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Kézia Kéllen Alves dos Santos

Laila Gonçalves Fonseca

O ensaio seguinte retrata os Regimes da Arte e o Realismo de Jacques Rancière


em A partilha do sensível (2009), o conceito de literatura sob a perspectiva de
Terry Eagleton em O que é literatura? (1983) e a perspectiva de Pagu, em
Parque industrial (1933).
Segundo Rancière, a arte que conhecemos é dividida em três regimes, o Regime
Ético das Imagens, o Regime Estético e o Regime Poético.
Sobre o primeiro, o Regime Ético das imagens, tem-se que o modo de ser das
artes concerne em seu caráter o modo de ser dos indivíduos, tendo como
finalidade representar a realidade, favorecendo a burguesia e gerando
desigualdade. A este, o autor associa, por exemplo, à imagem da lei.
Deste advém-se o Regime Poético, sendo uma representação do sensível, por
meio da mimese e assumindo uma postura autônoma da arte, visibilizando
também a desigualdade. Este depende do conteúdo, nele há um sistema de
hierarquia entre o sujeito, gênero e a arte se baseia nas normas da mimese e se
fundamenta no poder das palavras.
a visão hierárquica global das ocupações políticas e
sociais: o primado representativo da ação sobre os
caracteres, ou da narração sobre a descrição, a
hierarquia dos gêneros segundo a dignidade de seus
temas, e o próprio primado da arte da palavra, da
palavra em ato, entram em analogia com toda uma visão
hierárquica da comunidade (RANCIÈRE, 2005, p. 32).

Já o regime estético, contrapondo-se aos anteriores, assume uma ruptura com


o metafísico. Neste, o pensamento é levado também a diferenciar-se de si
mesmo, ele cria a sua própria mimese, não tem dependência em relação à forma
artística e não corresponde a hierarquia entre o sujeito, gênero e arte . Com este
regime, a arte liberta-se da sua condição de artes e de belas-artes, para se definir
por si própria.
A palavra ‘estética’ não remete a uma teoria da
sensibilidade, de gosto ou do prazer dos amadores de
arte. Remete, propriamente, ao modo de ser específico
daquilo que pertence à arte, ao modo de ser de seus
objetos. [...] as coisas são identificadas por pertencerem
a um regime específico do sensível. Esse sensível [...] é
habitado pela potência do pensamento que se tornou
estranho a si mesmo: produto idêntico ao não-produto,
saber transformado em não-saber, logos idêntico a
um pathos, intenção do inintencional etc. (RANCIÈRE,
2005, p. 32).

Associando a ideologia literária ao supracitado, e tendo como base o ponto de


vista do filósofo e crítico literário Terry Eagleton, que afirma que todas as
definições de literatura são relativas e, portanto, não há uma forma concreta para
defini-la, em "O que é literatura?”, depreende-se que, as ideologias das artes
se dão quando, no Regime Poético, há uma herança do Regime Ético das
Imagens em relação à metafísica e a representação do sensível. E, no Regime
Estético, em contraposição ao anterior, quando há uma ruptura com a metafísica,
produzindo democracia, uma ideia de igualdade comum.
Ademais, há como associarmos o Regime Estético também à ideologia Realista,
quando afirma-se que o Realismo tem por objetivo visibilizar as relações sociais
e assim, inevitavelmente, acaba visibilizando o trabalho comum, expondo todos
os mecanismos que a sociedade dispõe para invisibilizar as minorias (negros,
mulheres, etc.). Essa relação se dá quando o Regime Estético realiza uma
ruptura com o metafísico, rompendo também a hierarquia criada entre as artes
e considerando todos os trabalhos iguais, sendo nenhum melhor que outro.
Como exemplo disto, tem-se o livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, em
que Machado de Assis dá luz ao que a sociedade quer esconder, mostrando a
obscuridade que há nas relações sociais, como a face do preconceito, do
racismo, os jogos entre aparência e essência, futilidades sociais, e afins. Outro
exemplo é o romance Parque Industrial, de Patrícia Galvão, o primeiro romance
proletário brasileiro, denunciando a vida das minorias excluídas da sociedade
paulistana, visibilizando, portanto, as relações sociais. Patrícia realiza uma
ruptura com a metafísica, retratando seus personagens como sem origem e sem
destino e também relacionando-se com o Regime Estético da Arte.

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