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A Formação do Estado de Israel: a influência britânica no conflito Árabe-

Sionista*

Robson da Silva Dutra Lima**


Resumo
Este estudo busca compreender a origem da relação litigiosa árabe-sionista, em que dois nacionalismos com
caráter político e religioso entraram em conflito pela posse da Palestina. A imigração judaica intensifica-se ao
longo do século XX, quando o projeto político sionista ambiciona a formação de um Estado político judaico na
região. Com o desenvolvimento da Grande Guerra, o Império Otomano foi extinto, abrindo o Oriente Médio para
as potências imperialistas européias. Portanto esse estudo visa desmembrar a origem tortuosa do conflito.
Palavras-chave: Imperialismo, nacionalismo, sionismo, anti-semitismo, palestinos.

Este artigo tem como objetivo analisar a origem do conflito existente entre árabes
palestinos, os Estados árabes e os sionistas na primeira metade do século XX. Certamente, o
Oriente Médio1 é uma das regiões de maior incidência de violência seja de Estado, seja de
cunho civil. Qual seria a origem desse conflito? De que forma o mandato britânico na
Palestina inviabilizou a manutenção política, social, econômica e militar autóctone da região?
Até que ponto a modernização dos Estados políticos nacionais do ocidente influenciou a
liderança sionista e os líderes árabes? Afinal, a pertinência deste tema faz com que seu estudo
se torne necessário para melhor compreensão, também, do estágio atual da região. Neste
sentido, o resgate histórico, não como panacéia para o conflito, mas sim como recurso para
seu entendimento, faz-se necessário.
No final do século XIX e inicio do século XX, os países europeus do Atlântico Norte2
exportaram, às demais regiões do planeta, o padrão de desenvolvimento capitalista dos seus
países industrializados. Dessa forma, impuseram a dominação colonial e estabeleceram
verdadeiros impérios coloniais, espalhando-se principalmente pela África e pela Ásia. Esse
novo sistema econômico e social consistia na exploração de matérias primas dessas
economias não industrializadas, dentro de preços relativamente baixos e na venda de
manufaturas a elas, com preço relativamente alto. Os países do Atlântico Norte, no inicio do
século XX, integraram as demais regiões do planeta ao capitalismo industrial e financeiro,

*
Artigo referente à monografia de conclusão do curso de Especialização em História do Mundo Afro-Asiático
ministrado pela Faculdade Porto-Alegrense de Educação, Ciências e Letras (FAPA), no ano de 2004, sob a
orientação da profª Analúcia Danilevicz Pereira.
**
Licenciado em História (ULBRA), Especialista em História do Mundo Afro-Asiático (FAPA), graduando em
Psicologia (ULBRA) e professor da rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul (SEC).
1
Região estratégica localizada entre a África, Europa e Ásia. A partir do século XIX, torna-se de vital
importância para as potências capitalistas, pois, além de garantir uma ponte para o mercado asiático é uma região
petrolífera de muita intensidade.
2
Refiro-me aos paises europeus que se industrializaram durante o século XVIII e XIX, sendo eles a Inglaterra,
França, Holanda, Império Alemão e Bélgica. Esses países foram os principais responsáveis pelo fenômeno que
ficou conhecido como imperialismo ou neo-colonialismo.
gerando dependência mútua. Contudo, o único modelo de desenvolvimento proposto às
demais regiões do planeta era aquele ao qual estavam submetidos, ou seja, o capitalismo
liberal europeu, que visava à exploração e à abertura de mercados consumidores e com isso a
construção de um padrão social, econômico e militar conforme os padrões impostos pela
sociedade européia.
Esse sistema, que parecia que ia ficar firme ao longo de muitos anos, despencou, no
entanto, como da decorrência da Grande Guerra3. Certamente o conflito marcou um novo
rumo nas relações políticas, econômicas e militares de todos os envolvidos direta e
indiretamente nele. A Revolução Bolchevique4 de 1917 e o estabelecimento do comunismo
soviético trouxeram novas possibilidades e modelos para os territórios coloniais dos países
europeus, apesar de trazerem uma proposta semelhante, somente substituindo a empresa
privada pela empresa pública, tal como afirma o historiador Hobsbawm (1995).
O término do conflito trouxe outras conseqüências, uma delas foi a recessão do pós-
guerra, quando as economias dos países envolvidos no conflito e suas colônias foram
profundamente abaladas, gerando crises econômicas principalmente nas colônias dos países
industrializados, que passaram a vender suas matérias primas por preços menores e a adquirir
manufaturados europeus a preços elevados. Com isso, as sucessivas crises econômicas
trouxeram desordens à administração das elites coloniais que, com a desestabilização
econômica, buscaram mudanças na estrutura social, política e econômica de seus países. O
término do conflito na Europa, trouxe mudanças no que concerne a geopolítica mundial. Os
impérios derrotados5, além de serem extintos, tiveram suas colônias divididas entre a França e
a Inglaterra. O Oriente Médio passou definitivamente ao controle das nações industriais
decadentes do velho mundo, França e Inglaterra que, com a posse da região, buscavam

3
A Grande Guerra ocorreu entre os anos de 1914 até 1918. Atualmente é comum nos referirmos a ela como a
Primeira Guerra Mundial. Participaram do conflito França, Inglaterra, Império Russo e os EUA contra o Império
Alemão, Império Austro Húngaro e Império Otomano.
4
Lênin, Trotsky e os demais líderes do partido Bolchevique Russo lideraram a Revolução Russa de 1917. A
Revolução usurpou o poder do Czar Nicolau II, dando fim ao Império Russo que posteriormente originou a
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), sendo essa de orientação marxista-leninista. A Revolução
foi conseqüência das crises social e financeira do Império Russo, que, após a derrota na guerra contra o Japão
(1904) e a participação onerosa na Grande Guerra, tornaram o sistema imperial russo insustentável.
5
Com o final do conflito o quadro político da Europa e de algumas regiões do planeta foram completamente
modificados. O Império Russo deixou de existir durante o conflito, com a concretização da Revolução Russa e a
usurpação do poder pelos Bolchevistas. O Império Alemão foi transformado em república democrática,
originando a República de Weimar, sendo obrigado a ceder suas colônias e até mesmo territórios às nações
vencedoras do conflito. O Império Austro-Húngaro foi desmembrado em duas repúblicas democráticas e o
Império Otomano, apesar de realizar várias reformas políticas, econômicas e sociais com grande êxito, não
conseguiu permanecer vivo, suas províncias foram terminantemente arrancadas e o Sultão, como os demais
imperadores, foi destituído do poder.
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retomar sua credibilidade diplomática e militar no mundo, com ajuda do tão cobiçado petróleo
da região. Dessa forma, durante o desenrolar do conflito, os ingleses desejavam dominar as
áreas que foram desmembradas do Império Otomano e com isso administradas direta ou
indiretamente. Todavia, os ingleses buscaram aliança com os árabes, para obter apoio contra
os turcos, e com os judeus, para obter apoio contra os alemães. Contudo, a realização desses
acordos se tornou inviável após o término do conflito, pois os ingleses não só mostraram que
estavam dispostos a dominar a Palestina de forma direta, como não demonstraram interesse
em permitir aos árabes e judeus o cumprimento das promessas feitas em momentos anteriores,
com isso inviabilizavam a formação de Estados nacionais árabes ou judeus na Palestina.
Entretanto, o mundo árabe estava tendo influências modernizantes, de origem
ocidental, desde o século anterior. As elites nativas árabes buscavam no nacionalismo burguês
europeu alguma referência para organizar seus Estados. No entanto, o nacionalismo árabe,
não encontrava as referências desejadas. A promessa de criar um estado forte e unificado em
torno de uma língua e uma cultura nacional parecia atraente aos árabes, desde o final do
século XIX. Podemos defini-la como pan-arabismo, mas esse, só a partir do pós-guerra,
ganhou força política, pois foi o responsável pela origem dos Estados árabes na região. Na
medida em que estes surgiram, como resultado de um simples traçado geométrico, ignorando
as realidades subjacentes, não foi possível assentar sobre eles um sentido de identidade
nacional. Esta busca de identidade não encontrou resposta no âmbito das unidades nacionais.
Em virtude disso, o pan-arabismo demonstrou claramente o quanto as fronteiras geométricas
do mundo árabe eram artificiais, pois sua função era de separar política e administrativamente
os árabes.
A realidade árabe não é homogênea, dentro dessa lógica modernizante e estruturante.
Enquanto as demais regiões de predomínios árabes conseguiram se organizar em Estados
nacionais, a Palestina encontrava-se resistente e mergulhada no retrocesso político e
administrativo agravado pela liderança britânica na região. A Inglaterra beneficiou-se com o
mandato da Palestina onde governou até 1948. Sob a desculpa que os povos nativos não
tinham condições de se autogovernarem, os britânicos, através da Liga das Nações,
administraram a região. Obviamente, o mandato da Palestina é um meio de colonialismo, pois
os britânicos necessitavam do controle político e econômico da região, principalmente da
extração de petróleo e do domínio do Canal do Suez6.

6
Inaugurado em 1869, este canal aproximou o oriente do ocidente, localizado na Península do Sinai, fazendo
parte do Estado político egípcio. O controle da região e do canal é de vital importância para as potências
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Os palestinos, sejam eles judeus ou árabes, não encontraram meios para impedir que o
pós-guerra fosse marcado pela administração britânica e com isso, este grupo, ao longo da
década de vinte e trinta do século XX, desestruturou-se, buscando atingir os próprios
interesses e visando à formação de um Estado, não Palestino, mas sim árabe ou judeu na
região. Dessa forma, este período foi marcado pelo crescimento da violência entre os
palestinos (árabes e judeus), ambos se confrontando, passando a se organizar contra a
administração britânica. Essa demonstrara claramente a incapacidade de ‘liderar’ a região, em
função de não viabilizar aos grupos residentes da Palestina os acordos prometidos durante a
Grande Guerra, tais como a formação do lar nacional para os judeus, como afirmaram os
ingleses através de Lorde Balfour,7 em 1917, e as promessas de permitir e organizar na região
os Estados árabes que as elites nativas árabes desejavam.
Os judeus palestinos, europeus e americanos diferentemente dos árabes palestinos
buscavam e se organizavam politicamente de forma homogênea. O sionismo político ganhou
força e adeptos no final do século XIX. Em 1897, ocorreu na Basiléia o primeiro congresso
sionista, tendo a liderança de Theodor Herzl8. A organização sionista pouco herdou da
religião, a política se tornou o seu principal meio de articulação. Com isso, os judeus se
tornaram estrangeiros em seus países. A imigração judaica para a Palestina se tornou cada vez
mais freqüente, por motivos adversos, de natureza religiosa e política, buscando se refugiar do
crescente anti-semitismo europeu.
Os árabes palestinos assistiram à criação do kibutz9 na palestina, em 1911, e à
Declaração Balfour, em 1917, com grande receio. Juntamente com essas investidas sionistas e
imperialistas em seu território, iniciaram-se dois problemas políticos fundamentais na região:
o da imigração e o da terra. Como alternativa, os árabes palestinos tentaram evitar a imigração
de judeus para a palestina e a compra de terras pelos judeus na região. A comunidade árabe
palestina exigiu a anulação da Declaração Balfour e tentou não reconhecer o aumento da
influência dos judeus na região. Com isso, rejeitaram a criação de uma Agência Árabe,
semelhante à Agência Judaica, já existente e responsável pelo controle da imigração judaica.

industriais, o Egito só terá o controle político e econômico do canal a partir da década de cinqüenta do século
XX, onde Nasser vai nacionalizar o canal descontentando as demais potências ocidentais.
7
Lorde Balfour, chanceler britânico, assinou, em 2 de novembro de 1917, a Declaração Balfour. Nela o governo
de sua majestade apóia a criação de um lar nacional judaico na Palestina, trazendo reconhecimento internacional
ao projeto sionista. Obviamente a Declaração Balfour é ainda uma alternativa para obter apoio da comunidade
judaica americana no conflito e contar com os judeus para apoiá-los na luta contra a Alemanha.
8
Fundador do sionismo político, Theodor Herzl (1860-1904), nasceu em Budapeste e estudou direito em Viena,
trabalhando como jornalista. Cobriu o caso Drayfus, se envolvendo, após isso, com o movimento sionista.
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O kibutz se tornou uma das principais maneiras de assentar a população judaica na Palestina, sendo ele,
sociedade coletivista agrária, fundamenta-se na produção socialista.
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Torna-se evidente que os Palestinos temem se colocar em igualdade com os judeus na
Palestina, desperdiçando a oportunidade de constituir bases políticas para a formação de seu
Estado. Desde então surge o anti-semitismo, sobretudo popular, entre os palestinos, que
incorporam do ocidente os estereótipos necessários para gerar, na população civil, o
sentimento anti-semita semelhante ao racista dos séculos XIX e XX.
Com as discussões e o acirramento do conflito árabe-sionista, a Inglaterra propôs a
criação de dois estados na região, o Estado Árabe Palestino e o Estado de Israel, mas perante
o desejo de não ceder o território aos judeus, os palestinos se negaram a aceitar a proposta e
novamente perderam a oportunidade de criar sua unidade política.
Durante a década de trinta, a Inglaterra foi obrigada a trocar o seu discurso da
imigração judaica e a apoiar os árabes na luta contra o sionismo, pois com o crescimento do
nazismo10 europeu, acrescido da aproximação dos estados árabes a um discurso segregador,
os ingleses se viram obrigados a apoiá-los. Com o início das hostilidades no continente
europeu, o apoio da região era de vital importância para a eminente guerra. Somente se
aliando às nações árabes e garantindo a produção de petróleo, os ingleses teriam condições de
participar da guerra, necessitavam, pois, da manutenção das relações políticas e sociais com
árabes. Como os nazistas da Europa, naquele momento, já realizavam perseguições à
comunidade judaica, os ingleses proibiram e passaram a controlar a imigração dos judeus para
a Palestina com o intuito de impedir o crescimento da política nazista em sua região de
influência, supostamente obtendo o apoio dos recém formados Estados Árabes. Os palestinos
viram, portanto, seus projetos nacionalistas desmoronarem perante o aumento da população
judaica em seu território, enquanto os demais países da região obtinham a sua independência
formalmente reconhecida pelos órgãos competentes.
Os árabes palestinos concluíram que o mandato britânico na Palestina era uma
ameaça a seus direitos e à autodeterminação nacional. Com isso, identificaram o sionismo
como mais um golpe do imperialismo ocidental na região, gerando protestos e manifestações
violentas, já nos primeiros anos do mandato. Na década procedente, os ingleses haviam
tentado implantar conselhos municipais para diminuir os protestos e a violência entre ambos.
No entanto, os ingleses mostraram sua incapacidade de governar a região e cada vez mais o
caos ganhava novas intensidades. Com a ascensão do nazismo na Europa, os Palestinos

10
Política desenvolvida pelos países do centro da Europa, a partir dos anos 20, que tem como seus principais
líderes Adolf Hitler e Benito Mussolini, respectivamente líderes da Alemanha e da Itália. Esse regime político
possui algumas características próprias como o culto ao líder, a nação, o racismo e outros. Um modelo político
denominado ’extrema direita’.
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assistiram ao aumento da imigração judaica de forma assustadora para a região. Sob o
discurso de que os ingleses e os judeus eram aliados, os árabes se revoltaram, organizando
greves gerais e até mesmo promovendo rebeliões contra os britânicos. Entretanto, a Palestina
se tornava ingovernável. Dentre todas as situações vistas até então, essa certamente foi a mais
onerosa. Com o desenvolvimento da Guerra na Europa11, os ingleses, temendo ter que
enfrentar os árabes e simultaneamente os nazistas, buscaram o apoio da população árabe e
passaram a vigiar a imigração judaica.
A partir daí, os ingleses se tornaram uma ameaça aos sionistas, pois, além de
controlarem a imigração para a região, buscavam não descontentar as elites nativas árabes.
Nesse momento, os sionistas buscaram uma nova aliança com o governo dos EUA através de
atividades diplomáticas – obviamente, o presidente Truman demonstrou intenção de apoiar os
judeus, com o intuito de obter auxílio para sua reeleição, para a qual o apoio e os votos da
comunidade judaica estadunidense eram vitais. Desde então, a imigração judaica para a
Palestina se tornou ilegal, pois temendo uma aliança entre árabes e nazistas, ou até mesmo
novos levantes, os ingleses não tinham interesse em descontentar os árabes. Entretanto, o raio
de ação dos grupos sionistas se ampliava. Além de despojar a população árabe, ela objetivava
atacar e desmantelar cada vez mais a autoridade dos britânicos na região. Seu governo não
mais interessava aos sionistas. Para ampliar seu raio de ação e construir bases sólidas para o
Estado político judaico, os sionistas prepararam organizações de caráter militar, reunidas em
torno de uma só: Haganah12.
Surgiram alguns grupos extremistas e ultranacionalistas, que passaram a atacar as
comunidades árabes e os órgãos do governo britânico, fazendo com que a Inglaterra ampliasse
o seu contingente militar na região. Em represália aos judeus, os árabes palestinos, seguindo
os exemplos dos sionistas, criaram grupos extremistas que passaram a atuar com táticas de
guerrilhas, suscitando o que conhecemos atualmente como terrorismo13. Para os árabes, não
haveria outra saída e a única forma de intimidar os judeus era com este artifício.
Durante os anos quarenta, a situação política e social na Palestina se exacerbou,
palestinos árabes e judeus buscaram, de forma turva, objetivos distintos, ou seja, enquanto a

11
Refiro-me a Segunda Guerra Mundial (1939 -1945).
12
Organização militar oficial dos judeus (força de defesa). Embora ilegal para os mandatários da região, o grupo
constituía a maior força militar dos sionistas. Sem dúvida, foi a base do exército israelense formado oficialmente
no final da década de quarenta, tendo o inicio de suas atividades na década de trinta.
13
O terrorismo é uma prática muito comum na sociedade, o mais comum é o terrorismo de Estado, pois a
ameaça e o medo levam ao desespero e ao caos. Como deixou evidente Maquiavel, a força e o uso da violência é
um modo concreto de alcançar finalidades bastante precisas.
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comunidade judaica buscava se reafirmar politicamente na região, os árabes buscavam
impedir a concretização do Estado judaico, ao invés de construir ou negociar a formação de
seu Estado.
Com o término das hostilidades na Europa e o fim do nazismo, a sociedade civil em
geral ficou estarrecida com a abertura dos campos de concentração nazistas. Dessa forma, a
comunidade judaica se aproveitou das atrocidades nazistas, ancorando-se, sobretudo, na
opinião pública para construir o Estado Nacional judaico, pois também foram vítimas de
massacres impostos pela Alemanha nazista durante a década de trinta e a Segunda Guerra
Mundial. Contudo, desde os anos trinta, a comunidade judaica estava se preparando para a
Guerra de Independência. Após o término da guerra na Europa, os despojos desta, ou seja, o
material bélico que sobrou dos conflitos ficaram à venda no mercado mundial para os paises
periféricos. Assim, os judeus realizaram um grande esforço para adquirir esses armamentos e,
com isso, formar uma força militar que pudesse proteger os interesses dos colonos judeus.
Oficialmente, a venda de material bélico para os Oriente Médio através de algum Estado
estava proibida, porém não foi isso que ocorreu.
Em função do grande número de socialistas dentro das comunidades judaicas, Stalin
percebeu que o apoio aos judeus poderia levá-lo ao controle efetivo da região, além de se
contrapor ao imperialismo britânico. Além de receberem armas e munições, os colonos judeus
analisaram o desempenho de Rommel14 na África, pois sua desenvoltura elucidou o tipo de
Guerra que seria realizada no Oriente Médio. A campanha do Afrika Korps15 demonstrou que
a provável guerra de independência deveria ser uma guerra de movimentos.
Os judeus, diferentemente dos árabes, estavam se preparando para a guerra há duas
décadas. Os árabes passaram a organizar-se em um momento posterior aos judeus. Durante a
guerra de independência israelense (1948-1949), os árabes ainda estavam criando e ampliando
as estruturas de seus Estados.
Neste ínterim, a causa sionista ganhou apoio das Nações Unidas16, pois a Inglaterra, na
incapacidade de resolver a Questão do Oriente, solicitou a intervenção da organização. Dessa
forma, a chamada ‘causa palestina’ recebeu apoio da comunidade árabe, provocando um
considerável aumento das hostilidades na Palestina. Os Estados árabes preocupados em

14
Refiro-me ao Marechal de Campo do exército alemão nazista.
15
Afrika Korps foi o nome dado ao exército alemão que lutou no norte da África, sob a liderança do Marechal
Rommel, durante a Segunda Guerra Mundial.
16
Com o final da Segunda Guerra Mundial, os países vencedores do conflito tomaram como medida, para
impedir um novo conflito armado de tamanhas proporções, um órgão internacional, a Organização das Nações
Unidas (ONU), a fim de mediar as hostilidades mundiais.
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impedir a formação do Estado judaico, tomaram para si a causa palestina, mas não os árabes
palestinos.
Ao findar o mandato britânico na Palestina, a comunidade judaica proclamou a criação
do Estado de Israel e, com isso, o conflito árabe-sionista tornou-se árabe-israelense. A
recentemente formada Liga Árabe e os árabes palestinos declararam guerra a Israel, Egito,
Líbano, Transjordânia, Síria e Iraque17. Os palestinos se lançaram à guerra, embora não
estivessem preparados para ela. Sob a liderança do rei Abdullah, as forças árabes estavam
obstinadas a destruir e a impedir a concretização do Estado de Israel. O rei Abdullah não
objetivava, porém, a vitória sobre os israelenses naquele momento, pois temia que com a
vitória árabe, os demais Estados se tornassem potências locais e, a partir disso, somassem os
despojos da guerra aos seus domínios. Com isso, o esforço da principal força militar árabe,
estava comprometido. A Legião Árabe, que possuía uma das maiores forças bélicas dos
Estados árabes, não se empenhou para a guerra, o que facilitou muito para os israelenses.
Os árabes precipitaram-se à guerra, lançando seus cidadãos à morte. A guerra de
independência dos judeus foi uma desmoralização para os árabes, pois eles mostraram a
incapacidade de se organizarem e se despreparo para o conflito. Lançaram-se à obstinada
guerra, pela pressão exercida pela opinião pública de seus países. Ao término do conflito, a
massa de refugiados palestinos se ampliou de tal forma, que fez da Faixa de Gaza, onde as
linhas de demarcação da ONU haviam sido ignoradas, a região com a maior densidade
demográfica do mundo.
A guerra de 1948-1949 gerou, portanto, uma série de problemas para os conflitantes.
Para os árabes, a forma como foi empreendida a vexatória derrota, mostrou a incapacidade de
organização do mundo árabe, a supremacia das armas israelenses, a perda de territórios antes
destinados aos árabes pela ONU e a derrota, sobretudo, no campo de batalha. Esta foi umas
das responsáveis pela sucessão de golpes de Estado no mundo árabe. Aos judeus sionistas,
não restava mais nada além da Guerra. A paz tornou-se apenas um sonho.

Referências bibliográficas.

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Traduzido por Eduardo Correia Lobo. Lisboa, Editora Ulisseia, 1958. 247 p.

17
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