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Superior Tribunal de Justiça

AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.512.039 - MG (2019/0158988-9)

RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ


AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : EGIDIO BONIFACIO GOMES
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO TENTADO.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL. FASE DE
PRONÚNCIA. ANIMUS NECANDI. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS.
AFERIÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA N.º 7 DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. A Corte a quo concluiu inexistir indícios idôneos da presença do
animus necandi, motivo pelo qual manteve a decisão desclassificatória proferida
pelo Juízo de primeiro grau. Para rever a conclusão, seria necessário o reexame
de matéria fático-probatório, descabido em recurso especial, nos termos da
Súmula n.º 7 do Superior Tribunal de Justiça.
2. Cabe ressaltar, que mesmo vigorando nesta fase processual o
princípio do in dubio pro societate, é necessária a presença de indícios
probatórios mínimos que indiquem a presença do dolo de matar.
3. Agravo regimental desprovido.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma


do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por
unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora. Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Antonio
Saldanha Palheiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 17 de dezembro de 2019(Data do Julgamento)

MINISTRA LAURITA VAZ


Relatora

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AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.512.039 - MG (2019/0158988-9)

AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL


AGRAVADO : EGIDIO BONIFACIO GOMES
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ:

Trata-se de agravo regimental interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO


FEDERAL contra decisão de minha lavra, por meio da qual foi conhecido o agravo do Ministério
Público do Estado de Minas Gerais para não conhecer do respectivo recurso especial, nos termos
da seguinte ementa (fl. 318):

"AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL.


HOMICÍDIO TENTADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL.
FASE DE PRONÚNCIA. ANIMUS NECANDI. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS.
AFERIÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA N.º 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL
DE JUSTIÇA. AGRAVO CONHECIDO PARA NÃO CONHECER DO
RECURSO ESPECIAL."

Alega o Agravante, nas razões do regimental, que, ao contrário do consignado na


decisão agravada, não incide na hipótese dos autos o óbice da Súmula n.º 7 do Superior Tribunal
de Justiça, na medida em que o deslinde da controvérsia não demanda nova incursão no
arcabouço fático-probatório acostado aos autos.
Argumenta que, havendo indícios de autoria, tal como ocorre na espécie, o
julgamento deve ser levado a termo pelo Tribunal do Júri, em obediência ao princípio in dubio
pro societate.
É o relatório.

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AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.512.039 - MG (2019/0158988-9)

EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO TENTADO.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL. FASE DE
PRONÚNCIA. ANIMUS NECANDI. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS.
AFERIÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA N.º 7 DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. A Corte a quo concluiu inexistir indícios idôneos da presença do
animus necandi, motivo pelo qual manteve a decisão desclassificatória proferida
pelo Juízo de primeiro grau. Para rever a conclusão, seria necessário o reexame
de matéria fático-probatório, descabido em recurso especial, nos termos da
Súmula n.º 7 do Superior Tribunal de Justiça.
2. Cabe ressaltar, que mesmo vigorando nesta fase processual o
princípio do in dubio pro societate, é necessária a presença de indícios
probatórios mínimos que indiquem a presença do dolo de matar.
3. Agravo regimental desprovido.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (RELATORA):


Consta nos autos que o Juízo de primeiro grau pronunciou o Agravado no tocante
ao art. 121, § 2.º, inciso II, c.c. o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal (fls. 135-140).
Irresignada, a Defesa interpôs recurso em sentido estrito, ao qual a Corte de
origem deu provimento para desclassificar a conduta para a prevista no art. 129, caput, do
Código Penal e, de ofício, declarou extinta a punibilidade do Acusado (fls. 185-195).
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (fls. 211-215).
Sustenta a Acusação, nas razões do apelo nobre, contrariedade aos arts. 14,
inciso II, 121, § 2.º, inciso II, do Código Penal; aos arts. 74, § 1.º, 413, caput e § 1.º, 418 e 419 do
Código de Processo Penal; bem como ao art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Contrarrazões às fls. 241-258.
O recurso especial não foi admitido (fls. 260-264). Foi interposto agravo (fls.
268-281).
O Ministério Público Federal, em parecer às fls. 298-316, opinou pelo
conhecimento do agravo para dar provimento ao recurso especial.
Por meio da decisão de fls. 318-322, foi conhecido o agravo para não conhecer do
recurso especial do Ministério Público do Estado de Minas Gerais.
Daí a interposição do presente agravo regimental (fls. 327-344).
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Feito esse breve escorço histórico, passo ao exame da controvérsia.
O acórdão recorrido, na parte que interessa, está calcado nas seguintes razões de
decidir (fls. 189-194; sem grifos no original):

"Narra a denúncia que no dia 04 de março de 2007, por volta de


09h, na rua Seringueira, n° 19, bairro São João, o apelante, impelido por
motivo fútil, teria tentado matar Raimundo Quintino Rosa, só não
alcançando seu intento por circunstâncias alheias à sua vontade.
Apurou-se que no dia e horário mencionados, a vitima e o
recorrente estariam no interior do estabelecimento comercial denominado
'Bar da Cidinha', sendo que Raimundo jogava sinuca e Egídio bebia cerveja
no balcão. Em dado momento, e sem motivo aparente, o recorrente teria
surpreendido o ofendido pelas costas, passando-lhe o braço ao redor do
corpo, desferindo-lhe um golpe de faca na região abdominal, causando as
lesões descritas no ACD de f. 15.
Consta ainda que na época dos fatos, a vítima estaria mantendo um
relacionamento amoroso com a ex-namorada do recorrente, tendo o ciúme
sido o motivo do crime.
O d. Magistrado Sumariante pronunciou o acusado nos termos já
relatados, o que culminou na interposição de recurso em sentido estrito pela
defesa.
[...]
In casu, a materialidade delitiva encontra suporte nos autos pela
prova testemunhal e, ainda, em razão do Boletim de Ocorrência de ff. 07-08
e do Exame de Corpo de Delito de f. 15 e Prontuário Médico de f. 14.
Verifica-se ainda a existência nos autos de indícios do cometimento
do crime por parte do recorrente, em especial diante de suas próprias
declarações (ff. 19-20 e do ofendido (ff. 09-09v), que confirmam a
existência de um entrevero entre ambos.
Em sendo assim, não há dúvidas de que acusado e vítima estiveram
juntos no dia e no local dos fatos. As agressões praticadas por aquele
contra esta estão claras nos autos. A única dissonância entre a versão da
defesa e a da acusação gira em torno das circunstâncias que permeiam o
fato, isto é, se o acusado agira (ou não) com intenção de matar a
companheira (animus necandi).
Nesse aspecto, verifica-se as declarações do réu e da vítima, e os
depoimentos da testemunha presencial dos fatos.
O primeiro confirmou haver brigado e empurrado a vítima com a
faca, não se lembrando de maiores detalhes sobre os fatos mesmo porque
estaria embriagado: Afirmou ainda que não teria tido a intensão de ceifar a
sua vida:
[...]
Já o ofendido afirmou que se encontrava em um bar, jogando
sinuca, quando agredido com uma facada pelo recorrente, que também
estaria no bar, bebendo cerveja.
[...]
Maria Aparecida de Assis, testemunha presencial dos fatos, sob o
crivo do contraditório, à f. 89, afirmou que acredita que o acusado não
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teria tido a intenção de matar vítima, já que 'devia estar de cabeça quente por
causa da namorada'. Relatou ainda que o ferimento casado na vítima seria
pequeno.
Não houve maiores consequências em face das agressões sofridas
pela vítima, nem me parece ter sido praticado algo de tamanha gravidade
como tenta fazer crer a versão narrada na denúncia.
Ora, a própria vítima, ao final de sua oitiva judicial, ressaltou que
teria desconsiderado a agressão, haja vista que sequer teria procurado o
apelante para tomar satisfação de sua conduta.
Assim, a verdade é que os elementos contidos nos autos indicam a
ocorrência de uma simples discussão por ciúme entre as partes, que resultou
em lesões corporais. Tal fato realmente demandava ser apurado e
eventualmente punido o agressor, mas dai a classificá-lo como tentativa de
homicídio, afigura-se um tanto ou quanto exagerado, dado que não há
sequer indícios de animus necandi na conduta do réu, como se exige para
um decreto de pronúncia.
[...]
Nem mesmo indiciariamente é possível sustentara existência sequer
de dolo eventual na conduta praticada pelo ora recorrente.
Destarte, impõe-se a cassação da r. sentença de pronúncia em
razão da desclassificação do crime doloso contra a vida para outro que não
de competência do Tribunal do Júri – qual seja, o de lesão corporal de
natureza leve (art. 129, do Código Penal).
Por outro lado, uma vez desclassificada a conduta do apelante
para o delito de lesão corporal de natureza leve, forçoso é convir que a
pretensão punitiva estatal já se encontra fulminada pela prescrição.
Verifica-se que a pena máxima cominada ao delito em tela é de 01
(um) ano de detenção, que prescreve em 04 (quatro) anos, nos termos do
art. 109, V, do Código Penal.
Sendo assim, verifica-se que da data do recebimento da denúncia
(13/09/2010 - f. 26) à da publicação da sentença de pronúncia (18/09/2016
- f. 102), transcorreu lapso temporal superior aos 04 (quatro) anos,
necessários para a extinção da punibilidade."

Como se vê, a Corte a quo concluiu inexistir indícios idôneos da presença do


animus necandi, motivo pelo qual manteve a decisão desclassificatória proferida pelo Juízo de
primeiro grau. Para rever a conclusão, seria necessário o reexame de matéria fático-probatório,
descabido em recurso especial, nos termos da Súmula n.º 7 do Superior Tribunal de Justiça.
Cabe ressaltar, que mesmo vigorando nesta fase processual o princípio do in
dubio pro societate, é necessária a presença de indícios probatórios mínimos que indiquem a
presença do dolo de matar.
A propósito:
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.

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TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. DESCLASSIFICAÇÃO.
USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JURI.
INEXISTÊNCIA, NA ESPÉCIE. ANIMUS NECANDI. SÚMULA 7/STJ.
RECURSO DESPROVIDO.
1. Se a desclassificação da conduta pelo juiz da pronúncia ocorre
porque cristalina e induvidosa a certeza quanto à inexistência de animus
necandi, resta ausente qualquer usurpação da competência
constitucionalmente atribuída ao Tribunal do Júri (REsp n. 1.312.781/RS,
Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 27/9/2013).
2. O exame da pretensão recursal, para que seja reconhecida a
ausência de animus necandi implica a necessidade de revolvimento do
suporte fático-probatório delineado nos autos. Incidência da Súmula n. 7 do
STJ.
3. Agravo regimental desprovido." (AgRg no AREsp 1.330.697/RS,
Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA,
julgado em 04/09/2018, DJe 14/09/2018.)

"PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO


AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 413 DO CPP E
121, § 2º, II, E 14, II, AMBOS DO CP. TRIBUNAL DO JURI.
DESCLASSIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DO ANIMUS NECANDI.
POSSIBILIDADE. RECONHECIMENTO DO DOLO. REEXAME DE
MATÉRIA FÁTICA. VEDAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A
QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Se a desclassificação da conduta pelo juiz da pronúncia ocorre
porque cristalina e induvidosa a certeza quanto à inexistência de animus
necandi, resta ausente qualquer usurpação da competência
constitucionalmente atribuída ao Tribunal do Júri.
2. Reavaliar os fundamentos do aresto combatido, para se
reconhecer o dolo na conduta e restabelecer a decisão de pronúncia,
demandaria, necessariamente, o reexame fático e probatório dos elementos
carreados aos autos, procedimento vedado na via dos apelos excepcionais.
Incidência da Súmula 7/STJ.
3. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no AREsp
1.260.736/GO, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 14/08/2018, DJe 28/08/2018.)

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo regimental.


É como voto.

Documento: 1902906 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 03/02/2020 Página 6 de 4
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEXTA TURMA

AgInt no
Número Registro: 2019/0158988-9 AREsp 1.512.039 /
MG
MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 00109523620108130362 0362100010952 036210001095236 10362100010952001


10362100010952003 10362100010952004 362100010952

EM MESA JULGADO: 17/12/2019

Relatora
Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS
Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO
AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
AGRAVADO : EGIDIO BONIFACIO GOMES
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra a vida - Homicídio Qualificado

AGRAVO INTERNO
AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : EGIDIO BONIFACIO GOMES
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos
do voto da Sra. Ministra Relatora.
Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Antonio
Saldanha Palheiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Documento: 1902906 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 03/02/2020 Página 7 de 4

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