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Instrumentos Harmônicos

As principais preocupações para músicos de instrumentos


harmônicos/polifônicos, ou instrumentos que podem facilmente tocar mais de
uma nota de cada vez, como o piano, órgão, violão, e os vários instrumentos da
família do xilofone, são aberturas de acordes (ou voicing), rearmonização, e
acompanhamento rítmico.

Aberturas de Acordes
No jazz, quando o músico pede um acorde Cmaj7, isso quase nunca significa
que um pianista deva tocar "Dó Mi Sol Si". Geralmente, o pianista escolhe
alguma outra maneira de tocar esse acorde, mesmo que seja simplesmente
uma inversão da posição fundamental do acorde. Livros inteiros foram escritos
sobre o assunto de abertura de acordes ("voicing" em inglês). A discussão aqui
somente arranha a superfície das possibilidades. Eu categorizei vagamente as
aberturas descritas aqui como aberturas 3/7, aberturas em quartas (ou
quartais), poliacordes, aberturas de posição fechada e aberturas drop, e outras
aberturas baseadas em escalas.

Rearmonização
Um músico no acompanhamento pode ocasionalmente rearmonizar uma
progressão de acordes para sustentar o interesse, introduzir um contraste, ou
criar tensão. Isso envolve substituir alguns dos acordes grafados ou esperados
por outros acordes. Uma substituição, como a substituição pelo trítono, é um
tipo de rearmonização.

Alguns músicos passam muito tempo tentando diferentes rearmonizações ao


trabalhar numa música. Entretanto, a menos que digam de antemão ao solista
o que vão fazer, muitas das rearmonizações que eles podem oferecer não são
práticas para uso num acompanhamento, já que o solista vai estar tocando a
partir de um conjunto diferente de mudanças de acordes. Há algumas
rearmonizações simples que podem ser usadas sem perturbar muito o solista. A
substituição pelo trítono é um exemplo; toda vez que um acorde de sétima da
dominante é pedido, o músico de acompanhamento pode substituí-lo pelo
acorde de sétima da dominante a um trítono de distância. Isso cria exatamente
o mesmo tipo de tensão que é criada quando o solista faz ele mesmo essa
substituição. Uma outra rearmonização simples é mudar a qualidade do acorde.
Ou seja, tocar um D7alt no lugar de um Dm, e assim por diante.
Outra rearmonização comum é substituir um acorde da dominante por uma
progressão ii-V. Isso já foi demonstrado quando discutimos a progressão de
blues; uma das progressões substituiu o acorde F7 no compasso 4 por um Cm7
- F7. Isso é especialmente comum no fim de uma frase, levando à tônica no
começo da próxima frase. A maioria das opções de escala que os solistas
possam estar usando sobre um acorde F7 também funcionarão sobre o acorde
Cm7, por isso essa rearmonização geralmente não cria muita tensão. Essa
técnica pode ser combinada com a substituição pelo trítono para criar uma
rearmonização mais complexa. Em vez de substituir o V por um ii-V, primeiro
substitua o V pelo acorde a um trítono, e aí sim substitua esse acorde por um ii-
V. Por exemplo, no compasso 4 do blues em Fá, primeiro troque o F7 pelo B7, e
então troque isso por F#m7 - B7.

Outro tipo de rearmonização envolve o uso de alternação. Em vez de tocar


vários compassos de um dado acorde, o músico no acompanhamento pode
alternar entre ele e o acorde meio tom acima ou abaixo, ou um acorde da
dominante uma quinta abaixo. Por exemplo, num acorde G7, você pode alternar
entre G7 e Ab7, ou entre G7 e F#7, ou entre G7 e D7. Isso é especialmente
comum nos estilos baseados no rock, em que a alternação é executada
ritmicamente. Se a alternação é executada regularmente, como por exemplo no
decorrer de um chorus inteiro, ou mesmo a música inteira, o solista precisa ser
capaz de captar isso e controlar a quantidade de tensão produzida, tocando
junto com a rearmonização ou tocando contra ela. Ou seja, o solista pode
reduzir a tensão trocando escalas à medida que você troca de acordes, ou
aumentar a tensão mantendo a escala original.

Acompanhamento Rítmico
Uma vez que tenha decidido que notas quer tocar, você precisa decidir quando
tocá-las. Não dá para tocar simplesmente semibreves ou mínimas; o seu
acompanhamento precisa em geral ser ritmicamente interessante, sem no
entanto distrair o solista ou o ouvinte.

Há poucas instruções que possam ser dadas para se tocar acompanhamento


com ritmo. Como há muito pouca teoria em que se escorar, a primeira fração de
conselho que eu posso dar é ouvir a outros músicos de acompanhamento. Com
muita frequência, tendemos a ignorar todos, exceto o solista. Lembre-se de
escolher álbuns que tenham músicos que, além de fazer o acompanhamento,
façam solos instrumentais. Entre os pianistas a serem ouvidos devem estar Bud
Powell, Thelonious Monk, Horace Silver, Bill Evans, Wynton Kelly, Herbie
Hancock e McCoy Tyner. Os pianistas devem também ouvir guitarristas e
músicos de vibrafone ou xilofone; geralmente os limites desses instrumentos
podem levar a ideias que você não teria de outra maneira.

Guitarristas devem ouvir pianistas, mas também guitarristas de jazz como Herb
Ellis, Joe Pass, e Wes Montgomery. Geralmente, os guitarristas trabalham
paralelamente aos pianistas, e o estilo deles quando há um pianista no grupo
pode variar em relação a como eles tocam quando são o único instrumento
harmônico no acompanhamento. Por exemplo, alguns guitarristas tocam
somente acordes curtos em cada tempo se houver um pianista tocando a maior
parte do material rítmico. Outros ficam de fora (param de tocar)
completamente. Por esse motivo, é especialmente importante ouvir guitarristas
em diferentes tipos de contexto.

Também se deve ouvir gravações que não têm nenhum acompanhamento


harmônico, como qualquer um dos vários álbuns de Gerry Mulligan, Chet Baker,
ou até mesmo do quarteto Ornette Coleman. Tente tocar junto com eles. Isso
vai muitas vezes ser difícil, já que a música foi gravada com o entendimento de
que não haveria acompanhamento harmônico, por isso os solistas e outros que
estão fazendo o acompanhamento geralmente deixam pouco espaço para um
piano ou violão. Praticar o acompanhamento nesse tipo de situação pode ajudar
você a evitar exagerar no acompanhamento. A maioria dos músicos iniciantes
de acompanhamento, como muitos solistas iniciantes, tende a tocar notas em
excesso. Do mesmo modo que o espaço pode ser uma ferramenta eficiente
durante um solo, pode ser ainda mais eficiente quando se está acompanhando.
Deixe o solista tocar com somente o baixista e o baterista durante uns poucos
compassos, ou mais, de vez em quando. Ficar de fora e deixar o solista sem
acompanhamento de instrumento harmônico é às vezes chamado
de strolling(passear). McCoy Tyner, Herbie Hancock e Thelonious Monk
frequentemente ficavam de fora durante solos inteiros.

Imaginar a si próprio exercendo um papel secundário no arranjo de uma grande


banda às vezes ajuda. Quando estiver confortável com uma progressão de
acordes específica, e não mais tiver que se concentrar integralmente somente
em tocar as notas "certas", você poderá dedicar-se ao conteúdo rítmico e até
melódico de seu acompanhamento. Ouça os acompanhamentos de sopros em
algumas gravações de orquestras de jazz, como as de Count Basie, para ver
como o acompanhamento pode ser melódico.

Certos estilos de música pedem padrões rítmicos específicos. Por exemplo,


muitas formas de música antes da Era do Bebop usavam o padrão stride na
mão esquerda, que consiste em alternar a nota do baixo em 1 e 3 com uma
abertura de acorde em 2 e 4. Muitos estilos baseados no rock também
dependem de padrões rítmicos, geralmente específicos de uma música
individual. Embora os estilos brasileiros como a bossa nova e o samba, na
maneira como tocados pela maioria dos músicos de jazz, não tenham padrões
de acompanhamento bem definidos, outros estilos de jazz latino, especialmente
as formas afro-cubanas que são às vezes coletivamente conhecidas como salsa,
usam um motivo repetido de dois compassos, chamado montuno. Um padrão
rítmico típico é o "e-do-1, e-do-2, e-do-3, e-do-4; 1, 2, e-do-2, e-do-3, e-do-
4". Esses dois compassos podem ser invertidos se o padrão de bateria utilizado
(ver abaixo) também for invertido. Uma descrição integral do papel do piano no
jazz latino e outros estilos está fora do escopo desta Introdução. Uma boa
discussão pode ser encontrada no livro The Jazz Piano Book, de Mark Levine.

O aspecto mais importante do acompanhamento na maioria dos estilos é como


se comunicar com o solista. Há várias formas que essa comunicação pode
assumir. Por exemplo, há a pergunta e resposta, em que você essencialmente
tenta ecoar ou responder o que o solista tocou. Isso é especialmente eficiente
se o solista estiver tocando frases curtas, simples, com pausas entre elas. Se o
solista estiver trabalhando num motivo rítmico repetido, geralmente dá para
antecipar o eco e tocar na verdade junto com o solista. Às vezes você também
pode conduzir o solista a direções que de outro modo ele poderia não ter
tentado. Por exemplo, você pode iniciar um motivo rítmico repetido, o que pode
encorajar o solista a ecoar você. Alguns solistas gostam desse tipo de
acompanhamento agressivo, outros não. Você terá que praticar com cada
solista para ver até que ponto poderá conduzi-lo.

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