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Black Blue Estudo PDF
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O LUXO MARGINAL: Reflexões sobre a construção da marca Black Blue
Paola Mazzilli2
Docente da ESPM/SP
Ana Catarina Holtz 3
Graduanda na ESPM/SP
Resumo
O presente trabalho consiste em uma investigação sobre o fenômeno do funk
ostentação a partir da marca Black Blue, que se destaca por apresentar-se ao público
consumidor como uma marca de luxo da “periferia”. A partir do material
disponibilizado no seu site institucional, pretende-se problematizar o consumo do
“luxo ostentação” que, ao mesmo tempo em que se aproxima de grifes internacionais,
sugerindo em sua comunicação mercadológica status e diferenciação, acaba por
também traçar um vetor de resistência de grupos que talvez não se sintam
representados pelos produtos de luxo ditos tradicionais. Para o desenvolvimento dessa
reflexão alguns autores serão fundamentais, tais como Lipovestky, Pelbart e Barros. A
título de ilustração, imagens do site da Black Blue serão relacionadas aos conceitos
explorados ao longo do texto.
1
Trabalho apresentado no Grupo de Trabalho 9 Comunicação, discursos da diferença e biopolíticas do
consumo, do 4º Encontro de GTs - Comunicon, realizado nos dias 08, 09 e 10 de outubro de 2014.
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Orientadora do trabalho. Doutoranda no Programa de Comunicação e Semiótica e Psicologia Clínica
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), mestre em comunicação e Práticas de
Consumo pela Escola Superior de Propaganda (ESPM), onde atualmente leciona. E-mail:
paola@espm.br.
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Estudante de Graduação do 8º semestre do curso de Comunicação Social – habilitação em
Publicidade e Propaganda da Escola Superior de Propaganda e Marketing, SP, email:
anacholtz89@gmail.com
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luxo, como demonstra seu slogan “The luxury of a few” (O luxo de uns poucos, em
tradução livre), dessa forma, ela contribui para a criação de um imaginário de luxo
peculiar, que está alinhado diretamente com valores e referências de uma classe em
ascensão socioeconômica.
Esse trabalho tem como objetivo refletir sobre a construção da marca Black
Blue, analisando a comunicação mercadológica e institucional realizada pela empresa
por meio do seu site, loja virtual e Facebook, de forma a explorar a abordagem do
luxo adotada pela marca, principalmente por ser fortemente associada ao movimento
do “funk ostentação”, que tem justamente como foco o consumo de produtos de alto
valor aquisitivo. O referencial teórico será composto por autores de diferentes áreas
do conhecimento, formando assim, um estudo transdisciplinar, tais como: Lipovetsky,
Bourdieu, Pelbart e Barros.
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In: http://www.sae.gov.br/site/?p=12060 acesso em jul/2014.
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nova forma de consumir e produzir o luxo, alinhado com seus próprios valores, dando
origem a uma resistência que não se configura, necessariamente, por meio da dialética
de oposição, como explica Pelbalrt:
(...) o contexto pós-moderno suscita posicionamentos mais oblíquos,
diagonais, híbridos, flutuantes. Criam-se outros traçados de
conflitualidade. [...] Certas dinâmicas urbanas (nomadismos sociais,
novos corpos pós-humanos, redes sociais de autovalorização,
devires minoritários, êxodo e evacuação de lugares de poder)
exemplificam essa mutação lógica da resistência, indo além das
figuras clássicas da recusa (PELBART, 2011, p. 136).
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In: http://planocde.com.br/jovens-sem-fronteiras/ acesso em jul/2014
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Disponível em: www.blackbluebrasil.com.br acesso em jul/2014
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logotipo posicionado na parte superior contém como símbolo a carpa dourada, que
segundo o sócio Alexandre dos Santos, representa a prosperidade e o sucesso na
cultura oriental10, bem como o slogan da marca “luxury of a few”, ou o luxo de uns
poucos (tradução livre), a página contém ainda diamantes “caindo” como chuva sobre
o cantor, cabe ressaltar que o dourado está presente nos acessórios usados por Nego
Blue, como o seu medalhão, no relógio, assim como no logotipo e no slogan, já a
segunda imagem que alterna com a protagonizada por Blue pode ser vista na Figura 2,
na qual um casal de modelos aparece sem camisa, utilizando um dos bonés da marca.
Como pode ser visto na entrada do site, a grife aposta em elementos que são
bastante explorados no movimento de “funk ostentação”, como a cor dourada, o
relógio, o medalhão, os diamantes, e também à sensualidade. O ato de ostentar está
relacionado, principalmente à manifestação de poder e superioridade, como atesta
Lipovetsky:
Por toda parte e em toda época, os soberanos são obrigados a
possuir e exibir o que há de mais belo, a ostentar os emblemas
resplandecentes da majestade, a viver cercados de maravilhas, de
pompas e de opulências como expressões de sua superioridade
desmedida (LIPOVETSKY, 2005, p. 34).
O site possui 6 seções: coleção 2013, a marca, pontos de venda, na mídia, eles
usam e contato. Na categoria “coleção 2013”, é possível encontrar todos os produtos
que compõe as linhas masculinas e femininas, todos com fotos de exibição, um link
que direciona para a loja virtual, para a visualização das peças os produtos são
divididos por categorias, ou vistos todos de uma única vez. Na seção “a marca”, está
um breve histórico que explica o significado do símbolo da carpa, as características
das cores vibrantes, acabamento e dos detalhes contidos nos produtos são enfatizados
como diferenciais capazes de concorrer com marcas como Lacoste, Hollister,
Abercrombie, Ralph Lauren, eles também destacam o fato da grife estar presente em
“mais de 100 pontos de venda”, novamente há um link para a loja virtual, e para uma
entrevista com os donos da Black Blue.
10
In: http://economia.uol.com.br/empreendedorismo/noticias/redacao/2014/05/20/grife-de-funk-
ostentacao-busca-clientes-da-abercrombie-com-camisas-a-r-200.htm acesso em jul/2014
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Na categoria “ponto de venda”, pode se fazer uma busca rápida ou por estado
(RJ e SP), as lojas, na sua maioria de multimarcas, tem o seus nomes, endereços e
telefones exibidos, as lojas exclusivas da marca também aparecem com suas
respectivas informações de maneira destacada das demais. A seção “na mídia” é
destinada a mostrar as notícias veiculadas pela imprensa.
A seção “eles usam” exibe uma galeria de fotos com famosos que foram
flagrados usando alguma peça da marca, como Caio Castro, Sabrina Sato, Léo
Santana, jogadores de futebol, além de cantores de funk e pagode, essa seção é muito
importante, pois ela representa a adesão da marca em diferentes públicos, ao utilizar a
imagem de celebridades usando algum de seus produtos, a Black Blue confere maior
credibilidade à sua marca, registrando assim, uma espécie de “subida”, em um
movimento oposto ao que McCracken (1988) destacou como trickle-down, nesse
caso, os “consumidores famosos”, supostamente da classe A, passam a consumir um
produto que a priori foi destinado à classe C. A área de “contato” possui espaço tanto
para consumidores, por meio do SAC, quanto para comerciantes com o contato do
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A abordagem usada na fan page é informal, uma vez que a rede social permite
uma comunicação mais próxima do público, incentivando os comentários e
compartilhamento dos usuários, as mensagens de motivação em especial, apresentam
um potencial maior de propagação, em virtude da identificação do público com o
conteúdo que está sendo transmitido, principalmente por terem conteúdo similar aos
versos entoados nas canções do “funk ostentação” que evocam o prazer em “se vestir
bem”, “esbanjar riqueza”, sempre trazendo referencias ao sucesso e ao dinheiro. A
página tem aproximadamente 216.000 curtidas, (até Agosto de 2014), cabe ressaltar
que cada curtida representa um usuário que recebe o conteúdo postado pela marca,
além de poder significar também uma medida de “fãs” que gostam da Black Blue,
podendo ser consumidor ou não dela.
A seguir será feita uma breve apresentação da loja virtual, conforme mostra a
Figura 10.
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A loja virtual segue o padrão do site oficial, com muitos detalhes em dourado,
exposição dos produtos, além de contar com uma seção para “depoimentos”. Para
comprar é necessário fazer um cadastro, dessa forma, a empresa pode recolher
informações importantes sobre o seu consumidor, transformando seu canal de venda
em ponto de comunicação direta e até personalizada, dependendo da maneira como
esse cadastro é processado e utilizado. Os produtos são divididos em masculino e
feminino, sendo que para cada um deles há uma nova classificação, agora de acordo
com a categoria de produto (boné, camiseta, cinto, moletom, pólo, sapatênis e
vestido), os produtos são exibidos juntamente com os seus preços, os valores podem
ser divididos em até 12 vezes, tal condição facilita o acesso aos produtos, a loja
também realiza a entrega dos produtos mediante pagamento de frete, e o prazo para a
realização do despacho é de até 5 dias. A seção “depoimentos” é uma ferramenta
interessante que ajuda a estabelecer um contato mais próximo com o consumidor, pois
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nela ele encontra espaço para se comunicar com a marca, dar sugestões, elogiar e até
mesmo reclamar sobre eventuais problemas no processo de compra, os comentários
são importantes para a visibilidade da marca, que acaba por conquistar uma espécie
de “garotos propagandas” sem custo.
É por meio da loja virtual que se podem observar melhor os produtos, sendo
assim, cabe algumas considerações a respeito de algumas características que se
destacam, principalmente no design. Como já observado, o símbolo da carpa dourada
aparece com bastante frequência nos produtos, substituindo muitas vezes o próprio
nome da marca, assim como o cavaleiro presente nas camisas da marca Ralph Lauren,
o dourado, que marca a identidade visual da Black Blue, também pode ser visto em
quase todos os produtos, bem como palavras que remetem à riqueza como luxo e sua
versão em inglês luxury, além de outras figuras como o diamante, uma coroa real, o
cifrão e um saco de dinheiro.
A escolha desses símbolos faz com que a Black Blue alterne entre a inspiração
em marcas tradicionais internacionais e o uso de elementos que podem ser
encontrados no movimento do “funk ostentação”, como o uso de medalhões com o
cifrão, e até mesmo certo tom cômico ao utilizar um desenho de saco de dinheiro,
normalmente exibidos em animações, fazendo com que gere familiaridade tanto com
as marcas que são referenciais mundiais, quanto com símbolos que representam a
“ostentação” explorada pelo funk.
Referências
BARROS, Carla . A 'invisibilidade' do mercado de baixa renda nas pesquisas de marketing:
as camadas populares consomem ou sobrevivem?. In: II Encontro de Marketing da
ANPAD - II EMA 2006, Rio de Janeiro, 2006.
LIPOVETSKY, Gilles. O luxo eterno: da idade do sagrado ao tempo das marcas / Gilles
Lipovetsky e Elyette Roux; tradução Maria Lúcia Machado. – São Paulo: Companhia das
Letras, 2005.
MCCRACKEN, Grant. Culture and consumption. Indiana: Indiana Univesity Press. 1988.
NERI, M. (Coord). A nova classe média: o lado brilhante dos pobres. Rio de Janeiro:
FGV/IBRE, CPS, 2010.
PELBART, Peter Pàl. Vida capital: ensaios de biopolítica. São Paulo: Iluminuras, 2011.