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Do conhecimento tácito ao conhecimento explícito

Não poderíamos falar sobre arquitetura de armazenagem e organização de dados sem definir “da-
dos” e sua relação com “informação” e “conhecimento”, afinal boa parte da matéria-prima para a
construção de uma decisão que estamos estudando são a informação e o conhecimento.

Dado é um fato, uma observação, um evento, uma ocorrência, um registro, também chamado de
informação bruta. Ele é indivisível, de natureza objetiva e abundante, não gozando de relevância,
propósito ou significado quando analisado de forma isolada, por isso é o mais elementar compo-
nente do sistema, mas sua importância reside no fato de que, ao ser fornecido a ele um significado,
um contexto, ele se torna a base da informação.

Isso nos leva à necessidade de definirmos informação, que é uma coleção de dados reunidos em
um determinado contexto conferindo um certo sentido e significado ao sistema. Percebemos,
então, que diferentes coleções de dados e contextos podem produzir informações diferentes,
e, como esses contextos são dinâmicos e decorrentes do movimento das relações sociais e seus
atores, as informações são afetadas pelos contextos. Contudo o mais importante quando estamos
falando de informação é sua relevância, qualidade, confiabilidade e utilidade, afinal ela somente
terá algum valor se for capaz de construir no decisor o conhecimento para apoiá-lo em uma ação
— processo decisório.

Novamente somos levados à necessidade de definirmos o que é conhecimento: um conjunto de


informações devidamente processadas na mente do decisor a partir de combinações e recombi-
nações, lógicas ou não, com o histórico de experiências passadas, do estado psicológico, insights,
visões, valores, comportamentos e inúmeros outros elementos que são vivenciados e afetam a
mente do decisor. Não é difícil de entender que o conhecimento, dito dessa forma, é único para
cada indivíduo, por serem únicos esses processos para cada um de nós.

Destacamos, ainda, que o conhecimento é capaz de agir no indivíduo por uma causa de mudança
de atitude, de comportamento, de resposta, responsável, portanto, por toda e qualquer ação que
cometemos. Uma ação é sempre decorrência de um conhecimento, ou de vários, que nos acomete
e nos impulsiona. O conhecimento é, então, o que nos levará a tomar uma decisão, por isso esta-
mos tão preocupados em falar sobre dados, informação, sistema e gerenciamento de informação.

Um outro aspecto é a natureza mutável do conhecimento. Se ele é decorrente da nossa digestão


mental de informações (dados filtrados) e toda a nossa complexa rede de influências de nossas me-
mórias e vivências, podemos entender que, se esses agentes que compõem o conhecimento forem
alterados, isso irá provavelmente implicar uma mudança do nosso conhecimento sobre aquela de-

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terminada situação-problema, o que nos leva a entender que o conhecimento é dinâmico, fluídico,
volátil e adaptativo — ainda bem!

Características básicas de dado, informação e conhecimento

Dado Informação Conhecimento

Registro de um evento Conjunto de dados com Resultado de ações e


significado para o sistema interações entre sujeitos e
Objetivo objetos e sujeitos e sujeitos
Contextual/relacional
Assignificativo Informação devidamente
Significatico tratada que muda o sistema

Contextutal/relacional

Significativo

Existe em função de uma


ação e justifica a crença
pessoal em relação à verdade

Fonte: Carvalho (2012)

O conhecimento é considerado o “ouro” da atualidade, sendo precioso porque trata de uma infor-
mação (dados brutos tratados, portanto, já com valor agregado) que recebeu um contexto, uma
significação, sendo, então, fruto de uma interpretação, da reflexão de um ou mais indivíduos que,
de certa forma, agregou a essas informações sua experiência (sabedoria).

E não poderíamos deixar de comentar as duas naturezas distintas, mas presentes no comporta-
mento mental dos indivíduos: o conhecimento tácito e o conhecimento explícito.

O conhecimento explícito é visível, material, decorrente de uma estrutura formal, impessoal, racio-
nal e sistêmica. Aquele que é possível “transmitir” a outros indivíduos.

O conhecimento tácito é aquele aprofundado nas experiências individuais; ele é intuitivo e pos-
sui viés prático, de natureza emocional, sensorial, muitas vezes nem mesmo explicado pelo pró-
prio indivíduo.

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Note que já tratamos do binômio razão versus emoção em competência anterior, quando falamos
da natureza humana diante do momento da tomada de decisão, e estamos aqui novamente reto-
mando esse tema, agora sob o viés do conhecimento, e, mais uma vez, como o conhecimento é que
nos leva à ação de decidir, e o conhecimento pode ser tácito ou explícito, então nossas decisões
podem mesmo estar relacionadas a reações emocionais e racionais, de forma indissociável — so-
mos humanos, somos assim mesmo.

Thomas Davenport (2001) sintetiza no quadro-resumo abaixo as principais características dos da-
dos, da informação e do conhecimento.

Dados, informações e conhecimento

DADOS INFORMAÇÃO CONHECIMENTO

Informação valiosa da mente


Simples observações sobre o Dados dotados de relevância e humana.
estado do mundo. propósito. Inclui reflexão, síntese e con-
texto.

• Facilmente estruturados.
• Requer unidade de análise. • De difícil estruturação.
• Facilmente obtidos por má-
• Exige consenso em relação • De difícil captura em má-
quinas.
ao significado. quinas.
• Frequentemente quantifi-
• Exige necessariamente a • Frequentemente tácito.
cados.
mediação humana. • De difícil transferência.
• Facilmente transferíveis.

Fonte: Davenport (2001)

Mas por que o conhecimento passou a ter tanta importância? Na verdade, o conhecimento sempre
representou uma vantagem competitiva; foi justamente graças a ele que a civilização humana se
desenvolveu tanto ao longo da sua história, mas, depois da Segunda Guerra Mundial, o mundo pas-
sou por uma grande quantidade de transformações, tendo seu eixo deslocado de forma gradativa
da indústria para os serviços e, posteriormente, para a informação. Assim, o conhecimento seria o
grande deflagrador da sustentabilidade do crescimento das décadas que viriam, uma vez que um
dos principais insumos do conhecimento é a informação. Peter Drucker (1991), considerado o pai
da administração moderna, escreveu:

O maior desafio com o qual os gerentes dos países desenvolvidos se depararam é au-
mentar a produtividade dos trabalhadores do conhecimento e da área de serviços. Tal
desafio, que dominará a agenda durante várias décadas, acabará determinando o de-

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sempenho competitivo das empresas. Mais importante, determinará a própria estrutu-
ra da sociedade e a qualidade de vida de todos os países industrializados.

Como vimos, o conhecimento representa valor por ser estratégico para as organizações, mas o
grande desafio é como capturá-lo para ser registrado, como fazemos com a informação, diante de
sua natureza intangível e individual. A gestão do conhecimento procura justamente lidar com esse
desafio — converter experiências em sistema, histórias em informações e habilidades em algo para
ser aprendido e ensinado. Esse movimento reflete bem a passagem do conhecimento tácito para
o conhecimento explícito. A gestão do conhecimento, então, caracteriza-se por esse esforço de
sistematizar e estruturar o maior ativo de uma organização — o conhecimento.

Referências
CARVALHO, F. C. A. de. Gestão do conhecimento. São Paulo: Pearson, 2012.

DAVENPORT, T. H. Ecologia da informação. 4. ed. São Paulo: Editora Cultura, 2001.

DRUCKER, P. F. Introdução à administração. São Paulo: Pioneira, 1991.

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