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Editora: Ática
Ano: 2004
A foto do cartaz
Pamela
As três feras
-- Nesta cidade mora uma bruxa. Ela deve ter uns trezentos anos -
contou Alex.
-- Trezentos anos? Isso não existe! - exclamou Vanessa.
Alex olhou para ela, irritado.
-- Existe, sim. Bruxas podem sempre mudar de aparência. É por isso que
nunca envelhecem.
-- E quem é essa bruxa? - quis saber Bia.
Alex deu de ombros.
-- Não sei. Vocês vão ter que descobrir. Talvez ela possa ajudá-las a
se transformarem em belas garotas.
Em nossa cidade moram cerca de 44 mil pessoas. Como poderíamos
encontrar uma bruxa? Seria como procurar a famosa "agulha no palheiro".
-- E qual é a outra possibilidade? - perguntei. Alex saltou para fora
do círculo de batatas chips e começou a remexer num monte de livros. Um
após o outro, foi
jogando-os para o lado até encontrar um pequeno volume verde-cheguei. A
capa era simplesmente nojenta. Como uma velha pele de cobra ressecada.
Grossos cabelos pretos despontavam
da capa, sobre a qual havia, além disso, pequenas protuberâncias
parecidas com espinhas. Eca!
Alex riu com ar maroto.
-- Esse livro é divertido. Há cerca de duzentos e cmqúenta anos eu
também participei de um concurso de beleza masculina e acabei ganhando.
Graças a este livro.
Franzi a testa, curiosa.
-- Qual é o segredo dele?
-- Ele tem fórmulas que podem fazer com que apareçam verrugas nas
concorrentes, narizes compridos, orelhas de abano, carecas e olhos
remelentos - explicou
Alex, com um largo sorriso.
Aquilo não parecia mau. Era um bom "presente" para Pamela. Eu não
excluiria nada: sete verrugas no mínimo, um nariz bem grande e
torto e orelhas de Dumbo, aquele elefante voador. Claro que não poderia
faltar uma careca brilhante e remelas em um olho só, o que é muito mais
nojento.
-- Mas existe um pequeno problema - disse Alex.
-- Qual?
-- Bem, pode acontecer de mais tarde o feitiço virar contra o
feiticeiro.
-- O quê? - gritei. - Mas então não tem sentido!
-- Você quer ganhar a aposta ou não? - Alex perguntou, mordaz.
Claro que queria, mas apesar disso não queria ficar realmente horrorosa
um ano depois.
-- Aqui está! Querem levá-lo? - Alex estendeu-nos o livro. Ele tinha um
cheiro horrível de ovo podre.
-- Não, obrigada! - recusamos.
Já eram quase cinco da tarde, hora de voltar para casa. Despedimo-nos e
saímos da caverna. Não tínhamos conseguido muita coisa. Aliás, não
tínhamos saído do
lugar.
No jantar, um novo choque. Meu irmão mais velho, César, disse de
repente:
-- Irmãzinha, você está me devendo uma coisa.
Mamãe olhou-nos sem saber do que se tratava.
Mamãe é realmente como uma amiga. Mas quando o assunto é dinheiro, ela
é imprevisível.
Ela não admite que um empreste dinheiro para o outro. Segundo ela: "Só
se pode gastar o que se tem". É que meu avó foi à falência e aqueles
foram tempos difíceis
para minha mãe. Ela ainda era uma menina. Por isso é tão rígida quando se
trata de mesada e empréstimos.
-- Sim, sim, vou devolver - respondi rapidamente a César.
-- O que você vai devolver? - quis saber Mamãe.
-- Hã...? A caneta azul fosforescente que ele me emprestou - menti.
Não gosto muito de mentir. Tenho a impressão de que minha cara denuncia
quando estou inventando coisas.
Antônio é diferente de meu irmão mais velho. E dois anos mais novo do
que César e ainda não é muito grande. Gosta de brincar comigo.
-- Estão promovendo um novo concurso de fotos do banco - contou ele. -
Desta vez eles querem fotos engraçadas. Quero participar de qualquer
maneira, mas sábado
é o prazo final de entrega e na próxima quarta-feira já serão divulgados
os vencedores, e suas fotos serão expostas.
Antônio já havia vencido dois concursos de fotografia.
-- Tire fotos de César pensando. Ele faz sempre uma cara engraçada -
sugeri.
César torceu o nariz.
-- Muito engraçado! Mas talvez Antônio devesse esconder uma câmera na
sala quando todos estivéssemos fora -sugeriu César, ironicamente.
Ai, não acredito! Fiquei com as orelhas vermelhas. Não sei como ele
descobriu que eu estive assistindo escondido a filmes de terror.
-- Eu... eu vou pegar suco - disse rapidamente, levantando-me. - Alguém
mais quer?
-- Só se for vermelho-sangue - disse César, piscando para mim.
Eu estava em maus lençóis. César queria seu dinheiro de volta, e eu
ainda não tinha. Se perdesse a aposta, a situação ficaria ainda pior.
Além disso, estava
com medo de voltar para a escola. Com certeza as fãs de Pamela não
parariam de fazer comentários idiotas nas nossas costas.
Estava morta de cansada e por isso fui dormir cedo. Depois que escovei
os dentes e sai do banheiro, tocou o sininho na janela do corredor. Vani
me enviou uma
mensagem secreta, por uma mangueirinha que ficava ao lado do cabo.
Vanessa transformou a mensagem numa bolinha de papel e a empurrou pela
mangueira com um secador de cabelos.
O tratamento de beleza
A transformação
Eu estava com os cabelos verdes. Para ser mais exata, com mechas
verdes. E a espinha na ponta do nariz tinha ficado ainda mais vermelha
com o líquido verde.
Vanessa deu um grito. Virei-me em sua direção e vi-a apontando para o
jardim. A janela estava aberta; do lado de fora, o meu irmão Antônio. Ele
estava com a
câmera em nossa direção disparando milhares de Jiasbes sobre nós.
-- Dê o fora! - vociferei.
Parecia que o dedo de Antônio havia grudado no disparador. Ele não
parava de fotografar.
-- Pare! Não! - continuei a berrar. Só então tive a idéia de fechar as
cortinas.
Bia veio tremendo em nossa direção e apontou para seus braços. Ela
tinha tirado o líquido verde com a toalha e a pele estava muito vermelha.
-- Está ardendo como fogo! - choramingou.
Juntas, fomos ao banheiro enxaguar aquela coisa. Então me enfiei
debaixo do chuveiro e lavei o cabelo pelo menos cinco vezes com xampu
normal.
Mesmo assim as mechas verdes não saíram!
Quando voltamos ao quarto de hóspedes, Vanessa não estava mais lá.
Tinha levado todos os produtos de beleza. Os tubos e as garrafas haviam
desaparecido.
O que significava aquilo?
-- Eu... eu preciso falar com minha mãe - disse Bia, apontando para as
manchas vermelhas.
Como meus pais ainda demorariam para voltar do cinema, fui com Bia até
a casa dela.
A mãe de Bia pôs as mãos na cabeça quando nos viu. Ela cheirou os
braços de Bia e disse:
-- Acho que você esfregou detergente no corpo.
Detergente! Era isso! Por isso aquele cheiro me era familiar.
-- E você, Cris, você passou uma tinta no cabelo. Agora vai ter de
esperar um pouco até sair.
Não eram palavras muito tranqüilizadoras. Será que eu teria de ficar
algum tempo com os cabelos verdes?
A mãe de Bia pegou uma pomada no estojo de primeiros socorros e cuidou
de todas as queimaduras. A pomada aliviou a irritação.
-- Posso saber por que vocês fizeram isso? - perguntou. Felizmente não
precisamos responder, pois naquele instante tocou o telefone.
Como explicaria à minha mãe os cabelos daquela cor? Despedi-me de Bia e
fui correndo para casa. Cobri a cabeça com as mãos para que ninguém visse
meus cabelos
verdes.
Lembrei-me de Antônio. Tinha de resgatar as fotos que ele havia tirado.
Fui até o seu quarto. Mas ele não estava. Não o encontrei em nenhum
lugar.
Peguei um gorro de inverno em meu quarto e enfiei-o até as orelhas.
Agora, pelo menos meus cabelos estavam escondidos.
Quando fui para cama e comecei a pensar sobre o que havia ocorrido e as
conseqüências, tive uma grave suspeita. Na realidade, era um a suspeita
terrível. A idéia
mais horrível que já tive. Tinha de mandar uma mensagem para Bia
imediatamente.
Havia uma dúvida: os tubos e frascos não continham o que estava
indicado nos rótulos. O conteúdo tinha sido trocado. Alguém tinha feito
aquilo. E eu sabia quem.
Toquei o sino do quarto de Bia e mandei o bilhete. Bia não respondeu.
Provavelmente não estava lá.
Fiquei andando pra lá e pra cá em meu quarto, até que finalmente
escrevi uma mensagem para Vanessa.
Puxei com insistência o fio que tocava o sino no quarto de Vanessa, mas
ninguém respondeu. Insisti, mas nada da Vanessa aparecer. Será que ela
estava com peso
na consciência?
Peguei o secador e empurrei a mensagem secreta pela mangueira. Se
prestasse atenção, encontraria o bilhete.
Foi uma noite terrível. Não parava de me perguntar por que Vanessa
tinha feito aquilo. Só podia ter sido de propósito!
Ela não havia usado os produtos que trouxera do salão. Tinha pegado
nata e pepino de minha casa. Com certeza nada lhe acontecera.
E por que agora ela não dava notícias?
Estava com medo da minha mãe quando visse os meus cabelos verdes. Por
isso me cobri inteira e fingi que estava dormindo quando ela chegou em
casa.
Naquela noite tive pesadelos. Meus cabelos estavam cada vez mais curtos
e tingidos de uma cor verde brilhante, meus braços eram tão compridos que
podia enrolá-los
diversas vezes em torno de meu corpo.
-- Acorde, dorminhoca! - ouvi minha mãe chamar. Abri os olhos, vi o
reflexo do sol na parede ao lado da cama e senti a mão de mamãe sobre
meus ombros.
Imediatamente me lembrei do que havia acontecido no dia anterior.
Cobri-me inteira com o lençol e me escondi.
-- O que está acontecendo? - perguntou mamãe, preocupada.
Delicadamente, ela quis levantar o lençol, mas segurei-o pelas pontas com
toda a força. - Você está
doente?
-- Não, está tudo em ordem - balbuciei baixinho.
-- Então venha tomar café - ela disse e saiu.
Esperei um pouco, pulei da cama e corri para o banheiro.
-- Cris, seus cabelos - gritou mamãe. Ela estava parada no alto da
escada me esperando.
Agora não dava mais para esconder, fiquei simplesmente paralisada,
aguardando o que aconteceria. Mamãe não brigou muito. Mas também nunca
tinha me visto de cabelos
verdes.
Ela se aproximou e levantou meu queixo com o dedo indicador, para que
eu pudesse olhá-la nos olhos.
-- Vocês brincaram com produtos de beleza? - perguntou, rindo.
Fiz que sim. Não estava mentindo.
-- Ah, Cris - suspirou mamãe. - O que posso dizer? Não mexa mais nessas
coisas, está bem?
Fiz que sim novamente.
-- Simplesmente vamos ter de deixar seus cabelos assim. E contra
espinhas eu tenho um bom produto - consolou-me mamãe.
Quando me olhei no espelho do banheiro, foi como se um raio tivesse me
atingido. Agora eu já tinha cinco pontos vermelhos no rosto.
Claro que César e Antônio riram de minha cara, quando desci para o café
da manhã. Papai me chamou de "Roxinha" - ha-ha-ha, que engraçado.
Já eram dez horas da manhã. Eu havia dormido muito. Normalmente gosto
de sair aos sábados para fazer compras, mas dessa vez preferi ficar em
casa, precisava
falar urgente-mente com Vanessa.
Fui até sua casa e toquei a campainha. Sua irmã mais velha, Suzana,
abriu a porta. Ela sempre tem o nariz tão arrebitado que qualquer dia é
capaz de chover dentro.
-- O que você quer? - ela perguntou.
-- Falar com Vanessa.
-- Ela não está.
-- Onde ela foi?
-- Foi até a fonte do parque.
-- Fazer o que lá? - eu quis saber.
-- Não sei. Só ouvi ela marcando encontro com alguém pelo telefone -
explicou Suzana, fechando a porta na minha cara.
Aquilo estava ficando esquisito. Com quem Vanessa teria marcado um
encontro no parque? Como o parque não ficava longe dali, fui até lá ver
do que se tratava.
A fonte fica exatamente no meio do parque. Trata-se de uma velha fonte
que de vez em quando espirra algumas gotas d'água.
Em seguida vi Vanessa. Ela estava ao lado da fonte acompanhada. Nos
senados da TV que gosto de ver, nesse ponto, a cena sempre acaba com
música.
Era exatamente assim que me sentia naquele momento. E estava
boquiaberta.
Hum-hum-hum
A bolsa-porquinho
Pior ainda
O grito de socorro
As desculpas