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COMARCA DE PONTE NOVA/MG

2ª VARA CÍVEL

Processo n.º 0521.15.020008-2 / 0521.16.001537-1


Natureza: Ação Ordinária / Embargos à Execução
Autor: MUNICÍPIO DE AMPARO DO SERRA
Réu: ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO (ECAD)

SENTENÇA
I - RELATÓRIO

Cuida-se de ação ordinária (autos nº 0521.15.020008-2) ajuizada pelo


Município de Amparo do Serra em face do Escritório Central de Arrecadação e
Distribuição (ECAD), partes devidamente qualificadas.
A inicial de ff. 02/07 foi instruída com os documentos de ff. 08/29. Alega a
municipalidade que sofreu um protesto indevido feito pelo escritório requerido, em
razão de termo de responsabilidade assinado pelo então Prefeito da cidade. Neste
instrumento, o representante do Município confessou dívida proveniente de direitos
autorais relativos à execução pública de obras musicais na festa de carnaval
promovida em Amparo do Serra no ano de 2015.
Aduz o autor que o negócio jurídico se encontra eivado de vícios que obstam
a cobrança pleiteada pelo requerido. Em vista disso, requereu cumulativamente a
declaração de nulidade e anulabilidade do negócio jurídico, bem como a
insubsistência do débito previsto no termo de responsabilidade.
Contestação oferecida pelo requerido às ff. 32/47. Documentos anexos às
ff.48/83. Neste ato, o réu afirmou que a real intenção do município é esquivar-se das
obrigações firmadas em contrato entabulado de forma válida e consciente, assinado
por autoridade dotada de legitimidade para tanto.
Impugnação a contestação à f.84-v.
Audiência de instrução e julgamento realizada à ff. 97, seguida de alegações
finais à f. 97-v.
Vieram-me, então, conclusos os autos para sentença.
Nesta sentença, também serão examinados os embargos à execução (autos
nº 0521.16.001537-1) propostos pelo mesmo autor, ora embargante, em desfavor
do escritório réu, ora embargado, uma vez que a decisão proferida na ação ordinária
principal afetará profundamente o mérito desta outra ação. A seguir, portanto, um
relatório dos embargos à execução.
A exordial de ff. 02/09 resiste à execução de título extrajudicial anteriormente
proposta pelo embargado (autos nº 0521.15.020723-6). Nesta oportunidade, o
embargante reprisou a fundamentação já aduzida na ação ordinária, acrescentando
a alegação de falsidade da assinatura do prefeito no instrumento de confissão de
dívida. O embargado, por sua vez, apresentou impugnação aos embargos (ff. 59/76)
reiterando os argumentos da contestação, bem como defendeu a veracidade da
assinatura que lastreia o título em análise.
Vieram-me, também, esses autos conclusos para sentença.
É o relatório. Decido.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Tendo em vista a conexão entre as partes dos processos, bem como a


realização da audiência de instrução (f. 971), constata-se que o feito encontra-se
devidamente instruído, sem necessidade de novas provas.

Portanto, em atendimento às exigências traçadas no art. 93, inciso IX, da


Constituição Federal, e no art. 489, do Código de Processo Civil, passo a decidir,
fundamentadamente, debruçando-me sobre os argumentos fáticos e jurídicos
trazidos pelos litigantes, julgando simultaneamente os dois processos supra-
relatados.

2.1) Das alegações autorais de ilicitude, potestividade, impossibilidade


e coação na celebração do negócio jurídico.

Em busca da satisfação de sua pretensão, o requerente argui uma série de


vícios para eliminar o título executivo objeto da presente ação, bem como o
respectivo negócio jurídico subjacente.
Primeiramente, vale dizer que a mera alegação de que os cálculos das
cobranças efetuadas pelo ECAD são indiscriminadas, não ilidem o dever de pagar a
retribuição ao autor pela execução da obra musical, cabendo ao ECAD a forma da
regulamentação da cobrança. Neste sentido, o regulamento acostado às f. 53/65
estabelece as regras para a arrecadação dos direitos autorais pelo referido escritório,
que atua nos parâmetros de sua competência.
Outrossim, tal entendimento já restou sufragado na jurisprudência do E. STJ:

CIVIL. DIREITOS AUTORAIS. ESTABELECIMENTO COMERCIAL.


RESTAURANTE/BOATE. ECAD. VALORES. TABELA PRÓPRIA.
VALIDADE.
I. Em estabelecimentos comerciais que funcionam como
bar/restaurante/boate, a reprodução musical faz parte da própria
natureza da atividade comercial, sendo devida a cobrança de direitos
autorais.

1
Devido a maior relevância da ação ordinária para o deslinde do feito, reportaremos prioritariamente às folhas
desses autos (autos nº 0521.16.001537-1) no decorrer da fundamentação.
II - Os valores cobrados pelo ECAD, em face da natureza privada
dos direitos reclamados, não estão sujeitos a tabela imposta por
lei ou pelo Poder Judiciário. Precedentes do STJ.
III - Ao trazer documentos comprobatórios de pagamentos de
mensalidades ao ECAD, reconhecendo que reproduz música
ambiente para seus clientes, reconhece a ré o direito do autor.
Recurso especial provido.
(REsp 509086/RJ, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA
TURMA, julgado em 15/08/2006, DJ 11/09/2006, p. 247) (g.n)

Ainda, quanto à coação narrada pelo requerente, não se constatam provas


constitutivas do direito aduzido pelo autor, que se limita a declarar a ocorrência de
“ameaças graves de interdição do carnaval e imposição de penalidades ao
Município” por parte do agente do ECAD. Desta forma, incumbia ao requerente
comprovar nos autos o fundado temor de dano provocado pelo réu e que
supostamente contaminara o negócio jurídico, já que se trata de fato constitutivo do
seu direito, nos termos do art. 373, I, do CPC.
Por corolário lógico, a improcedência dos pedidos de nulidade ou
anulabilidade do negócio jurídico pelas razões supranarradas é a medida que se
impõe.
.
2.2) Da insubsistência do débito fundada na Lei nº 8.666/93

Paralelamente, o autor se vale da chamada Lei das Licitações (Lei nº


8.666/93) para fundamentar sua pretensão, invocando o artigo 71 para isentar-se do
recolhimento dos encargos comerciais relativos à festa carnavalesca de Amparo do
Serra. O réu, por sua vez, contrapõe-se aos argumentos autorais, aduzindo que o
evento fora organizado pela Administração Pública, a qual não poderia esquivar-se
do cumprimento de suas obrigações.

Neste ponto, como se verá a seguir, faz-se necessário conferir razão ao autor.
Quando são reproduzidas obras musicais protegidas em eventos realizados por
entes públicos, tem-se inegável a possibilidade de cobrança de direitos autorais pelo
ECAD aos respectivos entes. No entanto, o artigo 71 da Lei nº 8.666/93 traz novo
regramento para as hipóteses em que os eventos festivos forem realizados por
empresas que venceram processo licitatório para exercer tal função. Se não,
vejamos:
“Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas,
previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do
contrato.

§ 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos


trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração
Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar
o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e
edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.”

No caso em tela, constata-se que o carnaval realizado no Município de


Amparo do Serra em 2015 foi promovido pelas pessoas jurídicas contratadas pelos
processos licitatórios de nº 007/2015 e nº 006/2015, respectivamente, EXPRESSO
& CIA PRODUÇÕES E EVENTOS e GALAXY PRODUÇÕES E EVENTOS, tal qual
se depreende dos contratos de ff. 21/28. Assim, não pode o requerente responder
pela cobrança dos direitos autorais, tampouco em sede de responsabilidade
solidária, tendo em vista o comando legal exposto alhures.

A única exceção à presente regra encontra-se prevista no § 2º do art. 71 da


Lei n. 8.666/1993, segundo o qual a Administração Pública responde solidariamente
com o contratado pelos encargos previdenciários resultantes da execução do
contrato. Fora dessa específica hipótese, não há que se cogitar em responsabilidade
solidária ou exclusiva do município.

Nesta esteira, também caminha a jurisprudência do Egrégio Tribunal de


Justiça de Minas Gerais, recentemente confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO -


DIREITOS AUTORAIS - LEI Nº 9.610/98 - ECAD - NOTORIEDADE
DO FATO - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE -
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO MUNICÍPIO NÃO
VERIFICADA - SIMPLES AUTORIZAÇÃO PARA A REALIZAÇÃO
DO EVENTO.
A atividade principal da radiodifusão é a publicação de músicas,
sendo este fato público e notório, o que por si só já comprova a
violação ao direito autoral. O art. 28, da Lei nº 9.610/98, Lei de
Direitos Autorais, estabelece como direito exclusivo do autor utilizar,
fruir, dispor da obra literária, artística ou científica, sendo que, a
utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou cientifica,
mediante execução musical, depende de prévia e expressa
autorização do autor. Não demonstrado nos autos a participação do
Município no evento, mas, tão somente, seu apoio e autorização para
a sua realização, fica afastada sua responsabilidade pelo pagamento
dos valores referente a direitos autorais. (TJMG - Apelação Cível
1.0382.13.011886-4/001, Relator(a): Des.(a) Dárcio Lopardi Mendes,
4ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 05/04/0018, publicação da
súmula em 11/04/2018)
O tema em comento também vem se revelando um importante objeto de
estudo pela doutrina, que discute aparente conflito entre as normas da Lei de
Licitações e da Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/1998), uma vez que esta última
prevê a responsabilização solidária da Administração Pública na hipótese em que
houver colaborado de alguma forma para a organização do evento. A este respeito,
o festejado mestre Flávio Tartuce pontua a aplicação do princípio da supremacia do
interesse público sobre o privado, plenamente adequada ao presente caso.

Vejamos:

“Resta aferir se o art. 71 da Lei n. 8.666/1993 pode ser aplicado à


cobrança dos direitos de autor, em confronto com a previsão contida
no art. 110 da Lei n. 9.610/1998, segundo o qual "Pela violação
de direitos autorais nos espetáculos e audições públicas, realizados
nos locais ou estabelecimentos a que alude o art. 68, seus
proprietários, diretores, gerentes, empresários e arrendatários
respondem solidariamente com os organizadores dos espetáculos".

Em princípio, a Administração deveria responder solidariamente pelo


pagamento dos direitos autorais na hipótese de execução pública de
obras musicais, desde que tenha colaborado de alguma forma, direta
ou indiretamente, para a organização do espetáculo. No entanto, na
hipótese em que a participação do ente público está limitada à
contratação de empresa, mediante licitação, para a realização do
evento, surge um aparente conflito de normas a ser dirimido.

O critério da hierarquia não se mostra adequado à solução da


controvérsia, porque ambas são leis ordinárias, tampouco o da
especialidade, segundo o qual a norma especial prevalece sobre a
geral, visto que ambas as normas são especiais, cada qual no seu
âmbito de incidência, ora garantindo o direito particular do autor, ora
protegendo o interesse público. Na espécie, afigura-se mais
pertinente valer-se dos princípios aplicáveis à Administração Pública,
entre os quais o da supremacia do interesse público sobre o privado.

Verifica-se, desse modo, que a absoluta preponderância das regras


contidas na Lei n. 8.666/1991, quando em conflito com a Lei de
Direitos Autorais, é corolário lógico do princípio da supremacia do
interesse público, notadamente para garantir que os fins almejados
no processo licitatório - isonomia entre os concorrentes e seleção da
proposta mais vantajosa - sejam atingidos, conforme salientado
anteriormente.” (Resumo do Informativo 588 do STJ - Flávio Tartuce.
Publicado em 21/09/2016)

Não obstante, cumpre ressaltar que o entendimento ora defendido tem por
propósito apenas retirar eventual responsabilidade de recolher os valores devidos
ao ECAD atribuída ao requerente. Tal qual o requerido salientou às ff. 33/41, o
Escritório Central de Arrecadação e Distribuição é pessoa jurídica legítima para
efetuar a cobrança dos direitos autorais constitucionalmente assegurados aos
autores de obras musicais. Deveria realizá-la, no entanto, em face das empresas
que venceram a licitação, por certo que o requerente não pode dispor arbitrariamente
dos recursos municipais, desonerando as contratadas e prejudicando o interesse
público.

Portanto, o ordenamento jurídico não permite que a Administração Pública


responda pelos encargos comerciais decorrentes de eventos festivos realizados por
empresas contratadas mediante licitação, razão pela qual procede o pedido de
insubsistência do débito pugnado pelo autor.

2.3) Da ineficácia da confissão instrumentalizada no termo de f. 13

Na fundamentação supra, restou evidente que o pagamento do débito relativo


aos encargos comerciais do carnaval realizado em Amparo do Serra no ano de 2015
não é responsabilidade do referido Município, ora requerente, nos termos do artigo
71 da Lei nº 8.666/93. Ainda assim, constata-se nos autos que o então Prefeito de
Amparo do Serra assinou o termo de responsabilidade e confissão de dívida de nº
9.619, afirmando o débito relativo ao pagamento dos direitos autorais do evento
ocorrido na cidade.

O requerido fundamenta sua contestação, em grande parte, na validade do


referido termo, que foi celebrado por agente capaz, seguindo forma não defesa em
lei e tendo objeto lícito, possível e determinado. É cediço que o Prefeito, autoridade
máxima do Município, possui legitimidade para confessar dívidas do ente público
pelo qual responde.

Por outro lado, conforme já se viu exaustivamente no caso em análise, as


empresas contratadas para executar carnaval de Amparo do Serra no ano de 2015
são as verdadeiras responsáveis pelos encargos comerciais arrecadados pelo
requerido. Nos termos da Lei nº 8.666/93, “a inadimplência do contratado, com
referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à
Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento”.

Nesse sentido, conclui-se que o então Prefeito não poderia confessar uma
dívida que jamais foi contraída pelo ente municipal, por certo que estaria dispondo
livremente do patrimônio público. Assim ocorre em função da natureza jurídica do
requerente, pessoa federativa que constitui a Administração Pública direta.

Como se sabe, o Poder Executivo não possui livre disposição dos bens e
interesses públicos, uma vez que atua em nome da coletividade. Por consequência,
encontra-se cercado de sujeições administrativas, impostas pela Lei com o intuito de
evitar lesões ao interesse público. A título de exemplo, citamos as restrições
enfrentadas pelos entes federativos para a alienação de bens, que só podem ocorrer
nos termos previstos em lei.

A doutrina já se posicionou a este respeito, relativizando a eficácia contida no


instrumento de confissão de dívida nos casos em que tratar de bem indisponível.
Vejamos:

“Modernamente, a confissão não é mais considerada “a


rainha das provas”, nem sempre sendo suficiente para o deslinde do
feito (testis unus, testis nullus). Note-se que, ainda que se
considerem verdadeiros os fatos, nem sempre o resultado de um
processo será contrário ao confitente, pois pode suceder que, ainda
que verdadeiros os fastos, destes não decorram as consequências
jurídicas afirmadas pela outra parte.” (Código Civil Comentado –
JOSE MIGUEL GARCIA MEDINA e FABIO CALDAS DE ARAUJO –
Editora Revista dos Tribunais, Publicado em 2014)

Dessa forma, conforme a fundamentação supra, o termo de responsabilidade


e confissão de dívida constante de f. 13 é ineficaz.

III – DISPOSITIVO

Diante do exposto, quanto à ação ordinária, JULGO PARCIALMENTE


PROCEDENTES OS PEDIDOS contidos na inicial para DECLARAR A
INSUBSISTÊNCIA DO DÉBITO DE R$ 3.584,74 (três mil quinhentos e oitenta e
quatro reais e setenta centavos), bem como a INEFICÁCIA DO INSTRUMENTO DE
CONFISSÃO DE DÍVIDA anexado à f. 13, do qual se originou o débito insubsistente.
Por consequência, com fulcro no disposto no art. 487, I, do CPC, RESOLVO O
PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.

Em vista da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das


custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor
atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, na proporção de 70% para
o autor e 30% para o réu. Observada a isenção do requerente ao pagamento de
custas e despesas processuais.

Além disso, no que tange aos embargos à execução, JULGO


PROCEDENTES OS PEDIDOS do embargado para DECLARAR A
INSUBSISTÊNCIA DO DÉBITO DE R$ 3.584,74 (três mil quinhentos e oitenta e
quatro reais e setenta centavos), bem como a INEFICÁCIA DO INSTRUMENTO DE
CONFISSÃO DE DÍVIDA anexado à f. 13, do qual se originou o débito insubsistente.
Por consequência, com fulcro no disposto no art. 487, I, do CPC, RESOLVO O
PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.

Em vista da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das


custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor
atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, na proporção de 70% para
o autor e 30% para o réu. Observada a isenção do requerente ao pagamento de
custas e despesas processuais.

Publique-se, registre-se e intimem-se.

Ponte Nova/MG, 16 de julho de 2018.

71, lei 8666/93

110, Lei 9.610/98

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO AUTOR. MUNICÍPIO. OBRA MUSICAL.


EXECUÇÃO PÚBLICA. LICITAÇÃO. EMPRESA. CONTRATAÇÃO. ENCARGOS
COMERCIAIS. REPASSE. IMPOSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA.
AFASTAMENTO. ART. 71, § 1º, DA LEI N.º 8.666/1991. INTERESSE PÚBLICO.
SUPREMACIA.
1. É possível a cobrança de direitos autorais, pelo ECAD, na hipótese de execução
de obras musicais protegidas em eventos realizados por entes públicos,
independentemente da existência de fins lucrativos.
2. Hipótese em que os eventos festivos, com execução pública de obras musicais,
foram realizados por empresas contratadas mediante licitação para esse fim
específico.
3. Nos termos do art. 71, § 1º, da Lei n.º 8.666/1991, é vedada a transferência à
Administração Pública da responsabilidade pelo pagamento dos encargos
comerciais resultantes da execução do contrato.
4. A obrigatoriedade do pagamento de direitos autorais, ainda que por expressa
previsão legal, não retira a natureza eminentemente privada da relação jurídica,
além de permitir a inserção dos valores cobrados pelo ECAD no conceito de
"encargos comerciais".
5. A responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais na hipótese de
execução de obra musical em evento realizado por empresa contratada para esse
fim, mediante licitação, não pode ser transferida para a Administração, salvo se
comprovada a ação culposa desta última quanto ao dever de fiscalizar o
cumprimento dos contratos públicos (culpa in eligendo ou in vigilando), conforme
decidido no julgamento da ADC nº 16/DF.
6. A preponderância das regras contidas na Lei nº 8.666/1991, quando em conflito
com a lei de direitos autorais, é corolário lógico do princípio da supremacia do
interesse público, notadamente para garantir que os fins almejados no processo
licitatório - isonomia entre os concorrentes e seleção da proposta mais vantajosa -
sejam atingidos.
7. Entendimento que não retira o direito do autor, constitucionalmente assegurado,
de receber retribuição pela utilização de suas obras, mas apenas define quem é o
responsável pelo recolhimento dos valores devidos ao ECAD.
8. Recurso especial não provido.
(REsp 1444957/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA
TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 16/08/2016)

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE PRECEITO LEGAL


C/C PEDIDO LIMINAR C/C PERDAS E DANOS - ECAD - DIREITOS AUTORAIS -
MUNICÍPIO - LEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA CONTRATO DE
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PARA REALIZAÇÃO DO EVENTO -
RESPONSABILIDADE DA EMPRESA PROMOTORA DE EVENTOS - RECURSO
NÃO PROVIDO.

Consoante Art. 71 da Lei nº 8.666/93, que rege a contratação e licitação pelo poder
Público, "o contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários,
fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato". E conforme seu § 1º, " A
inadimplência do contratado com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e
comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu
pagamento".

Prevalece a Lei que rege a Administração Pública, que é específica e especial,


sobre a Lei nº 9610/98 que regula os direitos autorais, sendo inaplicável o seu art.
110 ao Poder Público.

O pagamento dos direitos autorais devidos ao ECAD, decorrentes do objeto da


contratação com a municipalidade, deve ser arcado pela empresa
contratada. (TJMG - Apelação Cível 1.0572.10.001696-1/002, Relator(a): Des.(a)
Vanessa Verdolim Hudson Andrade , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em
14/09/2015, publicação da súmula em 22/09/2015)
 Extingue a execução nessa sentença, acolhendo os embargos. A

- Inexigibilidade do título executivo:

Verifica-se que a execução, em apenso, foi ajuizada em razão dos Termos de


Responsabilidade e Confissão de Dívida n. 7.444 e n. 7.452 (f. 8, f. 13), nos quais
a Prefeitura Municipal de Jequitinhonha, através de seu representante legal,
devidamente identificado, confessou ser devedora das quantias, respectivas,
R$ 7.691,78 e R$ 8.657,00. No primeiro Termo, firmado pela Prefeitura em
05/02/2013, a quantia é relativa ao pagamento dos direitos autorais do evento
musical denominado Carnaval Jequitinhora 2013, realizado nos dias 09, 10, 11 e
12 de fevereiro de 2013. E, no segundo Termo, firmado pela Prefeitura em
20/09/2013, a quantia é relativa ao pagamento dos direitos autorais do evento
musical denominado Aniversário da Cidade de Jequitinhonha 2013, realizado nos
dias 20 e 21.

Como cediço, a confissão de dívida consiste em verdadeiro reconhecimento do


débito e, observa-se que, os Termos de Responsabilidade e Confissão de Dívida
foram firmados pela Prefeitura Municipal de Jequitinhonha antes da realização dos
eventos musicais e, cada qual, expressa o valor certo, e os débitos se encontram
vencidos e não pagos.

Constata-se, ainda, que a cláusula VI é expressa em dispor que o não pagamento


dos respectivos boletos bancários, até a data de seu vencimento, acarretaria a
execução dos Termos firmados, na forma do art. 585, II, do CPC, com aplicação de
multa de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado, além de juros de 1% (um
por cento) ao mês.

Quanto à alegação de ilegitimidade da cobrança, haja vista que os eventos foram


realizados por meio de licitação, cabe esclarecer que, a jurisprudência do colendo
Superior Tribunal de Justiça sedimentou no sentido de que a cobrança da verba
autoral independe da análise da utilidade econômica do evento, conforme segue:

Logo, os referidos instrumentos atendem aos requisitos estipulados no art. 585, II,
do CPC, sendo, portanto, títulos executivos extrajudiciais, revestidos de liquidez,
certeza e exigibilidade.

Isso posto, rejeito a preliminar de inexigibilidade do título.

No tocante ao requisito da exigibilidade para a validade do título executivo, vale a


lição de Daniel Amorim Assumpção Neves, a seguir:

(omissis) “Por exigibilidade entende-se a inexistência de


impedimento à eficácia atual da obrigação. Interessante notar que a
exigibilidade não é um elemento intrínseco do título executivo como
são a liquidez e a certeza, dependendo para existir de atos que não
compõem o objeto do título;”

Bruno Henrique Tenório Taveira


Juiz de Direito

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