O documento descreve o Rito de Dedicação de Altar na Igreja Católica. Explica que o altar é consagrado para celebrar os ofícios sagrados e representa a mesa onde os fiéis se reúnem. Também discute a transformação do significado do altar no Cristianismo, passando de lugar de sacrifício para outros a mesa da Eucaristia onde Deus se oferece como alimento.
Descrição original:
O presente trabalho visa apresentar a teologia presente no rito de dedicação do altar.
O documento descreve o Rito de Dedicação de Altar na Igreja Católica. Explica que o altar é consagrado para celebrar os ofícios sagrados e representa a mesa onde os fiéis se reúnem. Também discute a transformação do significado do altar no Cristianismo, passando de lugar de sacrifício para outros a mesa da Eucaristia onde Deus se oferece como alimento.
O documento descreve o Rito de Dedicação de Altar na Igreja Católica. Explica que o altar é consagrado para celebrar os ofícios sagrados e representa a mesa onde os fiéis se reúnem. Também discute a transformação do significado do altar no Cristianismo, passando de lugar de sacrifício para outros a mesa da Eucaristia onde Deus se oferece como alimento.
O Rito de Dedicação de Altar é composto de uma missa própria onde, por meio de orações específicas, faz-se a consagração do altar que será dedicado para o uso dos ofícios sagrados. É um costume muito antigo da Igreja abençoar com solenidade a mesa em torno da qual se reúnem os fiéis. A herança antropológica do altar liga-se aos antigos sacrifícios que eram oferecidos às divindades. Grande parte das culturas originárias (para não dizer todas) conhecem algum tipo de altar para sacrifícios. A religião de Israel, de igual forma, conheceu diversos altares em sua história, sendo os principais deles, os altares do Templo de Jerusalém (digo altares no plural pois havia um dedicado aos sacrifícios de animais e um dedicado aos perfumes). Num primeiro momento, acreditava-se que o altar era o lugar onde o ser humano oferecia um sacrifício que pudesse alimentar a divindade. Também em Israel há algumas concepções semelhantes. Fala-se do “odor” dos sacrifícios que sobe a YHWH e lhe agrada. Essa compreensão visava, sobretudo, manter a amizade com a divindade, era uma reparação pelas ofensas cometidas e um pedido para que a divindade lhes fosse favorável. Este costume não é uma exclusividade dos povos do crescente fértil, como se poderia pensar. Antes, pode-se perceber tanto nos nativos americanos (Maias, Incas e Astecas) quanto nas diversas etnias africanas. Diversos rituais de oferendas se desenvolviam ao redor do Altar. Também Israel conheceu um complexo rito de oferecer sacrifícios no Templo. O ofício do sacerdote era muito mais o de um açougueiro divino, do que um ministro. Também a comunidade cristã conhece o altar. Há, contudo, uma transformação radical no sentido e no uso do mesmo. É interessante notar a presença, no Novo Testamento, tanto do uso da palavra altar (thysiastérion), quanto da palavra mesa (tràpeza). A primeira é utilizada quando em referência ao altar do Templo (no caso dos sinóticos), em referência ao altar do apocalipse, onde abaixo estavam as testemunhas (Ap 6,9), e na Carta aos Hebreus (Hb 13,10) como uma referência à cruz de Cristo, onde ele se oferece como sacrifício perfeito e santo. A segunda (mesa), por sua vez, dentro do contexto do culto cristão, aparece como o “novo altar”, isto é, o lugar no qual os fiéis se reúnem para celebrar a memória do Senhor na Eucaristia. Quanto ao sentido, este também passa por uma radical transformação: não é mais o lugar onde se oferece um “alimento” à divindade, mas é o lugar onde Deus mesmo, em seu Filho Jesus Cristo, oferece-se como alimento aos seus fiéis. A dimensão sacrificial não deixa de existir, é substituída, contudo, por uma forma incruenta de sacrifício, por meio da rememoração e atualização sacramental do único sacrifício de Cristo. Assim, a comunidade cristã rompe com os sacrifícios de terceiros (tanto humanos quanto animais) e oferece-se, com Cristo, no altar da Igreja, o sacrifício espiritual de si, com Cristo, a Deus Pai. Essa transposição semântica do altar da antiga aliança, para a mesa do altar da nova aliança está acompanhada de um significado etiológico. Ao redor do altar a Igreja nasce e se congrega. Ela é a comunidade dos seguidores de Jesus. É Jesus quem é, sumamente, o Altar da Igreja. Neste altar que é Cristo os fiéis são unidos ao único sacrifício agradável, capaz de obter-nos o perdão e configurar-nos plenamente ao Filho, pelo Espírito. Nele a Igreja se reconhece como assembleia santa, povo de Deus, corpo de Cristo e Templo do Espírito. As orações que compõem o Rito de Dedicação de Altar no-lo expressam, conforme veremos. A oração da coleta recorda a passagem de Jo 12,32 onde, ao anunciar sua paixão, Jesus afirma que atrairá a si todas as coisas. Expressa-se, desta forma, que Cristo é o eixo em torno do qual orbita toda a existência da Igreja. O altar da cruz é rememorado no altar da Igreja, que se transforma em mesa eucarística para os fiéis. O altar torna-se um lugar de “nascimento” da comunidade cristã. Nele acontecem os sacramentos da fé (porque é símbolo da cruz de Cristo, donde jorrou-nos a água do batismo e o sangue da eucaristia) e ao redor dele reúne-se o povo de Deus. Toda a celebração da dedicação de Altar estará carregada de um profundo simbolismo etiológico, conforme se pode perceber na oração de dedicação. A oração de Dedicação do Altar inicia sua parte anamnética com a recordação da carta aos efésios onde fala-se do mistério da bondade de Deus que, desde sempre, estava designado a manifestar-se em Cristo Jesus. Assim, dá-se o tom pelo qual as imagens que seguem devem ser compreendidas: à luz do mistério de Cristo. Com relação ao “tempo das figuras”, deve-se, sobretudo, recordar da passagem de Hb 1,1-2 que apresenta a multiplicidade de formas com a qual Deus falou ao povo. De antemão convém perceber que as figuras que sucedem nesta anamnese não são figuras sacerdotais, e, em momento algum, faz-se referência ao altar do Templo. Antes, as figuras apresentadas são constitutivas das narrativas de fundação do povo de Israel (Noé – Abraão – Moisés). Em Gn 8,20 lemos a discrição da edificação de um altar por Noé. Apesar de não ser o primeiro sacrifício descrito na Bíblia (visto que Abel já havia feito), trata-se do primeiro relato da edificação de um altar dentro das escrituras. O sacrifício sobre o altar obtém o favor de Deus e, por consequência, a firmação da Aliança. O Sacrifício de Noé tem, como consequência, uma benção de caráter cósmico: toda a criação participa da benção de Deus que se compromete a não mais destruir a terra (cf. Gn 8,21). O quase-sacrifício de Isaac, por sua vez, é relatado em Gn 22,1-18. Afigura paradigmática de Abraão irrompe na narrativa bíblica como um midrash onde acontece e se antecipa toda a história subsequente do povo de Israel. A prova à qual Abraão é submetido por Deus coloca em risco seu futuro, pois deveria abrir mão de seu único filho. É uma experiência vivida repetidas vezes por Israel durante sua história. A fidelidade de Abraão a YHWH lhe alcança o favor de uma longa posteridade, tornando- se pai do Povo Eleito. Além do mais, convém ressaltar que o sacrifício do carneiro que Abraão oferece sobre o monte Moriá é o primeiro. Tal monte, segundo 2Cr 3,1, é o monte de Sião, onde foi edificado posteriormente o Templo de Jerusalém. O livro do Êxodo nos recorda, no capítulo 24, 1-8, a conclusão da Aliança entre Deus e o povo, após a primeira páscoa, libertação do Egito e o recebimento e leitura da Lei ao povo. Moisés edifica um altar e asperge-o com o sangue do Cordeiro, mas também ao povo, de forma que o altar simbolizasse a Aliança estabelecida. A última secção da parte anamnética reassume a centralidade do Evento Cristo que é a realização das imagens prefiguradas no Antigo Testamento. Cristo institui uma nova criação em seu sangue derramado, conforme Ef 1,10, que afirma que tudo (o que há no céu e na terra) é recapitulado em Cristo Jesus. A promessa feita a Noé de não mais destruir a terra, encontra em Cristo a sua plena realização, onde não só não é destruída a obra, mas ela é elevada à plenificação, prefigurada escatologicamente na Ressurreição de Cristo. Como vítima, Jesus Cristo assume o lugar de Isaac no sacrifício, desta vez levado à plenificação. Em seu sacrifício na Cruz ele é o novo altar da Aliança, pois em seu sangue é comunicado o novo mandamento, na véspera de sua Paixão, e se estabelece a nova aliança que não será rompida. Em Jesus Cristo somos feitos um povo novo (cf. 1Pd 2,5), uma edificação espiritual (a Igreja), que se reúne ao redor do altar, símbolo de Cristo, a Pedra Viva da Igreja. É interessante aqui perceber a transposição de “altar” para “mesa”. O Novo Testamento faz uso dos dois termos, contudo, segundo a carta aos Hebreus, o Altar é a cruz de Cristo, onde se oferece o Sacrifício supremo. A mesa, por sua vez, é o lugar ao redor do qual a comunidade se reúne para rememorar e participar do único sacrifício de Cristo oferecido no altar da cruz. Enquanto que, nas religiões politeístas e em algumas passagens do Antigo Testamento, o altar é lugar onde a divindade se alimentava, no Novo Testamento é o lugar onde a divindade se dá em alimento aos seus fiéis. O altar se torna mesa. Sobre o altar ser sinal de Cristo, além das figuras bíblicas, ressalta-se, de maneira singular, o rito de ungir o altar com o santo crisma. Com efeito, Cristo é o Ungido do Pai. A unção do altar com o Crisma simboliza a unção do Espírito Santo com a qual o Cristo foi ungido, e que ele comunica aos apóstolos. Seguem-se cinco pedidos na parte epiclética. Os pedidos revelam o caráter do altar de ser o lugar onde a comunidade cristã nasce e se desenvolve até chegar à plenitude do louvor na Jerusalém Celeste. O primeiro pede que o altar seja o lugar de onde brotam os sacramentos da Igreja. Isso, porque, conforme já apresentamos, o altar é entendido como a Cruz de Cristo, onde se dá o supremo ato de amor e entrega ao Pai por nós. Assim, todos os sacramentos são ali presentificados e, de alguma forma, encontram-se ligados ao altar da Igreja. O segundo pedido é relacionado à existência dos fiéis. Já não se diz altar, mas mesa, lugar de alimentar-se. Na mesa da eucaristia recebe-se o pão da vida e se abre a mão para os irmãos. Somos, de alguma forma, reconduzidos à promessa dada por Deus a Noé. A promessa de vigiar pela vida e prover as condições para a vida humana encontram no altar da eucaristia sua forma definitiva. O terceiro pedido, por sua vez, versa sobre a amizade e fidelidade para com Deus. Recorda-nos o altar edificado por Abraão em sua fidelidade. Também nós, na participação da mesa da eucaristia, somos convidados a crescer na fidelidade e no amor a Deus. O quarto pedido recorda-nos o altar erigido por Moisés no deserto, ao redor do qual se reuniu todo o povo para assentir com a Aliança. Neste pedido, a Igreja ora para que os irmãos sejam concordes ao redor do altar, unidos na mesma fé. Ao final, no último pedido, encerra-se a prece com um louvor. O povo que se reúne ao altar para louvar a Deus, anseia, pois, com o dia definitivo em que já não mais por sinais sacramentais, mas de forma direta, prestarão o louvor perene a Deus na eternidade. É um pedido coletivo, não individual. Que se pôde perceber, a partir de nossa opção de reflexão, é que o altar é o lugar onde nasce e se congrega o povo de Deus. Nele encontram o alimento para a vida. Ele assume o lugar central da Igreja, não somente do espaço físico onde a Igreja se reúne, mas da ekklesia de Deus, que são os fiéis batizados em Cristo Jesus. A oração sobre as oferendas, de maneira bastante breve, mas profundamente densa, expressa o que acontece sobre e ao redor do altar em cada eucaristia que se celebra. Pede-se o Espírito Santo para santificar os dons para que se tornem Corpo e Sangue de Cristo, e pede-se que o mesmo Espírito torne Corpo e Sangue de Cristo todos aqueles que irão receber aquilo que se realiza no sacramento, mediante a purificação do coração. O prefácio recorda-nos, num primeiro momento, a imagem tanto de Hebreus como de Apocalipse ao chamar Jesus Cristo de “sacerdote e vítima verdadeira”. O motivo da ereção de um altar a Deus na Nova Aliança é perpetuar, no tempo, por meio dos sinais sacramentais, o único sacrifício de Cristo. Assim, justifica-se a edificação e a dedicação do altar cristão na segunda estrofe do prefácio: “celebrar para sempre o memorial” de Cristo. A terceira estrofe recorda que a celebração que acontece sobre o altar é verdadeiramente o Sacrifício de Cristo sob os sinais sacramentais. Não uma mera representação, mas uma presentificação, uma reapresentação ao único e sacrifício. O altar, tendo isso em consideração, torna-se para os fiéis o “verdadeiro lugar”, poderíamos dizer, sacramentalmente a cruz, donde foi-nos garantida a salvação e, agora pelos sacramentos, continua a ser-nos oferecida. A quarta estrofe retoma o uso do vocábulo “mesa” para manifestar seu sentido eucarístico. Na mesa os filhos se alimentam. Cristo é quem se dá em alimento para nossa salvação. Sua presença eucarística, real e verdadeira, dá dignidade à mesa do altar que, por conta de tão augustíssimo mistério que aí é celebrado é, por antonomásia, sinal de Cristo no meio da comunidade. A última estrofe do prefácio apresenta o altar como lugar onde os fiéis recebem o Espírito. O Ressuscitado comunica seu Espírito aos apóstolos na manhã da ressurreição (segundo João) e no cenáculo (segundo Atos dos Apóstolos). Contudo, antes de Ressuscitado, o Espírito é quem conduz Jesus em sua missão e o unge após o batismo por João. Assim, Jesus e o Espírito estão intimamente ligados durante a vida humana de Jesus e após sua ressurreição. A comunidade dos fiéis, reunidas ao redor do Altar que é Cristo, é congregada pelo Espírito e, de igual maneira, do Altar que é Cristo, recebe o Espírito para os animar em sua missão, transformando-os em “altar vivo”. A oração depois da comunhão, com uma profunda densidade manifestada na brevidade da prece, retoma tudo aquilo que aqui foi exposto, conduzindo-nos, assim, a uma conclusão. Em primeiro lugar, afirma a prioridade do sacrifício de Cristo. Tudo o que fazemos (e mesmo nossa vida cristã) só nos é possível por conta do Mistério de Cristo que dá sentido a tudo o que celebramos. Por meio de cada sacramento (e da vivência quotidiana da fé) somos inseridos na Páscoa de Cristo de maneira que, em cada sacramento celebrado, somos reapresentados ao sacrifício pascal de Cristo, que efetivamente manifesta sua redenção em nós, enquanto nos prepara para a glória futura, como antecipação escatológica, enquanto ainda vivemos no tempo das figuras. A santa Eucaristia é o sacramento para o qual converge e do qual dimana toda a vida cristã (e todos os demais sacramentos). O altar recebe sua dignidade por conta de seu uso para este fim. Nele, por conta dos sinais sacramentais, presentifica-se o Cristo sacerdote, altar e cordeiro. Nele, por causa da participação na Ceia do Senhor, os fiéis são inseridos no dinamismo salvífico de Cristo que, na oração em questão, é apresentado como “ser transformados em Cristo”.