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Contracultura Negra Nos Anos 1970 PDF
Contracultura Negra Nos Anos 1970 PDF
9 a 12 de julho de 2019
UFSC - Florianópolis, SC
Tim Maia e Jorge Ben foram dois significativos músicos negros no Brasil
que alcançaram o ápice do sucesso na década de 1970. Suas canções, na
referida década, foram influenciadas pela soul music americana e também pela
contracultura que surgia no país, enquadrando suas produções sonoras numa
contracultura negra.
O presente artigo busca uma interpretação da produção sonora dos dois
músicos em consonância com as transformações na representação do negro no
Brasil nos anos 1970. A assunção de uma contracultura negra é sintoma de
transformações significativas nas representações da cultura popular no país,
bem como da ascensão de uma estrutura de sentimentos negra que congregou
um novo discurso sobre as relações entre identidade e política no país.
As canções de Tim Maia e Jorge Ben nos anos 1970 são representativas
dessa contracultura negra brasileira. Ambos os compositores se destacaram por
uma produção sonora que assimilava gêneros nacionais com soul music e funk
norte-americanos, formulando uma musicalidade própria e altamente
comercializável.
Em 1970 a revista Veja apresentava o jovem Tim Maia da seguinte
maneira
Para a jovem guarda em crise, ele era a salvação, com o
som inovador, mistura de soul americano e ritmo brasileiro.
Mas era também o bom compositor incluído por Elis
Regina na rigorosa seleção de seu último disco; e
escolhido pelo maldito ou simplesmente “comercial”
Agnaldo Timóteo para seu recente compacto. Essa
estranha preferência de admiradores conflitantes parece
explicada de certa forma, nas combinações musicais de
seu disco: um baião engraçado de Luís Vanderlei e João
do Vale (Coroné Antonio Bento) convive pacificamente
com românticas baladas do próprio Tim em parceria com
o discutido Carlos Imperial e uma valsa do cantor de iê-iê-
iê, Fábio. (A ESPERADA..., 15 jul.1970, p. 69)
:
Visto como uma opção à crise da Jovem Guarda, o som de Tim Maia se
destacava pelos nos arranjos musicais e no estilo norte americano. Seu primeiro
disco apresentava a junção de gêneros nacionais com a soul music,
principalmente o samba e o baião.
É sintomático do processo de internacionalização o uso da língua inglesa
pelo cantor. Uma de suas canções, “Jurema”, toda cantada em inglês,
homenageava a erva usada em rituais xamanicos e rebatizada pelo compositor
de Queen of the jungle. Jurema apresenta arranjos musicais que misturam o
samba com a soul music, apontando para uma aproximação temática às práticas
medicinais alternativas e também para o psicodelismo.
É deste LP também os sucessos “Coronel Antonio Bento” e “Padre
Cícero”, duas composições feitas na base do gênero baião, vinculado às
festividades nordestinas. “Padre Cícero”, composta junto com Cassiano,
constrói uma imagem ambígua do reverendo. O sacerdote é representado tanto
da perspectiva messiânica, vinculada às classes oprimidas do Nordeste quanto
ao coronelismo das classes dominantes. A canção inicia com um estilo híbrido
entre o gospel norte americano e cantos religiosos do catolicismo popular, para
se desenvolver em um tom funkeado comandado pela forte voz do cantor.
A junção de elementos míticos da cultura popular nordestina com o som
de uma cultura pop aponta para a ampla participação de músicos nordestinos,
bem como para o significado da cultura nordestina no eixo Rio – São Paulo.
Outras gravações que envolvem a cultura popular nordestina na produção
sonora de Tim Maia são as canções: “Canário do Reino”, “Festa de Santo Reis”
e “Salve Nossa Senhora”, em que podemos notar um interessante diálogo entre
formas rítmicas, melódicas soul com estruturas musicais presentes na cultura
popular nordestina. Nas três canções os arranjos de guitarra se confundem com
o acompanhamento de sanfona em um ritmo entre o soul e o baião.
A aproximação do som de Tim Maia aos ritmos nordestinos não foi mero
acaso, o baião surgido nos anos 1950 se formulou como um gênero musical
muito presente no cotidiano das classes populares, cantores como Luíz
Gonzaga, João do Vale e Jackson do Pandeiro eram bastante populares na
época e influíam fortemente na formação dos gostos. Ademais, há de se levar
em conta a forte presença de músicos nordestinos no polo Rio- São Paulo.
Essa proximidade entre música negra e nordestinidade nos oferece um
cenário a respeito de grupos outsiders da sociedade brasileira. Antonio Sérgio
Guimarães (2002) propõe uma interpretação histórica para o fenômeno do
preconceito regional no Brasil. Para o autor, com a decadência do sistema de
lavoura na Bahia no século XIX, esse estado, juntamente com a região nordeste
de maneira geral, passou a ser visto como símbolo de um Brasil atrasado e
arcaico. A forte presença de negros e mulatos nessa região também servia como
fator de estigma por parte dos sulistas. Assim, o nordestino:
Bibliografia:
VELOSO, Caetano. Verdade Tropical. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
WISNIK, José Miguel. Minuto e o milênio ou, por favor, professor, uma década
de cada vez. In: Anos 70: música popular Rio de Janeiro: Europa Editora, 1980.
Jornais e revistas
A ESPERADA surpresa. Veja, São Paulo: 15 jul. 1970. p.69