Você está na página 1de 7

O conceito de soberania: Do estado moderno até a atualidade

Felipe Dalenogare Alves

Resumo: Este artigo tem por objetivo proporcionar aos acadêmicos


de Direito, fonte indispensável acerca do conceito de soberania,
por meio de uma abordagem sobre a evolução histórica deste
conceito. Através de uma pesquisa bibliográfica objetiva, busca-
se, além de esclarecer a importância do conhecimento acerca do
assunto, o qual, por inúmeras vezes, é tema de debate não
somente em âmbito interno da nação, mas, principalmente, frente
à comunidade internacional, realizar um paralelo crítico entre o
significado do instituto da soberania, partindo-se do momento
histórico que cercava o estado moderno, chegando-se à concepção
de soberania vigente no momento atual.*

Palavras-chave: Estado Moderno; Estado Soberano; Soberania do


Estado; Soberania.

Abstract: This article aims to give scholars in law, indispensable


source about the concept of sovereignty, by means of an approach
on the historical evolution of this concept. Through a bibliographic
search search-objective if, in addition to clarify the importance of
knowledge about the subject, which, on many occasions, is the
subject of debate not only in the nation, but, more importantly,
forward to the international community, perform a critical parallel
between the significance of the Institute of sovereignty, the
historic moment which rule of the modern state, and the design of
existing sovereignty at the current moment..

Keywords: The Modern State; Sovereign State; State Sovereignty;


Sovereignty.

Sumário: 1. Introdução; 2. A Soberania; 3. Considerações Finais.

1. INTRODUÇÃO

Atualmente, muito se ouve falar sobre o instituto da Soberania,


mas sem, ao menos, saber qual a origem, o conceito e a
importância deste instituto para uma nação. Ao fazer uma
retrospectiva nos últimos acontecimentos envolvendo o instituto
da soberania, não se poderia deixar de mencionar a entrevista
dada ao Canal Livre, da Rede Bandeirantes de Televisão, no dia 06
de abril de 2008, pelo General Augusto Heleno Ribeiro Pereira,
comandante do Comando Militar da Amazônia, um dos grandes
comandos de área do Exército Brasileiro[1].

Na entrevista, o militar, referindo-se aos incidentes ocorridos no


episódio da demarcação na reserva de “Raposa/Serra do Sol”,
afirmou que a demarcação da área, um espaço de terras
considerável no estado de Roraima, onde somente indígenas e seus
convidados teriam acesso livre é atentar contra a Soberania
Nacional. O General possui esta concepção porque, hoje, se
constata a presença de várias ONGs internacionais, onde, sob o
consentimento dos indígenas, têm o acesso irrestrito, o qual nem o
poder estatal possui. Como se entenderá a afirmativa do referido
general, sem haver conhecimento sobre o significado e a
importância de Soberania? Para se entender o real significado, far-
se-á uma abordagem de todo o legado histórico que se descreverá
no decorrer do artigo.

2. A SOBERANIA

O conhecimento a respeito do conceito de soberania é


fundamental para se entender a formação do que se define por
Estado. De tamanha importância é o conceito, que Sahid Maluf
chega a afirmar que não há estado perfeito sem soberania[2].
Dessa forma, leva-se a concluir que ou o Estado é soberano ou não
é. Jamais existirá Estado soberano se não houver supremacia total
e absoluta de sua soberania.

Foi a partir do Estado Moderno, com o esplendor da Revolução


Francesa, que o conceito de soberania começou a ser concebido e,
pouco a pouco, em uma evolução histórica, foi lapidado, chegando
tal qual se vislumbra hoje.

No período conhecido pelas gerações contemporâneas como


período do Absolutismo, conceituava-se soberania, como um poder
supremo, mas um poder exclusivo, inabalável, inquestionável e
ilimitado do Monarca. Este poder era ratificado pela promiscuidade
com que a igreja afirmava ser a soberania do monarca, uma
representação do poder divino, chamado poder temporal. Aos
poucos, entretanto, o monarca foi, gradativamente, se tornando
independente do poder papal e se tornando realmente absoluto.
Assim, o monarca instaurou uma série de medidas, a fim de
exercer sua soberania, onde se descrevem as que aqui se julgam
mais importantes:

Aplicou os conceitos burocráticos, séculos antes do advento da


Teoria idealizada por Weber, ao instituir funcionários que
cumpriam ordens do monarca e desempenhavam as tarefas de
administração pública[3]. Estas funções eram ocupadas pela
nobreza e pela alta burguesia.

Criou as forças militares, onde existia sua força naval, exército e


polícia, criados para assegurar a ordem pública na sociedade e o
poder do governo em seu território.

Seu conceito de justiça foi colocado em prática, com a legislação


criada pelo poder absoluto colocada em prática em todo o
território onde seu poder era exercido.

Criou o sistema tributário, com a cobrança de impostos


obrigatórios, com a finalidade de manter o governo e a
Administração.

Instituiu um idioma oficial obrigatório em todo o território do


Estado, pelo qual se transmitiam ordens e leis, além de valorizar
seus costumes e sua cultura.

A partir destas ações, parte-se ao entendimento inicial sobre a


visão de soberania no Estado Moderno, tendo, entretanto, algo
ainda intrigante: a soberania na mão do monarca.

Na evolução histórica do conceito de soberania, há o pacto social


como fator determinante de uma nova concepção desse instituto.
Isso se deve à força com as novas ideias foram se desencadeando,
o que deu ao poder representante, ou seja, o poder político da
época, um poder absoluto sobre seus membros representando a
vontade geral e, desta forma, criando um novo entendimento por
soberania.

A partir deste marco, passou-se a observar a soberania como


inalienável e indivisível. Inalienável por representar a vontade
geral, não podendo de forma alguma ficar alienada e nem mesmo
se representar por quem quer que seja. Consequentemente, só se
tornará a vontade geral, indivisível, se houver a participação do
todo.
Para isso ocorrer, todavia, há de se impor certos limites ao poder
soberano, absoluto e inviolável, uma vez que este poder não pode
ultrapassar nem transgredir os limites das convenções gerais. Isso
se resume no de o monarca não poder sobrecarregar os cidadãos
de atos inúteis à comunidade, sem também poder exigi-las,
devendo fazer exigências de forma igualitária a todos os súditos.

À passos largos, existirá na teoria constitucional francesa do século


XVIII uma distinção sistemática entre soberania nacional e popular.
Houve nesta distinção, a concepção, no conceito de soberania
nacional, de que o poder representativo, com absoluta autonomia
jurídica, não apenas representava a vontade geral, mas era
representante da Nação. A soberania popular estava calcada no
fato de o representante expressar o que o representado quer, de
forma democrática.

No Estado Atual, em qual prisma se pode definir o que é um Estado


soberano? Para inicializar-se a contextualização de soberania em
um Estado Contemporâneo, há a necessidade de se relembrar as
principais características de soberania.

A soberania é una, uma vez que é inadmissível dentro de um


mesmo Estado, a convivência de duas soberanias. É indivisível, pois
os fatos ocorridos no Estado são universais, sendo inadmissível, por
isso mesmo, a existência de várias partes separadas da mesma
soberania. É inalienável, já que se não houver soberania, aquele
que a detém desaparece, seja o povo, a nação ou o estado. É
imprescritível, principalmente, justificando-se pelo fato de que
jamais haveria supremacia em um Estado, se houvesse prazo de
validade. A soberania é permanente e só desaparece quando
forçado por algo superior.

A soberania no prisma do Estado contemporâneo brasileiro é


garantida no trecho que segue abaixo, retirado de nossa lei
suprema[4]:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união


indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:

I - a soberania;”
Seria importante a soberania para um Estado? Aqui, se torna
pertinente uma observação acerca do caput do Art. 1º. Ao analisar
as entrelinhas do referido caput, “União indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal”, haveria soberania no Estado
brasileiro, caso não houvesse essa união indissolúvel? Por que a
soberania constitui o primeiro fundamento da República Federativa
do Brasil, seria mera coincidência? As respostas a estas perguntas
se fazem utilizando a simples dedução lógica.

Poderia se descrever acerca do conceito de soberania no Canadá


ou na Austrália, por exemplo, ambas colônias autônomas do Reino
Unido. Discorrer-se-á, entretanto, da soberania no Estado
Brasileiro, na visão atual. Levando-se em conta os ensinamentos
de Sahid Maluf, sobre os três elementos constitutivos do Estado:
população, território e governo, leva-se a acreditar que a
soberania hoje é oriunda de cada um dos cidadãos brasileiros[5].
De forma democrática, em um estado de direito, concede-se esta
soberania ao governo, ou seja, o poder representante.

Para se entender melhor este conceito de soberania nos dias


atuais, há a necessidade de distinguir a soberania do Estado e a
soberania no Estado, muito bem ensinada pelo professor Paulo
Bonavides[6]. A primeira trata de assinalar a preeminência do
grupo político, o Estado, sobre os demais grupos sociais internos e
externos. Neste plano, cita-se como exemplo as ONGs, Igreja e a
própria família como grupos internos e a comunidade internacional
como externo.

Observando-se a partir destas definições, acredita-se que a


manutenção da soberania do Estado atual está diretamente ligada
ao poder estatal em impor sua supremacia perante a grupos do
crime organizado (interna) e, com o constante crescimento da
globalização, a imposição de políticas internacionais efetivas, de
forma que sobreponha o respeito do Estado brasileiro sobre a ótica
da comunidade internacional, seja de cunho social, político,
econômico, cultural e militar (externa).

A segunda, por outro lado, a soberania no Estado, se concentra na


autoridade suprema do poder representante, na hierarquia dos
órgãos integrantes da Administração e, sobretudo, na justificação
da autoridade conferida ao titular do poder supremo, não
permitindo que dentro da sociedade haja um poder superior ao
seu. Assim, temos que, mesmo a soberania pertencendo ao próprio
povo, o povo deve se submeter a soberania no Estado.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do paralelo crítico supra exposto, conclui-se que o instituto


da soberania sofreu uma constante evolução do Estado moderno
até o atual. Partimos de um modelo soberano como a
representação da vontade do monarca, o poder absoluto e
inquestionável exercido unicamente por esta figura. Hoje,
entende-se por soberania a vontade do povo, representada pela
supremacia do poder estatal, garantido pela Carta Constitucional.

Assim, consegue-se interpretar o teor das declarações do General


Heleno, ao ressaltar a atenção que o governo deveria dar à
demarcação da reserva indígena em Roraima, onde o próprio poder
estatal não tem acesso. A evolução histórica foi constante e se
pode observar que foi a partir do contrato social que iniciou-se a
vislumbrar o conceito atual de soberania, uma soberania não
representando o poder absoluto do governante, mas uma soberania
oriunda do povo.

Referências
BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10 ed. São Paulo: Malheiros,
2000.
BRASIL. Constituição da República Federativa do
Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília: Câmara dos
Deputados, 2008.
HELENO, Augusto Ribeiro Pereira. Entrevista sobre a Soberania
Nacional na demarcação de Raposa/Serra do Sol.São Paulo: CANAL
LIVRE/BAND, 06 abr 2008.
MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 23 ed. São Paulo: Saraiva,
1995.
WEBER, M. A objetividade do conhecimento nas ciências sociais.
In: COHN, G. (Org.) Max Weber. 4 ed. São Paulo: Ática, 1991.

Notas:
* Artigo orientado pela profa. Patrícia Medianeira Mino Ferrari,
Docente do Curso de Direito da Universidade Luterana do Brasil,
Campus Cachoeira do Sul, RS. Mestranda em Filosofia pela
Universidade Federal de Santa Maria.
[1] HELENO, Augusto Ribeiro Pereira. Entrevista sobre a Soberania
Nacional na demarcação de Raposa/Serra do Sol. São Paulo:
CANAL LIVRE/BAND, 06 abr 2008.
[2] MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 23 ed. São Paulo:
Saraiva, 1995.
[3] WEBER, M. A objetividade do conhecimento nas ciências
sociais. In: COHN, G. (Org.) Max Weber. 4 ed. São Paulo: Ática,
1991.
[4] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de
1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 15 jun. 2009.
[5] MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 23 ed. São Paulo:
Saraiva, 1995.
[6] BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10 ed. São Paulo:
Malheiros, 2000.

Informações Sobre o Autor


Felipe Dalenogare Alves

Graduado em Direito pela Universidade Luterana do Brasil, campus


Cachoeira do Sul - RS; Pós-Graduando lato sensu (Especialização)
em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes e em Gestão
Pública Municipal pela Universidade Federal de Santa Maria; Pós-
Graduando stricto sensu (Mestrado) em Direito pela Universidade
de Santa Cruz do Sul

Você também pode gostar