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Pedro Abelardo - Lógica para Principiantes PDF
Pedro Abelardo - Lógica para Principiantes PDF
LÓGICA PARA
PRINCIPIANTES
(LOGICA INGREDIENTIBUS)
Tradução do PROF. D R. RUY AFONSO DA COSTA NUNES
COMEÇAM AS GLOSAS DO MESTRE PEDRO ABELARDO
SOBRE PORFÍRIO
Para aqueles dentre nós que se iniciam no estudo da lógica digamos
algumas palavras sobre as suas propriedades, e comecemos por
tratar do gênero a que ela pertence, ou seja, a filosofia. Boécio não
denomina qualquer ciência filosofia, mas só aquéla que consiste no
estudo das coisas
a quaisquer mais elevadas.
estudiosos, mas apenas Deaos
fato,sábios
não damos o nome de filósofos
cuja inteligência
se aprofunda na consideração das questões mais sutis. Boécio distingue
três espécies de filosofia, isto é, aespeculativa, que investiga a
natureza das coisas; amoral, que considera a questão da vida honesta;
e a racional, denominada lógica pelos gregos e que trata da
argumentação. Alguns autores, entretanto, separam a lógica da filosofia
com afirmar que ela constitui mais um instrumento, de acordo
com Boécio, do que uma parte da ciência filosófica, uma vez que
todas as outras disciplinas dela se utilizam de alguma forma, quando
usam os seus argumentos para fazerem as próprias demonstrações.
Quer se trate de uma investigação sobre o mundo físico, quer de um
assunto moral, os argumentos procedem da lógica. O próprio Boécio
rebate essa opinião com afirmar que nada impede a lógica de ser, ao
mesmo tempo, instrumento e parte da filosofia, tal como a mão é, ao
mesmo tempo, instrumento e parte do corpo humano. Às vezes, a própria
lógica parece ser instrumento de si mesma, quando demonstra
com os seus argumentos uma questão pertencente à sua área, como,
por exemplo, a seguinte: o homem é uma espécie do género animal.
Contudo, nem por isso ela é menos lógica, ao servir de instrumento da
lógica. Assim, também, ela não é menos filosófica por ser instrumento
da filosofia. O próprio Boécio também a distingue das duas outras
espécies de filosofia pelo seu fim próprio que consiste em compor
argumentações. Ainda que o filósofo da natureza componha
argumentações, não é a filosofia natural (Physica) que o instrui quanto
a isso, mas apenas a lógica.
Por essa razão lembra, ainda, Boécio, a respeito da lógica que
,
Além disso, há uns outros que dizem ser a espécie não apenas
um conjunto de homens mas, também, os indivíduos enquanto são homens
e, ao afirmarem que a coisa que é Sócrates se predica de muitos,
tomam ta afirmação em sentido figurado, como se dissessem: muitos
são o mesmo que ele, isto é, com ele combinam ou ele próprio combina
com muitos. Quanto ao número de coisas, estabelecem que existem
tantas espécies e gêneros quantos indivíduos, mas em relação à semelhança
das naturezas acham que o número dos universais é menor de
que o dos indivíduos. Decerto, todos os homens considerados em si
mesmos são muitos, por força da diferença pessoal, e uma só coisa,
devido a semelhança da humanidade e, em relação à diferença e à
semelhança, os mesmos são julgados serem diversos de si mesmos tal
como Sócrates, naquilo que é homem, distingue-se de si mesmo
naquilo que é Sócrates. De outra forma,a mesma coisa não poderia
ser o seu próprio gênero ou espécie, a não ser que tivesse alguma difença
própria quanto a si mesma, uma vez que as coisas relativas
devem opor-se pelo menos sob algum aspecto.
Agora,
cada umresta-nos, ainda, combater
dos indivíduos aqueles
naquilo em que chamam
que combinam unsdecom
universal
os
outros e concedem que esses mesmos indivíduos sejam predicados de
muitos seres, não enquanto sejam esses muitos essencialmente, mas
porque os muitos combinam com eles. Mas, se ser predicado de muitos
é o mesmo que combinar com muitos, como dizemos que um indivíduo
é predicado apenas de um ser, isto é, uma vez que nada existe
que combine apenas com uma só coisa? Como, também, se dá a diferença
entre o universal e o singular pelo fato de algo serpredicado de
muitos, já que absolutamente da mesma maneira que o homem
combina com muitos, Sócrates também combina? Certamente, o
homem enquanto é homem, e Sócrates enquanto é homem, combinam
com os outros. Mas nem o homem enquanto é Sócrates nem Sócrates
enquanto é Sócrates combina com os outros. Por conseguinte, aquilo
que o homem tem Sócrates tem do mesmo modo.
Além disso, uma vez que se conceda que a coisa é absolutamente
a mesma, isto é, o homem que está em Sócrates e o próprio Sócrates,
não há diferença alguma deste para aquele. Com efeito, nenhuma
coisa é diversa de si própria no mesmo tempo, porque qualquer coisa
que ela tenha em si mesma, ela o tem absolutamente do mesmo modo.
Donde, sendo Sócrates branco e gramático, ainda que tenha diversas
coisas em si mesmo, não é, todavia, por isso, diferente de si próprio,
uma vez que ele tem as mesmas duas coisas absolutamente do mesmo
modo. De fato, ele não é gramático de um modo diferente de si
mesmo nem branco de outro modo, assim como o branco não é outra
coisa diferente dele mesmo e tampouco o gramático. Como se pode
entender, outrossim, o que dizem quanto ao fato de Sócrates combinar
com Platão na sua realidade de homem, uma vez que é certo
serem todos os homens diferentes uns dos outros, tanto pela matéria
quanto pela forma? De fato, se Sócrates combina com Platão na
mesma realidade humana, mas nenhuma outra coisa é homem a não
ser o próprio Sócrates ou um outro, é necessário que ele combine com
Platão ou em si mesmo ou em um outro. Em si mesmo, porém, ele é
antes diferente dele; quanto a um outro, chega-se também à mesma
conclusão de que ele não é um outro. Existem, porém, aqueles que
tomam negativamente a expressãocombinar na sua realidade de
homem, como se alguém dissesse: Sócrates não difere de Platão no
homem. Mas também poder-se-ia dizer, então, que eles não diferem
na pedra, uma vez que nem um nem outro é pedra. Desse modo, não
se nota maior combinação entre eles no homem do que na pedra, anão
ser, porventura,
a seguinte que certa
afirmação: "Elesproposição preceda,
são homens porquecomo se fosseno
não diferem feita
homem". Mas nem essa proposição pode manter-se, uma vez que é
absolutamente falso que eles não sejam diferentes no homem. Com
efeito, se Sócrates não difere de Platão na coisa que é homem, nem em
si mesmo dele se diferencia. Mas se é diferente dele em si mesmo
sendo, porém, ele próprio a coisa que é homem, certamente difere de
Platão na mesma realidade humana.
Entretanto, agora que já se apresentaram as razões pelas quais
as coisas tomadas individualmente ou coletivamente não podem ser
chamadas de universais pelo fato de serem predicadas de vários seres,
resta a solução de atribuir essa universalidade apenas às palavras.
Por conseguinte, assim como certos nomes são chamadosapelativos
pelos gramáticos, e certos outros, próprios, assim certas palavras simples
são chamadas de universais pelos dialéticos, e certas outras de
singulares, isto é, individuais. Uma palavrauniversal, entretanto, é
aquela que é apta pela sua descoberta para ser predicada singularmente
de muitos seres, tal como este nome homem, que se pode ligar
com os nomes particulares dos homens segundo a natureza das coisas
sujeitas (substâncias) às quais foi imposto. Já o nomesingular é aquele
que só é predicável de uma só coisa, como Sócrates, desde que se
toma apenas o nome de um único ser. Sem dúvida, se tomares o vocábulo
equivocamente, não terás um vocábulo e sim muitos vocábulos
de significado diferente, porque, de acordo com Prisciano, muitos
nomes coincidem numa só palavra. Portanto, quando se afirma que o
universal é aquilo que é predicado de muitos, a expressãoaquilo que,
usada no início da definição, não apenas indica a simplicidade da
palavra para distingui-la das proposições como, também, a unidade
do significado para distingui-la dos termos equívocos.
Ora, uma vez que foi mostrado o que se passa na definição do
universal por força da expressão preliminaraquilo que, consideremos
cuidadosamente as duas outras expressões que seguem, isto é,ser predicado
e de muitos.