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Lúcifer

Fire from heaven


Marcos Torrigo
Originalmente publicado na revista Sexto Sentido
Ano 5 - Número 54
Lúcifer por William Blake

Por milênios, uma figura tem suscitado diferentes emoções no imaginário


ocidental, em especial nos domínios da cristandade. Esta figura é Lúcifer, o arqui-
demônio, Senhor das hostes infernais, tentador e inimigo mor da humanidade, o
mais belo Anjo, precipitado no abismo por sua soberba. O fogo divino, o brilho do
Sol, o Logos transubstanciado no fogo infernal, o fogo que redime transformado no
fogo da danação eterna.
Mas o quanto disso é real, ainda mais quando estamos abordando o terreno
movediço do mito, da religião e, por conseguinte, da demonologia.
O nome Lúcifer é composto pelo prefixo indo-europeu Leuk, que determina um ser
luminoso, claro e puro, origem da palavra lux e, consequentemente, de luz e
lucidez. O sufixo latino fero, por sua vez, significa trazer, portar.
Lúcifer (Eósforos, Fósforos) dos romanos, filho de Zeus e de Aurora, era o deus
que anunciava um novo dia. É conhecido como o portador do Archote, da Luz, o
que anuncia a vinda do Sol , a estrela-d'alva. Na astronomia, é o planeta Vênus
que se torna visível nos crepúsculos. No nascer, é conhecido como a estrela d'alva
e, no poente, como Vésper. Vênus é a deusa do amor em todas as suas formas,
aparentada com as mesopotâmicas Ishtar e Inanna.
Lúcifer nunca foi tido por maléfico, muito menos associado com as potências
infernais, tanto é assim que havia um bispo em Cagliari chamado Lúcifer, que
viveu por volta do ano 300 E.V.* fundador do Luciferianismo.

A atribuição de Lúcifer como Demônio e Anjo caído veio depois, e foi criada pelos
"pais da Igreja".
A Igreja adaptou a sua maneira passagens do Antigo Testamento para serem
atribuídas à Queda de Lúcifer.
Eles "interpretavam" (hermenêutica) as escrituras do Antigo Testamento pelas do
Novo Testamento.
Desta forma, passagens do Novo Testamento, como: "Mas ele lhes disse: Eu vi
Satanás caindo do céu como um relâmpago" (Lc 10: 18), influenciaram a
interpretação do Antigo Testamento: "Como caíste do céu, ó estrela da manhã,
filho da alva! Tu que destruía as nações!
Tu dizias em seu coração: Subirei ao céu, acima do firmamento das estrelas de
Deus, exaltarei meu trono, e no monte da congregação me sentarei nos limites do
norte.
Subirei acima das nuvens mais altas, e serei igual ao Altíssimo.
Em verdade fosse precipitado para o reino dos mortos, no abismo mais profundo.
(Isaías 14: 12 a 15).

Essas passagens de Isaías eram destinadas ao célebre rei babilónico


Nabucodonosor, que havia destruído Jerusalém. Helel bem Shahar é a designação
hebraica referindo-se, de forma alegórica, à "Queda da Estrela Dalva”.
Há outras passagens interessantes, como uma endereçada ao rei de Tiro. Por mais
que ela tenha alvo definido (o rei), ela evoca talvez uma lenda anterior, unindo o
destino do monarca ao de um Querubim expulso das hostes celestes.
Tu eras Querubim da guarda ungido, te estabeleci, ficaste no monte santo de
Deus, entre as pedras brilhantes caminhava.
Tu eras perfeito em teus caminhos, desde o dia em que foste criado, até que se
encontrou iniqüidade em ti.
Multiplicando vosso comércio encheu seu âmago de violência, e pecaste; por causa
disso te deitarei profanado fora da montanha de Deus, te farei perecer, ó
Querubim da guarda, em meio ao brilho das pedras.
Elevaste teu coração por causa da tua beleza, conspurcaste vossa sabedoria por
causa de teu resplendor. (Ez 28:14-17)

Mas qual teria sido o motivo da Patrística ter escolhido Lúcifer, e não qualquer
outro? Existem alguns pontos mágicos e ocultos que devem ser abordados.
Especialmente a relação entre Vênus e Lúcifer, e consequentemente com o
demoníaco.

Há um fato peculiar, a criação dos demônios, (Qliphoth, conchas, força


desequilibrada), de acordo com o Judaísmo, deu-se na sexta-feira da criação (os
sete dias em que, de acordo com a Torah, Deus criou o mundo), momentos antes
do sagrado Shabat.
Neste mesmo dia, foi criada a raça humana, e se deu a sua Queda . Ou seja, na
mesma sexta-feira, Adão foi criado e cedeu a concupiscência. No calendário
judaico, Adão pecou no primeiro dia de Tishrei (Rosh Hashaná, primeiro e segundo
dia de Tishrei), e é justamente neste dia, todos os anos, que os homens são
julgados por seus atos.
O mês de Tishrei corresponde à tribo de Dan, esta por sua vez ao signo de Libra,
que é regido por Vênus. Sem falar que, tradicionalmente, a sexta-feira é o dia
consagrado à Vênus (dia de Vênus, Hemera Aphrodites grego, Vendredi, francês e
Venerdi em italiano).
Dando asas à imaginação, notaremos que o pecado original estava envolto em
correlações venusianas. A maçã é dada ao homem por sua companheira, o
resultado da Queda é a descoberta da sexualidade, a sedução da serpente, dentre
outros.
Outro elemento de ligação entre Vênus e o demoníaco é a Queda dos Anjos. Eles
caíram justamente por acharem belas as mulheres humanas e serem atraídos por
elas. Os Anjos as possuíram e desta união nasceu uma raça de gigantes, fortes e
poderosos, os Nephilins (ver Gênesis 6:1 a 4). A palavra deriva de Naphal, descer,
sendo que podemos entender Nephilins como os que desceram ou caíram.
Na Bíblia, são citados os Filhos de Deus (os Anjos), em hebraico Beni Elohim
(possivelmente a melhor tradução fosse filhos dos deuses).
Os Beni Elohins são correspondentes a Sephira Hod (que tem como planeta
Mercúrio, o tradicional mensageiro dos deuses) na Cabala, o complemento de
Netzach, que é Vênus e os próprios Elohins.
Inferimos que os caídos são Arcanjos, que são a Hoste de Hod, e não só por isso,
pois no Livro de Enoch** é mencionado que Miguel, Uriel, Rafael e Gabriel
(Arcanjos) observaram do céu os efeitos dos caídos.
O Livro de Enoch é um apócrifo e uma pseudoepigrafia, e narra, dentre outras
coisas, a Queda dos Anjos chefiados por Semjâzâ (um proto-Lúcifer?).
Os Anjos Caídos ensinaram inúmeras artes a humanidade, Azazel como trabalhar
os metais, e Semjâzâ, a Magia. Os outros ensinaram astrologia, astronomia e
signos. Azazel continuou seu magistério ensinando aos humanos os segredos
sagrados que estavam guardados no Paraíso.

Indo para a mitologia grega o titã Cronos castra seu pai Urano e joga seus genitais
no mar. Do sangue misturado a espuma do mar nasce Afrodite (Vênus). Logo em
seguida ela foi saudada pelas criaturas do mar, nereidas, tritões. A deusa surge de
dentro de uma concha.
Teve como irmãs as infernais Erínias (Fúrias), criadas pelas gotas do sangue de
Urano caídas na terra. As Erínias eram seres que até Zeus respeitava os desígnios.
São representadas como mulheres aladas, porém serpentes.

Retomando a Igreja, notaremos que estes pontos expostos podem ter motivado a
"escolha" de Lúcifer.
Que os cristãos sabiam das implicações de Vênus, é evidente pelo título conferido
a Lúcifer, príncipe da luxúria espiritual. Cada Sephiroth da Árvore da Vida
cabalística tem um "vício" e o de Netzach (Vênus), por sua vez, é a Luxúria.
De acordo com o Concílio de Latrão, os poderes do demônio são iguais aos dos
outros anjos, possivelmente devido a sua origem comum. Igualmente para a
Igreja, diabos e demônios são a mesma coisa.
O conceito de Mal se modificou com o passar do tempo. Notamos que no mundo
antigo o que prevalecia era o monismo. Deus ou os deuses eram responsáveis
tanto pelo bem como pelo mal, sendo a fonte de tudo. O Universo era percebido
como uno e não dividido entre um deus do bem e um deus do mal, ou entre Deus
e o diabo.
Podemos tomar por base o próprio Iavé do Antigo Testamento, que em suas
próprias palavras dizia: "Eu sou o Senhor e não há outro, além de mim não existe
Deus"; "Eu sou o Senhor e não há outro, Eu formo a luz e crio as trevas, Eu faço o
bem e crio o mal, Eu, o Senhor, faço todas estas coisas" (Isaías 45:5-7).
Quando eu afiar a minha espada reluzente, e tomar em mãos o juízo, tomarei
vingança contra meus inimigos e darei o merecido castigo aos que me odeiam.
Encharcarei as minhas setas de sangue, e minha espada se fartará de carne, do
sangue dos mortos e dos cativos, das cabeças dos chefes inimigos. (Dt 32: 41,42).
Suas crianças serão esmagadas em frente a eles, suas casas saqueadas, e suas
mulheres estupradas. (Isaías 13:16)
Em um dia em que os filhos de Deus apresentaram-se diante do Senhor, Satanás
veio com eles.
O Senhor perguntou a Satanás: "Por onde andastes?". Satanás respondeu: "De
passear pela terra". O Senhor continuou: "Viste meu servo Jó? Não há na terra
ninguém semelhante a ele, integro, correto e temente a Deus, e não trilha o
caminho do Mal".
Então Satanás falou: "Por que Jó teme a Deus? Por acaso não o protegeu de todas
as formas, a ele, a sua casa e a tudo quanto tem? A obra de suas mãos
abençoaste, e multiplicaram seus bens na Terra.
Estende tua mão e toca-lhe em tudo que é dele, e verás que blasfemará contra
Ti".

Disse o Senhor a Satanás: "Tudo que é dele está em seu poder, mas contra ele
não faça nada, e Satanás sai para cumprir a sua missão. (Jó 1: 6-12).
Reforcei os aspectos "negativos" de Jeová demonstrando o lado sombrio do Deus
de judeus, cristãos e muçulmanos.
O monismo tem uma vantagem óbvia, não há o mal absoluto. Desta forma, tanto
os princípios que compõem o Cosmos quanto os que compõem o indivíduo podem
ser harmonizados e integrados, sem maiores prejuízos. Justamente o contrário do
que aconteceu no seio do Cristianismo, por exemplo, com inquisições, "guerras
santas" e outros. O mal é vivenciado no outro, e assim, pode ser erradicado
(assim como outro pode ser morto).
A primeira religião a quebrar a harmonia do monismo foi o Zoroastrismo, criado no
Irã por volta de 600 a.C . Nele há início o dualismo; o Universo está fragmentado
em duas partes, uma "boa" e outra "má", um deus da luz e um deus das sombras.
Este pensamento influenciou os judeus e os gregos e, consequentemente, os
cristãos.
No Cristianismo, o mal é atribuído e projetado ao Diabo, enquanto Deus só faz
coisas boas.
Assim, o diabo ganha autonomia e poder perante Deus, remetendo-nos
novamente a uma forma de pensar que lembra o dualismo iraniano.
Por mais que o diabo seja inferior a Deus, ele pode corromper a criação e torna-se
o senhor do mundo. Partindo do pressuposto de que a matéria é essencialmente
má, assim como as "necessidades da carne", o campo de batalha é a alma
humana, afinal de contas, a corrupção principia mesmo no Antigo Testamento,
com o ato de insubordinação de comer da Árvore do Conhecimento do Bem e do
Mal, o que poderia, de acordo com as palavras da serpente confirmadas por Deus,
transformá-los em deuses. (Genesis 3: 22) Então disse o Senhor Deus: "Eis que o
homem se tornou igual a um de nos, conhecedor do bem e do mal; assim sendo,
para evitar que tome da Árvore da Vida e coma o seu fruto e viva eternamente". O
Senhor Deus o lançou fora do Jardim do Éden...
Deus é onisciente, onipresente e onipotente, desta forma, o diabo age porque
Deus permite. Se Deus fosse humano, poder-se-ia acusá-lo legalmente de
cumplicidade em todos os "delitos" do maléfico.
A desculpa descoberta pelos cristãos é a seguinte: Deus criou o diabo, mas ele, em
origem, não era Mal, o diabo escolheu ser mal.
Isso tecnicamente isentaria Deus do problema de ter criado o Mal ao criar o diabo.
Só que esta história tem problemas óbvios, se Deus é onisciente, ele saberia o que
estava por vir e mesmo assim não fez nada.
Tratando o assunto de uma forma mais leve, é de se imaginar que um filho traga a
genética do Pai, então, mesmo o diabo tendo se tornado " Mal" depois, este
predicado já estaria em latência nele.

Dionísio, um monge sírio do século VI, foi o primeiro a detalhar as hierarquias


dos Anjos. São divididos em três tríades, sendo elas (em grau de grandeza)
Serafins, Querubins e Tronos, a intermediária Dominações, Virtudes e Potestades e
a última composta de Principados, Arcanjos e Anjos.
Desta forma, nos séculos subsequentes, quando Lúcifer foi precipitado dos céus,
ele, sendo o mais importante entre os Anjos, naturalmente foi associado aos
Serafins (há referências a Lúcifer também como um Querubim).
Miguel Psellos (século XI), de Constantinopla, criou uma "hierarquia demoníaca",
de influência neoplatônica; a distribuição das hostes dos caídos se espelha no
Paganismo (DAIMONS). Então, teremos os demônios sendo distribuídos pelos
elementos (inclusive o Éter).
Encontraremos ecos do mito de Lúcifer em Iblis, o diabo muçulmano. Iblis recusou
a se curvar perante o homem e isto acarretou a sua Queda. Tudo leva a crer que
Iblis fosse um Anjo, já que sua história está ligada à ordem dada por Allah para
que os Anjos se curvassem perante Adão (ou se preferirmos a raça humana).
Todavia, há citações do Alcorão que o nomenclaturam de Djinn, um ser
aparentado aos Daimons gregos, ou seja, tanto bom como mau.
Os Djinn foram criados do fogo enquanto os Anjos, da luz. Curiosamente, as
palavras fogo e luz são em etimologia aparentadas — Nur, luz e Nar, fogo.
O problema do mal no Islã é até mais veemente que no Cristianismo devido ao seu
monoteísmo total, desta forma, Allah é a fonte do mal. Há todo um debate
semântico do porquê da existência do mal e por corolário do diabo, Iblis, não se
chegando a um bom termo da questão.
Outro ponto veemente é que no Islã somente Allah é passível de adoração, então,
ao negar a curvar-se perante o homem, Iblis foi o único que agiu corretamente?

Transformar deuses e deusas em demônios foi prática corrente do Cristianismo.


Com um único golpe, eles reforçavam a sua fé e destruíam os ícones do
Paganismo. Por outro lado, a própria Igreja contribuía para "gerar" as
manifestações do demônio. Afinal de contas, os sete pecados capitais são os
maiores criadores de diabolismo. Buda, séculos antes, compreendeu que se a
corda estiver muito esticada arrebenta, se estiver frouxa não toca: o famoso
caminho do meio. Justamente as privações criavam sonhos luxuriosos e recheados
de glutonaria, sem esquecer, é claro, o fenômeno da histeria.

A imagem do diabo clássico foi tomada de empréstimo de deuses como Pã e


Cernnunos. E não só isso, o culto aos antigos deuses foi tido pela Igreja como, em
verdade, um culto diabólico. Os deuses eram para a Igreja demônios a serviço do
senhor das trevas. A medida que ocorria a conversão dos povos ao Cristianismo,
os atributos positivos dos deuses foram incorporados ao Deus cristão e os
negativos, ao Diabo.
As capacidades xamânicas, como se converter em animais, viajar pelos mundos,
foram atribuídas ao diabo e aos que pactuavam (ou malditos como ele) com ele,
licantropos, bruxas e vampiros.

Curiosamente, o inexplicável, o misterioso, os grandes desastres naturais são do


Malefício. O diabo toma as funções dos Titãs, Gigantes do gelo, deuses ctônicos e
primordiais.
O diabo e o mal dinamizam o Cosmos. Na lenda da Queda, Eva e Adão viveriam
eternamente em um estado de graça. Por mais que este estado fosse "perfeito",
era imutável. A alma humana era como uma donzela em uma torre de cristal. Foi
justamente o mal que rompeu este estado de coisas e impulsionou a humanidade
à existência objetiva e, consequentemente, à evolução.
A teoria da relatividade levou Einstein a imaginar que o Universo estaria entrando
em colapso ou expandindo-se. A expansão do Universo é um fato (ao menos as
teorias atuais assim entendem) devido ao Big Bang, a explosão que deu origem ao
Cosmos e "promoveu" a expansão. Logo após o Universo ter origem por um
infinitamente minúsculo tempo, o Universo foi simétrico e como resultado,
perfeito; em seguida houve uma ruptura e, devido a isso, a assimetria. Caso esta
quebra não ocorresse, as inimagináveis combinações que se seguiram não teriam
ocorrido.
Para algumas vertentes do Catarismo, Jesus era irmão de Lúcifer. Vale lembrar
que Jesus se autodenomina "a brilhante estrela da manhã" (Apocalipse 22:16).
Esta passagem é encontrada mesmo na Vulgata, criando, no mínimo, estranheza.
Se lembrarmos o significando da palavra Lúcifer e os seus atributos em muitos
aspectos, eles se casam com os de Jesus.
Jesus é o verbo encarnado, ou seja, a manifestação do Logos e o Logos é a
inteligência cósmica (Deus). Jesus é o portador desta Luz. Sua correspondência
pela patrística no ser humano é a inteligência.
Creio não ser necessário traçar os paralelos entre o escrito acima e Lúcifer. Sem
falar que Jesus é conhecido por trazer uma lei de amor (Vênus), trocando os 10
mandamentos por "Ame teu Deus sobre todas as coisas e teu próximo como a ti
mesmo".
A era cristã é correspondente à Era de Peixes, signo regido por Netuno que, na
astrologia esotérica, é a oitava superior de Vênus.
Os cristãos primitivos acreditavam que o diabo queria ser Jesus, o elo entre o
homem e Deus. Desta forma, tanto Jesus quanto o diabo foram empurrados para
perto do conceito de demiurgo.
Demiurgo (Demiurgós em grego) é uma espécie de administrador da criação de
Deus. Para Platão, era o artífice da criação, que, apesar de não ter criado o
Cosmos, o ordena. Em verdade, mantendo e repetindo padrões.
Para os gnósticos, o termo ganha um caráter mais Maléfico, sendo o "demiurgo" o
responsável pelo aprisionamento do homem (da alma na matéria).
Esta visão gnóstica é importante tratando-se da mitologia cristã, que nasce e se
desenvolve em um ambiente grandemente influenciado pelo pensamento gnóstico.
A demonologia cristã herdou vários elementos dos gregos e judeus, estes, por sua
vez, dos mesopotâmicos (em especial dos sumerianos via cananaeus). Então, nada
melhor que nos voltarmos às origens.

Parte do Épico de Gilgamesh encontrado na biblioteca de Nìnive

Os acadianos, assírios e babilónicos tinham um sistema complexo de Magia,


demonologia e angelologia.
Assurbanipal, o célebre rei Assírio, responsável pela biblioteca de Nínive, teve uma
especial preocupação com textos de Magia. O rei instruiu seus escribas para que
reproduzissem em inúmeras cópias um livro com a parte velada da religião
mesopotâmica (Magia). Este tratado versa, dentre outras coisas, sobre uma
grande diversidade de seres. Muitos deles serviriam de inspiração para os futuros
Anjos, demônios, íncubos, súcubos, Lilith e outros das religiões atuais.
Este livro era uma cópia remanescente de Uruk, na Caldeia, onde houve um
profundo estudo das Artes Mágicas.
O tomo era composto de três partes, sendo que uma delas é dedicada
inteiramente aos espíritos malignos. Vale lembrar que estamos falando das
"tabuinhas cuneiformes", ou seja, de placas de barro em que eram escritos os
textos.

Lilitu (entre os séculos 18 e 19 antes da Era Vulgar) que viria


a ser a Lilith judaica.

Na visão de Ezequiel, é fácil observamos elementos assírios. Ele vê os Cherub, dos


quais vem o termo Querubim. A palavra é assíria, kirubu, do karâbu, significando
estar perto, os seres que estavam mais perto do Divino.
Cherub tem origem da palavra egípcia Xefer. Na arte de ambos (mesopotâmicos e
egípcios), há seres alados e com rostos humanos. Usualmente, o Cherub também
era usado como montaria do deus, o que culminou na visão da Merkavah por
Ezequiel.
Sukallin é o mensageiro (Anjo) babilônico. Encontraremos ecos da divisão entre os
"celestes" Igigi e os subterrâneos Annunaki. Os Sukallin, "os filhos dos deuses"
(importante notar esta designação e nos lembrarmos dos Beni Elohns), são o
modelo do qual saíram os anjos judeus, cristãos e muçulmanos.
Alguns "demônios" tiveram sua origem nas mesmas fontes. Asmodeus pode ser a
derivação de um ser relatado no Avesta, Aeshmo Daeva. Belzebu, Ba'al Zebul, o
senhor da montanha ou da morada elevada; Beel é a forma aramaica de Baal .
Outra curiosidade, no mínimo intrigante, é a semelhança entre Shell, concha em
inglês, e Sheol, o inferno hebreu, ainda mais quando Sheol determina algo oco,
interno. Sem falar, como já vimos, que demônio em hebraico é Qliphoth, que
significa concha.
Não falarei da empresa Shell e do fato dela vender combustíveis e derivados de
petróleo. Que nada mais são do que restos daquilo que um dia foi vivo, retirados
das profundezas da terra.

A palavra Sheol era usada para determinar o local dos mortos. Muitas vezes, os
fantasmas dos vivos são chamados Qliphoth também, uma referência a um
cadáver astral.

The Great Red Dragon and the Woman Clothed with Sun
Das figuras que nos remetem a Lúcifer, Prometeu é uma das mais instigantes.
Ele era um titã, um ser tão poderoso quantos os deuses ou até mais. Os Titãs
eram gigantes que regeram a Terra antes dos deuses.
Prometeu (percepção avançada) foi o criador da raça humana, feita a partir do
barro. Só que os humanos pouco se diferenciavam dos animais. Então, Prometeu
profetizou um futuro melhor para a sua criatura. Mas para tal seria necessário que
o homem tivesse algo mais, e este algo mais era o intelecto, o dom da
inteligência, a lucidez, o fogo dos deuses.
Por analogia, podemos imaginar que o fogo, essência divina, Agni conferiria a
capacidade aos humanos de se tornarem deuses.
Prometeu foi até o Olimpo e, no carro de Apolo (o deus sol), e "roubou" o fogo
para humanidade. Como castigo, ele foi condenado por Zeus ao Cáucaso.
O termo Zeus é de origem indo-européia, da antiga palavra para céu, Deiuos.
Encontraremos originados nela o Deva sânscrito, Deus latim, sendo associado à
claridade e à luz.
Lúcifer é um arquétipo que suscita infinitas especulações, essas norteadas pelos
sentimentos mais díspares. Não é à toa que tanto se falou sobre este Anjo caído, e
muito há a ser dito.

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