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Terapia Nutricional No Perioperatorio PDF
Terapia Nutricional No Perioperatorio PDF
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Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
Objetivo:
Esta diretriz tem por finalidade proporcionar aos médicos generalistas e especialistas
uma visão geral sobre a abordagem nutricional no paciente no perioperatório, com
base na evidência científica disponível. O tratamento do paciente deve ser individu-
alizado de acordo com suas condições clínicas e com a realidade e experiência de
cada profissional.
Conflito de interesse:
Nenhum conflito de interesse declarado.
Introdução
de excreção nitrogenada, perda de massa magra, Idosos com baixo peso ou desnutrição, quando
etc8(D). Por conseguinte, a resposta orgânica ao internados por condição clínica ou cirúrgica,
trauma pode levar ao aparecimento ou agravamento apresentam maiores riscos de dependência,
de desnutrição pré-existente, queda da qualidade de institucionalização ou morte5(D).
imunidade do paciente e possibilidade de falha de
cicatrização e aparecimento de infecções9(D). Recomendação
O estado nutricional prévio à operação
Recomendação influencia diretamente na morbi-mortalidade
A resposta orgânica ao trauma determi- pós-operatória.
na modificações basais em vários órgãos e
sistemas10,11(D). A inflamação local originada 3. Quais são os objetivos da terapia
pelo trauma operatório pode tornar-se genera- nutricional perioperatória?
lizada e produzir resposta inflamatória sistêmica
(SRIS), que é diretamente proporcional à Desnutrição pré-operatória é reconhecida-
intensidade do trauma12(B). O resultado final mente um fator independente de risco de maior
pode determinar aparecimento ou agravamento morbidade e mortalidade pós-operatórias, por
de desnutrição, queda da qualidade de imunidade diminuição dos compartimentos de composição
do paciente e possibilidade de falha de cicatriza- corporal, notadamente massa magra, imunode-
ção e aparecimento de infecções. pressão do tipo celular e retardo na cicatrização
das feridas2(B). Dessa maneira, a terapia nu-
2. O estado nutricional prévio influencia tricional (TN) está geralmente indicada para o
nos resultados do paciente cirúrgico? paciente cirúrgico, com o objetivo de prevenir
a desnutrição ou minimizar seus efeitos24,25(D).
Vários estudos consistentes demonstram que Recente análise multivariada mostrou que a
pacientes desnutridos apresentam mais risco de TN é fator independente para diminuição de
complicações pós-operatórias e de mortalidade13- morbidade pós-operatória18(B). A morbidade,
16
(B). No Brasil, o estudo IBRANUTRI iden- a mortalidade e o tempo de internação são os
tificou que quase 50% dos pacientes internados principais parâmetros a serem considerados
na rede pública de saúde (SUS) encontram-se para avaliar a eficácia dos objetivos da TN no
desnutridos de forma moderada a grave17(B). Pa- perioperatório.
cientes desnutridos submetidos a operações para
câncer apresentam maior incidência de compli- Recomendação
cações, assim como aumento da mortalidade, do O principal objetivo da TN perioperatória é
tempo de interação e dos custos hospitalares18(B). prevenir a desnutrição ou minimizar seus efei-
tos. As metas atuais da TN incluem também a
Nesse contexto, vários estudos19-21(B)22,23(D) imunomodulação, a melhora do estresse oxida-
têm mostrado que, em desnutridos graves ou tivo e a melhora dos resultados pós-operatórios.
moderados, a terapia nutricional pré-operatória
por 7 a 14 dias está associada a redução de in- 4. Quando a TN está indicada no pré-
fecções pós-operatórias e tempo de internação. operatório?
A ingestão inadequada por via oral por mais pacientes desnutridos candidatos a grandes proce-
de 14 dias está associada a aumento de morbi- dimentos cirúrgicos de cabeça e pescoço, tórax e
mortalidade pós-operatória25(D). Vários estudos intra-abdominais35-38(A)30,39(D). Há evidências que
demonstraram que pacientes desnutridos se esse tipo de paciente, tanto desnutridos38(A)40(B)
beneficiam de TN pré-operatória por 7-14 dias. quanto não desnutridos41(A), se beneficiam com
Esses benefícios se caracterizam por menor taxa formulações contendo imunonutrientes no perio-
de infecção pós-operatória e redução do tempo de peratório. Nesses pacientes, a TN pré-operatória
internação26(A)27,28(B)29,30(D). Em meta-análise com fórmulas imunomoduladoras traz significa-
envolvendo 1.250 pacientes cirúrgicos, com pre- tivos benefícios.
domínio de câncer gastrointestinal e desnutrição,
verificou-se que a nutrição parenteral empregada Se continuada no pós-operatório, a TN pré-
no período pré-operatório (por sete a 10 dias) é ca- operatória, com ou sem imunonutrientes, pode me-
paz de diminuir o risco de complicações em 10%. lhorar os resultados pós-operatórios41,42(A)43(D).
No entanto, se a terapia nutricional parenteral Estudo clínico randomizado avaliou o impacto
(TNP) for usada apenas no período pós-operatório, da imunonutrição em 200 pacientes com câncer
está associada a aumento do risco de complicações colorretal, que foram randomizados em quatro
em 10%30(D). As implicações deste estudo são grupos para receber imunonutrição via oral
de apenas indicar TNP em doentes desnutridos, durante cinco dias no pré-operatório; no pré e
pós-operatório em oposição a dois outros grupos
e, de preferência no período pré e perioperatório,
controles com dieta padrão pré-operatória pelo
evitando sua indicação de rotina no período pós-
mesmo período ou nenhum tipo de suplementação
operatório. A TNP será usada, no pós-operatório,
antes ou depois da operação (grupo convencional).
na vigência de complicações operatórias ou do
Observou-se que os grupos com imunonutrição
trauma, que impeçam a alimentação digestiva,
(pré e perioperatória) mostraram melhoras signi-
com tempo de jejum superior a cinco dias30(D). ficativas na resposta imunológica, oxigenação in-
testinal e microperfusão, e menor taxa de infecção
Nas últimas duas décadas, ocorreu maior que os dois grupos controles36(A).
aceitação da terapia nutricional enteral (TNE)
do que a TNP. Alguns estudos compararam a Pacientes com tubo digestivo apto para
eficiência da TNE em relação à TNP no perio- receber nutrientes e com apetite preservado de-
peratório de pacientes cirúrgicos31-33(A)34(D). vem receber TN com suplementos no período
Observou-se nesses estudos, redução da in- perioperatório39(D). Recente meta-análise, envol-
cidência de complicações infecciosas com a vendo 17 estudos randomizados e 2.305 pacientes,
TNE, sem impacto na mortalidade. Esse maior demonstrou que a suplementação pré-operatória
número de complicações com a TNP deveu-se, por cinco a sete dias, com fórmula contendo
provavelmente, a formulações hipercalóricas e imunonutrientes, diminui a morbidade, incluindo
imunodepressivas utilizadas em muitos estudos fístulas anastomóticas, e o tempo de internação
nas décadas de 70 e 80 do século passado30(D). pós-operatória44(A). Quando isso não for possí-
vel, a TN deve ser implementada por via enteral,
A TN deve ser implementada no pré-operató- preferencialmente por meio de sonda nasoentérica.
rio, preferencialmente por via oral ou enteral, em Quando o tubo digestivo não for possível de ser
acessado ou a via enteral estiver contraindicada ou associadas a vômitos e aspirações do conteúdo gás-
insuficiente, a TNP deve ser a opção30,39(D). São trico (Síndrome de Mendelson). Contudo, o jejum
exemplos dessa indicação: obstrução intestinal, íleo prolongado é prejudicial ao paciente, especialmente
prolongado e má absorção. no paciente idoso45(D). A resposta orgânica ao
jejum é agravada com o trauma operatório e a
Recomendações lesão tecidual que o segue. Além do aumento dos
• A TN pré-operatória está indicada, por um hormônios contrarreguladores, o jejum associado
período de sete a 14 dias, no paciente com risco ao trauma desencadeia maior produção de media-
nutricional grave candidato a operações eletivas dores inflamatórios que incrementam a resposta
de médio e grande porte. Entende-se risco orgânica com inúmeros efeitos, tais como aumento
nutricional grave quando existe, pelo menos, da resistência insulínica, proteólise muscular, li-
um destes itens: Perda de peso > 10% em 6 pólise e, dependendo do porte da operação, franca
meses; IMC<18,5 kg/m²; Avaliação Global resposta inflamatória sistêmica. Nesse contexto,
Subjetiva = C; ou albumina sérica < 3 mg/dL ocorre liberação de citocinas e produção de pro-
(sem evidência de disfunção hepática e renal); teínas de fase aguda em direta associação com a
• Em pacientes desnutridos submetidos a ope- intensidade do trauma46(B).
rações para tratamento de câncer do aparelho
digestivo e de cabeça e pescoço, recomenda-se A resistência à insulina no pós-operatório
a TN pré-operatória com imunonutrientes é um fenômeno transitório bem conhecido e
por sete a 14 dias, sendo que a TN deve ser que permanece aproximadamente por até três
continuada no pós-operatório por mais cinco semanas após a operação. Ele é mais intenso no
a sete dias; 1º e 2º dia de pós-operatório e regride caso o
• Em operações de grande porte para ressecção paciente não apresente complicações47(D). Em
de câncer, mesmo não havendo desnutrição pós-operatório complicado, a resistência insu-
grave, a TN pré-operatória com suplementos línica aumenta e determina níveis crescentes de
contendo imunonutrientes por cinco a sete glicemia, diretamente proporcionais ao agrava-
dias está indicada e também deve ser continu- mento do estresse metabólico. Estudos recentes
ada no pós-operatório; em pacientes eletivos demonstram que hipergli-
• Pacientes com tubo digestivo apto para receber cemia intraoperatória se associa a maior taxa de
nutrientes e com apetite preservado devem complicações pós-operatórias48(D). Esse estado
receber TN, com suplementos contendo metabólico é semelhante ao do diabetes mellitus
imunonutrientes no período perioperatório. tipo II: a captação de glicose pelas células está
diminuída devido à incapacidade do transportador
5. Qual é o período de jejum pré-ope- GLUT-4 realizar essa ação e, consequentemente,
ratório recomendado em operações a produção de glicogênio é diminuída49(D).
eletivas?
Outro agravante para o jejum pré-operatório
O jejum noturno pré-operatório foi instituído é que, na realidade, o jejum real é bem maior
quando as técnicas anestésicas ainda eram rudi- que o prescrito50(D). Estudos publicados recen-
mentares, para prevenir complicações pulmonares temente demonstram que o jejum recomendado
de oito horas é dilatado com frequência. Pacientes 6. Como deve ser a reintrodução da
acabam ficando 14 horas ou mais de jejum até dieta no pós-operatório?
o início do procedimento anestésico51(C), por
diversos motivos, como atraso no início das ope- A TN precoce em comparação à tardia diminui
rações, adiamentos para outro período do dia, etc. a morbidade infecciosa e o tempo de internação
Alguns pacientes ficam até 20 horas em jejum em pacientes cirúrgicos55(A)56(B)57(C). A TN
de líquidos e 36 horas de jejum para alimentos nutricional deve ser planejada para início precoce
sólidos aguardando a operação. Por conseguinte, no pós-operatório, quando é possível prever que o
a resposta orgânica antes de ser devida ao trauma, paciente ficará por mais de sete dias sem conseguir
inicia-se muitas vezes com o jejum prolongado. se alimentar ou se não conseguir ingerir 60% de
Isso certamente traz consequências ao paciente. suas necessidades por sete a 10 dias58(D). Vários
estudos59,60(A)61,62(B)63(C) demonstraram que a
Estudos prospectivos e randomizados realimentação precoce não só é segura (mesmo na
mostraram45(D) que reduzir o tempo de jejum presença de anastomoses digestivas), como diminui
para líquidos com carboidratos, no pré-operató- tempo de internação e morbidade pós-operatórias.
rio, não resulta em aumento do risco de morbi- Quando comparadas, a TNE tem-se se mostrado
dade associada à anestesia52(A). Várias sociedades superior à TNP no pós-operatório64,65(A)66(B).
de anestesia já modificaram suas diretrizes e Em estudo multicêntrico, randomizado e con-
passaram a recomendar essa rotina de abreviação trolado, com 317 doentes desnutridos portadores
do jejum que antecede operações eletivas53,54(D). de câncer, observou-se que a TNE em oposição
As diretrizes da ESPEN também recomendam à TNP no pós-operatório diminuiu a frequência
a abreviação do jejum para duas horas, com uso de complicações pós-operatórias e o tempo de per-
de bebida contendo carboidratos39(D). manência hospitalar. No entanto, a tolerância foi
menor com NE, obrigando 9% dos doentes com
Recomendações TNE a migrarem para uso de TNP67(A). Esses
• Recomenda-se em operações eletivas tempo de estudos reforçam o conceito de que, sempre que
jejum de seis horas para sólidos e de duas horas possível, deve-se preferir o uso de TNE no pós-
para líquidos claros contendo carboidratos; operatório. Há evidência de que a realimentação
• Recomenda-se o uso de maltodextrina a precoce, por via oral ou enteral, após anastomoses
12,5% em volume de 200-400 mL, seis e intestinais ou colônicas, é segura e pode ser reali-
duas horas antes da operação. Exceções a essa zada no mesmo dia da operação ou no 1º dia de
última recomendação são: obesidade mórbida, pós-operatório59,60,67(A)61,62,68(B)69(C).
gastroparesia, mau esvaziamento gástrico,
suboclusão ou obstrução intestinal e doença A aplicação de protocolos multimodais, envol-
do refluxo gastroesofágico moderada e grave; vendo abreviação do jejum pré-operatório para 2 ho-
• Jejum pré-operatório prolongado é desneces- ras com oferta de bebida com carboidratos, retorno
sário na maioria dos pacientes; precoce da realimentação pós-operatória e redução
• Interrupção da ingestão nutricional é des- da hidratação fluídica perioperatória, tem sido asso-
necessário no pós-operatório na maioria dos ciada a menor taxa de complicações pós-operatórias
pacientes. e encurtamento de dias de internação70(B)71(C).
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