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ED. 42 – ABRIL/2009
Pausa duvidosa
Certas vírgulas viram problema quando separam o que não deveriam
Josué Machado
Separações
Graciosas as frases e gracioso o título. Só que separar o sujeito ("quem contrapôs...") do predicado
("comprou...") com vírgula, na primeira frase, equivale a arrasar um casamento feliz. Não fica bem.
Quem comprou o mico buliçoso? Foi quem contrapôs a tal teoria.
Portanto, a vírgula depositada entre "Coisa" e "comprou" é absolutamente malufosa, isto é, indevida,
imprópria, adventícia, aventureira, depravada, corrupta. Separa o sujeito oracional do predicado. Na
segunda frase, do mesmo articulista, o "quem" aparece duas vezes. Na primeira, curta, ele não é
tentado pela pausa natural a virgular indevidamente (Quem não deve não teme).
Quem não teme? Quem não deve. É claro que "quem" não deve é também "quem" não teme.
Na segunda, longa, cai na tentação da pausa e desaba com a vírgula respiratória asmática ("...quem
não está encenando diligências espetaculosas, [virguleta dungosa] nada tem a reclamar.").
"Quem" não tem nada a reclamar é "quem" não está encenando diligências espetaculosas.
Quanto ao título do livro e da coluna (Quem Ama, Educa!), menos razão ainda há para a vírgula mal-
educada, porque as duas orações são pequeninas e não há pausa que justifique a vírgula.
Quem é que educa? O amoroso educador ou o papai ou a mamãe.
Suspense
O que o senhor Tiba quis foi criar uma pausa de suspense: Quem ama (tchan, tchan, tchan, tchan)
educa!
É a vírgula tchan vezes 4, como a da abertura da Quinta Sinfonia de Beethoven.
Se ele queria marcar pausa, poderia ter utilizado reticências: "Quem ama... educa!" Ou travessão:
"Quem ama - educa!" Ou uma cerca, mas nada de vírgula.
Tanto nos textos jornalísticos como no título do livro e da coluna, a vírgula malufosa tenta separar casais
indissolúveis.
Será leviandade dizer, e alguns sábios lamentarão, mas, no caso de incerteza, o melhor é omitir vírgulas
do que aplicá-las a cada ofego depois de fraseados mais longos.
Aventureira
É verdade que alguns livros de autores distraídos admitem a separação por vírgula dos dois elementos
de provérbios para marcar a pausa.
Por exemplo:
"Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura".
"Quem com ferro fere, com ferro será ferido".
Mas a vírgula será sempre inconveniente, mesmo nesses casos, porque está a separar, como dizem os
lusos, o sujeito do verbo - coisa sempre imprópria.
Água e bate; quem e será. (Quem bate? A água mole em pedra dura.)
Portanto, esses provérbios devem ser redigidos sem a vírgula aventureira. Assim:
Quem não tem Filipão escala com Dunguinha.
Sem vírgula, já se vê, mas sempre na defensiva: goleiro, nove no meio e um no "ataque".
Os do meio de preferência saracoteando para os lados com graciosas embaixadas, principalmente o
Ronaldo Cabeleira.
(Bem que o Pelé falou e disse: "No meu tempo não havia esse negócio de equilibrar a bola no cangote;
a gente ia pro gol".)
Provérbios
Algumas pessoas vão lembrar, em benefício do Dunga, que o Brasil ganhou de Portugal por 6 a 2;
esquecem-se de que os lusos para cá vieram no fim do ano passado gozar umas férias e apreciar
mulatais rebolados descontraídos.
De volta aos provérbios, há alguns nos quais a vírgula é essencial:
Barão, político, conde, político, banqueiro, político, manipulador do mercado acionário, político, lobista,
político e por aí vai.
No caso desse provérbio, a vírgula é essencial porque separa as duas frases paralelas, cada uma com
sujeito, verbo e complemento próprios.
E o provérbio é perfeito, embora não seja aplicável a nenhum caso conhecido neste país.
Claro que não.
Servirá quando muito para a Bananândia, terra de políticos corruptos e justiça cheia de meandros
conhecidos pelos endinheirados.
Outro mundo.