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Restaurando o Pastor Local

As igrejas deveriam ter um interesse maior pela saúde espiritual de seus pastores

por Philip Yancey

Há poucos meses, participei de uma conferência nacional de pastores co-


patrocinada pela Christianity Today. Os organizadores, de forma otimista
esperavam por 800 participantes, mas tiveram de se esforçar para acomodar
1.700, o que pode indicar uma fome de nossos pastores por companheirismo e
alimento.

Existe outra profissão que exige tanto e recompensa tão pouco? Um pastor usa
20 horas numa semana preparando um sermão, e então ouve, na melhor das
hipóteses, domingo de manhã, um polido “Bom trabalho, pastor” de uns poucos
diáconos na porta - que seria como se ele tivesse permanecido dentro dos 22
minutos determinados para a pregação. Quando é hora de uma inspenção formal
do trabalho, os pastores encontram-se muitas vezes avaliados por encanadores,
vendedores e engenheiros, muitos dos quais sabem pouquíssimo sobre o
ministério. Esta mesma diversidade de leigos vota os salários e benefícios a
portas fechadas, deixando o pastor como um aluno sentado que espera o diretor
na outra sala.

“Portanto, somos embaixadores de Cristo, como se Deus estivesse fazendo seu


apelo por nosso intermédio”, disse o apóstolo Paulo sobre o ministério pastoral.
Deus com certeza faz seu apelo através de instrumentos humanos, e depois de
minhas conversas com pastores, passei a ter uma apreciação renovada sobre as
dificuldades desta função. Eles gastam horas com aconselhamento pré-
matrimonial de jovens noivos sonhadores para, anos mais tardes, aconselhar
estes mesmos casais, agora antagonistas furiosos, em meio a um processo de
divórcio. Eles confortam o doente e oram fervorosamente pela cura. E então, de
alguma forma, devem encontrar forças para se manterem firmes frente a parentes
angustiados no funeral.

Fazemos nossos pastores exercerem função de psicólogo, orador, clérigo e chefe


de uma repartição. Enquanto isso, nós os colocamos numa peculiar estufa de
solidão e isolamento. O pastor ou reverendo perde qualquer vida pessoal. Henri
Nouwen costumava dizer “Sendo amigável com todos, ele muito freqüentemente
não tem amigos para si... O paradoxo é que aquele que ensina a amar a todos, na
realidade se encontra sem qualquer amigo; que aquele que se treinou na oração
silenciosa não é capaz de estar sozinho consigo mesmo. Abrindo-se para todos
que estão lá fora, não sobra quarto para o anfitrião”.

Chamado para ser “Outro Cristo”

Durante uma viagem a Lancaster, Pensilvânia, jantei numa casa amish (um
grupo cristão conservador da América do Norte), onde escutei sobre um
procedimento incomum para se escolher um pastor. Nesta parte dos EUA, poucos
amishes conseguem passar do 1º grau, e quase nenhum tem treinamento
teológico. A congregação inteira escolhe alguns homens que apresentam algum
potencial pastoral e quem recebe pelo menos três votos deve se dirigir a uma
mesa. Cada lugar tem um hinário na frente e dentro deste hinário escolhido
aleatoriamente um dos homens encontra um cartão o designando como o novo
pastor para o próximo ano.

“O que acontece se a pessoa não se sente qualificada?”, perguntei para meu


amigo. Ele me olhou confuso e respondeu: “se ele se sentisse qualificado, nós não
iríamos querer”.

Eu não recomendo o método amish de chamado pastoral (embora encontre


intrigantes paralelos com alguns sistemas do Velho Testamento), mas este último
comentário me deixou pensando. Thomas Merton disse certa vez que muito do
que esperamos que pastores façam - ensinar e aconselhar os outros, consolá-los,
orar por eles - deveria na verdade ser responsabilidade do resto da congregação.
Nos parece que o distintivo da vocação pastoral é ser o homem de Deus, aquele
que “é chamado para ser outro Cristo em um sentido mais particular e íntimo
que o cristão comum”.

O pastor fica como uma espécie de intermediário da misericórdia de Deus,


composto pela sua função de pregador e admoestação dos pecadores. O pastor
conhece a segunda função melhor que nós, graças a seu papel como conselheiro
espiritual. A primeira - bem, nós cuidamos dela.

Em nossa fixação moderna por currículos e competência, não estamos


negligenciando a qualificação mais importante de um pastor - a necessidade de
conhecer a Deus? Mahatma Gandhi, líder de meio bilhão de pessoas, se recusou
a comprometer seu princípio de guardar toda segunda-feira como um dia de
silêncio - mesmo no calor das negociações com a Inglaterrra sobre a
independência da Índia. Ele acreditava que uma falha em honrar o dia do
alimento espiritual o faria menos eficaz durante os outros seis dias.

Eu me pergunto o quanto nossos líderes espirituais seriam mais eficazes se nós


os encorajássemos a usar um dia por semana como momento de silêncio para
reflexão, meditação e estudo pessoal. Eu me pergunto como nossas igrejas seriam
se nós fizéssemos da saúde espiritual do pastor - e não sua eficiência - nossa
prioridade número um.

(Publicado originalmente em 14 de maio de 2001, na revista Christianity Today)

Tradução livre: Josaías Cardoso Ribeiro Jr.


Brasília-DF.

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