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O Rio de janeiro na virada do século XIX para o século XX foi palco de importantes
mudanças na sociedade brasileira. A recém proclamada República trouxe consigo
necessidades de modificar a estrutura de funcionamento da cidade, visto que esta
recebia o importante título de capital. Sendo assim, a partir do ano de 1902, uma
série de mudanças foram promovidas com o intuito de reorganizar o espaço urbano do
Rio de Janeiro. A chamada reforma Pereira Passos empreendeu mudanças significativas
na cidade, reestruturando toda a sua arquitetura e promovendo a modernização,
inaugurada com a recém proclamada República. O século XIX foi decisivo para
questões sociais, econômicas e políticas. Um novo Brasil, com novas necessidades.
A capital da recém-criada República era de fama detestável, conhecida como a
“capital da morte”. De arquitetura pitoresca, becos e vielas faziam do centro
urbano carioca um lugar escuro e de larga proliferação de epidemias mortíferas.
Aniquilar essa imagem era essencial, visto que a cidade era o cartão postal de
veiculação da imagem do Brasil no exterior, a porta de boas-vindas. Missão
encarregada pelo presidente Rodrigues Alves ao ser eleito, pretendia modificar a
estrutura urbana carioca para lhe dar o ar de avanço e modernidade. Inaugurar,
junto ao advento republicano, um começo do novo Brasil que acabara de nascer.
Antecedendo o advento republicano, e sendo um dos fatores para a culminação do
mesmo, a lei de 13 de maio de 1888 mudou o modelo de produção que sustentou todo o
regime colonial. A libertação dos cativos pela Lei Áurea deve ser analisada
concomitantemente as questões aqui levantadas, visto que foi de suma importância ao
contribuir no inchaço populacional sentido pela sociedade carioca na virada do
século XIX para o século XX. O inchaço urbano provocado pela decadência do regime
escravocrata possibilitou acontecimentos fundamentais. Ondas de emigrantes vieram
para a capital com a intenção de ocupar cargos, agora abertos devido a mudança no
modo de produção. O inchaço urbano, a falta de planejamento e administração da
cidade, falta de saneamento básico e condições higiênicas deploráveis contribuíram
para a proliferação de diversas epidemias que assolavam os cidadãos cariocas e
afastava quem cogitava embarcar no país.
Entendendo o jornal como uma fonte rica e primária para a compreensão da
mentalidade da sociedade do período, utilizaremos como fonte o jornal a Gazeta de
Notícias em busca de evidenciar qual é a formatação que a sociedade carioca tomou a
partir das mudanças estruturais e também reformistas na investida Pereira Passos.
Busca-se no presente trabalho analisar o contexto do Rio de Janeiro do final do
século XIX e início do século XX, tendo como delimitação temporal o período do
governo Pereira Passos (1902-1903). Em nossa pesquisa iremos entender como o Rio de
Janeiro, a então capital da República, teve o seu destaque como palco das mudanças
iniciadas no fim do século XIX, como a abolição da escravidão e a proclamação da
República. Nosso objetivo foi analisar como essas mudanças, juntamente com o
projeto idealizado pela burguesia e executado pelo prefeito Pereira Passos foram
cruciais na contribuição da segregação social dentro do espaço urbano carioca.
O RIO DE JANEIRO NO INÍCIO DO SÉCULO XX
Em 1889, com o advento republicano, o Brasil experimentava um momento de
recriação. A república, para muitos, representava a inauguração de um novo Brasil
onde o jogo político se tornaria mais dinâmico e participativo, dando oportunidades
de inclusão para aqueles que antes tiveram sido excluídos das decisões públicas. O
novo modelo republicano simbolizava a esperança, o avanço, a superação e o moderno,
podendo colocar o país ao lado das nações inauguradas na Europa durante o século
XVIII. Sendo o Rio de Janeiro sede do antigo Império e a região de maior influência
nacional, foi a cidade que mais sentiu a intensidade das agitações que se moviam e
que culminaram na abolição da escravidão e na proclamação da República¹.
Resumidamente, a capital fluminense foi palco das grandes mudanças proporcionadas
pela campanha militar de 1889 e berço da incipiente modernidade². Sendo uma área de
influência nacional devido a sua importância política e econômica, O Rio de Janeiro
durante os primeiros anos de República recebe em seu território ondas de imigração
e de migração, como aponta CARVALHO (1987), onde as estatísticas apontam o
crescimento populacional na antiga capital com somas que chegam a corresponder o
aumento de 3,23% no período de 1890-1900. O aumento populacional ocasionou severos
impactos no cotidiano dos habitantes fluminenses. Uma cidade marcada pelo inchaço
urbano, falta de planejamento urbanístico e incapacidade administrativa se viu
incapaz de absorver em sua organização esse contingente extra populacional,
causando assim uma onda de subempregados e desempregados que se aglutinavam nos
centros da capital formando um exército cada vez maior de reservistas industriais,
sem ocupação fixa, disputando os escassos cargos que existiam na recém-formada
República e disputando também a atenção da vigilância policial.
O Rio de Janeiro nos primeiros anos da República foi marcado por dificuldades que
eram frequentes e observadas anteriormente na história municipal, e que foram
agravadas pelo aumento populacional. Questões como o abastecimento de água,
saneamento básico e disponibilidade de habitações para as classes menos abastecidas
ficaram em voga e denunciaram o caráter de insuficiência da administração do
município. A especulação imobiliária do Rio de Janeiro cobrava de seus inquilinos
aluguéis exorbitantes no centro, lugar mais procurado por ser o lugar com maior
concentração de empregos, que não acompanhavam as condições das classes com menos
recursos, sendo essas obrigadas a habitarem casas de cômodos, cortiços ou então
casebres nos morros que cercavam o centro da cidade. As péssimas condições de vida
na capital possibilitaram o surto de epidemias mortíferas, que assolava o rio de
janeiro e se alastravam facilmente por meio da cidade mal planejada e administrada.
O estado operava de forma privada o que era a coisa pública, sendo estabelecido um
projeto elaborado por poucos e alcançando poucos. O grosso do contingente
populacional do Rio de Janeiro estava as margens do processo
civilizador/conservador, sendo ele, o povo, entendido como causa mor da
representação do atraso.
A capital da recém-criada República era de fama detestável, conhecida como a
“capital da morte”. De arquitetura pitoresca, becos e vielas faziam do centro
urbano carioca um lugar escuro e de larga proliferação de epidemias mortíferas.
Aniquilar essa imagem era essencial, visto que a cidade era o cartão postal de
veiculação da imagem do Brasil no exterior, a porta de boas-vindas. Missão
encarregada pelo presidente Rodrigues Alves ao ser eleito, pretendia modificar a
estrutura urbana carioca para lhe dar o ar de avanço e modernidade. Inaugurar,
junto ao advento republicano, um começo do novo Brasil que acabara de nascer. A
reforma veio como força de ruptura de um recente passado colonial e escravista,
onde os elementos arcaicos e duradouros estavam presentes na estrutura
organizacional do espaço carioca, como também na sua estrutura arquitetônica.
O Rio de Janeiro ocupava lugar privilegiado na economia nacional, porto de entrada
e de mercadorias importadas e de escoação dos produtos a serem exportados. A
economia brasileira do período era baseada na exportação de produtos agrários,
definindo assim o papel brasileiro na organização mundial do trabalho como país
agroexportador, que agora operava o seu meio de produção com mão-de-obra paga.
Atrair o imigrante, principalmente europeu, para trabalhar na grande lavoura era
também um dos pontos da reforma. Trazer civilidade através da reformulação urbana e
também através do imigrante branco. Não podemos perder de vista a ocupação do negro
no espaço urbano, assunto que será aprofundado no próximo capítulo.
O Rio de janeiro na virada do século XIX para o século XX foi palco de importantes
mudanças na sociedade brasileira. A recém proclamada República trouxe consigo
necessidades de modificar a estrutura de funcionamento da cidade, visto que esta
recebia o importante título de Capital Nacional da República e era um ponto
fundamental na economia nacional. O porto carioca era responsável pelo maior
contingente de exportação de café e pela importação de industrializados de todos os
tipos. A cidade do Rio de Janeiro, que fora palco principal de grandes
acontecimentos políticos, necessitava de uma significativa reforma e reelaboração
do seu espaço com finalidade de a) modernizar e “embelezar” o cartão postal
brasileiro; b) organizar o espaço urbano com finalidade de conter os avanços das
classes populares nesse espaço; c) atrair para o país imigrantes que serviriam para
a nova dinâmica assalariada e também para o projeto de embranquecimento cultural e
étnico.
Um modelo de civilização que não absorvia na sua base prática os pobres que
habitavam os cortiços, pelo contrário, a modernização veio como forma de exterminar
o atraso representado pelos pobres. A burguesia se empenha nesse projeto,
incorporando no aparelho estatal uma ação nacionalizante, baseada em seus
interesses genuínos de manutenção da organização social vigente. O pobre era
sinônimo de atraso e insalubridade. Nesse sentido, as campanhas sanitárias tiveram
o sem maior alvo as habitações populares. Casas de arquitetura horrenda, sem luz e
ventilação, habitadas por uma população que não conhecia princípios básicos de
higiene e necessitavam ser higienizados, ou melhor, expulsos daquele ambiente.
As principais pressões modernizadoras que marcaram a virada do século XIX para o XX
tinham objetivos diversos. Em uma sociedade, a organização do espaço urbano é
equivalente ao controle burguês sobre sua horda subordinada. A ideia de “Nação
Brasileira” sempre se estabeleceu pautada em privilégios, estes raciais, econômicos
e, como consequência, políticos. Segundo FERNANDES (1975), tanto o projeto
econômico como o projeto social de “Nação” correspondiam à interesses particulares
que eram absorvidos no aparelho estatal como interesses nacionais. Em suma, o
projeto urbano modernizador das grandes capitais foi um projeto arquitetado para
atender às demandas das elites, que se viam como os únicos correspondentes à
sociedade civil.
“Quando a burguesia assume o controle do Estado, intervém através deste no
desenvolvimento das cidades, ordenando-o conforme suas necessidades e interesses.
Surge o conceito de civilidade e de modernização urbana, e a questão sanitária
contribui em muito para tais discussões, uma vez que pobreza se associa a
insalubridade” Rocha Porto, Oswaldo, A Era das demolições, Cidade do Rio de
Janeiro:1870-1920. Prefeitura do Rio de Janeiro, 1986 p.26.
A Gazeta, de fato, não apresentava uma postura engajada. Era um jornal que se
mostrava distinto dos demais em termos de conteúdo por uma característica especial,
a relevância que dava aos escritos literários. A Gazeta se tornou o jornal mais
vendido na capital, quer seja pelo seu preço acessível e popular, por sua tática de
venda de exemplares avulsos, mas, também, pela inovação do conteúdo no meio das
notícias e nas colunas destinadas à literatura. Grandes nomes passaram pelo
periódico. Nomes como Machado de Assis, que possuía colunas diárias nas quais
escrevia contos e tiragens, Olavo Bilac, José do Patrocínio, Aluísio Azevedo, entre
outros. Escrever na Gazeta de Notícias era prestígio e sinônimo de bons
vencimentos, o chefe de redação Ferreira Araújo se encarregava de selecionar os
melhores nomes da literatura para compor o time do jornal, uma espécie de troca de
favores, como bem indaga ASPERTI (2005), em sua pesquisa sobre A Gazeta de
Notícias. Ela nos apresenta a seguinte consideração:
Na verdade, podemos chamar essa abertura orquestrada por Ferreira de Araújo de “uma
troca de favores”, pois, ao passo que este consagrava os escritores dando-lhes
colunas fixas ou esporádicas em suas páginas, também consolidava a Gazeta de
Notícias como um jornal que prezava a literatura, o diferencial do moderno
periódico. O apego aos textos literários enobrecia o jornal popular dando-lhe, ao
mesmo tempo, certo status elevado e matéria interessante a ler para a elite
burguesa letrada. Sendo assim, escolhia de modo criterioso aquele que teria o
supremo privilégio de participar do grande jornal do momento. Não era aceito nas
páginas da Gazeta nenhum estreante ou mesmo já tarimbado escritor que não tivesse
excelente fama e currículo invejável.
A Gazeta de Notícias era reconhecida e entendida por seus contemporâneos como sendo
um jornal neutro (VIDIPÓ, 2016). O próprio periódico trabalhava sua imagem de tal
forma. Porém, será necessário apontarmos o posicionamento tomado pela Gazeta em
momentos importantes de mudanças na estrutura social do país no século XIX,
contribuindo para o mapeamento do perfil do impresso. Em 1888, o país atravessava
um momento crucial: a pressão dos movimentos de libertação dos escravos, culminando
no sancionamento da decisiva lei de treze de maio de 1888, a Lei Aurea. O jornal,
no entanto, não se posicionou nos primeiros anos de tensão das discussões. Como
observa VIDIPÓ (2016), apenas a partir de março de 1888, às vésperas do
pronunciamento real, que a Gazeta apresenta um posicionamento diante aos
acontecimentos.
No entanto, a partir do mês de março inicia-se uma mudança de posição no jornal com
pequenas notas de proprietários de escravos que libertavam seus cativos sem
condições. No dia 9 de março de 1888, o jornal informa a tomada de decisão da
Assembleia Provincial de São Paulo de instituir um imposto sobre a propriedade dos
cativos. O periódico, então, comemora dizendo que a abolição estava posta, pois o
imposto de 400$000 inviabilizava a permanência da posse dos escravizados, ou
melhor, a escravidão na província. VIDIPÓ, George. A Gazeta De Notícias Do Rio De
Janeiro e os momentos decisivos (1888-1889). p. 3.
A comemoração acerca da inviabilidade da manutenção da escravidão contradiz a
neutralidade proposta pelo jornal. Segundo VIDIPÓ (2016) apud. PESSANHA (2006), a
neutralidade não existia, era mera estratégia de venda dos periódicos com o intuito
de alcançar um maior público. Sendo assim entendido, enquadraremos a Gazeta no
quadro dos jornais não neutros. A sua parcialidade contraditória se intensifica no
ano de 1889, onde o seu posicionamento contrário ao império e a favor da república
passa a tomar contornos. No dia quatorze de julho de 1889, é estampada em sua
primeira página uma gravura em homenagem ao centenário da Revolução Francesa e da
Queda da Bastilha. Mudando o seu esquema de publicações, a gravura abrangia o
público não letrado e gerava impacto naqueles que sabiam ler.
A república voltou a ter ênfase em 14 de julho de 1889, com o centenário da
Revolução Francesa e a Queda da Bastilha. O jornal muda a estratégia da primeira
página, em vez de uma grande manchete, publica uma grande gravura da Bastilha
compondo com um histórico daquele dia de 1789, assinado por Michelet. A gravura era
um inovador recurso técnico que o Gazeta de Notícias havia implantado em novembro
do ano anterior. Com esse recurso o periódico podia atingir um público não letrado
e ser marcante para o letrado. VIDIPÓ, George. A Gazeta De Notícias Do Rio De
Janeiro e os momentos decisivos (1888-1889). p. 8
A Gazeta de Notícias era reconhecida e entendida por seus contemporâneos como sendo
um jornal neutro (VIDIPÓ, 2016). O próprio periódico trabalhava sua imagem de tal
forma. Porém, será necessário apontarmos o posicionamento tomado pela Gazeta em
momentos importantes de mudanças na estrutura social do país no século XIX,
contribuindo para o mapeamento do perfil do impresso. Em 1888, o país atravessava
um momento crucial: a pressão dos movimentos de libertação dos escravos, culminando
no sancionamento da decisiva lei de treze de maio de 1888, a Lei Aurea. O jornal,
no entanto, não se posicionou nos primeiros anos de tensão das discussões. Como
observa VIDIPÓ (2016), apenas a partir de março de 1888, às vésperas do
pronunciamento real, que a Gazeta apresenta um posicionamento diante aos
acontecimentos.
No entanto, a partir do mês de março inicia-se uma mudança de posição no jornal com
pequenas notas de proprietários de escravos que libertavam seus cativos sem
condições. No dia 9 de março de 1888, o jornal informa a tomada de decisão da
Assembleia Provincial de São Paulo de instituir um imposto sobre a propriedade dos
cativos. O periódico, então, comemora dizendo que a abolição estava posta, pois o
imposto de 400$000 inviabilizava a permanência da posse dos escravizados, ou
melhor, a escravidão na província. VIDIPÓ, George. A Gazeta De Notícias Do Rio De
Janeiro e os momentos decisivos (1888-1889). p. 3.
A comemoração acerca da inviabilidade da manutenção da escravidão contradiz a
neutralidade proposta pelo jornal. Segundo VIDIPÓ (2016) apud. PESSANHA (2006), a
neutralidade não existia, era mera estratégia de venda dos periódicos com o intuito
de alcançar um maior público. Sendo assim entendido, enquadraremos a Gazeta no
quadro dos jornais não neutros. A sua parcialidade contraditória se intensifica no
ano de 1889, onde o seu posicionamento contrário ao império e a favor da república
passa a tomar contornos. No dia quatorze de julho de 1889, é estampada em sua
primeira página uma gravura em homenagem ao centenário da Revolução Francesa e da
Queda da Bastilha. Mudando o seu esquema de publicações, a gravura abrangia o
público não letrado e gerava impacto naqueles que sabiam ler.