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Se Não Servir para Induzir As Expectativas Sobre A Inflação, A Ata Do Copom Não Serve para Nada PDF
Se Não Servir para Induzir As Expectativas Sobre A Inflação, A Ata Do Copom Não Serve para Nada PDF
BC não vai atrás do destino. Ele o faz, ou, ao menos, precisa fazer com que
achemos que o controla. Se quebrar o encanto, será difícil se impor só no gogó
Se não servir para induzir as expectativas sobre a inflação, a ata do Comitê de Política
Monetária (Copom) do Banco Central, principal instrumento de coordenação dos
movimentos da economia, perde a sua razão. E, por consequência, o próprio regime de
metas de inflação.
A arte desse método adotado em vários países não é o sobe-desce da taxa básica de
juros, aqui chamada de Selic, mas a ameaça de o BC vir a acioná-la caso a inflação se
distancie da meta definida pelo governo (não pelo BC) - 4,5% de variação anual, com teto
de 6,5%.
A Selic percebida como uma arma de persuasão, usada com moderação, age,
primeiramente, sobre as renda do capital, sem sequelas sobre o nível de emprego
corrente. Para ser eficaz, ela deve espraiar-se por todo o mercado financeiro, o que não
acontece no Brasil, já que ficam de fora as operações dos bancos públicos com juro
subsidiado e fixo, tornando-as imunes à variação da Selic.
Além disso, também há a indexação, que aumenta a resistência da inflação, e parte dos
papéis do Tesouro é indexada à Selic, protegendo-os contra perdas.
Apesar destas distorções, o sistema de metas tem se mostrado, onde é adotado, superior
ao modelo antigo de combate à inflação, operado com o controle quantitativo do crédito e
da emissão de moeda, cujos efeitos invariavelmente levam à recessão. Na prática, a
inflação só cedia quando começavam as demissões, derrubando o salário real.
O controle da inflação pelos juros é menos nocivo, embora tenha os seus problemas: o
BC depende da cumplicidade dos gestores de fundos – ou seja, do sistema financeiro – e,
conforme seja a rentabilidade operacional das empresas, pode parar os projetos de
investimentos. O corte da demanda começa por ai e não, como é comum se supor, pelo
aumento do custo do crédito, que chega depois.
Horizonte embaçado
É esse arcabouço de razões, ignoradas até por muitos que operam o mercado de títulos
ou analisam as ações do BC, que foi comprometido pela dificuldade do governo de
influenciar o curso da inflação.
A última ata do Copom, divulgada na quinta-feira, mais confundiu que explicou. Mostrou
um BC vacilante, descoordenando as percepções dos gestores do mercado de títulos.
Para o mercado, lato sensu, o que importa é o que o BC fará com a Selic. E eles
entenderam o quê?
A “ata do Copom reforça nossa expectativa de manutenção dos juros em abril e ao longo
de 2013”, informou um banco aos seus clientes, referindo-se à reunião do BC agendada
para 17 de abril. Uma grande consultoria destacou que a “a ata do Copom reforça a
aposta de alta da Selic em maio”, mês da reunião do Copom em seguida à de abril.
E ficou assim: o horizonte embaçado, cada um dizendo uma coisa, o que é ruim para a
atividade e para o emprego, não para a especulação.
O BC pisa em ovos
A ata é esmiuçada pelos economistas e analistas da banca com esses propósitos. Uns
procuram sinais de aperto ou de laxismo monetário – indicativos da fluência dos negócios,
começando pelo crédito e pelo custo-oportunidade do investimento. Se a Selic alçar a
taxa de juro privada acima da rentabilidade estimada dos projetos de expansão, o
provável é que as empresas desacelerem os seus investimentos.
Isso não é desejado numa economia lenta e que está articulada para crescer graças aos
incentivos ao investimento público e privado. É tão ruim quanto as apostas do mercado
financeiro de que a inflação vai continuar pressionada, apesar das medidas
administrativas para suavizá-la (redução da conta de luz, desoneração da cesta básica,
adiamento do aumento de tarifas de ônibus, cabresto sobre o preço da gasolina e do
diesel), exigindo ao BC descongelar a Selic.
Controle do destino
Entende-se que ou a meta (central) deixou de existir ou o BC quer esperar antes de agir,
explicado pelo emprego da palavra “cautela” quanto à Selic. Só que um BC não vai atrás
do destino. Ele o faz, ou, ao menos, precisa fazer com que acreditemos que o controla.
Se quebrar o encanto, será difícil impor a ordem só com o gogó.
Ponto de irritação
A confiança, por sua vez, fala do esgarçamento das relações entre o empresariado e o
governo quase ao ponto de irritação mútua. É ai que a coisa pega, vindo não só das
questões objetivas da economia (o chão movediço da inflação, o ziguezague do câmbio,
os custos em contraponto ao lucro), mas de sutilezas ligadas ao bolso (bolsa em queda,
autuações da Receita e das agencias regulatórias, dirigismo sobre o preço e as taxas de
retorno nas concessões).
A presidente pensa de um jeito, a burocracia faz de outro, o empresariado não é ouvido,
se ouvido não abre o que pensa, e fica essa algaravia.