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Recensão Crítica

Why do mountains support so many


species of birds?
Adriana Ruggiero and Bradford A. Hawkins
Referência do artigo em análise​:
Ruggiero, A., & Hawkins, B. A. (2008). Why do mountains support so many species of
birds? ​Ecography,​ 31(3), 306-315. doi:10.1111/j.0906-7590.2008.05333.x

Foto de Elaine R. Wilson retirada no dia 9/05/2019 do site: ​https://carolinabirds.org/HTML/Thrush-02.htm

Trabalho de Biogeografia e Ecologia de Ornitocenoses


Filipa Duarte, nº42103 e Solange Nunes, nº43369
Biografia dos autores:

● Dra. Adriana Ruggiero

A Doutora Adriana Ruggiero fez a sua licenciatura em Biologia (1987) e doutoramento em


Ciências Naturais (1993) na Universidade de La Plata, na Argentina. É especialista em
Biogeografia sendo que o que mais lhe suscita interesse são a análise de padrões espaciais de
variação da distribuição geográfica e a diversidade de espécies a distintas escalas geográficas.

● Dr. Bradford A. Hawkins

O Doutor Bradford A. Hawkins fez o seu doutoramento em Entomologia (1984) na


Universidade da California, em Riverside. Atualmente é Professor de Ecologia e Biologia da
Evolução na Universidade da California, em Irvine. Toda a sua investigação é centrada na
pergunta “Porque estão as espécies distribuídas de forma não aleatória no ambiente, isto é,
porque é que existem gradientes de diversidade?”. Ao longo da sua carreira foi autor de
inúmeros artigos e livros e foram-lhe ainda atribuídas algumas distinções académicas.

Contextualização da investigação:

Este estudo ocorreu em 2007 no Novo Mundo com o objetivo de determinar a


resposta à pergunta “Why do mountains support so many species of birds?”. Este projeto
tornou-se pertinente não só a uma escala local mas também a uma escala global, podendo
este ser repetido para outras espécies de aves ou outros taxa.

Verificou-se ao pesquisar artigos relacionados com o tema em questão, que não


existem estudos anteriores ou simultâneos a este que abordem toda a extensão geográfica
ou que comparem os dois grupos de aves analisados no artigo em questão.

Inicialmente acreditava-se que a complexidade topográfica estava associada a uma


elevada diversidade de aves, no entanto pouco se conhecia sobre a contribuição para a riqueza
específica, da heterogeneidade geomorfológica e os gradientes climáticos que variam com a
altitude. Anteriormente ao estudo analisado, era conhecido que a heterogeneidade
topográfica promovia a riqueza específica, embora se desconhecesse que outros fatores
associados diretamente ou não à topografia poderiam influenciar esta riqueza. É ainda
mencionado neste artigo que, embora se costumasse utilizar o desvio padrão das diferenças na
elevação entre células adjacentes, os autores conseguiram descobrir a correlação perfeita
entre duas variáveis baseadas nos dados apresentados na Tabela 1. deste mesmo artigo.

A resposta a esta questão formulada por Ruggiero e Hawkins forneceu um conjunto de


novos conhecimentos sobre os dois grupos de espécies analisadas e sobre os fatores que
influenciam a riqueza específica nas montanhas da extensa área abrangida pelo estudo. Com
os resultados obtidos após o tratamento dos dados e as conclusões estabelecidas, será
possível a elaboração de outros estudos que poderão ser realizados em áreas em que se
desconhece a influência e efeitos dos fatores em foco neste artigo.

Resumo do artigo:
O objetivo central do artigo “Why do mountains support so many species of birds?” é
analisar a riqueza específica das aves que habitam as montanhas entre latitudes tropicais e
temperadas do Novo Mundo, isto é, a área que compreende a América do Norte e do Sul,
desde o Alasca à Terra do Fogo e, verificar a relação que existe entre esta riqueza específica e
as variáveis: heterogeneidade topográfica e gradientes climáticos que variam com a altitude.

Adriana Ruggiero e Bradford Hawkins avaliam a distribuição de espécies de aves que


habitam montanhas e das que habitam planícies, através da visualização direta e com o auxílio
de mapas com a distribuição das zonas de reprodução das aves nativas incluídas na área de
estudo. Com o auxílio da plataforma ArcGIS 9.2 foi possível estimar diretamente a riqueza
específica existente nas áreas analisadas.

Para obterem a gama de temperatura em cada célula, esta foi estimada a partir da
média anual de temperatura, desenvolvida por Hijmans et al. (2005), disponível na base de
dados do WorldClim em http://www.worldclim.org/current. htm. Assim, foi possível estimar o
gradiente de temperatura em cada célula após a correção das posições latitudinais.

Uma vez que as variáveis água-energia apresentam relações fortes com os padrões de
riqueza específica, foi estimado o valor máximo de evapotranspiração (AET) para cada célula a
partir da base de dados desenvolvida por Ahn and Tateishi (1994) disponível em http://
gcmd.gsfc.nasa.gov/.

Tendo em conta que análises estatísticas prévias sugerem que uma interação entre o
macroclima e os efeitos topográficos podem conduzir à variação da riqueza específica do
Equador aos pólos, testaram ainda os efeitos indiretos da topografia mediados pelo efeito da
AET.

Os autores utilizaram o software PROC CALIS em SAS 9.1 para testar a existência de
relações casuais entre as variáveis. De modo a perceber se os efeitos da topografia na riqueza
específica diferem entre as aves de montanha (de distribuição pontual/estreita) e as aves de
planícies (de distribuição ampla), o modelo foi testado para: todas as espécies, só para as
espécies de montanha, só para as espécies de planície e, para a proporção em cada célula de
espécies de montanha.

Com este estudo os principais resultados obtidos foram:

● A variação da riqueza específica das planícies representa mais precisamente a variação


das espécies em toda a área analisada.
● Os padrões de riqueza específica de todas as espécies possuem uma forte relação com
a evapotranspiração, refletindo assim uma influência do clima na generalidade dos
gradientes de diversidade.
● Os efeitos da heterogeneidade topográfica são duplamente mais fortes do que os
efeitos do gradiente de temperatura.
● Existe uma forte colinearidade entre a heterogeneidade topográfica e a gama de
temperaturas no Novo Mundo.
● Um terço da variação da riqueza específica foi explicada pela sobreposição da
rugosidade topográfica e da gama de temperaturas que variam com a altitude.
● O efeito independente da variação altitudinal da temperatura foi substancialmente
mais forte do que o efeito independente da heterogeneidade topográfica.

Os autores confirmaram que a influência dos efeitos da topografia nos padrões de


riqueza específica em larga escala, depende dos gradientes climáticos. Todos os resultados
obtidos neste estudo foram fortemente consistentes com a hipótese estipulada por Janzen
(1967), de que a associação entre a escala de elevações, a diversidade climática e o isolamento
de populações poderá promover o aumento da riqueza específica em regiões de elevado
relevo topográfico.

Ruggiero e Hawkins salientam ainda a importância de perceber as razões da correlação


existente entre a riqueza específica e a escala de elevações. Esta última tem sido interpretada
como a explicação para o gradiente de diversidade observado, em vez deste ser causado pelo
clima. No entanto, os resultados obtidos provam que o efeito do clima e o efeito da elevação
não constituem hipóteses distintas, sendo a mesma hipótese, porém atuam em escalas
diferentes.

Os autores do artigo em análise apontam que, a correlação existente entre a riqueza


específica e a escala de elevação versus as variáveis climáticas em ampla escala não são
necessariamente as explicações alternativas para os gradientes de diversidade observados.
Contudo, estes indicam que estas explicações devem ser sensíveis à escala espacial que o
presente modelo utiliza. Foi possível concluir que existe um pico nos valores de espécies
endémicas em locais climaticamente mais estáveis, oferecendo às espécies que aqui habitam
proteção contra condições menos favoráveis, possibilitando o surgimento de novas espécies. A
rugosidade topográfica está ainda associada a estes locais, no entanto este efeito não é
independente da ação do clima, mas possibilita sim uma contribuição estatisticamente
“independente” da heterogeneidade para a riqueza específica.

Os autores concluem que a riqueza das espécies amplamente distribuídas define mais
intensamente a riqueza global existente na área de estudo do que a riqueza de espécies de
distribuição pontual/estreita. Este facto é comprovado pela forte correlação existente entre as
espécies de planície e a riqueza específica global.

Em suma, os autores depreendem que a explicação para as montanhas suportarem um


elevado número de espécies aves, é devido aos gradientes climáticos de mesoescala que
variam em altitude ao longo das encostas das montanhas. Este facto permitirá obter um maior
conhecimento sobre a influência dos gradientes altitudinais e latitudinais na riqueza específica,
através de um modelo climático. Foi ainda possível determinar que ambos os gradientes atuam
de forma homóloga, a diferentes escalas, embora exista a tendência de os considerar
independentemente.

Adriana Ruggiero e Bradford Hawkins consideram relevante o desenvolvimento de


mais estudos posteriores a este relativamente às aves, para que possam ser comparados com
este, tornando-se ainda imperativo perceber se as relações estabelecidas para as aves, entre a
riqueza específica e a topografia, podem ser generalizadas aos restantes taxa.

Apreciação Crítica:
O título da obra “Why do mountains support so many species of birds?” embora reflita
o objetivo essencial do estudo, foca-se somente em perceber a explicação do número elevado
de espécies nas montanhas, enquanto que a íntegra do estudo aborda as variáveis que
influenciam a riqueza específica existente tanto nas montanhas como nas planícies,
comparando estas hipóteses.

O objetivo deste estudo é bem definido e estruturado na introdução, sendo este a


análise das variáveis que condicionam a riqueza específica das aves que habitam as montanhas
e das que habitam as planícies. A introdução possui uma estrutura coerente, sendo que explica
e direciona facilmente o leitor ao objetivo do estudo.

Em relação ao resumo (“abstract”) os autores, ao contrário do que pode ser observado


na introdução, embora expliquem o problema em torno deste tema, não referem em qualquer
parte do resumo, que o objetivo é solucionar este mesmo problema, passando de seguida à
explicação das ações realizadas durante o estudo.

Analisando o design experimental utilizado neste estudo, verificamos que é adequado


para obter a resposta à pergunta que os autores pretendem responder, podendo assim o
estudo ser replicado utilizando os mesmos métodos, tanto com outras espécies de aves, outros
taxa ou ainda outras regiões do globo. Ao rever a metodologia utilizada não foram
encontrados erros evidentes, sendo que esta apresenta coerência ao longo do artigo. A
seleção da amostra utilizada no estudo consiste em espécies de montanha, cuja distribuição
geográfica compreenda mais de 50% de região montanhosa e espécies de planícies que se
distribuam maioritariamente em planícies, embora possam habitar em montanhas. Uma vez
que para selecionar as espécies de montanha foi utilizado ​o critério que corresponde a um
intervalo (>50%), o mesmo deveria também ser aplicado às espécies de planície de forma a
obter resultados mais coerente e evitar possíveis erros. A ordem dos tópicos referidos nos
métodos, assim como o seu conteúdo, é considerada pertinente uma vez que aborda de forma
clara os assuntos de interesse para este estudo.

Relativamente aos resultados obtidos, verificámos que nos gráficos da figura 2 existe
um lapso correspondente à legenda, observando-se uma não correspondência entre a
descrição acima de cada imagem e a respetiva legenda, nos gráficos b) e c). Respetivamente ao
texto na sua íntegra constatamos que este está bem estruturado, com os títulos e conteúdos
bem associados. Ao longo deste artigo, os valores dos resultados (ex: R​2​) referidos no texto ou
nas tabelas ou nos gráficos não são simultaneamente mencionados em mais do que um destes
elementos, no entanto no texto que acompanha as respetivas figuras ou tabelas está presente
uma descrição complementar destes mesmos valores. Lendo o artigo e focando-nos no seu
objetivo inicial, concluímos que os autores respondem concretamente à pergunta formulada.

A discussão não repete somente os resultados como também adiciona informações


que os autores consideram relevantes, referindo outras conclusões que não foram
mencionadas anteriormente. Neste tópico os autores consideram que é possível repetir-se
este estudo para outras aves ou outros taxa. É realizada a interpretação dos dados
apresentados ao longo do artigo sem que sejam introduzidos novos resultados, isto é, são
discutidos somente os resultados obtidos através da implementação do estudo e que se
tornaram pertinentes para responder à questão inicial. Os autores deste artigo admitem a
possibilidade de existência de erros na relação diversidade-ambiente, uma vez que são
desconhecidas as limitações ao conjunto de dados utilizados para a obtenção dos resultados. O
modelo utilizado para responder à questão inicial necessita ainda, segundo Ruggiero e
Hawkins, de ser verificado com o auxílio de base de dados que atuem a uma escala mais
reduzida e com maior qualidade, do que as utilizadas neste estudo, no entanto estes dados
podem nunca vir a ser disponibilizados.

Este estudo é suportado por Janzen (1967) que originalmente defendeu que a
associação entre a escala de elevações, a diversidade climática e o isolamento de populações
podem promover o aumento da riqueza específica em regiões de relevo topográfico
acentuado. Janzen (1967) defende ainda que a riqueza específica é fortemente influenciada
pelo gradiente de temperatura verificado ao longo de uma montanha. As análises realizadas
recentemente sobre os padrões da riqueza específica de aves reforçam a hipótese defendida
pelos autores do artigo, de que a variação latitudinal da riqueza de espécies terrestres é
influenciada pela interação observada entre o clima e a topografia.

Como referimos anteriormente, embora no resumo ​o objetivo do estudo não seja


referido, este aborda ​de forma adequada o essencial do artigo “Why do mountains support so
many species of birds?”. Ao longo deste artigo, a linguagem que o compõe é clara, embora
dirigido a um público científico e entendido nos assuntos abordados, podendo por vezes se
tornar de difícil compreensão, especialmente certos termos com os quais não estamos
inteiramente familiarizadas.

Significância do artigo:
Este artigo foi citado por vários outros artigos, uma vez que adicionou informação
pertinente e desconhecida à ciência, sendo por isso muito importante para outros
investigadores e outros problemas biogeográficos semelhantes. As conclusões adquiridas por
Ruggiero e Hawkins permitiram a obtenção de novos conceitos que se tornaram fulcrais para o
estabelecimento de novas teorias por parte de outros autores. Isto pode ser verificado através
da leitura do artigo “​Historical Legacies in World Amphibian Diversity Revealed by the Turnover
and Nestedness Components of Beta Diversity” (Baselga et al., 2012) cujos autores afirmam
que o papel da variação altitudinal deve ser visto como um efeito indireto do clima,
possibilitando o cálculo da heterogeneidade climática ou ambiental e favorecendo a
diversidade de espécies em pequena escala. Sendo assim, Baselga et al. (2012) concluem que
as formações montanhosas podem influenciar mais a composição das populações de anfíbios
estudadas, do que a presente temperatura verificada na área de estudo.

Os autores do artigo “​Tropical niche conservatism and the species richness gradient of
North American butterflies.” (Hawkins e DeVries, 2009) ​concordam com Ruggiero e Hawkins
quando afirmam que a utilização da variação da temperatura para o cálculo da variabilidade
dentro de cada célula representa uma medida mais direta da forma como o gradiente
climático se altera com a altitude ao longo das montanhas, ao invés de utilizar para este efeito
a escala de elevação per se. A ideia supra referida, ao ser mencionada por ​Hawkins e DeVries
(2009)​, prova que os fundamentos alcançados pelos autores do artigo alvo de crítica foram
aceites pela comunidade científica, sendo por isso utilizados em outras investigações.

Aragón et al. (2009) afirmam que a escala de elevação acaba por ser um substituto da
heterogeneidade do habitat, uma vez que esta é intrínseca à variação da elevação, sendo
frequentemente associada ao aumento da riqueza específica, referindo ainda que as variáveis
topográficas podem influenciar a diversidade de espécies espacialmente, concordando assim
com Ruggiero e Hawkins.

No artigo “​Ants on a mountain: spatial, environmental and habitat associations along


an altitudinal transect in a centre of endemism.” ​(Munyai e Foord, 2011) ​os autores referem
uma das conclusões obtidas por Ruggiero e Hawkins, de que os padrões de riqueza específica
são frequentemente associados a diferentes variáveis, entre elas, a temperatura,
mencionando ainda que com a compreensão dos mecanismos que explicam estes padrões de
diversidade é possível agir com foco na conservação.

Referências Bibliográficas:
Ahn, C. H. & Tateishi, R. (1994). Development of a global 30minute grid potential
evapotranspiration data set. ​Photogram. Rem. Sens.​ 33: 1221.

Aragón, P., Lobo, J. M., Olalla-Tárraga, M. Á., & Rodríguez, M. Á. (2009). The contribution of
contemporary climate to ectothermic and endothermic vertebrate distributions in a glacial
refuge.​ Global Ecology and Biogeography,​ 19(1), 40–49. doi:10.1111/j.1466-8238.2009.00488.x

Baselga, A., Gómez-Rodríguez, C., & Lobo, J. M. (2012). Historical Legacies in World Amphibian
Diversity Revealed by the Turnover and Nestedness Components of Beta Diversity. PLoS ONE,
7(2), e32341.doi:10.1371/journal.pone.0032341

Hawkins, B. A., & DeVries, P. J. (2009). Tropical niche conservatism and the species richness
gradient of North American butterflies. ​Journal of Biogeography, 36(9),
1698–1711.doi:10.1111/j.1365-2699.2009.02119.x

Hijmans, R. J. et al. (2005). Very high resolution interpolated climate surfaces for global land
areas. ​Int. J. Climatol.​ 25: 1965-1978.

Munyai, T. C., & Foord, S. H. (2011). Ants on a mountain: spatial, environmental and habitat
associations along an altitudinal transect in a centre of endemism. Journal of Insect
Conservation,​ 16(5), 677–695.doi:10.1007/s10841-011-9449-9

Stein, A., & Kreft, H. (2014). Terminology and quantification of environmental heterogeneity in
species-richness research.​ Biological Reviews,​ 90(3), 815–836.doi:10.1111/brv.12135

USGS 1999. GTOPO30 Documentation. Consultado em: http://edcwww.


cr.usgs.gov/landdaac/gtopo30/README.html.

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