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Poder Judiciário

Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro


Segunda Câmara Cível
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0063483 – 53.2010.8.19.0000
AGRAVANTE: LUIZ HENRIQUES NAZARETH
AGRAVADO: ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RELATOR: DESEMBARGADOR ALEXANDRE FREITAS CÂMARA

Direito civil. Renúncia a herança em favor de irmão.


Renúncia translativa, que se distingue da verdadeira
renúncia e tem natureza de cessão de direitos. Incidência
do imposto de transmissão. Recurso a que se nega
provimento liminarmente.

DECISÃO

Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, em processo de

inventário e partilha, determinou o recolhimento de ITD (imposto de transmissão de

direitos) em razão de renúncia a direitos hereditários que a decisão agravada

considerou ser verdadeira cessão de direitos.

Contra tal decisão insurge-se o agravante, inventariante e, em razão da

renúncia, agora único sucessor, sob o fundamento de que não incide imposto de

transmissão sobre o ato de renúncia, o qual não perde essa natureza pelo fato de ter

sido manifestada por herdeiros que já estavam habilitadas nos autos mas, nem por

isso, praticaram qualquer ato de expressa aceitação da herança.


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É o breve relatório do essencial. Passa-se à decisão.

A leitura do termo de renúncia, de que há cópia nos autos do agravo de

instrumento, mostra claramente que as herdeiras que o subscreveram abriram mão de

seus quinhões hereditários em favor do ora agravante.

Trata-se, pois, de evidente renúncia translativa, que não é verdadeira

renúncia à herança, mas cessão de direitos hereditários, não se confundindo com a

renúncia abdicativa, esta sim verdadeira renúncia, no estrito sentido do termo.

Há precedentes deste Egrégio Tribunal acolhendo a tese aqui

sustentada. Confira-se, por exemplo, o seguinte:

0044632-68.2007.8.19.0000 (2007.002.19014) - AGRAVO DE


INSTRUMENTO - 1ª Ementa

DES. ODETE KNAACK DE SOUZA - Julgamento: 28/11/2007 -


VIGESIMA CAMARA CIVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. IMPOSTO DE


TRANSMISSÃO INTER VIVOS. ITBI. RENÚNCIA TRANSLATIVA.
INCIDÊNCIA. HERDEIRO QUE RENUNCIA EM FAVOR DE SUA
MÃE. RECURSO DESPROVIDO.
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É preciso, aqui, fazer uma observação relevante. Existem várias

decisões, inclusive desta Colenda Segunda Câmara Cível, exigindo prévia aceitação –

ainda que tácita – da herança, para que depois se possa caracterizar a renúncia

translativa. Ocorre que em todos esses precedentes a renúncia foi feita em favor do

monte (e, portanto, de todos os herdeiros). Impõe-se, porém, distinguir tais

precedentes do que aqui está a se examinar, inclusive em razão de ter o agravante

afirmado que as coerdeiras renunciantes não terem praticado qualquer ato capaz de

permitir asseverar que, mesmo que tacitamente, tenham aceitado a herança.

Ocorre que, no caso em exame, a “renúncia” é feita, expressamente, em

favor de outrem (no caso, o agravante). Ora, isto não é – em hipótese alguma – uma

verdadeira renúncia, mas sim uma cessão de direitos, tradicionalmente conhecida

pela denominação “renúncia translativa”.

Não é por outra razão que o eminente professor CRISTIANO CHAVES DE

FARIAS, ao tratar do tema, assim se pronuncia:1

“Consequência lógica da renúncia é a inexistência de transmissão


e, por conseguinte, a não incidência tributária. Aliás, em razão disso,
exige-se que o ato de renúncia seja puro e simples, não podendo
produzir os mesmos efeitos da renúncia o ato pelo qual se abre mão

1
Cristiano Chaves de Farias, “Incidentes à transmissão da herança”, in Giselda Maria Fernandes
Novaes Hironaka e Rodrigo da Cunha Pereira (coord.), Direito das sucessões. Belo Horizonte: Del Rey,
2ª ed., 2007, p. 54.
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da herança em favor de alguém (indevidamente rotulado como
renúncia translativa, translatícia ou ‘in favorem’), pois em tal hipótese o
que ocorre é uma aceitação e posterior cessão gratuita de direitos”.

Substancialmente idêntica é a lição da eminente jurista MARIA BERENICE

DIAS:2

“Renúncia e cessão são modalidades distintas de transmissão dos


direitos sucessórios. Não se confundem, apesar de o legislador usar
indevidamente uma expressão por outra. Ao tratar da aceitação,
chama a recusa do quinhão aos demais co-herdeiros de cessão
gratuita, pura e simples (CC 1.805 § 2º). A falta de uma linguagem
uniforme acaba gerando muita confusão. Como afirma Cristiano
Chaves de Farias, independentemente do nome que se lhe empreste,
a renúncia é sempre um ato abdicativo, repúdio gratuito, puro e
simples da herança. Havendo manifestação em favor de terceiro,
caracteriza-se cessão de direitos hereditários, mesmo quando
chamada, indevidamente, de renúncia.
“Em face do equívoco do legislador, diversas expressões são
utilizadas para identificar estas duas possibilidades de transmissão da
herança. A doutrina fala em renúncia abdicativa e em renúncia
translativa; renúncia própria e imprópria. Renúncia abdicativa é não
aceitação da herança. Esta é renúncia mesmo, renúncia própria. Já a
chamada renúncia translativa, renúncia não é, daí, renúncia
imprópria. A transferência do quinhão hereditário a pessoa certa não é
renúncia, é cessão”.

2
Maria Berenice Dias, Manual das sucessões. São Paulo: RT, 2008, p. 188 (os grifos estão no original).
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Vê-se, pois, que o ato praticado, por termo nos autos, por duas das

herdeiras, “renunciando” aos seus quinhões hereditários em favor do agravante, não

pode ser caracterizado como verdadeira e própria renúncia, mas é, isto sim, uma

cessão de direitos hereditários que, por ser gratuita, leva à incidência do imposto

estadual devido em razão da transmissão do direito.

Diante do exposto, e na forma do art. 557 do CPC, nega-se provimento

ao recurso, negando-se-lhe seguimento.

Rio de Janeiro, 2 de dezembro de 2010.

Des. Alexandre Freitas Câmara


Relator

Certificado por DES. ALEXANDRE CAMARA


A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br.
Data: 02/12/2010 15:15:54Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 0063483-53.2010.8.19.0000 - Tot. Pag.: 5

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