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Nelson Job
Rogerio Mandelli
Valeria Portugal
[Org.]
Luiz Pinguelli Rosa
Nelson Job
Rogerio Mandelli
Valeria Portugal
[Org.]
© 2018 Auterives Maciel Jr., Frederick Travis, Gregory
Chaitin, Luiz Pinguelli Rosa, Nelson Job, Rogerio Mandelli,
Valeria Portugal
9
A Consciência da Obra de Arte e o Devir-Outro do Criador
Auterives Maciel Jr.
29
A Science of Consciousness: Meditation Techniques as Scientific
Probes of the Structure of Conscious Experience
Frederick Travis
43
Consciousness and Information
Gregory Chaitin
51
Introdução ao Problema da Inteligência Artificial e da Mente: Discussão
de Textos Básicos e a Polêmica sobre o Modelo Quântico de Penrose
Luiz Pinguelli Rosa
97
Emergências no Inominável: os Aspectos Imanentes à Consciência
no “Conceito” de Vortex
Nelson Job
113
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência
Rogerio Mandelli
141
Um Lampejo na Escuridão: uma Proposta Prática para se Avivar o Observador
Valeria Portugal
Apresentação
A consciência que efetua a criação da obra de arte é o meio fluido que co-
necta o pensamento com o ser do sensível1 pelo ato de criação que ela torna
possível. Assim, ela se mostra fora de seu estado comum quando é rever-
tida por alguma coisa oriunda da sensibilidade. Sendo verdadeira a tese
de que a consciência comum trabalha em função dos interesses práticos –
estando esses condicionados por opiniões –, deve existir alguma coisa no
seio do sensível que venha produzir um efeito suspensivo na ação motriz
da consciência, colocando-a à disposição do pensamento. Algo que altere
o seu estado normal, vertendo-a à urgência de um pensamento nascido na
esfera de um questionamento do sensível.
Com isso, apresentamos dois estados de consciência: um banal – “interes-
seiro”, utilitário e imerso na opinião – e outro intensificado por uma atenção
oriunda de um impacto sensorial que afeta imediatamente a sensibilidade.
Partindo da premissa de que o pensamento na arte – implicado na criação
estética – se engendra em circunstâncias especiais, torna-se plausível dizer
que a consciência, inerente a tal ato, se evidencia na situação de uma exceção
que contraria seu curso corriqueiro. Há, portanto, uma consciência estética
ocasionada por uma experimentação que condiciona a criação da obra de
arte e faz desta o meio de conservação da sua intensificação. Como explicar
tal experimentação? Apresentando, primeiramente, uma definição geral da
consciência para detalhar a diferença da sua condição estética.
Consciência é, em princípio, o intervalo de indeterminação existente
entre a percepção do mundo externo e o reconhecimento exigido quando
*
Auterives Maciel Jr. é doutor em Teoria Psicanalítica pela UFRJ e mestre em Filosofia pela Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (Uerj). Atualmente leciona no departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro (PUC-Rio) e no programa de pós-graduação (mestrado e doutorado) em Psicanálise, Saúde e Sociedade
da Universidade Veiga de Almeida (UVA-Rio). É autor dos livros Pré-socráticos – a invenção da Razão. São Paulo: Odys-
seus, 2001 e O todo-aberto – duração e subjetividade em Henri Bergson. Rio de Janeiro: Arquimedes, 2017.
1
Ser do sensível é aquilo que só pode ser sentido pela sensibilidade. Algo intenso que mobiliza a sensibilidade,
forçando o pensamento a se exercer. Tal noção, desenvolvida por Gilles Deleuze em Diferença e repetição, será devida-
mente apresentada na segunda metade deste estudo. Aqui, adiantamos uma definição provisória para estabelecermos
um esclarecimento inicial.
12 A Transdisciplinaridade da Consciência
este é percebido, para que se cumpra de modo eficaz a ação motora do ser
animado em geral e, mais especificamente, do ser humano. De acordo com
Bergson – segundo uma tese exposta no primeiro capítulo de Matéria e
memória2 –, a consciência habita o intervalo interno de todo ser movente,
sendo acionada por uma hesitação existente entre o ato de perceber, o afeto
que ocupa o intervalo subjetivo e a ação a ser executada. Com tal caracte-
rística, ela marca sua condição seletiva mediante uma dupla operação: por
um lado, analisa os estímulos que procedem do corpo e escolhe, dentre as
respostas possíveis, qual ação deve ser devidamente eleita para reagir ao
estímulo. Para isso, na hesitação existente entre o perceber, o sentir e o
agir há o esforço para reconhecer a realidade pela rememoração do passa-
do, cumprindo com as obrigações condicionadas por interesses orgânicos
e sociais. Por outro lado, o intervalo – por mais rudimentar que possa ser
– deve ser chamado de tempo da indeterminação; pois, nele, um certo coe-
ficiente de liberdade se torna possível, acentuando-se toda vez que o ser se
coloca à disposição de um pensamento que crie problemas, por meio de um
estado que altere o fluxo da consciência habitual.3
Sendo assim, podemos dizer, por um lado, que a função habitual da
consciência é presidir os interesses práticos que ganham fundamento nas
necessidades orgânicas e nos meios organizados pelas opiniões. A regula-
mentação dos hábitos, o ouvir dizer – ocasionado pela difusão da lingua-
gem – e os diversos interesses orgânicos que necessitam de um cuidado
fundamentado na esfera da atenção à vida tornam a consciência um re-
curso a serviço de uma inteligência utilitária, voltada para a manutenção
adaptativa do indivíduo ao seu meio.
Por outro lado, nos estados alterados de consciência, existe um pensa-
mento ativado por experimentações sensíveis, isto é, por algo existente no
sensível que desconstrói seus hábitos corriqueiros. Desse modo, isto força
o ser humano a pensar, retira a consciência de sua atenção habitual, colo-
cando-a em estado de pura atenção. Nesse estado, o ser humano contempla
o que percebe e objetiva o que sente, colocando-se na esfera do sensível
2
Essa definição da consciência de fato pode ser lida ao longo do primeiro capítulo de Matéria e memória. Ao longo do
estudo, o leitor perceberá que as teorias de Bergson serão utilizadas em função do intervalo de indeterminação toda
vez que estivermos situando a consciência no seu aspecto temporal.
3
Tempo de indeterminação é, igualmente, uma duração interna que em Bergson se mostra como um tempo hete-
rogêneo constituído por uma multiplicidade qualitativa ou virtual. Tal tese, exposta no livro Ensaios sobre os dados
imediatos da consciência, é aludida no trabalho como a condição preliminar de uma consciência contemplativa. Que-
remos, com isso, pensar livremente a condição da consciência imediata quando ela se livra dos interesses práticos ou
sensório-motores.
A Consciência da Obra de Arte e o Devir-Outro do Criador 13
4
Inconsciente puro do pensamento e pensamento inconsciente são diferenças demonstradas por Deleuze a partir da
Ética de Spinoza. De acordo com Deleuze, há em Spinoza uma concepção de pensamento referida a uma potência de
pensar que é inconsciente em relação à qual a consciência é efeito. Observem que aqui não falamos de representações
recalcadas, mas de uma potência de pensar que pode ativar a consciência quando ela for exercida. Tal exercício será,
no nosso trabalho, a condição da consciência alterada. Sobre o inconsciente puro do pensamento, ver Gilles Deleuze,
Espinosa – filosofia prática, capítulo 2.
14 A Transdisciplinaridade da Consciência
5
A contemplação na arte é explorada por Deleuze e Guattari na conclusão de O que é a filosofia?, para explicitar a
condição estética de uma síntese passiva que apreende a sensação em estado puro. Tal ideia já havia sido utilizada por
Deleuze no capítulo “A repetição para si mesma”, do livro Diferença e repetição, e foi retomada na conclusão, intitulada
“Do caos ao cérebro”, escrito pela dupla. Aqui utilizamos a noção de contemplação relacionando-a a um momento
páthico da consciência estética.
6
A intuição é a visão direta do espírito por ele mesmo. Com tal palavra, Bergson propõe um meio de acesso imediato
da duração interna e elabora, posteriormente, seu método filosófico com o mesmo nome. Aqui utilizamos a intuição
como maneira de acesso imediato da duração e propomos essa forma como a condição da consciência rara. Sobre a
intuição, recomendamos a leitura dos dois capítulos iniciais do livro O pensamento e o movente, de Henri Bergson.
A Consciência da Obra de Arte e o Devir-Outro do Criador 15
A consciência rara
Há, no sensível, alguma coisa que faz nascer o ato de pensar no seio do
pensamento; isto é, algo que engendre o ato de pensar através de uma ex-
perimentação. É que, nessa inflexão, pensar é um acontecimento que supõe
uma ocasião para existir; pois não pensamos no elã de um gosto ou de
vontade; tampouco de uma maneira reta e natural. Para pensarmos, é pre-
ciso que nos coloquemos em uma situação experimental que condicione o
surgimento desse acontecimento que é o ato de pensar.
Ora, isso que torna possível o ato de pensar não é, obviamente, um
objeto passível de ser reconhecido; pois, quando reconhecemos, perma-
necemos na esfera dos interesses práticos, uma vez que o reconhecimen-
to é uma atividade a serviço de uma ação definida por representações
interessadas. Sendo assim, isso que força a pensar acontece quando não
reconhecemos uma situação e somos, por isso, forçados a contemplar
alguma coisa que intensificou nossos sentidos. Deleuze tem razão quan-
do diz que aquilo que nos força a pensar é o objeto de um encontro, isto
é, um signo que advém de um encontro que mobiliza a sensibilidade,
colocando-a em presença daquilo que só pode ser sentido. É assim que
ele irá se opor ao reconhecimento, pois o sensível, no reconhecimento,
“nunca é o que se pode ser sentido, mas o que se relaciona diretamente
com os sentidos num objeto que pode ser lembrado, imaginado, concebi-
do” (DELEUZE, 2003, p. 206). A respeito do objeto do encontro, Deleuze
dirá que:
A Consciência da Obra de Arte e o Devir-Outro do Criador 17
7
A apresentação da sensação como um composto de afetos e perceptos inaugura o capítulo sobre a criação artística
que Deleuze e Guattari apresentam no livro O que é a filosofia?. Ao longo do texto, o leitor terá detalhes sobre os diversos
procedimentos artísticos apresentados como exemplos das definições acima propostas. Além disso, na conclusão desse
livro, intitulada “Do caos ao cérebro”, os dois autores irão trabalhar a criação na arte por meio desse crivo no caos, dizen-
do como é plausível uma construção de uma lógica das sensações erigida por um procedimento criacionista.
8
Deleuze e Guattari, idem.
20 A Transdisciplinaridade da Consciência
9
A análise do Livro do desassossego feita por José Gil se encontra desenvolvida ao longo dos dois primeiros capítulos
de Fernando Pessoa ou a metafísica das sensações. Lá, o autor apresenta os detalhes que fundamentam a ideia de que tal
livro seja a exposição do laboratório poético de Fernando Pessoa.
A Consciência da Obra de Arte e o Devir-Outro do Criador 21
10
Todas as páginas iniciais do Livro do desassossego são uma apologia das “horas lentas e vazias”, onde nelas o desas-
sossego cresce. Em Fernando Pessoa, a ideia de desassossego se vincula à capacidade de análise das sensações posta
como uma conquista do terreno primário dos sentires. Para um esclarecimento geral da ideia, indicamos a leitura
das páginas 54-80 do Livro do desassossego. Nelas, teremos a precisão deste estranho desassossego na vida anódina
de Bernardo Soares.
A Consciência da Obra de Arte e o Devir-Outro do Criador 23
Ou seja, a obra faz conservar aquilo que na vida se dissipa; ela faz durar
na textura intrínseca do seu material um bloco de sensações configura-
dos em um meio por nós nomeados de consciência. Na obra, a consciência
pode ser difusa, maleável, afeita à consecução de metáforas, de conexões
pouco prováveis na vida, mas que se tecem pela composição do poema,
sendo, por isso, a consciência autônoma da obra. Queremos, com isso, dizer
que a obra é, rigorosamente, a expressão consciente de uma minuciosa aná-
lise das sensações. Sendo assim, a consciência da obra é o palco das visões
e audições que animam o poema, materializando ideias. Ela é o meio de um
pensamento páthico versificado e devidamente analisado.
A ideia de uma consciência imanente à obra de arte é evocada por De-
leuze e Fernando Pessoa em contextos diferenciados da arte. Por exem-
plo, no livro Cinema 1 – a imagem-movimento, pensando com Bergson
uma consciência de direito imanente à matéria,11 Deleuze dirá que o filme
montado e exibido na tela dá a esta o estatuto de uma consciência. Mas
como é possível tal comparação? Como pensar uma consciência de direito
imanente à matéria? Concebendo – a partir de Bergson – a matéria como
um conjunto de imagens móveis. Ao situar as imagens vistas pelos ho-
mens no plano da matéria, Bergson concebia tal plano de imanência como
portador de uma consciência difusa e virtual. Procedia contraditando a
fórmula idealista que situava a imagem na consciência humana ao reduzi-
-la à condição de representação. Em Matéria e memória, Bergson chega a
dizer que a matéria é, em si mesma, um conjunto de imagens móveis, e que
estas supõem, ao menos de direito, uma consciência difusa e virtual. Ora, a
consciência do ser humano – através da qual ele seleciona o que vê e pensa
no que vai agir – é, de fato, uma tela negra onde irão se revelar as imagens
do mundo segundo os seus interesses. Mas, nesse caso, a consciência se-
letiva do humano foi assimilada a uma tela negra, a um ecrã. A rigor, ele
reflete e enquadra as imagens do mundo, formando um mundo próprio se-
11
Existe um capítulo intitulado “A imagem-movimento e as suas três variedades”, no qual Deleuze aborda o pri-
meiro capítulo de Matéria e memória, de Bergson, para extrair da análise uma ideia de consciência virtual imanente
ao plano da matéria e a ideia, não menos profícua, de assimilar a tela cinematográfica à consciência limpa do filme.
Para mais detalhes dessa aproximação que analisamos no texto, indicamos Cinema 1 – a imagem-movimento, capítulo
4, p. 93-114.
26 A Transdisciplinaridade da Consciência
O devir-outro do criador
e a língua inventada na arte
Na consciência comum, agimos desempenhando papéis devidamente
configurados nas esferas sociais. Somos enunciadores parciais de tipos
históricos e bem delimitados. A enunciação do ato de fala pela via da
abordagem pragmática torna o homem um tipo psicossocial definido
pelo contexto territorial no qual ele fala. Por exemplo, “eu vos falo na
condição de presidente da República”; ou “falo na condição de amante, de
amigo, de patrão” etc. Em sociedade, os seres falantes habitam territórios
e se configuram como tipos que marcam o advento de uma formação ter-
ritorial. Ou seja, os tipos psicossociais são índices de territórios que mar-
cam o meio histórico de uma determinada época. Sendo assim, é justo
concordar com Deleuze e Guattari quando dizem que cada época possui
os seus tipos, se definindo pelos territórios que demarcam a distribuição
dos homens no campo social.
Na criação artística – que põe em relevo a intuição que traceja o plano
de composição –, assistimos ao advento de figuras estéticas – segundo a
28 A Transdisciplinaridade da Consciência
12
As figuras estéticas fazem parte da lógica das sensações. São evocadas como explicações dos devires do criador no
capítulo em que Deleuze e Guattari tratam da criação na obra de arte. Para um melhor detalhamento de tais figuras,
indicamos a leitura de “Percepto, afecto e conceito”. In: O que é a filosofia?, p. 229-232.
A Consciência da Obra de Arte e o Devir-Outro do Criador 29
13
Heterônimos poetas são essenciais em toda a obra escrita por Fernando Pessoa. Na Obra poética completa, encon-
tramos os poemas de todos os principais heterônimos e de outros não mencionados neste estudo. Os heterônimos, na
nossa avaliação, são os devires do poeta que foram, brilhantemente, nomeados por Fernando Pessoa. Aqui, propomos
uma associação entre tais heterônimos e as figuras estéticas analisadas por Deleuze e Guattari.
30 A Transdisciplinaridade da Consciência
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A Science of Consciousness:
Meditation Techniques
as Scientific Probes of the Structure
of Conscious Experience
Frederick Travis*1
Introduction
A science of consciousness should study the full extent of consciousness,
which research suggests ranges from the level of consciousness (tonic
wakefulness) to the contents of consciousness (specific thoughts, feelings,
and perceptions of outer objects and experiences) (KOCH & TSUCHIYA,
2007). These two aspects of consciousness are intertwined during ordi-
nary waking experiences. Consequently, most scientists, beginning with
William James, have concluded that consciousness cannot exist without
an object (JAMES, 1890/1951; NATSOULAS, 1997). For instance, Searle, a
philosopher who studies the brain and consciousness, defined conscious-
ness as (SEARLE, 1999):
By ‘consciousness’ I simply mean those subjective states of
sentience or awareness that begin when one awakes in the
morning from a dreamless sleep and continue throughout
the day until one goes to sleep at night or falls into a coma, or
dies, or otherwise becomes, as one would say, ‘unconscious’.
(p. 40-41)
*
Fred Travis is a professor at Maharishi University of Management.
32 A Transdisciplinaridade da Consciência
Figure 1: EEG coherence maps during Mindfulness Meditation and Transcendental Meditation. Notice that in
the top row (Mindfulness Meditation), the areas of peak coherence are in the theta and the alpha-2 bands. In
the bottom row (Transcendental Meditation), the area of peak coherence is in the alpha-1 band.
34 A Transdisciplinaridade da Consciência
S e l f - A w a r e n e ss
NO YES
T h o u g h ts
YES
Dreaming Waking
NO
Figure 2. Comparison of subjective and objective experiences during waking, sleeping, dreaming, and pure
consciousness.
36 A Transdisciplinaridade da Consciência
This conclusion is a valid one for the waking experience, which always
includes a sense of self with changing content. However, pure consciousness
is a distinct, reported experience during Transcendental Meditation practice.
One person describes their experiences during Transcendental Medita-
tion practice in this way:
...during my TM practice, I experience deep, unbounded si-
lence, during which I am completely aware and awake, but
no thoughts are present. There is no awareness of where I am,
or the passage of time. I feel completely whole and at peace.
exist, for the depths of the mind are transformed into the na-
ture of the Self. All the desires which were present in the
mind have been thrown upward, as it were, they have gone
to the surface, and within the mind the finest intellect gains
an unshakeable, immovable status. (pg. 151)
Conclusion
A science of consciousness needs to consider the full range of conscious-
ness from computation of sensory experience, when consciousness is
identified with changing objects, to consciousness in its most expanded
state – being outside the boundaries of time, space and body sense. One’s
sense of self is more than individual characteristics, personality, and style
A Science of Consciousness: Meditation Techniques as Scientific Probes of the Structure of Conscious Experience 41
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Consciousness
and Information
Gregory Chaitin*1
*
Gregory Chaitin is an Argentine-American mathematician living in Rio de Janeiro. His father was the play-
wright Norman Chaitin, whose 1962 feature film The Small Hours is preserved in the Film Library of the MoMA,
in NY, and was screened there in April 2016 with the presence of its writer/director, Norman Chaitin, who died
later that year at the age of 92. A documentary by Karol Jałochowski, in which Gregory and Virginia Chaitin
discuss creativity at their philosophical retreat on the tropical island of Paquetá, was broadcast on Polish TV
in 2015, and in 2017, their son João Bernardo Fontes Chaitin was born in Rio de Janeiro. The year of 2017 also
marked Chaitin’s 70th birthday and the 30th anniversary of the Cambridge University Press publication of his
first book, Algorithmic Information Theory, coincidentally the first volume in the Cambridge Tracts in Theoretical
Computer Science.
46 A Transdisciplinaridade da Consciência
comparison with what is perhaps becoming its chief contender, the in-
creasingly elaborate Tononi integrated information theory of conscious-
ness (TONONI, 2012; KOCH, 2012).
Note especially how much easier it is to measure consciousness ac-
cording to Chalmers as opposed to the extreme computational difficulties
of the Tononi Φ proposal, which requires considering all possible parti-
tions of a physical system.
In conclusion, I believe that Chalmers’ panpsychism remains vigorous
and stimulating, especially if taken in the context of digital philosophy,
which attempts to build the world out of information and computation
rather than matter and energy.
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Introdução ao Problema da
Inteligência Artificial e da Mente:
Discussão de Textos Básicos
e a Polêmica sobre o Modelo
Quântico de Penrose
Luiz Pinguelli Rosa*1
*
Luiz Pinguelli Rosa é professor do Coppe e do HCTE, ambos da UFRJ.
54 A Transdisciplinaridade da Consciência
tos são novos na ciência e polêmicos. Será possível vir a existir vida não
biológica?
Cairns-Smith (1993) especulou que a forma de vida atual, baseada em
cadeias de átomos de carbono nas moléculas da química orgânica que
constituem as células vivas, já seria a segunda forma de vida na Terra. Teria
sido antecedida por uma primeira, muito incipiente, pré-biológica, forma-
da por cadeias de cristais de argila. Logo, os computadores poderiam vir a
ser a terceira forma de vida na Terra, sucedendo a atual. A primeira forma
de vida, nessa concepção, também teria sido baseada em moléculas da quí-
mica inorgânica, como são na sua essência os computadores, pelo menos
os atuais. Ou seja, nessa concepção:
1a forma de vida: pré-biológica, baseada em cristais de argila.
2a forma de vida: biológica, baseada em moléculas orgânicas de
carbono.
3a forma de vida: pós-biológica, baseada em computadores inteli-
gentes.
Os cristais microscópicos de argila se desenvolvem pelo processo físi-
co normal de crescimento de cristais, formando estruturas ordenadas de
átomos, as quais se rompem reproduzindo a mesma estrutura, como uma
cópia da original. Podem deslocar-se eventualmente, crescer e partir-se
de novo. Logo se reproduzem. Nesse processo, pequenos defeitos podem
ocorrer na ordenação dos átomos na estrutura cristalina, alterando suas
propriedades físicas e químicas. Surgiram variações – umas mais densas,
outras menos, ou esponjosas –, permitindo que a água penetre e traga ou-
tros minerais para se agregarem à argila. Reúnem-se os ingredientes da
evolução: reprodução, hereditariedade e mutação.
Não é claro o que o autor considera ser a competição para sobreviver, já
que também não é explícito o que seja a vida nessa regressão de conceitos
da biologia para o mundo pré-biológico. Como há formas de argila estáveis
e outras menos estáveis, a sobrevivência pode equivaler à permanência
no tempo, incluindo a reprodução. Como a definição científica de vida é
interna à biologia, a extrapolação do conceito torna-se uma questão não
científica, mas epistemológica ou da filosofia da ciência. De acordo com
Cairns-Smith, a argila serviu de molde para a agregação de grandes molé-
culas com cadeias de átomos carbono – muito mais estáveis e eficientes –,
abrindo o caminho para surgir a vida biológica que conhecemos.
Nessa linha de pensamento especulativo, ao criarmos os computadores
podemos ter decretado a substituição no longo prazo de nossa forma de
Introdução ao Problema da Inteligência Artificial e da Mente 55
vida por outra – à base de silício e outros materiais – mais apta a sobre-
viver. E, acrescentemos, as mudanças do meio ambiente podem dificultar
muito a vida biológica atual e a sobrevivência do homem sobre a Terra;
pela poluição, destacando-se o efeito estufa que aquece o planeta, pelo es-
gotamento de recursos naturais ou por uma guerra nuclear.
Essa especulação extravagante é exatamente oposta à polêmica conjetu-
ra de Penrose (1989, 1994), que veremos detalhadamente, buscando negar
a possibilidade de vida mental própria nos computadores. Ao negar essa
possibilidade, Penrose considera que há no cérebro algo a mais além da
computação para dar conta da emergência do novo e da criatividade hu-
mana. Penrose se inspira no Teorema de Gödel, que reduz o problema da
mente à microfísica e, portanto, à mecânica quântica – o que é polêmico.
O problema da inteligência nos conduz inevitavelmente ao problema da
mente humana, que requer uma explicação científica. Longe de ser trivial,
essa explicação ainda não é consensual nem sequer no âmbito da neuro-
ciência, envolvendo aspectos filosóficos polêmicos, como o dualismo car-
tesiano e o reducionismo, como veremos a seguir.
6w + 2 x − y 3 = 0
5xy − z 2 + 6 = 0
w2 − w + 2x − y + z − 4 = 0
w 2 − w + 2x − y + z − 3 = 0
biológicos de computação para certas funções. Isso sem falar nos avanços
no software, como as redes neuronais e os algoritmos genéticos, imitan-
do os sistemas biológicos de adaptação e de aprendizado na computa-
ção bottom-up, em contraste com a tradicional top-down. Na computação
bottom-up, as regras de operação e o conhecimento não estão totalmente
especificados, a priori, mas, em vez disso, o sistema aprende com a expe-
riência, modificando seu conhecimento ao operar repetidas vezes sobre os
dados que recebe como input.
Chegamos aqui à pergunta crucial de Penrose (1994): poderá um com-
putador, no futuro, ter uma mente como a humana? Para respondê-la, há
quatro pontos de vista possíveis:
A) Todo o pensamento reduz-se à computação, e a consciência
pode ser produzida através da computação apropriada.
B) A consciência decorre das atividades físicas que ocorrem no cé-
rebro e somente nele e, embora elas possam ser simuladas em
computador, as simulações por si só não produzem a consciência.
C) As atividades físicas do cérebro que produzem a consciência
não podem ser simuladas.
D) A consciência nem se reduz à computação nem às atividades
físicas do cérebro e não pode ser explicada cientificamente.
Vamos, didaticamente, decompor em um quadro matricial os quatro
pontos de vista segundo as respostas de cada um deles a três perguntas
que ordenamos na tabela 1. Resulta para o ponto de vista A a resposta sim
a todas as três perguntas, e assim por diante, até o D, que nega todas, como
vemos a seguir usando uma notação booleana com 1 = sim e 0 = não: A =
(1,1,1); B = (1,1,0); C = (1,0,0); e D = (0,0,0).
Os dois extremos são contestados por Penrose. O último, D, ele o con-
sidera místico-religioso por negar a capacidade da ciência para enten-
der a mente humana. O primeiro, A, que chama de Inteligência Artificial
Forte, ele considera funcionalista e insatisfatório. Acha que, para efeitos
práticos, B se confunde com A. Por exclusão, podemos ver que sua pre-
ferência recai sobre o ponto de vista C. Mas, apesar disso, respeita como
científico o ponto de vista A, do qual se ocupou basicamente no seu pri-
meiro livro sobre o tema (PENROSE, 1989). A ele retornou em confronto
com os demais, de modo mais aprofundado no segundo livro (PENROSE,
1994) – que, em boa parte, busca responder às críticas ao primeiro livro
–, e em outros textos.
64 A Transdisciplinaridade da Consciência
respostas
perguntas 1 = sim; 0 = não
a b c d
A consciência decorre de atividades físicas do
1 1 1 0
cérebro?
Todas as atividades do cérebro, físicas, podem
1 1 0 -
ser simuladas?
Tais simulações podem produzir consciência
1 0 0 -
em computadores?
ele, falta um ingrediente na descrição do mundo pela ciência atual, pois não
há teoria física nem biológica que explique nossa consciência nem nossa
inteligência; o que fazemos com o nosso conhecimento científico hoje é
outra coisa.
Vejamos agora por que Penrose descarta o caos determinista na tenta-
tiva de explicar a mente. Sistemas caóticos são sistemas físicos dinâmicos
ou simulações deles por modelos matemáticos que podem se comportar
de um modo imprevisível. Isso ocorre porque são extremamente sensíveis
a mínimas variações das condições iniciais e nunca temos um controle
absoluto da precisão destas. Apesar de serem governados por equações
perfeitamente deterministas e serem programáveis em computador, sua
evolução no tempo apresenta uma aparência não determinista. Isso ocorre
na previsão meteorológica e também em sistemas simples como um pên-
dulo sob a ação de um campo magnético.
Entretanto, embora imprevisíveis na sua forma, específicos comporta-
mentos dos sistemas caóticos são sempre enquadrados nos tipos de com-
portamentos plausíveis do sistema considerado. Ou seja, não podemos
prever o tempo na meteorologia, mas o resultado da computação é sempre
um dos comportamentos possíveis da atmosfera. O mesmo ocorre com
o pêndulo em interação com o campo magnético: sua trajetória varia es-
tranhamente e não podemos predizê-la em cada caso. Mas é sempre uma
das trajetórias possíveis do pêndulo, limitada a uma porção do espaço fí-
sico e com velocidades dentro de limites bem estabelecidos. Por exemplo,
a distância da massa ao ponto fixo não se altera no movimento se a massa
estiver presa por uma haste rígida. Enfim, o comportamento dos sistemas
caóticos é imprevisível dentro de limites, mas não o suficiente para dar
conta da imprevisibilidade criadora e da riqueza da mente humana.
Penrose descarta também a possibilidade de que a teoria quântica exis-
tente seja suficiente para explicar a consciência, pois é, como a mecânica
clássica, uma teoria algorítmica. Nessa última, como vimos acima, ele des-
cartou o caos determinista por poder ser programado em computador e
sua imprevisibilidade ser limitada pelas possibilidades de o sistema evoluir
no chamado espaço das fases. Quanto à hipótese de o indeterminismo da
mecânica quântica (necessário na interpretação das medidas das grandezas
físicas, embora haja uma evolução determinista do sistema governada por
uma equação) ser a explicação da consciência, inclusive do livre-arbítrio,
Penrose a refuta em duas direções. Em uma delas, refuta que a mente, to-
mada em abstrato e separada dualmente da matéria ao estilo cartesiano e
Introdução ao Problema da Inteligência Artificial e da Mente 67
A microfísica da mente
O aspecto mais polêmico do livro de Penrose (1994) é a explicação que ele
conjetura para a consciência a partir da mecânica quântica e da reformula-
ção dessa teoria na fronteira com a física clássica.
Como ponto de partida de sua conjetura coloca duas questões:
a) Por que a consciência só é produzida no cérebro?
b) Por que, se ela for explicada por uma nova teoria quântica não
algorítmica na interface com a física clássica, algum efeito não
se faria sentir na matéria em geral fora do cérebro?
Penrose vai buscar a resposta no fenômeno de coerência, em que mui-
tas partículas ocupam o mesmo estado quântico, como nos raios laser e
na supercondutividade. O sistema entra em um regime cooperativo entre
seus componentes e funciona como um todo. Nessa conjetura, ocorreria no
cérebro um fenômeno de coerência similar à supercondutividade. Mas a
supercondutividade só ocorre a temperaturas extremamente baixas, dife-
rentemente das condições do cérebro. Torna-se então indispensável buscar
indícios nos resultados experimentais para essas conjeturas. Baseando-se
Introdução ao Problema da Inteligência Artificial e da Mente 69
As diferentes abordagens
O estudo da mente, além da crítica às ideias de Penrose, comporta dois
tipos de abordagens paralelas. Uma delas é sobre a compreensão da mente,
da consciência e da inteligência humana. A outra liga-se ao desenvolvi-
mento dos computadores, às perspectivas da inteligência artificial e dos
robôs, especialmente quanto à possibilidade de adquirirem consciência.
A primeira abordagem passa pelo avanço da biologia, da psicologia e da
neurologia, além de ligar-se à filosofia da ciência e à medicina. A outra tem
mais a ver com o estado da arte e o futuro da tecnologia da computação, ao
qual voltaremos no fim deste capítulo.
A literatura científica sobre a mente se tornou profícua nos anos 1990,
independentemente da polêmica influenciada por Penrose (1989, 1994).
Além de Searle (1997) e dos trabalhos por ele citados – dos biólogos Crick
(1994) e Edelman (1992) e dos filósofos Dennet (1991) e Chalmers (1996) –
alinhamos alguns livros desse período. Dois deles foram traduzidos para o
português, escritos para divulgação científica, dos médicos neurologistas
Damásio (1994) e Sacks (1995). Utilizamos também dois livros especiali-
zados sobre a ciência da consciência, adotados na pós-graduação de Enge-
nharia de Sistemas do Coppe (UFRJ), e artigos publicados sobre pesquisas
realizadas no Coppe (VIDAL DE CARVALHO, 1999). Ambos os livros têm
Introdução ao Problema da Inteligência Artificial e da Mente 77
Francis Crick – que, em 1953, havia descoberto com James Watson a estru-
tura do DNA – criou no Caltec os Seminários em Neurociências. Foi Crick
quem, segundo Horgan (1996), mudou a atitude dos cientistas, até então re-
lutantes, sem considerar a consciência como objeto da pesquisa científica.
Vamos iniciar pela abordagem médica, por ser mais intuitiva, para, a partir
dela, introduzir a abordagem da neurobiologia.
Monismo Dualismo
↓ ↓ ↓ ↓
Idealismo Materialismo Substância Propriedade
↓ ↓
Behaviorismo Fisicalismo
↓ ↓
funcionalismo
As previsões tecnológicas
sobre inteligência artificial
As abordagens que vimos mostram outro lado da questão além das ousa-
das conjeturas de Penrose. Mas é no terreno da inteligência artificial que a
polêmica se acirra, sobre, na prática da tecnologia, um computador ou um
robô virem a possuir consciência. O debate é exaltado e as prospectivas
são, no mínimo, estranhas.
Poderíamos aqui conjeturar que, empiricamente, poderão ser verifica-
das uma das situações:
1) um computador jamais poderá adquirir consciência.
2) se isso for possível, poderá ocorrer na prática uma das três
hipóteses:
a) o nível mental estará muito abaixo do humano, a despei-
to da alta eficiência na computação algorítmica do robô;
b) terá um nível mental à semelhança do humano;
c) seu nível mental será superior.
90 A Transdisciplinaridade da Consciência
assim seja nem que os teoremas por ela obtidos sejam sempre corre-
tos...” (CASTI, 1994). Casti vê nessa afirmação de Gödel a possibilidade
de se chegar evolutivamente a um computador que simule o cérebro,
não desenhado racionalmente para isso. Toma partido então da corren-
te pró-inteligência artificial bottom-up ou conexionista (computadores
aprendem com redes neuronais, por exemplo) em confronto com os
pró-top-down ou simbolistas. Contra estes últimos, cita a argumentação
de que não se pode programar um computador para dirigir um carro,
como faz o ser humano. Mas acredita que talvez se possa ensiná-lo
usando redes neuronais.
Há algumas características do cérebro sobre as quais nos referimos que
o diferencia dos computadores, dificultando simulá-lo:
• Processadores: os neurônios, em número de bilhões, funcio-
nam cada um como um simples processador do tipo chave
on-off.
• Paralelismo maciço: cada neurônio liga-se a um grande número
de neurônios, em contraste com o reduzido número de ligações
em um computador paralelo.
• Não programado: em contraste com os computadores que se-
guem instruções rígidas dadas a priori mesmo na computação
bottom-up.
• Adaptável: possui uma plasticidade que muda fisicamente sua
estrutura pelo ajuste das sinapses, enquanto o hardware de um
computador é fixo.
A favor da possibilidade de se chegar um dia a simular o cérebro, Casti
cita o programa que simula a evolução natural de Darwin, de forma a, com
algumas regras (de tipo do autômata celular, mais sofisticado), fazer emer-
gir no computador uma diversidade complexa imprevisível. Afirma, então,
que a competição pela vida não se restringe a seres baseados em moléculas
com cadeias de átomos de carbono, lembrando as especulações de Moravec
(1993) vistas na introdução. Os postulados para haver vida artificial, segun-
do os estudos do Instituto de Santa Fé, são:
1) Uma máquina de Turing pode simular qualquer processo
físico.
2) A vida é um processo físico.
3) Há um critério pelo qual posso distinguir sistemas vivos e não
vivos.
Introdução ao Problema da Inteligência Artificial e da Mente 93
4) U
m organismo vivo artificial deve perceber uma realidade R’
que, para ele, é tão real quanto é real para nós (humanos) a reali-
dade R que nós percebemos.
5) As realidades R e R’ possuem o mesmo status filosoficamente.
6) Podemos aprender sobre R estudando diferentes R’s.
Críticas fortes têm sido formuladas a algumas das ousadas teorizações
desenvolvidas no Instituto de Santa Fé (Hogan, 1997), como a extrapolação
do conceito de vida.
Mas o especialista em robótica que citamos no início, Moravec (1993),
no livro MindChidren: The Future of Robot and Human Inteligence, traduzido
em espanhol com o título El Hombre Mecánico, escreve: “Tenho absoluta
segurança de que os robôs com inteligência humana serão algo corrente
dentro de 50 anos.” Com base em Moravec (1993), construímos a tabe-
la 2, que tem a ver com a esquematização de Popper que mostramos na
introdução. Devemos examinar criticamente essa visão de Moravec. Para
ele, “nossos genes biológicos, e os corpos de carne e osso por eles criados,
terão um papel cada vez menos importante...” mas “nossas mentes, de onde
nasceu a cultura” poderão não se perder. Pois “a revolução pode liberar
(do corpo) a mente humana com a mesma eficácia que liberou (da mente)
a cultura humana... somos híbridos incômodos entre a biologia e a cul-
tura” e muitas de nossas características biológicas “ficaram atrasadas com
respeito às criações da nossa mente”. Podemos dizer que Moravec espera
que os mundos 1, 2 e 3 enumerados por Popper se tornem independentes
entre si. Lembra o histórico Manifesto Comunista de Marx transposto aos
robôs ao postular “o pensamento humano liberado da escravidão do corpo
mortal” em um mundo “pós-biológico dominado por máquinas pensantes”.
Especulando sobre o futuro desses nossos descendentes, considera que,
no universo em expansão, a temperatura decrescerá continuamente, mas
a energia para enviar um sinal decrescerá com a temperatura, permitindo
elaborar mais pensamento com menor energia, rumo à imortalidade, como
o físico Freeman Dyson (1988) imaginara.
Predomina entre os especialistas em inteligência artificial e robótica
uma crença de que darão consciência aos computadores. Professam, nesse
caso, um pragmatismo empírico. Afirmam que a prática demonstrará se
isso é ou não possível. Mas há um equívoco em negar qualquer tentati-
va teórica de provar a priori que as máquinas jamais poderão chegar a ter
consciência. A argumentação baseia-se em ser impossível provar que algo
não venha a existir jamais, pois sempre poderá haver um contraexemplo
94 A Transdisciplinaridade da Consciência
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Emergências no Inominável:
os Aspectos Imanentes à
Consciência no “Conceito” de Vortex
Nelson Job*
*
Nelson Job é atrator dos transaberes, autor do livro A ontologia onírica (2013), doutor pela UFRJ e psicólogo.
100 A Transdisciplinaridade da Consciência
1
Como auto-organização, o apreendemos enquanto uma organização que prescinde de qualquer agente externo, cuja
organização emerge das relações de seus próprios componentes.
2
Os fractais, oriundos da Teoria do Caos na segunda metade do século XX, foram descobertos por Benoit Mandel-
brot ao identificar padrões de ruídos nas informações transmitidas entre ligações telefônicas. Ao passar esses padrões
para um gráfico, construiu-se imagens autossimilares, no sentido de que pequenas figuras eram semelhantes à figura
completa formada. Os fractais são identificados na Natureza, como nas samambaias, nas encostas das praias e nos
cristais de neve.
104 A Transdisciplinaridade da Consciência
3
No tocante à relação do vortex com a filosofia, a ciência e a arte, estamos nos inspirando nas caoides de Deleuze e
Guattari (1992).
Emergências no Inominável: os Aspectos Imanentes à Consciência no “Conceito” de Vortex 105
4
Para ampliar a apreensão da filosofia bergsoniana, veja artigo de Auterives Maciel neste livro.
5
Para uma descrição crítica do modelo de consciência quântica de Penrose e Hameroff, veja artigo de Luiz Pinguelli
Rosa neste livro.
Emergências no Inominável: os Aspectos Imanentes à Consciência no “Conceito” de Vortex 111
inteiro, que percebe que, por sua vez, é coextensivo ao campo perceptivo.
Citemos o final de dois textos do autor em que, para ele:
o crânio é vazado, e que é a mente que vaza através dele! (...)
Quero sugerir que não é apenas a mente que vaza, mas as
coisas de modo geral. E elas o fazem ao longo dos caminhos
que seguimos à medida que traçamos os fluxos de materiais
do ambiente sem objeto. (INGOLD, 2005b)
6
O termo “epistemontologia” é ausente na obra de Ingold, no entanto, o autor também evidencia a imanência entre
ontologia e epistemologia.
112 A Transdisciplinaridade da Consciência
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Consciência:
Consonâncias e Dissonâncias
entre Filosofia e Ciência
Rogerio Mandelli*
Introdução
As reflexões e o estudo da consciência1 e seus processos decorrentes talvez
remontem à Antiguidade. Seus domínios são vastos e a grande dificuldade
em abordá-la a partir de uma perspectiva científica ainda parece intrans-
ponível. Atualmente, os agentes qualificadores de experiências conscien-
tes, vivenciáveis em níveis subjetivos, não guardam correlatos claros com
os processos de natureza biofísica, fisiológica, molecular, orgânico-sistê-
mica, bem como com sistemas de qualificação e quantificação utilizados
atualmente pelo método científico.
Este trabalho procura traçar, resumidamente, algumas considerações
sobre as dificuldades em reduzir o fenômeno da experiência consciente
a leis puramente mecanicistas, bem como suscitar questões transversais
acerca de como o complexo mente-consciência2 é capaz de recriar o mundo
a partir dos mecanismos da percepção e gerar novas possibilidades, cujos
objetivos primordiais são transformar e organizar a realidade apreendida
retratada nas experiências mais comuns do cotidiano. Questiona também
sobre qual é o estatuto da consciência em relação à realidade que nos cerca:
é apenas um efeito dos infindáveis processos neurais que ocorrem a cada
instante no cérebro ou seu lugar na Natureza tem um papel muito mais
fundamental do que imaginamos?
Professor do departamento de Engenharia da Universidade Veiga de Almeida (UVA) e doutorando pelo programa
*
Mente e consciência
Sem dúvida, um dos principais marcos da modernidade no estudo de uma
abordagem sistemática na relação entre mente e corpo tem sua fundação
com René Descartes (1596–1650), o qual levantou questões fundamentais
ainda extremamente atuais na contemporaneidade, destacando-se aqui o
termo dualismo cartesiano, cunhado devido à nítida distinção que faz entre
o físico e o mental. Sua proposição central cogito ergo sum (DESCARTES,
1983) é considerada a origem do dualismo.
De forma bastante clara, a Ciência estabelecida não aceita o dualismo,
pois boa parte dos cientistas acredita que a experiência consciente, de algu-
ma forma, emerge das propriedades físicas do cérebro. No entanto, muitos
não negam que exista uma clara distinção entre a mente e matéria, sendo
extremamente tortuosas as conjecturas sobre como a primeira pode emer-
gir da segunda.
A árdua tarefa de compreender essencialmente as questões relacio-
nadas ao complexo mente-consciência é um projeto igualmente amplo e
bastante diversificado. O satisfatório entendimento demanda uma multi-
plicidade de explicações que passam naturalmente pelos três eixos abaixo
(GULICK, 2014), dos quais o presente artigo pretende transitar apenas pe-
los dois primeiros:
1) Questão descritiva: o que é consciência? Quais são suas princi-
pais características? E por quais meios ela pode ser melhor des-
coberta, descrita e modelada?
2) Questão explicativa: como a consciência existe? É um aspecto
primitivo da realidade ou surge por processos físico-químicos
não conscientes?
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 117
3
Eletroencefalografia (EEG): método de monitoramento eletrofisiológico não invasivo utilizado para registrar a
atividade elétrica do cérebro.
4
A fMRI (functional Magnetic Ressonance Imaging) é uma técnica de imagem por ressonância magnética funcional
capaz de detectar variações no fluxo sanguíneo em resposta à atividade neural estabelecida.
118 A Transdisciplinaridade da Consciência
5
Uma exceção pode ser considerada, a princípio, em condições de sono profundo.
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 119
Os problemas “fáceis”
Como já indicado, a palavra consciência é utilizada de muitas maneiras
diferentes. Muitas vezes está diretamente ligada ao espectro cognitivo-
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 121
O problema “difícil”
Também conhecido como o problema da experiência consciente, que abran-
ge um amplo espectro de estados que incluem, entre outros, a experiência
perceptiva e motora, a tátil, as sensações corporais, as imagens mentais, as
emoções, os pensamentos etc. Esta perspectiva é baseada no importante ar-
tigo “What is it like to be a bat?” (NAGEL, 1974), que demonstra que há “algo
que é como” ver uma rosa vermelha à luz do sol, sentir uma dor renal aguda,
contemplar um pássaro voando, sentir um profundo pesar, ouvir o barulho
das ondas, lembrar-se de um episódio da infância. Cada um desses estados
tem um caráter fenomenal, com propriedades fenomenais (ou qualia) que
caracterizam o que é como ser/estar naquele estado (MANDELLI, 2012).
Intuitivamente, não há qualquer dúvida de que a experiência conscien-
te está enraizada nos processos físico-químicos que se transformam no
cérebro. Infere-se que tais processos dão origem à experiência ou esta-
dos conscientes. Mas perguntas fundamentais permanecem sem repostas:
como e por que estes processos originam ou permitem a consciência? Por
que estes processos não ocorrem “no escuro”, sem quaisquer estados cons-
cientes? De fato, estes são o mistério central da consciência.
122 A Transdisciplinaridade da Consciência
A lacuna epistemológica
Diante dos paradigmas da ciência estabelecida, é natural se esperar uma
solução materialista para o problema difícil e uma explicação redutiva da
consciência, mas esta parece resistir a tais desenvolvimentos materialis-
tas de uma maneira diferente de outros fenômenos. Esta resistência pode
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 123
Argumento explanatório
O mais simples dos três argumentos apresentados baseia-se na diferença
entre os problemas fáceis e o problema difícil, como já explicada anterior-
mente. Os problemas fáceis dizem respeito à explicação das estruturas e fun-
ções cognitivas e comportamentais, mas o problema difícil não, onde estas
não são suficientes para explicar a consciência. Assim sendo, a compreensão
destas estruturas e funções não são capazes de explicar a consciência.
1) Explicações materialistas compreendem as estruturas e funções.
2) Explicar tais estruturas e funções não é suficiente para explicar
a consciência.
3) Materialismo não pode explicar a consciência.
Argumento da conceptibilidade
De acordo com este argumento (CHALMERS, 2003), seria concebível lo-
gicamente um sistema que fosse fisicamente idêntico a um ser consciente,
mas que carecesse dos estados conscientes deste ser. Tal sistema poderia
ser o que o autor chama de zumbi: um sistema fisicamente idêntico a um
ser consciente, mas que careceria completamente de experiência conscien-
te. Não há parâmetros disponíveis que se possa inferir sobre o que é ser
um zumbi, assim, provavelmente não parecem ser naturalmente possíveis,
pois provavelmente não podem existir neste mundo com as leis que os
regem. Pode-se colocar o argumento de forma mais simplificada:
1) É concebível que haja zumbis.
2) Se é concebível que haja zumbis, é possível que haja metafisica-
mente zumbis.
3) Se for metafisicamente possível que haja zumbis, então a cons-
ciência é não física.
4) A consciência é não física.
Argumento do conhecimento
Concebido por Frank Jackson em seu artigo de 1992, intitulado Epipheno-
menal qualia (JACKSON, 1982), o argumento do conhecimento6 sustenta
6
O argumento imaginado pelo autor é: “uma neurocientista chamada Mary é forçada a investigar o mundo de
124 A Transdisciplinaridade da Consciência
que há fatos sobre a consciência que não são dedutíveis a partir de eventos
físicos. A questão crucial para o argumento de Jackson é: O que acontece
quando Mary sai da sala em preto e branco pela primeira vez? Se Mary
realmente apreende algo novo ao experimentar como é a sensação de olhar
uma rosa vermelha ou o céu azul, então seu conhecimento anterior, ba-
seado em fatos físicos apenas, era incompleto. Jackson conclui: “Se toda a
informação acerca de fatos físicos não é suficiente para conhecermos fatos
sobre a consciência, então o materialismo é falso”(JACKSON, 1982).
Chalmers (2003) defende que o argumento de Jackson pode ser estrutu-
rado de forma mais genérica:
1) Existem verdades sobre a consciência que não são dedutíveis a
partir dos eventos físicos.
2) Se há verdades sobre a consciência que não são dedutíveis a
partir dos eventos físicos, então o materialismo é falso.
3) O materialismo é falso.
dentro de um quarto preto e branco, aparelhado com um monitor de televisão também preto e branco, sem jamais
ter tido acesso ao mundo externo repleto de cores. Mary é especialista em neurofisiologia da visão e adquire toda a
informação física que se pode obter sobre as cores e sobre todos os processos cerebrais envolvidos na identificação
de cada uma delas – por exemplo, sobre como os diversos comprimentos de onda provenientes do céu estimulam a
retina e como estes afetam o sistema nervoso central até a verbalização da frase ‘o céu é azul’”.
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 125
Assim:
a) Conhecendo-se (F) não se pode deduzir (M) como o argumento
do conhecimento sugere.
b) Concebendo-se racionalmente (F) sem a existência de (M), de
acordo com o argumento de conceptibilidade, então parece que
(F) não implica (M).
c) Argumento explicativo pode ser visto como uma alegação de
que uma implicação de (F) a (M) exigiria uma análise funcional
da consciência, que não é um conceito funcional.
Depois de estabelecerem uma lacuna epistemológica, os argumentos
avançam na possibilidade da existência de uma lacuna ontológica, da or-
dem da natureza das coisas do mundo.
Perspectivas ontológicas:
a consciência e o seu lugar na natureza
Naturalmente, ao longo do tempo, o problema da consciência foi susci-
tado por inúmeros autores que buscaram encontrar um lugar adequa-
do para a experiência consciente dentro da ordem natural do mundo
como o concebemos, sob a ótica da civilização ocidental. Assim, a fim
de prover um panorama geral sobre as diferentes perspectivas ontoló-
gicas sobre esta antiga questão, a influente obra The Mind and Its Place
in Nature (BROAD, 1925), do epistemólogo inglês Charlie Dunbar Broad
(1887–1971), torna-se pilar fundamental do artigo homônimo de David
Chalmers (2003). No artigo de 1925, Broad posiciona a problemática de
forma bastante aguda, questionando o lugar ocupado pela consciência
em relação ao mundo físico.
No artigo de Chalmers (2003), dados os avanços da compreensão da
problemática na contemporaneidade, o autor propõe um modelo de estudo
ontológico em uma estrutura dividida em seis classes distintas, por ele
nomeadas de Tipo-A, sucessivamente até a letra F (Tipo-F).
As três primeiras classificações (A, B e C) envolvem abordagens
amplamente redutivas, posicionando a consciência como um processo
oriundo do mundo material que não requer desenvolvimento para além
das fronteiras do mundo físico. As três classificações subsequentes (D,
E e F) esboçam visões não redutíveis, demandando, dessa forma, uma
expansão dos limites ontológicos para além da realidade física.
126 A Transdisciplinaridade da Consciência
7
Alguns dos autores que defendem a posição ontológica tipo-A: (DENNETT, 1991), (SOSA; DRETSKE, 1997), (HAR-
MAN, 1990), (LEWIS, 1990), (REY, 1995) e (RYLE, 2009).
8
Alguns dos autores que defendem a posição ontológica tipo-B: (BLOCK; STALNAKER, 1999), (HILL, 1997),
(LEVINE, 1983), (LOAR, 1990), (LYCAN, 1996), (PAPINEAU, 1993) e (TYE, 1995)
9
Alguns dos autores que defendem a posição ontológica tipo-C: (GULICK, 1993) e (MCGINN, 1989), este último
enquadrado por Chalmers na posição tipo-F.
Alguns dos autores que defendem a posição ontológica tipo-D: (ARMSTRONG; FOSTER, 1993), (POPPER; EC-
10
Posicionamento da pesquisa
Obviamente, nem todas a abordagens existentes hoje foram relacionadas
anteriormente. Diante das conjecturas expostas até aqui, há indícios rele-
vantes para que não corroboremos com as três perspectivas materialistas
apresentadas (tipos A, B e C), apesar de serem posturas naturalistas de
vanguarda e que devem sofrer novas atualizações e melhorias a partir de
novas proposições e resultados nos âmbitos de seus objetos de estudo.
A pesquisa defende uma posição não reducionista e reconhece a la-
cuna epistemológica existente entre os campos dos eventos físicos e
experiências fenomenais, baseada nos argumentos antirreducionistas
descritos anteriormente. Como exposto, as posições tipo D, E e F não
apresentam falhas robustas e relevantes em relação às suas correspon-
dentes hipóteses.
Naturalmente, cada uma das visões não reducionistas demandam ain-
da muitas pesquisas e desenvolvimentos posteriores dentro do escopo da
Ciência atual. A pesquisa assume como sua posição norteadora a pers-
pectiva dualista não ortodoxa, uma vertente conhecida como dualismo
de propriedade, que propõe que a realidade seja constituída por apenas
uma única substância, mas que dela decorrem duas propriedades distin-
tas, uma propriedade fenomenal e outra propriedade física, sendo ambas
irredutíveis entre si. A versão compatível com tal proposta é o chamado
emergentismo, onde as propriedades fenomenais são, ontologicamente,
propriedades resultantes dos sistemas físicos. Portanto, uma versão in-
vertida desta perspectiva também pode ser razoável, onde as proprieda-
des físicas sejam decorrentes das propriedades fenomenais, ideia a partir
da qual boa parte do pensamento oriental se estabelece.
Mente
Qual é a natureza da mente? Como é relacionada à consciência? E, aci-
ma de tudo, quem somos? Qual é a nossa identidade por trás do fluxo
interminável de pensamentos, a cada instante? Essas são as perguntas
essenciais feitas há milênios por nossos ancestrais, talvez ainda anterio-
res ao chamado período pré-socrático, berço da Filosofia Ocidental, mas
128 A Transdisciplinaridade da Consciência
13
Yoga Sūtras de Patañjali: composto por 196 sutras (aforismos) compilados por volta de 400 a.C. pelo pretenso sábio
conhecido como Patañjali. O Yoga Sūtras foi o texto indiano antigo mais traduzido na era medieval.
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 129
Consciência
A presente pesquisa procura agora trazer ao centro da discussão a defini-
ção de consciência originada por escrituras antigas da civilização, nomea-
damente os Vedas14 da cultura indiana, bem como o budismo, uma de suas
dissidências.
Nessas tradições, bem como na proposta desta pesquisa, a consciência
se apresenta em uma estrutura quádrupla: vigília, sonho, sono profundo
e pura consciência. Pelas limitações de extensão e amplitude do presente
artigo, tais dimensões não serão abordadas. Em tempos mais longínquos
daqueles em que os grandes filósofos clássicos começavam a erguer os
primeiros pilares da Filosofia Ocidental, o autor Thompson (2015) cita uma
passagem das Upanishads,15 na qual é relatada um famoso diálogo (ROE-
BUCK, 2003) durante o qual o conceito de consciência é explanado de
forma dialética.16 Assim, de acordo com as tradições da cultura indiana,
a consciência17 é aquilo que é luminoso e tem a capacidade de conhecer.
Luminoso, então, significa ter o poder de revelar, como a luz. Sem o sol,
o nosso mundo seria velado na escuridão e, assim, sem consciência, nada
poderia aparecer. A consciência é, fundamentalmente, aquilo que revela ou
torna manifesto, porque é a pré-condição essencial para a aparência das
coisas, recriadas dentro do nosso sistema corpo e mente.
Sem consciência, o mundo não pode aparecer para a percepção, o pas-
sado não pode aparecer na memória, e o futuro não pode ser estabelecido
sob as condições de esperança ou expectativa. É ela a testemunha de todas
as imagens e conteúdos que se estabelecem na mente. Em termos simples,
sem a consciência não há nenhuma observação, e, sem observação, não
existem dados, sem consciência nada pode existir (THOMPSON, 2015). Até
aqui, consciência significa ser o sujeito da experiência em todas as suas
formas, seja através da vigília, do sonho e do sono profundo; neste último,
há a suspensão da mente e a ausência de objetos.
14
A palavra sânscrita Veda é proveniente da raiz “vid” e significa “conhecimento, sabedoria”. Deriva da raiz proto-
-indo-européia u̯eid que significa “ver” ou “saber”. Os Vedas são compostos por quatro grandes textos: Rigveda, Yajur-
veda, Samaveda e Atharvaveda.
15
Coleção de textos em sânscrito. São considerados pelos hindus como repositórios das verdades reveladas (sruti)
sobre a natureza da realidade última (brahman) e que descrevem o caráter e a forma da emancipação humana (moksha).
Discutem principalmente meditação e filosofia, tendo surgido como comentários sobre os Vedas, sua finalidade e
essência, sendo, portanto, conhecidos como Vedānta (o fim dos Vedas).
16
O diálogo entre Yājñavalkya e o rei Janaka ocorre no Bṛhadāraṇyaka Upaniṣad (The Great Forest Teaching).
17
Também chamada de consciência fenomenal pelos comentadores recentes do pensamento hindu.
130 A Transdisciplinaridade da Consciência
Consciência pura
A partir da perspectiva da Filosofia e Ciência ocidentais, a ideia da cons-
ciência pura,18 aqui considerada como o aspecto mais profundo da cons-
ciência fenomenal, normalmente, não é acessada por vias cognitivas. O
estado de consciência pura pode ser alcançado por indivíduos com mentes
treinadas em técnicas específicas para este fim, entre as quais a meditação
é uma das alternativas (ver “Dimensões metafísicas da consciência?”).
Outra grande diferença entre as visões ocidentais e as das tradições
consideradas nesta pesquisa é que, do ponto de vista da Ciência Cognitiva
padrão, a experiência sensorial de vigília é a base para toda a consciência.
Já nas visões tradicionais do Oriente, consciência grosseira ou sensorial
depende diretamente da consciência sutil.
Chamado simplesmente de “o quarto” (turiya), este modo de consciência
é não dual (FORT, 1990). Diferentemente dos estados da vigília, do sonho
e do sono profundo, a consciência pura não é propriamente um estado no
sentido de uma condição transitória e discreta. Ao contrário, é considerada
a fonte constante, subjacente a esses estados transitórios, bem como um
estágio avançado de realização meditativa por várias tradições. Como fon-
te subjacente para a vigília, o sonho e o sono profundo, “o quarto” é pura
consciência, definida pela sua qualidade de luminosidade. Considerada por
muitas tradições como o mais alto grau de autorrealização humana, que
pode ser alcançada de forma espontânea ou através de técnicas destinadas
a este fim, como já descrito anteriormente. Na consciência pura, pode-se
testemunhar os outros estados impermanentes, mas sem se identificar er-
roneamente com eles, bem como com o próprio “eu”. Tal possibilidade será
discutida no item seguinte do presente capítulo.
18
A consciência pura (turiya) também é conhecida como consciência sutil.
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 131
através das vias do misticismo que, segundo estes, envolve mais do que
“experiência mística” (estados místicos ou visionários), sendo o objetivo
final da transformação humana (GELLMAN, 2004).
No contexto atual, o termo “misticismo” é amplamente utilizado de for-
ma pejorativa para denotar o pensamento descuidado ou supersticioso. As
experiências místicas podem ser induzidas deliberadamente por drogas,
meditação, oração ou outras práticas espirituais, mas também podem ser
respostas espontâneas ao arrebatamento causado pela beleza da natureza,
da música, do parto, do orgasmo, por eventos com risco de vida, de dor
intensa e de doença (HORGAN, 2003).
Alguns pesquisadores também afirmam que as experiências místicas não
são tão comuns como se pode supor, entre eles, destaca-se o neurologista ame-
ricano James Austin. O estado que ele chama de absorção - conhecido como
samadhi pelos hindus e como satori pelos budistas – é bastante raro. Durante
esta condição, o mundo externo e o próprio “eu” parecem se dissolver em uma
unidade sem forma. Ainda mais raro do que a absorção, de acordo com Austin,
é o nirvana budista, a realização, a libertação, o despertar, o pleno discernimen-
to, nos quais esporádicos brilhos de percepção cedem lugar a uma mudança de
visão de mundo a longo prazo, ou seja, o conhecimento profundo da realidade
subjacente a todos os fenômenos impermanentes (AUSTIN, 1998).
Mesmo sendo uma condição aparentemente bastante incomum, a autor-
realização é perseguida por muitas pessoas ao longo dos séculos. Chamada
também de iluminação, segundo Horgan (2003), ela é o telos das grandes
religiões orientais, como o hinduísmo e o budismo. Para o erudito Huston
Smith (SMITH, 1991), o sentido do chamado conhecimento absoluto é a
condição sine qua non19 para as experiências místicas, onde o componente
noético as transforma em algo mais que sensações transitórias. Segundo
Smith, a visão mística não é um sentimento propriamente dito, mas é um
conhecimento (HORGAN, 2003).
No clássico “The Varieties of Religious Experience”,20 William James ofe-
rece uma definição do termo que ainda hoje é amplamente difundida. Em
sua visão, o cenário abrangido pelo misticismo incorpora experiências que
englobam as características seguintes:
19
Expressão de origem latina que indica que uma condição ou elemento seja indispensável e essencial.
20
A obra ainda exerce uma poderosa influência sobre as discussões da experiência religiosa e do misticismo. Apesar
de criticada por enfatizar demais as dimensões subjetivas da espiritualidade e negligenciar os aspectos sociais, ela se
sustenta até os dias atuais porque James articulou eloquentemente o que é ser enquadrado “no limite entre crença e
descrença” (HORGAN, 2003).
132 A Transdisciplinaridade da Consciência
21
Termo utilizado pela primeira vez através da obra A ilha, do escritor britânico Aldous Huxley. Atualmente, é uma
área da Neurociência Cognitiva que aborda os estudos da experiência religiosa e da espiritualidade.
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 133
22
Sob uma ótica neurobiológica, rituais apresentam duas características principais: 1- geram descargas emocionais
em diferentes graus de intensidade, que representam sentimentos subjetivos de tranquilidade, êxtase e admiração;
2- resultam em estados unitários que, em um contexto religioso, são muitas vezes experimentados como algum grau
de transcendência espiritual. As experiências unitárias produzidas por atos rituais são quase sempre acompanha-
das por fortes estados emocionais, que são, eles mesmos, resultantes de comportamentos rítmicos (GELLHORN;
KIELY, 1972). Os comportamentos motores repetitivos, como dançar ou cantar em cerimônias, podem ter efeitos
significativos sobre os sistemas límbicos e autônomos, ambos envolvidos na criação de emoção e humor. Um estudo
mostrou que os estímulos auditivos e visuais repetitivos – dança ritualizada, canto ou cânticos, por exemplo - podem
impulsionar ritmos corticais para produzir sentimentos inefáveis e intensamente prazerosos (D’AQUILI; NEWBERG,
1993). Outro trabalho demonstrou que comportamentos rítmicos ativam simultaneamente vários sentidos. Em com-
binação com outras atividades contribuintes, que muitas vezes fazem parte do ritual de jejum, hiperventilação e ina-
lação de incenso ou outras fragrâncias, essa estimulação multissensorial pode afetar a fisiologia do corpo de maneiras
que podem levar a estados mentais alterados.
23
Perda da entrada sensorial de uma porção do corpo, geralmente causada pela interrupção das fibras sensoriais periféricas.
134 A Transdisciplinaridade da Consciência
Técnicas passivas
São praticadas sob várias formas por ordens budistas, a partir do ato de von-
tade do meditante em acalmar todos os seus pensamentos, emoções e percep-
ções que emergem de forma descontrolada na mente. A intenção consciente
24
Estimativas da frequência de experiências místicas variam muito; primeiro, por seus métodos serem passíveis
de ampla discussão e, segundo, pelo amplo horizonte de variabilidade das definições. De acordo com uma pesquisa
realizada na década de 1970, descobriu-se que 33% dos adultos americanos tiveram pelo menos uma experiência em
que sentiram “uma poderosa força espiritual que parecia levá-los para fora de si mesmos”. Outra pesquisa, realizada
na Inglaterra, determinou que uma porcentagem semelhante de pessoas tenha sido “consciente ou influenciada por
uma presença de poder” (HORGAN, 2003).
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 135
25
Responsável pela integração de informações correntes com outras informações preexistentes de natureza emo-
cional e cognitiva.
26
Estudos baseados em EEG (registros eletroencefalográficos) demonstraram aumento da atividade elétrica sobre os
lobos frontais durante vários tipos de meditação.
27
Embora a deaferentação seja conhecida por ocorrer diversas circunstâncias, não foi completamente provado que
ocorre durante as práticas de meditação. No entanto, dois estudos conduzidos por Newberg e sua equipe (meditado-
res budistas tibetanos e imageamento cerebral sobre a meditação de relaxamento da ioga) demonstraram aumentos
relativos nos lobos frontais e diminuição relativa nos lobos parietais posteriores.
136 A Transdisciplinaridade da Consciência
Técnicas ativas
Diferentemente das técnicas passivas, a abordagem ativa não objetiva si-
lenciar os pensamentos, mas concentrar-se intensamente em algum pen-
samento ou objeto. Ao se direcionar o foco da atenção para uma imagem,
o processo se inicia de forma similar à abordagem passiva, com a área de
associação de atenção traduzindo, em termos neurológicos, a intenção
consciente do meditante. Como tal intenção é dirigida sobre o objeto ou
pensamento específico, a área atencional facilita o fluxo neural ao invés de
inibi-lo, como na forma passiva. Assim, no modelo proposto por Newberg,
o incremento do fluxo neural faz com que a área de orientação direita, em
conjunto com a área de associação visual, mantenha o foco no objeto (real
ou imaginado) na mente. A manutenção do foco em direção ao objeto faz
com que as descargas da área de atenção direita sigam através do sistema
límbico e cheguem até o hipotálamo, promovendo a excitação dessa estru-
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 137
fazendo com que os limites percebidos do “eu” tornem-se cada vez mais
difusos, possibilitando, assim, que a mente possa experimentar o chamado
sentimento de absorção mística do “eu” individual, que, em estados mais
profundos ao longo do espectro do continnum, pode levar ao chamado es-
tado unitário absoluto ou consciência pura, mas de rara ocorrência (NEW-
BERG; D’AQUILI; RAUSE, 2002).
Conclusão
De acordo com o conteúdo exposto ao longo deste capítulo, as questões
fundamentais relacionadas ao complexo mente-consciência e seus desdo-
bramentos em algumas áreas do conhecimento humano ainda parecem
distantes de qualquer teoria consistente. Diante das ideias e argumentos
apresentados, não parece ser possível reduzir tal complexo a conceitos e
dinâmicas puramente mecanicistas, a partir dos quais seja possível estabe-
lecer correlações causais coerentes entre os eventos físicos e as experiên-
cias fenomenais, bem como realizar previsões de comportamento sistêmi-
co do sujeito da experiência.
Obviamente, frente às possibilidades aqui apresentadas, não significa
que o mainstream da Ciência esteja aberto à possibilidade de uma realida-
de além do escopo objetivo abrangido por seus métodos. A autoridade da
Ciência, afinal, está enraizada no pressuposto de que a realidade material
é a origem e fim de todas as coisas no universo. Contudo, com as ideias
aqui apresentadas, pode-se conjecturar que o tema em questão esteja além
dos domínios circunscritos pelo método científico, e discutir seus limites
atuais relacionados ao lugar que a consciência ocupa na natureza parece
ser uma sensata postura frente aos desafios aqui delineados.
Também parece ser bastante razoável e obviamente especulativa a pro-
posta de que a consciência possa ser uma das entidades fundantes da natu-
reza, pois, a partir dela, o mundo é criado para o sujeito da experiência e, na
ausência desta, nada pode-se afirmar sobre a existência do que nomeamos
realidade. Além dos argumentos apresentados, um fator de destaque nessa
direção está relacionado com o chamado conceito de “consciência pura”
(abordado anteriormente em “Consciência”), que pode ser um dos indícios
que permitem corroborar com a proposta acima apresentada.
No item acima referenciado, apesar das diferentes perspectivas das es-
colas de pensamento e distintas correntes religiosas, sob uma abordagem
neurológica e filosófica, parece não haver versões divergentes do estado
Consciência: Consonâncias e Dissonâncias entre Filosofia e Ciência 139
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142 A Transdisciplinaridade da Consciência
Ao olhar para dentro, o que se vê? É interessante notar que, para olhar para
dentro de si, o indivíduo precisa utilizar outra ferramenta além do sistema
físico da visão. Que ferramenta seria esta então? A Ciência Védica de Ma-
harishi Mahesh Yogi propõe o uso adequado do pensamento, tornando-o
cada vez mais refinado, até que se transcenda a própria atividade da men-
te e se atinja um estado denominado de consciência transcendental, ou
Consciência Pura, que seria a própria essência do Ser. Daí o motivo pelo
qual é fundamental diferenciar Consciência em seu sentido mais amplo de
experiência consciente, estado em que o indivíduo está consciente do am-
biente à sua volta, mas não necessariamente consciente de seu próprio eu
interno, aquele aspecto seu que é o observador e o agente da própria expe-
riência. Consciência, no sentido estendido, engloba todas as possibilidades
de estados de consciência: o estado de Consciência Pura, ou consciência
transcendental, em que existe somente a experiência do próprio Ser, sem
objeto de observação; os estados inconscientes, sonho e sono; e os estados
de experiência consciente da vigília.
Para John Searle, filósofo da mente, a definição de consciência se reduz
ao estado de experiência consciente da vigília, ao descrevê-la como sendo
o estado entre o acordar e o dormir, fruto de processos biológicos, para a
existência do qual o cérebro é um sistema necessário e suficiente. Que o
cérebro e todo o sistema nervoso sejam necessários para se ter uma expe-
riência consciente parece ser aceitável, mas não é suficiente para garantir
a existência da Consciência, que inclui a Consciência Pura, estado que não
necessita do cérebro para existir.
Utiliza-se aqui, então, a mente e a dinâmica cerebral para o entendimen-
to
1 dos processos de se olhar para fora e ver o mundo através dos estímulos
sensoriais e olhar para dentro e ver o próprio observador que sofre tais
*
Diretora de Pesquisa do Instituto David Lynch – Brasil e colaboradora do Laboratórios de MultiAplicações Expe-
rimentais (Lamae)/UFRJ.
144 A Transdisciplinaridade da Consciência
Quando a atenção está voltada para fora e a consciência não está assen-
tada na consciência transcendental, o estado fundamental da Consciência,
ela não é pura, não é completa. Identifica-se com os objetos e não se refere
a si própria. Somente no nível transcendental a consciência é autorreferen-
te. Ela sussurra para si mesma e se torna criadora. Sem pular para o nível
de espaço e tempo, a consciência funciona em sua própria estrutura pura e
permite a experiência do absoluto.
Conforme o cérebro vai adquirindo a habilidade de integrar os proces-
sos referentes ao objeto e os autorreferentes por meio da prática da trans-
cendência, o nível consciente de percepção passa a se sobrepor sobre os
outros estágios de processamento, o pré-consciente, o subliminar e o in-
consciente (ou desconectado), colocando o indivíduo em acesso direto com
a fonte dos pensamentos, de onde também surge o insight.
Com uma fisiologia que suporte manter os dois estados de consciência
ao mesmo tempo, o indivíduo desfruta do estado de silêncio de onde ema-
na todo o poder criativo da vida e do mundo material dinâmico de forma
mais ordenada e plena, e é possível considerar que ele tenha atingido a
realização plena, rumo a níveis ainda superiores de consciência.
Para que a consciência transcendental, ou Consciência Pura, possa ser en-
tendida como um nível basal de consciência, seria preciso analisar sua estru-
tura. Parte-se então do princípio de que o que há de primordial é Consciência,
que possui dois atributos básicos: existência e inteligência. Trata-se tanto de
um campo de existência pura, a fonte autossuficiente de tudo que existe, quan-
to um campo de inteligência pura, a fonte de ordem da natureza. O atributo da
existência está relacionado ao aspecto silencioso do campo unificado, mas não
inerte. O aspecto inteligente se relaciona ao dinamismo. Sendo um campo de
existência e de inteligência, ele está desperto para sua própria natureza, ou seja,
possui a propriedade de consciência autorreferente. A propriedade de autorre-
ferência é responsável pela criatividade da inteligência pura.
O termo Consciência Pura denota o campo unificado de consciência si-
lencioso e imutável na base de todas as diversas fases ativas de consciência
que se experimenta normalmente. Ao se ater aos níveis mental e compor-
tamental, a psicologia moderna exclui o nível fundamental da consciência
e não consegue desvendar o funcionamento dos processos inconscientes e
de sua origem. Enquanto os fenômenos mentais, como pensamentos, per-
cepções e sentimentos, e os comportamentais possam ser considerados
eventos, postula-se que a Consciência Pura possa ser a base de onde eles
surgem.
Um Lampejo na Escuridão: uma Proposta Prática para se Avivar o Observador 149
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Este livro é resultado do Encontro Internacional Trans-
disciplinar da Consciência, que contou com a participa-
ção de vários pensadores de diversas áreas do conheci-
mento com o objetivo de conversar acerca da consciência.
O encontro, por sua vez, é fruto do grupo de pesquisa de
Teorias da Consciência. Nosso orientador/supervisor é
o professor Luiz Pinguelli Rosa, e o grupo pertence ao
curso de pós-graduação em História das Ciências, das
Técnicas e Epistemologia na Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ).
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