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Processo Civil – Leonardo Valladares

Aula 08 | Jurisdição e Competência - Declaração de Incompetência

SUMÁRIO

1. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA ................................................................................... 2


2. DECLARAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA ........................................................................ 3
2.1 INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA .................................................................................... 3
2.2 INCOMPETÊNCIA RELATIVA ..................................................................................... 5

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1. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA
Na aula passada o professor abordava os temas jurisdição e competência e qual a relação
entre estes.
Para uma melhor prestação do serviço judiciário, foram criadas regras onde existem
limites para se exercer legitimamente a atribuição jurisdicional. Essas regras são chamadas de
competência jurisdicional. Existem ainda vários critérios para que o ordenamento jurídico
atribua a competência a um ou a outro órgão. Exemplo: o art. 114, I, CF, estabelece uma norma
de competência em razão da matéria para a Justiça do Trabalho. É como se o legislador
destacasse uma matéria do ordenamento jurídico e direcionasse à Justiça do Trabalho o
processo e julgamento das lides que tratam da relação de trabalho.
Por outro lado, para os candidatos ao TRF, importa destacar que a principal da Justiça
Federal é in ratione personae, ou seja, em razão da pessoa, em razão da presença de alguns
entes do art. 109, I, CF.
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na
condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as
sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

Portanto, se a União, suas empresas públicas, autarquias ou fundações de direito público


em um dos polos da relação jurídica processual, a competência desloca-se para a Justiça
Federal, é um outro critério de atribuição de competência.
Por seu turno, os juizados especiais cíveis estabelecem a competência em razão do valor
da causa. O art. 3º da Lei 9099/95 vaticina que os juizados especiais serão competentes para
processar e julgar causas de até 40 salários mínimos.
Art. 3º O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas
cíveis de menor complexidade, assim consideradas:
I - as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo;

Dentro desses critérios de atribuição e competência, alguns deles são estabelecidos em


razão de normas de ordem pública que, por serem de ordem pública, são cogentes e, por isso,
não podem ser modificadas nem por vontade das partes nem por vontade do órgão julgador.
Alguns critérios interessam ao próprio ordenamento jurídico, são cogentes, ou seja, não
podem ser afastadas e nem modificadas pela vontade do julgador e nem pelas pessoas que estão
em juízo. Estas são as chamadas normas de competência absoluta ou critérios absolutos de
distribuição de competência.
Por outro lado, outros critérios de distribuição de competência, como o critério territorial,
por exemplo, não estão estabelecidos em virtude de normas de ordem pública. Estas são normas
de interesse privado e, portanto, são supletivas, que podem ser modificadas pela vontade das
partes ou por critérios legalmente estabelecidos. Este segundo tipo de normas de competência,
a doutrina, a jurisprudência e o próprio Código de Processo Civil chamam de normas de
competência relativa.

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2. DECLARAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA
A declaração de incompetência visa estudar quais as consequências do desrespeito de
norma de competência absoluta e de norma de competência relativa.

2.1 INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA


Quanto à incompetência absoluta, será estudado primeiramente a forma de alegação, se é
possível ao juiz reconhecê-la de ofício e ainda se, eventualmente, esse reconhecimento está
sujeito à preclusão.
No que diz respeito à possibilidade de que o juízo a reconheça de ofício, o art. 61, §3º,
aduz:
§ 1o A incompetência absoluta pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição e deve ser
declarada de ofício.
Exemplo: em virtude do crescente trabalho, um escritório de advocacia bastante
renomado na cidade contrata um estagiário para auxiliar nas demandas diárias. No mesmo dia
da contratação, o advogado do escritório atendeu uma causa de direito de família, um divórcio,
e uma reclamatória trabalhista. Ambas as demandas são de competência absoluta totalmente
diferentes, porque envolvem matérias de competência material e, portanto, absolutas. A
reclamatória deverá ser proposta no foro da justiça do trabalho e o divórcio deverá ser proposto
no foro da justiça estadual, na Vara de Família. O advogado prepara as duas petições, entrega
ao estagiário para que distribua a reclamatória na Justiça do Trabalho e o divórcio na Vara da
Família, na Justiça Estadual. O estagiário entrega a reclamatória na Justiça Estadual e o divórcio
na Justiça do Trabalho. Neste caso, o juiz não só pode como também deve reconhecer a sua
competência absoluta de ofício, na forma do art. 64, §1º, CPC. O juízo, portanto, deve declarar
a sua incompetência para processar e julgar uma demanda que seria julgada na Justiça do
Trabalho, por exemplo.
Na incompetência absoluta não há a necessidade de a outra parte arguir a incompetência.
Exemplo: uma causa que versa dano moral por traição na relação conjugal seria causa da
Vara de Família ou Vara Cível? A Vara da Família tem competência material absoluta.
Ressalte-se que nem sempre a competência é tão evidente quanto no exemplo anterior, mas se,
eventualmente, o juiz reconhecer-se incompetente, deverá fazê-lo de ofício.

 Supondo que a incompetência passe ilesa ao juiz, qual a forma de alegação da incompetência
absoluta?
A mesma forma já positivada no CPC/73, ou seja, se o juiz não perceber que é
absolutamente incompetente a partir do contato com a petição inicial, incumbe ao réu alegar
essa incompetência absoluta como preliminar de contestação, na forma do art. 337, II c/c art.
64, caput, ambos do CPC.
Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar:
(...)
II - incompetência absoluta e relativa;

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Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação.
O momento processual recomendado pelo Código para o réu realizar a alegação de
incompetência é na própria contestação, isto é, na primeira oportunidade que o réu tem para se
manifestar nos autos, qual seja, na contestação.
No CPC/73 já havia a possibilidade de o juiz reconhecer oficiosamente sua incompetência
e, também, a forma que o réu alegava essa incompetência, na ausência do reconhecimento
oficioso pelo juiz, era a preliminar de contestação. O NCPC prevê este mesmo procedimento.

 Se o juiz não reconhecer de ofício nem o réu alegar na preliminar de contestação a


incompetência absoluta do juízo, a alegação preclui? A Incompetência absoluta prorroga caso
não seja arguida nestes momentos?

A incompetência absoluta não é preclusiva, o que quer dignificar que, se o juiz não
reconhecer no primeiro contato com a petição inicial e se o réu não alegar em preliminar de
contestação, o réu pode alegar a qualquer momento do processo (por simples petição, por
alegação oral, nas alegações finais, etc.), o juiz pode reconhecer de ofício a qualquer momento
processual, conforme disposto no art. 64, §1º, CPC. A matéria não está sujeita à preclusão.
A respeito no tema, a novidade trazida pelo NCPC reside na consequência do
reconhecimento da incompetência absoluta. O reconhecimento pode gerar duas consequências
distintas no processo civil:
a) O envio dos autos ao juízo competente, sem gerar extinção do processo, pois é
puramente dilatória. Esta consequência já constava no CPC/73.
No CPC/73 estava positivada uma consequência com relação aos atos do juiz quando a
incompetência absoluta. Quando o processo está sob a jurisdição de um juízo, ele pode praticar
3 tipos de atos processuais quanto à sua natureza: atos ordinatórios, que geralmente decorrem
de um despacho (“cite-se”, “intime-se”), são atos relativos ao andamento processual;
instrutórios, por exemplo, colhendo uma prova, ouvindo uma testemunha, determinando a
realização de uma perícia; e decisórios, por exemplo, decidir uma tutela antecipada, um
requerimento incidental, proferir uma sentença, etc.
No CPC/73, o reconhecimento da incompetência absoluta levava à nulidade de todos os
atos decisórios proferidos pelo juiz incompetente. Exemplo: retomando o caso do dano moral
por traição na relação conjugal, se a ação fosse proposta perante juízo incompetente e ele tivesse
proferido uma decisão interlocutória concedendo uma tutela cautelar do arresto de algum bem,
o simples reconhecimento da incompetência absoluta na ocasião levava à nulidade do ato
decisório.
b) No NCPC, os efeitos de atos decisórios do juiz permanecem, a princípio, intocados, de
acordo com o disposto no art. 64, §4°, CPC.
§ 4o Salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo
incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente.

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A princípio, se não houver decisão em contrário do juiz incompetente, todos os atos


praticados pelo juízo incompetente, inclusive os decisórios, permanecem válidos, podendo ser
ratificados ou retificados pelo novo juiz.
Uma pegadinha que está sendo colocada, principalmente pela banca CESPE, é afirmar na
questão que, salvo decisão em contrário, os atos decisórios praticados pelo juízo incompetente
permanecem válidos ou que os atos decisórios praticados pelo juízo incompetente podem
permanecer válidos. As afirmativas estão corretas, vez que o art. 64, §4º, CPC, ressalva
expressamente a possibilidade de os atos decisórios permanecerem válidos.

2.2 INCOMPETÊNCIA RELATIVA


A incompetência relativa é determinada por normas de índole privada, supletivas, que
não dizem respeito a disposições cogentes no ordenamento jurídico.

 A incompetência relativa pode ser reconhecida de oficio?


Exemplo: Ricardo é o autor de uma ação de cobrança na qual almeja receber o valor de
R$10.000,00 de Leandro. Ricardo reside em Curitiba/PR e Leandro tem endereço profissional
em Belo Horizonte/MG. Ao observar o art. 46, CPC, que trata da competência territorial,
relativa por excelência, é de se observar que, caso Ricardo pretenda receber o valor supra
referido pela via judicial, utilizando a técnica processual adequada, não deverá apresentar a
ação de cobrança em seu domicílio, no Paraná. Isto porque, o foro geral para as obrigações no
CPC é o domicílio do réu, portanto, a ação deveria ser proposta em Belo Horizonte. A norma
do exemplo é de índole territorial que, em regra, é de cunho relativo. O credor não consegue
contato com Leandro, mandou carta, ligou, e-mail, já mandou mensagem pelo aplicativo de
celular WhatsApp, já enviou Direct pela rede social Instagram, mas sem sucesso no contato
com o devedor. Dessa forma, ir à BH somente para demandar contra Leandro representa
prejuízo financeiro para o credor e, em razão disso, Ricardo resolve ajuizar a ação no Paraná,
onde reside.
Analisando o art. 64, §1º, CPC, tem-se que propositalmente o legislador não incluiu entre
as regras de reconhecimento de ofício de competência a incompetência relativa. A única
incompetência que deve ser reconhecida e declarada de ofício é a incompetência absoluta. Há,
inclusive, entendimento sumulado do STJ, esposado na Súmula 33, que, apesar de ter sido
fabricada à luz do CPC/73, ainda está vigente, no sentido de que a incompetência relativa não
pode ser reconhecida de ofício pelo juiz.
Súmula 33 - A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício.

Portanto, em regra, a incompetência relativa não pode ser reconhecida pelo juiz.
Entretanto, excepcionalmente, o CPC reconhece hipótese em que o juiz pode ter a sua
incompetência territorial declarada de ofício. A hipótese está positivada no art. 63, §3°, CPC,
in verbis:

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§ 3o Antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo
juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu.

Trata-se de uma situação muito específica de possibilidade de reconhecimento pelo juiz


da incompetência relativa que depende da existência de cláusula de eleição de foro abusiva. O
CPC/73, para aplicação da possibilidade de reconhecimento da incompetência territorial de
ofício, exigia que a cláusula de eleição de foro constasse em contrato de adesão, o que não é
exigido pelo NCPC. Mesmo que o contrato não seja de adesão, se a cláusula for abusiva, cabe
o instituto. O NCPC, portanto, ampliou o cabimento do instituto.
Os requisitos e as particularidades da possibilidade de reconhecimento da incompetência
territorial de ofício serão vistos na próxima aula.

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