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Quando a ansiedade controla sua mente, não há onde se esconder.

Você faz alguma outra coisa por alguns


minutos e então a obsessão retorna. Você rodopia até descobrir que aquela energia não tem saída, não vai conseguir
operar. Então, se consegue, você se distrai por mais alguns minutos até que ela retorna, ainda mais destrutiva.
A cada crise a insatisfação se intensifica, quanto mais evidente é que a paisagem onde sua energia quer
operar não está presente. Então essa energia se volta contra você, e talvez você perca a capacidade de se distrair.
Pode ficar na cama, dormindo patologicamente, ou patologicamente acordado. Enquanto a ansiedade persiste, a
energia sem paisagem cria ilusões, paisagens irreais e distorcidas que então passam a ser reificadas. O sofrimento e a
insatisfação continuam na medida em que estes âmbitos são usufruídos pela mente ansiosa, que se deleita
em sustentar seus aparentes motivos causais. Ela se contenta num loop de justificativas e criação obsessiva de
paisagens ilusórias até cair em âmbitos de raiva, seja explosiva ou fria, ou torpor, depressão. A aflição da ansiedade
é por excelência o reino dos pretas, fantasmas famintos. Os reinos vizinhos são o inferno e o reino animal.
A única forma de acumular méritos nestes âmbitos é abandonar a causalidade e esquecer de si. A forma
mais grandiosa de esquecer de si é lembrar o outro. A partir do momento que a causalidade é rompida aquela energia
de obsessão ansiosa pode tornar-se a energia da compaixão, e as paisagens passam a ser Terras Puras.
No reino humano, se temos o mérito do treinamento do dharma, podemos ser resgatados dos âmbitos
criados pela frutificação de nossos carmas através de muitas formas extraordinárias. Por exemplo, se criamos ao
nosso redor um ambiente sagrado, com imagens puras que representam fontes de refúgio, é mais fácil
encadearmos uma paisagem causal que nos relembre a prática. Mesmo se usamos um nome ou roupas budistas, isto
funciona desta forma. É um lembrete externo, que ajuda a nos conectar com os níveis interno e secreto. Na
linguagem precisa do dharma, geramos mérito ao reproduzir estas imagens, ao limpar e arrumar o altar e os
ambientes onde vivemos e praticamos. Também, se nos conectamos com pessoas virtuosas e praticantes, temos ao
nosso redor muitas chances de relembrar como cortar a causalidade pela raiz e transferir nossa consciência
diretamente dos âmbitos de insatisfação para a amplidão da paisagem não-causal. Mesmo os âmbitos agradáveis
podem e devem estar completamente imbuídos de lembretes de sabedoria. Dessa forma podem também ser
usufruídos sem delusão, na perfeição de sua insatisfatoriedade inerente.
Se nossa mente recebeu muitos ensinamentos, sabe orações e mantras de cor, é capaz de relembrar
visualizações e nossa postura foi acostumada a permanecer num equilíbrio saudável nem relaxado nem tenso,
estamos mais próximos de não fazer distinção entre prática formal e na vida cotidiana. Os lembretes externos são
mais lentos e ineficazes do que os lembretes internos, o treinamento da nossa mente. Quando o sofrimento surge,
pelo fato de termos ouvido 100.000 vezes palavras diretas, verdadeiras e completamente puras e virtuosas, nossa
mente é invadida de antídotos, remédios. Imediatamente somos capazes de transformar nossas vivências agradáveis
e desagradáveis em prática e trazer benefício com nosso exemplo.
Enfim, se a mente relaxa num estado não-conceitual que não é uma ausência, se o âmbito não-causal é
vivenciado sem interrupções, então encontramos o tantra, a continuidade da mente do Lama, da mente que não
pertence a alguém. Seguimos a Sadhana da mente do Guru e nosso corpo, fala e mente espelham esta sabedoria.
Dessa forma, mesmo os obscurecimentos sutis são dissolvidos como água sobre a água.
Quando sofremos, sabemos o conforto que amigos e ambiente puro, sagrado, podem nos dar. Quando temos
incertezas e nossa energia oscila, sabemos como é importante cultivar a prática. Quando a realidade é experimentada
como ela realmente é, abandonamos as tentativas de alterar qualquer coisa.
Primeiro refúgio, visão, compromisso e conduta. Depois cultivo, treinamento, meditação. Enfim, usufruto,
repouso-ação. Decidir de forma inabalável, cultivar e usufruir. Garab Dorje e Sakyamuni nunca disseram nada mais
do que isto.
Padma Dorje

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