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estudantes-a-superar-o-medo-de-errar

Publicado em NOVA ESCOLA 25 de Outubro | 2019

Pesquisa Aplicada

Jogos educacionais podem ajudar


estudantes a superar o medo de
errar
Aprendizagem depende também da autoconfiança do aluno, que ele acredite
ser capaz de realizar as tarefas. Entenda como ajudá-los nesse desafio
Silvio Henrique Fiscarelli

Foto: Getty Images

É muito comum atribuirmos as dificuldades de aprendizagem dos estudantes a fatores extraescolares


como as políticas educacionais, suas condições socioeconômicas e familiares, bagagem de valores,
experiências e vivências que se chocam com as práticas de ensino na escola. Estes aspectos, sem
dúvida, influenciam o processo educacional. No entanto, gostaria de chamar a atenção para um outro
aspecto que, muitas vezes, passa desapercebido dentro da sala de aula: o medo de errar dos alunos.

Todos os professores, provavelmente, já se deparam com aquilo que parece ser uma “indiferença” ou
“preguiça” do aluno frente as atividades propostas durante a aula. Estão ali, mas não fazem o exercício
e esperam que seja corrigido para copiar a resposta, por exemplo. É claro que existem exceções, mas
esse comportamento pode ser classificado como medo de errar. Na verdade, o medo não é do erro,
mas das consequências do erro.

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Do ponto de vista do aluno, essas consequências podem ser externas, por exemplo, expor sua
condição de não saber fazer uma determinada atividade para o professor e outros alunos. O medo de
errar também gera consequências de caráter interno, quando o aluno, constatando seu erro, se sente
inferior aos outros por não saber realizar uma determinada tarefa. Ou seja, o medo das consequências
do erro leva à insegurança, ansiedade e displicência. O medo de errar leva o aluno a querer “fugir” da
situação e, nestas condições, começa a importunar os colegas e a realizar ações que não têm relação
com a atividade proposta. Uma recente pesquisa realizada na Universidade de Maryland aborda a
“ansiedade social”, um transtorno que atinge crianças e jovens que temem que seus erros sejam
percebidos em situações sociais (BUZZELL et al, 2017).

A aprendizagem depende, em grande parte, de uma autoconfiança do estudante. É preciso que ele
acredite ser capaz de realizar as tarefas, evitando assim, o sentimento de desânimo e de frustração
(Bandura et al, 2008). Esta autoconfiança vai influenciar fortemente no interesse, na persistência e no
esforço dispensado à realização das atividades. Kuhl (2000), chama atenção para um fenômeno
denominado volição , que é um fator distinto da motivação, pois segundo o autor, a motivação é
responsável pelo interesse e desejo inicial, enquanto a volição é responsável pela manutenção do
interesse, das intenções e da ação planejada para atingir os objetivos. Podemos pensar que existe uma
relação entre motivação e volição pois, para dispor-se a realizar uma tarefa, os alunos precisam ter um
certo grau de motivação. Contudo, para se manterem engajados na tarefa e não se dispersarem,
precisam também de um certo grau de volição. O medo de errar atua diminuindo a volição, que é
fundamental para que o aluno se mantenha envolvido e crie oportunidades para a aprendizagem.

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Poderia continuar dando outros exemplos e situações, mas acho que os argumentos são suficientes
para mostrar que o medo de errar é um elemento a ser considerado dentre as chamadas dificuldades
de aprendizagem.

Durante a pesquisa com uso de tecnologia em uma escola do primeiro ciclo do Ensino Fundamental de
Araraquara, no interior do estado de São Paulo, temos observado que o uso dos recursos tecnológicos
pode levar a uma diminuição do medo de errar. De início, destaco o fato de que a maioria dos alunos
não percebem as atividades realizadas no computador como uma forma de julgamento de suas
competências e habilidades, fato que os deixa menos apreensivos em engajar-se nas tarefas. O caráter
lúdico das atividades ameniza o peso dos erros que possam vir a cometer, pois, para o aluno, a
participação e o processo de interação tornam-se mais importantes do que resultado final
propriamente dito.

Os jogos educacionais, quando elaborados de maneira adequada, podem levar os alunos a


perceberem que o erro pode fazer parte do processo, que ele pode refletir porque errou, tentar
corrigir e continuar. Outro aspecto interessante é o fato de os alunos identificarem suas características
individuais de uma maneira mais natural: alguns são mais rápidos no teclado, outros têm mais
habilidade com o mouse; alguns terminam primeiro, outros demoram mais para chegar ao fim. Ou
seja, é uma forma de entenderem que apresentar dificuldades em um ou outro aspecto de uma tarefa
é algo absolutamente normal. Embora a pesquisa esteja em andamento, considero os indícios
apresentados como princípios interessantes de como a tecnologia pode ajudar os alunos a superar,
mesmo que parcialmente, o medo de errar.

Silvio Henrique Fiscarelli é mestre e doutor em Educação Escolar pela Faculdade de Ciências e
Letras de Araraquara (Unesp) e professor na mesma instituição

Para saber mais

Bandura, A.; Azzi, R. G. & Polydoro, S. Teoria Social Cognitiva: conceitos básicos. Porto Alegre:
Artmed, 2008.

BUZZELL et al. A Neurobehavioral Mechanism Linking Behaviorally Inhibited Temperament and


Later Adolescent Social Anxiety.Journal of the American Academy of Child & Adolescent
Psychiatry, volume 56, número 12, 2017 disponível em
https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0890856717317732

Kuhl, J. The volitional basis of personality systems interaction theory: application in leasing and
treatment contexts. Internationl Journal of Educational Research, 2000.

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