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Antes de Escrever um Relatório, Leia-me

Silvia H. Bonilla e Biagio F. Giannetti


(Laboratório de Físico-Química Teórica e Aplicada
Inst. de Ciências Exatas e Tecnologia da Univ. Paulista
R. Dr. Bacelar 1212, CEP 04026-002, S. Paulo, Brasil)

Leia-me

É capaz que o título tenha despertado sua curiosidade ou quem sabe você está
prestes a escrever um relatório e interessou-se por este artigo. Qualquer que
seja sua motivação para estar lendo estas linhas esperamos nos próximos
parágrafos passar algumas informações úteis para escrever um relatório. É
possível que algumas sugestões você já conheça, mas sempre é bom relembrá-
las.

Por que escrevemos relatórios?

A resposta é bastante direta: para comunicar nosso trabalho e nossas idéias por
escrito. Todo relatório tem que ser claro, conciso e exato. Com um relatório
que tenha estas qualidades você terá mais chances de obter a colaboração ou a
resposta esperada de seus superiores e de seus colegas. Por este motivo, a arte
da boa comunicação por escrito não é um luxo, é uma questão de
sobrevivência profissional.

Além do mais, quando se escreve um relatório tem-se a responsabilidade de


fazer uma autocrítica honesta dos resultados experimentais. O bom
profissional deve avaliar o próprio trabalho e relatar aos outros,
quantitativamente se possível, se são bons ou maus, exatos ou incorretos os
dados apresentados. É necessário avaliar os erros das medidas e como esses
erros são refletidos nos resultados que foram calculados. A responsabilidade
de avaliar a qualidade do trabalho experimental é de quem escreve e não do
leitor.

E na escola, por que escrevemos relatórios? Basicamente, os relatórios na


escola servem para treinar a habilidade da comunicação escrita e para
exercitar a autocrítica dos estudantes.

O início do relatório: planejamento

Antes de começar a escrever um relatório é necessário algum planejamento.


Inicialmente definimos a estrutura que o relatório vai ter. Geralmente, os
relatórios acadêmicos possuem a estrutura de um artigo científico, incluindo
(mais ou menos) os seguintes tópicos:

Título

Resumo

Introdução

Experimental

Resultados (ou Resultados e Discussão)

Conclusões

Apêndices

Referências Bibliográficas

Existe outro tipo de relatório, que é o chamado relatório executivo. Este tipo
de relatório é empregado freqüentemente na indústria quando prestamos conta
de nossas atividades ou apresentamos soluções a um superior. Muitas vezes o
superior não está muito disposto a ler todo o relatório, embora precise tomar
uma decisão rápida, especialmente neste caso, é oportuno inverter a ordem,
colocando as conclusões no início do relatório.

Por este motivo, sempre é bom perguntar se há algum modelo de relatório a


ser seguido, se não houver normas siga o seu bom senso.

A idéia fundamental é a de que estamos tentando nos comunicar com alguém


que sabe menos sobre nosso trabalho, mesmo que seja nosso professor ou
nosso superior numa empresa e, geralmente, o leitor vai tomar uma decisão
baseado no conteúdo do relatório (uma avaliação na escola ou - até pode ser o
caso - uma promoção, na empresa). Enfim, é preciso que nos preocupemos
com o destinatário, por exemplo, construímos uma tabela e fazemos
imediatamente a seguinte pergunta: "A tabela é clara? A informação flui
facilmente para o leitor?".

Resumo do conteúdo de cada tópico

A seguir apresentamos algumas descrições gerais e breves do conteúdo de


cada tópico do relatório acadêmico.

Título

Não esqueça de identificar-se.


Resumo

Em poucas linhas, descreva a experiência e talvez o método experimental ou o


aparelho empregado. Sempre, que possível, dê um resultado numérico da
experiência. Seja breve.

Introdução

Coloque a motivação do trabalho, faça um resumo curto da teoria relevante e


apresente as equações matemáticas e químicas importantes para facilitar o
entendimento do relatório.

Numere cada equação matemática e química na margem direita.

Não faça diferença na numeração entre equação matemática e química, por


exemplo:

equação química (1)

equação matemática (2)

Apresentada a equação matemática dê a seguir o significado de cada símbolo


empregado. Quando for a primeira vez que aparecem, no texto, termos
técnicos ou parâmetros experimentais, escreva-os por extenso, e coloque a
correspondente abreviação ou símbolo entre vírgulas ou parênteses. Feito isto
pode-se escrever a abreviação ou o símbolo no decorrer do texto que o leitor
já conhece o significado, como é mostrado no exemplo a seguir:

"Inicialmente o gás se encontrava nas condições normais de temperatura e


pressão, CNTP."...e mais adiante... "O volume do gás, V, medido nas CNTP
tinha um valor muito próximo ao esperado para um gás ideal..."

Se no final do relatório se percebe que há um grande número de abreviações e


símbolos, o melhor a fazer é colocar todos as abreviações e símbolos num
apêndice (que pode ter como título "Simbologia Empregada" ou simplesmente
"Simbologia").

Seja original e breve. Não seja exibicionista, nem faça ostentação esnobe de
seus conhecimentos. Lembre-se que a introdução serve de base para o leitor.

Use o tempo verbal em presente.

Experimental
Descreva o aparelho, a pureza e purificação de reagentes, o método de análise
química, como o sistema foi montado, quais foram as variáveis independentes
e como foram medidas e controladas.

Aqui é apropriado colocar as curvas de calibração (se forem muitas as curvas


de calibração é melhor passá-las para o apêndice).

A apresentação é quase sempre cronológica e é escrita no tempo verbal em


passado.

Resultados

Nesta seção os resultados experimentais são apresentados e discutidos.

Nunca inicie os parágrafos com tabelas ou figuras.

Geralmente, inicia-se cada parágrafo apresentando uma tabela ou uma figura


(como: "A figura 1 mostra a variação de P com T"), dá-se continuidade com a
descrição dos resultados obtidos (por exemplo, se a curva da figura apresenta
um máximo ou, no caso de uma tabela, uma frase do tipo "As medidas de
densidade realizadas, tabela 2, apresentavam erros da ordem de 10%") e, se
for possível, finaliza-se com a interpretação causa-efeito dos resultados
experimentais.

As tabelas e figuras devem entrar no texto de uma maneira lógica, de modo


que a informação flua claramente para o leitor. O leitor não deve ser forçado a
ficar virando a página de trás para frente para encontrar os dados citados.
Numere de forma independente as tabelas e as figuras (por exemplo, tabela 1,
tabela 2, figura 1, tabela 3, ...).

Apêndices

Aqui é um bom lugar para colocar os programas de computador empregados


ou as listas geradas no computador. Cada apêndice deve ter um número e um
título.

Referências Bibliográficas

Apresente uma lista numerada das referências citadas no texto do relatório.

Apresentando os dados

No corpo do relatório temos tabelas e figuras com a finalidade de apresentar


os dados obtidos. A seguir daremos algumas recomendações sobre estes
componentes do relatório.
Tabelas

Não esqueça de colocar um número e um título na tabela. O título deve ser


informativo e deve descrever especificamente o conteúdo da tabela. Os títulos
tal como "Dados Experimentais" ou "Pressões e Temperaturas" não são
satisfatórios. Se possível, coloque no título informações sobre o sistema sob
investigação e as condições experimentais; por exemplo, "A Pressão de Vapor
de Soluções de Etanol de 30 a 50 oC."

A fluência da informação numa tabela é de esquerda para direita e de cima


para baixo. Os dados experimentais ficam nas colunas da esquerda, enquanto
dados numéricos calculados ficam nas colunas à direita dos respectivos dados
experimentais que geraram estes resultados.

As variáveis devem ser definidas no texto do relatório antes da tabela.


Freqüentemente a apresentação de alguma equação matemática que acaba
servindo para gerar dados numéricos na tabela é feita na introdução. Assim
sendo os parâmetros empregados na equação com seus respectivos símbolos
foram apresentados anteriormente. Feito isto, geralmente, é suficiente
encabeçar cada coluna com um símbolo (P, T, M), com a unidade separada
por parênteses (P (atm), T (K), M (g/mol)) ou por uma barra (P/atm, T/K, M/g
mol-1). O mesmo critério para indicar as unidades (parênteses ou barra) deve
ser usado em todas as tabelas e figuras.

Os valores numéricos apresentados numa coluna deveram ficar alinhados com


a mesma casa decimal (casa das unidades uma em baixo da outra, o mesmo
para a casa dos décimos, centésimos, etc.). Um zero deve preceder a vírgula
de fração decimal se o número é menos que um (por exemplo, 0,123). Se os
números são muito grandes ou muito pequenos, todas as entradas numa coluna
podem ser multiplicadas por uma potência apropriada de dez, como no
exemplo:

103 P / atm

4,67

5,34

No exemplo apresentado, é freqüente que alunos tenham a seguinte dúvida: na


primeira entrada o valor da pressão é 4,67 103 atm ou 4,67 10-3 atm?

Aconselha-se nestes casos que se faça leitura como uma sentença matemática
103 P / atm = 4,67, portanto, P = 4,67 103 atm.

Figuras
De maneira mais eficiente que uma tabela, um gráfico serve para informar ao
leitor de forma rápida a relação entre um parâmetro experimental (variável
independente) e um valor calculado ou obtido experimentalmente (variável
dependente). A variável independente deve ser representada ao longo do eixo
horizontal (abcissa) e a variável dependente deve ser representada ao longo do
eixo vertical (ordenada).

Como as tabelas, os gráficos devem ter um número, independente da


numeração das tabelas (mesmo que só exista um gráfico no relatório), e sua
legenda correspondente. As legendas são colocadas, geralmente, sob o gráfico
e devem descrever as condições experimentais. Portanto, uma legenda do tipo
"P vs T" não é satisfatória, pois não diz o gás que foi empregado nem o
volume ou a massa de gás, além disto, não esclarece se o valor de P foi obtido
experimentalmente ou calculado. Enfim, são muitas as duvidas que o leitor
pode ter com relação a uma legenda tão sucinta. A melhor legenda é aquela
que junto com o gráfico forma um conjunto auto-explicativo, isto é, sem ler o
texto o leitor consegue saber como uma determinada variável influencia o
comportamento de outra num determinada condição experimental.

Além dos gráficos os relatórios podem conter fotografias, esquemas ou


desenhos. Todas estas ilustrações, inclusive os gráficos, são chamadas de
figuras, e todas elas possuem uma numeração e uma legenda. Para
exemplificar como se faz a numeração das figuras apresenta-se um texto
hipotético, onde se faz referência primeiro ao desenho de um aparelho e
depois a um gráfico:

"A montagem experimental (Fig. 1) consistia ..." e mais adiante "Na figura 2
são apresentados os valores de ...".

Note que no exemplo chama-se o "gráfico" de "figura", isto é sempre assim,


nunca é usada a palavra "gráfico" (tanto no texto como na legenda), a
denominação correta é de "figura". Note, também, no exemplo que Fig. é a
abreviação de figura.

Para facilitar a leitura, sempre que possível, coloca-se a figura logo após a sua
citação no texto, desse modo o leitor pode ler com fluência o relatório sem ter
que parar a leitura para ficar procurando a referida figura.

Sem receitas

Escrever relatórios é uma arte, que serve para comunicar nosso trabalho e
nossas idéias e, como toda arte, para dominá-la deve ser exercitada. Este
artigo, portanto, não pretende ser uma "receita" e sim um guia breve de
consulta, especialmente dirigido ao aluno iniciante nesta arte. Para finalizar,
vamos repetimos um trecho, que consideramos especialmente importante:
procure fazer relatórios "claros, concisos e exatos".

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