Você está na página 1de 129

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-1-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

(...) Escutar é complicado e sutil. Diz Alberto


Caeiro que "não é bastante não ser cego para
ver as árvores e as flores. É preciso também
não ter filosofia nenhuma".

Filosofia é um monte de idéias, dentro da


cabeça, sobre como são as coisas. Para se
ver, é preciso que a cabeça esteja vazia.

Parafraseio o Alberto Caeiro: "Não é bastante


ter ouvidos para ouvir o que é dito; é preciso
também que haja silêncio dentro da alma".
Daí a dificuldade: a gente não agüenta ouvir o
que o outro diz sem logo dar um palpite
melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo
que a gente tem a dizer.

Como se aquilo que ele diz não fosse digno de

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-2-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

descansada consideração e precisasse ser


complementado por aquilo que a gente tem a
dizer, que é muito melhor. (...)

Rubem Alves

ÍNDICE SUMÁRIO

Textos Págin
a

01 MATRIZ PEDAGÓGICA DO 2º MÓDULO DO CURSO 01


REGIONAL SUL

02 O QUE É SER HOMEM? O QUE É SER MULHER? 05


Nalú Faria e Miriam Nobre

03 O NASCIMENTO DOS SINDICATOS RURAIS E O 07


SINDICALISMO COMUNISTA NO PARANÁ - 0svaldo
Heller da Silva

04 ORIGEM E PAPEL DOS SINDICATOS – Altamiro 31


Borges

05 PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA LUTA DOS 37


TRABALHADORES E NO MOVIMENTO SINDICAL -
Maria Valéria Junho Penna

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-3-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

06 HISTÓRIA DO MOVIMENTO SINDICAL – CARTILHA 45


CNTE

07 CONCEPÇÕES E CORRENTES SINDICAIS NO 57


BRASIL - Amarildo Carvalho de Souza e Domingos
Corcione

08 HISTÓRIA DE NOSSAS RAÍZES – Socorro Silva 73

09 A TRAJETÓRIA POLÍTICA DA CONTAG 88

10 HISTÓRICO DA CUT NACIONAL – www.cut.org.br 101

11 POTENCIAL E LIMITE DAS DISPUTAS POLÍTICAS: 104


PONTOS PARA REFLEXÃO - Sara Pimenta e
Domingos Corcione

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-4-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

2°MÓDULO DO CURSO DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES E EDUCADORAS EM CONCEPÇÃO, PRÁTICA


SINDICAL E METODOLOGIA DA FORMAÇÃO.
(REGIÃO SUL)
Data: 07 a 13 de outubro de 2007
Local: FETAESC
Endereço: RUA LEOBERTO LEAL, 976 – BARREIROS, 88117-700 - SAO JOSE /SC – fone: 48. 3246-8011

MATRIZ PEDAGÓGICA

Objetivo Geral:

 Contribuir com a formação de militantes do MSTTR, de modo que aprimorem sua capacidade
multiplicadora e potencializadora da ação formativa em suas áreas de atuação.

Objetivos Específicos:

 Socializar e aprofundar referenciais teóricos, políticos e ideológicos que fundamentam e alimentam os


ideais e a luta sindical e popular.
 Re-avaliar e fortalecer a luta sindical, numa visão e ação sindical transformadoras, estimulando
processos de mudanças de atitudes, comportamentos e práticas individuais e coletivas, coerentes com
as exigências de implementação do PADRSS.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-5-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

 Favorecer a experimentação, sistematização e apropriação de novas metodologias pedagógicas que


realimentem a prática formativa do movimento sindical.
 Contribuir para a constituição de uma rede de formadores/as que assumam e implementem o projeto
de formação do MSTTR.

EIXO TEMÁTICO: HISTÓRIA, CONCEPÇÃO, ESTRUTURA E PRÁTICA SINDICAL.


EIXOS PEDAGÓGICOS: PEDAGOGIA PARA UMA NOVA SOCIABILIDADE E MEMÓRIA E IDENTIDADE.

Dia/perío Tema e Sub-temas. Objetivos Responsáveis


dos
07/10 –
Domingo Chegada e Acolhimento Dar continuidade ao processo de FETAESC/ENFOC
Manhã 10:00 - Mística – Identidade regional integração do grupo.
 Abertura Socializar a programação do 2º
 Apresentação do roteiro, acordos módulo, definir comissões de
de convivência, comissões de trabalho e acordos de convivência.
trabalho

14:00 – Reapropriação do I Módulo Construir pontes e identificar Rede de educadores


Trabalho em grupo a partir de possíveis lacunas de um módulo Equipe ENFOC
Tarde perguntas orientadoras para outro
Estabelecer pontes com o 2º Módulo

08/10 08:30 – Identidade social de classe Compreender como são Convidados:


Segunda  Raça e Etnia reproduzidas as relações desiguais.  Marcos Rodrigues
Feira  Gênero. Consultor do MDA
Manhã  Sonilda Pereira –

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-6-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Assessora da FETAG
RS

Tarde 14:00 – Socialização das Socializar os resultados das Rede de educadores


atividades inter modulares atividades inter-módulo e identificar Equipe da ENFOC
 Trabalho em grupo por estado a aspectos a serem refletidos durante
partir de perguntas orientadoras o módulo.
 Apresentação

08:00 – História de lutas na


09/10 região sul Resgatar elementos da história Professor Osvaldo
Terça Feira política do país considerando as Heler – Universidade
Manhã e  Abordagem histórica das lutas principais lutas pela terra na região Federal do Paraná
tarde na região sul, considerando as sul.
colônias anarquistas, ligas Lideranças
camponesas, as frentes agrárias convidadas dos 3
nos estados do Rio Grande do estados.
Sul, Santa Catarina e Paraná.
 Memória e Identidade: Refletir sobre questões presentes
depoimentos de lideranças que nos relatos históricos das lideranças
fazem a história dos convidadas e sobre suas trajetórias
trabalhadores e trabalhadoras de lutas.
rurais na região sul.

10/10 8:30h – Contexto e origem do Introduzir a abordagem histórica do Convidado:


Quarta sindicalismo no Brasil sindicalismo no Brasil. Compreender Nelson Mota –
feira o papel do sindicalismo no contexto educador
manhã  História histórico enquanto meio de
 Concepções e práticas sindicais transformação social.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-7-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Exposição Dialogada Refletir sobre o contexto, as diversas


concepções sindicais existentes, as
formas de organização dos
trabalhadores a as estratégias de
lutas adotadas.

Tarde LIVRE

Noite CONFRATERNIZÇÃO

11/10 08:30h – Organização no Campo Manhã:


Quinta  Trajetória Histórica da Contag e Compreender e refletir sobre a Exposição: Manoel
Feira das Federações trajetória histórica da CONTAG e das Santos – Presidente da
 História de lutas das mulheres federações dos estados da região CONTAG
Manhã e  A construção do PADRSS: Projeto sul Coordenação: Alberto
tarde Alternativo de Desenvolvimento Broch – Vice Presidente
Rural Sustentável Solidário Dialogar sobre a construção da CONTAG.
histórica do PADRSS Tarde: Painel com as
federações: Euclides
Dionísio Canalle (SC),
Sergio Miranda (RS),
Maira Botega (RS) e
Augustinho Bukowski
(PR)

12/10 08:30h – Diálogos Pedagógicos Debater e refletir sobre os desafios e Equipe ENFOC

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-8-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Sexta  Desafios e perspectiva para o as perspectivas para o MSTTR a


Feira MSTTR partir da reapropriação das questões
Manhã  A relação entre Política Nacional suscitadas pela abordagem histórica
de Formação e a prática sindical: e do atual contexto sócio-político.
princípios e sujeitos Refletir sobre a Política Nacional de
Formação do MSTTR e sua relação
com a prática sindical na
perspectiva da transformação
política.

12/10 14:00h – Diálogos Pedagógicos: Dialogar sobre a estratégia do Equipe ENFOC


Sexta  Tempo Escola e Tempo tempo comunidade – discutir
Feira Comunidade próximos passos
Tarde

13/10 08:30 – Avaliação e Fazer avaliação do processo Equipes de Estudantes e


Sábado Sistematização pedagógico vivenciado durante o equipe ENFOC
Manhã módulo e sistematizar as principais
13:00 – Encerramento questões apreendidas.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
-9-
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O QUE É SER MULHER?


O QUE É SER HOMEM?
Subsídios para uma discussão das relações de gênero

Nalú Faria e Miriam Nobre

Quando uma criança nos pergunta por que a Terra é redonda ou


porque o céu é azul, temos duas saídas. Responder "porque sim" ou pensar,
procurar uma reposta, que só vai provocar novas perguntas. Este texto é
para quem prefere o segundo caminho.
O que é ser mulher? O que é ser homem? Por que mulheres e
homens vivem em condições de desigualdade? Por que se diz que algumas
coisas são de mulheres e outras de homens? Por que as mulheres são
consideradas inferiores e vivem situações de injustiça por serem mulheres?
Onde é que isto tudo começa?

A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA DESIGUALDADE DE GÊNERO


Vamos começar pelos bebês. As pessoas nascem bebê machos
e fêmeas e são criadas e educadas conforme o que a sociedade define
como próprio de homem e de mulher. Os adultos educam as crianças
marcando diferenças bem concretas entre meninas e meninos. A educação
diferenciada dá bola e caminhãozinho para os meninos e boneca e
fogãozinho para as meninas, exige formas diferentes de vestir, conta estó-
rias em que os papéis dos personagens homens e mulheres são sempre
muito diferentes. Outras diferenças aparecem de modo mais sutil, por
aspectos menos visíveis, como atitudes, jeito de falar, pela aproximação
com o corpo.
Educados assim, meninas e meninos adquirem características e
atribuições correspondentes aos considerados papéis femininos e
masculinos. As crianças são levadas a se identificarem como modelos do
que é feminino e masculino para melhor desempenharem os papéis
correspondentes. Os atribuídos às mulheres não são só diferentes dos do
homem, são também desvalorizados. Por isso, as mulheres vivem em
condições de inferioridade e subordinação em relação aos homens.
Usamos as expressões identidades de gênero e relações de
gênero para deixar bem claro que as desigualdades entre homens e
mulheres são construídas pela sociedade e não determinadas pela
diferença biológica entre os sexos. Elas são uma construção social, não
determinada pelo sexo.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 10 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Compreender essa construção social, não significa des-


considerar que ela se dá em corpos sexuados. Compreendemos que há
uma estreita imbricação entre o social e o biológico. Como disse Guacira
Lopes Louro, gênero também tem uma dimensão e uma expressão
biológica. Assim, mulheres e homens imprimem no corpo, gestos, posturas
e disposições, as relações de poder vividas a partir das relações de gênero.
Os modelos de feminino em nossa sociedade são criados a partir
de símbolos antagônicos: Eva e Maria, bruxa e fada, mãe e madrasta. Essas
definições propõem o que é bom para as mulheres e culpam-nas quando
não respondem a esse padrão.
A partir da consolidação do capitalismo, existe a idéia de que
ocorre uma divisão entre as esferas pública e privada, sendo que a esfera
privada é considerada como o lugar próprio das mulheres, do doméstico, da
subjetividade, do cuidado. A esfera pública é considerada como o espaço
dos homens, dos iguais, da liberdade, do direito.
Nessa compreensão, o papel feminino tradicional estabelece a
maternidade como principal atribuição das mulheres e, com isso também o
cuidado da casa e dos filhos, a tarefa de guardiã do afeto e da moral na
família. Ela é uma pessoa que deve sentir-se realizada em casa. O homem
típico é considerado o provedor, isto é, o que trabalha fora, traz o sustento
da família, realiza-se fora de casa, no espaço público. Para uma mulher,
ainda é considerado mais adequado ser meiga, atenciosa, maternal, frágil,
dengosa, e do homem, o que ainda se espera, é que tenha força, iniciativa,
objetividade, racionalidade.
Esse modelo de vida, em que os homens trabalham fora e as
mulheres só fazem o trabalho doméstico, nunca existiu, de verdade, desse
jeito. Na realidade, só uma parcela muito pequena de mulheres vive essa
situação.
As mulheres negras, por exemplo, sempre trabalharam fora de
casa, primeiro como escravas e depois na prestação de serviços domésticos
ou como vendedoras ambulantes, circulando por muitos espaços públicos.
Para as mulheres camponesas, o que é chamado de cuidar da casa esconde
o trabalho na roça, a produção de artesanato, o cultivo da horta e a criação
de animais, trabalho que produz mercadorias, cuja venda contribui para o
sustento da família. Além disso, nas cidades, muitas mulheres vivem
sozinhas com seus filhos e são as principais responsáveis por sua
manutenção. E muitas, muitas outras trabalham fora e dividem com o mari-
do o sustento da casa.
E por que ainda é tão forte a idéia de que mulher deve seguir o
modelo de mãe e dona-de-casa? E por que ainda é tão forte a idéia de que
o trabalho fora de casa cabe apenas ao homem? A persistência nessas
idéias tradicionais e nunca realizadas plenamente costuma ser justificada
pela idéia de que esses papéis são naturais, isto é, homens e mulheres já
nascem para ser desse jeito. Dizemos que a naturalização é o principal
mecanismo de justificativa dessa situação.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 11 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

A naturalização dos papéis e das relações de gênero faz parte


de uma ideologia que tenta fazer crer que esta realidade é fruto da
biologia, de uma essência masculina e feminina, como se homens e
mulheres já nascessem assim. Ora, o que é ser mulher e ser homem não é
fruto da natureza, mas da forma como as pessoas vão aprendendo a ser,
em uma determinada sociedade, em um determinado momento histórico.
Por isso, desnaturalizar e explicar os mecanismos que conformam esses
papéis é fundamental para compreender as relações entre homens e
mulheres, e também seu papel na construção do conjunto das relações
sociais.
Se os papéis femininos e masculinos são uma construção
histórica, as relações entre homens e mulheres que daí decorrem também
variam ao longo da história. A nossa geração sabe que essas relações
sofreram profundas mudanças nos últimos trinta anos, em grande parte
como fruto da ação organizada das mulheres e do feminismo.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 12 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O nascimento dos sindicatos rurais e o sindicalismo


comunista no Paraná 1
0svaldo Heller da Silva

Introdução
O surgimento de organizações de representação da população rural,
envolvendo lutas sociais e candidatos a porta-vozes dos trabalhadores,
ocorridos a partir do final dos anos 40 no estado do Paraná, é que se
pretende aqui examinar. O estudo do momento de constituição do
movimento sindical no campo ganha relevância não só devido à rara
literatura existente sobre o tema, em função também do mito criado pelo
sindicalismo oficial, que ignora e queria fazer ignorar este período inicial do
sindicalismo, mas sobretudo graças às lições que podem ser tiradas e
talvez assim contribuir para a compreensão dos dilemas atuais vividos pelo
sindicalismo.
Com a ocupação rápida e desordenada da região de Porecatu, no
norte do Paraná, um conflito em torno da posse da terra no final da década
de 40 permitiu o início da implantação do Partido Comunista Brasileiro
(PCB) no campo. Juntamente, deu-se a criação dos primeiros organismos de
representação coletiva dos pequenos agricultores e trabalhadores rurais, as
chamadas “ligas camponesas”. A partir do sufocamento da guerrilha de
Porecatu pelas forças de repressão, os militantes comunistas
remanescentes servirão de elo ao posterior desenvolvimento das “Uniões
Gerais de Trabalhadores”, organismos de tipo sindical - arregimentando
indistintamente grupos sociais rurais e urbanos. Apesar da feroz resistência
dos patrões, o sucesso alcançado junto à população rural, particularmente
colonos das fazendas de café, impôs o desmembramento destas Uniões
ecléticas e a constituição dos primeiros sindicatos especificamente
agrícolas.
Sempre sob a iniciativa dos comunistas, a proliferação sindical no
campo e a formação da primeira geração de dirigentes sindicais rurais

1
Este texto é uma versão resumida de parte de minha tese de doutorado intitulada "Communistes
et anticommunistes : l'enjeu du syndicalisme agricole dans l'état du Paraná - de 1945 à la fin des
années 70", defendida na École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris em 2 de julho de
1993. Ele foi publicado em: VILLALOBOS, Jorge(org). Geografia social e agricultura. Maringá,
EUEM, 2000. As fontes utilizadas foram: entrevistas com aqueles que viveram os
acontecimentos, jornais da época, documentos dos sindicatos e arquivo do DOPS do Paraná.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 13 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

mexeu com interesses poderosos, sobretudo das oligarquias rurais e da


Igreja Católica. Esta última, com o apoio das primeiras, decide assim entrar
na corrida pela sindicalização dos trabalhadores rurais, constituindo o seu
próprio movimento sindical: a Frente Agrária Paranaense. Mas os
comunistas vencerão este primeiro embate pela hegemonia da
representação dos trabalhadores do campo. A região norte do estado
constituiu-se, assim, no berço da organização sindical da população
agrícola do Paraná. Entretanto, o golpe militar de abril de 1964 varrerá,
definitivamente, os adeptos do PCB da paisagem rural.
Em que pese a quase ausência de organização profissional, sindical
e mesmo política no meio rural do estado, na virada dos anos 40 para os
anos 50, ocorreu a formação de ligas camponesas. Entretanto, elas foram
exceção. Sua aparição bem como o seu rápido desaparecimento por volta
de 1951 –inesperado e pouco claro– deixaram muitas questões em aberto.
As evidências indicam que a repressão policial que se abateu sobre a
guerrilha de Porecatu sufocou, ao mesmo tempo, estas ligas animadas pelo
Partido Comunista Brasileiro. Assim, esta primeira tentativa comunista de
mobilização da população rural no Paraná aparentemente foi interrompida.
O aparato policial e militar havia cumprido seu objetivo: dispersão e
desarticulação dos camponeses rebeldes e aniquilamento das ligas.
Todavia, o pesado dispositivo utilizados pelas forças de repressão não
chegou a desmontar de fato a organização do PCB na região. Afora algumas
perseguições, algumas detenções e processos judiciais sem maiores
conseqüências, a organização de base e as relações de confiança junto a
algumas camadas sociais pobres do campo e mesmo as ligações com
círculos do poder local foram preservadas. A máquina de repressão policial
e o discurso radical anticomunista das elites não conseguiram – ou
curiosamente não quiseram – desenraizar o debutante Partido Comunista
no setentrião paranaense.
Deste modo, sem delongas os militantes comunistas retomaram o
trabalho de implantação do “Partidão” entre as camadas menos
favorecidas, nesta região ainda essencialmente rural. Progressivamente,
recomeçou a distribuição de panfletos e jornais, a busca de adesão de
trabalhadores do campo e as reuniões nas fazendas. Ora, não demorou
para que esta efervescência social no meio rural provocasse preocupação,
irritação e clara reação no seio das elites políticas, da grande imprensa, das
forças policiais e do clero.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 14 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Não obstante, agora o PCB havia transformado suas táticas e sua


estratégia política. O extremismo do Manifesto de Agosto de 1950 (que
propunha a luta armada), os guerrilheiros de Porecatu, as ligas
camponesas, tudo isto pertencia ao passado. Agora, sua ação política
pautava-se na conciliação e no legalismo. As antigas táticas radicais tinham
sido esquecidas e enterradas.
Neste momento, o PCB dizia que “o caráter semi-feudal e semi-
escravista da sociedade brasileira” e “as tarefas não cumpridas da
revolução burguesa” colocavam a necessidade de uma “revolução
democrático-popular, de natureza anti-imperialista e agrária anti-feudal”.
De agora em diante, os grandes inimigos eram o “imperialismo e o
latifúndio. O partido não devia mais lutar contra a burguesia brasileira – dita
“nacional”- esta não merecia mais ser vista como adversária. Stalin
ensinava: “não convém sobrecarregar a revolução com todas as tarefas de
uma só vez”. Ao contrário, é melhor “concentrar o fogo sobre o inimigo
mais forte”.
Munidos desta doutrina mais conciliadora e moderada em relação às
elites “nacionais”, os comunistas batalhavam para construir organizações
mais adaptadas à legislação existente, mais susceptíveis de serem
assimiladas institucionalmente e legitimadas socialmente. No lugar dos
bandos rebeldes e das ligas camponesas, foram propostos uniões e
sindicatos. Primeiro foi a vez das “uniões gerais de trabalhadores”, em
seguida vieram os “sindicatos de trabalhadores rurais”(entrevistas 1 e 2). A
formação destes organismos, sob o comando do PCB, desencadeará um
movimento de reação dos grupos dominantes, contribuindo assim para a
formação de uma novo campo de conflitos e lutas sociais. Porém, este
processo de organização de camponeses no Paraná continua ainda hoje
muito pouco conhecido, só agora começam a aparecer pesquisas sobre
este assunto.

As primeiras organizações sindicais


O fraco desenvolvimento da região não havia ainda permitido a
criação de organismos sindicais e profissionais no meio urbano. Este fator,
aliado à ausência de órgãos similares da população rural, provavelmente
tenha conduzido o Partido Comunista a propor uma modalidade ampla de
organização a todos os “trabalhadores”, sejam eles da cidade ou do campo.
Assim, desde os primeiros anos da década de 50, começaram a se formar

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 15 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

entidades chamadas uniões gerais de trabalhadores (UGTs), que logo se


espalharam por todo o norte do Paraná.
Entre os seus associados, estes organismos contavam com citadinos
como operários da construção civil e da indústria nascente, empregados do
comércio, bancários, funcionários públicos e pequenos comerciantes. Mas
sobretudo deles participavam pessoas da roça, como colonos, assalariados
agrícolas, trabalhadores de empreitada, parceiros, posseiros, pequenos
arrendatários e proprietários. Em conseqüência, estas “uniões de
trabalhadores” acolhiam sob a denominação de “trabalhadores” os mais
variados tipos de empregados, de produtores independentes e também de
pequenos empresários e patrões. Observa-se, portanto, que o termo
“trabalhadores” era aqui utilizado num sentido bastante amplo, para não
dizer elástico. A formação ainda incipiente dos grupos sociais seria o motivo
principal da constituição destes organismos tão heterogêneos. Aqueles que
desejassem “contribuir com serviço ou financeiramente” eram aceitos “na
qualidade de sócio benemérito”. As UGTs se pretendiam isentas de caráter
“político-partidário e religioso”(entrevista 3).
Graças à sua vocação sindical, estas uniões se propunham a
“defender intransigentemente as reivindicações da classe operária”, com o
objetivo “de melhorar suas condições de vida, de trabalho, de liberdade, de
saúde e de educação; de promover assistência médica e hospitalar,
assistência jurídica e o conhecimento da legislação do trabalho e da
Constituição Federal; de alertar os trabalhadores sobre os empregadores
que não pagavam férias, horas extras e o descanso semanal. A exigência
do cumprimento da legislação existente estava muito presente neste
princípio de sindicalismo rural.
Para colocar em evidência o caráter “proletário” destes organismos,
o 1° de maio era a ocasião de comemorar “o dia do trabalhador”, “a
jornada internacional dos trabalhadores”. Assim, em 1956, a UGT de
Londrina organizou uma “concentração de trabalhadores do campo”, na
sede da União. Em seguida ocorreu um “encontro solene dos trabalhadores
do campo e da cidade”, na Praça Primeiro de Maio, onde Manoel Jacinto,
David Marujo, entre outros dirigentes sindicais, falaram sobre “a anistia
ampla, os direitos dos trabalhadores do campo e o salário mínimo previsto
em lei”. No final, uma passeata de mais de duas mil pessoas se dirigiu ao
Cine Marabá para escutar os discursos de Flávio Ribeiro e de Clarice
Valença, chefes comunistas locais. No ano seguinte, no Cine Horizonte de

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 16 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Maringá, novas “atividades cívicas”, festividades e provas esportivas


marcaram o Dia do Trabalhador.
Em relação aos colonos das fazendas de café, reclamava-se “um
pedaço de terra para plantar” e para “criar um porco, uma vaca”, assim
como o direito de fazer culturas intercalares no cafezal. Para os
assalariados agrícolas demandava-se o pagamento regular e o salário
mínimo. Um exemplo: A União interveio na fazenda Palmital, em Iretama,
onde algumas dezenas de trabalhadores viviam sob um “verdadeiro
sistema de campo de concentração”. Até para ir ao banheiro eles tinham “a
carabina apontada pra cabeça”. Não recebiam nada, e alguns foram mortos
e enterrados no local. Por fim, as UGTs também promoviam atividades
lúdicas para os seus associados, como bailes, futebol, corridas de bicicleta
e à pé, concursos de violão e de dança, e projeção de filmes.(entrevista 3)
A completa ausência de organismos de representação das classes
sociais menos favorecidas é que permitiu aos militantes comunistas
construírem estas “Uniões Gerais de Trabalhadores”. Elas foram as
primeiras entidades de tipo sindical na zona rural do Paraná, embora o
caráter ainda rudimentar e singelo de sua organização.
No aspecto jurídico, as UGTs se apresentavam como associações de
direito civil, que tinham um simples registro em cartório. Portanto,
formalmente elas não eram organismos sindicais, pois não tinham
autorização do Ministério do Trabalho (entrevista 3). A vocação sindical
destes órgãos decorria do seu papel social e não de sua forma institucional.
Apesar da sua linguagem relativamente moderada e de suas ações
“bem comportadas”, as “uniões gerais de trabalhadores” não ganharam a
simpatia de todos, suscitando até reações hostis. O assistencialismo e o
legalismo eram as marcas principais da intervenção destes organismos
principiantes. Todavia, a simples defesa das leis trabalhistas já era
suficiente para inquietar setores do patronato, que se manifestavam na
imprensa e nas câmaras municipais. Isto ocorreu com a União dos
trabalhadores de Maringá que, acusada de “comunista”, enfrentava
dificuldades em obter recursos do governo municipal. E seus membros
camponeses eram definidos como “caipiras, ignorantes e bêbados”. A UGT
se queixava de O Jornal: um “pasquim” que “combatia os trabalhadores e
suas organizações” e “só defendia aqueles que mais podiam pagar”. De
fato, o dono do jornal havia solicitado ao DOPS do Paraná uma lista dos
comunistas “infiltrados” na União. Por seu lado, a polícia local, sob pressão

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 17 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

de seus superiores e das elites, também se inquietava. A polícia de Maringá


pretendia fazer uma “batida total” na sede sindical. Em Campo Mourão, os
policiais foram encarregados de obter da UGT “as informações necessárias
sobre seus dirigentes e também de suas atividades”.
Assim como no conflito de Porecatu, Londrina mais uma vez teve o
papel irradiador. Graças à iniciativa dos comunistas, a União Geral de
Trabalhadores daquela cidade foi a primeira a ser fundada. José Rodrigues
dos Santos - quadro do PCB na época - conta, no entanto, que esta UGT se
limitava a atividades de lazer(entrevista 4).
À moda de Londrina, em 8 de abril de 1956, Maringá cria sua União
Geral de Trabalhadores. José Rodrigues muda-se expressamente de
Londrina para Maringá e torna-se o primeiro presidente da entidade. Prova
de seu sucesso, 10 meses após, a UGT já contava 1.571 filiados. Por volta
de 1957, sob o comando de Antônio Mendonça Conde, uma extensão da
organização foi fundada na cidade vizinha de Mandaguari (entrevistas 5 e
4).
A União de Campo Mourão teve importância não desprezível. Criada
em 14 de fevereiro de 1960, ela chegou a atingir “alguns milhares de
membros”.(entrevista 3)
Pouco a pouco, estes organismos ecléticos vão se espalhando pelo
norte, mas igualmente em direção à região oeste do estado. É deste modo
que surgiram UGTs também em Cabirú, Nova Esperança, Paranavaí, Loanda,
Goioerê, Querência do Norte e Cascavel (entrevista 3).
O balanço que se pode fazer destas Uniões é positivo, concluiu
Moacyr Ferraz, um de seus principais animadores. Graças ao largo campo
de atividades destas entidades, os sindicalistas tiveram a chance de
“tomarem consciência de vários problemas de muitas categorias
profissionais”. Portanto, a diversidade de categorias sócio-profissionais e de
camadas sociais, mais que fonte de problemas, representava uma
oportunidade de interconhecimento. Com relação ao desenvolvimento
regional, a UGT de Campo Mourão teve “um papel muito importante”,
“tranqüilizando a população”, estabilizando “até um certo ponto” a região.
Os agricultores puderam plantar, colher seus produtos sem excessivas
dificuldades. Assim, o município pode “florescer e crescer”(entrevista 3).
Na ausência de uma orientação nacional precisa do Partido
Comunista, seus militantes locais eram obrigados – ou tinham a chance –
de se virarem sozinhos. Estes momentos de autonomia e de criatividade

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 18 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

dos militantes do Paraná é que permitiram o surgimento das UGTs. Também


é verdade que, durante os anos 50, o Partido não possuía uma política clara
voltada para o campo. Os comunistas dispunham somente de palavras-de-
ordem gerais e genéricas como “criar associações, ligas, uniões, sindicatos
e etc.”. Assim, tudo leva a crer que as “uniões gerais de trabalhadores”
foram um fenômeno específico do Paraná, pois não observou-se modelo
similar de organização em outras regiões do país.
É preciso salientar ainda que, sob uma aparente homogeneidade,
cada União tinha uma maneira singular de se inserir na sociedade, sujeita
às pressões das forças políticas locais, de sua base social e das
características de suas lideranças.
A título de exemplo e de maneira esquemática, comparemos as
práticas das UGTs de Londrina, Maringá e Campo Mourão. Enquanto a
primeira se consagrava essencialmente à diversão e ao congraçamento de
seus associados, a segunda cobrava a aplicação das leis trabalhistas e a
terceira se envolvia seguidamente em conflitos mais graves pela posse da
terra. O presidente desta última União se pronunciava contra as “posições
radicais como a luta armada”, explicando que a sua “luta passava pela
organização legal” dos camponeses, mas “não era legalista”. Este discurso
parece contraditório com relação às posições radicais efetivamente
assumidas pela UGT de Campo Mourão. Porém, é preciso assinalar,
primeiro, que esta organização viveu o ambiente político do início dos anos
60, muito mais conflituoso do que nos anos precedentes; segundo, nos
arredores de Campo Mourão a luta pela terra era mais acentuada que nas
regiões mais ao norte do estado (entrevista 3). Portanto, da primeira à
terceira entidade, é visível o crescimento do radicalismo das práticas
políticas.
Ao constituir estas organizações, o Partido Comunista reatava seus
laços construídos, desde a guerrilha de Porecatu, com os camponeses e os
trabalhadores rurais. Ao mesmo tempo, o Partido tentava estabelecer uma
aproximação com outros grupos sociais oprimidos. Em que pese as
limitações impostas pela clandestinidade (o PCB era considerado ilegal), os
comunistas buscavam se afirmar enquanto uma força emergente na
política paranaense. A formação das “uniões gerais de trabalhadores”,
devido a sua composição social heterogênea, significava o início da
construção de uma concepção política da expressão “trabalhadores”. Era a
primeira vez que os comunistas utilizavam do conceito de “classe

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 19 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

trabalhadora” de uma maneira mais sistemática, para designar o conjunto


dos grupos sociais desfavorecidos, urbanos e rurais. Esta concepção
genérica de “trabalhadores” não fazia ainda parte de uma política
deliberada. Porém, ao longo do processo de desenvolvimento do
sindicalismo, a palavra “trabalhadores” ganhará uma conotação política
globalizadora, primeiro através do discurso do PCB, depois será incorporada
pelo governo, para em seguida “cair na boca do povo” se legitimando
socialmente.
Até o golpe militar de 1964, as UGTs provocarão todo o tipo de
oposição: da repressão oficial dos militares à repressão oficiosa de grupos
para-militares, da reação patronal à contra-ofensiva da Igreja. Algumas
Uniões desapareceram mesmo antes de 1964. A medida que sindicatos
específicos eram criados nas diferentes categorias profissionais, estas
categorias eram desligadas da UGT. Assim, estes organismos sindicais
polivalentes davam lugar, progressivamente, ao sindicalismo por ramo de
atividade. Deste modo, seguindo as ligas camponesas, mas com uma
postura menos radical, as “uniões gerais de trabalhadores” contribuíram
para o enraizamento comunista no norte do Paraná, arregimentando os
‘trabalhadores” do campo e da cidade. Além disso, as UGTs permitiram a
formação de um novo grupo de lideranças comunistas – pós-Porecatu – dos
quais uma parcela será de origem camponesa. Ao mesmo tempo, as Uniões
irão constituir uma base sólida para a criação, em escala mais ampla, dos
sindicato rurais.

Os sindicatos comunistas no Paraná


No Paraná, até meados dos anos 50, não existiam sindicatos de
pequenos agricultores e de assalariados rurais. Entretanto, os problemas
sociais no campo eram inúmeros: grilagem de terras, não observância das
leis trabalhistas, desrespeito aos contratos de arrendatários e parceiros,
violências de toda a sorte. Nas fazendas, imperava “realmente a
escravidão”, dizia um sindicalista. O ambiente de insatisfação favorecia o
“Partidão” que, pouco a pouco, via aumentada a sua audiência junto à
população rural. Já em 1952, quando o médico Dirceu Galli aderiu ao
partido em Maringá, este já “tinha se infiltrado no campo” de maneira
considerável (entrevistas 6 e 5). Paralelamente, as “uniões gerais de
trabalhadores” ganhavam importância. Isso, em reação aos ataques e à

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 20 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

coação constante imposta pelos grupos dominantes ou diretamente pelos


órgãos de repressão.
Contudo, as UGTs tornavam-se, progressivamente, muito pequenas e
pouco ágeis para enfrentar ao leque de demandas crescentes. Sem tardar,
os militantes comunistas tiveram que desmembrar as “uniões de
trabalhadores”. Segundo Gregório Parandiuc, antigo militante, o sindicato
era uma necessidade:

“Naquela época, tínhamos necessidade do sindicato, por que ... o


cara pegava o trabalho, não tinha nenhum contrato ... era oral, isto
trazia problemas”. (entrevista 1)
Assim nasceram os primeiros sindicatos de lavradores e de
trabalhadores agrícolas do estado do Paraná que, certamente, figuraram
entre os primeiros sindicatos camponeses criados no Brasil. Eles darão
impulso a uma formidável onda de sindicalização que invadirá, no início dos
anos 60, o meio agrícola brasileiro.

Londrina e Maringá: os precursores


Após os episódios de Porecatu, o PCB não tardou a retomar sua
atividade política na região, e a cidade de Londrina manteve-se sempre
estrategicamente como sua base de comando. Aqui e acolá ocorreram
algumas substituições de militantes comunistas, mas os líderes da época
do conflito, sediados em Londrina, como Newton Câmara, Manoel Jacinto e
Flávio Ribeiro, permanecerão à frente do movimento de organização no
campo.
Nesta época, o PCB encorajava os assalariados das fazendas a lutar
por uma remuneração em dinheiro, opondo-se ao “boró”, espécie de vale
cunhado pelo fazendeiro, aceito unicamente dentro daquela fazenda. O
trabalhador não podendo, gastar o “boró” em outro lugar, via-se obrigado a
fazer todas as suas compras no armazém do proprietário.
Trabalhando na fazenda Eldorado, nos arredores de Londrina, José
Rodrigues dos Santos estava na linha de frente do Partido na zona rural.

“Em Eldorado nós já tínhamos feito um movimento ... uma greve


contra o boró ... Os Esguario, eles utilizavam o boró ... Eles pagavam
10%, 20% ao pessoal, de 90 em 90 dias, e todo o resto era em
bônus. Então, nós começamos uma luta contra o boró ... nós
cuidávamos de um milhão de pés de café ... No dia do pagamento,
eles só pagavam em boró ... Eu mobilizei as mulheres, não os
homens! Eu reuni doze delas e dei um soco no balcão. Elas saltaram
para trás do balcão, deste jeito, e o senhor Raul foi obrigado a pagar

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 21 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

em dinheiro. Um pouco em boró, um pouco em dinheiro. Um pouco


de boró, um pouco de dinheiro.”(entrevista 4)
Em seguida, José dos Santos mudou-se para a Fazenda Santa
Helena, onde ele dirigiu uma outra mobilização:
“Eu organizei um movimento ... por melhores condições de vida. Não
deixavam a gente plantar, cortavam as plantas ... melancia, abóbora,
tomate, todas aquelas que cresciam no cafezal. O fazendeiro não
deixava ... Um dia, eu cheguei ... os colonos estavam reunidos para fazer
uma limpeza, para cortar todas as coisas ... Eu era empreiteiro da
fazenda ... Eu disse: ‘Aquele que não luta contra isso, contra esse
absurdo ... não é digno de ser pai de família’. ... Eu revolucionei o pessoal, o
pessoal se agitava ... Então, dois colonos puxa-saco ... contaram (ao
proprietário) ... À noite, ele foi à minha casa: ‘Você quer comandar a minha
fazenda?! Promover a agitação?!’ ‘Não, a fazenda é sua, mais eu quero
respeito’. Ele tentou me convencer que isto, a Reforma Agrária que eu
pregava, que ela não ia dar certo, ... que não tinha resolvido nada no
México, na China, na Rússia ... que eu me confundia ... Eu disse: “O.K., esta
é a sua idéia, mas a minha é que a idéia da Reforma Agrária é válida”. Eu
me livrei ... e um dia eu pedi demissão.”(entrevista 4)
Todavia, em pouco tempo, devido à coação dos fazendeiros, este
militante se viu obrigado a deixar o trabalho agrícola, e foi se estabelecer
na cidade, em Londrina. Mas o campesinato permaneceu seu setor de
atuação. Afim de não perder o contato com a população rural, José
Rodrigues percorria as fazendas, vendendo remédios, roupas, fazendo
fotografias, distribuindo panfletos e jornais.(entrevista 4)
A partir deste trabalho político no campo, os comunista de Londrina
deram mais um passo para organizar os trabalhadores da agricultura. Desta
vez, pretendia-se arregimentar estes trabalhadores em um organismo
autônomo, de forma independente dos grupos sociais urbanos. Assim, em
29 de janeiro de 1956, no Cine Avenida, os militantes do PCB convocaram a
população pobre do campo para a fundação do Sindicato dos Colonos e
Assalariados Rurais de Londrina. Mais de dois mil trabalhadores
responderam ao apelo. “Algumas pessoas ficaram do lado de fora”. Para a
direção da entidade foram escolhidos: José Onofre Borges, para presidente;
Valdevino Madeira, para secretário; Odilon Martina, para tesoureiro; Manoel
Jacinto Corrêa, para presidente do conselho fiscal; Miguel Tostaresli e José
Pereira da Costa, como membros do conselho fiscal. (entrevista 4)

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 22 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O Cine Marabá teve que ser alugado por oito meses para sedear as
reuniões, daquele que seria o primeiro sindicato de lavradores e
assalariados rurais do Paraná (e o sexto do Brasil). Segundo a polícia, a
cidade de Londrina tornava-se o local de reuniões de “colonos revoltados”,
que recebiam “instruções para a luta de classes contra os patrões”. Em
apenas 6 meses de existência do sindicato, atingiu-se a cifra extraordinária
de 18 mil filiados. Ônibus lotados de colonos das fazendas de café
chegavam ao sindicato. Filas de 200 a 300 pessoas se formavam para
aderir ao sindicato. 10 a 12 pessoas eram necessárias para fazer as
filiações. Não havendo concorrentes, este sindicato logo extrapolou os
limites de Londrina, transformando-se em sindicato agrícola de toda a
região norte (entrevistas 4 e 5). As elites mais alarmistas falavam em
40.000 trabalhadores sindicalizados:

“Começa então uma loucura generalizada. Das terras dos municípios


de Ibiporã, Sertanópolis, Bela Vista do Paraíso, Cambé, Rolândia,
Arapongas, Apucarana, centenas de pessoas, diariamente, dirigiam-
se à Londrina. São os colonos que querem filiar-se no ‘sindicato’”.
Sem tardar, outros lugares seguiram o exemplo de Londrina. Neste
momento, Maringá já dispunha de uma União Geral dos Trabalhadores. Os
100 km que a separam de Londrina foram percorridos rapidamente e o
sindicalismo invadiu as fazendas e os sítios, os cafezais e os canaviais. Em
poucos meses, o setor dos trabalhadores agrícola se separou da União.
Assim, ainda no ano de 1956, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Maringá foi fundado, sendo o primeiro, de uma longa série, com esta
denominação. O conceito globalizador de “trabalhador”, já utilizado pelas
UGTs, foi aqui retomado. Deste modo, a expressão “trabalhadores rurais”
abrigava todas as camadas da sociedade rural, excluindo-se é claro os
fazendeiros. Aos poucos, esta noção excessivamente abrangente de
“trabalhador rural” foi se institucionalizando, tornando-se praticamente
consensual, sendo incorporada ao vocabulário sindical e mesmo
governamental.
Uma reunião de aproximadamente 180 pessoas, no Cine Horizonte,
formou uma comissão provisória para a direção do sindicato, tendo como
presidente Chico - um assalariado agrícola. Contudo, neste momento o
jovem sindicato agrícola de Maringá ainda estava vinculado à UGT,
dividindo o mesmo teto. Durante 3 meses, a primeira diretoria, foi
composta por Manoel Barreto, Zé Seguro, Gregório Parandiuc e Barbosa,

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 23 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

liderados por José Rodrigues dos Santos - deslocado de Londrina e até


então presidente da UGT. (entrevistas 1, 2 e 4)
Sob à direção do Partido Comunista, o sindicato nasceu graças à
iniciativa de Bonifácio Martins, um militante local e pequeno comerciante
de vestuário. Apesar desta obediência ao partido, a entidade se pretendia
aberta em termos de religião e política. Embora não comparável ao caso
de Londrina, o sindicato de Maringá passou por um crescimento bastante
acentuado, logo contando com 4 mil sindicalizados, tornando-se em 1961
“a mais forte organização rural do Paraná”. (entrevista 7)
O maior empreendimento do sindicalismo comunista em Maringá foi
sem dúvida o Palácio Sindical. Tratava-se de um local para o encontro de
sindicalistas, reuniões, eventos, produção cultural, discussão ideológica e,
sobre tudo, para a afirmação política frente aos adversários. Fundado em
1963, sob o comando de José Rodrigues, o Palácio era apoiado por “todos
os sindicatos legalizados de Maringá” - “13 ou 12 organizações”. Entre
estas contava-se os sindicato dos trabalhadores rurais, dos empregados do
comércio, dos bancários, dos trabalhadores da construção civil, dos
ensacadores e carregadores de café, dos metalúrgicos, a associação dos
cabeleireiros e a associação das mulheres. Porém, no dia primeiro de abril
de 1964, os militares fecharam o Palácio dos sindicalistas, pondo fim ao
sonho comunista de união sindical: “reunir, juntar todo o mundo, para
começar a falar a mesma língua”. (entrevistas 7, 4 e 5)

A proliferação dos sindicatos


A onda de formação de sindicatos que se iniciou em Londrina e
Maringá logo alcançou outros municípios como Nova Fátima, Cornélio
Procópio, Apucarana e Centenário do Sul. Afastado a apenas 50 km, o
Sindicato dos Colonos e Assalariados Agrícolas de Nova Fátima, conforme o
nome indica, era praticamente uma extensão daquele de Londrina. Sob a
presidência de Manoel Carlos de Souza, a entidade de Nova Fátima contava
com Manoel Janjão Filho e Vítor Volpi para o trabalho de propaganda nas
fazendas.
Localizado na região que tinha sido atingida pela guerrilha de
Porecatu, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Centenário do Sul,
fundado ainda em 1956, provavelmente seja uma herança do movimento
de guerrilha. Contudo, esta organização não resistiu aos desafios da
conjuntura e desapareceu, para ressuscitar em 26 de maio de 1963.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 24 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Naquele dia, uma assembléia formal reuniu-se para solicitar o


reconhecimento do sindicato pelo Ministério do Trabalho. Cerca de 90
pessoas aprovaram um estatuto para a entidade e elegeram uma diretoria
provisória, integrada por: Regino Alves de Almeida (presidente), Sebastião
Júlio da Costa (secretário), Armando de Souza (tesoureiro), Juvenal de
Oliveira, Joaquim Lopes Sobrinho e João Siqueira de Oliveira (membros do
Conselho fiscal).
Em 1961, chegou a vez do município de Mandaguari. Antônio Conde,
então encarregado da UGT de Mandaguari e presidente do sindicato
agrícola de Maringá, cedeu este posto a José Rodrigues, para ficar
disponível para a fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Mandaguari e tornar-se seu presidente (entrevista 54). Antônio Soares
assumiu a secretaria da organização. O crescimento desta entidade foi
bastante peculiar. O padre da Igreja local - com de resto toda a Igreja
Católica do Paraná daquela época - combatia abertamente os comunistas e
seus sindicatos. Mas, em Mandaguari, a pregação católica não conseguiu
desencorajar a população e, até mesmo, acabou curiosamente estimulando
a adesão dos adventistas ao sindicato.(entrevista 5)
Em seguida, os sindicalizados do município de Jandaia do Sul, que
antes estavam ligados ao sindicato de Mandaguari, separaram-se deste e
criaram sua própria organização, em 16 de setembro de 1962: o Sindicato
dos Trabalhadores Rurais (STR) de Jandaia do Sul. No dia 11 de março do
ano seguinte, Agenor Messias da Silva (presidente), José Sonni e João
Soares Filho foram escolhidos para a primeira diretoria efetiva da entidade.
Normalmente, a representação local do PTB decidia sobre a composição da
diretoria. Pouco a pouco, esta colaboração entre comunistas e trabalhistas
irá se estreitar ainda mais. (entrevista 5)
Portanto, o sindicato de Londrina fracionou-se dando origem ao de
Maringá, que por sua vez levou à formação daquele de Mandaguari, este
último resultou no sindicato de Jandaia do Sul... e assim por diante.
Rapidamente, as organizações sindicais multiplicaram-se em todas as
direções nestas terras rochas do norte do Paraná até atingir, segundo José
dos Santos, a cifra de 86 sindicatos de agricultores e assalariados rurais
fundados pelos comunistas, às vésperas do golpe militar em março de
1964. Além do sindicalismo agrícola, os militantes rurais do PCB também
estimularam a criação de cerca de 100 sindicatos de outras categorias de
trabalhadores, especialmente urbanos. (entrevistas 8, 7, 4 e 3)

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 25 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O êxito do sindicalismo de inspiração comunista, no entanto, foi


duramente criticado por seus adversários políticos, principalmente pela
Igreja Católica. Apesar de reconhecer a vitória dos comunistas na corrida
pela sindicalização no Paraná, os cristãos os acusavam de terem se
utilizado de métodos fraudulentos. Assim, segundo os católicos, para a
fundação dos sindicatos, eles reuniam “20 ou 30 pessoas” que, às vezes,
nem pertenciam à localidade. Eles criavam vários sindicatos de uma só vez:
“agora eles estão em Jandaia, daqui há três horas estarão em Cambira” e
assim por diante. Conta a Igreja que, das assinaturas coletadas durante a
assembléia, “70% eram falsificadas”. Para uma reunião de 70 ou 80
pessoas, eles declaravam a presença de 700 participantes. (entrevistas 9,
10 e 11)
Com o objetivo de valorizar a sua organização, os sindicalistas do
PCB informavam ao Ministério do Trabalho que esta continha: advogado,
hospital, médicos, equipamentos de raios X, armazém de sementes,
farmácia, ambulância e “mais mil coisas”. Na verdade, não dispunha de
nada, nem mesmo “a sombra disto”. Portanto, aos olhos dos filhos de Deus,
este órgão não passava de um “sindicato de malandros, não autêntico”.
(entrevistas 9, 10 e 11)

Sindicato de trabalhadores rurais, direção de pequenos proprietários


A composição da base social desta primeira geração de sindicatos
rurais do Paraná mostrava-se muito parecida de uma entidade para outra.
De forma geral, estes organismos sindicais - apesar das diferentes
denominações - apresentavam-se como representantes de todos aqueles
que viviam em sua região e se enquadravam na grande categoria dos
“trabalhadores rurais”. Resultado: a base do sindicato era extremamente
heterogênea, compreendendo ao mesmo tempo assalariados agrícolas de
todos os tipos, posseiros, meeiros, pequenos arrendatários e pequenos
proprietários. O que poderia levar a pensar que as diretorias sindicais
também fossem igualmente heterogêneas. Nada disso. Desde a sua
criação, o sindicalismo rural do Paraná se apresentou composto por um
corpo de sindicalizados diversificado sob uma direção, mais ou menos
homogênea, de pequenos proprietários de terra. Ou seja, uma organização
com uma base heterogênea comandada - ou dominado - por um grupo de
proprietários. Cena comum no norte do estado: enquanto o assalariado
dava duro nos cafezais, seu representante sitiante defendia “seus

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 26 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

interesses” e “seus direitos” enfiado no sindicato dos “trabalhadores


rurais”. Fato que, com algumas variações, se repete até os dias de hoje.
Em 1960, a base potencial do sindicalismo rural do norte do Paraná
era constituída aproximadamente de 25 % de pequenos proprietários (de 0
a 50 ha), 0,6 % de posseiros, 4 % de meeiros, 9 % de arrendatários e 61 %
de assalariados. Porém, esta composição nunca se reproduziu nas diretorias
sindicais. A justificativa para isto era, de um lado, que a propriedade
agrícola - ainda que pequena - funcionava como uma espécie de
retaguarda, deixando o sitiante mais independente, mais à vontade, mais
livre para as tarefas sindicais; por outro lado, estes pequenos proprietários
seriam mais interessados e dedicados ao sindicalismo, graças as suas
melhores condições econômicas e culturais. Vejamos o caso de Maringá:

“o sindicato decolou, começou a sua caminhada... quando eu tomei a


direção, porque eu tinha o apoio dos pequenos proprietários. Na
diretoria, eu era o único assalariado. O resto era tudo proprietário ....
nossa diretoria era uma diretoria de pequenos proprietários. Isto
fortaleceu, isto viabilizou ... e ... deu vida ao sindicato. Porque ele (o
pequeno proprietário) não se deslocava. E tinha muito interesse em
aprender e nós tínhamos muitas coisas a ensinar... Ele tinha também
interesse de ensinar aos seus filhos”. (entrevistas 7 e 4)
Mais do que uma distância econômica em relação ao restante dos
trabalhadores rurais, estes dirigentes sindicais pertenciam a um grupo
social específico, diferente do conjunto da maioria dos associados. Estas
diferenças entre a condição social da base e a direção do movimento trazia
consigo outras diferenciações importantes em termos dos interesses
imediatos, das estratégias políticas ou mesmo dos projetos ideológicos.
Entretanto, estas diferenças sociais no seio do sindicato comunista não
chegaram a ter tempo de colocar-se como um problema para este
sindicalismo nascente. O golpe do 1964 interrompeu o desenvolvimento
destas organizações.

Sindicato rural, modelo urbano


Quando este sindicalismo se instalou nas áreas rurais, os comunistas
brasileiros não levaram suficientemente em conta as particularidades do
meio rural. Tudo indica que as peculiaridade do meio ambiente e as
características próprias das camadas sociais do campo não estimularam
uma discussão mais aprofundada, nem tomadas de posição específicas
sobre o assunto dentro do Partido. Assim, o PCB aplicou, sem modificações,
a receita de sindicalismo que já vinham implantando há algum tempo nas

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 27 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

grandes cidades. Desde a sua constituição, estes sindicatos rurais foram


marcados por características urbanas, quer na sua estrutura, nas suas
ações, quer no seu programa político. Esta falta de inventividade, inércia ou
conservadorismo podem ser atribuídos a um conjunto de fatores. Antes de
mais nada, o “Partidão” se pretendia herdeiro da tradição marxista-
leninista, onde a classe operária industrial desempenharia o papel
dirigente, no quadro de uma “aliança operário-camponesa”. Daí decorrem
julgamentos depreciativos em relação aos camponeses, considerados como
embrutecidos, ignorantes e ingênuos, como “batatas em um saco” (MARX
em “O 18 Brumário”). Além disso, após a revolução do 1930, vivia-se no
país um ambiente político de sobrevalorização do urbano - o novo, o
moderno, o cosmopolita, o progressista – em detrimento do rural. Outro
fator é que a maioria dos dirigentes do Partido no Paraná, como nos outro
estados, era de citadinos. Por fim, é bom lembrar que este sindicalismo
rural nasceu das “uniões gerais dos trabalhadores”, que eram ecléticas e
urbanas. Imitá-las, portanto, parecia “natural”, “lógico”, quase que
obrigatório.
Assim, estes sindicatos “rurais” apresentavam uma estruturação
interna, os postos de direção, a divisão das tarefas, os mecanismos de
representação, de eleição, de consulta dos associados semelhante ao
movimento operário. Mais à frente, estes traços urbanos serão reforçadas
pela intervenção do Governo, que imporá uma estrutura sindical segundo o
mesmo modelo.
As datas “históricas” do proletariado industrial eram sempre motivo
para comemoração no sindicalismo rural. O calendário do movimento
operário era utilizado como referência obrigatória. Assim, a partir de 1956,
em coerência com suas “origens proletárias”, os jovens sindicatos de
Londrina e Maringá participavam nas festas do Primeiro de Maio. Originadas
pelas mesmas práticas sindicais citadinas, as greves eram propostas - e às
vezes seguidas - nas áreas rurais: greves localizadas nas fazendas, como
aquelas que ocorreram nas propriedades da família Moreste (Mandaguaçu,
1963), contra o atraso de cinco meses nos pagamentos; greves de longa
duração como na fazenda São José, dos irmãos Moreschi - “latifundiário, os
mais terríveis da região” - (Maringá, em 1963), que durou mais de 50 dias;
greves gerais, como aquela organizada em 1957, por ocasião da colheita do
café. (entrevista 5)

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 28 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Nos anos 50, apesar da sua determinação em se implantar no meio


agrícola, o “Partidão” ainda continuava sendo essencialmente um partido
urbano e fracamente enraizado nas “massas populares”. Em 1953, segundo
a opinião cáustica do jornal conservador francês “Le Figaro”, o comunismo
brasileiro não passava de um “comunismo de colarinho branco” e seus
militantes seriam “revolucionários de salão”. Nas reuniões do PCB, alguns
dirigentes do Paraná reconheciam que o Partido visitava os bairros
populares somente “em dia de eleição”. Segundo os militantes, em
Maringá, o partido “era só de cúpula” e, em Londrina, haviam “9 pequeno-
burgueses para cada operário”. Em conseqüência, o Partido sequer
distinguia seus militantes rurais dos não-rurais. Na falta de efetivos de
origem camponesa, freqüentemente quadros de classe média urbana
chefiavam ativistas do campo. Em Maringá, os médicos Salim Haddad e
Dirceu Galli participavam das reuniões públicas do sindicato dos
“trabalhadores rurais”. Em Londrina, o também médico Newton Câmara
desempenhava um papel parecido. Muitas vezes, as assembléias de
fundação dos sindicatos eram dirigidas por citadinos, este foi o caso de
Centenário do Sul (entrevistas 7 e 10). Esta prática paternalista do urbano
mais à vontade frente ao rural tido como menos preparado, marcará
significativamente o sindicalismo brasileiro até hoje.

O assistencialismo
Desde o seu nascimento, o sindicalismo rural brasileiro dará muita
atenção à prestação de serviços para os filiados, de vários tipos, entre os
quais mereceu uma posição de relevo a assistência à saúde. O
“assistencialismo”, espécie de benevolência sindical, será a marca
registrado dos sindicatos pós-64. A falta de uma estrutura estatal de
seguridade social, a ausência de uma responsabilidade formal neste
sentido por parte dos empregadores, aliada ao precário poder aquisitivo
dos lavradores, resultaram num acesso difícil – para muitos, impossível –
aos serviços de saúde (médicos, hospitais, ambulatórios e dentistas). A tal
ponto que a ampliação da seguridade social para o pessoal da agricultura
constituiu uma das primeiras reivindicações do recém-nascido sindicalismo.
Na ausência de uma resposta positiva, em pouco tempo o sindicato tratou,
ele mesmo, de preencher esta lacuna. Talvez isto não passasse de uma
medida temporária, mas logo se revelou um excelente meio para atrair
agricultores e assalariados para o sindicalismo. Assim, para além da “luta

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 29 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

reivindicativa”, gabinetes médicos e odontológicos foram instalados nos


sindicatos; foram assinados convênios com hospitais, médicos e dentistas.
Em Maringá, pelo menos três médicos, Dirceu Galli, Salim Haddad e
Osvaldo Alves, trabalhavam para o sindicato. Dirceu Galli conta que
oferecia consultas, cuidava dos doentes, assistia a partos: “a minha clínica
já era um órgão do sindicato .. e tudo era gratuito”. Da mesma forma, o
médico Salim “assistia às pessoas que precisavam”, “os agricultores”, na
sua clínica. Até 1964, o sindicato de Maringá tinha patrocinado em torno de
1800 consultas médicas para os filiados (entrevistas 7 e 6). Os sindicatos
comunistas foram, portanto, os iniciadores destas práticas assistenciais.
Dez anos depois, esta atividade ganhará em importância, chegando a
transformar as organizações sindicais em meros escritórios de prestação de
serviços para os associados.

Os congressos camponeses do Paraná


A partir de 1960, numa demonstração de força política, o
sindicalismo rural comunista preparou reuniões de âmbito estadual. Ora,
pela primeira vez se promoviam encontros – contando com a participação
efetiva de lavradores e de trabalhadores rurais oriundos de diferentes
pontos do Paraná - com o objetivo de discutir assuntos de seu interesse.
Desta forma, foram organizados dois “congressos dos trabalhadores
rurais”, primeiro em Londrina e em seguida em Maringá. (entrevista 5)
De 5 a 7 de agosto de 1960, o Sindicato dos Colonos e Assalariados
Agrícolas de Londrina - com a colaboração de Maringá – realizou aquele que
ficou conhecido como o “Primeiro Congresso dos Trabalhadores Rurais do
Paraná”. “Um dos maiores eventos na vida sindical e rural” do Brasil -
segundo um dos organizadores -, o conclave reuniu 307 “trabalhadores
rurais” inscritos, representando os assalariados, os meeiros, os
trabalhadores de empreitada e os posseiros de mais de 200 fazendas do
estado. Entre os convidados estavam presentes “algumas autoridades” e
“alguns camponeses de Pernambuco das famosas ligas camponesas”, entre
os quais seu número um, Francisco Julião em pessoa, símbolo indiscutível
da relevância da reunião. (entrevistas 4 e 5)
Divididos em cinco comissões, os congressistas debateram sobre: o
“regime feudal”, que grassava nas áreas rurais; salário mínimo; férias;
aviso prévio em caso de demissão; descanso semanal remunerado;
ausência de uma legislação trabalhista completa e adequada à vida rural;

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 30 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

direito à previdência social. Eles demandavam o acesso ao crédito para os


agricultores sem terra, o desenvolvimento da indústria de tratores e de
implementos agrícolas, preço mínimo para seus produtos, reforma agrária e
o reconhecimento dos sindicatos por parte do Ministério do Trabalho. Nessa
época, nenhum sindicato rural do Paraná havia sido legalizado pelo
Governo. Fato revelador da obediência às diretrizes comunista, foram
incluídas reivindicações patrióticas como: uma política nacionalista,
dinâmica e desenvolvimentista, visando libertar o país do “imperialismo
internacional e escravista” e a defesa da Petrobrás, da Eletrobrás e das
riquezas minerais. Em resumo, segundo um porta-voz comunista, “a
consciência e o valor da classe camponesa” foram reafirmados.
O “Segundo Congresso dos Lavradores e dos Trabalhadores Rurais
do Paraná” ocorreu em Maringá, de 12 a 15 de agosto de 1961. Mais de
dois mil delegados eleitos estavam presentes.(entrevistas 1, 4, 5 e 10 )
Entre os convidados, participaram o senador Nelson Maculano, os
deputados federais Josué de Castro e José Silveira, os deputados estaduais
Leo de Almeida Neves, Amaury de Oliveira e Silva e Valdemar Daros, o
presidente da Associação dos Produtores de Café do Paraná (Roberto
Celidônio), o juiz de Maringá, o presidente da União dos Estudantes do
Paraná e representantes de “todos os sindicatos” do estado, da ULTAB, do
PSB (general Agostinho Pereira), do Conselho Municipal de Maringá (Arion
Ribeiro de Campos), da “quase totalidade” da imprensa e inclusive da ONU.
A presença deles era um indicador de que o sindicalismo rural de
orientação comunista estava, enfim, conquistando um lugar no jogo político
institucional. Em particular, a participação do Nestor Duarte, representando
o Presidente da República, demonstrava as mudanças – sem dúvida
favoráveis - nas relações entre o Governo Federal e os sindicatos. Sinal
revelador de uma política um pouco mais tolerante em relação à esquerda,
o Presidente Jânio Quadros tinha, recentemente, reatado as relações
diplomáticas com a União Soviética e os “países satélites”. Medida
aplaudida, na ocasião, pelo PCB. (entrevistas 1, 4 e 5)
A presença da figura emblemática de Francisco Julião revelava a
busca de unidade dentro do movimento camponês (entrevista 6). Enfim, o
congresso, sob a presidência de Nestor Vera - dirigente nacional comunista
- demonstrava que o PCB do Norte do Paraná não se constituía em um
braço autônoma do partido, o comando do Comitê Central se fazia
presente, em que pese as fricções e as divergências com os paranaenses.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 31 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O diagnóstico elaborado pelo Congresso não se mostrava otimista:


um Paraná onde o latifúndio dominava ¾ da superfície e onde 80 % dos
camponeses não possuíam terra, era um “barril de pólvora”, sobretudo na
região norte. O deputado Julião tentava dar um tom mais radical ao evento.
Segundo o chefe das ligas do nordeste, “o caminho do Brasil é o caminho
de Cuba”:

“Acredito que nosso lema deva ser: “Reforma Agrária ou


revolução!”... Para as forças reacionárias que infestam o país, é
melhor perder um pouco hoje, do que perder tudo no futuro”.
(entrevistas 4 e 5)
Todavia, para além da exigência de uma “reforma agrária radical
capaz de eliminar o monopólio das terras”, o Congresso cobrava mudanças
nas relações de trabalho como salário mínimo, descanso semanal e férias
pagas.
Entretanto, este teria sido apenas mais um congresso camponês,
não fosse o conflito ocorrido com os fieis da Igreja Católica, o que lhe
conferiu um caráter espetacular. Mas, como por ironia da história - na
verdade expressando uma nova relação de forças política – o evento
promovido pelos comunistas só pode ocorrer graças à ajuda providencial da
polícia militar, sob as ordens do Governo Federal. Apesar das pressões
feitas pela Igreja, o Presidente da República apoiou o Congresso:
“Jânio Quadros nos deu um grande apoio .... Jânio manteve uma
posição correta ... Sem isso, nós não teríamos podido realizado o
congresso! Nos teriam massacrado .... Nós conseguimos colocar a polícia
do nosso lado ... contra os padres .... Não tivemos uma carnificina graças ao
Presidente da República”. (entrevistas 1, 4, 5 e 3)
Assim, contra a vontade dos “servos de Deus” e apoiada pelas
forças de repressão, a reunião conseguiu chegar ao seu final. Este
Congresso representava um momento importante do sindicalismo de
tendência comunista: de afirmação em relação aos adversários políticos; e
de afirmação dos militantes do PCB como porta-voz dos lavradores e dos
assalariados agrícolas presentes. Por extensão, eles pretendiam tornar-se
também representantes dos que ali não estavam, quer dizer, do conjunto
do campesinato paranaense. Mais do que um espaço de reflexão, de
elaboração e de tomada de decisões políticas, este congresso funcionava
como lugar de acumulação de energias, espécie de bateria política.
Olhando-se cara a cara, escutando-se uns aos outro, encontrando aqueles
que os ouviam e os aplaudiam, os sindicalistas saíam do isolamento.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 32 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Momento mágico, a “classe” sonhada e representada tornava-se concreta,


visível e audível. A possibilidade igualmente de entrar em contato direto
com seus “ídolos” políticos transformava esses militantes verdadeiros fãs.
Atribuindo às lideranças todas as qualidades que lhes faltavam, esses
militantes imaginavam preencher suas carências políticas. Desta forma,
podiam voltar para suas casas mais confiantes, mais seguros de si, mais
confiantes de sua missão e de sua boa causa.

A Federação sindical dos comunistas


Os sindicalistas do “Partidão” tinham pressa. Em pouco tempo eles
sentiram o concorrência de outras forças políticas – notadamente dos
católicos -, também desejosos de comandar o campesinato. O PCB, então,
elaborou um plano para fundar sindicatos “em todos os municípios, antes
da Igreja”. Ora, este impulso na sindicalização, somado aos congressos
estaduais permitiram mais um passo rumo à hegemonia no sindicalismo
rural: a fundação da Federação dos Trabalhadores da Lavoura do Estado do
Paraná, no primeiro semestre do 1963. Mais uma vez, tratava-se de uma
iniciativa independente dos militantes do norte do estado: “isto foi por
nossa conta. Depois de ter fundado, nós comunicamos e eles (a direção do
PCB) acharam que estava certo”.(entrevista 5)
A fundação foi simples, discreta e um pouco precipitada. Um
pequeno anúncio nos jornais da capital informava do evento. Em Maringá,
uma modesta reunião de presidentes de apenas 8 sindicatos do norte do
estado decidiu, então, criar a federação sindical, votando seu estatuto e
elegendo sua diretoria: Antônio Mendonça Conde, presidente; José
Rodrigues dos Santos, secretário e Arlindo Pereira da Silva, tesoureiro. Em
seguida, no dia 20 de julho do mesmo ano, aquela que foi, segundo José
dos Santos, “a primeira federação dos trabalhadores rurais do Brasil”
recebia sua carta sindical.(entrevistas 4 e 5)
Porém, a disputa não se limitava a uma concorrência para constituir
sindicatos aqui e acolá. O objetivo final da corrida pela sindicalização
estava na conquista da confederação nacional: “a necessidade, a urgência
da federação tinha a ver com a fundação da confederação... para fazer
número”. Assim, era preciso apressar-se, ter o controle de muitas
federações estaduais, reconhecidas pelo Ministério do Trabalho, afim de
segurar a maioria dos votos no congresso de constituição da confederação.
Então, a razão principal pela criação da Federação do Paraná – de resto,

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 33 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

parecido com o que acontecia em outros estados - não era o interesse local
ou regional. O verdadeiro o objetivo maior era o controle do sindicalismo
rural em termos nacionais.
No entanto, esta Federação, que no plano nacional era muito mais
um instrumento político, não teve a oportunidade de estruturar-se e de
estabelecer-se realmente. O tempo lhe fez falta - o golpe militar abortou
todas as possibilidades de ação. Os limitados esforços voluntaristas do
presidente da Federação que, vendeu seu sítio, mudou-se para Curitiba e
montou uma modesta sede na rua José Loureiro, 133, 17 o andar, revelaram-
se insuficientes. Ele chegou a organizar, em nome da entidade, algumas
reuniões sindicais, como o “1o Encontro dos Sindicatos de Trabalhadores na
Lavoura do Paraná”, em Apucarana; promoveu a fundação de alguns sin-
dicatos; participou de algumas reuniões com empregadores, como a que
teve lugar na Câmara Municipal de Londrina. Mas estas atividades no
interior o impediam de ficar na sede. Deste modo, antes do 1964, a
Federação dos Trabalhadores na Lavoura do Estado do Paraná era quase
sinônimo de Antônio Conde, ele era a personalização da organização.
Testemunho da insipiência deste órgão, Gregório Parandiuc e Salim Haddad,
ex-militantes comunistas de Maringá, hoje nem se lembram mais da
existência da Federação.(entrevistas 1, 7 e 5)

O papel dos advogados


No sindicalismo brasileiro, sempre existiu um personagem, às vezes
enigmático, às vezes carismático, geralmente nos bastidores, mas sem
dúvida central: o advogado. O mito do “doutor”, do “intelectual”, do
“homem que conhece e faz cumprir a lei”, que “enfrenta os patrões”, o
“intocável”, ou até “o profeta”, foi essencial tanto na constituição quanto
no cotidiano do movimento sindical. Lembremo-nos da figura do advogado
Francisco Julião do nordeste do país, bem em evidência naquela época.
Assim, a assistência jurídica tem sido um traço fundamental do sindicalismo
brasileiro. Todos os sindicatos, inclusive os mais modestos, ofereciam - e
ainda oferecem - a seus filiados os serviços de assessoria jurídica, seja por
meio de advogado(s) da própria organização sindical, seja de um
profissional independente. Em geral, o “jurídico” não passava de um
pretexto para transformar o bacharel em mentor intelectual, em
conselheiro ou até mesmo em direção política. Deve-se atribuir este
fenômeno por um lado, ao surgimento de um novo e promissor filão de

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 34 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

atuação para os advogados, abrindo novas perspectivas profissionais,


econômicas e, no limite, políticas (entrevista 7). Por outro lado, às
deficiências de escolarização e de preparo político, por parte daqueles
oriundos do povo do campo, principalmente no início da campanha de
sindicalização.
Não fugindo à regra, a partir das primeiras manifestações do
sindicalismo rural no Paraná, um lugar importante foi reservado aos
advogados, em particular àqueles que tinham ligações com o “Partidão”.
Seus escritórios serviram, ao mesmo tempo, como polo de atração das
camadas sociais dominadas, como local difusor das propostas comunistas e
como organizador da militância. Em Londrina, no centro deste trabalho
político estava Flávio Ribeiro, advogado especialista em direito trabalhista,
tendo adquirido experiência na época da guerra de Porecatu. Ele era “o
advogado dos camponeses”, o homem que lidava com “a defesa do
trabalhador”, se apoiando na Consolidação das Leis do Trabalho e no
Código Civil. A atividade de Flávio Ribeiro incluía o recebimento daqueles
que chegavam das zonas rurais, mas também envolvia incursões suas no
campo, promovendo encontros entre colonos e assalariados nas fazendas
de café.
A área de atuação de Flávio Ribeiro, que contava com um grupo de
auxiliares, cobria vários municípios nos arredores de Londrina. Exemplo
disto, Nova Fátima, onde os advogados Jairo Regis e Raul Santos,
“ostensivamente dirigiam o movimento” do sindicato local.
Outros bacharéis labutaram em favor da “causa dos trabalhadores”
e escolheram como seus redutos outros municípios: Jorge Haddad em
Maringá e Mandaguari; Newton Pereira em Campo Mourão; Osny Rebelo e
Manoel Silva em Porecatu; Manoel Alberto de Azevedo Coelho em Jandaia
do Sul; e Joaquim Monteiro da Nobrega em Nova Esperança. Ainda que o
indivíduo não fosse diplomado em direito, mas o simples fato de dominar o
“jurídico” lhe abria muitas portas, era o mais importante. O contador
Bonifácio Martins era muito valorizado por seus camaradas comunistas
maringaenses, porque ele “sabia mais ... ele conhecia todas as leis”.
(entrevistas 1, 12 e 3)
Por isso a função - muitas vezes política - dos advogados acabou
imprimindo aos sindicatos um ritmo e um estilo de condução bem peculiar,
onde o “jurídico”, o “legal”, “os direitos” tinham uma posição central na
vida sindical. Desde a sua criação, estas organizações foram, portanto,

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 35 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

impregnadas por estes atributos legalistas. A preocupação primeira e a


mais importante era sempre a de satisfazer as leis em vigor, visando a
obtenção do reconhecimento pelo Ministério do Trabalho. A assembléia de
fundação da organização tinha este objetivo principal. Ela era
cuidadosamente preparada, tendo em conta todos procedimentos
determinados pela lei: formas e prazo de convocação, composição da
diretoria, forma de eleição, conteúdo das atas, etc. Por exemplos, em Nova
Fátima, a agenda do dia da assembléia era a seguinte: “autorização para o
reconhecimento do Sindicato no Ministério do Trabalho, da Indústria e do
Comercio, de acordo com a Portaria Ministerial n.º, de 1 de março de 1945”;
em Jandaia do Sul, “reconhecimento do sindicato no Ministério do Trabalho
e da Previdência Social”. Em seguida, os estatutos “discutidos” e adotados
eram freqüentemente a réplica do modelo definido e imposto pelo Governo.
Neste estatuto padrão, a entidade sindical declarava-se favorável à
“colaboração com os poderes públicos”, “à solidariedade social”, a sua
“subordinação aos interesses nacionais” e comprometia-se a “respeitar ... a
lei e acatar as autoridades constituídas”.
Em conseqüência, a atividade diária destas organizações centrava-
se na ação legal. Um caso típico: o Sindicato dos Colonos e Assalariados
Agrícolas de Londrina, desde a fundação se preocupava com as queixas dos
empregados das fazendas contra seus patrões. E foi isto que popularizou o
sindicato. Geralmente os reclamantes expunham seus problemas e
assinavam uma reclamatória trabalhista. Esta reclamatória era preenchido
pelos advogados com as demandas e justificativas e enviadas ao Fórum
local. “Choveram reclamações trabalhistas” nos Fóruns de Londrina e dos
municípios vizinhos. No Fórum de Mandaguari existiam mais de 400
processos abertos pelo sindicato. Mas estas reclamatórias eram na sua
maioria proteladas, arquivadas ou simplesmente recusadas. Segundo um
militante comunista, a Justiça ficava na maior parte dos casos do lado dos
fazendeiros, “por causa do medo”.(entrevistas 4 e 5)
Mas o que importava mais era o fato em si mesmo, com suas
repercussões e seus dividendos políticos e simbólicos. Simplesmente, dado
o volume das reclamatórias, estes processos originalmente jurídicos logo
ganharam uma dimensão política. A recusa sistemática dos tribunais podia
constituir uma munição ideológica para combater a “não independência dos
três poderes” e a “justiça burguesa”.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 36 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

No que diz respeito às reivindicações, os trabalhadores ou - mais


exatamente - os advogados em nome deles, demandavam “o respeito aos
seus direitos” ao salário mínimo, às férias remuneradas, ao décimo terceiro
salário, ao aviso prévio em caso de demissão, ao descanso semanal
remunerado e ao correto preenchimento das cadernetas dos colonos; a
aplicação, ponto por ponto, da legislação trabalhista em vigor, mesmo que
estas exigências eram seguidamente contestadas pelas elites. Em resumo,
reivindicava-se uma legislação trabalhista “completa e adequada à vida
rural”.
A busca de negociação com os empregadores fazia parte do trabalho
destes jovens sindicalistas comunistas. Eles praticavam uma política “de
boa vizinhança”, “não sectária”, segundo eles. Assim, em agosto de 1961, o
sindicato de Maringá assinou o primeiro contrato coletivo de trabalho rural
da região. Naquela tempo, o fato de reunir-se com os representantes dos
empresários, todos “reacionários, terríveis, todos de direita” e o bispo de
Londrina, dom Geraldo Fernandes, era uma verdadeira proeza.(entrevistas
4 e 5)
Também nas mobilizações da base o aspeto “legal”, “os direitos”
eram valorizados. Durante um conflito que surgiu nas terras dos irmãos
Moreschi, o sindicato, por meio de seu advogado, Jorge Haddad,
“cumprindo sua missão”, moveu uma ação de indenização. “Os
trabalhadores” estavam dispostos a deixar a propriedade só depois de
terem recebido “aquilo que eles tinham direito”. Igualmente, “a orientação
e esclarecimentos sobre as leis que protegem os trabalhadores do campo”
ocupavam um lugar central na formação sindical.
Progressivamente, institucionalizava-se um ritual jamais visto no
norte do Paraná: a peregrinação dos senhores da terra ao sindicato ou - pior
- ao Tribunal, que exigia explicações, recriminava, julgava, e de vez em
quando os condenava a pagar seus empregados. Mesmo a Igreja Católica
não escapou deste novo rito. E o fato de conseguir acordos com os
empregadores constituía um indicador de eficácia do sindicato: em
Maringá, até o golpe militar, foram obtidos “mais de 600 acordos através
dos advogados”(entrevista 2).

O domínio sindical comunista


Ao longo dos anos 50 e início dos anos 60, o Partido Comunista
estabeleceu-se efetivamente nos campos e sertões do norte do Paraná. A

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 37 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

guerrilha de Porecatu tinha significado o início da instalação comunista na


região, depois com a formação da formidável rede de organizações
sindicais, o partido enraizou-se nessas terras roxas do Sul do Brasil. O
“Partidão” constitui-se, assim, no elo de ligação entre o movimento de
guerrilha e o posterior sindicalismo. Ainda mais que os simpatizantes e os
militantes comunistas, oriundos do conflito de Porecatu, tiveram um papel
de ponta na constituição das primeiras organizações que pretenderam
arregimentar o campesinato paranaense. No final, esta corrida à
sindicalização foi premiada pelo triunfo dos comunistas sobre as demais
forças políticas, com a fundação da Confederação nacional, a CONTAG. Foi,
portanto, em torno do “Partidão” que se constituiu a primeira corrente do
sindicalismo rural. Para alcançar esta posição, o PCB teve que abandonar a
política radical pregada pelo Manifesto de agosto de 1950, que propunha a
luta armada, e assumir posições mais aceitáveis para a opinião pública,
especialmente aos olhos das elites. Ao mesmo tempo, os marxistas foram
obrigados a fazer concessões em seus dogmas políticos, se adaptando ao
ambiente sociocultural. Também mostrou-se necessária e útil a ampliação
de sua influência junto aos centros do poder. Por meio do “trabalhismo”, os
comunistas conseguiram fazer-se ouvir muitas vezes nas Câmaras
Municipais, assim como estabelecer relações privilegiadas - jamais vistas -
junto ao Governo Federal, em especialmente o Presidente João Goulart e
seu Ministro paranaense, Amaury Silva.
Contudo, sobretudo no início da sindicalização, para vencer a
inércia, os jovens sindicalistas do Paraná tiveram que enfrentar obstáculos
de todos os tipos. As primeiras resistências ao projeto de sindicalização
rural vieram do interior próprio aparelho partidário do PCB. Em seguida, por
ocasião da criação dos primeiros sindicatos (de Londrina e de Maringá), no
momento de fundação da Federação estadual e de escolher a diretoria da
Confederação nacional, aumentaram os choques opondo o Comitê Central
aos militantes do norte do Paraná. Assim, o partido de tradição estalinista,
muitas vezes percebido como um bloco monolítico, desvendou suas
contradições internas. Paralelamente, brotaram inúmeras forças externas
de oposição à ação do Partido. Isto porque, apresentando-se como porta-
voz dos lavradores e dos assalariados agrícolas, os comunistas desafiavam
o poder secular das oligarquias rurais. O PCB procurava, na verdade, apesar
de sua clandestinidade, conquistar um lugar - ainda que minoritário – no
campo político. As classes patronais, sustentadas pelo aparelho repressivo

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 38 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

do governo do estado, obstaculizavam de todas as formas. Mais tarde, será


a Igreja Católica do Paraná, de tendência conservadora, que acorrerá em
auxílio aos grupos dominantes. O clero organizará seu próprio movimento
sindical, com a finalidade de reduzir as baixas em seu rebanho e,
principalmente, para freiar o avanço comunista. Porém, não sem
contradições, o Partido Comunistas soube ultrapassar ou contornar estes
obstáculos que surgiram no seu caminho no Paraná. Constituindo a maioria
dos sindicatos, criando a primeira federação sindical e impondo a fundação
da Confederação nacional, os sindicalistas comunistas derrotaram seus
adversários, em particular os cristãos. Foi, portanto, ao redor do PCB - seja
por sua intervenção direta, seja pelas reações provocadas - que o
sindicalismo rural do Paraná se formou. Assim, o “Partidão” considerava-se
o porta-voz autorizado e inconteste dos “trabalhadores rurais”
paranaenses, e também brasileiros. Porém, o golpe militar de abril de 1964
porá um fim à supremacia comunista no sindicalismo rural, transformando
os sindicatos em meros apêndices do Estado.

Entrevistas Citadas

1 Gregório Parandiuc - ex-diretor do sindicato de Maringá


2 Gregório Parandiuc - ex-diretor do sindicato de Maringá (realizada
pelo Projeto Memória)
3 Moacyr Ferraz - ex-presidente da UGT Campo Mourão (realizada por
Salvador Ferraz)
4 José Rodrigues dos Santos - ex-presidente do sindicato de Maringá
5 Antônio Mendonça Conde - ex-presidente da FETAEP
6 Dirceu Galli – médico e ex-militante comunista de Maringá
7 Salim Haddad - médico e ex-militante comunista de Maringá
8 Tadeu Boddy - assessor da FETAEP
9 José Lázaro Dumont - ex-presidente da FETAEP
10 Pe. Osvaldo Rambo ex-dirigente da FAP
11 Lauro Vilas-Boas - ex-diretor da FETAEP
12 Onofre Pimenta - ex-presidente do sindicato de Nova Esperança)

Bibliografia de Interesse

PRIORI, Angelo. O Protesto do Trabalho: História das Lutas Sociais dos

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 39 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Trabalhadores Rurais do Paraná: 1954-1964. Maringá:Eduem, 1996.


AZEVEDO, Fernando . As ligas camponesas: campesinato e política - 1955-
1964. Recife, PIMES. 1980. 140 p.
BANDEIRA, Moniz. O governo João Goulart : as lutas sociais no Brasil (1961-
1964). 5ª ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. 1978. 187 p.
CHILCOTE, Ronald H. Partido Comunista Brasileiro - conflito e integração -
1922-1972. Rio de Janeiro, Graal. 1982. 413p.
CORRÊA, Hercules. A classe operária e seu partido. Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira. 1980. 247 p.
FERREIRA, Angela Duarte Damaceno. Agricultura capitalista e campesinato
no norte do Paraná. Região de Porecatu 1940-1952. Curitiba, UFPR.
1984. 243 p. (tese de mestrado)
FÜCHTNER, Hans. Os sindicatos brasileiros - organização e função política.
Rio de Janeiro, Graal. 1980. 259 p.
MARTINS, José de Souza. Os camponeses e a política no Brasil. 3ª ed.
Petrópolis, Vozes. 1986. 185 p.
MEDEIROS, Leonilde Sérvolo de. 1989. História dos movimentos sociais no
campo. Rio de Janeiro, FASE.
TONELLA, Celene e outros. As memórias do sindicalista José Rodrigues dos
Santos. Maringá, Eduem. 1999. 108 p.
VERA, Nestor. "O II Congresso camponês em Maringá". Revista Brasiliense.
(37) set-out 1961: p. 62-65.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 40 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Origem e papel dos sindicatos

Altamiro Borges2

Desde a divisão da sociedade em classes, após a superação da


comuna primitiva, a história das sociedades é marcada pela luta entre
explorados e exploradores. Isto ocorreu no sistema escravista, no modo de
produção asiático, no feudalismo e ocorre até hoje no capitalismo. É nesse
último sistema econômico, entretanto, que a luta de classes atinge a sua
plenitude.
O Sindicato, objeto de nosso estudo, é um fenômeno típico
desse sistema. Ele só surge no modo de produção capitalista. A palavra
surge do francês - syndic - que significa “representante de uma
determinada comunidade”. Com a queda do feudalismo na Europa, num
longo processo iniciado a partir do século 17, a sociedade se divide
claramente em duas classes. De um lado, a burguesia, dona dos meios de
produção - instalações, máquinas, matérias primas etc. O termo burguesia
deriva de burgos, que eram as pequenas localidades nos arredores dos
feudos, onde viviam os comerciantes e os artífices - os germes dos futuros
industriais. Do outro, o proletariado, desprovido de tudo, obrigado a vender
a sua força de trabalho aos capitalistas. A expressão proletariado vem do
latim da antiga Roma e designa os cidadãos que viviam à beira da miséria
e que tinham uma prole numerosa.
Lênin, dirigente da revolução russa de 1917, sintetiza de
maneira simples as características desse sistema. “Denomina-se
capitalismo a organização da sociedade em que a terra, as fábricas, os
instrumentos de produção etc., pertencem a um pequeno número de
latifundiários e capitalistas, enquanto a massa do povo não possui
nenhuma ou quase nenhuma propriedade e deve, por isso, alugar sua força
de trabalho. Os latifundiários e industriais contratam os operários,
obrigando-os a produzir tais ou quais artigos que eles vendem no mercado.
Os patrões pagam aos operários exclusivamente o salário indispensável
para que estes e suas famílias mal possam sub-existir. Tudo o que o
operário produz acima dessa quantidade de produtos necessária a sua
manutenção, o patrão embolsa isso: isso constitui o seu lucro. Portanto, na
economia capitalista, a massa do povo trabalha para os outros, não
trabalha para si, mas para os patrões, e o faz por um salário. Compreende-
se que os patrões tratem de reduzir o salário, quanto menos aos operários,
mais lucro lhes sobra. Em compensação, os operários tratam de receber o
maior salário possível para poder sustentar sua família com uma
alimentação abundante e sadia, viver numa boa casa e não se vestir como
2
Jornalista

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 41 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

mendigos. Portanto, entre patrões e operários há uma constante luta pelo


salário”.
É dessa luta cotidiana, inerente ao capitalismo, que surgem as
primeiras formas de organização dos trabalhadores. Elas nascem como
resultado do esforço espontâneo dos operários para impedir ou atenuar a
exploração. Não aparecem por inspiração de “subversivos”, como a
burguesia propaga, mas sim por uma necessidade natural dos que vivem
de salário. Para elevar os seus lucros, o capitalista necessita extrair o
máximo de mais-valia, que é o trabalho excedente não repassado ao
operário na forma de salário.
Essa é a lógica do sistema, em que a concorrência leva os
empresários a uma incessante busca por maiores lucros - com a redução
dos custos operacionais e a elevação da produtividade. Por sua vez, os
trabalhadores têm a necessidade de lutar pela diminuição da taxa de mais-
valia, pelo aumento do seu poder aquisitivo, e por condições humanas de
trabalho. Nessa luta, o operariado conta com a vantagem de se constituir
em grande quantidade.
Para cumprir esse papel, os sindicatos se tornam centros
organizadores dos assalariados, focos de resistência à exploração
capitalista. Num primeiro momento, eles vão congregar os operários das
oficinas e das fábricas, os que produzem diretamente as riquezas - o setor
dinâmico da sociedade capitalista. Posteriormente, com o desenvolvimento
do próprio sistema, eles se generalizam, atingindo outros setores
econômicos. Para Marx, “se os sindicatos são indispensáveis para a guerra
de guerrilhas cotidianas entre o capital e trabalho, são também
importantes como meio organizado para a abolição do sistema de trabalho
assalariado”.
Berço do capitalismo
Os primeiros sindicatos nascem exatamente na Inglaterra -
considerada o “berço do capitalismo”. Foi nesse país que se realizou a
primeira revolução burguesa da história - dirigida por Cromwell, em 1640.
Após muitas marchas e contramarchas, a burguesia se consolidou no
poder, acumulou capital e pode realizar a primeira revolução industrial - no
século 18. O capitalismo inglês vai viver a partir daí um intenso processo
de desenvolvimento, com a superação do trabalho artesanal,
posteriormente da produção manufatureira e, a partir da introdução de
novas máquinas, com o surgimento das grandes fábricas. É nesse
momento, meados do século 18, que o capitalismo encontra plenas
condições para se expandir e virar o sistema predominante.
O desenvolvimento do capitalismo deixará evidente a
contradição desse sistema. Para extrair a mais-valia, fonte dos lucros, a
burguesia inglesa imporá jornada de trabalho que atingiam até 16 horas
diárias. Os salários serão os mais reduzidos e as condições de trabalho, as
mais precárias. Com o objetivo de atrair mão-de-obra livre, ela promoverá

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 42 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

os famosos “cercamentos” no campo, nos séculos 17 e 18, expulsando os


servos das glebas rurais para torná-los “homens livres”, aptos ao trabalho
assalariado. Nesse período, são constituídos enormes contingentes de
desempregados nos centros urbanos, que Marx chamará de exército
industrial de reserva, como forma de baratear o custo do trabalho através
da concorrência.
A introdução das novas máquinas, que representa a
consolidação definitiva desse novo modo de produção, também agravará
as contradições entre capital e trabalho. Através desses novos
instrumentos, a burguesia golpeia os artesãos e suas corporações, que
tinham grande poder de barganha. Com as máquinas, ela não necessita
mais de mão de obra especializada do artesão, pode introduzir a mulher e
o menor no mercado de trabalho, com salários mais aviltados e em piores
condições de trabalho. Leo Huberman, no livro “História da Riqueza do
Homem”, descreve esse brutal processo de rebaixamento do nível
profissional. Ele cita, por exemplo, o depoimento de uma criança de 11
anos a uma comissão do parlamento inglês, em 1816: “Sempre nos batiam
se adormecíamos. O Capataz costumava pegar uma corda da grossura do
meu dedo polegar, dobrá-la e dar-lhe em nós. Trabalhei toda a noite, certa
vez”.
Todas essas condições de exploração, próprias do novo sistema
econômico, vão gerar resistências entre os explorados. Esse processo de
luta passará por longas experiências. As greves e os sindicatos, por
exemplo, não aparecerão num estalo de dedos. Antes, a classe operária
passará por um longo processo de aprendizado até encontrar as formas
mais eficientes de luta e concluir que sua união é fundamental para se
contrapor ao poder do patronato. Um das principais formas de luta foi o
Luddismo, também conhecido como o movimento dos quebradores de
máquinas. Inexperiente, a jovem classe operária viu nas máquinas o seu
principal inimigo. Afinal, aparentemente a máquina é que era responsável
pelo desemprego dos trabalhadores especializados, pela inserção da
mulher e do menor nas fábricas em condições degradantes etc.
O termo Luddismo deriva do nome do operário têxtil Ned Ludd,
que trabalhava numa pequena oficina em Nottingham, cidade próxima de
Londres. Segundo pesquisas, esse operário destruiu totalmente os teares
mecânicos da fábrica num sinal de revolta contra os efeitos da Revolução
Industrial. Sua atitude, apesar de individual, refletia o estado de espírito
dos artesões. Em pouco tempo, seu gesto foi imitado em várias cidades da
Inglaterra e atingiu também a França. “Entre 1811 e 1812, os Luddistas
espantaram a burguesia”, informa José Cândido Filho, autor do livro “O
Movimento Operário: O Sindicato e o Partido”. O parlamento Inglês, que
nunca tratara da questão operária, discutiu o assunto e aprovou, em 1812,
uma lei que punia com a pena de morte os “quebradores de máquinas”.
A legislação repressiva não conteve o Movimento Luddista, que
quatro anos depois foi retomado com novas máquinas quebradas em

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 43 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Londres, Glasgow, Newcastle, Preston, Dundee e outras cidades. Segundo


José Cândido, os Luddistas ingleses costumavam cantar uma música que se
tornou conhecida, quando quebravam as máquinas. “De pé ficaremos
todos/E com firmeza juramos/Quebrar tesouras e válvulas/E arrasar todas
as máquinas”. A revolta operária repercutiu também entre a
intelectualidade da época, que passou a dar maior atenção às condições de
vida e de trabalho do proletariado. Dessas primeiras lutas da classe
operária nasceram belos escritos e poemas, como o de Shelley, “Os
homens da Inglaterra”, reproduzido no livro de Leo Huberman, “A História
da Riqueza do homem”.
Aos poucos, entretanto, o Luddismo começou a ser superado
como forma de luta da jovem classe operária. Mas experiente, ela
constatou que não era a máquina a sua inimiga, mas sim o uso que o
patrão fazia dela. Que era um erro se contrapor ao desenvolvimento do
próprio conhecimento humano, expresso os avanços da tecnologia. O
movimento dos quebradores de máquinas também caiu no isolamento
diante da sociedade, reduzindo-se a pequenos grupos de trabalhadores que
destruíam máquinas e espancavam os cientistas que as inventavam. A
própria burguesia que num primeiro momento aprovou a pena de morte,
começou a dar sinais de assimilação dessa forma de luta. É nesse período
que se generalizava o seguro de patrimônio na Inglaterra e alguns patrões
inclusive são flagrados destruindo suas máquinas para adquirir outras mais
modernas.
Outra forma de luta que será utilizada na infância da classe
operária, será o boicote - palavra que deriva do nome de um oficial inglês
encarregado de administrar os negócios do conde Erne, da Irlanda, Sir
Boycott era conhecido por seus métodos truculentos no tratamento com os
empregados. Ele se recusava a negociar e os trabalhadores passaram a
fazer o mesmo, propondo que os moradores do povoado não consumissem
os produtos do Conde Erne. Este teve um grande prejuízo e afastou o oficial
inglês do cargo. A sabotagem também será usada nesse período como
mecanismo de pressão dos trabalhadores por seus direitos. O termo tem
origem francesa e significa "tamanco". Os operários franceses usavam esse
tipo de calçado para danificar as máquinas, emperrando a produção.
O salto na ação desse jovem proletariado vai se dar com o
recurso da greve - uma forma de luta mais avançada para pressionar o
patronato. Segundo José Cândido, “A origem do termo, liga-se à Praça da
Greve (place de grève), atualmente praça do Hotel De Ville, em Paris.
Quando desempregados ou para tratarem de assuntos relativos ao
trabalho, os operários costumavam reunir-se ali. Faire grève (fazer greve)
significava, portanto, reunir-se na praça da greve. A greve foi o recurso de
luta de maior eficácia nesse período, tanto na Inglaterra, como nos demais
países em que o capitalismo foi introduzido. Esse recurso se espalhou pelo
mundo, sendo encarado de diversas formas. Para alguns, defensores da
manutenção do sistema capitalista, como simples mecanismo regulador do
mercado de trabalho. Para outros, no caso dos Anarquistas, como um fim

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 44 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

em si mesmo. “A greve é tudo”, dirá Bakunin - um dos principais teóricos do


movimento ácrata.
Já para os revolucionários, a greve será vista como uma das
principais armas na luta de guerrilha entre capital e trabalho e como
poderoso instrumento de elevação da consciência e do nível de
organização do proletariado. O dirigente da revolução russa de 1917,
Vladimir Ilitch Lênin, escreveu um texto sobre as greves.
Sindicato Clandestino
É nesse processo da luta que a classe operária sentirá a
necessidade de se organizar. É dele que surgirão os sindicatos que na
Inglaterra têm o nome de trade-unions - que significa união de ofício, de
profissões. Essas jovens entidades de trabalhadores não terão as mesmas
características dos sindicatos atuais - que conquistaram o reconhecimento
legal, têm sedes, diretores afastados e gozam do direito de negociar com o
patronato. Pelo contrário. No século 17, período de surgimento das trade-
unions, elas serão clandestinas, com muita dificuldade de atuação. A
burguesia verá nelas um grande perigo. Seu temor é que elas unam o
grande número de trabalhadores, até aqui dispersos e vivendo em
concorrência entre si pelo emprego. Há registro de associações de
trabalhadores com caráter sindical desde 1699. Nesse ano em Londres,
uma greve dos operários têxteis assustou o governo e a jovem burguesia -
que ainda se constituía enquanto classe. É só no século 18, quando a
revolução industrial tomou impulso na Inglaterra, que os sindicatos vão se
generalizar para evitar seu crescimento, o parlamento inglês aprova em
1799 a combination law, a lei sobre associações que proíbe o
funcionamento de sindicatos.
A violência da burguesia se dará em vários terrenos. No campo
legal, elas serão proibidas. A primeira lei que garantirá a livre associação
dos trabalhadores só será aprovada em 1812, na câmara dos Lordes, em
Londres. Além de usar o aparato policial do Estado para reprimir essas
entidades, a burguesia inglesa - e posteriormente de outros países -
também utilizará as milícias privadas. Os jagunços, que hoje são uma
marca do campo em nosso país, já foram muito usados pelo patronato nos
centros urbanos. Alguns se tornaram famosos como o bando Pinkerton, dos
EUA - uma poderosa agência de pistoleiros contratada para reprimir greves
e assassinar lideranças operárias.
Para se proteger dessa violência, no inicio as trade-unions agem
totalmente na clandestinidade. As reuniões são secretas; não há sedes
sindicais, campanhas massivas de sindicalização, nem mesmo negociação
direta com o patronato. Algumas trade-unions inclusive formulam “códigos
de participação”, com normas para garantir a sobrevivência da entidade.
Elas fixam a triagem dos trabalhadores que devem ser convidados para as
reuniões clandestinas. A entidade dos têxteis, por exemplo, prevê um
período de observação de dois anos para avaliar se o trabalhador não é

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 45 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

dedo-duro, infiltrado do patrão. Só depois ele é convidado a participar das


reuniões. O seu código fala também de justiçamento dos delatores,
compondo um braço armado para amedrontar os traidores em potencial.
Aos poucos, no entanto, as trade-unions inglesas vão se
consolidando. Elas dirigem mais greves, maiores protestos. Deixam o
patronato num dilema. Já que são proibidas, o empresário não tem como
negociar em momentos de greve. Isso gera grandes prejuízos,
principalmente quando não há estoques e surgem encomendas de
produtos. Diante desse crescimento das lutas operárias, é que o
parlamento da Inglaterra irá aprovar, em 1824, a primeira lei sobre o direito
de organização sindical dos trabalhadores. Essa conquista permitirá um
poderoso aumento da força do sindicalismo. Em todos os ramos industriais
formam-se trade-unions. Também surgem as “caixas de resistências” para
apoiar financeiramente os grevistas.
O outro avanço nesse período será a organização de federações
que unificam várias categorias. Em 1830 é fundada a primeira entidade
geral dos operários ingleses - a associação nacional para a proteção do
trabalho. Ela reunirá têxteis, mecânicos, ferreiros, mineiros e outras
profissões. Chegará a ter cerca de 100 mil membros e editará um
periódico, A Voz do Povo. Na vanguarda do movimento operário inglês
dessa época estarão os têxteis, principalmente os da concentração
industrial de Lancashire. Em 1866, com o avanço da industrialização em
outros países, será realizado o primeiro congresso internacional das jovens
organizações de trabalhadores de vários países. Ela representará um
grande salto na unidade dos assalariados, que será materializado com a
fundação da associação internacional dos trabalhadores (AIT), também
conhecida como a primeira internacional.
Apesar de possibilitar um avanço da organização sindical, a lei
de 1824 é contraditória, tendo duas características distintas. Em primeiro
lugar, reflete a própria pressão organizada dos trabalhadores. Em segundo,
também indica uma mudança estratégica da burguesia inglesa. Tanto que a
lei foi aprovada na câmara dos Lordes, que reunia apenas a aristocracia
inglesa. Com ela a burguesia procura novos métodos para controlar o
movimento operário. Ela não poderia abandonar o seu projeto de dificultar
a luta e a união dos trabalhadores - fundamental para sua sobrevivência
enquanto classe.
Como não era mais possível proibir as trade-unions, ela adota
novos meios de interferir. Como a história vai demonstrar, mesmo
legalizados, os sindicatos podem ser reprimidos. Neste período, muitos
industriais pressionarão os operários exigindo a renúncia formal à
participação das trade-unions, como forma de garantir o emprego. A força
policial continuará a ser acionada, deixando um rastro de sangue em toda a
trajetória do movimento sindical. A legalização também permitirá
identificar as lideranças, o que pode facilitar o trabalho de cooptação e
corrupção - processo muito usado até hoje pelo patronato. Além disso, é

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 46 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

possível implantar toda uma legislação de controle dos sindicatos - como a


que existiu no Brasil após o governo de Getúlio Vargas.
Ainda nesse período, fruto da experiência concreta, o
proletariado também desenvolverá a luta política, superando a pressão
apenas por reivindicações de caráter econômico e específico. Surge o
movimento cartista na Inglaterra, que representou um salto na ação
operária. O nome deriva de uma “carta”, elaborada em 1837-38, em que os
trabalhadores reivindicam maiores liberdades políticas: direito de voto para
todos, abolição do sistema pelo qual só podiam se candidatar os que
tivessem renda, voto secreto etc. Em seu conteúdo, o cartismo já
expressara a luta por liberdades democráticas e socialistas. Ele será
duramente reprimido - com inúmeros cartistas, sofrendo processo criminal -
de “alta traição” - e muitas condenações.
Em outros países, o proletariado participará de ações políticas,
sendo a mais célebre participação na Comuna de Paris. Essa foi a primeira
experiência em que a classe operária alcançou o poder político. Sua
duração foi curta - de fim de março a fins de maio de 1871. Num primeiro
momento, a sede do novo poder se instalou na Câmara Federal dos
Sindicatos franceses que também era o local de reuniões da sessão
parisiense da AIT. Essa experiência, que não se alastrou e serviu de base
para novos estudos dos marxistas, foi violentamente reprimida. As tropas
do exército francês, que pouco antes havia sido derrotadas e tornadas
prisioneiras pelos alemães, foram libertadas e colocadas a disposição do
governo da França, de Thiers, por ordem e Bismarck. A burguesia superava
as suas divergências para esmagar o movimento operário. A luta contra a
comuna durou uma semana. Mais de 14 mil combatentes foram mortos na
guerra ou foram sumariamente fuzilados; 5 mil operários foram deportados
e outros 5 mil encarcerados.
O próprio Karl Marx, um dos idealizadores da AIT, já havia
apontado essa necessidade de ação política ao proletariado. “O fim
imediato dos Sindicatos concretiza-se nas exigências do dia a dia, nos
meios de resistência contra os incessantes ataques do capital”. Numa
palavra, na questão do salário e da jornada de trabalho. Essa atividade não
só é justificada, como necessária. Não podemos privar dela enquanto
perdure o modo atual de produção. Ao contrário, é preciso generalizá-la,
fundando e organizando sindicatos em todos os países. Por outro lado, os
Sindicatos, sem que estejam conscientes disso, chegaram a ser o eixo da
organização da classe operária. “Se os sindicatos são indispensáveis para a
guerra de guerrilhas cotidianas entre o capital e o trabalho, são também
importantes como meio organizado para a abolição do próprio sistema de
trabalho assalariado”.
Papel dos Sindicatos
Nessa primeira fase de existência, o sindicalismo vai
demonstrar que é um instrumento indispensável para os assalariados. Com

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 47 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

a expansão do capitalismo, que se torna o sistema predominante a partir


do século passado, os sindicatos vão se espalhar pelo mundo. Deixam de
ser um fenômeno na Inglaterra. Num processo dialético, em que o capital
impera, suas contradições aparecem, as lutas operárias têm início e,
conseqüentemente, surgem os sindicatos. Todos os avanços sociais,
mesmo que pequenos ou parciais, serão fruto dessa luta e da formação dos
sindicatos. Nada será dado de mão-beijada pelo capital; nada cairá do céu.
Cada nova reivindicação apresentada pelos trabalhadores representa, num
primeiro momento, a redução da taxa de mais-valia do patrão. Por isso,
depende de luta, de pressão organizada. A história da legislação trabalhista
no mundo será a história da luta de classes, em que os sindicatos jogarão
um importante papel.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 48 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA LUTA DOS TRABALHADORES E


NO MOVIMENTO SINDICAL
Maria Valéria Junho Penna3

Em 1872, ainda durante o Império, foi realizado o primeiro


recenseamento da população brasileira. Naquele ano, constatou-se que ela
era composta, por 9.700.187 pessoas, das quais 4.694.943 eram mulheres
e, dessas, 689.998 mulheres escravas. Mais de cem anos depois, o Censo
Demográfico de 1980 mostra que a população brasileira é de 119.070.865
pessoas, das quais 59.146.099 do sexo feminino. Mas às diferenças; é
claro, não são apenas demográficas e numéricas: em 1888 extinguiu-se a
escravidão, um, ano após proclamou-se a República, o país industrializou-
se alterou-se a composição de sua população com a absorção intensa da
imigração espanhola, italiana, alemã e japonesa; formou-se um
proletariado urbano rural e a classe média assumiu claros contornos sociais
e políticos.
Nos longínqüos 1872, as mulheres compunham
aproximadamente 45% do que o Censo considerava trabalhadores e, então,
como agora, não se considerou as donas de casa nesse conjunto. Das
mulheres que trabalhavam oficialmente, a agricultura empregava 25%, os
serviços domésticos 33%. No entanto, se observarmos o total de pessoas
absorvidas, naquela ocasião, tanto nos· serviços, quanto na indústria,
constataremos que elas eram mulheres em sua maioria. De fato, as
mulheres eram dominantes na prestação de serviços pessoais· (81 % do
total de pessoas no setor); contudo, diferentemente de agora, eram 78% ,
dos trabalhadores industriais: Elas perdiam para os homens na agricultura,
que' consistia na atividade econômica mais importante.
O que esses dados do século passado mostram é que muitas
mulheres trabalhavam, embora parte substancial, desse trabalho fosse
realizada dentro da família, como donas de casa e serviçais domésticas.
Política e economicamente, a família, a propriedade territorial e a
escravidão eram eixos do mesmo fenômeno, o latifúndio, com sua produ-
ção voltada para o mercado externo. No latifúndio, sinhás e escravas eram
partes da mesma comunhão doméstica. Às fazendeiras, embora sob o jugo
masculino e interminavelmente explorando as escravas, cabia, não
obstante, desempenhar várias ocupações: supervisionava e controlava
todas as atividades caseiras, como cuidar das crianças, cozinha e costura
e, ainda, a produção de sabão e velas, freqüentemente comercializados nas
vilas mais próximas. No caso das mulheres escravas, elas partilhavam,
desde pequenas, com as crianças do sexo masculinas, as tarefas mais
duras e pesadas, tanto domésticas quanto na agricultura. Elas roçavam

3
Este texto foi distribuído pela Nalú Farias da SOF, durante o Curso de Formação de Educadores/as em
Concepção Prática Sindical e Metodologia da Formação, realizado pela ENFOC/CONTAG.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 49 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

plantavam e colhiam algumas cultivavam ainda, alimentos em pequenos


pedaços de terras que vendiam e assim, logravam comprar sua liberdade.
Na periferia da grande propriedade territorial estavam os
antepassados dos atuais bóias-frias: homens e mulheres pobres e brancos,
sem propriedade, e que, eventualmente, eram incorporados às atividades
do latifúndio: Nesse grupo, disperso pelo território brasileiro e desprovido
de terras, as mulheres ficavam com o encargo dos filhos, freqüentemente
abandonados pelos pais, dedicando-se ao comércio ambulante de
mercadorias feitas em casa, à prestação de serviços pessoais como costura
ou cozinha e, finalmente, à prostituição. A mulher taboleira, por exemplo,
teve origem nesse pequeno comércio ambulante, onde se vendia sonhos,
café torrado, flores, refrescos, cestos, palmitos, aves, milho assado, bolo,
angu, etc.
Foi também no século passado que tomou impulso a
constituição de um campo de trabalho fundamental para a jovem de classe
média: o ensino primário. Inicialmente, o ensino era uma esfera de
atividades masculina, mesmo porque, até o inicio do século XIX, um
conjunto de medidas legais restringia o acesso das mulheres às escolas e,
portanto, à habilitação profissional. Apenas em 1827 surgiu a primeira
regulamentação que permitia às mulheres freqüentarem o ensino elemen-
tar, mas apenas esse. As primeiras Escolas Normais (a da Bahia, fundada
em 1835, e a de São Paulo, fundada em 1836) destinavam-se
exclusivamente a rapazes. Não podendo ser alunas, não podiam ser
professoras. Aos poucos, no entanto, as vagas foram se abrindo às
mulheres e, finalmente, em 1871, reorganizou·se o ensino de formação
para o magistério, aceitando-se a participação feminina, desde que com
um currículo específico que incluísse bordado branco, em filó, de matizes,
flores de contas e aplicação, cortes de roupas brancas e lisas.
Como se sabe, as restrições progressivas ao tráfego negreiro, a
libertação de escravos sexagenários, a Lei do Ventre livre, começaram a
configurar uma crise na oferta de mão-de-obra e a estimular o comércio
interno de escravos, principalmente em direção às regiões fluminense e
paulista, para absorção nas lavouras de café. No mesmo período, expandiu-
se a cultura do algodão em São Paulo e surgiram as primeiras fábricas
têxteis. Em resumo, a expansão econômica da lavoura para exportação
provocou uma crise na lavoura para o abastecimento interno e uma
demanda não suprida por mão-de-obra. A longo prazo, promovida pelo
Estado em estreita conexão com os empresários, a imigração européia
seria a solução para a questão da força de trabalho nas lavouras de ex-
portação e consumo interno e, ainda, para a indústria em expansão. A
curto prazo, mulheres e crianças das periferias pobres das cidades
forneceram os primeiros braços para essa indústria.

MULHERES E CRIANÇAS NA FÁBRICA

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 50 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O panorama da convivência das mulheres e crianças com as


fábricas foi, desde o início, desolador: viviam nelas, trabalhando uma
jornada de até dezesseis horas diárias, dormindo e se alimentando entre
máquinas; eram obrigadas, após incontáveis horas de trabalho, a aprender
corte e costura e, freqüentemente, não faziam jus a nenhum salário. As
condições de trabalho supunham, ainda, a sujeira, a insalubridade, os
espancamentos e estupros.
À medida que o século XX se avizinhava, vilas operárias foram
sendo construídas, os homens - freqüentemente imigrantes estrangeiros -
passaram, paulatinamente, a substituir as mulheres nas oficinas, os
salários generalizaram-se no interior da indústria, iniciando-se o hábito de
pagamento diferenciado entre os sexos, com os homens recebendo salários
maiores que as mulheres.
Uma operária, Luzia Ferreira de Medeiros, da fábrica têxtil
Bangu, no subúrbio do Rio, contou como eram as condições de trabalho já
depois da virada do século: "Entrei para a fábrica Bangu no período da
primeira guerra mundial com sete anos de idade. Iniciava o trabalho às seis
e terminava por volta das 17 horas - sem horário para almoço de definido.
Era o critério dos mestres o direito de comer e tendo ou não tempo para
almoçar, o salário era o mesmo. Isso, evidentemente, depois de passada a
fase do trabalho gratuito, que chamavam de aprendizado. Não tínhamos
lugar para comer. As refeições eram feitas entre as máquinas. A Penas uma
pia imunda servia· nos de bebedouro. Nunca recebíamos horas extras,
mesmo trabalhando além do horário estabelecido. Mestre Cláudio fechava
as moças no escritório para força-la à praticar relação sexual. Muitas moças
foram prostituídas por aquele canalha. (Em Edgar Rodrigues, Alvorada
Operária.)
O fato é que as mulheres: além de estarem submetidas, como
os homens trabalhadores, a condições de trabalho corrosivas,
diferentemente desses, ainda sofriam maus tratos corporais e auferiam
salários mais baixos. Dados de 1912, do Departamento Estadual do
Trabalho de São Paulo, revelam que foram visitadas, para confecção de um
relatório, fábricas que contavam com 1.943 trabalhadores brasileiros, 7.499
estrangeiros e 862 de nacionalidade ignorada. Dos 10.304 recenseados,
6.80I eram do sexo feminino. A jornada de trabalho iniciava-se por volta
das cinco e meia da manhã e terminava treze horas depois. O salário médio
das mulheres era bastante mais baixo que o dos homens: o salário médio
masculino na fiação era de 4$500 réis e o das mulheres, 2$000 réis. Na
seção de acabamento, em média, os homens recebiam 4$900 réis e as
mulheres recebiam 3$000 réis.
O PROTESTO FEMININO
No entanto, por mais dramática que fosse a vida da mulher
operária, dividida entre seus afazeres domésticos e a longa jornada do
trabalho assalariado, esse fato não a fez abdicar da sua capacidade de

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 51 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

reação à injustiça e da ação política. No Brasil, no início do século,


anarquistas e socialistas foram os arquitetos da questão social - uma
questão de polícia para o Estado. Assim, foi no interior desses dois
movimentos que as mulheres procuraram demarcar um território para sua
luta. Porque luta houve. O jornal A Terra Livre, de tendência anarquista, foi
o veículo utilizado pelas costureiras das confecções para articular suas
demandas e organizar seus sindicatos. Dois manifestos, assinados por
Teresa Cari, Teresa Fabri e Maria Lopes, ficaram célebres. Neles, por
exemplo, podia-se ler: "Devemos demonstrar, enfim, que somos capazes
de exigir o que nas pertence; e se todas forem solidária, se todas nos
acompanharem nessa luta, se nos derem ouvidos, nós começaremos por
desmascarar a cupidez dos patrões sanguinolentos". (A Terra Livre, 19.07I
906.)
Conjuntamente ao apelo em nome dos' "direitos", vinham
reivindicações mais concretas e imediatas, mas não menos importantes,
exigindo melhores salários e menor jornada. Ao mesmo tempo muitas
mulheres encabeçaram alguns dos mais importantes movimentos grevistas
do período.
Em 1901 e 1903, na Álvares Penteado, paralisaram o trabalho
em protesto contra as condições de trabalho e os salários; na mesma
época, na Companhia Industrial de São Paulo, fizeram uma paralisação
contra a diminuição de tarefas; em 1902, na Anhaia, em São Paulo,
entraram em greve por solidariedade a uma companheira despedida; em
1903, na Cruzeiro, no Rio de Janeiro, pelas mesmas razões, com o
agravante de que a operária em questão, recém-parida, fora dispensada
pelo mestre que a engravidou; em 1906 e 1907, em fábricas por todo o
país, pela diminuição da jornada.
Em 1917, as mulheres pararam os trabalhos nas Fábricas
Matarazzo, Fábrica de ligas Peterson, Fábrica de tecidos Mariângela, Fábrica
de cigarros Trajano; e em 1919, em Porto Alegre, tecelãs da Cia. Têxtil Rio
Grandense, Companhia de Fiação e Tecidos Porto-Alegrense e trabalhadoras
da fábrica de chapéus F. C. Kessler & Cia., participaram de nova greve geral
por aumento de salário, além das havidas no Rio e em São Paulo.

MULHERES ENTRAM PARA OS SINDICATOS


Embora houvesse inúmeros fatores freando a participação
feminina na vida sindical.., . de um lado, a relutância masculina em aceitá-
Ias como companheiras e, de outro, as exigências de sua dupla jornada de
trabalho que não Ihes deixava tempo para a política - ainda assim, existem
numerosos registros mostrando que um esforço considerável nessa direção
foi realizado: não apenas vários sindicatos femininos foram fundados,
quanto há evidências de freqüência de mulheres, inclusive discursando, em
alguns congressos operários. ,

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 52 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Dos sindicatos constituídos, um dos mais importantes foi a


União das Costureiras, Chapeleiras e Classes Anexas, com sede na rua
Senhor dos Passos, no Rio de Janeiro, onde já funcionava a União dos
Alfaiates da mesma cidade. Â União foi fundada por 50 operárias e sua
primeira medida foi deflagrar uma greve pela redução da jornada de
trabalho a oito horas diárias. Uma de suas inspiradoras, Elvira Boni, lembra
que o trabalho começava às 8 h da manhã, terminando às 19 h, isso
"quando a dona do atelier não prorrogava a jornada até às 20 ou 22 horas,
sempre pelo mesmo salário". (Em Edgar Rodrigues, Alvorada Operária.)
Por sua vez, em alguns Congressos Operários, sua presença foi
destacada. No 2º Congresso Operário do Rio Grande do Sul, realizado em
1920, lima operária delegada, de nome Alzira, discursou sobre as condições
do trabalho feminino, destacando como essas eram tão árduas que impe-
diam um companheirismo mais vigoroso como o dos homens na vida
sindical: “Quando tomamos conta que a jornada de trabalho é de 8 horas e
mais, pois ainda há casas em que se trabalham 14 a 16 horas, como por
exemplo as chapeleiras, costureiras sob medida, etc., podemos ainda
lembrar o estado de ânimo em que se encontram nossas irmãs, que após
tão fatigante trabalho em troca de um mísero salário , tem necessidade de
fazer seus serviços domésticos. Como já disse, a maioria é composta por
mães de famílias, necessitando sustentar os seus e ampará-los contra as
misérias da vida (...) " (Em Edgar Rodrigues, Alvorada Operária.)
De fato, embora a presença de mulheres não tenha sido usual
nos Congressos, sendo mesmo obstaculada em alguns casos, desde as pri-
meiras reuniões de trabalhadores formou-se um certo consenso sobre quais
deveriam ser as condições de seu trabalho extra-doméstico. Uma resolução
do 3º Congresso Operário Brasileiro, realizado entre 23 e 30 de abril de
1920, resume esse consenso: "O 3º Congresso Operário, confirmando as
resoluções do 1º Congresso quanto à situação do elemento feminino no
meio proletário, aconselha vivamente as associações obreiras a se
esforçarem para interessar diretamente as operárias na vida sindical,
preocupando-se com a sua educação social e intelectual e para que se
estabeleça no trabalho um ambiente de respeito, repelindo as brutalidades
dos patrões e encarregados de serviços intensificando-se a campanha no
sentido de que para elas seja abolido o trabalho noturno e o seus salários
sejam equiparados aos dos homens."
A demanda por uma legislação especial, de caráter protetor,
embora discutível para muitos em virtude dos embaraços que terminou por
causar para a contratação e a carreira das mulheres, acabou por prevalecer
e, em 1932, foi reconhecida pelo Estado, pelo Decreto 21.417, que tanto
proibia seu trabalho noturno, quanto criava condições mais favoráveis à
gravidez e estabelecia o princípio do salário igual para trabalho igual.

AS MULHERES COMO FORÇA DE TRABALHO

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 53 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O censo demográfico de 1920 mostrava que então 1.434.000


mulheres trabalhavam oficialmente, apresentando 15% da força de
trabalho. Deste total de mulheres trabalhadoras, 42% estavam na
agricultura, 31 % na indústria (inclusive em serviços de reparação) e 26%
em serviços.
No entanto, tomando o total de pessoas trabalhando nos
diversos setores da economia, constata-se que, na agricultura as mulheres
eram 9% da força de trabalho; na indústria de transformação 36%; na
prestação de serviços, 81 %. Comparando os dados de 1872 com os de
1920, a conclusão mais importante é que, à medida que a indústria se
expandiu, diminuiu a participação das mulheres no seu interior. Outras
informações demonstram que, não obstante esse decréscimo, elas
permaneceriam, desde então, em torno da metade do proletariado têxtil e
seriam majoritárias no setor de confecções.
Assim, vale a pena lembrar que durante toda a década dos
vinte, e no início dos anos 30, principalmente ma condição de tecelãs e
costureiras, elas militaram no movimento dos trabalhadores: a título de
exemplo, eclodiram greves na Fábrica de Tecidos Santa Maria, em
Sorocaba, em I 922 no mesmo ano, no Rio, participaram da tentativa de
uma greve geral da categoria: em 1925, bordadeiras, costureiras e
trabalhadoras de fábricas de fósforos em Niterói deram testemunho em A
Classe Operária sobre suas condições de trabalho e salários e tentaram
ganhar a solidariedade masculina para suas reivindicações; fizeram greves
na Fábrica de Tecidos Irmãos Tognato, em São Bernardo, em 1931.

PIONEIRAS DA LUTA SOCIAL


Algumas mulheres destacaram-se na vida pública e em sua
participação junto às organizações operárias. Dentre várias, cabe destacar
Maria Lacerda de Moura, Isabel Ferreira Bertolucci e Bertha Lutz.
Maria Lacerda de Moura; mineira de Manhuaçu nascida em
1877, professora e escritora, organizou a Vila Dom Viçosa, em Barbacena,
na qual 22 casas foram construídas para favelados e, ainda, fundou a Liga
Contra o Analfabetismo. Convidada para discursar na Federação Operária
Mineira, afirmou na ocasião: "A questão social, a questão do bem-estar
para todos resume-se no seguinte: 1º) Formar um núcleo de resistência
feminina, cujo objetivo será protestar contra a escravidão da mulher,
trabalhar para a reivindicação de seus direitos e para sua emancipação
mental. 2.°) Pregar e exigir a educação popular, a instrução obrigatória, a
educação racional feminina por todo o país. 3.°) Trabalhar para a criação de
uma ou mais universidades femininas, sob esses moldes, a fim de preparar
o pequenino exército das trabalhadoras que deverão sair para o interior em
demanda de outras mulheres de boa vontade, educando-as num sonho de
Paz futura para toda a gente. 4.°) Abrir escolas do caráter e da boa
vontade, escolas que despertem a iniciativa, escolas de força moral,

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 54 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

porquanto é a força moral que conduz o mundo no dizer de Binet. 5.°)


Promover o estudo da psicologia das forças ancestrais, da higiene, da
fisiologia, da educação e da ética, das ciências enfim, da filosofia, das artes
- para o conhecimento da humanidade e das leis evolutivas em favor da
beleza e da perfeição dos costumes. 6.°) Trabalhar pela juventude e pelo
exemplo para dar à criança, fazendo crescer na juventude a necessidade
de ideal mais amplo - de justiça e eqüidade entre os homens. 7.°) Falar,
pregar e protestar contra as mentiras convencionais, contra a hipocrisia
protocolar, detestar a política. 8.°) Pregar a Paz, abominar a guerra, ampliar
o amor à Pátria, fazê-Ia atravessar as fronteiras e olhar a Humanidade de
uma só vez, abrangendo as nacionalidades como membros da família
humana".
Isabel Bertolucci celebrizou-se pelo seu "Manifesto à Mulher
Paulista", publicado em A Plebe, em 03/12/1932, por ocasião do movimento
constitucionalista. Segundo ela própria, sua origem social estava na classe
dos que tudo produzem e nada possuem. No seu manifesto procurou,
ultrapassando sua condição social e dirigir-se a todas as classes de
mulheres, de forma a persuadí-Ias de sua crença pacifista e da imoralidade
das guerras.
Bertha Lutz, já em 1919, juntamente com Olga de Paiva Meira,
representou o Brasil no Conselho Feminino Internacional, da Organização
Internacional do Trabalho, em cuja Primeira Conferência foram aprovados
os princípios "de salário igual, sem distinção de sexo, para o mesmo
trabalho; e a obrigação de caia Estado organizar um serviço de inspeção,
incluindo mulheres, a fim de assegurar a aplicação das leis e regulamentos
para a frr0teção dos trabalhadores". Em 1922, fundou a Federação
Brasileira Para o Progresso Feminino, em cujo estatuto se esclareciam seus
objetivos:
Promover educação da mulher e elevar seu nível de instrução;
Proteger as mães e a infância;
Obter garantias legislativas e práticas para o trabalho feminino;
Auxiliar as boas iniciativas das mulheres e orienta-Ias, na
escolha de urna profissão;
Estimular o espírito de sociabilidade e de cooperação entre as
mulheres e interessá-Ias pelas questões sociais e de alcance público;
Assegurar à mulher os direitos políticos que a nossa
Constituição lhe oferece e prepará-Ia para o exercício inteligente desses
direitos;
Estreitar os laços de amizade com os demais paises americanos,
a fim de garantir a manutenção perpétua da Paz e da Justiça no Hemisfério
Ocidental.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 55 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Em 1936, Bertha passou a integrar a Câmara Legislativa


Federal, como suplente da vaga deixada por outro Deputado, elaborando,
na ocasião, o Estatuto da Mulher, apresentado por ela e pela Deputada
Carlota Pereira de Queiroz. O Estatuto ampliava a licença especial na época
do parto para três meses; concedia à trabalhadora o direito de dois
períodos diários para amamentação, de meia hora cada um, durante os
seis meses iniciais de vida do bebê; reduzia de 30 para 20 o número de
empregadas no local de trabalho cuja presença exigia creches. Com o
golpe de 1937 e o Estado Novo, fechado o Congresso, as reivindicações de
Bertha Lutz tiveram de esperar por melhores oportunidades, e algumas
delas somente foram concedidas em 1962.
Mas outras mulheres, de extrações ideológicas e partidárias
diversas, procuraram igualmente organizar-se, participando da vida
pública. Em 1934, como parte da Aliança Nacional libertadora, fundou-se a
União Feminina que, no entanto, em 1935 foi considerada ilegal, assistindo-
se à prisão de várias de suas integrantes. Por sua vez, durante a II Guerra
Mundial, organizou-se o Departamento Feminino da Liga de Defesa
Nacional, cujos objetivos, além de recolher dos nativos e roupas para os
soldados, eram, no âmbito do estritamente econômico, lutar contra os
aumentos no custo de vida e, no âmbito do político, combater o nazi-
fascismo e sua influência no país.

PARTICIPAÇÃO FEMININA NO PÓS-GUERRA


Terminada a guerra, promoveu-se um encontro nacional de
várias associações femininas, com representantes de vários estratos so-
ciais, incluindo mulheres de classe média, operárias e faveladas. Nessa
ocasião, duas delas, participando do Primeiro Congresso Internacional de
Mulheres, em Paris, ressaltaram em discurso os males do fascismo e a
necessidade de proporcionar-se instrução política às mulheres, "a fim de
possibilitar-lhes participação efetiva nos movimentos de combate à guerra
e aos regimes de força". (Idem.) Todo esse esforço acabou por resultar, em
1949, na constituição da Federação das Mulheres do Brasil, que consistiu
em forte impulso para outros núcleos locais, freqüentemente organizados
em comitês de bairros.
No final dos anos 40 e durante a década seguinte, a
participação feminina foi intensa no movimento contra a carestia: no então
Distrito Federal, onde se fundou a Associação Feminina, mais de mil
mulheres se congregaram para, nas palavras de uma estudiosa, "lutar pela
solução dos problemas especificas dos bairros, pela paz, contra a elevação
do custo de vida, pelos direitos das mulheres, pela defesa e proteção da
infância". (Idem). Também vale a pena ressaltar o papel que elas
cumpriram na organização do movimento de anistia para aquelas pessoas
perseguidas ou presas pelo Estado Novo.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 56 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Embora as mulheres tenham participado de formas variadas, da


dinâmica do movimento operário no período pós Estado Novo, destaca-se
seu desempenho na greve de 1953, em São Paulo, que paralisou
aproximadamente 300 mil trabalhadores e, cuja comissão central a tecelã
Mariana Galgaitez terminou por integrar. Na ocasião, várias outras
grevistas foram indiciadas em processos por sua presença em piquetes.
(Ver José Álvaro Moisés, Greve de Massas e Crise Política, Ed. Polis, São
Paulo). De fato, a greve teve como origem a luta pelo aumento do salário
mínimo, congelado desde 1951 e desvalorizado pelos constantes aumentos
no custo de vida (que Celso Furtado estima como sendo de 50% entre
1949-52). A greve de São Paulo não foi isolada e dados coletados por José
Álvaro Moisés lhe permitiram falar em 264 paralisações no período 1951-
1952, eclodidas em todo país, cujas principais motivações eram a
necessidade de aumentos nos salários, pagamento de salários atrasados,
solidariedade, melhores condições de trabalho e, em número menor,
bonificação de Natal e o protesto contra a carestia.
Os Censos Demográficos de 1940 e 1950 continuavam, então,
acusando queda da participação feminina na indústria e sua persistência
na prestação de serviços pessoais. Em 1940, o trabalho industrial das
mulheres caíra para 26.4% e em 1950 para 23.9% do total de
trabalhadores.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 57 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

HISTÓRIA DO MOVIMENTO SINDICAL4


De 1964 aos nossos dias

O golpe militar de 1964 colocou às escuras os movimentos


sociais e grevistas que tiveram grande atuação no período 1959/1963. As
fortes repressões não permitiram que entre 1964 e 1977 houvesse
praticamente nenhuma greve ou outras formas quaisquer de manifestação.
Os trabalhadores e trabalhadoras enfrentaram, desde a
instauração da ditadura militar no Brasil em 1964, uma forte repressão às
organizações que lutavam contra as políticas salariais que arrochavam o
poder de compra e as condições de vida de toda a classe. O governo
ditador procurou atacar as cúpulas dos sindicatos realizando intervenções
nas organizações, desmantelando as estruturas já construídas
anteriormente e impedindo qualquer tipo de articulação dos operários que
intuísse a formação de um grupo opositor organizado.
Mas, mesmo sobre forte pressão os trabalhadores e
trabalhadoras se organizam e realizam, em 1967, a II Conferência Nacional
de Dirigentes Sindicais, marcando posição contrária à política de arrocho
salarial e buscando construir junto aos operários as comissões sindicais de
trabalhadores e trabalhadoras. No entanto, mesmo com a manifestação
contrária de alguns grupos de trabalhadores e trabalhadoras que
paralisavam isoladamente algumas fábricas afrontando e contestando a
política econômica do governo militar ditador, a luta sindical perdurou
durante um grande período do pós-64 sem atingir plenamente os seus
objetivos.
O movimento dos trabalhadores e trabalhadoras organizados
em sindicatos ainda conseguiu causar grandes problemas para os ditadores
em 1968, sobretudo, com a greve dos trabalhadores e trabalhadoras da
Belgo Mineira em Contagem-MG, e com os metalúrgicos de Osasco que,
com um forte sindicato, desempenharam um papel importante na
organização das ações dos trabalhadores e trabalhadoras.
As ações do governo também se tornavam duras em relação a
qualquer manifestação ou postura de contestação, por mais “irrelevantes”
que fossem. Em 1969, o Ministro Jarbas Passarinho através de um decreto
intervém em vários sindicatos, afastando os seus dirigentes que, em sua
opinião, não conseguiram disciplinar as entidades com a ordem social
vigente5.
Essa situação de perseguição de lideranças e de intervenção
nas entidades por parte do governo ditatorial continuou, mas sem eliminar
4
Cartilha de Formação CNTE. Jones Dori Goettert
5
Cf. SANTANA, 2001.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 58 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

totalmente o “germe” da subversão que se manteria vivo e crescente até o


final dos anos 70, quando as manifestações ganham as ruas e o interior
das fábricas.
Por outro lado, é importante registrar o papel que a União
Nacional dos Estudantes (UNE) desempenhou nesse período. A UNE,
fundada em 1937, tem logicamente desempenhado um papel importante
na história política nacional. Em vários momentos dessa história,
principalmente num passado recente, firmou-se como uma entidade de
força política na coordenação das mobilizações e ações dos estudantes.
No período pós-60, em que o país viveu um momento político e
econômico conturbado, com a manifestação constante do operariado e
com a insatisfação dos trabalhadores e trabalhadoras rurais exigindo
reforma agrária, a UNE procurava demarcar as suas posições ideológicas
considerando, é claro, a diversidade interna dos grupos que a compunham,
mas comungando com os ideais de transformação social (o que pouco
tempo depois colocaria a entidade na mira dos ditadores).
Apesar das suas várias tendências internas, que claramente se
posicionavam contrárias ao regime ditatorial militar imposto em 1964, e
mesmo sendo formada em grande parte por estudantes de classe média,
um pouco distantes da dura realidade vivida pelos trabalhadores e
trabalhadoras, a UNE se uniu aos demais oposicionistas à ditadura (como o
PCB, PSB, PTB, FPN, Confederação Geral dos trabalhadores e trabalhadoras
e as Ligas Camponesas), trilhando em conjunto o caminho da luta pela
redemocratização.
A posição da UNE frente ao governo continuou sendo a de
desaprovação, organizando manifestações e sofrendo uma violenta
repressão como resposta, que procurava remodelar e enquadrar o
movimento estudantil na “nova ordem social” ditada pelos militares6.
A perseguição e repressão sobre os estudantes, sindicalistas,
trabalhadores e trabalhadoras e intelectuais, acentuou-se drasticamente
com o Ato Institucional número 5, o AI – 5, de 1968.
O AI-5 anulou o Estado de Direito no Brasil firmando um governo
de direita autoritário. Suas práticas, agora, estavam institucionalizadas;
práticas de repressão política contra todos aqueles que pudessem ser
enquadrados ou que se caracterizassem minimamente como subversivos,
como inimigos da ordem estabelecida. Uma ordem que não trouxe para a
maior parte da população, e claramente para a grande parte da classe
trabalhadora, nenhuma melhora em suas condições de vida7.
Ao fechar o Congresso e instituir um bi-partidarismo que forjava
uma falsa idéia de democracia com o MDB como “oposição” consentida à

6
Cf. SANFELICE, 1986.
7
Cf. SEGAL, 2001.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 59 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

ARENA, partido do governo, a ditadura militar demonstrava ainda mais sua


truculência e arbitrariedade. Já para os militantes de esquerda envolvidos
em ações políticas, manifestações e organizações contrárias à ditadura, o
AI - 5 instaurou a prisão arbitrária, a violência sem limites, à tortura e, em
diversos casos, o assassinato.
Mas, mesmo durante esse período vários sindicatos tentaram,
mesmo que timidamente, orientar as bases para continuar reivindicando e
se contrapondo às políticas de arrocho salarial, através da organização no
“chão das fabricas” fazer frente ao processo de controle sobre o aumento
de salários baseado no AI-5.
As greves começaram a ressurgir no ano de 1978, quando os
trabalhadores e trabalhadoras, já no máximo de sua condição de
exploração e percebendo o momento político favorável, começam a se
manifestar e a exigir melhorias no salário que possibilitassem a melhoria
das suas condições de vida e de trabalho. Essas manifestações aconteciam
e continuaram seguindo esta lógica durante algum tempo, nos momentos
de negociação de salários (a data base de cada categoria), que passou a
ser o momento mais propício para o enfrentamento político, que também
procurava abarcar outras questões, além das salariais.
As greves passaram a ter um crescimento anual considerável,
envolvendo cada vez mais categorias de trabalhadores e trabalhadoras e
tendo à frente os operários das fábricas produtoras de automóveis, os
metalúrgicos. Nascia o “novo sindicalismo”. A partir de 1978, constitui-se
um amplo movimento social de massas, de democratização interna, de
inserção no processo de luta da democracia, de confronto com os limites
impostos pelo autoritarismo no Brasil ao pleno exercício da cidadania dos
trabalhadores e trabalhadoras. O “novo sindicalismo” extrapolava,
portanto, “o terreno de suas funções sindicais, e redefiniu-se em face do
conjunto de agentes que, no Brasil, lutam pela democracia: fala-se hoje,
abertamente, que os trabalhadores e trabalhadoras são a espinha dorsal do
movimento democrático brasileiro”, porque sem eles qualquer “abertura”
ou “liberalização” apenas reconstruiria o círculo vicioso da crise do regime
autoritário8.
As manifestações dos trabalhadores e trabalhadoras que se
avolumam no final da década de 70, e que tem o ABC paulista como palco
inicial, estão ligadas não só à resistência política contra a ditadura, mas
também se contrapõem às investidas político-econômicas do capital que
arrochavam os salários e aumentavam a exploração do trabalho.
O acontecimento primeiro desse período de grande
movimentação foi à greve dos trabalhadores e trabalhadoras da Saab-
Scania, com início em 12 de maio de 1978. Os operários enfatizavam que a
empresa não havia cumprido o acordo de readmissão de trabalhadores e
trabalhadoras dispensados em protestos anteriores, em 1977. O
8
MOISÉS, 1982, p. 31.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 60 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

movimento alastrou-se extrapolando o ABC e chegando a outros municípios


como São Paulo e Osasco, acabando por atingir outros setores da
economia, mesmo com a decisão do Tribunal Regional do Trabalho de
considerar a greve ilegal.
Estas manifestações continuariam crescendo durante o ano de
1979, de forma a aumentar a participação e a atuação dos trabalhadores e
trabalhadoras na política nacional. Com a greve iniciada em 1978 o
movimento expande-se e ganha força em outros estados brasileiros,
alcançando Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Contudo, é
em seu “centro nervoso”, o ABC paulista, que o movimento dos
trabalhadores e trabalhadoras assume outros patamares, indo além das
questões trabalhistas dos primeiros movimentos e estabelecendo a
bandeira da democratização política do país9.
No início de março de 1979, os trabalhadores e trabalhadoras
do ABC entram em greve: são por volta de cinqüenta mil trabalhadores e
trabalhadoras parados. A greve estende-se para o interior e o governo a
declara ilegal; mesmo assim os trabalhadores e trabalhadoras mantêm a
posição e conseguem novas adesões ao movimento que se espalha para o
interior, e em alguns dias são mais de 170 mil trabalhadores e
trabalhadoras parados. Com o passar de dias de greve o Ministério do
Trabalho resolve intervir na negociação, elaborando propostas que não
convencem os trabalhadores e trabalhadoras. O governo, então, declara a
intervenção nos sindicatos e deflagra uma série de confrontos em praça
pública entre trabalhadores e trabalhadoras e policiais. O movimento
continua até o dia 27 de março quando os trabalhadores e trabalhadoras
resolvem aceitar a proposta feita pelo patronato, que estabelecia o prazo
de 45 dias para negociação de um piso satisfatório.
A insubordinação dos sindicatos e o crescimento do movimento
grevista, que continua nos anos 80 do século XX, tiveram então como
grande elemento aglutinador da classe trabalhadora a questão salarial. A
inflação crescente combinadas ao baixo rendimento dos salários
deteriorava as condições de vida dos trabalhadores e trabalhadoras, que
viam o seu poder de compra diminuído a cada mês. É nesse momento de
agitação e de organização dos trabalhadores e trabalhadoras que surgem a
Central Única dos trabalhadores e trabalhadoras - CUT e o Partido dos
Trabalhadores e trabalhadoras - PT, sinalizando para uma nova forma de
sindicalismo.
O PT surge como instrumento necessário de organização e de
luta dos trabalhadores e trabalhadoras na política nacional; contudo,
sempre articulado a outras formas de luta organizada como os sindicatos e
demais associações populares, sendo a participação dos sindicalistas o
elemento fundamental para a formação e a caracterização do partido.
Segundo Ozai da Silva (2000), essa afirmação pode ser feita com base na

9
Cf. SANTANA, 2001.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 61 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

análise da formação da primeira Comissão Nacional Provisória, de 1979,


que era composta por 12 dirigentes sindicais, dos 16 membros que a
compunham.
O contexto de formação do Partido dos Trabalhadores, no
começo dos anos 80, tem como pano de fundo o crescimento dos
movimentos sociais organizados no Brasil e as intensas lutas dos operários
do ABC paulista, que colocavam em questão o regime de governo
autoritário dos militares. O PT levanta bandeiras que extrapolavam as
questões salariais e que visavam transformações políticas e sociais
bastante profundas, demarcando fortemente nesse período uma tendência
ideológica socialista, que se baseava de forma clara em um projeto político
anticapitalista.
Será, em especial, esta a tendência do PT: a busca da
democracia plena exercida pela massa organizada e participativa, que tem
gravado em seu manifesto de fundação as idéias básicas de um projeto que
visa à construção de uma sociedade igualitária, sem explorados nem
exploradores10.
Já a CUT - Central Única dos Trabalhadores, criada em 1983,
ainda no regime militar, aglutinava as correntes sindicais mais ativas,
fazendo frente às políticas de degradação das condições de vida da classe
trabalhadora, estabelecendo-se nesse período como uma importante
organização política e social e fazendo frente de forte oposição ao governo
Figueiredo e depois ao governo Sarney. A CUT tornou-se o inimigo número
um das políticas governistas e se firmava como a Central que aglutina o
maior número de entidades filiadas.
A ascensão da CUT, nos anos 80, assim como o crescimento do
PT, na esfera da política institucional, é impulsionada pelo momento
histórico-político de grandes transformações, com o fim da ditadura e com
a crise do Estado e da economia hiperinflacionada. Nesse período, de
acordo com Alves (2000), o sindicalismo brasileiro caminha na contramão
dos sindicatos no resto do mundo, inclusive em relação a alguns países na
América Latina como a Argentina. Enquanto nesses países os sindicatos
entravam em depressão por falta de participação e por perder poder
político, no Brasil vivia-se o que se denominou a década de explosão do
sindicalismo.
Com uma atuação política constante, a CUT procurou na década
de 1980, firmar um projeto de organização e ação dos trabalhadores e
trabalhadoras, classificado como “sindicalismo defensivo”, mantendo uma
postura reivindicatória e que tinha como principal instrumento de ação e
pressão e a greve. Com as mudanças políticas e econômicas ocorridas até
o começo dos anos 90, com a implantação do modelo econômico
neoliberal, a CUT procurou estabelecer, após o seu IV Congresso realizado
em São Paulo, em 1991, uma ação estratégica mais propositiva, elaborando
10
Cf. SILVA, 2000.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 62 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

propostas de políticas que poderiam ser discutidas em fóruns que


contassem com a presença de representantes não só dos sindicalistas, mas
também do governo e do empresariado.
Antes de prosseguirmos, é importante destacar a criação das
duas outras maiores Centrais Sindicais brasileiras: a CGT – Confederação
Geral dos Trabalhadores e trabalhadoras e a FS – Força Sindical.
A Confederação Geral dos Trabalhadores - CGT11, segundo
informações em seu site, é uma sigla histórica, datando de 1929, quando
foi criada a Confederação Geral dos Trabalhadores e trabalhadoras
Brasileiros passando por mudanças, em 1945, passou a Confederação Geral
dos Trabalhadores e trabalhadoras; em 1962, para Comando Geral dos
Trabalhadores e trabalhadoras (esmagado pelo golpe de 1964); em 1986,
para Central Geral dos Trabalhadores e trabalhadoras (início da
reestruturação) e 1988, para Confederação Geral dos Trabalhadores e
trabalhadoras.
A CGT, hoje abrange todo território brasileiro, com filiais em 21
Estados e conta com 1.056 entidades sindicais, filiadas que representam
8.669.000 trabalhadores e trabalhadoras (dos quais 30% são
sindicalizados, o que corresponde a 2.600.000 filiados), representados por:
1.017 sindicatos de base; 04 confederações nacionais e 35 federações
nacionais /regionais e estaduais
A Força Sindical12, segundo informações em seu site, foi criada
em 1991 a partir de Congresso em São Paulo, surge a partir de críticas ao
sindicalismo em curso no Brasil. De um lado, a crítica recaia sobre um
sindicalismo de “radicalismo estéril”13 (crítica, em especial, à CUT) e, por
outro, sobre um sindicalismo de “conformismo paralisante”. A superação
dessas formas de sindicalismo seria possível na medida em que se lançasse
“o movimento dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiros à
modernidade, para construir uma central forte, capaz de endurecer quando
preciso, mas também de saber negociar, autônoma, livre, pluralista, aberta
ao debate interno e com a sociedade”.
A Força Sindical passou, então, a empreender esforços no
sentido de pragmatizar as lutas com “conquistas reais para os
trabalhadores e trabalhadoras”. O Centro de Solidariedade ao (a)
trabalhador (a), a Qualificação Profissional, o “1º de Maio pelo Emprego”
em 1998, e o “1o de Maio pelo Brasil – por Emprego, Educação e
Qualificação Profissional”, em 1999, assim como “a luta pela
aposentadoria, pelas grandes reformas – previdenciária, agrária, do
judiciário, política, fiscal e sindical e pela flexibilização das leis trabalhistas
– dando-se status à negociação livre entre empregadores e empregados

11
Site: www.cgt.org.br
12
Site: www.forçasindical.org.br
13
A referência base das informações sobre a Força Sindical foi o site da Central.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 63 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

com o apoio dos sindicatos e das centrais”, foram resultados dessa forma
de se construir e de se fazer sindicalismo. A Força Sindical se assenta sobre
um discurso que acentua o moderno, a pluralidade e a democracia.
Mesmo que o processo de surgimento e desenvolvimento do
“novo sindicalismo” “não tenha sido suficiente para desmontar totalmente
a estrutura sindical corporativa erigida desde os anos 30, tendo em vista
que suas bases fundamentais – como o imposto sindical, o monopólio da
representação pelo sindicato, o princípio da unicidade sindical e a estrutura
confederativa – foram mantidas, ele permitiu um significativo aumento da
liberdade de organização e ação sindical. Na verdade, embora a proposta
pela qual os setores de ponta do sindicalismo vinham lutando ao longo de
todos esses anos – de superação da estrutura sindical corporativa e de sua
substituição por uma institucionalidade sindical democrática, baseada no
contrato coletivo de trabalho – tivesse sido derrotada pelo empresariado e
pelos setores mais conservadores do próprio movimento sindical, suas lutas
deixaram marcas”14 profundas.
Pode-se afirmar, nesse sentido, “que o movimento sindical
brasileiro esteve na contramão da tendência histórica predominante
durante a década de 1980, ao conquistar uma capacidade de intervenção
política inédita na história do país, quando, em nível internacional, os
sindicatos viviam um processo generalizado de enfraquecimento”15.
Essa resistência dos trabalhadores e trabalhadoras ia de
encontro às políticas de exploração do trabalho estabelecidas pelo capital
industrial brasileiro da época, que se utilizava dos baixos salários pagos ao
operariado como principal elemento da competitividade da indústria
nacional. Com isso, conseguia colocar seus produtos no mercado a um
preço menor que os internacionais. O aumento de salário requerido pelos
trabalhadores e trabalhadoras, portanto, não era visto como um bom
negócio para o capital.
Apesar do crescimento e da força do movimento operário dessa
época, a classe trabalhadora, sobretudo o operariado fabril dos anos 80,
começava a sofrer as transformações nas relações de trabalho e de
produção que sinalizavam para transformações que iriam reestruturar o
processo produtivo fabril. Essa reestruturação tinha como um de seus
principais aspectos a inserção de novas tecnologias que visavam à
diminuição quantitativa da exploração da força de trabalho e a
verticalização da exploração qualitativa, tornando-se um dos elementos
mais importantes da constituição da hegemonia do capital sobre o trabalho
nos anos 80 e 90 do século XX.
Essa reestruturação produtiva do capital que começava a se
desenhar no Brasil nos anos 80 e que já estava a pleno vapor nos países de
centro da economia capitalista, vinha a reordenar a organização e a gestão
14
LEITE, 1997, p. 17.
15
LEITE, 1997, p. 17.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 64 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

da produção fabril que até então estava montada totalmente nos moldes
do esquema de produção taylorista/fordista. Nesse modelo o
descontentamento e a organização dos operários era crescente, colocando
em risco o processo de acumulação e reprodução do capital.
Para os capitalistas, esse era o começo da implantação da
acumulação flexível baseada no toyotismo, organização do processo
produtivo criada no Japão e exportada como modelo para os demais países
capitalistas, e que ganharia força no Brasil a partir dos anos 90, com a
abertura e a liberalização da economia realizada por Fernando Collor de
Mello.
Esse novo arranjo do capital encontra ainda uma força de
trabalho organizada, que procurava fazer resistência à ação avassaladora
do capital. Uma das formas de resistência foi à proposição da instalação
das Comissões de Fábrica e a intervenção sindical no processo de decisão
da inserção de novas tecnologias no processo produtivo, procurando
minimizar os danos e os prejuízos que o operariado sofreria com esse novo
modelo de produção. Mas, o ritmo de instalação das novas tecnologias foi
bastante forte e agravado pela falta de condição e de tempo que os
trabalhadores e trabalhadoras tinham para se contrapor a esse movimento.
É que, se esse movimento seguiu um processo temporalmente mais lento
nos países de primeiro mundo, possibilitando a luta dos trabalhadores e
trabalhadoras concomitantemente às transformações, no Brasil as
transformações aconteceram rapidamente, com a reformulação tecnológica
de parques industriais em pouquíssimo tempo.
Devemos lembrar que, o período de 1980 a 1990, é marcado
pelo fim da ditadura militar (1985), e pela instalação de um governo civil
proclamada como a retomada da democracia no Brasil. Por outro lado, a
década foi também um período de inflação muito alta e de recessão
econômica com aumento do desemprego, fatores que colaboraram para
uma diminuição das ações reivindicatórias dos trabalhadores e
trabalhadoras que se viam pressionados pelo crescente desemprego
estrutural.
Um dos mais importantes fatos desse momento foi, sem dúvida,
o processo eleitoral que elegeria, pelo voto direto, o novo presidente do
Brasil. Em 1989 tivemos o enfrentamento, no segundo turno, de duas
frentes bastante diferentes. Uma que tinha como candidato Luís Inácio
“Lula” da Silva, ex-líder operário e um dos fundadores do PT, que contava
com o apoio de uma ampla gama de organização dos trabalhadores e
trabalhadoras, sindicatos e demais organizações; do outro lado, era
candidato Fernando Collor de Melo, fantoche criado pela burguesia e pelo
poder político conservador e demais larápios nacionais, com amplo e
irrestrito apoio da imprensa nacional (leia-se Rede Globo).
O desfecho não poderia ser pior: Fernando Collor de Melo é
eleito presidente com o discurso da necessidade da abertura econômica.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 65 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Implanta uma política de importação de bens de consumo e de produção,


dando os primeiros retoques para liberalização da economia ao iniciar o
processo de privatização das empresas estatais brasileiras. Dois anos
depois tem o mandato cassado por corrupção. Mas o estrago já estava
feito.
O processo de abertura da economia brasileira seguiu tornando-
se mais agudo com os governos posteriores. É claro que os prejuízos desse
processo foram transferidos para a classe trabalhadora, que mais uma vez
se viu arcando com o ônus necessário a ser pago para o “bom
desempenho” dos indicadores da economia nacional, agora na era da
mundialização dos capitais.
Nesse sentido, a situação do movimento operário muda
significativamente com a chegada dos anos 90. “A política econômica
neoliberal inaugurada pelo governo Collor em 1990 jogou o país numa
profunda crise recessiva, aumentando de maneira extremamente rápida os
níveis de desemprego no país, ao mesmo tempo em que, ao abrir
abruptamente a economia brasileira, forçou as empresas a acelerar seus
processos de reestruturação produtiva, gerando novos desafios para os
quais o movimento sindical, de maneira geral, não se encontrava
preparado”16.
A partir de 1994, com a eleição do Presidente, Fernando
Henrique Cardoso, a política adotada foi a de continuidade da
implementação das políticas neoliberais iniciadas por Fernando Collor de
Melo, com o governo se empenhado em seguir amplamente a “cartilha” do
Fundo Monetário Internacional, privatizando as empresas estatais,
diminuindo gastos na esfera social e contribuindo na soma das
transformações estruturais do processo de produção capitalista em nível
mundial. Com as dificuldades políticas e econômicas conjunturais locais,
tem-se um aumento da miserabilidade de grande parcela da população
brasileira.
Neste novo contexto de reestruturação do capital mundial,
houve um número crescente de trabalhadores e trabalhadoras brasileiros
vivendo o drama do desemprego, um fenômeno que afetou e afeta,
sobretudo as regiões de grandes indústrias, como a automobilística. Mas,
que tem reflexos, também, noutras regiões e setores do país devido à
implantação de políticas econômicas que abrem o mercado brasileiro para
produtos externos, diminuindo o consumo de produtos internos e
desencadeando um processo gerador de mais desemprego.
Conseqüentemente, mais trabalhadores e trabalhadoras buscam na
informalidade formas de ocupação.
A implementação pelo governo federal de um modelo político
econômico centrado no neoliberalismo, tornou a relação entre capital e
trabalho mais injusta no Brasil, favorecendo sobremaneira o primeiro.
16
LEITE, 1997, pp. 17-18.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 66 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Montado no discurso de geração de postos de trabalho, as ações do


governo FHC procurou estimular o surgimento de relações de produção,
que se contrapunham às Leis Trabalhistas vigentes. Com a criação de
contratos temporários que deixaram o trabalhador e a trabalhadora
desprovidos de qualquer direito, impedindo que este tivesse qualquer
benefício estipulado por Lei. Isso acabou barateando o custo do Trabalho
para o Capital.
As transformações do modo capitalista de produção têm se
realizado no Brasil com mais força no âmbito da implantação de políticas
de cunho neoliberal e procuraram, dentre outras ações, acabar com os
“entraves” gerados pelas leis trabalhistas na relação Capital/Trabalho,
garantindo às empresas maior flexibilidade no uso e desuso da força de
trabalho, sem impedimento legal e reduzindo a contestação no campo
institucional formal por parte dos sindicatos.
As ações das instituições governamentais revelaram a face
intervencionista das instâncias burocráticas do Estado, que de acordo com
os princípios liberais não deveria intervir no movimento do mercado, mas o
faz, desde que seja para utilizar o poder político institucional para a
otimização das condições de reprodução do Capital.
Nesse período, ficou evidente uma outra contradição na forma
de atuação do Estado, no trato das questões relativas ao Trabalho e à
economia informal. Enquanto o discurso oficial pregava a regularização e a
regulamentação dos trabalhadores e trabalhadoras e das transações
econômicas informais, o discurso ideológico que sustentava as ações
governamentais estava fundado no liberalismo econômico, que tem como
diretriz a desregulamentação, que precariza o emprego e,
conseqüentemente, reduz o poder de luta organizada da classe
trabalhadora, se refletindo no esvaziamento dos sindicatos.
Desta forma, tornou-se crescente o desemprego, o que colabora
para a degradação das condições de trabalho daqueles que continuam
formalmente empregados. Os que continuam formalmente empregados
passam, neste contexto de precarização das relações de trabalho, a sofrer
pressões sobre os seus salários e seus direitos trabalhistas, cuja existência
passa a ser denunciada como obstáculo à expansão do emprego formal 17.
O fenômeno crescente do desemprego e da precarização do
trabalho, longe de serem uma anormalidade pelas forças econômicas e
políticas dominantes, são vistos, até pelos discursos oficiais, como
conseqüências naturais da nova ordem política e econômica estabelecida
para a organização e participação dos atores econômicos no mercado
capitalista.
Pautado em pressupostos liberais, o governo FHC sempre
procurou justificar a aceitação do crescimento contínuo da precarização das

17
Cf. SINGER, 1998.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 67 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

relações de trabalho alimentando uma política de desregulamentação do


mercado, como forma de evitar o aumento do desemprego, que de outra
maneira só poderia ser conseguido com o crescimento econômico. Neste
sentido, os pronunciamentos e as atitudes tomadas pelo governo, foram de
estimular a informalidade e a precarização do trabalho. Esse fato pode ser
constatado se analisarmos os projetos que visavam modificações nas leis
que regiam os contratos de trabalho, ou que permitiam que houvesse
contratos de trabalho que não atendessem aos princípios da legislação,
estimulando a ampliação das condições para o aproveitamento e
exploração da força de trabalho, contando muitas vezes com a participação
de algumas organizações sindicais.
Desta forma, fica evidente o desmonte do já insuficiente
aparato institucional de proteção ao trabalhador e a trabalhadora, frente à
“intempéries” do mercado e das investidas extremas de espoliação dos
empregadores.
Esta situação demonstra o poder de influência da classe
dominante sobre os aparelhos do Estado, que se reconfiguram modificando
a legislação ou mesmo desobedecendo-a, para melhor colaborar com o
atual contexto organizativo do Capital. O mesmo Estado que em outros
momentos procurou mostrar-se como mediador ou imparcial frente ao
confronto Capital X Trabalho, corrobora sem disfarce à sua vinculação com
o Capital.
Assim, é no crescimento do desemprego, do trabalho informal,
da desregulamentação e do desmantelamento do aparato institucional que
garantia alguns direitos básicos à classe trabalhadora, que se mostra o
desgaste e a fragilidade das atuais formas de organização dos
trabalhadores e trabalhadoras, que são em sua maior parte sindicatos que
organizam, representam e defendem os direitos de determinada
categoria18.
Combinada a terceirização ao desemprego, a precarização
torna-se um elemento corrosivo da base sob a qual se assenta a
legitimidade e representação dos sindicatos, que por serem
reconhecidamente institucionais trabalham dentro de normas que não
permitem, ou não tornam interessante, organizar os trabalhadores e
trabalhadoras que estão fora do mercado de trabalho formal, seja pelo
desemprego ou pela informalidade.
Como instituição, os sindicatos, estão fracionados para
representar as diferentes categorias, organizando, em tese, estes
trabalhadores e trabalhadoras, também legalmente contratados como uma
força conjunta frente ao capital. Logicamente, temos que considerar a

18
Atualmente os sindicatos têm lutado muito mais para a manutenção do emprego do que por melhorias nas
condições de trabalho e de salário, como acontece atualmente com os metalúrgicos do ABC. Há uma preocupação
maior em reintegrar o desempregado ao mercado de trabalho, e não um projeto de organização dos trabalhadores
e trabalhadoras para o enfrentamento da atual política econômica.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 68 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

fragmentação existente entre os sindicatos instituídos de acordo com a


categoria de trabalho, pois como sabemos os sindicatos acabam por
representar um fragmento da classe trabalhadora, uma categoria
específica e não a todos os trabalhadores e trabalhadoras. Esta
fragmentação colabora para que os problemas enfrentados por
determinada categoria que cumpre sua função na divisão social do
trabalho, pareça não dizer respeito a outras categorias de trabalhadores e
trabalhadoras, o que tem impedido por vezes a participação conjunta de
toda a classe trabalhadora em suas reivindicações.
E por estar organizado política e estruturalmente desta forma
fragmentada e institucionalizada, que privilegia a dimensão de categoria e
profissional, é que os sindicatos perdem atualmente o seu poder de
representação. Com o aumento do desemprego e da informalidade do
trabalho tem uma diminuição considerável de sua base de representação,
já que os desempregados e os trabalhadores e trabalhadoras precarizados,
informais, estão fora da sua área de atuação legal. No aumento da
informalidade e de seus efeitos sobre os sindicatos, a representatividade
sindical é corroída à medida que sua pretensão de falar pelo mundo do
trabalho ou ao menos de sua parcela majoritária torna-se crescentemente
insustentável.
A diminuição da participação dos trabalhadores e trabalhadoras
nos sindicatos, pelos motivos aqui apontados, somada à insegurança no
emprego gerada pela reestruturação produtiva, que tem no avanço
tecnológico uma maneira de poupar quantitativamente a força de trabalho,
leva, com o enfraquecimento da entidade representativa, a maior
exposição de algumas categorias de trabalhadores e trabalhadoras às
investidas dos capitalistas no sentido de diminuir o custo do trabalho,
sobretudo no que diz respeito aos direitos trabalhistas conquistados
através da luta organizada.
Todo esse novo contexto, como não poderia deixar de ser, tem
se refletido nas atuações dos sindicatos, ou no não-enfrentamento por
parte destes das atuais condições de exploração do trabalho. As greves,
em grande medida, têm deixado de ser um instrumento de luta dos
trabalhadores e trabalhadoras frente ao Capital para passar a realizar
ações, como temos visto nos últimos anos, de manutenção de empregos e
de alguns dos direitos conquistados historicamente.
Necessário se faz, ainda, apresentar com maior profundidade a
atuação da CUT nas décadas de 1980 e 1990, principalmente em relação
às greves.
O sindicalismo do Brasil nos anos 80 inovava nas suas
reivindicações pela criação das comissões de fábrica e desafiava o capital,
que procurava a manutenção do controle sobre o trabalho no lugar da
produção, colocando em questão o controle exercido durante todo período
de implantação do capitalismo industrial no Brasil.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 69 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

A CUT, composta nesse período pelas correntes sindicais mais


ativas, teve grande expressividade no movimento operário dos anos 80,
organizando as greves gerais em oposição às políticas adotadas pelo
governo brasileiro. Adotava uma postura oposicionista franca e direta de
maneira a construir uma estratégia sindical combativa em relação à política
pró-monopolistas, pró-imperialistas e pró-latifundiária do governo.
As greves gerais arquitetadas pela CUT resultaram em fortes
movimentos de contestação e foram de grande importância política,
enquanto forma de organização unificada dos trabalhadores e
trabalhadoras. Ao todo foram quatro greves gerais nesse período. A
primeira acontece em 1983, em pleno regime militar e protestava contra
um decreto que modificava a política salarial, tendo a participação de dois
a três milhões de trabalhadores e trabalhadoras. A segunda aconteceu em
1986, em protesto contra o Plano Cruzado II, particularmente contra o fim
do congelamento de preços. A terceira greve geral comandada pela CUT
realizou-se em 1987, contrapondo-se ao Plano Bresser e que tinha como
motivação as modificações nas políticas salariais, mas o movimento dava
também ênfase a palavras de ordem como: não ao pagamento da dívida
externa, reforma agrária, semana de quarenta horas e estabilidade de
emprego. A quarta greve aconteceu em 1989, protestando contra mais um
plano de estabilização do governo, o Plano Verão, que modificava a política
de indexação dos salários; o número de grevistas nesta greve dobrou em
relação à de 1987, chegando a vinte milhões de trabalhadores e
trabalhadoras19.
Essa última greve também contou com a participação ativa de
vários setores: os metalúrgicos e trabalhadores e trabalhadoras da
indústria automobilística e química, os petroleiros, os professores da rede
pública de ensino federal e estadual, entre outros. A principal característica
da greve foi a de ser uma reação ofensiva da classe trabalhadora brasileira
no sentido de se contrapor às investidas do capital e conquistar direitos
para a classe trabalhadora, que nesse período também sofria as
conseqüências das ações políticas e econômicas comandadas pelo
governo, que visavam dar maior espaço e criar melhores condições para o
desenvolvimento capitalista no Brasil20.
É justamente no período dos anos 80, que o surto de
reestruturação produtiva no Brasil sofre um novo avanço, de maneira a
incorporar as novas tecnologias nos processos produtivos e implementar
novas formas de gestão e controle da produção baseadas, sobretudo, nas
técnicas utilizadas nas fábricas japonesas e que correspondiam melhor as
vontades do capital internacional.
A partir dos anos 90, a luta sindical, e logicamente a CUT,
participam de um novo contexto histórico e social no Brasil. Com a vitória

19
Cf. BOITO, 1999.
20
Cf. ALVES, 2000.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 70 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

de Fernando Collor de Mello nas urnas e pelo voto popular, é eleito também
um projeto neoliberal para a política econômica brasileira. Um projeto que
visava criar as condições para instauração do neoliberalismo e que, mesmo
com a saída vergonhosa de Collor via Impeachment, continuou a ser
orquestrada pelos seus sucessores Itamar Franco e Fernando Henrique
Cardoso.
A abertura da economia para o capital estrangeiro, o aumento
das importações, o desmantelamento do parque industrial nacional e o
crescimento da miséria e do desemprego, são produtos conhecidos e
visíveis desse processo de liberalização da economia. Tais fatores, somados
à reestruturação do processo produtivo com base na aplicação de novas
tecnologias, tem colaborado para a precarização das relações de trabalho
no Brasil e, conseqüentemente, para o enfraquecimento das formas
organizativas e de luta da classe trabalhadora. As greves deste período
foram muito mais na busca de manter os direitos sociais conquistados
historicamente, ou na intenção de manter os empregos existentes, do que
movimentos de reivindicação e de tomada de controle do processo
produtivo ou de contestação ideológica.
Essa crise da organização sindical brasileira acabou por
colaborar para a instauração do novo modelo político e de acumulação,
pois, o sindicalismo classista e unificado que havia sido obstáculo durante
os anos 80, nos anos 90 desarticula-se e se torna debilitado em sua
capacidade de movimentação e organização da classe trabalhadora, o que
permitiu uma investida mais dura do capital sobre os trabalhadores e
trabalhadoras, apoiado pelas políticas do governo nacional que estimulou e
legalizou a precarização das relações de trabalho.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 71 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

CONCEPÇÕES E CORRENTES SINDICAIS NO BRASIL

Amarildo Carvalho de Souza e Domingos Corcione

A trajetória das concepções e correntes políticas que constituíram e


constituem o movimento sindical brasileiro, no campo e na cidade, é
reveladora do grau de desenvolvimento da luta de classes, aliás, mais que
isso, revela o grau de independência e maturidade política da classe
trabalhadora brasileira.
A classe trabalhadora, no campo e na cidade, luta não apenas por melhores
salários, mais também, pela superação das desigualdades sociais,
econômicas, politicas, raciais, étnicas, de gênero, e de geração. Nesse
sentido, as organizações sindicais e os movimentos populares, constituem-
se em espaços privilegiados de enfrentamento de interesses, muitas vezes
distintos.
Os trabalhadores e trabalhadoras não são um todo homogêneo e
monolítico, disposto a lutar de forma unânime pelas mesmas bandeiras.
Existem diferentes níveis de consciência de classe, de visões de mundo e
de projeto de sociedade. Inclusive, existem segmentos que muitas vezes
expressam programas de “conservação, melhoria e desenvolvimento do
capitalismo”.
A ENFOC não se propõe a aprofundar todas as concepções e correntes
politicas. Foi feita a opção de nos debruçar sobre 04 concepções e
correntes, na perspectiva de uma maior compreensão da trajetória e
contemporaneidade do sindicalismo no Brasil.
A reflexão e aprofundamento dessas concepções e correntes, parte da
identidade política do Movimento Sindical dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais, construída ao longo dos seus 43 anos de existência.
Esperamos que estes textos estimulem aos participantes do 1º Curso da
ENFOC, a pesquisar, refletir e compreender as ‘idéias’ que promoveu a
constituição e consolidação do movimento sindical brasileiro, no campo e
na cidade.

AS PRINCIPAIS IDÉIAS DO ANARQUISMO

Anarquismo vem da palavra grega ANARQUIA, que significa “contra o


governo, a autoridade e a dominação”.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 72 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Quanto à Sociedade e ao Estado, os Anarquistas defendiam as


seguintes idéias:
 O capitalismo deve ser derrubado e, como alternativa, deve ser
implantado o socialismo.
 O socialismo deve ser democrático, descentralizado, formado
por comunidades independentes, coordenadas a partir de
centros de produção dos trabalhadores e trabalhadoras
organizados em sindicatos.
 É preciso lutar contra o Estado (governo, parlamento, forças
armadas, poder judiciário, polícia...), as eleições e a Igreja, pois
são um mal e uma fonte de opressão.
Os anarquistas assumiam uma posição antiparlamentarista e
antipartidária. Pregavam a revolução proletária, o socialismo sem classes e
sem Estado, a auto-gestão e o internacionalismo proletário.
Quanto à concepção e à prática sindical, os anarquistas tinham
posições bem definidas. Para eles os sindicatos:
 Devem ser a arma principal de luta para derrubar o capitalismo
e implantar o socialismo.
 Deve organizar os trabalhadores e as trabalhadoras, formar sua
consciência política.
 Devem ser organizados a partir do local de trabalho e
implementar as lutas reivindicatórias, levando-as sempre mais
adiante.
 Deve organizar somente os trabalhadores e as trabalhadoras,
como classe que se opõe à classe dos patrões.
 Devem ser autônomos e livres, sem nenhuma interferência do
Estado, sustentados exclusivamente pelos trabalhadores e
trabalhadoras.
 Devem ser formados somente por trabalhadores e
trabalhadoras conscientes, dispostos a assumir a liderança na
luta pelo socialismo.
 Devem ser organizados em pequenos grupos de fábrica ou por
ofício, possibilitando a mais completa democracia, onde todos
tenham condições de participar.
 Devem se unir segundo os ramos de produção, em formas
federativas ou em confederações: em nível local, estadual e
nacional, sempre preservando a autonomia de cada
organização e evitando qualquer tipo de centralização que
venham a prejudicar a participação direta dos trabalhadores e
trabalhadoras em todas as decisões.
 Devem priorizar a ação direta (mobilizações, boicotes, greves),
visando organizar a greve geral, que derrubará o sistema
capitalista.
 Promover atividades culturais, que possam favorecer a
conscientização dos trabalhadores e trabalhadoras.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 73 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Os anarquistas eram contrários à liberação de dirigentes sindicais.


Não consideravam a aliança com a classe média.

O ANARQUISMO NO MUNDO
O anarquismo se iniciou na metade do século XIX, na França. Por
meio de Proudhon21, Bakunin22 - que foram seus primeiros idealizadores - e
de outros seguidores, se expandiu para a Rússia e para toda a Europa,
particularmente na Itália e na Espanha, até chegar aqui no Brasil no final do
século XIX, por meio de imigrantes espanhóis, italianos, portugueses,
franceses e belgas.

A DIFUSÃO DO ANARQUISMO NO BRASIL


As idéias anarquistas, apesar de já estarem presentes em alguns
segmentos da sociedade brasileira, começaram a ganharam força no Brasil
nas últimas décadas do século XIX, quando varias famílias de imigrantes
italianos chegaram ao sul do país, mais precisamente no Paraná e
posteriormente em Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Essas famílias
formaram comunidades com ideais libertários e constituíram as primeiras
cooperativas, mesmo enfrentando problemas econômicos e repressão.
As teorias e táticas do anarco-sindicalismo foram difundidas por meio
de livros, da imprensa, dos panfletos, e das decisões dos congressos
operários, seus principais veículos. O anarco-sindicalismo influenciou
também o campo, atribuindo um papel político e revolucionário ao
cooperativismo rural. Foram muitas as cooperativas e outras organizações
de caráter cooperativo criadas pelos anarquistas, tendo como objetivo a
ajuda mútua, em estreita relação com a luta e o projeto político
revolucionário.
A expansão do anarquismo foi rápida nas grandes cidades brasileiras,
nas primeiras décadas do século XX. Suas propostas de supressão do
Estado e de todas as formas de repressão encontraram receptividade entre
os trabalhadores e trabalhadoras, num contexto em que o jogo político era
exclusividade das oligarquias e inexistia qualquer proteção ao trabalho.

21
Precursor do anarquismo enfatizava o respeito à pequena propriedade, propondo a criação de cooperativas
sem fins lucrativos voltadas para o auto-abastecimento e de bancos que concedessem empréstimos sem juros
aos empreendimentos produtivos e crédito gratuito aos trabalhadores. Dizia que o Estado deveria ser destruído,
sendo substituído por uma "república de pequenos proprietários" organizada num sistema federativo.
22
Outro precursor do anarquismo, afirma que "A liberdade é o direito absoluto de todo homem ou mulher maiores
de só procurar na própria consciência e na própria razão as sanções para seus atos, de determiná-los apenas
por sua própria vontade e de, em conseqüência, serem responsáveis primeiramente perante si mesmos, depois,
perante a sociedade da qual fazem parte, com a condição de que consintam livremente dela fazerem parte".

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 74 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

AÇÃO DOS ANARQUISTAS NOS SINDICATO


Em 1906 houve o 1º Congresso Operário Brasileiro, com 43
delegados, eleitos por 28 organizações operárias de todo o País. O
Congresso fundou a Confederação Operária Brasileira (COB). As propostas
vencedoras do Congresso e a linha predominante da COB eram da corrente
dos anarquistas:
 A organização dos operários deve ser federativa e não
centralizada.
 O sindicalismo deve ser de resistência e não assistencialista.
 O importante é a ação direta da classe operária, sem passar
pela intermediação parlamentar: priorizar boicotes, greves e
outras formas diretas de luta.
 É preciso combater as visões reformistas dos agentes do
Governo e da Igreja Católica.
Como se viu acima, os anarco-sindicalistas entendiam que “a ação
direta deveria ser a grande bandeira do sindicalismo revolucionário". Por
isso, cada ação direta - greve, boicote, sabotagem, etc. - era considerada
um meio dos trabalhadores e trabalhadoras aprenderem a agir de uma
maneira solidária em sua luta por melhores condições de trabalho, contra
seu inimigo comum, os capitalistas. Essa conclusão partia da seguinte
convicção: cada ação direta é uma batalha na qual o proletário conhece as
necessidades da revolução, por meio de sua própria experiência, e se
prepara para a ação final, isto é, a greve geral que “destruirá o sistema
capitalista”. O anarco-sindicalismo – assim como o anarquismo em geral –
considerava que nas ações diretas seria legítimo o uso de um certo tipo e
grau de violência.
Essa concepção e as práticas dela decorrentes se constituíam numa
das características diferenciais do anarco-sindicalismo em relação a outras
correntes e formas de ação do sindicalismo brasileiro. A sabotagem – por
exemplo - era vista como especialmente eficaz para o proletariado, no caso
em que ele não pudesse entrar em greve. A destruição de equipamentos
tocaria no ponto fraco do sistema, pois as máquinas são de mais difícil
substituição do que os trabalhadores e as trabalhadoras.
Como principais divulgadores do ideário anarquista destacaram-se
José Oiticica, Everardo Dias e Edgard Leuenroth. Os primeiros jornais
anarquistas e anarco-sindicalistas tentaram se sustentar apenas com as
contribuições dos militantes. Como era ainda um número reduzido e não
possuíam muitos recursos econômicos, acabaram sendo poucos os jornais
anarquistas que chegaram a publicar mais de cinco números.
A partir de 1908 a COB publicou seu jornal nacional “A VOZ DO
TRABALHADOR”. Esse jornal continuou irregularmente até 1920, com o
desmantelamento da própria COB.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 75 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

A greve de 1917 foi comandada pelos anarquistas. A maioria de


jornais da época atestou a força e organização dos anarquistas do Brasil.
Isso não quer dizer que não havia outros grupos políticos que dividiam com
eles a liderança do movimento operário.
Depois da greve, apesar de alguns avanços em termos de legislação
social, houve anos difíceis para o movimento operário, que foi obrigado a
enfrentar grandes desafios. O principal foi o recrudescimento da repressão
por parte do governo.
Em 1921 foi aprovada a Lei de Expulsão dos Estrangeiros, que
legitimava a deportação sumária de lideranças envolvidas em “distúrbios
da ordem” e o fechamento de organizações operárias. Os principais alvos
passaram a ser os anarquistas. A justificativa utilizada para a aprovação
dessa lei repressiva era evidente: o movimento operário estava sendo
controlado por lideranças estrangeiras radicais, que iludiam trabalhadores e
trabalhadoras nacionais!
Desde o início dos anos ’30 as principais categorias de trabalhadores
e trabalhadoras do Estado de São Paulo estavam organizadas em
sindicatos. Havia duas federações estaduais:
 A Federação Operária de São Paulo (FOSP), com o maior
número de sindicatos e algumas categorias mais importantes
da capital paulista, sob a influência anarco-sindicalista.
 A Federação Sindical Regional de São Paulo (FSRSP), dirigida
pelos comunistas, (sindicatos de cidades do interior, que não
contavam com bases expressivas na capital).
Durante toda a década de 1930 os anarco-sindicalistas foram à única
corrente sindical que se manteve irredutível na defesa da organização
autônoma dos trabalhadores e trabalhadoras, assim como na oposição ao
sindicalismo corporativista.
Contudo, essa posição os levou ao isolamento político e contribuiu –
no contexto das crescentes dificuldades relativas à sobrevivência dos
sindicatos livres – para sua perda de influência no movimento sindical.
Enquanto a força dos anarquistas foi diminuindo, foi crescendo a influência
dos comunistas no movimento sindical.
Mais tarde, com a implantação da Estrutura Sindical – que tinha o
Estado como seu principal regulador - a corrente anarquista foi perdendo
cada vez mais expressão e presença no movimento sindical, que se
expandia e se consolidava no Brasil.

ONDE ATUAM HOJE OS ANARQUISTAS?


Apesar da reduzida presença de anarquistas no sindicalismo, suas
idéias continuam vivas em vários segmentos da sociedade, inclusive entre

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 76 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

trabalhadores e trabalhadoras, organizações sociais e sindicais, no Brasil e


no mundo.
Existe uma carência de informações relacionadas com o anarquismo e
sua atuação na atualidade, devido à ausência de registros mais precisos.
Desde os anos ‘80 foi identificado em muitas atividades de massa o
movimento anarco-punk, que continua sendo ativo até hoje.
Os anarquistas podem ser vistos também:
 Em manifestações realizadas para expressar insatisfações e
protestos contra reuniões e encaminhamentos promovidos pelo
grupo de países mais ricos (G 08), pela OMC e pelo BID.
 Em organizações sociais – de ambientalistas, de mulheres,
jovens...
Nesses grupos ou reuniões podem até aparecer divergências - entre
os próprios anarquistas ou entre eles e as demais correntes, quanto às
estratégias de luta e à maneira de atuar - mas eles têm um ponto em
comum: a luta contra qualquer sistema opressor.

TRAJETORIA DO SINDICALISMO “AMARELO” OU “PELEGO”.


O sindicalismo “amarelo” ou “peleguismo” é um fenômeno antigo no
sindicalismo brasileiro, refletindo a forte influencia de patrões e do Estado
no movimento operário. É constituído por uma enorme massa de dirigentes
burocratizados, para os quais o sindicato tem apenas um papel
assistencialista e de intermediário legal nas relações entre o capital e o
trabalho. Esse é o aspecto político e social mais profundo da questão: o
“pelego” é o agente dos patrões e do Estado no movimento sindical.
Já em 1908 o jornal anarquista “A VOZ DO TRABALHADOR” órgão da
Confederação Operaria Brasileira – COB definiu-os como “operários que
bajulam os potentados, em prejuízo da autonomia da classe”. Em que pese
a forte presença dos anarquistas e, posteriormente dos comunistas e
socialistas nas direções dos sindicatos, os amarelos ou pelegos
representavam à maioria dos dirigentes na época. Os grupos
revolucionários os chamavam pejorativamente de "amarelos".
Particularmente no Rio de Janeiro era bastante influente essa corrente
política moderada, não revolucionária, interessada em obter conquistas
específicas como diminuição da jornada de trabalho e aumentos salariais.
Esses grupos preocupavam-se ainda em garantir o reconhecimento dos
sindicatos por parte do Estado.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 77 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

O presidente Hermes da Fonseca, em 1912, desenvolveu a primeira


ação concreta para uma intervenção governamental nas decisões das
organizações de trabalhadores, pois organizou um congresso com
representações sindicais, mais que teve grandes conseqüências.
Em 1921 o Estado fundou o Conselho Nacional do Trabalho, visando
controlar os sindicatos e torná-los órgãos de conciliação entre as classes.
Foi criada também a Confederação Sindicalista Corporativista Brasileira, de
tendência reformista. Os Sindicatos “amarelos” passaram a ser ainda mais
favorecidos pelas vantagens concedidas pelo Estado. Principalmente os
setores cujas atividades eram indispensáveis para a exportação do café,
como ferroviários e portuários, tinham prontamente atendidas suas
reivindicações, uma vez que sua paralisação estrangularia a economia. Já
as categorias vinculadas à indústria, dado seu caráter secundário na
economia agro-exportadora, eram tratadas de forma exclusivamente
repressiva. Lembre-se aqui a afirmativa do Presidente Washington Luís de
que “a questão social era simples caso de policia”.
Mas foi durante a década de 30 que os pelegos conseguiram as
condições mais favoráveis para se eternizarem nas direções sindicais.
“Pelego”, deixou de significar a manta colocada entre o cavalo e a sela para
amortecer os solavancos e passou a ser sinônimo de sindicalista
acomodado e comprometido com os patrões e o governo.
À medida que o Ministério do Trabalho intervinha nos Sindicatos,
Federações e Confederações e destituía suas direções, os pelegos eram
indicados para dirigi-las a partir das orientações governamentais. A criação
do Imposto Sindical era o que faltava para garantir a imensa estrutura –
com médicos, dentistas, escolas, dentre outras – criada naqueles sindicatos
em que o pelego era sua representação maior.
O chamado Estado Novo, dentre outras coisas, consolidou a seguinte
concepção, “o sindicalismo brasileiro deve ser corporativo, isto é, um
sindicalismo que concilie patrões e operários e não um sindicalismo
revolucionário, baseado na luta entre classes inimigas, como
historicamente foi feito nas décadas anteriores”.
Já nos primeiros anos da década de 1940 o Estado Novo mostrava
seus primeiros sinais de debilidade; consequentemente, o sindicalismo
amarelo passou a ficar na defensiva. Com a extinção do Departamento de
Imprensa e Propaganda (DIP) e do Tribunal de Segurança Nacional –
organismos de repressão ideológica e política, existentes durante o Estado
Novo –, esse segmento conservador encontrou ainda mais dificuldades.
Uma O avanço das lutas operárias foi freado com o golpe e o governo
do Marechal Dutra. Dentre outras medidas, Dutra proibiu a existência do
Movimento Unificado dos Trabalhadores (MUT), colocou na ilegalidade o
partido comunista, decretou a intervenção e suspensão das eleições
sindicais. Tudo isso facilitou que os pelegos retornassem às direções dos
sindicatos mais importantes do país.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 78 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

A retomada das lutas politicas e sindicais no início dos anos 1960


recolocaram os pelegos na defensiva. A fundação do Comando Geral dos
Trabalhadores (CGT), por exemplo, objetivava - dentre outras coisas -
combater o ‘peleguismo’ das Confederações Nacionais, especialmente da
CNTI, dominada há décadas pelo pelego Ari Campista. Durante este
período, os pelegos receberam apoio financeiro da Confederação
Internacional das Organizações Sindicais Livres – CIOSL, da Organização
Regional Interamericana do Trabalho – ORIT, dentre outros organismos
sindicais internacionais ligados ao governo norte-americano.
Além de receberem todos esses apoios financeiros, muitos dirigentes
pelegos tornaram-se interventores do Ministério do Trabalho durante o
governo militar, a exemplo da CONTAG, que em 1964 teve sua presidência
ocupada por um deles. O assistencialismo foi mantido e, fortalecido na
grande maioria das entidades sindicais; os pelegos voltaram a ter
hegemonia e domínio sobre os destinos do sindicalismo brasileiro.
Apesar dessa hegemonia, durante o congresso promovido pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria – CNTI, em julho de
1978, um grupo de sindicalistas que se autodenominavam ‘autênticos’,
denunciaram a direção pelega da CNTI e apresentaram uma “Carta de
Princípios”, que se tornou a principal referencia para a retomada das
entidades sindicais operarias.
As transformações mais recentes ocorridas nos anos 1980 - anistia
aos exilados políticos; fim do bipartidarismo; eleições diretas; assembléia
constituinte - estimulou o sindicalismo pelego a um processo de auto-
reforma, uma modernização conservadora. Esse sindicalismo foi
modificando sua forma de ser, para permanecer como órgão de controle
sindical e político, procurando coibir as ações autônomas e independentes
dos trabalhadores e trabalhadoras.

O SINDICALISMO DE RESULTADOS E FORÇA SINDICAL


O sindicalismo de resultado nasceu, inicialmente, da confluência de
duas atuações sindicais que vivenciaram trajetórias distintas e que, num
dado momento, na segunda metade da década de 1980, abraçou o mesmo
projeto.
Referimo-nos à confluência da atuação de amarelos ou pelegos com a
ação de líderes sindicais pragmáticos. Assim formou-se, no Brasil, uma
nova direita no movimento sindical, distinta do velho ‘peleguismo’ e
perfeitamente inserida na onda neoliberal, que penetrou também no
movimento sindical em nosso país.
Alguns dos pontos centrais do seu ideário são:

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 79 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

 Reconhecimento da vitória do capitalismo e da inevitabilidade


da lógica do mercado.
 Restringir a luta sindical à busca de melhorias nas condições
de trabalho, não cabendo aos sindicatos extrapolarem este
âmbito da luta.
 Atribuir o papel da ação política exclusivamente aos partidos,
que devem estar totalmente desvinculados da ação sindical.
 Diminuir o papel do Estado, reduzindo apenas sua ação a uma
linha política privatizante.
Estes pontos básicos - aliados a uma estratégia que recusa o
confronto e procura extrair resultados imediatos nas ações sindicais,
calculadas para que não extrapolem o âmbito da negociação -
conformaram uma feição neoliberal e burguesa no seio do movimento
sindical brasileiro. Por isso, dizíamos, é algo muito distinto do peleguismo
(sempre atrelado ao Estado e dele porta-voz) e conforma o que
caracterizamos como sendo a nova direita no movimento sindical. Este é o
âmbito e o campo ideológico onde o sindicalismo de resultados opera e
atua.
Conforme disse Luís Antônio Medeiros, em entrevista à Folha de S.
Paulo (20/08/87): “Eu acho que o capitalismo venceu no Brasil... Eu quero a
divisão das riquezas e a minha briga não é pela mudança do regime”. E
quanto ao papel dos sindicatos: “O sindicato é um fator de mercado e deve,
portanto, valorizar o preço de mão-de-obra”. “Estamos procurando
caminhos novos. Eu diria que todo sindicato que se preze faz parte da
reprodução capitalista. Pois, qual é o objetivo do sindicato? É lutar para
vender a mão-de-obra pelo preço mais alto possível. Se crio o mercado
interno estou fortalecendo o nosso capitalismo”.
A Força Sindical, contando com o apoio de cerca de 300 sindicatos,
duas confederações e vinte federações – fundada no início de 1991 -
caminha no sentido de consolidar o sindicalismo de resultado: um
sindicalismo que projete “que todos (os trabalhadores) necessitam, e
exigem uma central sindical que não seja ‘revolucionarista’”.
Foi a Força Sindical que introduziu a prática recorrente de um 1° de
maio como um circo para os trabalhadores e trabalhadoras. É a política de
pão e circo. Para atrair um grande público, a Central organiza grandes
manifestações, chama artistas da indústria cultural. Que fazem sucesso
freqüentemente pela música de baixíssima qualidade e doam
apartamentos, carros, eletrodomésticos” 23.

23
Ricardo Antunes é professor livre docente em sociologia do trabalho na Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp), in Jornal dos Trabalhadores Rurais SEM TERRA Ano XXIV – numero 252 – maio de 2006.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 80 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

ALGUNS REFERENCIAIS TEÓRICOS DO COMUNISMO


Com base no assim chamado “socialismo científico” no final do século
XIX, tendo a frete Karl Marx e Friedrich Engels, os sindicatos passaram a
ser vistos como instrumentos que devem contribuir para a luta
revolucionária do proletariado pela tomada do poder político. Essa doutrina
passou a se diferenciar tanto dos reformistas, que pregam mudanças
graduais no capitalismo, como das anarquistas, que negam a luta política
pelo poder.
Para Marx, “os sindicatos são indispensáveis para a guerra de
guerrilha cotidiana entre o capital e o trabalho”. Seu objetivo
imediato “concretiza-se nas exigências do dia-a-dia, nos meios de
resistência contra os incessantes ataques do capital”. Mas a
concepção Marxista vai além. Aponta outros objetivos da atividade sindical,
não se limitando a uma visão economicista. Os teóricos do comunismo
vêem os sindicatos, sobretudo, como centros organizadores do
proletariado, que devem ser “escolas do socialismo”. Marx diz:
“O capital é o poder social concentrado, enquanto o operário só dispõe da
sua força de trabalho. O contrato entre capital e trabalho não pode,
portanto, repousar nunca em justas condições... Do lado do operário sua
única força é o número. Mas a força do número se quebra pela desunião. A
divisão dos operários é produto e resultado, da inevitável concorrência
entre eles próprios. Dos sindicatos nascem precisamente os impulsos
espontâneos dos operários para eliminar, ou pelo menos reduzir essa
concorrência, a fim de conseguir melhores condições que os coloquem ao
menos em situação superior à de simples escravos”.
Partindo desse princípio norteador, o marxismo condena o
economicismo, as correntes que encaram os sindicatos nos estreitos
marcos corporativos. Para essa concepção, a luta puramente econômica
não conduz a nada, já que o capitalismo tem capacidade para assimilar as
pequenas melhorias salariais - garantindo sua taxa de mais-valia. Isso não
significa que o marxismo negue a luta econômica. Muito pelo contrário.
Mostra apenas suas limitações e prega a transformação da luta econômica
em luta política pela tomada do poder.
Acompanhando a evolução do sindicalismo, principalmente o da
Inglaterra, Marx vai perceber a miopia economicista e apontará qual deve
ser a tarefa maior dos sindicatos no capitalismo. “Os sindicatos trabalham
bem como centros de resistência contra os ataques do capital. Mas
demonstram ser partes ineficazes em virtude do mal compreendido uso de
sua força. Em geral, erram o caminho porque se limitam a uma guerra de
guerrilhas contra os efeitos do sistema existente, em vez de trabalharem,
ao mesmo tempo, para a sua transformação, usando a força organizada
como alavanca para a libertação definitiva da classe operária”.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 81 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Entretanto, o marxismo não adota a mesma visão dos anarquistas


nessa questão. Ele aponta que a greve não deve ser vista como a única
arma de luta dos trabalhadores e trabalhadoras. Para o marxismo, a greve
deve ter como principal objetivo organizar os trabalhadores, acumular
forças, preparando para as novas batalhas. Relaciona sempre as lutas
parciais com seu objetivo final, que á a tomada do poder pelo proletariado.
Por isso, uma greve por interesses imediatos, que coloquem em risco a
organização dos trabalhadores e trabalhadoras, deve ser rejeitada.
Outra característica da corrente marxista é a defesa da unidade dos
trabalhadores, o marxismo condena as tentativas de dividir as organizações
sindicais por motivos político-partidários ou religiosos. Exatamente por isso,
o marxismo vai fazer esforços no sentido da unidade dos trabalhadores.
Para Lênin, “Não atuar no seio dos sindicatos reacionários significa
abandonar as massas operárias insuficientemente desenvolvidas ou
atrasadas à influência de líderes reacionários, dos agentes da burguesia,
dos operários aristocratas ou operários aburguesados”.
Exatamente por enfatizar que o primeiro objetivo do proletariado é a
conquista do poder político, a concepção marxista ressalta a supremacia do
partido político sobre o sindicato. Para ela, o partido revolucionário é um
estágio superior de organização. Quando fala em supremacia do partido, o
marxismo não nega a importância da luta sindical, mas destaca que há
diferenças entra assas duas formas de organização e que elas devem ser
preservadas. Contudo, essas premissas não eliminam o risco de uma
submissão do sindicato ao partido. Talvez seja também por isso que os
comunistas tenham sido muitas vezes acusados de fazerem do sindicato
uma mera “correia de transmissão do partido”.

PARTICIPAÇÃO DOS COMUNISTAS BRASILEIROS NO


MOVIMENTO SINDICAL
No Brasil, o comunismo surgiu a partir da desagregação do
anarquismo – e não da crise da social democracia, como em outros países –
e a história dos primeiros anos desse movimento é a crônica de seu esforço
para derrotar a influencia anarquista e indicar novos rumos à luta operaria
e sindical.
A partir de 1922, embalados pela criação do primeiro Estado
socialista na Rússia, militantes brasileiros fundaram o Partido Comunista do
Brasil (PCB), que se de um lado não se apresentava como uma alternativa
imediata de poder causou apreensão do Estado oligárquico. Entre os
fundadores estavam ex-lideranças anarquistas como Astrojildo Pereira e
Otávio Brandão.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 82 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Ao contrário dos anarquistas, que viam o Estado como um mal em si,


os comunistas o viam como um espaço a ser ocupado e transformado.
Essas concepções os levaram, seja na ilegalidade, seja nos breves
momentos de vida legal, a buscarem aliados e a participar da vida
parlamentar do país.
Entre a fundação do Partido Comunista e seu II Congresso em 1925, a
principal palavra de ordem dos comunistas foi “ir às massas”. Nesse
sentido, muitos esforços foram feitos para fortalecer o movimento sindical,
levando-os a se chocarem com os anarquistas e com a repressão policial.
As décadas de 20 e 30 do século passado foi um período de grandes
desafios para o movimento sindical brasileiro, marcado pela forte repressão
ao movimento sindical independente e pela regulamentação e controle das
relações de trabalho e da organização sindical pelo Estado Getulista.
Em 1929 é criada a Confederação Geral dos Trabalhadores Brasileiros
– CGTB (funcionando até 1936) sob controle dos comunistas que passam a
exercer a hegemonia sobre o movimento sindical brasileiro. Os comunistas
defenderam desde o inicio a unidade sindical; em conseqüência, surgiram
as duas características marcantes da atuação comunista: o trabalho em
sindicatos reacionários e pelegos e a politização da luta operaria (contra o
imperialismo e contra o latifúndio).
Os primeiros aos da década de 1930, foram de luta entre os
sindicatos livres e o governo. As entidades operárias independentes não
aceitavam os decretos sobre sindicalização. Contudo, crescia
progressivamente o numero de entidades organizadas conforme a
legislação e, dirigida por sindicalistas ligados ao Ministério do Trabalho ou
que aceitavam sua tutela.
Com a promulgação da Constituição Federal em 1934, a influencia
sindical dos comunistas cresceu, “o PCB organizou o Congresso de Unidade
Sindical, com representantes de 300 sindicatos de todo o país”. No ano
seguinte, “o PCB organizou a Confederação Sindical Unitária do Brasil, num
congresso com 400 delegados de 11 estados”, alem de junto com outros
segmentos da sociedade, constituir a Aliança Nacional Libertadora, “frente
única revolucionária anti-imperialista e anti-feudal, que lutava por um
governo popular e que chegou a congregar em suas fileiras amplas massas
populares do país inteiro, e os mais variados atores sociais, desde o
proletariado até a burguesia nacional”, perseguida pelo Governo Vargas.
Em 1937, Getulio Vargas rasgou – por meio de um golpe - a
Constituição e dá origem ao Estado Novo. O Partido Comunista foi
praticamente dispersado, os sindicalistas comunistas foram perseguidos e
afastados das direções de inúmeras entidades.
Quando o Estado Novo entrou em crise, o Partido Comunista começou
a se reorganizar em entidades sindicais. Uma de suas primeiras iniciativas
foi à rearticulação do movimento sindical independente, em 30 de abril de
1945, funda o Movimento Unificador dos Trabalhadores – MUT, apoiado por

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 83 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

300 dirigentes sindicais de 13 estados. Seu manifesto pedia “a mais ampla


liberdade sindical; a soberania das assembléias sindicais, sem a presença
obrigatória do Ministério do Trabalho; eleição e posse dos dirigentes
sindicais independente da aprovação pelo governo; autonomia
administrativa para os sindicatos, etc.”.
Naquela conjuntura os sindicalistas comunistas orientados pelo
partido, defendiam claramente a conciliação de classes: “por intermédio
das organizações sindicais a classe operaria pode ajudar o governo e os
patrões a encontrar soluções práticas, rápidas e eficazes para os graves
problemas econômicos de hoje”, defendia Luiz Carlos Prestes, secretário-
geral do Partido Comunista. Essa orientação de fundo oportunista estava
baseada na idéia de que, “com a derrota do nazismo, surgia uma nova
época, de desenvolvimento pacifico, que prescindiria da revolução.”.
Com o governo do Marechal Dutra, foi desencadeado outra ofensiva
conservadora contra a classe trabalhadora: intervenção em mais de 400
importantes sindicatos, fechamento do Partido Comunista e da CGTB;
perseguição a todos os sindicalistas independentes. Com a eleição de
Vargas em 1950, os direitos individuais e coletivos retornam a normalidade,
principalmente com a extinção do ‘atestado ideológico’.
Durante o governo Vargas e, após o suicídio do presidente em agosto
de 1954, o partido coordenou uma ampla articulação de setores
nacionalistas para a formação de uma frente democrática, dando inicio à
aliança do Partido Comunista com o Partido Trabalhista Brasileiro, que
congregava sindicalistas getulistas. Um novo período de colaboração de
classes se esboçava, “ajudando a colocar o movimento sindical em função
dos interesses de determinados setores burgueses. Tal tendência refletiu-se
logo no refluxo da luta pela autonomia sindical e pela destruição da
estrutura sindical corporativista. O movimento sindical passou a acomodar-
se”.
A hegemonia desses setores dentro do partido e dentre os
sindicalistas comunistas crescia ano a ano. A reação de militantes
comunistas vem a ocorrer com mais força em 1962, numa Conferência
Nacional Extraordinária, quando foi reorganizado o Partido Comunista do
Brasil, adotando a legenda PC do B. No mesmo ano, foi criado o Comando
Geral dos Trabalhadores – CGT, uma central que colocou em pânico as
elites com a perspectiva daquilo que eles chamavam de “República
Sindicalista”.
A orientação cupulista para o sindicalismo continuava com forte
influencia em importantes estruturas sindicais, a exemplo das
Confederações: dos trabalhadores na indústria – CNTI; dos trabalhadores no
comercio – CNTC; dos trabalhadores em transporte marítimos, fluviais e
aéreos – CNTTMFA; dos trabalhadores em empresas de credito – CONTEC; e
suas Federações Estaduais. Contudo, esta aparente força não se materializa

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 84 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

em reação dos trabalhadores e das suas organizações, ao golpe militar que


depôs João Goulart.
A nova conjuntura forçou o movimento sindical combativo a recuar.
As tentativas mais importantes de contrapor-se à perseguição policial e ao
arrocho salarial revelaram as limitações existentes e os dilemas em que o
movimento operário se debatia, a exemplo das greves de Contagem – MG e
de Osasco – SP em finais da década de 1960.
Essa época de recuo durou até 1977, quando o país voltou a mover-
se, exigindo o fim da ditadura, anistia aos políticos perseguidos, o fim da
alta do custo de vida, etc. Em 1978, ocorre a primeira grande greve
operaria no ABC. A partir de 1988, os dirigentes sindicais comunistas
ligados ao PC do B, passaram a se organizar na Corrente Sindical Classista.

ALGUNS REFERENCIAIS DO SINDICALISMO CRISTÃO


A partir da encíclica Rerum Novarum (Das coisas novas), publicada
pelo Papa Leão XIII, em 15 de maio de 1891, a Igreja Católica adota
oficialmente uma doutrina para a sua atuação no movimento social,
principalmente no sindicalismo. Até esta data, essa instituição ainda
preservava suas tradições elitistas e aristocráticas, próprias de período
feudal.
Durante o feudalismo, a Igreja possuía grande poder. Ela era a maior
propriedade feudal da Europa, controlando cerca de 1/3 das terras
agricultáveis. Exercia com exclusividade o poder religioso, sendo o poder
espiritual do sistema em vigor. E era também o poder político. Os feudos,
dispersos e constituindo-se como mini-Estados, dependiam da instituição
religiosa para manter o controle político. A Igreja exercia esse poder, via
seus tabus ideológicos, para preservar a “pureza da alma humana” e
através da repressão - tão marcante no período da Inquisição.
A igreja resistiu violentamente ao fim do feudalismo. Segundo o
sermão mais conhecido na Europa no século XVI, “Deus fez clérigos, mas os
demônios fizeram a burguesia”. O capitalismo, entretanto vigora, a Igreja
perde poder, tanto econômico, como político. Posteriormente, entretanto, a
própria burguesia dá espaço para a refundação da Igreja. Depende dela
também para controlar o jovem proletariado. A Igreja se adapta ao novo
sistema social, apesar de num primeiro momento manter suas tradições
aristocráticas.
Esse conservadorismo não corresponde à mentalidade emanada do
novo sistema. As relações capitalistas de produção enfraquecem os
preconceitos religiosos. O proletariado, diferente do servo camponês, é um
homem “livre”. Surgem os primeiros conflitos de classe, o luddismo, as

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 85 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

greves, e também as novas formas de organização dos explorados - os


sindicatos e as cooperativas. Parcelas da jovem classe operária se
aproximam das idéias anarquistas e marxistas. A Igreja perde base social. A
religiosidade popular não garante mais a sustentação da instituição
católica. Daí o surgimento da Rerum Novarum, que é um marco na viagem
da Igreja católica com vista aos movimentos sociais.
De acordo com essa encíclica papal, existe no capitalismo “uma
desigualdade natural, necessária e conveniente para o homem. Os
exageros de injustiças devem ser reformados, procurando encontrar-se
função social” do capital, para torná-lo um sistema “justo e eqüitativo”.
Entre capital e trabalho não deve haver antagonismos, luta de classes
obedecendo-se os princípios da “caridade cristã”. A Confederação
Internacional dos Sindicatos Cristãos, central sindical fundada no Congresso
de Haia, em 1920, chega a afirmar que “a vida econômica e social implica a
colaboração de todos os filhos de um mesmo povo.” Rejeita, portanto, a
violência e a luta de classes.
A Rerum Novarum vai criticar tanto o socialismo como o liberalismo.
O para qualifica o pensamento socialista como falso, porque prega a
supressão da prioridade privada - “que é um direito natural dos homens”.
Além disso, Leão XIII considera as idéias socialistas subversivas, “porque
gera ódios e extingue nos homens o estímulo ao trabalho”. Para a Rerun
Novarum, “o capital e o trabalho devem viver em colaboração um com
outro, obedecendo aos princípios da caridade cristã”. Ela confia a sorte dos
trabalhadores à ação do Estado, que deve estabelecer leis para proteção e
promoção do ser humano. A encíclica propunha a criação dos sindicatos aos
moldes das antigas corporações de artesãos e também estimulava a
formação de associações mutualistas.
Com base nessa doutrina, os militantes católicos atuaram no
sindicalismo com uma concepção reformista, de conciliação de classes. Eles
rejeitaram energicamente as greves e outras formas de confronto.
Defenderam o papel assistencialista dos sindicatos. Para realizar as
reformas graduais no capitalismo, afirmam que o terreno propício é a
própria Igreja - já que ela reúne patrões e empregados, “filhos de um
mesmo Deus”. O fundamental é a paz social, a harmonia entre as classes,
tendo como mediadora a Igreja - que dessa forma tenta readquirir o seu
poder político.
Outra característica fundamental do sindicalismo cristão é o
anticomunismo. Muitos historiadores, inclusive católicos, afirma que a Igreja
só passou a se preocupar com o movimento sindical como forma de se
contrapor ao aumento da influência das idéias revolucionárias. “Ela nasceu,
sobretudo para enfrentar o avanço do socialismo, particularmente a
revolução social do marxismo”, explica José Cândido Filho, autor do livro “O
movimento operário: o sindicato e o partido”.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 86 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Miguel Gonzáles Núniz acredita que uma das causas do fraco


desenvolvimento da corrente cristã é que ela não atuará nos sindicatos
como organismos de luta por conquistas materiais, mas para “proteger os
trabalhadores católicos contra os perigos socialistas”. Outra razão, segundo
o autor, é que “o sindicalismo cristão aparece tardiamente (43 anos depois
do Manifesto Comunista de Marx e Engels), quando as massas proletárias,
desiludidas também no plano espiritual (desconfiança da irmandade
capitalismo-poder-igreja), haviam abandonado as Igrejas, católicas ou
protestantes, ou melhor, tinham sido abandonadas por estas”. Os estatutos
dos Círculos Operários Católicos no Brasil são bem elucidativos. Um dos
primeiros itens de seu objetivo era o “combate ao comunismo”.
A Igreja advoga a separação dos católicos dos que professam
confissões e idéias diferentes, seu temor era o contágio dos fiéis com as
novas idéias. Essa tese, que leva à fragmentação da organização sindical,
foi levada à prática em vários países, principalmente na Europa.

SINDICALISMO CRISTÃO NO BRASIL


Desde o início da atuação organizada dos católicos no sindicalismo
brasileiro, tendo a frente o cardeal Sebastião Leme, a Igreja organizou os
círculos operários, que atuavam por fora dos sindicatos existentes. Na
Constituinte de 1934, os deputados vinculados à Igreja defenderam,
juntamente com a reação, a implantação do pluralismo sindical - que
inclusive é aprovado.
Em pleno Estado Novo, a hierarquia católica apresenta ao ditador
Getúlio Vargas a proposta de transformar os aproximadamente 400 círculos
operários católicos existentes em sindicatos paralelos. E na Constituinte de
1945, mais uma vez, os deputados eleitos com o apoio do LEC (Liga
Eleitoral Católica), defendem, juntamente com os parlamentares da UDN, a
implantação do pluralismo sindical.
Os Círculos Operários, Escolas de Lideres Operários e Movimento de
Orientação Sindical, foram responsáveis pela formação de inúmeras
lideranças sindicais em todo o país. Estas lideranças estiveram ao lado dos
conspiradores do golpe militar de 64. Vários materiais foram publicados
nesse sentido, dentre eles, um livreto muito difundido “Como combater os
comunistas nos sindicatos”, da Federação dos Círculos Operários de São
Paulo, escrito por Frei Celso em 1964.
As mudanças que a Igreja vivia a nível internacional tiveram
influencia decisiva nesse quadro. O Concilio Vaticano II já havia apontado o
caminho da realização do reino de Deus neste mundo neste mundo, uma
direção que seria seguida por enorme parcela do clero brasileiro que, por
sua vez, influiria de forma também decisiva na modernização do clero
latino-americano e na formulação da Teologia da Libertação.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 87 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

A Igreja do Nordeste foi pioneira nas criticas radicais contra o regime.


Em 1966, com o apoio da Regional Nordeste II da CNBB, o manifesto
“Nordeste, desenvolvimento sem justiça”, uma forte denúncia do regime e
da situação da classe trabalhadora. O documento foi confiscado pela policia
e os bispos foram proibidos de publicá-lo D. Helder Câmara, bispo de
Recife, foi acusado de comunista e ameaçado de prisão.
As profundas mudanças promovidas pelo CELAM (Conselho Episcopal
Latino Americano) em Medellín, em 1968 (confirmadas em Puebla, em
1979), que recomendavam a opção preferencial pelos pobres,
fundamentavam a atuação dos progressistas da Igreja brasileira. Um dos
resultados mais visíveis das mudanças promovidas em Medellín foram as
comunidades eclesiais de base – CEBs, que proliferaram nas grandes e
medias cidades brasileiras a partir de finais da década de 1960, como
importantes instrumentos de organização e mobilização. Calcula-se que no
auge do movimento, no final da década de 1970, seu numero chegou a
atingir entre 50 a 100 mil CEBs, em todo o país, envolvendo mais de 2
milhões de filiados.
Quando o movimento operário brasileiro atingiu novo patamar, na
onda de greves iniciada em 1978 os militantes católicos tiveram papel
destacado na reorganização do movimento sindical, no afastamento das
diretorias pelegas dos sindicatos e, principalmente, na articulação do
Partido dos Trabalhadores. O assassinato de Santo Dias da Silva, no ano
seguinte, levou a uma maior intensificação das manifestações, ele que era
dirigente da Pastoral Operaria e muito próximo de D. Paulo Evaristo Arns,
tornou-se um dos mártires da luta operaria.
A aproximação entre militantes da oposição sindical, de movimentos
de base, e lideranças católicas, acelerou-se com as greves. Um importante
encontro de lideres de pastorais operarias, de movimentos populares, de
comunidades eclesiais de base, oposições sindicais, e ativistas ligados às
novas diretorias sindicais “autenticas” ocorreu em João Monlevade, Minas
Gerais, em fevereiro de 1980, onde foram estabelecidos “alguns princípios
básicos ligados à luta pela democratização da estrutura sindical”.
Em junho de 1982, essas forças politicas formaram a ANAMPOS
(oficialmente, IV Encontro Nacional da Articulação Nacional dos Movimentos
Populares e Sindicais), em Goiânia. Em 1983, esse movimento culminou na
fundação da Central Única dos Trabalhadores – CUT, com o apoio da imensa
maioria dos militantes católicos e, militantes de outras concepções e
correntes políticas.

QUADRO-SÍNTESE
POSIÇÕES MEIOS PROPOSTOS OBJETIVOS

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 88 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

1. CRISTÃOS  Sem violência.  Desenvolver a função


(católicos)  Colaboração entre as social do capitalismo,
classes. em vista de uma
 Luta contra as sociedade fraterna e
injustiças. justa.
 Evitar o agravamento
dos conflitos sociais.

 Colaboração de  Continuidade do
2. AMARELOS classes. capitalismo.
 Sindicatos e  Negação da existência
organizações comuns da luta de classes.
(entre patrões e  Sociedade harmoniosa.
operários).
 Sindicatos
assistencialistas.

 O Partido é o principal  Destruição do


instrumento de luta. capitalismo.
 Combinação de ação  Revolução proletária.
3. COMUNISTAS
legal e clandestina.  Ditadura do
 Participação Proletariado.
parlamentar.  Socialismo e
 Greve. Comunismo.
 Insurreição.  Internacionalismo
proletário.

 O Sindicato é o  Destruição do
principal instrumento capitalismo,
de luta.  Revolução
 Ação direta contra o proletária.
4. ANARQUISTAS  Sociedade sem
Estado e os patrões.
 Antiparlamentarismo. classes, sem Estado.
 Antipartidarismo.  Auto-gestão.
 Estrutura Sindical  Internacionalismo
federativa. proletário.
 Greve geral
insurrecional.
 Contra a liberação de
dirigentes sindicais.

BIBLIOGRAFIA

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 89 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

 ANTUNES, Ricardo L.C. – Jornal dos Trabalhadores Sem Terra, Ano XXIV
– numero 252 – maio de 2006.
 ANTUNES, Ricardo L.C. - Novo Sindicalismo, Editora Brasil Urgente -
1991.
 ANTUNES, Ricardo L.C. - O que é Sindicalismo, Coleção Primeiros
Passos - Abril Cultural. 1985.
 CEPS, Apostila de Concepção, Estrutura e Política Sindical, Secretaria
Nacional de Formação da CUT, 1987.
 GIANNOTTI Antônio e NETO Sebastião - CUT Ontem e Hoje, Editora
Vozes - 1991.
 RUI, José Carlos – A presença dos anarquistas nos sindicatos, Revista
Debate Sindical, nº. 02 – junho/julho/agosto – 1986.
 RUI, José Carlos – Comunistas I, Revista Debate Sindical, nº. 06 –
out/nov/dez – 1989.
 RUI, José Carlos – Comunistas II, Revista Debate Sindical, nº. 07 –
março – 1990.
 RUI, José Carlos – Pelegos, Revista Debate Sindical, nº. 03 –
junho/julho/agosto – 1987.
 RUI, José Carlos – Sindicalismo Cristão II, Revista Debate Sindical, nº
11 – fevereiro/março/abril – 1992.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 90 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

A HISTORIA DAS NOSSAS RAÍZES: ITINERÁRIO DAS LUTAS


DOS TRABALHADORES (AS) RURAIS NO BRASIL E O SURGIMENTO
DO SINDICALISMO RURAL
Maria do Socorro Silva24

"Da desparecença dos tempos aprendo as tranças e tramas das novas lições."
Gonzaguinha

PARA INICIO DE CONVERSA

Nos colocamos, nesse momento, diante do desafio de trazer ao


debate questões que se inserem nas reflexões em torno do enraizamento
histórico do sindicalismo rural no Brasil, ou seja, o processo no qual é
gestado a dinâmica do movimento sindical dos trabalhadores(as) rurais
(MSTTR), que se traduz, concretamente, num amplo imbricamento de
ações. Porém, considerando os limites a que nos propomos discutir o
assunto em pauta, nesse texto, restringeremos nossa análise a elencar
alguns movimentos ou lutas que contribuíram para esse processo, como se
constituiu a estrutura sindical oficial no Brasil.
Os movimentos sociais do campo vem se constituindo ao longo
da nossa história, como sujeitos coletivos, onde constroem uma identidade
e organizam práticas que visam defender direitos, interesses e projetos.
Esse processo se dá através de lutas de resistências, de organização,
mobilização que se constroem nos locais de trabalho, na roça e na
comunidade. É na teia de constituição dessas lutas que se forjam as
condições para a tomada de consciência do que significa ser trabalhador(a)
rural.
Desde a chegada dos colonizadores portugueses que tivemos,
em nosso país conflitos e rebeliões populares formados por complexa
composição étnica, social e ideológica – índios, caboclos, camponeses,
escravos, alfaiates, barqueiros, religiosos, seleiros, etc - com proporções e
alcances distintos, ora manifestando-se como amplos movimentos de
massa construindo novas formas de organização social, política e
econômica, ora manifestando-se como ações específicas e localizadas ou
movimentos messiânicos, de confronto com a opressão, a miséria, a
dependência, a ausência de direitos, a luta pela posse da terra e por
melhores condições de vida e de trabalho nas sociedades Colonial,
Monárquica25 e Republicana26
24
Pedagoga e Psicóloga. Professora da Faculdade de Educação da UnB/UFCG. Doutoranda em Educação da
UFPE.
25
No período Imperial tivemos apenas o nascimento das primeiras organizações operárias. No começo do século
XIX já existiam algumas associações de artesãos, mas organizadas sob a forma de irmandades religiosas. As
primeiras organizações operárias, sem um caráter essencialmente religioso, foram associações voltadas para a
ajuda mútua em situações de doença, acidentes no trabalho, invalidez, etc..
26
A primeira constituição republicana foi a de 1891 - assegura o direito à associação e a reunião deixando em
aberto qual seria o tipo de organização, surgiram então às primeiras organizações de socorros mútuos, caixas
beneficentes, sociedades de resistência, bolsa de trabalho.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 91 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

A proclamação da República (1889), juntamente com a Abolição


da escravidão (1888), marcam um dos momentos de maior transformação
social já vivido pelo país. A chamada Primeira República, que se segue, é o
período de delineamento da identidade social e política do trabalhador
brasileiro. Evidentemente, havia anteriormente trabalhadores, mas não uma
classe trabalhadora. Até então, quem trabalhara no Brasil foram os
escravos e a sociedade imperial escravista desmerecera inteiramente o ato
de trabalhar.
No século XIX, começamos a ter uma nova configuração,
primeiro com a chegada dos primeiros colonos europeus não-portugueses,
para o cultivo do café, a partir de 1819, suíços, alemães, italianos, todos
agricultores pobres atraídos para o Brasil por promessas de terra, que
passaram a ocupar áreas ainda não utilizadas, nas regiões Sul e Sudeste,
principalmente sobre a forma de parceria ou colonato, com isso tivemos
uma intensificação dos conflitos por terra e pela libertação dos escravos.
Juntamente com o processo de luta contra a escravidão vamos
ter a afirmação das leis de locação de serviços que visam regular o trabalho
assalariado, (1830, 1837), os trabalhadores não poderiam romper seus
contratos a não ser que pagassem ao patrão quantia correspondente e se
não o fizessem estariam sujeitos à prisão com trabalhos forçados até pagar
suas dívidas.
Em 1850, o império restringiu o direito de posse da terra por
meio da Lei de Terras. Essa Lei significou o casamento do capital com a
propriedade de Terra, pois a partir desse momento a terra foi transformada
em uma mercadoria a qual somente quem já dispunha dela e de capital
pudesse ser proprietários, isso impedia que os ex-escravos, brasileiros
pobres, os posseiros e os imigrantes pudessem se tornar proprietários, mas
sim constituísse a mão de obra assalariada necessária nos latifúndios,
segundo José de Souza Martins, professor da USP: “Enquanto o trabalho era
escravo, a terra era livre. Quando o trabalho ficou livre, a terra ficou
escrava”.
Nesse mesmo período, milhares de nordestinos, fugindo da seca
e da crise econômica dos engenhos de açúcar, foram para o norte,
trabalhar na extração dos produtos da floresta, principalmente a borracha e
a castanha, que tiveram um grande peso na formação da atual população
de agricultores familiares amazônicos.
O resgate do itinerário de algumas dessas lutas que são raízes
da organização do campo brasileiro, e do surgimento, do sindicalismo rural
brasileiro, podem sinalizar para descobertas importantes na construção de
uma sociedade mais justa, e no fortalecimento das organizações no
momento atual.

PRIMEIRO MOMENTO: DAS LUTAS PELA LIBERDADE AO


SURGIMENTO DO SINDICALISMO RURAL
“O movimento para a liberdade, deve surgir e

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 92 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

partir dos próprios oprimidos, e a pedagogia decorrente será


aquela que tem que ser forjada com ele e não para ele,
enquanto homens ou povos, na luta incessante de recuperação
de sua humanidade". vê-se que não é suficiente que o oprimido
tenha consciência crítica da opressão, mas, que se disponha a
transformar essa realidade; trata-se de um trabalho de
conscientização e politização .”
Paulo Freire

1.Lutas e mobilizações pela liberdade

A luta dos trabalhadores (as) rurais brasileiros pela posse da


terra, visando garantir melhores condições de trabalho e de vida fazem
parte da história do povo brasileiro: lutas de tribos indígenas, movimentos
de escravos, revoltas como da Cabanagem e Balaiada, litígios e reações de
parcela das populações pobres foram uma constante ao longo da nossa
história.
Durante todos esses períodos tivemos ações populares de
intervenção na ordem social, práticas reprimidas de participação social e
política do povo que colocaram em ebulição os direitos políticos e sociais,
antes que a cidadania e a sociedade civil se estabelecessem entre nós, e
que tiveram nos camponeses (as) sujeitos protagonistas de várias dessas
lutas e mobilizações.

a) Quilombos
Nos quilombos refugiavam não só escravos foragidos, como
também índios e pobres livres. Um dos mais importantes quilombos de
nossa história foi Palmares foi construído no fim do século XVI e resistiu até
o fim do século XVIII, chegou a reunir mais de 20 mil habitantes, localizava-
se na Serra da Barriga entre Pernambuco e Alagoas, e era governando por
um rei (sendo o mais conhecido Zumbi) e um conselho formado por chefes
dos quilombos. O sistema de vida e produção organizado em Palmares pode
resistir a economia patriarcal e escravocrata, com uma cultura e economia
baseada na policultura, na organização coletiva da produção e na
resistência e combate a escravidão.
Durante sua existência foram feitas varias tentativas de destruir
Palmares. Por fim, o governo de Pernambuco solicitou a ajuda do
bandeirante paulista Domingos Jorge Velho, que preparou uma expedição
para derrotar os fugitivos. Também ele falhou nas primeiras tentativas, mas
não desistiu. Organizou um exército realmente poderoso e voltou ao ataque.
Mesmo assim, a resistência dos quilombolas foi tão grande, tão valente, que
a luta durou perto de três anos.
Os negros tinham uma desvantagem: estavam cercados.
Enquanto os atacantes podiam conseguir reforços e munições de fora,
principalmente contando com o interesse do governo, os quilombolas
encontravam-se sozinhos e apenas podiam contar com o que possuíam. É

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 93 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

claro que, um dia, a munição dos sitiados tinha de se esgotar. Quando isto
se deu, muitos negros fugiram para o sertão. Outros se suicidaram ou
renderam-se aos atacantes.

b) Missões
A luta dos indígenas ao longo da nossa história apresenta raízes
de uma organização camponesa, principalmente por meio das missões, os
exemplos mais conhecidos são: a Confederações dos Tamoios, Guerra dos
Guaranis e a Guerra dos Bárbaros.

A Confederação dos Tamoios


Em 1562, aliaram-se aos franceses tomaram a Baía de
Guanabara. Não fora difícil aos franceses conquistar os tamoios, homens
altivos, que há tempos lutavam contra portugueses, que pretendiam
escravizá-los. A paz foi conseguida pelos padres José de Anchieta e Manuel
da Nóbrega.

Guerra dos Guaranis


Em 1750, o Tratado de Madrid determinou novos limites entre os
impérios coloniais de Portugal e Espanha. Na área do estuário do Prata, pelo
novo acordo, a Espanha trocava os Sete Povos das Missões, na margem
esquerda do rio Uruguai, pela Colônia do Sacramento, dos portugueses. Os
governos de Madrid e Lisboa tomaram decisões sem levar em conta os
interesses dos jesuítas e guaranis. Em 1752, enviaram comissões para
tornar efetivas as mudanças previstas no Tratado.
Os Guaranis se revoltaram e se organizaram para defender suas
terras. Mas os portugueses e espanhóis se uniram contra os rebeldes. Em
1754, começou a Guerra Guaranítica, que durou dois anos. Melhor
equipado, o exército europeu massacrou os guerreiros guaranis, liderados
por Nicolau Ñeenguiru e Sepé Tiaraju. Obrigados a sair, alguns
sobreviventes foram para as reduções da margem direita do Uruguai.
A guerra não resolveu as questões de limites, pois, além dos
índios, os portugueses da Colônia do Sacramento também não estavam
satisfeitos com a troca de terras. Portugal e Espanha voltaram atrás,
anulando o Tratado de Madrid em 1761. Com isso, os Guaranis continuaram
a ocupar a área dos Sete Povos. Mas já não existia o entusiasmo de antes e
as mesmas condições de resistência e luta.

Guerra dos Bárbaros


Essa guerra durou vinte anos, a partir de 1682, e foi
empreendida pelos cariris. O cenário dessa guerra foi uma extensa área do
Nordeste, particularmente nos vales do Rio Açu (atual Piranhas) e Jaguaribe.
Todavia, estes bravios guerreiros, apesar das degolas, dos aprisionamentos,
cativeiros e reduções em aldeamentos jesuíticos que sofreram ao longo

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 94 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

dessa história que lhes fora imposta, resistiram por cerca de mais vinte
anos sempre lutando como podiam pela posse de suas terras e na tentativa
de vencer as injustas estratégias da dominação colonial.

2. Lutas messiânicas – 1888 e a década de 1930


As lutas messiânicas se caracterizam pela existência de
uma liderança messiânica. Isso significa que a fé era a ligação entre ele e
seus seguidores. Ë por isso que alguns autores chamam as revoltas
camponesas do período de lutas messiânicas. Dentre essas podemos
destacar:

a) Canudos a terra prometida


Os/as trabalhadores rurais e escravos peregrinavam pelo sertão,
atrás do beato Antônio Conselheiro, até se estabelecerem no Arraial do
Canudos. Criou-se um povoado em que o trabalho cooperado foi essencial
para a preservação da comunidade. Todos tinham direito a terra e
desenvolviam a agricultura para auto-consumo, envolvendo todos os
membros da família. Na comunidade havia um fundo comum destinado a
proteção dos velhos e aos doentes. Chegou a ter cerca de 10 mil
habitantes. Entre outubro de 1896 e outubro de 1897, mais de 5 mil
soldados do exercito e armamentos pesados de guerra foram envolvidos no
ataque ao arraial.

b) Guerra do Contestado
Em 1912, o governo concedeu uma enorme extensão de terras à
empresa norte-americana Brasil Railway Company, no trecho previsto para
a construção da ferrovia São Paulo-Rio Grande do Sul. Ao final da
construção da ferrovia, cerca de 8 mil trabalhadores ficaram
desempregados e passaram a perambular pela região a procura de
trabalho. Nesse momento surgiu na região de Campos Novos e Curitibanos,
em Santa Catarina, um movimento camponês de caráter político-religioso,
liderado pelo monge José Maria. Inicialmente ficaram numa área de disputa
entre Paraná e Santa Catarina, por isso chamado de Contestado, que
chegou a cerca de 20 mil pessoas. Em 1915, os lideres lançaram um
manifesto monarquista e declararam a “guerra santa” contra os coronéis,
as companhias de terras e as autoridades governamentais. O arraial foi
dizimado quando o governo enviou cerca de 07 mil soldados do exercito,
até mesmo aviões foram utilizados pra localizar os redutos rebeldes.

c) Guerra do Caldeirão
Uma luta de resistência camponesa, contra os latifundiários, que
aconteceu no Ceará, na Chapada do Araripe, no período de 1926-1937,
quando foram assassinadas mais de 400 pessoas. O nome Caldeirão refere-
se a uma depressão no relevo, onde se encontrava água cristalina durante

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 95 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

todo o ano. A área pertencia ao padre Cícero - famoso religioso e político da


época - que a entregou ao beato Zé Lourenço e seus seguidores para
trabalharem na terra. O Caldeirão ficou auto-suficiente. Sua fama crescia e
já influenciava outras cidades, porque tinham uma produção diversificada:
agricultura, artesanato, confecção de redes, roupas, calçados, etc. Todas as
ferramentas necessárias para o trabalho eram feitas na própria
comunidade. Os produtos excedentes eram vendidos em Juazeiro e no
Crato. Ninguém se considerava dono de alguma coisa. Todavia, a grande
concentração de camponeses naquelas terras chamou a atenção dos
fazendeiros, que, temendo o aumento da organização dos trabalhadores e
uma possível ocupação de suas terras, iniciaram uma guerra contra os
camponeses para destruir Caldeirão. A força militar chega ao sítio e os
moradores resistem à destruição, casas são incendiadas e pessoas mortas,
mais não conseguem vencer a comunidade. Dias depois, retornam usando
dessa vez aviões, acontece o segundo bombardeio aéreo sobre civis na
história do Brasil. (o primeiro foi em 1912, Contestado), destruindo assim o
povoado.

3. As lutas pré-sindicalistas
a) As colônias anarquistas
A chegada dos imigrantes para trabalhar nas lavouras do café
dos grandes fazendeiros vai trazer mudanças no perfil do campesinato
brasileiro. Além de ser explorado com baixa remuneração (a família toda
precisava trabalhar para a subsistência), o colono ainda sofria a
especulação do fazendeiro, pois era obrigado a comprar o que precisava
pelo dobro do preço, nos seus armazéns, desta forma estava sempre
devendo ao fazendeiro. Recebiam um preço de terra onde desenvolvia uma
cultura de auto-consumo, no entanto, ao chegar à época da colheita, muitos
eram expulsos, sofrendo as mais variadas injustiças e perseguições. A
exploração imposta faz com que se organizem ainda que de forma
clandestina (já que o Ato Adicional de 1834 proibia toda e qualquer
associação de ofício): surgem as primeiras associações de socorro mútuo,
os mutirões, e a organização de núcleos e colônias que serão precursores
do sindicalismo brasileiro.
A formação de núcleos ou colônias, tais como a Colônia Cecília,
Colônia Leopoldina, Colônia Nova Itália, organizadas sem propriedade
individual, sem lei e sem religião, e onde começaram a funcionar as
“Escolas Internacionalistas”, que depois se espalharam por outras áreas de
imigração do sul do Brasil.
Além disso, os anarquistas começaram a se organizar nos
sindicatos, cuja ação deveria ser voltada para o desenvolvimento da
consciência da classe, com repudio a idéia de organizar os trabalhadores
em partido político, recusa intransigente ao assistencialismo e mobilização
permanente dos trabalhadores para ação direta contra os patrões. Para os
libertários a educação ocuparia um papel de destaque, pois era considerado
um veículo de conscientização e transformação das sociedades, sendo

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 96 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

responsável pela formação de novas mentalidades e ideais revolucionários.


Articulavam a educação entre si, em três dimensões: a educação político-
sindical27, a educação escolar e as práticas culturais de massa.
Em 1907, é aprovada a Lei Adolfo Gordo para expulsar
lideranças sindicais estrangeiras (1907/1913- governo Hermes da Fonseca).
Esse processo vai ser intensificado em 1917, quando a nível internacional,
ocorria a Primeira Guerra Mundial, e os anarquistas e socialistas faziam
intensa propaganda anti-militarista, além disso, a situação econômica para
os trabalhadores (as) estava insuportável: carestia, desemprego, recessão,
reinava fome e miséria, culminando com a Greve Geral, sendo
desencadeada um processo de repressão e o uso intensivo da Lei Adolfo
Gordo.

b) Posseiros da Rodovia Rio-Bahia.


A valorização das terras da Região de Governador Valadores -
MG devido à perspectiva da construção da rodovia Rio - Bahia em 1940, ali
viviam muitos posseiros, sem perda de tempo, os supostos donos das terras
começaram a aparecer de todos os lados e impuseram aos posseiros a
condição de derrubar a mata para formação de pasto, eles só podiam
plantar para subsistência. A partir de 1955 com a construção das rodovias,
começou o processo de expulsão dos posseiros. Eles começaram então a
juntar os posseiros para formar uma associação (visto que os sindicatos
rurais ainda não eram reconhecidos), essa organização foi até a década de
1964, quando foram presos e torturados pela ditadura militar.

c) Trombas e Formoso
Em 1948, a construção da Transbrasiliana e o projeto de
colonização dos governo federal valorizaram as terras da região de Uruaçu,
no norte de Goiás. Trabalhadores provenientes do Maranhão e Piauí
chegaram ao local liderado por Jose Porfírio e estabeleceram posses numa
área de terra devoluta, que estavam sendo griladas, por um grupo de
fazendeiros, um juiz e um dono de cartório da região. Eles queriam que os
posseiros saíssem das terras, e eles pagariam as benfeitorias feitas, a
recusa foi geral. Então os grileiros queimaram as roças e as casas dos
camponeses, inclusive acarretando a morte da mulher de José Porfírio. No
final da década de 1950, com a contribuição do PCB, toda a região estava
organizada na Associação dos Lavradores de Trombas e Formoso, a
organização foi se afirmando, até a região se tornar um município e Jose
Porfírio foi eleito deputado estadual em 1962. Os posseiros ganharam muita
força na região e formaram vários sindicatos, o que foi desmentalado em
1964, com o golpe militar. Depois de viver na clandestinidade, José Porfírio,
foi preso em 1972, foi solto no ano seguinte e desapareceu.

27
Desde esse período a necessidade de formação sindical já se fazia presente entre as organizações, já
colocavam a educação em suas diferentes dimensões sinalizando para o que chamamos hoje de formação
programada (cursos, seminários, oficinas, etc), e a formação na ação que ocorre no cotidiano da organização, nas
comunidades, no trabalho, mobilizações, intercâmbios, pesquisas, sistematização coletiva de experiências.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 97 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

c) Influência do Partido comunista formação do Bloco


Operário e Camponês (BOC)
A mudança de ênfase no PCB sobre a realidade brasileira, que
identifica a realidade brasileira como sendo de um capitalismo agrário semi-
feudal, leva o partido a formar o Bloco Operário e Camponês (BOC) em
1927, incorporar a luta contra a política da oligarquia, buscar aliança com a
Coluna Prestes e atuar na área rural brasileira.
A análise da sociedade como sendo um país semi-feudal, onde a
revolução seria feita por etapas: a primeira, de caráter nacional e
democrático, seria anti-imperialista e anti-feudal, para isso teria que fazer
alianças entre o operariado e o campesinato; a segunda, de caráter
socialista. Essa tese se fundamenta na revolução leninista, pois para Lênin,
a etapa primeira representada pela revolução democrático-burguesa é
constituída pelo desenvolvimento do capitalismo. Embora esse processo
revolucionário deva estar sob a direção política do proletariado, suas tarefas
consistem em desenvolver as forças produtivas capitalistas (modernas), a
fim de que possam ser eliminadas as antigas formas de produção ainda
existentes nessas sociedades atrasadas. Por isso, a estratégia fundamental
no operariado não pode basear-se na luta contra o capital, mas sim numa
aliança com o campesinato para enfrentar o feudalismo. É esse caráter
democrático-burguês que a proposta do BOC confere, a partir de 1928, à
luta de classes.
As divergências com relação a essa aliança, os resultados da
revolução de 1930 e as definições do comunismo internacional levaram a
uma re-orientação para a “obreirizaçao”, que consistia em substituir os
intelectuais por operários nos cargos e instâncias partidárias e o fim do
BOC.
Na verdade essa aliança acabou tendo uma dimensão mais
eleitoral de assegurar candidaturas que assegurassem a defesa dos
interesses proletários, daí a necessidade de ampliar sua ação e se
aproximar de outras organizações progressistas. Daí os acenos a setores da
pequena burguesia como forma de romper o bloqueio à ação política que
lhe era imposto não só pelas classes dominantes como também pela sua
própria fraqueza interna. Com isso entendemos porque o BOC vai centrar
sua ação nas questões sociais, sem questionar o sistema social vigente,
pleiteando, reformas modernizadoras.
Essa aliança retoma na ação do partido na década de 1960 com
a participação na organização das Ligas Camponesas e dos sindicatos
rurais.

SEGUNDO MOMENTO: A IMPLANTAÇÃO DA ESTRUTURA SINDICAL NO


BRASIL NO CONTEXTO DO ESTADO NOVO

“Ninguém tem liberdade para ser livre, pelo contrário, luta por

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 98 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

ela precisamente porque não a tem”


(Freire, 1978).

O fim da primeira guerra mundial (1914-1918), a revolução


russa (1917), a quebra da bolsa de Nova York (1929), a crise do café, o
movimento tenentista e a coluna Prestes marcou uma grande seqüência de
manifestações de operários, artistas, militares, camponeses que
começaram a reinvidicar a suspensão do pagamento da dívida externa, a
reforma agrária, a elaboração de uma legislação protegendo os
trabalhadores rurais e colonização em terras devolutas com base em
pequenas propriedades.
A revolução de 1930, inaugura as condições que permitiriam no
decorrer dos anos seguintes, a modernização conservadora e a construção
do Estado Moderno, criador de classes sociais modernas (burguesia
industrial e proletariado), e o fortalecimento de uma classe média urbana,
que insatisfeita com o domínio imposto pelas oligarquias agrárias. Lideradas
pelo seu segmento mais radical, os “tenentes”, desencadeiam um ciclo de
movimentos armados, cujo início é a revolta do Forte de Copacabana
(1922), sucedendo-lhe a chamada Revolução de São Paulo, que culmina
com a formação da Coluna Prestes (1924-1927).
As oligarquias agrárias, ligadas á lavoura de exportação, entram
enquanto classe, num persistente processo de decadência econômica,
embora o sistema político continue fortemente influenciado por ela, que
mostrou uma capacidade insuspeita de se manter no controle do poder
político ate 1964. É importante notar que a oligarquia agrária foi capaz de
diversificar seus negócios expandindo-se em atividades urbanas, e
aproveitar-se do capital industrial, através de associações, sem perder sem
abrir mão do autoritarismo e conservadorismo, e sua vinculação com o
rural, o que lhes garantia e fortalecia seus currais eleitorais.
Os industriais que querem controlar o poder, o Estado, não tem
força para fazê-lo sozinhos; apelam, então, para uma aliança com a classe
operária e a chamada “classe média”, tendo Getúlio Vargas com seu
representante, constituindo a aliança entre desiguais – populismo brasileiro-
para permitir a consolidação do poder dos industriais contra o poder da
oligarquia rural, essa aliança que se afirma na Região Sudeste, não
consegue se estruturar no restante do Brasil.
É dentro desse contexto que o Governo Vargas assina em 15 de
março de 1931, o decreto conhecido como Lei de Sindicalização (decreto
19.770, de 19 de março de 1931). Até essa época todos os sindicatos eram
formados por iniciativa de trabalhadores de uma profissão ou categoria e se
mantinham através das contribuições de seus associados. Os sindicatos
eram livres, independentes e funcionavam como organismos de luta por
melhores condições de vida e salário.
A lei de sindicalização definindo o sindicato como órgão de
colaboração com o poder público, servindo de pára-choques entre
tendências conflitivas nas relações do capital com o trabalho. Os diretores

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 99 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

só podiam ser brasileiros natos ou com mais de 20 anos de residência,


sendo obrigação do ministério do trabalho fiscalizar as assembléias e
contabilidade dos sindicatos.
A nova lei de sindicalização visava oficializar, ou seja, atrelar os
sindicatos ao recém criado Ministério do Trabalho. Pelo projeto
governamental, os sindicatos deveriam funcionar como um órgão de
conciliação entre os trabalhadores e os patrões e como um órgão de caráter
assistencialista.
De fato, os objetivos básicos da Lei de Sindicalização eram
claros: 1) transformar o sindicato, de arma autônoma dos trabalhadores, em
agência colaboradora do Estado; 2) disciplinar o trabalho, considerando-o
como mero fator de produção; e 3) evitar a emergência da luta de classes,
utilizando o sindicato como “para-choque, entre o capital e o trabalho.
O projeto sindical populista de Vargas previa a adoção de leis
que, na verdade, eram conquistas ou reinvidicações dos trabalhadores ao
longo de anos de luta, as chamadas leis sociais: pensões de aposentadoria,
jornada de trabalho de 08 horas, proteção ao trabalho das mulheres e das
crianças. A constituição corporativista de 1937 e a Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) consolidam a política varguista para o movimento operário,
com a instalação da justiça do trabalho e a criação do imposto sindical. A
CLT exclui os trabalhadores rurais do direito a sindicalizar-se apesar de lhes
assegurar o direito ao salário mínimo.
A inexistência de uma organização no campo que aglutinasse
essas bandeiras, à época, foi um dos fatores que impediram a elaboração e
a implementação de uma legislação especifica para o campo.
A construção da estrutura sindical oficial (e a ideologia
corporativista que lhe dá suporte) não foi somente produto da repressão e
do silêncio a que foram subjugados os setores mais combativos e de
esquerda do movimento sindical brasileiro. Foi também resultado de uma
série de medidas legais e político-ideológicas que engenhosamente
articuladas, dentre as quais a educação constituiu um dos mecanismos de
propaganda e de convencimento.
O estimulo a sindicalização era acompanhada por uma
propaganda doutrinaria que envolvia benefícios sociais advindos de um
conjunto de leis trabalhistas, e a divulgação de um regime sindical
especifico, o regime corporativista, principalmente por meio das práticas de
formação sindical incentivadas pelo Ministério do Trabalho, nos sindicatos
dirigidos por ministerialistas ou ‘amarelos’.
Uma vez constituído o sindicato de acordo com a lei, exigia-se
ainda, para o seu reconhecimento o envio de seus estatutos ao Ministério
do Trabalho para aprovação, além da presença permanente nos sindicatos
em assembléias e no controle das finanças. Portanto, significando
progressivamente a implantação de um projeto totalitário de poder.
No entanto, as influências das correntes comunistas e
anarquistas criaram organizações paralelas como foi o caso do Pacto da

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 100 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

União Intersindical (PUI), organizado a partir da greve de 1953, em São


Paulo que chegou a aglutinar não só sindicatos mas federações de
mulheres, associações de bairro, entidades estudantis. Também o Pacto de
Unidade e Ação (PUA), de 1957, ou o Comando Geral dos Trabalhadores
(CGT), de 1962, deram certa autonomia e permitiram articular melhor as
lideranças e deram mais vigor as lutas dos trabalhadores (Abreu e Lima,
2005).
No que se refere à defesa dos direitos trabalhistas na área
rural, foram organizados sindicatos de forma localizada e isolada, além de
associações mais voltadas aos interesses dos pequenos produtores, como
arrendatários, parceiros, posseiros e pequenos proprietários. Embora
existisse uma legislação que permitia a criação de sindicatos, somente em
1944 através do Decreto 7.038 se autoriza de forma explicita a
sindicalização rural, porém esta lei não foi implementada. Assim até 1955, o
Ministério do Trabalho só tinha reconhecido o sindicato rural de Campos, Rio
de Janeiro (que tinha sido criado em 1938), o mais antigo do país, e em
seguida: Barreiros, Rio Formoso e Serinhaém, em Pernambuco; Belmonte,
Ilhéus e Itabuna, na Bahia; Tubarão em Santa Catarina.
Muitas eram as dificuldades para esse tipo de organização: a
legislação trabalhista era feita para os trabalhadores urbanos, não
considerando a especificidade do trabalho no campo, quase não existiam
juntas de conciliação e julgamento nas cidades do interior, o código civil
não permitia a organização de sindicatos rurais, e os proprietários rurais
agiam de forma repressiva, inclusive acionando a polícia para reprimir
qualquer tentativa de organização e mobilização dos trabalhadores (as)
rurais.

TERCEIRO MOMENTO: OS CAMPONESES ORGANIZADOS


COMO CLASSE
Somos gente nova vivendo a união
Somos povo, semente de uma nova nação,
ê, ê
Somos gente nova vivendo o amor
Somos comunidade, povo do Senhor, ê, ê
Vou convidar os meus irmãos trabalhadores
Operários, lavradores, biscateiros e outros
mais
E juntos vamos celebrar a confiança
Nesta luta na esperança de ter terra, pão e
paz.
Zé Vicente

Após a segunda guerra mundial, houve uma aceleração do


processo de penetração capitalista, no campo, com a construção de

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 101 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

grandes obras e expansão de crédito.


Nesse processo, foram duramente atingidos os foreiros,
parceiros, pequenos proprietários e moradores de engenho (que tinham
direito a cultivar a lavoura branca e a obrigação de prestar três dias de
serviço por semana ao proprietário).
Através da expulsão do morador, da supressão do direito do
cultivo do sitio, do aumento dos dias de cambão. Como reação a esse
processo, as organizações camponesas passaram a se contrapor, de forma
articulada, contra as ações de despejo acionadas pelos usineiros e
latifundiários.
No período de 1954 a 1964, surgiram três grandes organizações
camponesas que deram uma outra fisionomia ao debate e as lutas dos
camponeses (as) no País:
a) Ligas camponesas
Em 1955, os donos do Engenho Galileia, em Vitória de Santo
Antão, impuseram o aumento do foro e tentaram expulsar os foreiros da
terra, que resistiram ao processo de despejo, e começaram a participar da
formação da Sociedade Agrícola dos Plantadores e Pecuaristas de
Pernambuco (SAPPP), fundada inicialmente com fins basicamente
assistenciais, para fornecer assistência médica, jurídica, criar escolas e uma
caixa funerária para seus associados, e posteriormente, se tornando um
movimento de luta pela Reforma Agrária que se espalhou por vários
Estados do Nordeste. “A repressão atribuiu o nome de Ligas à organização
desses trabalhadores para caracterizá-los como comunistas, em alusão ao
nome por estes utilizados para certas organizações populares”(Abreu e
Lima, 2005).
A partir das Ligas os camponeses organizados faziam um
trabalho de denúncia, agitação, resistência na terra e mobilizações. As ligas
utilizavam diferentes estratégias para organizar e formar os trabalhadores:
conversas na feira, na missa, nos locais de trabalho, boletins, cordéis, etc.
As Ligas se organizavam em “delegacias ou núcleos, por
município, distritos ou fazendas. Em âmbito local, eram compostas só de
camponeses; no nível estadual além das lideranças camponesas, envolvia
profissionais liberais, intelectuais, estudantes, parlamentares”. (Abreu e
Lima, 2005).

b) União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas –


ULTAB
Mesmo na ilegalidade, o PCB manteve algum trabalho no campo,
e em 1954, na II Conferencia Nacional de Lavradores, foi fundada a ULTAB,
com a presença de 303 representantes de 16 estados, tendo-se discutido o
direito a organização dos trabalhadores rurais em associações e sindicatos,
o direito de greve, a reforma agrária, previdência social, adoção de medidas
de apoio a produção etc.., sendo a primeira experiência na perspectiva
sindical no campo brasileiro.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 102 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

c) Movimento dos Agricultores Sem Terra – MASTER


Surgiu no Rio Grande do Sul em 1950, a partir da resistência
de 300 famílias de posseiros, inovava com relação às formas de luta, pois
executava a ocupação de terras, formando acampamentos e organizando
estratégias de defesa, dentro das terras dos latifundiários, em áreas
previamente escolhidas.
Essas três organizações durante sua existência assumiram
algumas lutas de forma unificada, como por exemplo, a greve no setor
canavieiro em Pernambuco, em 1963, que obteve conquistas significativas
para a categoria ou a participação em Congressos como o I Congresso
Nacional dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas, realizado em 1961, que
embora explicitasse as divergências, marcou o reconhecimento social e
político da categoria camponesa e o reconhecimento do seu potencial
organizativo dentro da sociedade brasileira.
A partir, o movimento camponês cresceu e as discussões sobre
a questão fundiária ampliaram-se, atingindo outros setores da sociedade,
inclusive a Igreja Católica, que passou a atuar na perspectiva de fortalecer
a posição da Igreja entre os camponeses através da criação de sindicatos28.
A década de 1960 chega com o país falando de reformas de
bases. As principais eram a reforma agrária, reforma na educação e no
sistema bancário. Nesse período foi criado o Estatuto do Trabalhador Rural
(1963), que concedia aposentadoria por invalidez ou por velhice como
resultado das lutas lideradas pelas Ligas Camponesas no Nordeste, que
aliavam as lutas por direitos trabalhistas e reforma agrária e do surgimento
dos sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras rurais, das federações e da
CONTAG, o que já era o bastante para deixar os latifundiários muito
aborrecidos com o governo.

SURGE A PRIMEIRA ORGANIZAÇÃO SINDICAL NACIONAL


NO CAMPO: CONTAG

Ainda que o gesto me doa, não encolho a mão: avanço


levando um ramo de sol.
Mesmo enrolada de pó, dentro da noite mais fria,
a vida que vai comigo é fogo: esta sempre acesa
Thiago de Mello

A existência das Ligas Camponesas, da ULTAB, do Master e a

28
No Rio Grande do Norte, o então Bispo Dom Eugenio Sales funda em 1960 o Serviço de Orientação Rural
(SAR) uma organização beneficente da Igreja destinada a fundar sindicatos. Até 1962 48 sindicatos foram
fundados e 16 deles foram reconhecidos. Em Jaboatão (PE) o padre Crespo e o Padre Antonio Melo no Cabo (PE)
passam a criar sindicatos com um objetivo declarado de enfraquecer o avanço das Ligas Camponesas e do PCB.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 103 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

influência do PCB e da Ação Popular- AP29, fizeram com que a organização


dos trabalhadores(as) rurais em sindicatos fosse acelerada, as bandeiras de
lutas atualizadas e ampliadas e estabelecidas linhas de ação comum.
Esse processo culminou na realização do 1º Congresso Nacional
dos Lavradores e trabalhadores agrícolas, em 1961, em Belo Horizonte
coordenado pela ULTAB, que reuniu 1.600 delegados de várias
organizações. Articular nacionalmente as lutas passou a ser uma das
principais preocupações, apesar das diferentes correntes de pensamento,
de concepções e de formas de organização.
Em 1962, já existiam 42 federações, em alguns estados mais de
duas: de assalariados, de lavradores, de pescadores, de agricultores, de
trabalhadores rurais, sendo que 27 eram reconhecidas oficialmente pelo
Ministério, que solicitou a realização de um Congresso Nacional para criação
da Confederação, o que ocorreu em 22 de dezembro de 1963, com a
participação de trabalhadores rurais de 18 estados, distribuídos em 29
federações, sendo reconhecida em 31 de janeiro de 1964, pelo Decreto
Presidencial 53.517.
“A CONTAG torna-se a primeira entidade sindical camponesa de
caráter nacional reconhecida legalmente. Ajustou em seu interior diversas
concepções e correntes de pensamentos, desde os setores mais à direita,
setores da Igreja, provenientes das Ligas e os comunistas”. (Revista dos 40
anos da CONTAG).
A mobilização popular a favor das reformas amedrontou a classe
dominante, temiam que fosse apenas o começo de uma série de
transformações radicais no país. A resposta das elites veio de imediato no
dia 31 de março de 1964, as tropas militares ocuparam os pontos
estratégicos do país, autoritarismo, desrespeito a constituição, perseguição
militar, prisão e tortura para os opositores e censura prévia nos meios de
comunicação, esse foi o quadro político criado pelo regime militar para
arrasar toda oposição a sua forma de governar o país.
Recém criada a CONTAG, na busca pela melhoria das condições
de vida dos trabalhadores do campo, pela reforma agrária, sofre de
imediato a violência do golpe militar sobre as lideranças de sua
organização, que viu bandeiras de lutas políticas dos trabalhadores, em
especial, a da reforma agrária, serem colocadas em segundo plano.
Já em 1964, foi decretada a Primeira Lei de Reforma Agrária do
Brasil elaborada ainda no Governo João Goulart, acabou sendo promulgada

29
Foi formada em Belo Horizonte (MG), em 1962, a partir de grupos de operários e estudantes ligados à Igreja
Católica: a Juventude Operária Católica (JOC), Juventude Universitária Católica (JUC) e a Juventude Estudantil
Católica (JEC). Nos primeiros anos da década de 1960, ainda fortemente influenciada pelo ideário humanista
cristão, vinculada às estruturas formadas pela Igreja junto aos movimentos populares, a AP possuía penetração
entre operários, camponeses e estudantes, principalmente entre os últimos. A AP deslocou militantes para as
fábricas e para o meio rural, sendo efetuadas experiências em meios populares como o ABC paulista, da Zona
Canavieira em Pernambuco, da região Cacaueira da Bahia, da área de Pariconha e Água Branca em Alagoas, e
do Vale do Pindaré, no Maranhão. Foi da Juventude Estudantil Católica que partiram as primeiras discussões que
operaram mudanças políticas e ideológicas e sua transformação em uma organização marxista-leninista. Em
março de 1971, a AP formalizou a influência do marxismo e se proclamou partido com a denominação de Ação
Popular Marxista-Leninista (APML), que continuou sua ação política durante a ditadura (ACO, 1985).

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 104 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

com modificações, pela ditadura militar, sendo denominada Estatuto da


Terra, que por um lado definiu regras para os contratos de arrendamento e
parceria, como resposta as reinvidicações do movimento sindical, e por
outro incentivou o pacote da Revolução Verde, que obrigou muitos
agricultores familiares a saírem do campo, com um grande aumento da
miséria na área rural e nas cidades.
Logo na sua criação tinha sido constituída uma equipe de
“educação sindical” com o objetivo de capacitar lideranças e dirigentes a
fim de mantê-los informados, nas temáticas do movimento e da realidade
social e política do país. A formação sindical centrava sua ação na
alfabetização dos trabalhadores (as), na difusão de práticas agrícolas e
cursos políticos para formar novas lideranças, que durante a ditadura
tiveram que atuar de forma quase clandestina.
“Após a intervenção, foi constituída uma Junta Governativa que
durante um ano administrou a CONTAG. No ano seguinte, uma diretoria foi
eleita para administrar a entidade durante o período de 1965 a 1968, tendo
como interventor José Rotta.”(Revista 40 anos da CONTAG).
A partir de 1966, trabalhadores que resistiam à ditadura
buscaram retomar o controle da entidade, e superar as dissidências
alimentadas durante o período de intervenção, buscando a organização dos
sindicatos e federações. A formação se traduzia em práticas educativas
para garantir núcleos organizados nos locais de trabalho e para fortalecer o
processo de retirada dos interventores e sindicalistas pelegos, impostos nos
sindicatos e federações pela ditadura.
Os materiais de comunicação sindical foram fundamentais para
garantir minimamente uma ação articulada nacional, regional e estadual.
Eram boletins, revistas e jornais, que tinham como objetivo central a
conscientização e a socialização das vitórias e lutas do MSTTR. A
criatividade marcou esse período. O cerceamento das liberdades individuais
e coletivas inibia qualquer divulgação de trabalhos que pudessem, em seu
conteúdo, ser interpretado como “ofensivo” ao governo e a “ordem
pública”.(Revista 40 anos da CONTAG)
O cotidiano e o estímulo à organização dos trabalhadores (as)
rurais eram reproduzidos por meio de personagens. Também reproduziam
as poesias, prosas e cordéis, escritas pelos trabalhadores (as) rurais,
dialogando com os desafios do dia-a-dia, sem serem perturbados pela
Policia ou pelo Ministério do Trabalho. Os autores das histórias utilizavam
pseudônimos, caso a repressão militar resolvesse censurar os textos, os
autores estariam protegidos.
Outro instrumento utilizado no final da década de 1960 e
meados de 1970, foi o sócio-drama. Priorizava a oralidade e a expressão
corporal, para estimular uma visão crítica daquele momento que o país
vivia sem chamar a atenção do poder público (Revista CONTAG 40 anos).
O trabalho comunitário e de pequenos grupos foi á estratégia
adotada durante muitos anos para resistir e formar novas lideranças
durante a fase da ditadura. Eram organizações quase clandestinas em

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 105 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

grande parte fomentadas ou apoiadas pela Igreja. Portanto, esse período


nos ensinou a importância da comunidade, da formação de base, do
trabalho em grupos, da importância do ambiente cultural na formação do
ser humano, por exemplo, na Amazônia, as relações comunitárias de
parentesco e de vizinhança foram à base da organização dos “posseiros”,
durante toda a década de 1970. Os núcleos formados por famílias extensas
e vizinhos, liderados pelos mais antigos, formavam uma rede importante de
relações através das quais se recrutavam os membros das comunidades
para as ações coletivas. Foi na experiência de comunidades já existentes,
na sua organização já construída e na solidariedade que novos migrantes
foram rompendo as fronteiras do latifúndio na região, e foram ficando na
terra e produzindo.
De meados da década de 60 até o final da década de 70, as
lutas camponesas eclodiam por todo o território nacional, os conflitos
fundiários triplicaram e o governo, ainda na perspectiva de controlar a
questão agrária determinou a militarização do problema da terra. A
militarização proporcionou diferentes e combinadas formas de violência
contra os trabalhadores. A violência do peão que é o jagunço da força
privada, muitas vezes com o amparo da força pública. A violência da polícia,
escorada na justiça desmoralizada, que decretou ações contra os
trabalhadores, utilizando recursos dos grileiros e grandes empresários,
defendendo claramente e tão somente os interesses dos latifundiários. No
ano derradeiro do governo militar, 1985, os jagunços dos latifundiários e a
polícia assassinavam um trabalhador (a) rural a cada dois dias.
Essas diferentes ações fomentam a resistência e a luta por uma
sociedade justa e solidária até os nossos dias. As desigualdades sociais e a
exclusão continuam acirrando as contradições de nossa sociedade,
portanto, a luta pela terra, pelo meio ambiente, pela cidadania, a soberania
alimentar, os valores humanistas, a participação popular, a educação, a
saúde, as relações igualitárias de gênero e etnia, vinculadas à luta por uma
sociedade economicamente justa, ecologicamente sustentável com
equidade e justiça social continuam na agenda do dia para tecer o amanhã.

Tecendo a manhã

João Cabral de Melo Neto


Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
lançou e o lance a outro; de um outro
galo que apanhe o grito que um galo
antes lançou e o lance a outro; e de
outros galos que com muitos outros
galos se cruzem os fios de sol de seus
gritos de galo, para que a manhã, desde
uma teia tênue, se vá tecendo, entre

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 106 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

todos os galos

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACO. AÇÃO CATÓLICA OPERÁRIA. (1985) História da classe operária no


Brasil: Gestação e nascimento -1500 a 1888. Rio de Janeiro: ACO.
ABREU E LIMA, Maria do Socorro de. Construindo o sindicalismo rural: lutas,
partidos, projetos. Recife: Editora Universitária da UFPE: Editora Oito de
Março, 2005.
ARROYO, Miguel. (2003). Pedagogias em Movimento – o que temos a
aprender dos Movimentos Sociais? In: Currículo sem Fronteiras, v 3, n.1, pp.
28-49, Jan/Jun. Minas Gerais.
CONTAG. Revista dos 40 anos. Brasília, 2004.
GOHN, Maria da Glória. (1999) Educação não formal e cultura política:
impactos sobre o associativismo do terceiro setor. São Paulo, Cortez.
(Coleção Questões da nossa época; v.71).
MANFREDI, Silvia Maria. Formação Sindical no Brasil: história de uma prática
cultural. São Paulo: Escrituras Editorial, 1996.
MEDEIROS, Leonilde Servolo. História dos movimentos sociais no campo. Rio
de Janeiro: FASE, 1989.
NEVES, L.A. O comando geral dos trabalhadores (CGT) no Brasil (1961-
1964). Belo Horizonte: Vega, 1981.
SILVA, Maria do Socorro. Da raiz a flor: a produção pedagógica dos
movimentos sociais e a Educação do Campo. NEAD/Brasília, 2006.
TRONCA, Ítalo A. Revolução de 30: a dominação oculta-São
Paulo:Brasiliense, 2004.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 107 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

TRAJETÓRIA POLÍTICA DA CONTAG - AS PRIMEIRAS LUTAS 30

Na década de 50, as organizações camponesas passaram a se


contrapor, de forma articulada, contra as ações de despejo acionadas pelos
usineiros (Porecatu/PR) e da luta dos posseiros e arrendatários de Trombas e
Formoso, em Goiás, onde várias lideranças se destacaram.
Em Pernambuco, fundaram a Sociedade Agrícola e Pecuária dos
Plantadores, promovendo uma das mais importantes lutas da época, no
Engenho Galiléia, município de Vitória de Santo Antão, nos limites da região
Agreste com a Zona da Mata de Pernambuco. Foi quando surgiu a primeira
experiência de Ligas Camponesas e, conseqüentemente, de resistência
camponesa articulada a objetivos políticos mais definidos (...). A luta
camponesa passa a ter uma postura politizada e politizadora. No processo
de organização e luta, foram criadas outras organizações como o
Movimento dos Agricultores Sem Terra – MASTER na região sul do
país. As várias formas de organizações camponesas passaram a sentir a
necessidade de uma articulação nacional que representasse os interesses e
as demandas específicas.
Em 1954, surgiu a União dos Lavradores Agrícolas do Brasil – ULTAB,
durante a II Conferência Nacional dos Lavradores, realizada em São
Paulo. O primeiro presidente foi Lyndolpho Silva, que, uma década depois,
viria a ser o primeiro presidente da CONTAG. Nessa conferência, foram
identificadas as bandeiras prioritárias entre elas o ”estímulo à criação de
sindicatos de trabalhadores rurais”.

CONTAG – PRIMEIRA ORGANIZAÇÃO SINDICAL NACIONAL NO CAMPO

As Ligas Camponesas, O MASTER, A Ação Popular – AP (ligada aos católicos


radicais) e a União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil –
ULTAB, dentre outros, fizeram com que a organização dos trabalhadores
rurais em sindicatos fosse acelerada.
As organizações de esquerda com atuação no campo buscaram atualizar e
ampliar as bandeiras de luta e estabelecer linhas de ação comuns. Neste
sentido organizaram: o 1º Congresso Nacional dos Lavradores e
Trabalhadores Agrícolas (1961) – convocado e coordenado pela ULTAB; em
1962 acontece o 1º Congresso de Trabalhadores na Lavoura do Nordeste;
em 1963 a ULTAB organizou a 1ª Convenção Brasileira de Sindicatos Rurais
(Natal-RN).
Em 1963 uma greve no setor canavieiro envolveu a Federação dos
Lavradores, as Ligas Camponesas e sindicatos autônomos.
Em 22 de dezembro de 1963, trabalhadores rurais de 18 estados,
distribuídos em 29 federações, decidiram pela criação da Confederação

30
Publicação – Revista Contag 40 anos

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 108 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, reconhecida em 31


de janeiro de 1964, pelo Decreto Presidencial 53.517.
A CONTAG torna-se a primeira entidade sindical camponesa de caráter
nacional legalmente reconhecida. A CONTAG nasceu em um momento
crítico da atividade política do país, resistindo ao regime imposto pelos
militares.
O golpe militar de 64 foi uma contra-revolução que barrou mudanças
estruturais de democratização da sociedade brasileira. O golpe foi
deflagrado contra o governo de João Goulart. Nos primeiros dias após o
golpe, uma violenta repressão atingiu setores politicamente mais
mobilizados à esquerda como, por exemplo, o Comando Geral dos
Trabalhadores (CGT), a União Nacional dos Estudantes (UNE), as Ligas
Camponesas e grupos católicos como a Juventude Universitária Católica
(JUC) e a Ação Popular (AP).
Os dirigentes sindicais mais combativos foram cassados, presos, torturados
e substituídos por interventores que conduziam os sindicatos como órgãos
de colaboração do Estado. Com o golpe militar, a direção da CONTAG foi
deposta e alguns dirigentes foram presos.
Milhares de pessoas foram presas e casos de tortura transformaram-se em
atos comuns. As pessoas também foram atingidas em seus direitos
individuais e coletivos. O Ato Institucional (AI) foi criado pelo governo militar
– cujo objetivo era justificar os atos de execução. Os militares justificavam
sua ação afirmando que o objetivo era restaurar a disciplina e deter a
“ameaça comunista”. Com o golpe, deu-se início à implantação de um
regime político marcado pelo “autoritarismo”.
O Estatuto da Terra, elaborado durante o governo de João Goulart, foi
promulgado devido às pressões internacionais e internas, mas, com
profundas modificações. Ainda assim, marcou uma nova etapa em relação à
legislação existente, permitindo, dentre outras coisas, a intervenção do
Estado no setor fundiário, mediante a desapropriação de terras por
interesse social.
O governo militar concentrou-se na modernização das relações capitalistas
no campo e nos projetos de colonização nas áreas de fronteira,
preocupando-se com um projeto agrícola afinado com sua política
econômica. Colocou à margem a pequena produção e favoreceu a
ampliação ainda da concentração de terra e de renda no país. Houve um
estímulo à especulação com a terra e de concessões a grandes empresas
para atuarem no campo. A idéia aguçou o conflito em torno da propriedade,
em especial nas áreas de fronteira agrícola. A política salarial, controlada
pelo governo, impedia os aumentos reais e garantia ao patronato à
crescente exploração de mão-de-obra barata. A repressão à atuação
sindical não permitia que os assalariados rurais pleiteassem seus direitos
trabalhistas.
Os pequenos e médios produtores foram incentivados a se modernizarem,
adquirindo máquinas e equipamentos mediante financiamentos que, mais
tarde, não conseguiram saldar. Essa situação, aliada à ausência de uma

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 109 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

política diferenciada de créditos, resultou na perda de muitas propriedades,


tornando irreversível o processo de concentração fundiária. As lideranças
políticas sindicais comprometidas com a luta por direitos e liberdade,
resistiram como puderam ao regime militar e no 1º Congresso Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura – CNTR.
No 1º Congresso Nacional de Trabalhadores Rurais da CONTAG, realizado
em São Paulo, estava clara a existência de dois grupos políticos, um ligado
ao interventor e, outro ligado a trabalhadores e lideranças que se
mostravam comprometidos com as lutas dos trabalhadores.
Em 1967, o Rio de Janeiro é transformado em sede da Conferência Nacional
Intersindical, congregando representantes dos trabalhadores rurais,
bancários e industriários. Nessa conferência, a defesa da reforma agrária foi
unânime, contando com a presença de sindicalistas rurais de quase todos
os estados. Foi o início de uma articulação ampla, urbana e rural, de
consolidação de uma chapa para concorrer às eleições da CONTAG.
Fruto da união operária e camponesa, por apenas um voto de diferença, a
chapa encabeçada por José Francisco da Silva impõe a derrota ao
interventor e então presidente da CONTAG, José Rotta. Empossada, a nova
diretoria (1968) convocou todas as federações para um encontro, em
Petrópolis (RJ), a fim de elaborar um Plano de Integração Nacional - PIN. A
preocupação maior era criar um instrumento capaz de garantir a unidade
do MSTR diante da divisão política revelada no processo eleitoral.
O PIN elegeu a reforma agrária como uma das bandeiras de luta capaz de
propiciar a unidade do movimento, pois seria de fundamental importância
não apenas para os diretamente envolvidos nos conflitos pela terra, mas
também para o pequeno produtor e o assalariado.
O PIN previu ações específicas para cada setor. No caso dos assalariados,
por exemplo, foram incentivadas as ações coletivas, em grande número,
para abarrotar as Juntas de Conciliação e Julgamento, forçando uma tomada
de posição favorável aos trabalhadores. Essa proposta, quando levada à
prática, causaria uma reação violenta do patronato e do poder público, que
ameaçavam e puniam os líderes sindicais, por promoverem reuniões dos
grupos nos Sindicatos de Trabalhadores Rurais.
A formação de líderes era essencial para o futuro do MSTR. Por meio de
cursos sobre a realidade brasileira, legislação trabalhista, agrária, agrícola,
cooperativismo e de organização sindical, iniciou um contínuo trabalho de
conscientização dos trabalhadores rurais sobre os seus direitos,
qualificando-os para a luta cotidiana.
O PIN marcou a singularidade do MSTTR dentro do sindicalismo brasileiro.
Enquanto as outras confederações urbanas existentes tinham dúvidas entre
resistir ou aceitar a intervenção no movimento sindical, a CONTAG optou
pelo enfrentamento ao poder econômico e político em uma de suas
principais bases: a democratização da terra e a organização política dos
trabalhadores rurais, por meio da formação de lideranças.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 110 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Durante os ‘anos duros’ do regime ditatorial militar, 1968 e 1969, os


dirigentes do MSTR aceleraram o processo de organização e politização da
categoria. Lançaram o periódico “O Trabalhador Rural”, informativo que
levava as idéias e propostas da direção da CONTAG acerca das bandeiras de
lutas e da organização sindical às Federações.
Nesse período, a direção da CONTAG qualificou ainda mais a sua forma de
comunicação com a base, lançando a revista mensal “O Trabalhador Rural”,
apresentando análises sobre a conjuntura nacional e sugerindo
encaminhamentos para reflexão nos estados.
Num dos primeiros números dessa revista, foi transcrita a carta ao Papa
Paulo VI, assinada por José Francisco, que reafirmava: “É, para vencer
barreiras centenárias de irracionalidades geradas pelo latifúndio, sinônimo
de um poder político, econômico, social e cultural que contrariam a função
social de propriedade, é necessária uma decisão drástica e enérgica pela
reforma agrária”. Os textos reproduzidos no periódico demonstram
explicitamente o enfrentamento da CONTAG diante das políticas do governo
militar.
A necessidade de organizar os trabalhadores nos municípios e constituir
sindicatos era uma das grandes demandas do movimento sindical naquele
momento. A revista “o Trabalhador Rural” era um dos meios utilizados para
chamar os trabalhadores para organização sindical. Um espaço chamado
“Conversa de Caboclo” que contavam estórias sobre o cotidiano dos
trabalhadores rurais, criadas pela equipe técnica da Contag e assinadas
com nomes fictícios, para chamar a atenção dos camponeses sobre a
importância da organização sindical. Em uma dessas estórias consta esse
trecho: “E quem é esse sindicato, que vai dar nosso valor? É uma sociedade
composta de agricultor. Nós vai lá se reunir, pra acabar com a tal de meia.
Que sempre nos tem trazido amarrado no nó da peia.”
A luta essencialmente corporativa, nunca foi a marca do movimento sindical
coordenado pela CONTAG, já em 1968, preocupados com a importância da
educação para o desenvolvimento do campo, foi organizado um Encontro
Nacional em Petrópolis. Reunindo diversos representantes das Federações
concluíram que: a) o diálogo deve ser a base para a construção de uma
proposta educativa para o campo; e b) o método a ser utilizado, deve levar
em conta o conhecimento da realidade, que será criticada, para daí se
chegar à escolha da ação e a própria ação, conhecimento e crítica.
Na revista “O Trabalhador Rural”, a direção da CONTAG politizou o debate
sobre o papel da organização sindical e utilizou repetidamente o lema
“Sindicalismo autêntico, é Sindicalismo livre”. Denunciou a intenção de
cooptação do governo através do assistencialismo. Demonstrou que o
conceito de desenvolvimento do governo era diferente da idéia do MSTR:
“milhões de camponeses continuam morrendo de fome (...), mas o Brasil
está em franco crescimento. Sim, porque crescer é bem diferente de
desenvolver”.
Levantamento elaborado pela CONTAG, em 1971, demonstraram que a
estratégia adotada pelo MSTR foi acertada, conforme a tabela abaixo:

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 111 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Levantamento numérico do movimento sindical em 22 estados, inclusive


Brasília e Guanabara, de 1960 a 1971.

Municípios Municípios Municípios Média de sócios por


brasileiros com sem sindicato
sindicatos sindicatos
Inicio de 3959 705 3254 800
1969
Final de 3959 1045 2914 1132
1971
Fonte: Revista O Trabalhador Rural

Em março de 1971, ocorreu a Reunião do Conselho Deliberativo que


escolheu a diretoria da CONTAG para o triênio 1971/1974, tendo como
presidente José Francisco/PE, esta foi a 4ª eleição da CONTAG.
A CONTAG segue sua trajetória e realiza seu 2º Congresso Nacional dos
Trabalhadores Rurais - CNTR em 1973, que representou um marco para
a organização da classe trabalhadora rural, logo o governo militar buscou
impedir a posse da diretoria eleita. Em maio de 1977 foi empossada a
direção para o triênio 1977/1980.
Em 1979 acontece o 3º Congresso Nacional dos Trabalhadores
Rurais, dando visibilidade nacional ao sindicalismo de trabalhadores
coordenados pela CONTAG. Em abril de 1980, foi empossada a direção para
o triênio 1980/1983 e a festa de posse contou com a presença dos ex-
dirigentes Lyndolpho Silva e José Pureza da Silva, ambos fundadores
da CONTAG, de volta ao país após vários anos de exílio.
Durante o 3º Congresso Nacional de Trabalhadores Rurais, em 1979,
em seu discurso de abertura, o presidente José Francisco recordou:
“apesar das condições desfavoráveis para o trabalho sindical entre o último
Congresso e os dias atuais, passamos de 19 para 21 Federações, de 1.500
sindicatos para 2.275, de dois milhões e meio de associados para mais de
cinco milhões”.
A CONTAG estava consolidada, não como um espaço desse ou daquele
‘modo de pensar o sindicalismo’, mas de todas as correntes políticas
existentes. Rompeu com a visão imediatista da luta sindical e buscou
atender às outras dimensões e necessidades do ser humano, inclusive,
apontando o conceito de desenvolvimento que se queria para o campo: “O
desenvolvimento deve vir acompanhado de transformações sociais e
políticas”.
O mesmo aconteceu com o estímulo à participação, em registros internos,
vê-se que reuniões de avaliação e planejamento sempre estiveram
presentes na história dessa entidade, inclusive, com a participação da
assessoria nesses momentos, demonstrando como praticar democracia
interna, mesmo em momentos difíceis e sob ameaça constante dos
militares.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 112 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

No 4º CNTR em 1985 o debate sobre o modelo de reforma agrária


defendido pelo MSTR foi o ponto alto. Os delegados aprovaram a
realização de eleições da CONTAG e Federações em Congresso, com
mandato de três anos. Em dezembro de 1985 aconteceu a 1ª Eleição
Congressual da história da CONTAG.
Apesar da deliberação do 4º CNTR, a eleição da Diretoria e do Conselho
Fiscal da CONTAG, gestão 1989/1992, não aconteceu em congresso. As
urnas foram colocadas nas sedes das federações. A votação foi de um
delegado por sindicato. A Diretoria Efetiva teve como presidente Aloísio
Carneiro/BA. Nessa eleição foi eleita a primeira mulher, Gedalva de
Carvalho/SE, enquanto suplente da direção da entidade.
No 5º CNTR, em novembro de 1991 a participação da base foi ampliada
qualitativa e quantitativamente. Elegeram o dirigente Francisco
Urbano/RN como presidente da CONTAG.
Em agosto de 1994 foi realizado o 1º Congresso Nacional Extraordinário
dos Trabalhadores Rurais – CNETR. Neste congresso participaram a direção
executiva da CONTAG, a direção efetiva das federações e os delegados
eleitos em número correspondente a 10% dos sindicatos filiados a cada
federação. Foi assegurada a participação das diretoras da CONTAG,
como delegadas, e de duas trabalhadoras rurais por estados.
O 6º CNTR acontece em maio de 1995 explicitando a necessidade da
classe trabalhadora rediscutir a sua prática de luta e de convivência
democrática com as divergências. O 6º CNTR foi um marco, pois a partir
daí o Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – MSTTR
incorporou o conceito de agricultura familiar às suas formulações,
dando os passos iniciais para a construção de um projeto alternativo de
desenvolvimento rural, a participação efetiva das mulheres na Diretoria da
CONTAG e uma maior abertura para os jovens e as pessoas da 3ª idade. No
6º CNTR também foi aprovada a filiação da CONTAG à Central Única
dos Trabalhadores - CUT. Em 1995 foi oficializada estatutariamente a
Comissão Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais, cuja
Coordenadora passou a integrar a Diretoria da CONTAG. A Comissão
Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais – CNMTR elege a sua
Coordenadora Nacional, Margarida Maria Alves da Silva (Hilda) do STTR
de Surubim/PE.
Dois anos (1997) depois foi realizada a 1ª Plenária Nacional de
Mulheres Trabalhadoras Rurais que discutiu as lutas específicas das
mulheres e a sua relação com as lutas do conjunto da categoria.
O 7º Congresso representou um marco, em 1998 mais de 1.400
delegados e delegadas debateram e aprovaram um Projeto Alternativo de
Desenvolvimento Rural Sustentável – PADRS. Nascia o PADRS representando
um passo significativo para a articulação e unificação das lutas da categoria
na esfera nacional e para o fortalecimento de um novo tipo de interseção
campo e cidade.
O projeto ampliou a visibilidade política das mulheres coordenadas pela
CNMTR, que já haviam conquistado a inclusão da Coordenação da

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 113 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Comissão Nacional no Estatuto da CONTAG. Incluíram mais um “T” no nome


do congresso, que passou a ser 7º Congresso Nacional de Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais – CNTTR. Foi aprovada também a cota de, no
mínimo, 30% de mulheres em todas as instâncias do sindicalismo
rural. Foi eleito como presidente Manoel José dos Santos/PE.
Neste Congresso os trabalhadores e trabalhadoras rurais aprovaram: o
Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável - PADRS,
tendo por princípio a realização de uma ampla e massiva reforma agrária,
expansão, valorização e fortalecimento da agricultura em regime de
economia familiar, centrado na inclusão social, no desenvolvimento social,
econômico, ecologicamente sustentável e no fim de todas as
discriminações, em especial as de gênero, de geração, raça e etnia. Para a
implementação do Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural
Sustentável - PADRS desenvolveu-se um trabalho de formação de lideranças
em desenvolvimento local, através do Programa de Desenvolvimento
Local Sustentável – PDLS, voltado para a animação e estímulo a
processos de desenvolvimento sustentável ao nível local, possibilitando
uma maior intervenção nas políticas públicas e nos Planos Municipais.
Em outubro de 1999 foi realizado o 2º Congresso Extraordinário
buscando atualizar e potencializar o MSTTR para o desafio de
implementação do PADRS. o 2º CNETTR discutiu e deliberou
especificamente sobre estrutura, organização, gestão e auto-sustentação
do MSTTR. Este processo de avaliação e discussão interna tem possibilitado
continuar na construção de um movimento sindical autônomo, combativo,
ético e participativo.
Em Março de 2001 acontece o 8º CNTTR , onde o MSTTR reafirmou a
estratégia de continuidade e o avanço no processo de
implementação do PADRS, indicando a necessidade de atuação efetiva
na organização da produção e comercialização. Foi criada a Comissão
Nacional de Jovens Trabalhadoras e Trabalhadoras Rurais e a
Coordenadora da Comissão, Simone Battestin/ES foi eleita junto com a
Direção Efetiva da CONTAG. Neste congresso foi deliberada a necessidade
do MSTTR participar articuladamente das Eleições Eleitorais e de eleger
representantes dos trabalhadores e trabalhadoras rurais.
Os Congressos da CONTAG garantiram o debate, a socialização e a
integração nacional das políticas do Movimento Sindical dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais – MSTTR. Ver anexo I sobre a trajetória das Eleições e
Congressos Nacionais da CONTAG.
Desde então, o Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
vem aperfeiçoando suas proposições e ações em torno da construção e
implementação do PADRS, se contrapondo aos padrões dos sucessivos
modelos de desenvolvimento implementados no Brasil. Modelos estes, que
embasados na preservação do latifúndio e na produção de monoculturas
para exportação, fizeram aprofundar a exclusão social, o desemprego, a

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 114 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

concentração da terra e renda, sendo responsáveis, também, pela violência


no campo e pela alta degradação ambiental.31
Como também, implementando e ajustando, permanentemente, o Projeto
Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável - PADRS. Sua última
atualização ocorreu no 9º Congresso Nacional da CONTAG, realizado em
Brasília, no ano de 2005. Dentre os vários ajustes, ressalta-se a reflexão
sobre o princípio da SOLIDARIEDADE. Durante o 9º Congresso, as
trabalhadoras e trabalhadores rurais entenderam não ser possível se opor
ao neoliberalismo sem implementar profundas mudanças nas relações
sociais estabelecidas entre homens e mulheres, de todas as idades, raças e
etnias que vivem e trabalham no campo.
Logo, a solidariedade foi compreendida enquanto principal elemento para a
construção de relações fraternas entre a classe trabalhadora rural, na
perspectiva de um mundo melhor. Nosso projeto passou a ser denominado:
Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e
Solidário – PADRSS.
A construção do PADRSS foi a primeira iniciativa concreta de unificar as
demandas do campo, considerando as diferenças e especificidades
regionais, culturais, produtivas, ambientais, organizativas, de gênero,
geração, raça e etnia. E ainda propõe alternativas específicas que
consideram as demandas das pessoas no âmbito das suas características
produtivas, a exemplo das assalariadas e assalariados rurais, das
agricultoras e agricultores familiares, assentados, acampados, meeiros,
posseiros, extrativistas, dentre outros.
A incorporação das propostas do PADRSS no dia-a-dia do MSTTR estimulou
profundas mudanças em nossas entidades, garantindo um salto qualitativo
e dinâmico às respostas necessárias ao atendimento das demandas da
base. A ampliação das frentes de lutas do MSTTR foi uma delas. Não
bastava atuar nas questões trabalhistas, previdenciárias, de acesso à terra
e crédito, sem articular essas lutas com outras políticas necessárias e
estratégicas para garantir o desenvolvimento rural sustentável que se
pretende.
A ampliação das frentes de lutas acabou estimulando o MSTTR a expandir e
qualificar suas direções. Foram criadas as secretarias específicas,
primeiramente na CONTAG, em seguida nas Federações, e em muitos
Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais.
Essas mudanças apontaram para a necessidade de investir na
formação política, sindical e profissional de novas lideranças
sindicais e técnicas do MSTTR. Essas ações formativas deram
visibilidade a um público estratégico para as mudanças, a juventude e as
mulheres trabalhadoras rurais.
Ainda hoje, esse processo formativo busca conjugar a formação política
sindical com as demandas por melhoria das condições de trabalho,

31
PORTO, Cleia Anice. “Reforma Agrária e Agricultura familiar como base para o desenvolvimento rural –
Sustentabilidade e qualidade de vida, Reforma Agrária e Meio Ambiente, Instituto Socioambiental, 2003, p.107

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 115 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

aumento da renda e dos salários, direitos trabalhistas e previdenciários,


elevação dos níveis de escolaridade, de formação e requalificação
profissional, habitação rural, saneamento básico, saúde pública e de
qualidade, educação do campo e lazer. 32 Conjugadas com as demandas
estruturantes do desenvolvimento rural sustentável, como o acesso à terra,
crédito, infra-estrutura social e produtiva, condições de comercialização,
tecnologias de produção adaptada à agricultura familiar e aos
ecossistemas.
A estratégia do MSTTR se orientou pelo estímulo à participação política e à
gestão democrática na comunidade, município, território ou região, levando
os excluídos e marginalizados do campo a serem protagonistas de uma
outra realidade, sem perder de vista a articulação entre o local, o regional e
o territorial com o global, o rural com o urbano, na perspectiva de uma
sociedade justa, democrática, igualitária e solidária.
Tal estratégia exige uma participação efetiva nos processos políticos e
eleitorais, nos espaços de concepção e gestão de políticas públicas e, o
permanente debate com a sociedade sobre a concepção de espaço rural e
do desenvolvimento que propomos, tendo como um dos principais objetivos
reverter o processo neoliberal e viabilizar políticas públicas necessárias à
implementação do PADRSS.
Não queremos dizer que o projeto vá resolver num passe de mágica os
desafios históricos que estão postos para trabalhadores e trabalhadoras
rurais brasileiras. Mas, sem dúvida, representa um salto qualitativo para
nossa organização, mobilização, luta e ampliação das possibilidades
concretas de implementarmos e consolidarmos o PROJETO ALTERNATIVO
DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTAVEL E SOLIDÁRIO –
PADRSS.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura
– CONTAG, em seus 43 anos de existência, com o esforço e a
participação de milhões de trabalhadores e trabalhadoras rurais, tem
contribuído, de maneira decisiva, para a construção de uma sociedade mais
justa, democrática, igualitária e solidária em nosso País.
Em sua história de luta, a CONTAG continua engajada na defesa
permanente dos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras rurais. É a
maior entidade camponesa da América Latina organizada em 27
Federações Estaduais de Trabalhadores na Agricultura e 4.100 Sindicatos de
Trabalhadores Rurais. Essa organização se constitui no Movimento
Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais - MSTTR. É
essencial que tenhamos viva, unida e ativa essa grande estrutura de
representação construída ao longo desses 43 anos, em prol do bem - estar
da representatividade dos trabalhadores e trabalhadoras rurais do nosso
país.
A CONTAG foi fundada no dia 22 de dezembro de 1963 em 01
Congresso Nacional. Desde então, foram realizados mais 08 Congressos
Nacionais de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, 02 Congressos
32
Anais da 1ª Plenária Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – Novembro 2003

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 116 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Nacionais Extraordinários de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, 01


Plenária Nacional de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, 03 Plenárias
Nacionais de Mulheres Trabalhadoras Rurais, 01 Congresso Nacional da
Terceira Idade, 03 Encontros Nacionais de Juventude.
A CONTAG nestes 43 anos se engajou nas principais lutas do povo
brasileiro: contra a ditadura militar, pela anistia política, pela
convocação da Assembléia Nacional Constituinte, por eleições diretas para
presidente e governadores, no Movimento “Diretas Já”, na Constituinte de
1988 e foi participante do Comitê em Defesa da Ética na Política que levou
ao “Impeachment” o presidente Fernando Collor de Mello.
Os Congressos da CONTAG adquiriram cada vez maior importância política e
capacidade no aprofundamento das questões de interesse da categoria.
A história da CONTAG é marcada também por ações de massa em defesa
dos interesses da categoria. A partir de 1995, o MSTTR passou a se
mobilizar anualmente no “Grito da Terra Brasil” - nacional, estaduais e
municipais - que hoje é considerado como a “data-base” para a
categoria trabalhadora rural, marcada pela mobilização, proposição,
reivindicação e negociação das políticas essenciais para o meio rural.
A Marcha das Margaridas é outra ação de massa importante no contexto
do MSTTR, em sua primeira edição mobilizou milhares de trabalhadoras
rurais dos municípios, estados e regiões, contando também com a adesão
das trabalhadoras urbanas. Foi reconhecidamente, a maior mobilização
nacional de mulheres já realizada na história do país. Os principais objetivos
da Marcha, foram o fortalecimento das organizações e comissões de
mulheres nos STTRs, Pólos/Regionais, FETAGs, CONTAG, e principalmente a
inclusão e organização das mulheres trabalhadoras de base; dar visibilidade
e reconhecimento ao papel político, econômico, social e cultural das
mulheres trabalhadoras rurais no Movimento Sindical de Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais – MSTTR e na sociedade. A próxima Marcha das
Margaridas acontecerá em agosto de 2007.
A CONTAG procurou se estruturar como uma entidade legítima de
representação dos trabalhadores e trabalhadoras rurais em defesa
dos interesses da classe camponesa, contribuindo para a ampliação e o
fortalecimento da organização e representação sindical no meio rural:
reivindicando, mobilizando, propondo e negociando políticas agrícolas
diferenciadas, direitos trabalhistas e políticas sociais que resgatam a área
rural enquanto espaço de vida, de luta, de trabalho e de construção de
conhecimentos capazes de promover as transformações necessárias para
um desenvolvimento sustentável em nosso país.
Nossa trajetória é fruto de organização, trabalho, articulação e mobilização
dos Sindicatos e Federações de Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais que, em cada município e estado, vêm, desde a fundação da
CONTAG construindo o MSTTR.

ANEXO I

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 117 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Trajetória das Eleições e Congressos Nacionais da CONTAG

1ª Eleição da Em Congresso participativo, democrático e de construção de


CONTAG estratégias comuns, as organizações que atuam no campo criam a
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG. O
congresso contou com a participação de 29 federações, de 18
estados. Ao final, foi eleita a primeira Direção Executiva: Lyndolpho
Silva/RJ, Sebastião Lourenço de Lima/MG, e Nestor Vera/SP.
2ª Eleição da Com o golpe militar, a direção da CONTAG foi deposta e alguns
CONTAG dirigentes presos. Uma Junta Governativa foi indicada pelo Ministério
do Trabalho e, no ano seguinte foi eleita para o período de 1965 a
1968 a diretoria composta por: José Rotta/SP; Euclides A. do
Nascimento/PE; Joaquim B. Sobrinho/PA; João de A. Cavalcante/PA;
José Lazaro/PR; Nobor Bito/; Agostinho J. Neto/RJ; Joaquim
Damasceno/RN e Antonio J. de Faria/RJ. Para o Conselho Fiscal, foram
escolhidos: Jose Felix Neto/SE; José Palhares/RN e João Jordão da
Silva/PE.
3ª Eleição da Em 1968, as eleições contaram com duas chapas. Uma encabeçada
CONTAG por José Rotta, que representava a influência do Ministério do Trabalho
e, a outra chapa por José Francisco, contando com o apoio de
entidades sindicais urbanas e da base do movimento sindical de
trabalhadores rurais.
A eleição ocorreu na reunião do Conselho Deliberativo da CONTAG,
onde apenas 11 Federações votavam. Por apenas 01 voto de
diferença, a chapa encabeçada por José Francisco saiu vitoriosa.
Foram eleitos para o mandato de 1968/1971: José Francisco/PE; José
Felix Neto/SE; Joaquim A. Damasceno/RN; José Ari Griebler/RS; Geraldo
F. Miqueletti/PR; João de A. Cavalcante/PB; Agostinho José Neto/RJ;
José Benedito da Silva/AL e Otavio F. Gomes/CE. O Conselho Fiscal:
Joaquim Coutinho/RN; Tarciso G. Mendes/CE e Manoel P. da S. Filho/PB.
4ª Eleição da Em março de 1971, ocorreu a Reunião do Conselho Deliberativo que
CONTAG escolheu a Diretoria da CONTAG para o triênio 1971/1974, composta
pelos diretores efetivos: José Francisco/PE; Otávio F. Gomes/CE;
Francisco Urbano de A. Filho/RN; Zacarias Pedro/SC; Acácio F. dos
Santos/RJ; Agenor P. Machado/SP e José Felix Neto/SE.
2º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais - CNTR, a classe trabalhadora faz valer
sua vontade.
O congresso deliberou sobre: Legislação Rural, Educação, Previdência, Reforma Agrária
e Desenvolvimento Agrícola. No encerramento, o presidente da CONTAG enfatizou a
necessidade de cumprimento do Estatuto da Terra para: “estabelecer um sistema de
relações entre o homem, a propriedade rural e o uso da terra, capaz de promover a
Justiça Social, o progresso e o bem-estar do trabalhador rural e o desenvolvimento
econômico do país, com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio”.

Trajetória das Eleições e Congressos Nacionais da


CONTAG

5ª Eleição da Em março de 1974, o Conselho de Representantes da CONTAG


CONTAG elegeu a nova diretoria para o triênio 1974/1977. A Diretoria
Efetiva foi composta por: José Francisco da Silva/PE; Octavio
Adriano Klafke/RS; Paulo F. Trindade/ES; Jonas P. de Souza/MT;

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 118 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Francisco Urbano A. Filho/RN; José Felix/SE; Leocadio N. de


Oliveira; Acácio F. dos Santos/RJ e José B. da Silva/AL. O
Conselho Fiscal foi composto por: Álvaro Diniz; Euclides D.
Canalle e João Tavares da Silva.
6ª Eleição da Em maio de 1977, foi empossada a Direção para o triênio
CONTAG 1977/1980. A Diretoria Efetiva era composta por: José Francisco
da Silva/PE; Roberto T. Horiguti/SP; Paulo F. Trindade; Orgenio
Rott/RS; Francisco Urbano A. Filho/RN; José Felix/SE; Henrique
Gomes Vilanova/PI; Acácio F. dos Santos/RJ e José B. da Silva/AL.
O Conselho Fiscal foi composto por: Álvaro Diniz; Euclides D.
Canalle e Jonas P. de Souza.
3º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais – CNTR – “Um marco na História da
classe trabalhadora rural”.
7ª Eleição da Em abril de 1980, foi empossada a direção para triênio
CONTAG 1980/1983. A Diretoria Efetiva era composta por: José Francisco
da Silva/PE; Roberto T. Horiguti/SP; André Montalvão/MG; José B.
da Silva/AL; Gelindo Zulmiro Ferri/RS; Jonas P. de Souza/MT;
Eraldo Lírio de Azevedo/RJ; Francisco Urbano A. Filho/RN e
Henrique Gomes Vilanova/PI. O Conselho Fiscal foi composto
por: Álvaro Diniz; João F. de Souza e Norberto Kortmann
8ª Eleição da Em abril de 1983, foi empossada a direção para o triênio
CONTAG 1983/1986. A Direção Efetiva era composta por: José Francisco
da Silva/PE; Roberto T. Horiguti/SP; André Montalvão/MG;
Estevam N. de Almeida/BA; Gelindo Zulmiro Ferri/RS; Jonas P. de
Souza/MT; Eraldo Lírio de Azevedo/RJ; Francisco Urbano A.
Filho/RN e Osmar Araújo/PI. O Conselho Fiscal foi composto por:
Álvaro Diniz; João F. de Souza e Norberto Kortmann.
4º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais - CNTR, “Reforma Agrária para acabar
com a fome e o desemprego no campo e na cidade”. “a democratização da terra é a
base para a democracia no Brasil”.

9ª Eleição da A Direção Efetiva era composta por: José Francisco da Silva/PE;


CONTAG Ezidio V. Pinheiro/RS; Divino Goulart/GO; Francisco Sales/MA;
“1ª Eleição da André Montalvão/MG; Jonas P. de Souza/MT; Elio Neves/SP;
história da CONTAG Eraldo Lírio de Azevedo/RJ; Francisco Urbano A. Filho/RN; Aloísio
em Congresso” Carneiro/BA; Pedro Ramalho/MS e José Amadeu Araújo/CE. O
Conselho Fiscal foi composto por: Henrique Gomes Vilanova;
João F. de Souza e Norberto Kortmann.
10ª Eleição da A Diretoria Efetiva eleita era composta por: Aloísio Carneiro/BA;
CONTAG José Francisco da Silva/PE; José Amadeu Araújo/CE; Antenor
“Eleição da CONTAG Beni/PR; Erny Knortst/RS; André Montalvão/MG; Norberto
de 1989 não ocorreu Kortmann/SC; Vidor Jorge Faita/SP; Francisco Sales/MA; Francisco
em Congresso”. Urbano A. Filho/RN; Pedro Ramalho/MS e Adevair N. de
Carvalho/ES. O Conselho Fiscal foi composto por: Jonas P. de
Souza; Eraldo Lírio de Azevedo e Henrique Gomes
Vilanova.Nessa eleição foi eleita a primeira mulher, a sergipana
Gedalva de Carvalho, enquanto suplente da direção da
entidade. As mulheres conquistam a Comissão Nacional
Provisória da Trabalhadora Rural, que apesar de subordinada à
presidência da entidade, dava os primeiros passos para
consolidar a organização das mulheres trabalhadoras rurais.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 119 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Trajetória das Eleições e Congressos Nacionais da


CONTAG

11ª Eleição da 5º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais – CNTR.


CONTAG “TERRA, PRODUÇÃO, SALÁRIO”.
“apesar das tentativas de desarticulação das organizações
sociais promovidas pelo governo, o MSTR reuniu mais de dois
mil delegados (as) de todo o país, para rediscutir e redefinir
suas lutas”.
A Direção Efetiva eleita era composta por: Francisco Urbano A.
Filho/RN; Aloísio Carneiro/BA; José Francisco da Silva/PE; Juarez
L. Pereira/MG; Tereza Silva/MG; Hilário Gottselig/SC; José
Fialho/MS; Itálico Cielo/RS; José Raimundo de Andrade/PB e
Francisco Sales/MA. Conselho Fiscal: Antonio Zarantonello;
Wilson Paixão e Osmar Araújo.

1º Congresso Nacional Extraordinário dos Trabalhadores Rurais – CNETR


“... não podemos sacrificar a nossa intervenção nos processos eleitorais gerais que o
país viverá, convocando um congresso massivo em Brasília. As eleições de agora terão
a responsabilidade de construir o amanhã...”.
Constatando que o próximo congresso aconteceria na segunda quinzena de novembro,
no mesmo período em que ocorreriam as eleições gerais de 1994, o Conselho
Deliberativo aprovou a realização de um Congresso Extraordinário, em Brasília, em
agosto de 1994. O Congresso Extraordinário foi coordenado pelo Presidente em
exercício, Aloísio Carneiro. Francisco Urbano estava licenciado para concorrer a uma
vaga para o Senado Federal, pelo Rio Grande do Norte

12ª Eleição da 6º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais – CNTR. “Nem


CONTAG fome, nem miséria. O campo é a solução”.
A direção eleita teve a seguinte composição: Diretoria Efetiva:
Francisco Urbano A. Filho/RN; Avelino Ganzer/PA; Gerônimo
Brumatti/ES; Francisco Miguel de Lucena/CE; Maria Santiago de
Lima/RO; Hilário Gottselig/SC; Norival Guadaghin/SP; Francisco
Sales/MA; Alberto Ercílio Broch/RS; Guilherme Pedro Neto/GO;
Airton Luiz Faleiro/PA e Sebastião Rocha/MG. Conselho Fiscal:
Antonio Zarantonello; Divino Goulart e Almir José Feliciano.
13ª Eleição da 7º Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras
CONTAG Rurais – CNTTR. “Rumo a um Projeto Alternativo de
Desenvolvimento Rural Sustentável”.
A partir do 7º – CNTTR, passou a ter três dirigentes na direção
efetiva da CONTAG. As novas diretoras ocuparam a
Coordenação da CNMTR e as Secretarias de Políticas Sociais e a
Secretaria de Organização e Formação Sindical.
de Fátima R. da Silva/PI e Raimunda Celestina de Mascena/CE.
Conselho Fiscal: José Roberto de Assis; Antonio Zarantonello e
Maira Bottega.

Trajetória das Eleições e Congressos Nacionais da


CONTAG

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 120 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

2º Congresso Nacional Extraordinário dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais –


CNETTR
“A prioridade será a discussão na base, os trabalhadores e trabalhadoras rurais
deverão determinar qual o tipo de sindicalismo que irá representá-los no próximo
milênio”.
14ª Eleição da 8º Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras
CONTAG Rurais – CNTTR. “Avançar na Construção do Projeto Alternativo
de Desenvolvimento Rural Sustentável”.
“entre tantas deliberações, vale destacar a criação da
Comissão Nacional da Juventude Trabalhadora Rural e da
estrutura cooperativista ligada ao MSTTR, é o futuro sendo
construído hoje”
Duas chapas concorreram à eleição da direção da CONTAG.
Uma chapa encabeçada por Manoel de Serra e, outra,
encabeçada pelo baiano Edson Pimenta.
A direção eleita teve a seguinte composição: Diretoria Efetiva:
Manoel José dos Santos/PE; Alberto Ercílio Broch/RS; Manoel
Candido da Costa/RN; Hilário Gottselig/SC; Maria do Ó do
Nascimento/AL; Juraci Moreira Souto/MG; José de Jesus
Santana/BA; Airton Faleiro/PA; Guilherme Pedro Neto/GO; Maria
da Graça Amorim/MA; Francisco Miguel de Lucena/CE; Maria de
Fátima R. da Silva/PI; Raimunda Celestina de Mascena/CE e
Simone Battestin/ES. Conselho Fiscal: Francisco Sales, Gilson
Francisco da Silva e Maria Helena Baungarten.

15ª Eleição da 9º Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras


CONTAG33 Rurais – CNTTR. “Consolidando o Projeto Alternativo de
Desenvolvimento Rural Sustentável”.
A direção eleita teve a seguinte composição: Diretoria Efetiva:
Manoel José dos Santos /PE; Alberto Ercílio Broch/RS; Manoel
Cândido da Costa/RN; David Wilkerson Rodrigues/BA; Regina
Rodrigues de Freitas/AC; Juraci Moreira Souto/MG; Pedro Mário
Ribeiro/MG; Antoninho Rovaris/SC; Paulo de Tarso Caralo/ES;
Alessandra da Costa Lunas/RO; Antonio Lucas Filho/GO;
Raimunda Celestina de Mascena/CE; Carmem Helena Ferreira
Foro/PA; Maria Elenice Anastácio/RN. Conselho Fiscal: Francisco
Sales de Oliveira/MA; Ademir Mueller/PR e Elizete Hintz/RS.
Suplentes: Joel José Farias/SE; Simone Battestin/ES; Antonio
Soares Guimarães/CE; Maria Lucinete Nicácia de Lima/AM;
Maria José de Carvalho/PE; Liberalino Ferreira de Lucena/PB;
Wilson Hermuth Gottens/GO; Domingos Albuquerque Paz/MA;
Cláudia Pereira Farinha/DF; Maria da Glória da Silva/MT; Maria
do Ó do Nascimento Melo/AL; Josefa Rita da Silva/BA; Manoel
Carlos Dantas/RO; Paulo César Ventura Mendonça/RJ;
Suplentes do Conselho Fiscal: Maria das Graças Darós/SC;
Geraldo Teixeira de Almeida/MS e Antonio Vitorino da Silva/AL.

33
Fonte: Ata de Posse da Diretoria e do Conselho Fiscal da Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura – CONTAG, para o quadriênio 2005/2009

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 121 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Bibliografia:

 Anais do 4º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais - 1985


 Anais do 5º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais – 1991
 Anais do 1º Congresso Nacional Extraordinário dos Trabalhadores
Rurais - 1994
 Anais do 6º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais – 1995
 Anais do 7º Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais – 1998
 Anais do 2º Congresso Nacional Extraordinário dos Trabalhadores
Rurais - 1999
 Anais do 8º Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais – 2001
 Anais da 1ª Plenária Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais – Novembro 2003
 Anais do 9º Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais – 2005
 Publicação – Revista Contag - 40 anos
 Ata de Posse da Diretoria e Conselho Fiscal da Confederação Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, para o quadriênio
2005/2009.
 Manfredi, Sílvia Maria – Formação sindical no Brasil : história de uma
prática cultural / Silvia Maria Manfredi – São Paulo : Escrituras Editora,
1996.
 Sindicalismo – Brasil – História 2. Sindicatos – Brasil – História I. Título
 PORTO, Cleia Anice. “Reforma Agrária e Agricultura familiar como
base para o desenvolvimento rural – Sustentabilidade e qualidade de
vida, Reforma Agrária e Meio Ambiente, Instituto Socioambiental,
2003, p.107
 O Golpe Militar de 64 e a Instauração do Regime Militar – CPDOC –
Fundação Getúlio Vargas – FGV.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 122 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

HISTÓRICO DA CUT NACIONAL

Fonte: www.cut.org.br

A Central Única dos Trabalhadores (CUT) é uma organização sindical de


massas em nível máximo, de caráter classista, autônomo e democrático,
adepta da liberdade de organização e de expressão e guiada por preceitos
de solidariedade, tanto no âmbito nacional, como internacional. A CUT foi
fundada em 28 de agosto de 1983, na cidade de São Bernardo do Campo,
no estado de São Paulo, no 1º Congresso Nacional da Classe Trabalhadora.
O QUE QUEREMOS?
A defesa dos interesses imediatos e históricos da classe trabalhadora,
melhores condições de vida e trabalho e o engajamento no processo de
transformação da sociedade brasileira em direção à democracia e ao
socialismo.
Organizar, representar sindicalmente e dirigir numa perspectiva classista a
luta dos trabalhadores brasileiros da cidade e do campo, do setor público e
privado, dos ativos e inativos.

NOSSOS PRINCÍPIOS
 Defender que os trabalhadores se organizem com total independência
frente ao Estado e autonomia em relação aos partidos políticos, e que
devem decidir livremente suas formas de organização, filiação e
sustentação material;
 Garantir a mais ampla democracia em todos os seus organismos e
instâncias, assegurando completa liberdade de expressão aos seus
filiados, desde que não firam as decisões majoritárias e soberanas
tomadas pelas instâncias superiores e seja garantida a unidade de
ação;
 Desenvolver sua atuação de forma independente do estado, do
governo e do patronato, e de forma autônoma em relação aos
partidos e agrupamentos políticos, aos credos e às instituições

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 123 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

religiosas e a quaisquer organismos de caráter programático ou


institucional;
 Considera que a classe trabalhadora tem na unidade um dos pilares
básicos que sustentarão suas lutas e suas conquistas. Defende que
esta unidade seja fruto da vontade e da consciência política dos
trabalhadores da cidade e do campo;
 Solidariedade com todos os movimentos da classe trabalhadora, em
qualquer parte do mundo, desde que os objetivos e princípios desses
movimentos não firam os princípios da CUT. Defenderá a unidade de
ação e manterá relações com o movimento sindical internacional,
desde que seja assegurada a liberdade e autonomia de cada
organização.

NOSSO COMPROMISSO
 Desenvolver, organizar e apoiar todas as ações que visem a conquista
de melhores condições de vida e trabalho para o conjunto da classe
trabalhadora da cidade e do campo;
 Lutar para a superação da estrutura sindical coorporativa vigente,
desenvolvendo todos os esforços para a implantação de sua
organização sindical baseada na liberdade e autonomia sindical;
 Lutar pelo contrato coletivo de trabalho, nos níveis geral da classe
trabalhadora e específico, por ramo de atividade profissional, por
setores, etc.;
Apoiar as lutas concretas do movimento popular da cidade e do
campo, desenvolvendo uma relação de unidade e autonomia de
acordo com os princípios básicos da Central;
 Defender e lutar pela ampliação das liberdades democráticas como
garantia dos direitos e conquistas dos trabalhadores e de suas
organizações;
 Construir a unidade da classe trabalhadora baseada na vontade, na
consciência e na ação concreta;
 Promover a solidariedade entre os trabalhadores, desenvolvendo e
fortalecendo a consciência da classe, em nível nacional e
internacional;
 Defender o direito da organização nos locais de trabalho,
independentemente das organizações sindicais, através das
comissões unitárias, com o objetivo de representar o conjunto dos
trabalhadores e dos seus interesses;

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 124 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

 Lutar pela emancipação dos trabalhadores como obra dos próprios


trabalhadores, tendo como perspectiva a construção da sociedade
socialista.

QUEM REPRESENTAMOS?
A CUT é a maior central sindical da América Latina e a 5.ª maior do mundo,
estando presente em todos os ramos de atividade econômica. Segundo os
dados de março de 2004 somava:
3326 - Entidades Filiadas
7.468.855 - Trabalhadoras e Trabalhadores Associados
22.487.987 - Trabalhadoras e Trabalhadores na Base

NOSSA ORGANIZAÇÃO
A CUT se organiza em dois níveis:
Organização Vertical: Parte dos locais de trabalho, buscando aglutinar as
atividades afins em suas formas organizativas, dela fazem parte as
organizações sindicais de base, as entidades sindicais por ramo de
atividade econômica e as federações e confederações, também por ramo
atividade econômica.
Organização Horizontal: Tem por objetivo construir a unidade dos
trabalhadores promovendo sua organização intercategoria profissional
enquanto classe em âmbito regional, estadual e nacional. Além da estrutura
nacional, a CUT está organizada em todos os 26 estados e no Distrito
Federal.

INSTÂNCIAS DE DELIBERAÇÃO E ÓRGÃOS DE APOIO


O Congresso e a Plenária Nacional são os órgãos máximos de deliberação
da Central. O Congresso Nacional é realizado a cada três anos, quando é
eleita a Executiva Nacional composta por 25 membros efetivos e 7
suplentes . A Direção Nacional é composta pela Executiva Nacional e mais
83 membros efetivos representando as estaduais da CUT e a Estrutura
Vertical, escolhidos conforme o estatuto da Central.
Para cumprir eficazmente os seus objetivos e as deliberações, a CUT tem
uma estrutura interna complexa com funções vinculadas a Administração,
Comunicação, Formação, Políticas Sociais, Política Sindical, Mulher
Trabalhadora, Relações Internacionais e Organização. Conta ainda com

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 125 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

comissões sobre a Amazônia, Meio Ambiente e Combate a Discriminação


Racial.
Os organismos para o desenvolvimento de políticas específicas e assessoria
são:

 Agência de Desenvolvimento Solidário (ADS)

 Observatório Social,

 Instituto Nacional de Saúde no Trabalho (INST)

 Departamento de Estudos Sócio-Econômicos e Políticos (DESEP).


Tem ainda sete escolas sindicais:
 Escola Sul (Florianópolis-SC)
 Escola São Paulo
 Escola 7 de Outubro (Belo Horizonte- MG)
 Escola Amazônia (Belém-PA)
 Escola Chico Mendes (Porto Velho-RO)
 Escola Centro-Oeste (Goiânia-GO)
 Escola Sindical da CUT no Nordeste Marise Paiva de Moraes (Recife-
PE).

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 126 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

POTENCIAL E LIMITE DAS DISPUTAS POLÍTICAS:


PONTOS PARA REFLEXÃO

Sara Pimenta e Domingos Corcione - Agosto de 2006

Dirigentes e lideranças sindicais constroem projetos políticos ou se


identificam com um entre aqueles já existentes, assumindo sua defesa no
cotidiano da vida sindical.
É comum a existência de projetos diferenciados em suas origens e
concepções político-ideológicas. Isso resulta em disputas pela
predominância e hegemonia de um sobre o outro.
As disputas políticas não se limitam aos antagonismos entre trabalhadores
e classes dominantes, mas têm lugar no interior do próprio Movimento
Sindical e entre este e outros movimentos e organizações populares. Em
muitos casos as disputas internas se tornam de tal forma acirradas que
geram rupturas e levam à criação de novas entidades e movimentos. Mas
há disputas “menores” - não menos importantes - que caracterizam o
cotidiano do MSTTR: disputas de idéias, de espaços, de reconhecimento, de
protagonismo e liderança. Afinal, disputas permanentes de poder.
A dimensão positiva das disputas políticas
As disputas podem ser vistas como elementos que integram a dinâmica
política do MSTTR, em sua dimensão positiva e construtiva, favorecendo a
qualificação dos projetos políticos e a aquisição - pelos dirigentes e
lideranças - de maior habilidade na defesa de suas posições.
A pluralidade ideológica e de posicionamento político confere um novo
dinamismo à luta sindical e aos processos de mudança, pois pode sinalizar
o surgimento e a consolidação de novas práticas. As posições são
demarcadas de modo a assegurar os interesses relacionados com o projeto
defendido, colocando em destaque pontos divergentes, conferindo maior
clareza às idéias e facilitando a comunicação.
Idéias, posições e projetos, quando em disputa, ganham maior relevância,
são apresentados e defendidos na perspectiva de fazerem adeptos e
construírem sua hegemonia.
Todo esse processo promove fortes motivações para se avançar com maior
garra, perseguindo as estratégias necessárias para vencer as posições
antagônicas ou diferenciadas e conquistar novos espaços de poder.
Práticas a serem transformadas

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 127 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

Apesar dos aspectos positivos acima ressaltados, é preciso reconhecer que


no campo das disputas políticas ainda persistem posturas e atitudes
equivocadas, que ferem a ética e acabam por comprometer o avanço da
organização sindical e a construção de projetos de mudança social, tais
como:
 Dificuldade de reconhecer o outro como um legítimo interlocutor e
de construir um diálogo aberto, que implica, sobretudo, na escuta
atenta das posições ou correntes adversárias.
 Utilização de palavras e gestos ofensivos, que acabam por incorrer
em desrespeito pessoal com quem esteja representando posições
políticas diferenciadas ou adversárias.
 Dificuldade de identificar e reconhecer valores e aspectos positivos
nas idéias, posicionamentos e pessoas que estejam defendendo
posições ou projetos diferenciados. Forte tendência a distorcer o
que se vê e se ouve e a evidenciar somente aquilo que se
considera equivocado, contraditório e incorreto no lado adversário.
 Tendência a forjar oportunidades para denegrir a imagem da
posição adversária e – em certos casos – humilhar e desqualificar
as pessoas que a defendem.
A formação como espaço estratégico para a construção de novas
práticas
As disputas, tão comuns no cotidiano sindical, acontecem também nos
“espaços de formação programada”, como Seminários, Oficinas ou
Encontros de caráter formativo, voltados para o estudo, para a reflexão
mais aprofundada ou a capacitação. Nesses espaços, mesmo entre pessoas
de uma mesma corrente político-ideológica, ocorrem debates, mais ou
menos acirrados, que reproduzem posturas positivas ou equivocadas, como
aquelas anteriormente citadas.
As atividades de formação têm uma importância primordial na vida sindical.
Sem formação não há como qualificar a luta. Um curso de formação, um
seminário ou uma oficina podem contribuir muito para esclarecer idéias e
projetos, avaliar a caminhada, fazer repensar e aprimorar estratégias e
métodos de trabalho. A ação formativa, portanto, tem um grande
rebatimento na ação mobilizadora e transformadora da luta sindical.
Contudo, para que esse rebatimento tenha um impacto realmente positivo,
é preciso fazer das ações e atividades formativas espaços estratégicos,
reconhecendo-os em seu potencial catalisador de novas concepções e
práticas, o que demanda alguns compromissos como os abaixo
relacionados:
 Respeitar a pluralidade de concepções e idéias e buscar compreendê-
las de modo a compor uma visão crítica e construtiva, frente a todas
elas.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 128 -
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG

 Resgatar, em primeiro lugar, a história, explicitar o significado e


prever os possíveis desdobramentos de cada concepção e prática,
pautando-se pelo estudo e pesquisa.
 Refletir e aprofundar o debate, para identificar insuficiências e
valores de cada posição. Cada prática ou concepção revela
fragilidades, mas também tem contribuições a dar. Para isso se faz
necessário uma postura aberta ao diferente e o exercício da escuta
sempre atenta ao que a outra posição ou corrente tem a transmitir.
Nessa perspectiva, é fundamental reconhecer as próprias limitações e
se dispor a rever posições.
 Fazer da formação um campo profícuo de debates e oportunidades de
aprendizado e aprimoramento das idéias e concepções ideológicas,
primando por uma postura ética e respeitosa para com as pessoas e
grupos.
 Tratar as disputas políticas como elementos constitutivos de um
desafiador processo de construção de consensos.
Na medida em que nos dispormos a construir e assumir novas posturas e
práticas para as quais os espaços de formação nos convocar, certamente
estaremos dando largos passos para transformar o cotidiano de nossas
relações políticas no movimento sindical.
Portanto, não se trata de acabar com a disputa, pois – reiteramos - ela pode
ser positiva e dinamizadora da ação social transformadora. O desafio é
conferir às nossas disputas uma dimensão mais humana e humanizadora,
coerente com nossos sonhos e utopias, de modo que isso nos faça crescer
em todas as dimensões: na política, nas relações interpessoais, nas
relações de gênero... Uma disputa que nos aproxime cada vez mais da nova
sociedade que queremos construir: justa, igualitária, solidária e respeitosa
das diferenças, onde se conviva – ao mesmo tempo – na unidade e na
diversidade.

2º Módulo Regional Sul


São José (SC), de 07 a 13 de outubro de 2007.
- 129 -

Você também pode gostar