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V I E L H A U E R , P h i l i p p . Historia de Ia literatura rristiaiia primiliva.

I n t r o d u c c i ó n a\ N u e v o T e s t a m e n t o , los a p ó c r i f o s y los p a d r e s
a p o s t ó l i c o s . r r a d u ç à o ( d o a l e m ã o ) M . O l a s a g a s f i , A . P i n e r o , S.
V i d a ! , Salamanca, S í g u e m e , 1991. 865 p p . 13 x 20,5cm. ( b i b l i o t e c a
d e e s t ú d i o s bíblicos).

A iibr.i monumenlal do teólogo mente os compêndios de fé, cânticos


luterano l'h. Vieihauer, publicada ori- e parêncses. Considera sobretudo sua
ginalmente um alemão, um 1975, veio forma literária, som se a v e n t u r a r
mais perto du nós, graças ã tradução demais na sempre discutível questão
da Síjíueme, bem-apresentada e bas- do suposto conlexlo vital (Sit/,-im-
tante adetjuada, abstração feita de Leben). Neste sentido, relativi/a —
alguns errmhüs de revisão (p. 113: por justa causa — o suposto caráter
Kümelj 334: V e r r l e etc.) palcNtinense arcaico das fórmulas du
íé referentes ã morte de Cristo (35),
No capítLilii introdutório, o A.
As fórmulas confessionais
debate o conceito de uma história da
(homologias) em IJo e H b nào são
literatura crista primitiva. Surã que
aclamaçõc"s, mas demonstram u m
existe possibilidade de delimitá-la no
contexto de "perseverar na confis-
tempo, de delimitar seus gêneros l i -
terários etc. Não discorda da última são", de aprofundamento e interpre-
grande síntese anterior, a de Dibelius tação sempre renovada (40), Eviden-
{192f)), quanto ã constatação de gran- temente tal abordagem não se pode
des tíêneros (evangelhos etc). Tenta, r e s t r i n g i r aos escritos canônicos;
contudo, melhorar ta! tratamento da exemplo de útil ampliação d i i campo
dita literatura mantendo unidas obras de observação enconlra-se no breve
que correspiindem a diversos gêne- tratamento da "doutrina dos dois
ros: Lc-At, as cartas paulinas autênti- caminhos", referido em Mt 7,1.1, ela-
cas e as controvertidas, o evangelho borado na Didaqué e na Epístola de
e as cartas joaninas (21), Neste senti- Barnabó (67-69).
do confessa-se mais adepto de uma
"história das tradições literárias" do A primeira parte, dedicada ao
cri.stianismo primitivo (corLsiderando- corfiís pauliinim começa, coerente-
Ihe os gêneros) do que de uma "his-
mente, com a descrição do gênero
tória das formas" exage-radamentu
"carta", tanto a real quanto a artifici-
formai (22). ü capítulo introdutório
al e os gêneros intermediários, fazen-
continua depois tratando das lormas
do jus ã enorme diversidade que sem-
prií-literárias que não chegaram a
transformar-se em estrutura básica de pre existiu neste gênero e observan-
escritos ulteriores (como foi o caso do perspi ca/.mente que o que fa? uma
das narrativas uvangiilicas), especial- carta tornar-se literatura nao é tanto
sua forma quanto seu conteúdo.

CioD
Depois de expor brovi-merle os ve, mas apenas c o m b a t o o
d.idos biográficos, apresenta as car- partidarismo como tal 1 ISl). Pena que
tas consideradas autênticas. Primei- o A . dedica páginas ã interpretação
ro as cartas aos ressalonicenses, que do "eu sou de Cristo" (ICor 1,12) sem
apresentam o intrincado problema de mencionar que se po.ssa tratar de u m
mostrar íntimo parentesco literário, paradoxo ou i r o n i a . Mas c o n c l u i
porém intenções quase contrárias certeiramente que "não existiu u m
(problemas de parusia iminente x partido de C r i s t o " (154). Quanto à
entusiasmo escatolõgico). Vielhauer u n i d a d e das cartas aos Coríntios,
se inclina para a hipt^tese de que 2Ts admite o caráter compósito de am-
seja põs-paulina: "Devemos conside- bas as cartas; em ICor, atribui 11.2-
rar 2Ts sem dúvida como a mais 34 à perdida carta A, em 2Cor, à carta
antiga carta fictícia de Paulo que f i - C (lágrimas): 2,14 - 7.4 (- f i . l 4 - 7,1);
cou conservada — embtira, confor- à carta D (reconciliaçàit): 1,1 - 2,13;
me 2,2 e 3,17, nào a>mo a primeira. 7,5-15; 9(?); à carta E (recomendação
Caraterizá-la como 'falsificação' seria par T i t o e companheir<)s): cap. 8
a-hisliírici) e falso, em vista dos cos- (158.170). Em El, distingue a carta A
tumes literários da Antigüidade. Esta (ação de graças): 4,10-211; B (carta
composição mostra de maneira exem- maior); 1,1 - 3,1; 4,4-9,21-23; C (polê-
plar os elementos estruturais dos mica): 3,2 - 4,3; favorece a hipiílese
escritos deuteropaulinos e, com isso, de que Éfeso se)a o lugar onde as
de u m setor essencial da história da cartas v i r a m a luz (e Paulo estivesse
literatura cristã p r i m i t i v a : a carta preso, portanto).
paulina fictícia como meio literário
de disputa intraeclesial eos métodos Quanto a Rm. Vielhauer não se
desta disputa, a saber, o recurso a pronuncia sobre o peso numérico de
Paulo c o m o 'a' a u t o r i d a d e , a genlio-cristão e judeu-cristãos na co-
reelaboracão atualizada e modifica- m u n i d a d e de Roma, mas observa
da de idéias paulinas e a assunção com razão que Paulo d i f i c i l m e n t e
crítica de outras tradições. Em com- podia explicitar seu pertsamento pres-
p a r a ç ã o com os ( u i l r o s escritos cindindo da tradição de Israel e do
deuteropaulinos, 2Ts revela tudo isso arsenal escrituríslico da p r i m e i r a
com bastante reserva e sem grandes apiílogética cristã, fampouco pensa
preten.sões; representa, portanto, uma que os "fracos"de Rm 14 sejam |u-
fase inicial deste pr(xres.so" (119). deu-cristâos, A carta como tal tem
traços de tratado, mas é carta. pri>va-
É agradável sentir o espirito agu- velmente enviada em duas versões,
çado, crítico e por vezes irônico do uma romana (terminando no cap. 15)
A. a respeito de teses extravagantes. e uma efesina (com o cap. Ih).
Assim, em relação a Gaiatas (tratada
antes de l/2Cor!], rebatendo a tese Cl é d i r i g i d o contra desvios de
de Schmilhals de que Paulo se teria tipo mistérico-gnóstico no meio dos
enganado acerca de seus adversários cristãos, E u m pseudepígrafo
na G a l á c i a ( q u e s e r i a m de f a t o polemizante, d i r i g i d o a diversas igre-
gnósticos, e não nomistas); "Paulo |as paulinas n u m a s i t u a ç ã o pós-
está ma l-inf o r n a d o , mas Schmilhals paulina, Ef, cuja destinaçãii já apare-
o está excelentemente, mediante a ce questionável à crítica textual, c
caria aos gaiatas do mal-informado uma reelaboracão de C l , mas com
Apóstolo" (138)... Sobriamente desis- notáveis diferenças estilísticas e teo-
te de reconstituir os " p a r t i d o s " de lógicas, Ainda que a oposição entre
Corinto, porque Paulo não os descre- I C o r 7 (o matrimônio como u m mal
ni-ccssário) c Ef 5 (p, 227) n.io seja o como seu Melqiiisi-dec de 7.3: sem
melhor dos argumentos, a atribuição pai, sem mãe, sem genealogia (265).
de Ef à pseudunímia pós-paulina
parece aceitável. Seria um ensaio em Apresentando, na segunda parle, o
tom homilético em forma de "carta gênero dos evangelhos (e A t ) , V. co-
católica" (228), respondendo ã situa- meça com a afirmação — a nosso ver,
ção de u m pagano-crislianismo que conic-stável — de que "os primeiros
desconhece o significado leológico- cristãos concediam importância
salvífico de seu enraizamento em Is- .salvadora ã morte e ressurreição de
rael. Jesus, nào a suas palavras e gestos e
outros acontecimentos de sua histó-
As cartas pastorais são tratadas ria" (279). Toma como exemplo Pau-
S(í/j í(«i) e com cimsiderável reticên- lo (ICor 13,3-5). Só em Mc l , i . "evan-
cia quanto aos aspectos históricos. gelho" inclui toda a narrativa de Je-
S o b r e t u d o não se deve p r o c u r a r sus, aliás sem ser seguido nisto por
enquadrá-ltis numa situação imagina- M t e I,c, V, observa que o N T e os
da depois de At 28. 1'or vocabulário Padres Apostólicos não dão muito
e estilo, gênero e temática, estas car- peso ao termo evangelho (falta em
tas se mostram homogêneas entre si l,c e Jo), Que gênero é este então?
e distintas das reciinhccidamente
p a u l i n a s . Os a d v e r s á r i o s são os Tratando dos sinóticos. V, defen-
gnósticos ( I T m 6,20! não 3,20, como de a prioridade de Mc e exclui o
está na p, 252). Por causa das original aramaico de M t , pela sim-
nnlillicseiü em I T m 6,20. V, admite a ples razão de que o nosso atual M t
ptissibilidade de uma redação depois não é nenhuma tradução (279), De-
de Marcial) (243-244), Quanto ao ctm- pois de uma breve evocação históri-
teúdo, os ministérios e sobretudo a ca da questão sinótica, expõe de
"sã doutrina", que vem substituir a modo clássico a "teoria das duas fon-
paulma loucura da Cru/., nos reme- tes", Mc (como o conhecemos) e Q
tem a uma fase bem avançada da (em uma única versão escrita)(296),
tradição p ó s - p a u l i n a , O g ê n e r o No f i m , V. afasta a ilusão de que
pseudepigrálico pós-paulino 6 aqui através da reconstituição de supos-
aplicado com muita consciência e arte tas fontes literárias chegássemos mais
literária, para garantir a audiência no perto do Jesus histórico; isso, lem-
combate contra a gnose alastrando- brando Wrede e Wellhausen, que
se entre i>s cristãos. mostraram que os evangelhos trazem
a marca da fé da comunidade e são
A inclusão de H b neste capítulo constituídos por fragmentos da tra-
se deve ao peso que V, confere ã dição unidos pelo redator,
compilação dos escritos do N T , H b é
u m discurso sobre Cristo-sacerdote, O passo lógico é então expor a
com fictício final de carta, antes de- investigação desta atividade das co-
vido a um talento tetilógico desigual munidades, o método da história das
d u que a uma tradição difícil de ima- f<irmas, a "paleontologia dos evan-
ginar, sem atual discussão com o ju- gelhos" (cf, üverbL-ck, K,L„ Schmidt)
daísmo do templo, mas enraizado (305), e seu complemento natural, a
n u m a e r u d i ç ã o c u l t u a i de t i p o história da redação. Apresenta os
alexandrino (cf, Fílon), que juide até resultados da Formg^-schichle sobre-
ser uma arma contra o rilualismo tudo a partir da coincidência das
gnóslico. Todavia é difícil situá-lo. análises mutuamente independentes
Citando Overbeck, V, repete: H b é de Bultmann e Dibelius. Como a obra
nâi) ó bum rwrenle, não menciona as da pregação oral, uma história da Pai-
novas aquisições ncsle campo, sobre- xão com introdução detalhada, por-
tudo de K. 13erger. Mais penetrante ê tanto, não essencialmente diferente
o capítulo dedicado a Q. Depois de do "querigma" (372).
uma sugc"stiva descrição da teologia
do documento, critica a tese de Tüdt, O tratamento de M t , ú
que vê em Q o documento-base de esquemático, resumindo os clás.sicos
uma comunidade que opHíe a trans- da Redaklioasgeschichte no âmbito
missão da mensagem de Jesus ao alemão e simpatizando com o Silz-
querigma da morti--ressurreição. A o im-Lchc» cultuai proposto por
contrário, Q é solidário com o resto Kilpatrick,
da imagem evangélica de Jesus, em-
bora revele um contexto vital próprio; Também o evangelho de Lc é tra-
significativo, neste particular, ê a tado em poucas páginas, dando-se
ausência de "transgressões do sába- um pouquinho mais de atenção a A t ,
d o " ; Q seria de origem palestinense. a segundo parte da "obra dupla", Lc
compilado inicialmente em aramaico molda as tradições evangélicas na
a partir dos anos 30. redigido em forma da biografia com coordenadas
grego bem mais tarde (atraso da de história m u n d i a l , V. se aproxima
parusia) e recebido com grande pres- criticamente da interpretação de
tígio, a ponto de ter sido integrado Conzelmann, de Jesus como centro
independentemente por M t e Lc nos do tempo. Este centro é delimitado
.seus respectivos evangelhos. de u m lado pela atividade de João,
pertencendo ainda Mt A T , e do outro
Seguem as introduções aos três pela Paixão e morte, que já perten-
evangelhos sinóticos, Na exposição cem ao tempo da Igreja. Assim o atra-
da teologia de Mc destacam-se as so da parusia não cria um va/io, mas
considerações sobre a geografia teo- u m t e m p o salvífieo próprio. De
lógica C a l i l é i a - J e r u . s a l é m , a o- escatológica, a posição de Jesus vira
nipresença da Paixão em M c e a "centro",,, (392). Deptiis deste centro
questão do segredo messiânico. Este vem a história da comunidade dos
não se deve e x p l i c a r p o r h i s t o - que são .salvos: os Atos dos Apósto-
ri/ações, mas, ao e x e m p l o d e los, Neste seu segundo livro, o autor
Conzelmann, pela consciência da fé pode dar livre expres,são a seu talen-
da Igreja de que o messianismo de to de historiador religiosii, A salva-
Jesus antes da R-ssurreição não era ção é levada a partir de Jerusalém
comprivnsível, já que ainda não ha- até os confins d o mundo (1,8), medi-
via a fé pós-pascal (361-362). O que ante principalmente o apiístolo Pau-
significa que o verdadeiro conheci- lo, Ora, observa V,, com Kãsemann,
mento só é possível no .seguimenio "deste modo a pregação lucana não
q u e a s s u m e a cru7 (362; cf. E. se limita exclusivamente ao evange-
Schwei/er). Produto do âmbito j u - lho de Jesus" (422), Jesus está no iní-
deu-helenista-cristão, V. o situaria cio da última fase da história da sal-
preferencialmente na Síria grega, vação, mas também fica incardinado
pouco depois da queda de Jerusalém nela. Este Chrisius prolofi<iiitté!^ lembra
(em 70 d . C ) . Quanto ao final (I6,«), a carta aos Efésios. V, reconhece na
V, ainsidera o texto inacabado e acre- obra lucana uma dupla finalidade.
dita n u m a supressão i n t e n c i o n a l . Para fora da Igreja, procura mostrar
Quanto ao gênero. V. subscreve as aos simpatizantes a confiabilidade do
opiniões de Bultmann e K,L. Schmidt cristianismo, mostrando-se até mui-
de que Mc é uma genuína evolução to diplomático para com os romanos.
Na liimensãi) intrat'dL'síal, "a dupla evangelista. De m o d o mais radical
obra lucana iraz à Igreja, no forma que os sinóticos, )o reinterpreta a tra-
de uma hisíória de seu passado, o dição sobre Jesus, a ponto de anunci-
m i l o de sua auloridade" (423). Mas a ar na boca de Jesus tal interpretação
Igreja inicialmente canonizou só o ulterior no Espírito (Jo 13,7; 14,25
evangelho e nunca mais colocou os etc), E o evangelho da "re-cordaçào",
dois livros em pé de igualdade... n luz da glorificaçâo, e também do
(ibid.). verdadeiro conhecer e do testemu-
nho, "Percebem-se nele duas tendên-
Concluindo a terceira parte, V. cias; uma, que, com m u i t o maior
confirma a coerência entre o ênfase que nos Sinóticos, tende a
querigma da morte e ressurreição ea unificar o tempo de Jesus e o do pró-
fiirma do "evangelho" criada por Mc prio evangelista e outra, que tende a
e substancialmente mantida por Mt combinar, em forma totalmente dis-
e Lc, tinta dos três primeiros evangelhos,
as crislologias do tliciosaiicr ('homem
De João — assunto da quarta par- divino') e da preexistência" (452).
le — não se pode afirmar esta última
frase. V. acha que não se pode pro- Sintetizando muito bem a discus-
var a dependência de Jo dos sinóticos, são pós-bultmanniana. a visão de V,
Recimhece as conhecidas rupturas não nos parece fazer jus A crescente
narrativas. Quanto a eventuais fon- percepção da cristologia profética e
tes, 1) aceita como indubitdvel uma da presença dos g r a n d e s temas
fonte com relatos de milagres (442), vétero-testamentários em Jo. A ma-
cu|as características seriam reveladas neira Ijastante vaga de situar a ori-
por 2,11; 4.54; 12,37s e 20,30s (cf, J gem da pc-culiaridade joanéia n u m
M , Robinson), e que Haenchen cha- judaísmo heterodoxo devera receber
mou de "uma espécie de evangelho matizes à luz do crescente conheci-
de Marcos v u l g a r i z a d o " (243), 2) mento do judaísmo plural do primei-
Aceita u m relato da Paixão não- ro século.
sinótico, 3) Lamenta que u m uso
s u p e r f i c i a l da crítica estilística Quanto â IJo, V. defende a dis-
"engavetou" as intuições de tinção literária de Hullmann entre o
liuitmann e Becker quanto a uma m o d e l o ainda visível em 1,5-10;
fonte dos discursos de revelação 2,4.5,9-11; 3.4-15 e as elaborações
(445), Se não concordo totalmente homiléticas do autor.
com estas avaliações literárias de V..
subscrevo sem restrição sua afirma- Em suma, V, considera a literatu-
ção de que "a tendência, visível nos ra joanina na perspectiva de u m "cir-
Sinólicos, a acentuar a identidade do culo joanino", no qual se destacam o
Jesus terreno e do glorif içado, encon- "evangelista", o autor da IJo e o
tra seu radical ponto culminante em presbíteros de 2/3Jo. Este círculo,
Jo" (445), Faz um "evangelho seleti- provavelmente localizado na Síria,
v o " para nos dizer que na existência conhece u m desenvolvimento teoló-
humana de Cristo, Deus mesmo vem gico no sentido da eclesialização.
ao nosso encontro; Jo L14 tradu? Considerá-lo como uma seita, como
realmente o escopo de Jo (446), Uma alguns fazem, contradiz o auto-con-
Redaklions)(eschichle aplicada a Jo, ain- ceito deste grupo, Mas sua proximi-
da que com maior dificuldade do que dade ao gnosticismo, que ele comba-
a M t ou Lc, nos permitiria reconhe- te, lhe caustiu graves suspeitas da
cer a grandeza de visão do quarto parle da "ortodoxia", e é a Irineu que
SC deve a luta pelo reconheci monlo O livro esboça bem a discussão
de ]o, enquanto a comunidade foi se no âmbito alemão (e anglo-saxónico)
dissolvendo (498). até nos anos sessenta, geralmente
com muita perspicácia e n u m estilo
A íjiiirita parle do livro trata dos agradável. Mas, como já apontamos
apocalipses (João, Pedro, Hermas, a respeito das matérias maiores aci-
Ascensio Isaíao), a seifo. das cartas ma sintetizadas, entretanto passou
tardias (Clemente, Inácio, Policarpo), muita água pelo Reno... De Ioda
a séliiua, das cartas pseudônimas maneira, não é possível fazer traba-
(Tiago, Pedro, Judas, Barnabé), a oi- lho li terá rio-cri ti CO sobre a Bíblia pre-
tava, dos e v a n g e l h o s a p ó c r i f o s terindo as grandes discussões que
(Agrafa, Tome, papiros Egerton 2 e animaram o âmbito alemão durante
O x i r r i n c o , l'edro, evangelhos dos praticamente dois séculos. Q u e m
nazarenos, ebionitas, hebreus, egíp- negligencia estes debates, corre o ris-
cios, evangelhos da infância, conver- co de querer reinventar a roda, Para
sações do Kessuscitado], a luma, dos que fora da arena germânica si' pos-
atos api^crilos de apóstolos (Pedro, ,sa ter, em "poucas" páginas, uma b«w
Paulo. André, João, Tome), a décima. visão do debate e não st' considere
das ordenações comunitárias e escri- novidade revolucionária algo que j.i
tos l i l i j r g i c o s (Didaqué, Segunda vem sendo discutido desde há muito
Clementis. Evangelho da Verdade, tempo, o livro que agora nos chega
Odes de S^ilomão) e a undeciiiia e f i - em idioma espanhol será muito útil,
nal, da literatura cri.stiana primitiva ao lado da Introdução ao N o v o Ti-s-
(1'apias de Hierápolis. Hegesipo e a tamento de Kümmel. com a qual
formação do cânon). Seguem os ín- entra diversas vezes em discussão.
dices onomástico e de matérias, de
citações e de palavras gregas. ./. Kimings

l £ ) l ' E Z A Z P I T A R T t , E d u a r d o , Vwidamentación dc Ia Ética cristiaiia.


M a d r i d , San Pablo, 1994. 460 p p . . 21 X 13.5 c m . (Biblioteca d e
T e o l o g i a ; R) I S B N « 4 - 2 8 5 - 1 4 0 6 - 2

O autor é conhecido do público antiga cttlaljoração em l'rdxis cristã.


brasileiro, devido á sua colalioração O mesmo acontece com outra obra
nos volumes 1 e I I da obra 1'riixii cris- publicada recentemente: Kfica dc Ia
tã (S. Paulo: Paulinas, 19S3). No pri- scxualidad y dei mairimonio (Madrid:
meiro, que é u m traLido de moral Paulinas, Í992). Além disso, |á está
fundamental, a contribuição concen- na teceira edição o livro Llica y Vida:
tri>u-se na terceira parte: "Fundamen- desafios aclualci ( M a d r i d : Paulinas.
1993).Por estas e outras <ibras e arti-
tação da Ética cristã" e no segundo,
gos pode-se constatar ii fecundidade
que trata da moral da pessoa, redu-
intelectual do autor gestada por anos
ziu-se â segunda parte: "Moral do
de reflexão ética em publicações va-
amor e da sexualidade". Nos últimos
riadas e no ensino da moral.
anos, o autor reformulou w m p l e t a -
mente estas suas colaborações o as
Depois dos capítulos iniciais que
publicou como obras isoladas. O l i - tratam da crise atual da moral e da
vro que está sendo recenseado é uma urgência c sentido de uma moral, o
proposta de moral fundamental que autor explicita a metodologia prévia
reprojxie de uma maneira nova a a qualquer elaboração da moral. E.sta
mi't(idi)k>jíiii precisa aclarar i i p<into que busca a sua concretização. Na
dc partida da reflexão cjue, por sua formulação destas normais deve-se
vez, irá determinar a importação de levar en consideração os dados da
qualquer questão ética. Existem dois ciência, o contexto cultural e os pro-
p<uit<)s de partida: a fé e a razão. cessos históricos. Isto nào significa
Alguns sistemas morais cimfundem cair n u m relalivismo absoluto, É u m
os dois pontos de partida, outros os relativismo relativo porque existem
separam radicalmente. O autor apon- constantes históricas que se repetem,
ta os perigos desta confusão ou se- l'or outro o tempo histórico é lugar
paração. A moral católica sempre de salvação e, portanto, lugar de
procurou u m camintio intermediário manifestação da vontade de Deus,
e complementar entre fé e razão, O
autor coloca-se claramente na pers- A norma, contudo, não consegue
pectiva da ética autônoma e mostra expressar o imperativo da consciên-
a incongruência de uma pura moral cia para esta pessoa concreta. Por
da fé. Recorda que esta autonomia é isso, não basta tamtiém uma pura
teónoma, ética niirmativa, é necessário chegar
a uma ética pessoal. Assim atinge-se
Tendo presente a perspectiva as- a dimensão singular. Neste âmbito,
sumida pelo autor, pode-se dizer que as coisas não são sempre claras e
a obra divide-se em duas grandes existem situações de conflilividade
partes: dimensão autônoma (caps, 4 a ética. Diante destas situações singu-
8) e dimensão religiosa (caps 9 a 15) da lares pode-se ter duas perspectivas:
moral, a detmtológica e a teleológica. A pri-
meira resolve a questão apelando ao
A autonomia é a própria origem
dever, expresso na lei, e afirma que
da autêntica moralidade e uma exi-
existem ações intrínseca mente más
gência da maturidade moral. A obri-
gatoriedade moral não pode estar que nào se justificam em nenhum
fundada na auloridade porque só age castt A segunda, avalia a situação
moralmente quem age por convicções não sõ a a partir da norma mas tam-
pessoais e não porque é mandado, bém tomando em consideração as
Existem muitos fatores psicológicos conseqüências. M u i t o s moralistas
que interferem na autonomia e é pre- proclamam-se, teoricamente, deontó-
ciso estar atento a eles. lista atenção logos mas na hora de resolverem
à psicologia nos diferentes aspectos problemas apelam para a perspecti-
da moral é um dos grandes mereci- va teleológica. Seria mais coerente
mentos desta e de outras obras de assumir este ponto de vista porque a
Az pitar te. moral ê uma ciência prática e, no
concreto, não se pode fugir de levar
Esta autonomia nào é solipsista em consideração as conseqüências.
porque confronta-se com valores éti-
cos aos quais o homem chega atra- A parle que cimtempla a dimen-
vés da luz natural da razão. Üs valo- são autônoma da moral termina com
res corresptmdem a tendências e exi- um capítulo sugestivo sobre a criati-
gências que emergem da própria vidade da consciência. Ela é a in.s-
naturez.a humana. Keste contexto, o lância última da moral porque nela
autor faz uma interessante reirter- chega-se ã norma cimcrela que é o
pretação da lei natural. Mas não imperativo para esta situação pesso-
baslam <is puros valores morais, é al. Neste sentido, ela é também a
preciso chegar a uma ética normativa instância da autonomia.
A dimtínsào religiosa começa com e seguimento de Cristo, Mas esta
u m capítulo sobre o Magistério da imitação não pode significar um
Igreja, parlindii da coastatação doque mimelismo narcisístico, O ideal evan-
todii grupo religioso necessita de uma gélico, proposto por Jesus, é sermos
autoridade para a defesa, salvaguar- perfeitos (Mt) ou, melhor ainda, com-
da e interpretação da própna doutri- passivos (Lc) como o Pai.
na, Este capílulo inicial pode ter o
perigo de ver o magistério indepi'n- A ética que a Bíblia nos propõe, é
dente da Igreja, apesar de c)ue este de índole humanista porque também
temor é posteriormente desfeito pelo
é fruto do esforço racional e as pró-
desenrolar da reflexão. Será i]ue não
prias normas que. nela se encontram,
seria melhor falar da dimensão ecle-
neces.sitam de hermenêutica porque
sial da ética religiosa e no contexto
dependem de um contexto cultural.
da Igreja entender o papel do Magis-
tério em sua relação com o pensar Esta a>nstatação coloca a questão da
dos teólogos e o sentir dos fiéis? especificidade da ética cristã, Existe
Existe u m ctlios eclesial para o qual uma peculiaridade cristã nos conteú-
contribue tanto o ensino do Magisté- dos éticos da moral cristã? Este pro-
rio quanto o pensar dos teólogos e o blema fui largamente discutido, nas
sentir dos fiéis, O Vaticano II procu- últimas décadas, no âmbito da Teo-
rou situar o Magistério no interior e logia moral, Para uns a respi)sta a esta
em relação ao l*ovo de Deus e na pergunta é positiva e para outros é
docilídade à palavra de Deus e ao negativa,Um ponto interessante, res-
Espírito Santo, Ü ['ovo de Deus, do saltado pelo autor, é que o importan-
qual fazem parte também o l'apa e te não é se os cristãos tém ou não u m
os Bispos, é o dado primeiro, porque conjunto de verdades e valores éti-
a condição de bati/ados insere a Io- cos próprios mas ver se esti-s conteú-
dos neste Povo e lhes confere o setisiis dos são comunicáveis. Isto significa
fiáci e a conseqijenie infalibilidade iji perguntar se eles tem |ustificação
crcdetuio de todo o Corpo da Igreja, racional ou capacidade de explicação
anterior à quela iii liocendo do Magis- h u m a n a . Trata-se de ressaltar a
tério,
comunicabilidade da mensagem de
Jesus. Não adianta os cristãos terem
Ao falarda dimensão religiosa da belas verdades éticas se elas não são
ética cristã, o autor inicia, alertando comunicáveis e só serão comunicá-
para o perigo da autosuficiência es- veis se forem apreendidas racional-
piritual e d o perfeccionismo farisaico mente. O que a revelação atesta como
que não se coadunam com o princí- sendo ético, não supõe que a razão
pio cristão da gratuidade da salva- não tenha aces.so a estes conteúdos.
ção, É o perigo do c'steticismo \'irtu- A revelação testifica simplesmente a
oso. Começa-se a ser cristão quando
autenticidade da ética racional.
se abandona o ideal dc ser perfeito,
A força de Deus precisa mostrar-se
na debilidade humana, A fé influen- A lei judaica queria ser um cami-
cia a práxis do cristão porque lhe dá nho para encontrar a vontade de
maior lucidez no conhecimento da Deus, mas u m a visão f i x i s t a e
vontade Deus, A esperança dá cora- p e r f e c c i o n i s t a da lei l e v o u a u
gem e anima nas dificuldades, A legalismo farisaico que encobriu e
caridade faz ver no próximo um sa- desfigurou este caminho. Para alcan-
cramento de Deus, çar a vontade Deus ajuda mais o dis-
cernimento espiritual do que a lei.
A dimensão cristológica da mo- Este discernimento é uma capacida-
ral aparece na categoria de imitação de, criada em nós pela ni>s.sa condi-
ção de batizados. Islo significa viver limites e possibilidades. Neste con-
a condição de liberdade dos Filhos texto, introduz o tema da opção fun-
de Deus. A lei era necessária enquan- damental, I'odc parecer estranho a
to não se vivia i.'sta condição, Portan- inclusão desta temática neste lugar
to, a lei tornou-se obsoleta por dois mais dedicado à dimensão religiosa.
motivos: em primeiro lugar, devido Pareceria que o seu lugar mais apro-
à no.ssa vocação à liberdade e, em priado teria sido a parte sobre a d i -
segundo lugar, porque a moral não mensão autônoma da ética. Assim,
pode revelar-nos as exigências con- ressaltar-se-ia a importância da op-
cretas do cristão em cada situação. ção fundamental para a experiência
Necessita-se de uma capacidade que da autonomia, Mas esta localização
é fruto do Espírito e que rompe os
pode ter sua justificativa se o autor
h o r i z o n t e s minúsculos da m o r a l
quis mostrar que a liberdade cristã é
legalista. Trata-se de buscar o que
uma liberdade humana que tem seus
agrada ao Senhor ou o que mais con-
limites e suas possibilidades e, por
vém em cada situação singular. Isto
só é possível com discernimento. As outro lado. introduzir os seguintes
condições básicas pura este discerni- capítulos que abordam a questão do
mento são o abandono dos esquemas pecado. Este é abordado na sua d i -
humanos e a identificação com o mensão pessoal e coletiva,
modo de agir de Deus, manifestado
em Jesus. Físte destaque dado à con- No seu conjunto, esta obra apre-
dição de liberdade dos Eilhos de senta-se como um tratado original de
Deus e ã conseqüente capacidade de moral fundamenta! que procura re-
discernimento, como base da ética colher o que há de melhor na refle-
cristã e meio indispensável para en- xão atual de ética cristã, A maneira
contrar a vontade Deus, é um dos de abordar as diferentes questões
pontos altos da reflexão do autor sempre é sintética e sugestiva, É uma
sobre a dimensão religiosa da ética. obra que merece ser traduzida pela
sua profundidade e abertura e pelo
renome que o autor já goza no Brasil,
Depois de ter falado da liberdade
cristã, o autor dedica um capítulo à
liberdade humana, suas exigências. Roque Junges

P K I V I T E R A , Salvatore: // volto moraie deli 'uomo. A v v i o a l i o s t u d i o


d e l l e l i c a filosófica e teológica — P a l e r m o : O f t e s , 1991, 428 p p , 24
X 17 c m , ( I s t i t u t o S i c i l i a n o d i líioetica — Collecüo Moralis: 1)

O autor é d i r e t o r do Instituto Dal!'espericnza alia morale_(l] proble-


Siciliano de Bioética e, nesta condi- ma esperienza' in Teologia moraie.
ção, coordenou junto com Salvino Palermo: Oftes, 1985), Em 1991 p u -
Leone a recente p u b l i c a ç ã o do blicou esto tratado de moral funda-
Diiionario di Bioelica (Acirea- m e n t a l c o m o f r u t o de anos de
leVBoIogna: ISBVEDB, 1W4), Atual- dcx«nda de ética filosófica e teológica,
mente está mais dedicado a questões
de Bioética, E conhecido também por O autor constrói o seu discurso
outras publicações importantes como desenvolvendo sua reflexão em dois
L 'uomo e Ia norma moraie {I criteri d i níveis: a moral vivida e a moral sis-
individuazione delle norme morali tematizada. O primeiro é o nível do
secondo i teologi moralisti d i lingun ethos, mediatizado pela existência
tedesca, B o l o g n a : EDB, 1475) e humana, o o segundo é o da ética.
f o r m u l a d a polu i n t f l e t o h u m a n u . são interior na qual se sedimenta a
Qualquer discurso élico Icm que tra- moralidade da pessoa identifica-,se
balhar esfL"s dois níveis em uma rela- com a conformidade com a atitude.
ção dialética. C o m p o r t a m e n t o moralmente reto
não significa necessariamente atitu-
Ü autor destaca, ao nível da mo- de moralmente boa. N o comporta-
ral vivida, uma distinção que é fun- mento entram elementos que não
damental para toda e qualquer com- dependem da lx>a vontade porque ele
preensão ética: atitude fundamental é i m p r e g n a d o de e m p i r i c i d a d e e
e comportamento particular, A pri- facticidade histórica,
meira está mais ligada ã vontade, ao
coração, à intencional idade ou ã op-
A norma fundamental que deter-
ção fundamental. Retrata a disposi-
mina a bondade moral da atitude é
ção ou a orientação de fundo do su-
genuína, enquanto que as normas de
jeito moral. Neste sentido determina
comportamento são mistas porque
a bondade moral de uma pessoa.
englobam elementos avaliatórios e
O u t r a coisa é o c o m p o r t a m e n t o
e m p ír ico-des c ri p t i v( )s.
categorial que se refere mais às nor-
mas e está mais ligado à inteligência
O primeiro critério para avaliar
que formula o juí/o moral adequado
um ci>mportamentii é a própria ati-
a esta situação concreta, N o âmbito
tude. Ela é a condição de um com-
do comportamento fala-se de retidão
portamento reto. Deve existir a dis-
moral.
ponibilidade de assumir o ponto de
vista moral (imparcialidade e univer-
A v o n t a d e m o r a l m e n t e boa é salidade) da atitude,
condilio necessária cl siifficiens para
uma atitude de bondade moral mas Nem sempre se está em a>ndições
é condilio necessária sed non sufficiens de realizar o que é moralmente pedi-
para a retidão moral do comporta- do ao nível do comportamento, Sa-
mento. Neste segundo nível ret^uer- Ix-r o que se deve fazer não eqüivale
se faculdade inleleliva para chegar ao ainda à possibilidade material de
juízo o u a norma moral a seguir. realizá-lo, A impossibilidade material
Dependendo dos contextos opera- de realizar uma determinada ação ou
tivos (ações disiributivas, prtxlutivas não estar em condiçíWs de atuá-la
'ou expressivas) é mais importante a significa que não se tem o dever de
a t i t u d e de f u n d o o u o resultado realiz.á-la, Ad impossihdia nemo teiietur
comportamental, dizia o velho Vermersch. N o momen-
to em que a benevolência (atitude)
I'ara a atitude sé existe uma nor- se transforma em beneficência (com-
ma moral fundamental que pode ser portamento), ela deve fazer as con-
formulada de mil maneiras mas se tas com a limitação das possibilida-
des, Este é o segundo critério.
reduz, em última análise, à regra de
ouro: Não faças aos outros o que não
queres que fa(aw a li, ou, em outras O terceiro d i z que, ao avaliar u m
palavras, ao mandamento do amor. comportamento, é necessário ter pre-
As duas características fundamentais sente as suas conseqüências. Em o u -
desta norma são a imparcialidade e tras palavras, é preciso assumir o
a universalidade, Para o comporta- ponto de vista teleológico. O autor
mento existem inúmeras normas se- advoga, como já tinlia feito em o u -
gundo os inúmeros tipos de ação, Ele tras obras, em favor desta perspecti-
é estruturado sobre a base da confor- va e mostra como a perspectiva con-
midade externa com a norma, A ade- trária, a deontológica. é impossível
p o r q u o recorre a toda hora à juízos morais, isto é, a existência,
teleologja para resolver questões prá- possibilidade e valídez das normas,
ticas. A Teologia moral tradicional e a fundamentação dos juí/os morais,
defende tei>ricamente o p<mto dc vis- isto é, a persptvliva dcimtológica o u
ta diMntológico mas na hora buscar teleológica ao aplicar as normas.
soluções não consegue escapar da
teleolugia. O autor igualmente defen- A ética parenética é uma alterna-
de esta perspectiva das acusações de tiva ao discurso normativo. A ética
r e l a t i v i s m o e a f i r m a a insus-
não quer sií formular juízos mas tam-
tentabilidade do relativismo nor-
bém exortar e encorajar. O normativo
m a t i v o . As duas teorias é t i c o -
tratwlha com o inteleto e refere-se ao
normatívas (deimlologia e teleologia)
comportamento. O parenético i n f l u -
pressupõem a existência de normas
e o relativismo ético-normativo, ao encia o âmbito volitivo e diz respeito
contrário, nega a existência, a possi- à atitude. As lógicas são diversas
b i l i d a d e e a v a l i d e / das normas como é diversa a argumentação e a
morais. O relativismo é admissível ao exortação. A primeira fundamenta e
nível da ética descritiva mas não ao formula juízos morais e a segunda
nível da ética normativa, Ma.s, com quer afrontar a debilidade volitiva.
isso, já passamos ao campo da moral A parênese tem d u p l a finalidade;
sistematizada. estimular a vontade boa a aderir mais
decisivamente au l>em e exortar a
vontade não tão boa a converter-se e
A o nfvel da ética formulada, o
mudar de direção.
autor distingue e trabalha quatro
â m b i t o s : ética d e s c r i t i v a , ética
n o r m a t i v a , ética p a r e n é l i c a e As condições para a parênese são
metaética. As duas primeiras distin- as seguintes: ter a u t o r i d a d e
guem-se porque uma descreve o cííiiís parenética, exortar mais pela vida do
que concretamenle existe em deter- que pelas palavras, apresentar mo-
minado contexto e a outra formula o delos, existir convergência inteletiva
noiiios daquilo que deve ser, Uma sobre os juízos morais ou sobre o que
emite juí/os de fato e a outra juízos é moralmente bom e reto entre quem
de valor. As duas referem-se ã moral recebe e dá a parênese, A exortação
especial. A ética parenética e a nunca deve substituir a argumenta-
metaéiic.i refletem sobre os funda- ção, Não se deve dar um reforço
mentos antropológicos e teológicos volitivo para quem espera uma ilu-
do agir moral e. por is.so, dizem res- minação da inteligência. Argumentar
peito à moral fundamental. sobre questões normativas de com-
portamento não é a mesma coisa que
exortar a atitude, E preciso distinguir
N o âmbito da ética descritiva
problemas normativos e exortativos,
pode-se constatar um relativismo de
comportamentos mas esta constata-
ção nãt> permite fazer afirmações para A p a r ê n e s e d e v e chegar á
o campo normativo. Relativismo ao consciênca para que tenha efeito e
nível do elhos não s i g n i f i c a possa intervir sobre o sentimento dos
relativismo ao nível dos valores, O v a l o r e s , A e s t r u t u r a lógica da
problema que emerge neste âmbito parênese é tautológica porque iden-
é, segundo o autor, a questão da to- tifica indicativo e imperativo.
lerância. Até que ponto pode-se tole-
rar certos comportamentos. N o contexto da parênese. o autor
aborda a dimensão trinitária da vida
A ética normativa teiri duas ques- moral (moralidade como obediência
tões pela frente: a individuaçàu de ao Pai, imitação do Filho e d o m d o
Espírito Santo), a dimensão leologal Outra questão metaética impor-
da obediência moral (a obediência tante é o pniblema das fontes primá-
quL' se origina da íé, se nutre da es- rias e secundárias da ética tixilõgica.
perança e se explicita na caridade) e, A Sagrada Escritura, a Tradição e o
por f i m , a dimensão eclesial da mo- Magistério são fontes primárias e a
ral te<ilogal (comunidade como escu- razão e a lei natural, fontes secun-
ta da palavra, como celebração dos dárias ou não .seria melhor dizer que
sinais sacramentais e como busca do não podemos falar de fontes primá-
bem). rias e secundárias porque na moral
estamos ao nível do humamtm. I'ara
Alem da linguagem normativa e a moral, a ra7,ão não pode ser fonte
parenética existe a assim chamada secundária comti poderia ser ao m'-
metaética, í um discurse) que trans- vel da Teologia dogmática. A<) falar
cende a reflexão de tipo normativo e da razão como fonte esta-se falando
constitue o horizonte último da re- de d u a s coisas: a f a c u l d a d e
flexão ética. Trata dos postulados da cogfíoscitiva que serve de meio e o
m o r a l i d a d e , dos pressupostos da lugar do qual emerge a mensagem
moral normativa ou das condições moral, isto é, o objeto.
indispensáveis para impostar bem
uma reflexão ética. N o âmbito da Outras duas questões metaélicas
metaética. filosofia e teologia exigem- são a consciência, como síntese do
se mutuamente. discurso moral, e o f i m último da
vida moral como resposta ã pergun-
A primeira série de problemas ta: iwque viivr niorahncnlc. Quanto à
afrontados pela metaética é a análise primeira é preciso superar, segundo
da linguagem moral. Trata-se de dar o autor, um reducionismo psicológi-
maior rigor ao uso de certas catego- co e ressaltar a dimensão moral da
rias éticas para que nào se caia na c o n s c i ê n c i a nas suas f u n ç õ e s
equivocidade. Outra série de proble- inteletiva, volitiva e parenética.
mas são os postulados da vida mo- Quanto â segunda, o autor vê três
ral: imortalidade da alma. existência grandes respostas: agir moralmente
de Deus e liberdade humana. Outro m o t i v a d o pela busca d o prazer
problema metaético, ressaltado pelo (hedonismo), pela busca da felicida-
a u t o r , é a q u e s t ã o da cognos- de (eudaimonismo) ou pela busca da
cibiiidade e verificabilidade dos juí- vontade de Deus. Nesta segunda
zos m o r a i s . líle professa o q u e s t ã o f a l t o u u m a m a i o r ex-
cognitivismo e critica o decisionismo plicitação da categoria de opção fun-
(não-cognitivismo). O cognitivismo damental para determinar, em últi-
defende que é possível conhecer uma ma análise, porque o sujeito age
ordem moral objetiva e que, porLin- moralmente. A questão do pecado é
to, pode-se verificar a veracidade de intn>duzido no contexto da pergunta
u m juízo moral. O decisionismo, ao porque viver moraiiiienle e da resposta
contrário, pensa que os valores não como busca da vontade de Deus.
são objehvos mas frutos de uma de- Assim t) pecado aparece
cisão e, por is,so. não é possível per- essencialmete cumo desot>ediência à
guntar pela verificabilidade lógica da vontade Deus,
verdade de u m juízo porque este é
essencialmente uma emoção. Assim
o n ã o - c o g n i t i v i s m o sustenta u m Hsta obra é uma primeira tentah-
relativismo metaético. va, da parte do autor, de apresentar
um tratado moral fundamental. Ele
caracloriza-so, em outras obras, pela mesmas notas aparecem no obra 11
precisão nm termos e pela seriedade volto nioralc ddVuoim.
e abertura da sua reflexãii. Estas Roque Junges

G O N Z A L E Z - D Ü R A D O , A n t ô n i o , Mariologia popular Intino-amcri-


cam. Da M a r i a c o n q u i s l a d o r . i À M a r i a l i b e r t a d o r a . T r a d u ç ã o ( d o
e s p a n h o l ) L u i z João C a i o . S ã o P a u l o , L o y o l a , 1992. 123 p p . , 20,8
X 13,8 c m . I S B N 85-l!>-l)()645-6

Ao terminar a recensão do origi- distinguindo quatro aspectos: a Ma-


n a l , p u b l i c a d o no Paraguai (cf. ria da história, a Maria da fé pascal
PerspTeol 18 11986} 254-256), o recen- do NT, a Maria do Magistério e dos
seador fazia votos de que aparecesse teólogos, a Maria da piedade eclesial
uma tradução brasileira. Com atraso das diversas Igrejas particulares, l ^ a l
de seis anos, ei-la ai. Como se trata des.sas Marias subjaz à mariologia
de uma obra que mantém sua atua- popular latino-americana?
lidade, vaie a pena repetir os elogios
feitos então. Maria chega ao mundo ameríndio
como "a Conquistadora", com toda
Esta pequena grande obra de G.- a ambigüidade que este termo apre-
D. vem preencher uma lacuna na senta na teoria e na prática dos inva-
bibliografia teológica: uma sores e diante aos ameríndios (cap.
mariologia a partir da América Lati- 111). Mas logo Maria muda de feição
na, ao mesmo tempo critica e aberta e aparece aos ameríndios com u m
à religiosidade popular mariana lati- " n o v o rosto m e s t i ç o " . O A . o
no-americana. exemplifica com Guadalupe,
Copacatwna e a presença mariana na
ü A. parte de que A religiosidade saga da independência (cap. IV),
popular subja/, uma teologia que o
teólogo deve explicitar a nível da É como mãe (minha màe — nos-
racionalidade científica (cap. I). Para sa mãe) que Maria é especialmente
tanto, observe-se q u e a teologia reconhecida e cultuada na piedade
subjacente à religiosidade popular é popular latinoamericana. Daí a ne-
o resultado do encontro entre a reve- cessidade de estudar o que significa
lação divina e a cultura autóctone concretamenle a maternidade em
que, quando assimila a revelação, nossas culturas (cap, V), São três os
acaba por traduzi-la ao idioma do fatores que marcam a experiência da
povo fiel. " A tradução nem é neutra maternidade entre nós, especialmen-
nem homogênea. E a expressão lin- te nas camadas p o p u l a r e s : o
güística do mesmo fato, mas numa machismo, a opressão e a experiên-
nova perspectiva e a partir de u m cia predominantemente camp<mesa.
novo h o r i z o n t e " (22). Assim será Dentro da perspectiva machista se
preciso considerar todo o universo define a mãe cm oposição ao macho,
ecológico, histórico, social e cultural O lugar da primeira é o aconchL'go
do povo para compreender a tradu- do lar, com todas as virtudes carac-
ção. E o que o A, trata de fazer com terísticas da fidelidade, da compre-
relação ã mariologia. en.sào, do cuidado etc, O lugar do
macho é a sociedade, onde se vence
pela durez,a e valentia; o facão ou a
Inicia seu caminho, perguntando
pistola são seu símbolo. — Viver a
quem é a Virgem Maria (cap. II) e
maternidade na opressão significa ção eterna ligados ao amparo mater-
uma relação dolorosa e sofrida, su- na! de Maria, a espera de auxílio da
portar conflitos, mas ao mesmo tem- Mãe. Entretanto há limitações que
po a mãe ê segurança, consolo e es- provém dessa cosmovisão: o valor do
perança para o mesmo oprimido. — feminino se concentra na maternida-
A cultura camponesa compreenderá de, enquanto a feminilidade (o ser
a mãe com as características da mãe- mullier) é considerado negativamen-
terra. Essa maternidade telúrica é te. C o m isso, Maria fica reduzida a
v i r g i n a l , estabelece solidariedade seu lugar na cultura machista, com o
entre o ser humano e a terra, ê ritual que não se pode compreender ple-
e quase mágica, é cíclica. namente a personalidade humana do
Maria e conseqüentemente sua fun-
O cap. V I enlaça Maria, tal como ção salvifica para a mulher oprimi-
foi apresentada teológica mente no da. Outra limitação coasiste em que
cap. 11 e as três notas características a piedade mariana popular se baseia
da p i e d a d e p o p u l a r m a r i a n a ; a na oposição lar-sociedade e assim a
exaltação de Maria ("Nossa Senhorii"), religiosidade (maternal) não repercu-
ao mesmo tempo que sua proximi- te na sociedade.
dade ao povo ("consoladora dos afli-
tos", "nossa mãe") e sua concretiza- O cap. VIII trabalha a passagem
ção em imagens e espaços sagrados entre essa figura de Maria, mãe dos
(onde se tem o mesmo comportamen- oprimidos, â Maria, mãe da liberta-
to que com a própria mãe n u m lar ção, possível porque a situação de
sofrido e matriarcal — cf. p. 77). opressão-libertação se torna novo
lugar hermenêutico para a mariologia
Agora se torna possível uma aná- (popular e erudita). Maria será assim
lise da teologia mariana popular (cap. apresentada como aquela que foi
VII). que mostra suas potencialidades mulher antes de ser mãe, e mulher
e limites. A ciismovísâo da cultura que viveu numa sociedade oprimida
o p r i m i d a na América Latma está e nes.se condicionamento social foi
marcada pelo dualismo maniqueu "mulher simultaneamente religiosa e
entre o lar e a sociedade e colorida consciente da situação real em que
por certo fatalismo. ao mesmo tem- se encontrava seu p o v o " (106, cf.
jjo que apresenta inteasa referencia -Magnihcat). Como mulher de fé que
religiosa. A sociedade, âmbito do assume a história, Maria faz frente
macho, é um espaço diabólico e imo- ao fatalismo: crê no Deus que age "na
ral, onde só a força e a violência são libertação ativa dos pobres" (108),
capazes de impor-se. O lar, próprio Outro aspecto a ressaltar é a dimen-
da mulher — da "nossa mãe" — é o s ã o c r i s t o l ó g i c a de M a r i a . O
espaço do perdão, da misericórdia, antimachismo do Cristo tem dois
da compreensão, onde se desenvol- aspectos: 1) "sua concepção de m u -
ve o mundo afetivo nas relações mãe- lher e [...] o modo de relacionar-se
filho. Entre os dois há u m abismo, com ela e de incorporá-la ativa e ple-
embora haja ligações, pois no lar (na namente à sua missão" (110); 2) Cris-
piedade para com a mãe) o macho se to vence não ao modo machista da
purifica. A mãe é ainda "refúgio, violência (a facão), mas pela h u m i -
auxílio e ajuda" e é capaz de provo- lhação (a negação do macho), E o
car o reencontro dos irmãos enfren- Evangelho de João nos apresenta
tados na l u t a da v i d a . Daí a Maria participando desse modo de
mariologia "basicamente afetiva e ver, ao pé da cruz. — Por f i m , Maria,
sentimental" (84), o perdão e a salva- por sua maternidade universal, per-

[716]
m i l f c o r r i g i r possíveis desvios c Nove anos depois da publicação
roducionismos de u m j perspectiva d o original, este livro, longe de d i m i -
libertadora (neocatarismo. negação n u i r sua atualidade, aumentou-a.
da possibilidade de conversão do Cada vez mais se fala de inculturação
opress(»r. imanentismo). da fé. ü.-D. nos oferece pistas con-
cretas para u m a m a r i o l o g i a i n -
G . ' l ) . nos oferece assim magnífi- culiurada nas culturas tradicionais da
ca contribuição a uma mariologia ao América Latina.
mesmo tempo fiel ã tradição e à pi-
edade, à elaboração erudita da fé e Depois de tantos (e tão mereci-
ao "sensus f i d e l i u m " (que tantas ve- dos) elogios, cabe tamtiém uma res-
zes nos aparece desfigurado piir não salva. G.-D. não completa o círculo
nos determos a analisar seu verda-
h e r m e n ê u t i c o . Sua a n á l i s e da
deiro e profundo sentido — cf. a pro-
mariologia popular permite corrigi-
pósito as páginas em que se analisa a
la a partir da erudita, mas falta um
acusação de "mariolatria" —91-93).
passo: aprender da mariiilogia popu-
Na introdução i> A, considera ler
f>odido iipoins "apontar um cammhii lar, perguntar o que essa teologia
para ulteriores investigações" (13), espontânea do povo pode ensinar à
como se fosse pouco ter descoberto teologia acadêmica em termos de
caminho tão promiss»)r. O recensea- conceituação e sislematização. l'or
dor é de opinião que não se poderá esse proces,so se possibilitaria que a
doravante fazer mariologia na Amé- teologia se enriquecesse com no\'iis
rica Latina, desconhecendo esta pe- paradigmas, conceitos e categorias a
quena e despretensiosa obra de G.- serem trabalhados sistematicamente
D. O A. une garra teológica a amplos em vista a novas sínteses (cf. Fran-
conhecimentos antropiilógicos e pro- cisco IAHOKDA: "Métodos teológicos
funda expi-riéncia da cultura popu- na América L a t i n a " . PerspTcol 19
lar. i'ica o desafio para ulterior in- 119871 293-319; aqui: 302-31)5).
vestigação que leve em consideração
micro-regiões culturais na "l'álria
Grande" da América [.atina.
Francisco Taborda

1 1 0 t ) R N A l í R r, E d u a r d o , O movimento dc jcsus. Petrópolis, Vozes,


1994. 16(1 p p . 20.5 X 13,7 c m . C o l e ç ã o u m a liislória d o cristianis-
m o na p e r s p e c t i v a d o p o b r e . I S B N 85.326.1159-1

O A., assaz conhecido no meio rem a falta de obras de história do


teológico do país, já escrevera sobre cristianismo desde o ponto de vista
este mesmo tema pequeno livro de da realidade do 111" M u n d o , ,se dão
caráter didático e de fácil c o m p n v n - ao trabalho de redigi-las nesta pers-
sào (O movimento de Jesus, São Pau- pectiva dos pobres em aintraste com
lo, n i ) , Vm). O presente livro tem a visão dominante europeizante e
a mesma estrutura que o anterior, só ocidentalizante.
que mais amplo, apetrejado cientifi-
camente e no contexto de coleção O método, que presidirá o con-
abrangente. Abre, com efeito, coleção junto das obras da coleção, parte do
prevista para 6 tomos. Obra de cinco homem como ele é, na sua situação e
especialistas, formados não só acade- identidade corporal, e, na sua gran-
micamente mas também através de de maioria, em luta dramática pela
pratica de ensino, que, ao percebe- existência, perseguida pela fome.
l'nrli.'-su do "acontLtxT na baso" lam- ne, portanto, o caráter e a natureza
bem visilado pelos sonhos, fesla, d i - das obras da coleção.
mensão amorosa, imaginário e não
sri pela fome. fervade o mótodii a Este livro começa com reflexão
trilogia: terra, festa e corpo; pão (ali- sobre as íontL"s do m o v i m e n t o de
mento), saúde, sonho; arado, arma, Jesus, chamando a atenção para o
canto; desfrutar o cosmos (economia, caráter próprio dos evangelhos com
festa, alimento), habitar o cosmos suas diferentes camadas, para a ne-
(ecologia, terra, saúde) e compartir o cessidade d o conhecimento do juda-
cosmos (corpo, sonho). Os pobres são ísmo, para a s u p e r a ç ã o d o b i -
os excluídos do alimento e da sáude, bliocentrismo no enfoque das cultu-
mas não dos símhos. As obras que- ras religiosas circunvizinhas numa
rem responder as três perguntas: nova perspectiva em relação ao pa-
onde se distribuí o pão? onde se con- ganismo, para a maneira douta e l i -
segue a saúde? por onde passa o vre de Jesus proceder diante dos tex-
m u n d o dos sonhos? E pensa-as dc's- tos bíblicos, para a existência de ou-
de os excluídos, :iimi.i "hermenêutica tras fontes além dos evangelhos, tais
e heurística do pobre", animada pela como, as fontes judaicas (Plávio
mística do pobre. Os A A . estão cons- Josefo, Fílon de Alexandria, Fscritos
cientes dos percalços de nature7.a de Q u m r a n e de Nag HammadiK' as
documental e hermenêutica dessa do escritor romano Tácito. Conside-
opção. Apontam, porém, caminhos ra o cristianismo das origens como
para resgatar fontes históricas popu- movimento religioso dentro do juda-
lares, dos pobres, tais como. expres- ísmo sob a liderança do Jesus e inspi-
sões artísticas e religiosas populares, rado no seu evangelho, Este movi-
iconografia, topografia, etc. Preten- mento entra no palco da história, le-
dem fugir ao enciclopi-dismo das g i - vado piir marginalizados e minorias
gantescas e eruditas histórias da Igre- discriminadas. Nisto, ele segue os
ja. Buscam também manter relação pa.ssos de Theissen (G. Theissen, So-
com a atualidade nos trabalhos em ciologia do movimento de Jesus, cf.
perspectiva ecumênica, tendo como PT 25 (1993): 258-260).
quadro referencial, nàoo eclesial, mas
o antropológico, econômico, S(X"ial,
O segundo capítulo traça a situa-
político, c u l t u r a l , ecológico, numa
ção sócio-política, econômica e reli-
p a l a v r a , h u m a n o . Esta o p ç ã o
giosa do tempo de Jesus. Classifica-a
metodológica implica posição teoló-
de situação colonial. Politicamente a
gica que se afasta da l e i t u r a
situação estava mais calma, mas so-
agostiniana de que o paganismo e o
cialmente fervilhava ptir causa da
judaísmo não passam de preparação
pobre/a das imensas maiorias do
para o cristianismo, ü paganismo
povo, especialmente dos camponeses.
será anali.sado assim como é, sem a-
A Palestina vivia naquele tempo sob
priori dogmático. O mesmo vale da
três donos: o Templo, o liei e o I m -
heresia, do misticismo e de outras
pério Romano.
formas discriminadas de experiência
cristã.
E)escreve a situação da Palestir^
como de anomia social em que os
Esta longa referência ao método pobres buscavam soluções fora da lei
se fa/ importante pela sua singulari- para s o b r e v i v e r e m : mendicância,
dade e pelo seu caráter controverso. banditismo, emigração, integração a
Metodologia que divide as águas da algum grupo em torno de um profe-
historiografia latino-americana. Defi- ta.

[4,-,:
o A., b ú s e j J o om Josefo, retrata O A. estuda quatro formas histó-
rapidamente os principais grupos ricas do movimento de Jesus nos seus
religiosos da Palestina do tempo de inícios: o cristianismo palestinense,
Jesus: fariseus, saduceus, zelotas e asiático, sírio-egípcio e mediterrâneo
essênios. Quadro simples, claro, d i - ocidental.
dático, sem L^speciais novidades.
No cmliaiiismo palestiiietisc de ca-
O terceiro capítulo aborda direta- ráter c o m u n i t á r i o - d o m ó s t i c o e
mente o moviment») de Jesus. As fon- sapiencial de acolhida aos pobres, a
tes principais são os evangelfios, l i - figura de Tiago, primo do Senhor, se
dos na perspectiva sócio-histórica. torna central, A experiência cristã
Baseia suas ponderações no pressu- vincula-se tanto ã Torá quanto ã nova
posto teórico de que as palavras,
lei de Jesus, sobretudo na afirmação
gestos e açikrs se tornam inteligíveis
de que já não se espera o .Mi^ssias,
somente dentro da "comunidade e
porque já veio na pessoa de Jesus, O
contexto lingüísticos" em que acon-
cristianismo dcsioca-se. com a qucxJa de
tecem. Nesse sentido, a pessiia de
Jesus se deixa entender dentro do Jerusalém, ;Mrii a Aia Menor, onde
contexto camponês galileu, E por isso, prolifera apesar das perseguições da
explicita este contexto e nele localiza dominação romana. Ele se exprime
a atuação de Jesus, Em seguida, trata no livro do Apocalipse de modo v i -
do surgimento do m o v i m e n t o em goroso. A figura do apiistolo João
torno da pes.si)a de Jesus e o cerne de domina essa forma de cristianismo.
sua proposta e de seu projeto de ca-
ráter universal, consulwtanciado no Sobre base judaica, o cristianismo
evangelho. se expande também em direção ã Siria e
ao £v'(fo com as duas cidades-chave
Os capítulos seguintes vão perse- de Antioquia e Alexandria respecti-
guir o caminhar dL'sse movimento, já vamente na seqüência da dispersão
que no seu ct>ração ele carregava seguida à morte de Estêvão, em par-
pniposta universalista. Surgiram, por te, em r u p t u r a com os costumes
assim dizer, diversos "crislianismos", judaizantcs. e, em parte, em continui-
diferentes da primitiva experiência dade com a vertente aramaica. A f i -
galileana. O cristianismo se torna gura de Tome e a Didaqué desenham
realidade plural e pluralista, O auf{ir a face desse cristianismo, A influên-
indica alguns pimios que considera cia helenista faz-se crescente sobre-
como referenciais permanentes para tudo em Alexandria, no Egito. A i
seu caminhar aii liingo dos dois m i - surge uma das mais famosas escolas
lênios: "marginalizados e excluídos teológicas com personagens como
constituem as forças ativas da histó- Clemente, Orígenes, Dionísio, Ataná-
ria; a violência não resolve, nem sio e Cirilo. Nes,se mesmo movimen-
mesmo a violência sagrada; a mani- to, existe a vertente popular copia,
pulação da religião e da cultura em do interior, que resiste ã helenizjção
geral deve ser repudiada; não existe e de onde sairão os anacoretas.
nenhum 'salvador da pátria" (p, 94)",
Evidentemente estes elementos po- No cristianismo mediterrâneo oci-
dem parecer insuficientes ou mesmo dental emerge a gigantesca figura de
não ser os nucleares para definir real- Paulo de Tarso que compreende que
mente o movimento de Jesus, Faltam o cristianismo deve abandonar os l i -
as dimensões fundamentais do per- mites da Torá e de u m cristianismo
dão, da caridade fraterna, da filiação rural judaico para expandir-se nos
divina, da presença d u Espírito, etc. centros urbanos heleni7.adtis. Paulo,
npcsar de fariseu, linha mcnle e a v lhada d o desenvolvimento histórico
ração cosmopolita com cidadania d o cristianismo, a saber, sua v i n -
romana e abriu o cristianismo para o culação e/ou distanciamento dos
m u n d o genlio. pobres, [.imite, porque deixa de lado
outros aspectos também inspiradores
Enriquecem o livro, facililando- e fundamentais nesse miivimento,
Ihe a leitura, pequeno léxico com os como seria, p. ex., o "enjeux" das
lermos mais difíceis e u m conjunto idéias, das filosofias, das doutrinas,
de mapas e gravuras artísticas, que Isso aparece somente "per transen-
facilitam imaginar descrições e situa- d a m " , A leitura é fácil, interessante,
ções tratadas no texto. enriquecedora, permitindo ao leitor
ampliar sua visão do cristianismo sob
Esto livro de Hi>ornaort é exlro- a perspectiva de movimento e não
mamenle sugestivo. A ótica escolhi- somente de doutrina nivelada.
da marca sua riqueza e limite. Rique-
za porque desvela face pouco traba- J. U. Libanio

J O M I F R , Jaccpes, hlaniisnío. História e doutrina. Tradução (do


f r a n c ê s ) L u i z J. Baraúna, I V t r õ p o l i s , Vozes, 1993, 318 p p „ 21 x
13,6 c m . C o l e ç ã o : herança e s p i r i t u a l , 4, I S B N 85,326,(18.52-3

O Islamismo apresenta-se hoje didático quadro histórico do Islã: o


como a religião universal com maior sou s u r g i m e n t o e expansão. Para
força expansiva. Cresce não simples- entender o surgimento, inicia-se o
mente polo aumento vegetativo das livro com a descrição do ambiente
piipulações muçulmanas mas tam- gcHigráfico-humano da Aráhia, espe-
bém por novas e progressivas con- cialmente de Meca e Medina, no ini-
versões. Este fenômeno tem sido cio do sc^ulo V i l de nossa era, berço
percebido de modo m'tidü na Euro- do Mohammad (ou Maomé na for-
pa, Ainda não parece ser nosso priv ma aportuguesada).
blema pastoral, mas mesmo assim
mergulho histórico-teológico nesse No estudo d o surgimento do Islã.
universo culttiral religioso torna-se-
o A . não privilegia nenhum tipo de
nos importante e enriquecedor,
análise, materialista ou idealista, mas
procura mostrar os dois lados da si-
ü autor, padre dominicano, viveu
tuação em posição t>em equilibrada,
longos anos no Cairo, onde pôde
O q u a d r o histórico-geográfico da
imergir-so no universt» islàmic<). Des-
de o início, revela o A, mentalidade expansão permite que o leitiir possa
de diálogo no espírito do Concilio entender u m pimco da diversidade
Vaticano I I , que ele explicitamente das expressões islâmicas de uma
invoca. O estudo situa-se na perspec- identidade de fundo,
tiva do diáUigo. em que três aspectos
fundamentais são considerados: os Para C(impreender tal identidade,
elementos comuns entre ambos, a o A . estuda a doutrina, a lei, a pieda-
s i n g u l a r i d a d e de cada u m e seu de, a mística e as ainfrarias. Nesse
mútuo relacionamento-quesliona- estudo aponta com clareza os pontos
mento. nodais da fé e da lei islâmica. Insiste
naturalmente no centralismo mono-
Nos três primeiros capítulos, o A. teísta da fé islâmica e nos cinco pila-
traça-nos breve, substancioso, claro e res de sua lei: o testemunho da uni-
cidade de Deus e do caráter proféti- mútuo dos valores na fé e o compor-
co de Mahammad, a oração ritual, o tamento dos membros de ambas as
imposto social, o jejum do mês de religiões no cotidiano do encontro
ramadã e a pea-grinaçãci a Meca. Esta das pesstws e na a>lalwração em tra-
lei conforma a vida sticial do povo balho social, cívico ou cultural.
muçulmano, cuja configuração o A.
estuda nas suas variantes. N u m nível mais teórico e univer-
sal, cabe fJercebier os pontos comuns
Belo capítulo explora a dimensão no nível religioso, começando, antes
mística do islamismo que supera o de tudo, pela fé e obediência ao Deus
primarismo de fé centrada unicamen- uno e todo-poderoso. pela observân-
te no c u m p r i r i e n l o da lei. Há traços cia e vivência de p r e c e i t o s d o
muito próximos da mística cristã oci- Decálogo, etc.
dental.
Difícil e semeado de atrito é o
T e r m i n a d o esse m e r g u l h o no problema das missões, quer na his-
m u n d o político-religioso islâmicix o tória pa.s.sada. quer na atualidade com
A. dedica-se ã questão da relação do o complicador propagandista e
mundo muçulmano com o cristiani.s- proselitista das seitas pós-cristãs.
mo e com a modernidade. N u m pri-
meiro momento, tenta mostrar como 1 iá tamtiém nessas relações d i -
o i s l a m i s m o vê o c r i s t i a n i s m o . mensão psicológica, já que o proble-
Centra-se na questão cristológica, já ma da adesão às crenças envolve a
que há identidade de fundo no mo- afetividade toda, quer do lado cris-
noteismo. A questão fundamental tão, quer muçulmano. Na religião
situa-se na interpretação de |esus. islâmica, a relação afetivo-intelectual
Apesar do ri-speito e reconhecimen- com o Corão é absorvente e tota-
to pela pessoa de Jesus, o islamismo lizante. Fora dela torna-se difícil qual-
o amsidera um profeta para o mun- quer diálogo.
do judeu na seqüência d(w grandes
profetas do Antigo Testamento. Por O A. dedica longo parágrafo às
sua vez. M o h a m m a d é profeta de diferenças fundamentais entre o cris-
tianismo e o islamismo. Sem clareza
maior alcance, já que tem dimensão
nesse ponto, não há verdadeiro diá-
universal, Além do mais, o Corão é
logo. O cristianismo propõe-se como
para eles a línica fonte válida para
suj>.'ração definitiva do Antigo Tes-
conhecer a Jesus, Em relação à mo-
tamento e não simples correção de
dernidade, o A, estuda sobretudo a alguns pontos. Suas exigências vão
fMisição dos reformistas que procu- muito além das do islamismo. O A.
r a m a r t i c u l a r a f i d e l i d a d e ã fe indica alguns pontos de diferença:.a
islâmica e a participação numa so- questão do perdão, a compreensão da
ciedade industrial moderna, situação do ser humano pecador e
redimido pela graça, o dom de si com
O livro está escrito em espírito renúncia ã força, a revelação de Deus
c-cumênico e de simpatia em relação j3or etapas até o mistério da Trinda-
ao islamismo. O A. procura ir já in- de, etc.
dicando ao longo do livro, em pe-
quenos toques, as proximidades do Já terminando o livro, o A. at>or-
islamismo com o cristianismo. Dedi- da a questão de quem é Mohammad
ca, porém, todo um capítulo ãs rela- para o cristão e da apologética m u -
ções islamo-cristãs. A p o n t a , como çulmana, Não há simetria de situa-
ponto de partida, o reconhecimento ção entre o cristão e o muçulmano
um rolaçãü a Jesus e a Mohammad do, no plano de [X'us, "reformador
respeclivameme. Para o muçulmano cari.smático" em tempo de fraquez,a
n-conhecer a Jesus como profeta não do cristianismo.
lhe afeta cm nada a íé, já que se re-
fere ao Jesus de que fala o Corão, islu O livro termina tratando da apo-
é, à q u e l e que está a serviço d e logética muçulmana, N o momento
Mohammad. Para o cristão reconhe- atual, impera apologética oficial, nos
cera Mohammad como profeta, con- grandes centros muçulmanos quase
tradiria sua fé cristã, pois significaria única em que se reivindica para a
sem mais ser muçulmano. Reconhe- religião islâmica, au mesmo tempo,
cer alguém como profeta na concep-
o caráter de "religião da revelação e
ção muçulmana implica seguir-lhe o
da r a z ã o " , O p r ó p r i o l i v r o d o
ensinamento. Ora, segundo o
"Corão" é apologético, É aceito como
Islamismo Jesus profeta manda se-
única fonte absolutamente segura de
guir a Mohammad, Por sua vez, re-
conhecer a Mohammad como profc'- conhecimento, já que revelado por
ta. significa dizer que ele veio supe- Deus,
rar a Ji-sus, o que contradiz a fé cris-
ta. Esta situação mostra o impas.se Estamos diante dc livro excelente
nessa questão. Deve-se d i s t i n g u i r de introdução ao Islamismo para cris-
entre respeito ã pessoa de tãos, escrito p o r cristão de mente
M o h a m m a d s u p e r a n d o as agres- e c u m ê n i c a , respeitosa e aberta.
sividades pa.ssadas e o reconhecimen- Transparece nas linhas do livro pro-
to de ele ser profeta. O primeiro deve f u n d a a t i t u d e d e respeito ao
ser feito, O segundo se torna inviável Islamismo. mas também de clareza
para o cristão, A verdadeira questão das distâncias que o separam do cris-
é perguntar-se pelo significado d e tianismo. Não se trata de nenhum
Mohammad no plano d i v i n o da sal- diálogo demagógico, mas de verda-
vação e tentar teológica mente respon- deiro esforço d e conhecimento da
der esta pergunta, O A , apresenta outra religião a partir da consciência
rápida tipologia de algumas dessas da própria identidade cristã. Livros
resptistas. Em outro momento, levan- como estes servem ao diálogo e per-
ta duas delicadas questões para os mitem que se percebam a sua com-
muçulmanos: a historia das formas plexidade e reais d i f i c u l d a d e s , A
aplicada ao Corão, no sentido d e nele
apresentação gráfica foi ennqucvida
conterem-se estórias anteriores e não
com pequenos quadros didáticos que
simples revelações imediatas e dire-
facilitam a compreensão e leitura. O
tas de Deus e o caráter de total sufi-
texto é claro, didático, com abundân-
ciência reveladora do Corão,
cia de dados informativos necessá-
rios. As análises e reflexões teológi-
cas não se perdem em profundida-
Voltand<i à pessoa d e M o - des inacessíveis, mas permitem, a lei-
hammad, o A , propugna nova cate- tor alheio a esta questão, introduzir-
goria teológica para defini-lo, O ler- se bem nela.
mo profeta causa mais confusão que
clareza. Talvez possa ser considera- J . B. Libanio
G l B E I X I N l , R o s i n o (ed.), Percorsi di Teologia Africana. Brescia,
Q u e r i n i a n a , 1994. 332pp., 19,4 x 12,3 c m . G i o r n a l e d i T e o l o g i a
226. I S B N 88-399-0726-2.

Sob a direção de Rosino Cíbeilini, mente ligada à colonização, cujas


a Coleção "Giornale di Teologia" pu- conseqüências são sentidas até hoje.
blicou este ano o "Percorsi di Teologia Isso pode parecer banal, mas o A .
Africana". Trata-se de uma coletânea mostra de maneira muito inteligente
de artigos de Teólogos africanos ca- a importância do fato. Não põe em
tólicos e evangélicos, que pretendem dúvida a intenção generos.1 dos mis-
traçar o percurso da reflexão teológi- sionários, mas questiona se eles t i -
ca africana e a sua atualidade. Para nham idéia precisa do que deviam
além do editorial, temas como a pre- realizar na mis.são e. caso a tivessem,
sença do Cristianismo no norte da se estaria ela de acordo com o desíg-
África na antigüidade ou esforços nio de Cristo e da Igreja.
mi.s.sionãrios na Costa Atlântica no
Séc. X V I não aparecem, Quer-se tra- Muitos são os problemas decor-
tar, antes, da evangeli/ação da África rentes desse trabalho missionário,
no último século que coincide com a mas o fundamental, que se apresen-
coKmi/ação, já que o Cristianismo ta aos teólogos e pastores africanos,
africano atual é fruto dc"ssa época, O é construir uma Igreja que lenha em
livro é recomendável tanto peta seri- si t o d o s os meios de s a l v a ç ã o ,
edade e competência dos autores radicada na estrutura e cultura local,
como pela atualidade de seus temas. plenamente responsável do destino
Ganha especial atenção pelo fato de espiritual de seu povo.
a Igreja haver m u i t o recentemente
realizado o Sínodo Africano. N a s e g u n d a p a r l e d e sua
monografia, o A, apri-senta três cor-
O p r i m e i r o dos onze artigos, rentes características da Tixilogia na
intitulado "Breve Sloria delia teologia África. A Teologia missionária pau-
iri África", é de A l p h o n s e N g i n d u tada por três teses da escolástica: a
Mushete, teólogo católico z.airense, salvação da alma ou a conversão dos
professor da Faculdade de Teologia infiéis, desenvolvida sobretudo na
da Universidade de Kinshasa e mem- escola missiológica de Múnster; a
bro conselheiro para a África do Teologia da "Planiatio eccksiae" que
comilê-diretor da revista Concilium. via a alma do negro como "sedentes
Consciente da complexidade da rea- in tenehris et in uiiibra inortis" e, fa-
lidade da África negra e, por isso zendo tabula rasa dos povos sem
mesmt>, sem a pretensão de esgotar cultura e sem dvili/.ação, pregava a
o lema, o A . Irata-o em duas partes: implantação da Igreja como esta se
na primeira situa a questão e mostra realizara historicamente no Ociden-
a maneira como os teólogos ou ho- te; e, por f i m , a de fazer nascer uma
mens de Igreja percebem a realidade Igreja e ajudá-la a crescer. Sob esta
africana e suas repercussões religitv teologia, nasce uma Igreja modelada
sas, e, na segunda, busca apresentar secundo a européia, paralizada, sem
as principais correntes da Teologia na irúciativa, originalidade e criativida-
África. de.

A questão surge da ambigüidade Contrariamente, a teologia dita


da evangelização da África estreita- africana quer levar em consideração
o destinatíriu africano com sua cul- I n s l i t u t e Of West África de ! ' o r t
tura L> religião c, a partir de seus Hartcourt (Nigéria) assina o terceiro
problemas, pensar a verdade do cris- a r t i g o , i n t i t u l a d o "Cfisíotogia e
tianismo. Apresenta-a em duas ten- incuiturazione: um prospetiiva neo-
dências: a "Teologia da Adaptação " lestamentaria". Breve, porém, denso e
e "a Teologia africana Crítica". Na profundo, o artigo, com uma séria
primeira, é tratada a questão dos afri- cristologia, quer mostrar como Jesus
canos que aceitam e vivem a mensa- evangelízou os hebreus a partir de
gem do Cristo, anunciam-na a outros, sua cultura, sem destruí-la nem su-
para que a v i v a m em seu contexto primi-la. Jesus, embora de maneira
sõcio-cultural. Na segunda, aponta criativa e nova. busca converter os
duas preocupações principais: o de- hebreus usando elementos de sua
sejo de u m contato mais estreito com própria crença religiosa fundamen-
as fontes maiores da Revelação Bíbli- tal. O A. propõe esse modelo do pró-
ca e tradição, e o esforço de grande prio Cristo para a inculturação do
abertura ao m u n d o africano e aos Evangelho na África Negra, tendo
seus problemas. como medida sua situação específi-
ca.
Por f i m , o A. apresenta a "BInck
Thcology" ou teologia negra O quarto artigo, "Criítologie
sulafricana. Esta, inspirada particu- Africana Contctiiporanec-vaiutazione, c
larmente na situação social de opres- suggcrinicnti pratici", é de Charles
são e de segregação, nas quais se N y a m i t i , T e ó l o g o c a t ó l i c o da
encontram os negros na América e Tanzânia, docente do " Catholic
África do Sul, apresenta-se como re- Higher Institut of Eastern África",
visão crítica ao racismo considerado Nairobi (Quênia), considerado um
como fenômeno global, ligado histo-
dos tcóiogos africanos mais ativos na
ricamente à expansão do capitalismo
linfia da inculturação. Excelente arti-
europeu.
go para ter uma visão geral sobre a
cristologia africana contemporânea. O
O 2" artigo, " La Bibbia iiella cultu-
A., entretanto, não se limita a apre-
ra Africana", ó de John S. Mbití, da
sentar os diferentes modelos desse
Igreja anglicana do Kenya, u m dos
ramo da ttxjlogia; ele faz uma avali-
teólogos mais cultos e produtivos da
ação crítica e sugestões práticas. Por
África, Artigo muito breve, porém,
profundo, onde o A, mostra pontos não se tratar de mera especulação
comuns entre Israel e a África, tais intelectual, mas sim reflexões em vis-
como a tradição oral (algo que sobre- ta de m é t o d o s de cristologia da
vive à alfabetização e cultura letra- inculturação mais eficazes, o A. faz
da), a integração dos que não sabem propostas bem concretas, tais como
ler na sociedade, a maior participa- o uso intrín.seco do termos culturais
ção da pessoa na comunicação oral, africanos na teologia, identificando-
a concepção de tempo, comunhão e os analogicamente com o mistério
comunidade. Analisando tais seme- cristão e explicação dos elementos
lhanças, o A. conclui que, na África, implícitos que estão na base dessa
o m u n d o bíblico se faz, como em identificação.
nehnhum outro lugar, real, v i v o e
próximo. " A África vive na Bíblia, e O A. termina seu artigo, propon-
a Bíblia é viva na África",
do a urgência e validade de um
manual de Cristologia africana — e
Justin S, Vkpong, teólogo católi- chega mesmo a propor um esquema
co nigeriano, docente do Catholíc — para a formação dos candidatos
ao sacerdticii), para quo p<isso havor Os quatro últimos artigos lançam
mnior imp.icUi na vjda da Igreja afri- u m olhar sobre a sociedade africana,
cana. sobre a qual fazem uma n.'f1exào na
linha da teologia da libertação. O pri-
O livro Ira/, também dois artigos meiro i n t i t u l a d o "CrisÜaiiesiiiio c
sobre liturgia, Ü primeiro, intitulado lilierazimw irt África", é de Jean Marc
"Cdebrare Gcsii Cristo in África" é de Ela. teólogo católico dos Camarões e
François Kabasele Lubala, teólogo um dos principais nomes da fcxilogia
católico d o Zaire, docente de liturgia da libertação na África. O Autor le-
na Faculdade le<ilógica da Universi- vanta o grave problema da paupe-
dade de Kinshasa. Muito bom artigo rização africana diante do qual u m
para se ter uma idéia geral da expe- Cristianismo coerente não pcxie omi-
riência cultural e da celebração da tir-se. O Segundo artigo, "Pau-pcrizza-
salvação em Jesus Cristo na África. zionc c Liberazioiic. Ápproccio Teológico
O segundo, "IMiirgia c inculturazioite per África e pc il Terzo Mondo", é assi-
— Ccicbrazione cucaristichc crcative", é nado por Fngelbert Mveng, te<ilogo
de Elochukwu F, U z u k w u , teólogo jesuíta dos Camarõi-s, historiador,
católico nigeriano, reitor do Spirilan poeta e artista, atualmente dirige o de-
International School of Theology, partamento de história da Universi-
E n u g u (Nigéria), trata-se de uma dade do Yaoundé. Nesse excelente
avaliação da liturgia eucarística cek'- artigo, o A. analisa a pobreza do pim-
brada na África de maneira criativa, to de vista econômico, antopológico e
p a u t a d a pela i n t e r a ç ã o entre estutural, confronlando-a com a pt>-
Evangelho e cultura e examinada brez.a evangélica, e abrindo perspcxrti-
enquanto memorial de celebração e vas de uma práxis cristã.
"gL"stos verbais".
Não poderia faltar u m artigo so-
Uma das características básicas da bre a mulher africana. Mercy Amba
cultura africana é a sua natureza Üduyoye, nascida em Gana, mas v i -
holistica e englobante, por isso seria vendo atualmente na Nigéria, uma
inadequado tratara teologia africana das teólogas africanas mais ativas no
sem abordar a questão da espiritua- continente e no organismo do Con-
l i d a d e . N o s é t i m o a r t i g o , "La selho Ecumênico das Igrejas em Ge-
spirilualilà in una prospetiiva africana", nebra, colabora com o terceiro des-
]'atrick-Auguslin Kalilombe, que foi ses artigos, intitulado "Dana Nera. lii
bispo da diocese l.ilongwe (Malawi) teologia feminista m una prospettiiia afri-
e atualmente dirige o Centre for lilack cana". E por f i m , u m artigo do teólo-
and WhileChristian l'atnership, Selly go Protestante Sulafricano Simon
Oale. B i r m i n g h a m (Grã-Bretanha), Maímela sob o título, "La Teologia
trata a piissibilidade de falar em t-s- Nera delk Libcrazione".
p i r i l u a l i d a d e africana de maneira
geral. Marco Antônio Morais Lima

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