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Profª Maria Berenice Machado | Propaganda Política

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

IMAGEM E CARISMA DE MARINA SILVA


Marcelo Freire de Campos

Marina Silva nasceu em 1958 no seringal Bagaço, a cerca de 70 km de Rio


Branco, capital do Acre. Alfabetizou-se aos 16 anos, graduou-se em História aos 26,
e quatro anos depois foi eleita como vereadora de Rio Branco, obtendo o maior
número de votos daquela eleição. Em seguida candidatou-se à deputada estadual,
obtendo novamente maior votação, e nas eleições seguintes foi eleita senadora pelo
Acre, também com maior votação, mantendo o cargo de 1995 a 2011. Durante esse
período foi ministra do Meio Ambiente no governo do presidente Lula, entre 2003 e
2008. Concorreu às eleições presidenciais em 2010, 2014 e 2018, obtendo,
respectivamente, 19,33%, 21,32% e 1,00% dos votos. No trabalho em questão se
objetiva analisar sua imagem pública ao longo de sua trajetória política, assim como
seu carisma (presente ou não) infundido - ou não - nas populações em nível do Acre
e em nível nacional.

O conceito de carisma é pensado por Max Weber como algo inserido na


esfera do irracional, um pivô dos rompimentos com os processos de racionalização
na história da humanidade. Na esfera do racional estão situadas as instituições, a
rotina e a burocracia - instaurado um processo de falência e crise desse sistema,
costumamos ver a ascensão de líderes carismáticos; indivíduos dotados de um
certo magnetismo capaz de mobilizar grandes grupos a fim de romper com a
estrutura até então vigente, gerando descontinuidades no processo de
racionalização. A palavra “carisma” é originada do grego “khárisma”, que significa
“graça”; o indivíduo dotado de carisma é visto como um portador de graça a traçar
um novo rumo àqueles em desgraça.

Embora o carisma seja pensado como algo que foge das teorias
behavioristas e corresponde mais a uma forma de energia inerente ao indivíduo, o
fato de termos a ascensão de líderes carismáticos como algo característico de
momentos de crise e declínio dos sistemas racionais nos diz algo sobre a
efetividade de assimilação do carisma pelas populações; os líderes carismáticos
não surgem com a crise, mas é nela que normalmente são reconhecidos e elevados
- há, portanto, um ingrediente de circunstancialidade a ser levado em conta.

No caso de Marina Silva, podemos notar extremo êxito em todas as suas


candidaturas a nível municipal e estadual no Acre e uma votação expressiva
durante as eleições de 2010 e 2014, nas quais foi a terceira candidata mais votada,
porém um brusco declínio de seu sucesso nas últimas eleições, ao obter apenas 1%
dos votos válidos nacionais. Nos resultados eleitorais acreanos, vemos que a
candidata obteve 2,5% dos votos - menos de um vigésimo do número de votos a
Jair Bolsonaro, que obteve 62,2% dos votos.

Ao longo do início de sua trajetória no Acre, Marina foi muito bem sucedida
em engajar a população ao contar sua história e se apresentar como uma
provocadora de mudanças no sistema coronelista instaurado no estado. Era vista
como uma representante dos trabalhadores, sendo co-fundadora da CUT no Acre e
combatendo privilégios de vereadores durante sua vereança, e como uma ativa
militante dos povos da mata, apoiadora dos camponeses que lutavam contra o
desmatamento da Amazônia por parte de latifundiários. Seu carisma era
provavelmente assimilado pela população junto a um fator de representatividade,
por um sentimento de identificação que informava que Marina seria a voz do povo
nas cúpulas de grandes decisões. Seu afastamento do Acre, entretanto, prejudicou
esse sentimento; em uma reportagem do El País nas eleições de 2014, a professora
Maria da Costa Silva, que lecionou na mesma escola que Marina (quando a
candidata lecionava história), afirmou: “Eu gosto muito da Marina, mas não vou
votar nela. A Marina mudou muito, quando ela era senadora ela era ótima, mas
agora ela fala difícil”.

Ao concorrer no âmbito político nacional, podemos observar tanto uma


ineficácia na manutenção de seus laços com o povo acreano quanto uma certa
dificuldade em falar com a totalidade do país. Em entrevista à revista Época, um de
seus ex-integrantes de campanha constatou que “ela e seu entorno preferem falar
com um grupelho de estudantes da Universidade de Brasília a se preparar para
aparecer no Jornal Nacional ”, e que “esse é um tipo de atuação política eficiente
para algumas coisas, mas não para ganhar uma campanha presidencial num país
continental”. Marina teria então um preparo mais vinculado à ação política
grassroots, sendo mais apta à articulação em níveis locais.

No que tange à imagem, vemos que há uma ideia de fragilidade vinculada à


Marina. Seu porte é pequeno e sua voz fina e esganiçada; além disso, sob as
condições precárias do seringal, a candidata sobreviveu a uma infecção por
mercúrio, uma leishmaniose, três hepatites e cinco malárias. Esse conjunto de
informações transmite uma certa insegurança ao povo quanto à sua capacidade de
governar de estavelmente. Durante a campanha de 2018, Marina tentou melhorar a
percepção de sua imagem física, contratando uma consultora de moda que lhe
orientou à utilização de tons mais vibrantes, o cabelo por vezes solto e até mesmo a
opção de roupas que passem a impressão de maior porte à candidata.

Marina também é vista como uma candidata “em cima do muro”, alguém com
opiniões pouco consistentes e que, por isso, fica presa entre polarizações sem
conseguir agradar nenhum dos lados, sendo um exemplo desse tipo de
posicionamento a questão religiosa: é adepta da igreja pentecostal e, embora tenha
tido grande apoio do eleitorado evangélico em 2014, tentou adotar uma postura
mais neutra nas eleições de 2018 - propondo um plebiscito à legalização do aborto,
celebrando o Estado Laico e defendendo o direito ao casamento homoafetivo. Isso
gerou enorme repúdio da comunidade evangélica - sendo ela chamada de “traidora”
por Marco Feliciano - e, ainda sim, suas declarações não foram consistentes o
suficiente para atrair o voto do eleitorado de esquerda. Marina tentou demonstrar
firmeza e assertividade e fortes opiniões ao confrontar Jair Bolsonaro no debate
eleitoral da RedeTV quanto à diferença salarial entre homens e mulheres, buscando
atrair o voto feminino.

Se pensarmos no contexto fervoroso e polarizado instaurado nas eleições de


2018, vemos Marina Silva como uma candidata pouco carismática - ou, ao menos,
pouco carismática se comparada aos seus concorrentes. Em cenário de caos e
crise, a candidata foi “atropelada” pela pungência das declarações de Jair Bolsonaro
e pela presença de Lula, um dos líderes mais carismáticos da história do país. Em
um momento em que mais uma descontinuidade dos processos de racionalização
se esboça no horizonte, Marina não foi capaz de convencer o eleitorado de que era
capaz de traçar um novo caminho, ou um novo horizonte.

LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO

WEBER, Max. Max Weber: Sociologia. Ática. São Paulo, 1997.

WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. Zahar, Rio de Janeiro, 1982.


CARVALHO, Daniel; SETO, Guilherme; FLECK, Isabel. Bolsonaro e Marina têm
confronto sobre direitos da mulher e elevam tensão em debate. Disponível em:
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/08/bolsonaro-e-marina-tem-embate-
sobre-direitos-da-mulher-e-elevam-tensao-em-debate.shtml. Acesso em 24/10/2018.

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Disponível em:
https://especiais.gazetadopovo.com.br/eleicoes/2018/resultados/votacao-presidente-
ac-primeiro-turno/. Acesso em 24/10/2018.

HOLANDA, Marianna; BRAMATTI, Daniel. Marina Silva perde o apoio que teve de
evangélicos em 2014. Estadão. Disponível em:
https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,marina-perde-o-apoio-que-teve-de-
evangelicos-em-2014,70002474614. Acesso em 24/10/2018.

MARINA SILVA. Linha do Tempo da Biografia de Marina Silva. Disponível em:


https://marinasilva.org.br/biografia/. Acesso em 24/10/2018.

RIBEIRO, Aline. Marina Silva, a candidata invisível: os desafios de uma


campanha sem dinheiro, sem tempo de TV e sem alianças. Revista Época.
Disponível em: https://epoca.globo.com/marina-silva-candidata-invisivel-os-desafios-
de-uma-campanha-sem-dinheiro-sem-tempo-de-tv-sem-aliancas-22942713. Acesso
em 24/10/2018.

ROSSI, Marina. Porque Marina Silva é rejeitada no Acre, seu berço político?.
Pragmatismo Político. Disponível em:
https://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/09/por-que-marina-e-rejeitada-acre-
seu-berco-politico.html . Acesso em 24/10/2018

O SUL. Para combater a sua imagem de fragilidade como candidata, Marina


Silva quer repaginar o visual em sua terceira campanha para chegar à
presidência. Disponível em: http://www.osul.com.br/marina-silva-investe-em-
consultoria-de-moda-para-combater-imagem-de-fragilidade-da-candidata/. Acesso
em 24/10/2018.
O SUL. Marina Silva muda imagem para se livrar do rótulo de mulher frágil:
ousa no visual e adota discurso mais forte.

WIKIPÉDIA. Marina Silva. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Marina_Silva.


Acesso em 24/10/2018.

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