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Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS

Réu: MUNICÍPIO DE ALÉM PARAÍBA

SENTENÇA

Vistos.

Trata-se de AÇÃO CIVL PÚBLICA em que o Ministério Público sustenta, em síntese, a


ineficiência da política municipal de acolhimento e tratamento de animais doentes/abandonados, bem como de
controle de zoonoses. Faz considerações de direito e, ao final, requer, liminarmente, seja o Município compelido:
a) recolher cães e gatos considerados nocivos à saúde e às segurança dos serem humanos e de outros animais;
bem como os que estejam em fase de doença terminal ou que apresentem quadro irreversível de saúde, salvo a
captura para fins de vacinação, tratamento veterinário e/ou castração; b) realizar a eutanásia de animais somente
quando certificado por escrito por médico veterinário atestando a necessidade; c) não abater animais sadios (não
portadores de zoonoses), sob pena de multa; d) não realizar sacrifício de animais por meio de métodos não
recomendados, aceitos sob restrição, coletivos (câmaras de gás), ou qualquer outro meio cruel, sob pena de
multa. No mérito, pede a condenação do Município na obrigação de: e) tratar adequadamente todos os animais
recolhidos em via pública, sejam ou não portadores de zoonoses, para que preservem a boa qualidade de vida até
sua destinação, sob pena de multa; f) construir estrutura física capaz de abrigar o Centro de Controle de
Zoonoses/CCZ ou canil, de acordo com as diretrizes técnicas da Funasa, dotando-a de pessoa e estrutura
material, inclusive um veículo, necessários ao regular funcionamento; g) dotar o CCZ/canil somente de
servidores previamente capacitados em manejo etológico (racional e sem violência), comportamento animal,
ministrado em empresa, entidade de terceiro setor ou instituição de ensino reconhecida, assegurando-lhe
treinamento periódico para que adquiram técnica e conhecimento adequado ao exercício das suas funções, de
modo a prevenir a ocorrência de sofrimento desnecessário durante a apreensão, triagem e guarda dos animais; h)
manter os animais recolhidos em alojamentos separados por porte e por condição de saúde, assegurando-lhes a
exposição diária ao sol, alimentação própria e água potável; i) assegurar a higienização permanente das

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instalações, celas e veículos do CCZ/canil, mantendo o ambiente livre de infecções; j) não ceder animais
abrigados para realização de vivissecção ou de qualquer forma de experimento cruel; l) dar destinação ambiental
adequada a carcaças e resíduos de saúde animal; m) inserir animais em programa de doação após obervação por
tempo clínico razoável, feita a castração, vermifugação, vacinação e registro.

O Município de Além Paraíba se manifestou previamente refutando o cabimento dos pedidos


liminares (ff. 84/89).

Em contestação, o Município sustenta que as ações de promoção e proteção da saúde competem


aos órgãos e entidades que integram o SUS nas esferas federal, estadual e municipal. Aduz que o controle de
zoonoses, em especial, é competência da direção estadual do SUS, razão pela qual o Estado deveria ser
denunciado da lide. Assevera que o Município vem efetuando repasses para a associação protetora dos animais e
declarou utilidade pública de imóvel para construção do canil. Salienta que o Município realiza campanhas de
vacinação. Alerta para a necessidade de dotação orçamentária e elevados custos para implantação de centro de
controle de zoonoses, inclusive com pessoal. Ao cabo, requer o reconhecimento da ilegitimidade passiva,
denunciação da lido do Estado de Minas Gerais ou, subsidiariamente, improcedência do pedido (ff. 102/108).

Réplica às ff. 110/115.

Foram tentados acordos, contudo infrutíferos (ff. 119 e 134/135)

As partes requereram o julgamento do processo no estado (ff. 162/163).

É o relatório.

DECIDO.

O feito comporta julgamento antecipado, na medida em que se mostra despicienda a dilação


probatória, conforme art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

Busca o Ministério Público a construção de centro de controle de zoonoses/canil, além da


implementação de políticas públicas de acolhimento, tratamento e destinação de animais doentes/abandonados.

Ab initio, insta consignar a legitimidade ativa do Ministério Público para propositura da demanda,
diante do contido nos arts. 127 e 129 da Constituição da República.

Do mesmo modo, o Município de Além Paraíba é parte legítima para figurar no polo passivo da
ação, uma vez que a Constituição prevê a responsabilidade do Poder Público para “proteger a fauna e a flora, vedadas,
na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção das espécies ou submetam os animais
a crueldade” (CR/88, art. 225, §1º, VII).

E mais, o viés sanitário do controle de zoonoses repercute na solidariedade entre as esferas


federal, estadual e municipal (CR/88, art. 200, II), o que frustra as arguições de ilegitimidade passiva e
denunciação da lide.

Superadas as preliminares, vamos ao mérito.

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A ausência de políticas públicas dirigidas ao acolhimento, tratamento e destinação de animais


doentes e/ou abandonados no âmbito municipal traz graves impactos à saúde e qualidade de vida da população.

Sabe-se os animais podem atuar como reservatórios, hospedeiros e/ou vetores de agentes
patogênicos. Daí o interesse público envolvido e a consequente razão para o controle das populações animais,
com adoção de medidas de profilaxia das zoonoses.

No caso dos autos, a Associação Protetora dos Animais de Além Paraíba, declarada de utilidade
pública (fl. 16), fazia as vezes do poder público quanto às ações dirigidas em favor dos animais
doentes/abandonados (ff. 04/05 e 07), recebendo subvenções do Município (ff. 20/25).

Todavia, a entidade tem limitações próprias e não tem condições de fazer frente a demanda de um
Município do porte de Além Paraíba (ff. 56/57, 67/69 e 97).

O Município-réu chegou a declarar a utilidade pública de imóvel para fins de desapropriação e


doação à associação (ff. 63), mas a medida não prosperou e as subvenções foram suspensas (ff. 71/75).

A própria Vigilância Sanitária Municipal, em ofício dirigido ao Chefe da Divisão de Fiscalização,


informou sobre a precariedade dos equipamentos públicos destinados ao acolhimento/tratamento de animais,
recomendando a construção de uma centro de controle de zoonoses (fl. 99).

Muito bem.

A partir da Medida Cautelar na ADPF 45, o Supremo Tribunal Federal deixou assentado que não
é defeso ao Poder Judiciário determinar a implementação de políticas públicas com previsão constitucional/legal,
ante a omissão das instâncias governamentais, violadora dos direitos assegurados pelo ordenamento jurídico.
Vejamos:

DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO - MODALIDADES DE COMPORTAMENTOS


INCONSTITUCIONAIS DO PODER PÚBLICO.

- O desrespeito à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação estatal quanto mediante inércia
governamental. A situação de inconstitucionalidade pode derivar de um comportamento ativo do Poder
Público, que age ou edita normas em desacordo com o que dispõe a Constituição, ofendendo-lhe, assim, os
preceitos e os princípios que nela se acham consignados. Essa conduta estatal, que importa em um facere
(atuação positiva), gera a inconstitucionalidade por ação.

- Se o Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos preceitos da Constituição, em
ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis, abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de
prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse non
facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma
a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público.

- A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo
texto constitucional - qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis
que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela
se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos
postulados e princípios da Lei Fundamental." (RTJ 185/794-796, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno) É
certo que não se inclui, ordinariamente, no âmbito das funções institucionais do Poder Judiciário - e nas desta
Suprema Corte, em especial - a atribuição de formular e de implementar políticas públicas (JOSÉ CARLOS
VIEIRA DE ANDRADE, "Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976", p. 207, item n.
05, 1987, Almedina, Coimbra), pois, nesse domínio, o encargo reside, primariamente, nos Poderes Legislativo
e Executivo. Tal incumbência, no entanto, embora em bases excepcionais, poderá atribuir-se ao Poder
Judiciário, se e quando os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que
sobre eles incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de direitos
individuais e/ou coletivos impregnados de estatura constitucional, ainda que derivados de cláusulas revestidas
de conteúdo programático. Cabe assinalar, presente esse contexto - consoante já proclamou esta Suprema
Corte - que o caráter programático das regras inscritas no texto da Carta Política "não pode converter-se em
promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele
depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever,
por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do
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Estado" (RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. CELSO DE MELLO)" (ADPF 45 MC, Relator(a): Min. CELSO
DE MELLO, julgado em 29/04/2004, publicado em DJ 04/05/2004 PP-00012 RTJ VOL-00200-01 PP-
00191)

O Código de Saúde de Minas Gerais (Lei nº 13.317/99) estabelece:

Art. 34 - Para os efeitos desta lei, entende-se por controle de zoonoses o conjunto de ações que visam a
prevenir, diminuir ou eliminar os riscos e agravos à saúde provocados por vetor, animal hospedeiro,
reservatório ou sinantrópico.

§ 1º - Para os efeitos desta lei, entende-se por:

I - zoonose a doença transmissível comum a homens e animais;

II - doença transmitida por vetor a doença transmitida ao homem por meio de seres vivos que veiculam o
agente infeccioso, tendo ou não os animais como reservatório;

III - animal sinantrópico o que provavelmente coabita com o homem, no domicílio ou peridomicílio.

§ 2º - Nas ações de controle de zoonose, serão consideradas as alterações no meio ambiente que interfiram
no ciclo natural das nosologias envolvidas.

§ 3º - As campanhas que tenham como objetivo o combate a endemias com uso de inseticidas serão
precedidas de estudos de impacto ambiental e de eficácia e efetividade.

Art. 35 - Os serviços de controle de zoonoses no Estado serão estruturados segundo os princípios


do SUS e obedecerão às seguintes diretrizes:

I - definição e utilização dos critérios epidemiológicos para a organização dos serviços de controle e
diagnóstico de zoonoses;

II - desenvolvimento de ações de combate e controle dos vetores, animais reservatórios e sinantrópicos e dos
agravos à saúde, de forma integrada com a vigilância epidemiológica, de saneamento, meio ambiente,
educação, comunicação social e saúde do trabalhador, ressaltando o caráter de complementaridade do
combate químico. (Vide Lei n° 19.482, de 12/1/2011.)

Art. 36 - Compete aos serviços de controle de zoonoses:

I - planejar, estabelecer normas, coordenar, acompanhar, avaliar e executar as ações de controle de zoonoses;

II - analisar o comportamento das zoonoses, das doenças ou dos agravos causados por vetor, animal
hospedeiro, reservatório ou sinantrópico e a projeção de tendências de forma a subsidiar o planejamento
estratégico;

III - analisar o impacto das ações desenvolvidas, das metodologias empregadas e das tecnologias
incorporadas;

IV - promover a capacitação dos recursos humanos;

V - promover o desenvolvimento da pesquisa em área de incidência de zoonose;

VI - integrar-se de forma dinâmica e interativa com o sistema de informações do SUS;

VII - definir e implementar laboratórios de referência em controle de zoonoses;

VIII - incentivar e orientar a criação, a construção e o aparelhamento dos Centros e Núcleos de


Controle de Zoonoses nos municípios;

IX - incentivar e orientar a organização dos serviços de zoonoses, garantindo fácil acesso da população aos
serviços e às informações.

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Art. 37 - Os atos danosos cometidos por animal são da inteira responsabilidade de seu proprietário.

Parágrafo único - Quando o ato danoso for cometido por animal sob a guarda de preposto, estender-se-á a
este a responsabilidade de que trata o "caput" deste artigo. (Vide Lei nº 16.301, de 7/8/2006.).

Art. 38 - Fica o proprietário de animal doméstico obrigado a:

I - mantê-lo permanentemente imunizado contra as doenças definidas pelas autoridades sanitárias;

II - mantê-lo permanentemente em perfeitas condições sanitárias e de saúde, compatíveis com a preservação


da saúde coletiva e a prevenção de doenças transmissíveis, bem como tomar as providências pertinentes à
remoção de dejetos por ele produzidos;

III - mantê-lo distante de local onde coloque em risco o controle da sanidade dos alimentos e outros
produtos de interesse da saúde ou comprometa a higiene e a limpeza do lugar;

IV - permitir, sempre que necessário, a inspeção pela autoridade sanitária, no exercício de suas funções, das
dependências de alojamento, das condições de saúde e das condições sanitárias do animal sob sua guarda;

V - acatar as medidas de saúde decorrentes das determinações da autoridade sanitária que visem à
preservação e à manutenção da saúde e à prevenção de doenças transmissíveis e de sua disseminação.

§ 1º - A inspeção a que se refere o inciso IV deste artigo compreende a execução de provas sorológicas e a
apreensão e o sacrifício do animal considerado perigoso à saúde.

§ 2º - Cabe ao proprietário, no caso de morte do animal, a disposição adequada do cadáver ou seu


encaminhamento ao serviço sanitário competente.(Vide Lei nº 16.301, de 7/8/2006.)

Art. 39 - O proprietário que já não tiver interesse em manter seu animal solicitará ao órgão responsável
orientação sobre sua destinação, não podendo abandoná-lo .

Parágrafo único - Compete ao poder público definir os locais adequados para a destinação do
animal a que se refere o "caput" deste artigo. (Vide Lei nº 16.301, de 7/8/2006.)

Art. 40 - A criação e o controle da população animal serão regulamentados por legislação municipal,
no âmbito de sua competência, na defesa do interesse local, respeitadas as disposições federais e
estaduais pertinentes.

Parágrafo único. A comercialização de animais domésticos e sua criação para fins de reprodução dependem
de licença do poder público municipal (Parágrafo acrescentado pelo art. 10 da Lei nº 21.970, de 15/1/2016.)
(Vide Lei nº 16.301, de 7/8/2006.)

Art. 41 - A criação em cativeiro e o controle da população de animais silvestres obedecerão à legislação


específica.

O Código Sanitário traça os parâmetros reguladores dos programas de controle de zoonoses e


deixa clara a competência municipal para estruturação de local adequado à instalação do centro.

Portanto, inafastável o dever da administração municipal instalar local apropriado para


acolhimento, tratamento e destinação de animais doentes e/ou abandonados, sustentando programas de controle
de zoonoses, visando cumprir o mandamento constitucional inserto no art. 200, inciso II, da CR/88.

A matéria em debate também mote na proteção do meio ambiente, salvaguardando a fauna e


flora, extirpando práticas que “submetam os animais a crueldade” (CR/88, art. 225, VII).

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Cabe lembrar da Declaração Universal dos Direitos dos Animais, da Unesco, celebrada na Bélgica
em 1978, dispõe em seu art. 3º, que: "Artigo 3º 1. Nenhum animal será submetido nem a maus tratos nem a atos cruéis. 2.Se
for necessário matar um animal, ele deve de ser morto instantaneamente, sem dor e de modo a não provocar-lhe angústia."

Calha trazer à colação aresto proferido em caso análogo:

APELAÇÃO - CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA -


DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE - POSSIBILIDADE - NORMA
PRÉ-CONSTITUCIONAL - REVOGAÇÃO - RESERVA DE PLENÁRIO - INAPLICABILIDADE -
POLÍTICA PÚBLICA - CONTROLE DO NÚMERO DE CÃES E GATOS VADIOS - CENTRO
DE ZOONOSES - EXTERMÍNIO INDISCRIMINADO - ATUAÇÃO PODER JUDICIÁRIO -
POSSIBILIDADE.
1 - Consoante posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, é "(...) possível a declaração incidental de
inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, em sede de ação civil pública, quando a controvérsia figurar
como causa de pedir ou questão prejudicial indispensável à resolução do litígio principal." (AgRg no REsp
1367971/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 12/05/2015, DJe 19/05/2015).
2 - Nos termos da jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, norma pré-constitucional não se
submete a juízo declaratório de inconstitucionalidade, mas sim de juízo negativo de recepção.
3 - Não é defeso ao Poder Judiciário determinar a implementação de políticas públicas com previsão
constitucional/legal ante a omissão das instâncias governamentais, violadora dos direitos assegurados pelo
ordenamento jurídico. Em tais casos, não há que se falar em intervenção do Poder Judiciário no mérito
administrativo, pois restrita a sua atuação na concreção de direitos garantidos constitucional ou legalmente,
porém aviltados pelo Poder Público por meio da inércia administrativa.
4 - O controle do número de cães e gatos abandonados e de zoonoses no Município é medida
diretamente ligada à saúde pública, cuja prestação eficiente é dever constitucional do Poder
Público.

5 - Os §§1º e 2º do art. 120 da Lei nº. 681/78, do Município de Bambuí, ao prever o sacrifício
indiscriminado de cães vadios, não foram recepcionados pela ordem constitucional de 1988,
porquanto em conflito com o disposto no art. 225, §1º, VII, da CR/88.
6 - Conforme já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça (REsp 1115916/MG, DJe 18/09/2009), apenas
em situações extremas, nas quais a medida se torne imprescindível para o resguardo da saúde humana, é que
o extermínio de animais deve ser permitido. (TJMG - Apelação Cível 1.0051.14.001570-5/001, Relator(a):
Des.(a) Jair Varão , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/02/2016, publicação da súmula em
04/03/2016)

Continuando.

O Ministério da Saúde, através da Fundação Nacional de Saúde – FUNASA, apresenta diretrizes


para “projetos físicos de unidades de controle de zoonoses e fatores biológicos de risco” levando em consideração o porte do
Município (ff. 136/160).

Destarte, a criação de centro controle de zoonoses/canil deve seguir as normas técnica


pertinentes, sopesando o porte do Município, da forma mais proveitosa e menos onerosa para os cofres públicos.

Para tanto, o Município deverá incluir dotação no primeiro projeto de Lei orçamentária após o
trânsito e início do cumprimento da sentença, abrindo-se o competente processo licitatório e concurso público,
caso necessário.

III – DISPOSITIVO

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para condenar o Município de Além
Paraíba:

a) construir estrutura física capaz de abrigar o Centro de Controle de Zoonoses/CCZ ou canil, de


acordo com as diretrizes técnicas da Funasa;

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b) dotar o CCZ/canil de pessoal e estrutura material, inclusive um veículo, necessários ao regular


funcionamento. Os servidores serão previamente capacitados em manejo etológico (racional e sem violência).

Para cumprimento dos itens “a” a “b”, deverá o município incluir dotação no primeiro projeto de
Lei orçamentária após intimação para cumprimento da sentença transitada em julgado.

Os competentes processos licitatórios serão iniciados em até 45 (quarenta e cinco) dias da sanção
da lei; os processos licitatórios deverão ser concluídos em no máximo 90 (noventa) dias, com homologação e
adjudicação dos contratos. O início da execução das obras deverá ocorrer em até 30 (trinta) dias, contados da
adjudicação do contrato. As obras deverão estar concluídas nos 180 (cento e oitenta) dias seguintes. Qualquer
atraso no cronograma aqui estabelecido determinará multa diária de R$1.000,00, limitada a R$50.000,00,
revertida em favor do Conselho Municipal da Criança e do Adolescente – CMDCA, sem prejuízo de eventual
majoração caso se revele insuficiente.

A contratação de pessoal deverá seguir os parâmetros constitucionais e legais.

A aquisição de materiais/veículo e contratação de pessoal deverá estar concluída no prazo de 60


(sessenta) dias a contar da término da obra do CCZ/canil, sob as mesmas penas acima.

Em até 30 (trinta) dias após a conclusão da construção do centro de controle de zoonoses ou


canil e contratação de pessoal, o Município deverá: c) recolher cães e gatos considerados nocivos à saúde e às
segurança dos serem humanos e de outros animais; bem como os que estejam em fase de doença terminal ou
que apresentem quadro irreversível de saúde, salvo a captura para fins de vacinação, tratamento veterinário e/ou
castração; d) realizar a eutanásia de animais somente quando certificado por escrito por médico veterinário
atestando a necessidade; e) não abater animais sadios (não portadores de zoonoses); f) não realizar sacrifício de
animais por meio de métodos não recomendados, aceitos sob restrição, coletivos (câmaras de gás), ou qualquer
outro meio cruel; g) manter os animais recolhidos em alojamentos separados por porte e por condição de saúde,
assegurando-lhes a exposição diária ao sol, alimentação própria e água potável; h) assegurar a higienização
permanente das instalações, celas e veículos do CCZ/canil, mantendo o ambiente livre de infecções; i) não ceder
animais abrigados para realização de vivissecção ou de qualquer forma de experimento cruel; j) dar destinação
ambiental adequada a carcaças e resíduos de saúde animal; l) inserir animais em programa de doação após
obervação por tempo clínico razoável, feita a castração, vermifugação, vacinação e registro.

O não cumprimento das obrigações relacionadas nos itens “c” a “l”, determinará a incidência de
multa de R$1.000,00, limitada a R$50.000,00, por cada ato de descumprimento, revertida em favor do Conselho
Municipal da Criança e do Adolescente – CMDCA, sem prejuízo de eventual majoração caso se revele
insuficiente.

Sem custas ou honorários, já que litigam o Ministério Público e o Município.

P. R. I.

Além Paraíba, 28 de junho de 2016.

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Emerson Marques Cubeiro dos Santos

Juiz de Direito

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