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Luciana Vieira Castilho-Weinert

Cláudia Diehl Forti-Bellani


(Editores)

Fisioterapia em Neuropediatria

2011
Copyright 2011
c Omnipax Editora Ltda
Caixa Postal: 16532 - 81520-980 Curitiba, PR

A editora disponibiliza por acesso livre a versão eletrô-


nica deste livro no site: http://www.omnipax.com.br,
sob uma licença Creative Commons Attribution 3.0.

Capa:
Sérgio Alexandre Prokofiev

Projeto gráfico e editoração:


Omnipax Editora Ltda
Impressão:
Pix Bureau Gráfica e Editora
Ficha catalográfica:
Adriano Lopes (CRB9/1429)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

B537 Fisioterapia em neuropediatria / editores:


Luciana Vieira Castilho-Weinert, Cláudia Diehl
Forti-Bellani. — Curitiba, PR, Omnipax, 2011
338 p.

Vários autores
Inclui biografias
ISBN: 978-85-64619-01-2
eISBN: 978-85-64619-03-6

1. Neurologia pediátrica. 2. Fisioterapia para crian-


ças. 3. Crianças – Doenças – Tratamento. I. Castilho-
Weinert, Luciana Vieira, ed. II. Forti-Bellani, Cláudia
Diehl, ed. III. Tı́tulo.

CDD (22. ed.) 618.928


Dedicatória

A Deus que me dá forças para continuar a cada manhã...


A meu marido Wagner por seu amor incondicional..
A meus pais Loide e Vilson por seus esforços incansáveis para que eu
chegasse aqui...
L.V.C-W.

A meus pais, pelos valores éticos e morais.


A meu marido, Paulo Roberto e minha filha Isabela, razões da minha
felicidade pessoal!
A todos os meus pacientes, razões da minha perseverança cientı́fica e
felicidade profissional.
C.D.F-B.
.
Prefácio

A Fisioterapia na área da Neuropediatria tem expandido muito na


atualidade. Os avanços técnico-cientı́ficos permitem paulatinamente
uma atuação profissional diferenciada, embasada em evidências cien-
tı́ficas relacionadas aos aspectos plásticos do SNC e com resultados
mais promissores. Considerando-se o desenvolvimento de recursos e
técnicas na área, percebe-se uma necessidade iminente de atualização
profissional e disseminação do conhecimento cientı́fico sobre a área.
Este volume agrupa trabalhos de pesquisa, revisão de literatura e
estudos de caso, com foco na intersecção da Fisioterapia com a Neu-
ropediatra. A coletânea de capı́tulos abrange didaticamente tópicos
atuais e relevantes, explorando direções futuras para a pesquisa e a
atuação profissional nesta área. Desta forma, este livro vem suprir a
carência de material de referência, principalmente sobre técnicas de
intervenção, relativas ao assunto. Entre os diversos assuntos abor-
dados, destacam-se as correlações da neurofisiologia e da neuroplas-
ticidade com os processos de aprendizagem motora e reabilitação, o
desenvolvimento motor tı́pico, as encefalopatias crônicas da infância,
acessibilidade e tecnologias assistiva, escalas de avaliação em Neuro-
pediatria, e, as principais técnicas e formas de intervenção na área:
Kabat, Bobath, psicomotricidade, adequação postural e atuação em
terapia intensiva.

Luciana Vieira Castilho-Weinert – UFPR-Litoral


Cláudia Diehl Forti-Bellani – IBRATE
.
Sumário

1 Desenvolvimento motor tı́pico, desenvolvimento motor


atı́pico e correlações na paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . 1
Cláudia Diehl Forti-Bellani e Luciana Vieira Castilho-Weinert

2 Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades


motoras: AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS . . . . . . . . . . . . . . . 23
Tainá Ribas Mélo

3 Abordagem fisioterapêutica pelo Conceito


Neuroevolutivo Bobath . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
Luciana Vieira Castilho-Weinert e Cláudia Diehl Forti-Bellani

4 Alcance manual em lactentes tı́picos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69


Aline Martins de Toledo e Eloı́sa Tudella

5 Função do membro superior em crianças com paralisia


cerebral e o uso de tarefas direcionadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
Sheila Schneiberg e Felicia Cosentino

6 Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos


com paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107
Aline Duprat Ramos, Adriana Ferreira Dias,
Rosane Luzia de Souza Morais e Ana Paula Santos

7 Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades


de adaptações para pessoas com paralisia cerebral . . . . . . . 125
Cristina Antunes de Almeida e Paula Valéria da Costa Lima

8 Adequação de mobiliário e controle postural da criança


com paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147
Lı́gia Maria Presumido Braccialli e Franciane Teixeira O. Codogno

9 Variabilidade da frequência cardı́aca em crianças com


paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163
Andréa Baraldi Cunha, Antonio Roberto Zamunér,
Marlene Aparecida Moreno, Eloisa Tudella e Ester da Silva
10 A fonoaudiologia e a facilitação neuromuscular
proprioceptiva na sı́ndrome de Down . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 179
Kariane Eliza Souza, Luciana Vieira Castilho-Weinert e
Cláudia Diehl Forti-Bellani

11 Sı́ndrome de Rett: histórico, expectativa de vida,


genética e habilidades funcionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193
Carlos Bandeira M. Monteiro, Zodja Graciani, Camila Torriani-Pasin,
Emı́lia Katiane Embiruçu e Fernando Kok

12 Fisioterapia na unidade de terapia intensiva: enfoque


na criança crı́tica neurológica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213
Adriana Yuki Izumi, Dirce Shizuko Fujisawa e Márcia Regina Garanhani

13 Avaliação neuromotora em pré-escolares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229


Tereza Cristina Carbonari de Faria, Silvia Regina M. Silva Boschi,
Janaı́na Pereira de Souza e Érica Mie Okumura

14 Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor


infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 251
Eliane Roseli Winkelmann, Luciana Meggiolaro Pretto e
Elenita Costa Beber Bonamigo

15 Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o


estado nutricional infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 269
Fernanda Hack, Elenita Costa Beber Bonamigo e
Eliane Roseli Winkelmann

16 Acessibilidade de crianças portadoras de necessidades


especiais em escolas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 289
Silvia Regina M. Silva Boschi, Tereza Cristina Carbonari de Faria,
Jéssica dos Santos Tolentino, Wellington Yoshihide Harada
e Cecı́lia Augusto Ribeiro

17 Adultos com a paralisia cerebral: implicações para


intervenção em neuropediatria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 305
Anna Luisa Macedo Margre, Maria Gabriela Lopes Reis,
Rosane Luzia de Souza Morais e Aline Duprat Ramos

18 Marcadores de mineralização e formação óssea em


crianças com paralisia cerebral. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 321
Egle de Oliveira Netto Moreira Alves, Margarida de Fátima F. Carvalho,
Tiemi Matsuo e Anne Cristine Rumiatto
.
.
Capítulo 1

Desenvolvimento Motor Típico, Desenvolvimento Motor


Atípico e Correlações na Paralisia Cerebral

Cláudia Diehl Forti-Bellani∗, Luciana Vieira Castilho-Weinert

Resumo: Este capı́tulo tem como objetivo discutir aspectos rela-


tivos à importância do desenvolvimento motor para a prática clı́-
nica do fisioterapeuta. Os conceitos e as etapas do desenvolvimento
motor tı́pico são apresentados e correlacionados com o desenvolvi-
mento motor atı́pico. Também são analisadas as implicações para a
intervenção na Paralisia Cerebral (PC). Conclui-se que o desenvol-
vimento motor tı́pico é um referencial importante para a atuação do
fisioterapeuta, pois o reconhecimento de seus desvios permite iden-
tificar os casos de atraso e anormalidade, como na PC. Além disto,
serve como guia para o planejamento e execução da terapia e para
que se acompanhe a evolução dos pacientes.

Palavras-chave: Fisioterapia, Desenvolvimento Motor, Paralisia


Cerebral.

Abstract: This chapter aimed at discussing features related to the


importance of the motor development to physical therapist’s prac-
tice. Concepts and phases of the typical motor development are
presented and correlated to the atypical motor development. Also,
we analyze the implications in Cerebral Palsy (CP) intervention.
We conclude that the typical motor development is an important
reference to the physical therapist. The knowledge about its de-
viations allows identify delays and abnormal cases, such as CP.
Besides, it is a guide for planning and executing the therapy, as
well as following the patient’s evolution.

Keywords: Physical therapy, Motor development, Cerebral palsy.

∗ Autor para contato: cbellani.neuroibrate@gmail.com

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


2 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

1. Introdução
O desenvolvimento motor recebe várias denominações: desenvolvimento
neuropsicomotor, desenvolvimento motor normal, desenvolvimento neuros-
sensoriomotor, ou como recomendam as nomenclaturas recentes, desenvol-
vimento tı́pico ou desenvolvimento motor tı́pico.
O desenvolvimento motor é o conjunto de caracterı́sticas em constante
evolução que permite que um bebê que possui atividade motora essencial-
mente reflexa ao nascimento, evolua para a motricidade voluntária e realize
movimentos complexos e coordenados, tais como a deambulação, a corrida,
os movimentos finos de mão, entre outros (Diament et al., 2010).
O conhecimento sobre desenvolvimento neuropsicomotor é fundamen-
tal para o fisioterapeuta. A partir do momento que se reconhece o de-
senvolvimento tı́pico ou normal se está apto para reconhecer situações de
desenvolvimento atı́pico. Estas situações incluem os atrasos e as condições
patológicas, que requerem intervenção, com o objetivo de prevenção (es-
timulação precoce) ou reabilitação (no caso de grandes atrasos) (Halpern
et al., 2000).
É necessário que se considere que o nome neuropsicomotor remete ao
fato do desenvolvimento possuir aspectos neurológicos, ou seja, as estrutu-
ras do sistema nervoso devem amadurecer para que haja desenvolvimento.
O desenvolvimento também possui aspectos psicológicos ligados as emo-
ções, ao afeto e as motivações que levam ao aprendizado do ato motor. E
ainda, o desenvolvimento possui o próprio aspecto motor, que diz respeito
às especificidades do movimento humano (Willrich et al., 2009).
Segundo Papalia et al. (2000) o desenvolvimento infantil é influenciado
por uma trı́ade, a trı́ade de Newell (Newell, 1991), que considera o papel
do indivı́duo, do ambiente e da tarefa. Assim, também cabe ao fisiotera-
peuta, identificar que condições podem ser modificadas nesta trı́ade para
aprimorar o desenvolvimento neuropsicomotor infantil.
Este capı́tulo motiva-se no fato de que mesmo com todo o avanço e
respaldo tecnológico para se obter dados objetivos e mensurações, ainda
existem questões subjetivas e qualitativas muito importantes à atuação do
Fisioterapeuta, uma delas é o desenvolvimento neuropsicomotor. O fisio-
terapeuta precisa reconhecer quando há desvios no desenvolvimento, prin-
cipalmente nas condições patológicas em que a atividade reflexa (predomi-
nantemente a tônica) permanece e impede a evolução motora voluntária.
Além disto, o desenvolvimento neuropsicomotor repercute em outras ques-
tões do desenvolvimento, pois é a base para o desenvolvimento cognitivo e
para o aprendizado escolar (Mansur & Neto, 2006).
O objetivo deste capı́tulo é descrever brevemente o desenvolvimento
motor tı́pico e relatar as alterações no desenvolvimento atı́pico, mais espe-
cificamente na Paralisia Cerebral (PC).
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 3

2. Fundamentação Teórica
O objetivo principal da Fisioterapia é promover e restaurar a funciona-
lidade. Segundo Gusman & Torre (2006) o fisioterapeuta, por meio de
seu diagnóstico, identifica os distúrbios cinéticos-funcionais prevalentes,
elabora a programação progressiva dos objetivos fisioterapêuticos, elege e
aplica recursos e técnicas mais adequadas e mantém o controle da evolução
clı́nica.
Salienta-se a importância da atuação do fisioterapeuta nos diferentes
nı́veis de complexidade de atenção à saúde. O profissional está presente
desde o nı́vel da baixa complexidade, onde atua na promoção da saúde, até
a média complexidade, como na reabilitação em clı́nicas, e a alta comple-
xidade, como nas unidades de terapia intensiva.
As tendências atuais em saúde são de se retirar o foco do conceito de
doença (prevenção) e visualizar um ser humano biopsicossocial (promoção
da saúde). Para Czeresnia & Freitas (2003) a principal diferença encon-
trada entre prevenção e promoção está no olhar sobre o conceito de saúde.
Na prevenção a saúde é vista simplesmente como a ausência de doenças.
Na promoção, a saúde é encarada como um conceito positivo e multidi-
mensional, que resulta em um modelo participativo de saúde na promoção
em oposição ao modelo médico de intervenção.
Segundo esta visão, a importância da avaliação ou do diagnóstico fi-
sioterapêutico, além de determinar o grau de comprometimento ou déficit
funcional do indivı́duo doente, também está em realizar o levantamento
dos fatores determinantes para a saúde do indivı́duo saudável ou vulnerá-
vel (por exemplo, nos recém-nascidos prematuros).
O diagnóstico fisioterapêutico é subsı́dio para que se trace uma conduta
de intervenção, cuja finalidade é habilitar o indivı́duo e capacitá-lo a man-
ter sua independência funcional. Uma avaliação correta é fundamental,
pois é ela que fornece o diagnóstico fisioterapêutico preciso que, por sua
vez, estabelece as diretrizes para a intervenção adequada e individualizada
(Levitt, 1995).
Quando se trabalha com crianças que apresentam alteração ou defasa-
gem do desenvolvimento motor, para que se realize um diagnóstico é neces-
sário conhecer o desenvolvimento tı́pico e assim, reconhecer o atı́pico. Para
tal, as etapas do desenvolvimento infantil servem como guia no processo
de diagnóstico, prevenção e promoção em saúde e reabilitação (Gusman &
Torre, 2006).

3. Metodologia
Este capı́tulo caracteriza-se por ser um estudo de discussão e revisão da
literatura. Para tal, realizou-se uma revisão a cerca do desenvolvimento
motor tı́pico, agrupando dados relevantes da evolução motora da criança
4 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

no primeiro ano de vida. Procurou-se estabelecer subsı́dios qualitativos


representativos desta evolução, que sirvam como parâmetros de suspeita
ou reconhecimento do atraso do desenvolvimento motor.
Posteriormente discutiu-se alguns conceitos sobre PC, e relatou-se bre-
vemente a sua caracterização e a provável evolução do desenvolvimento
atı́pico nesta população.
Na busca de um aprofundamento a cerca do tema correlacionou-se a
intervenção em fisioterapia neuropediátrica para o tratamento da PC ba-
seada nas teorias modernas de comportamento e aprendizagem motora.

4. Discussão
4.1 O desenvolvimento motor típico
O desenvolvimento motor, descrito por vários autores como Diament et al.
(2010), Levitt (1995), Bly (1994), Bobath (1971), Milani-Comparetti &
Gidoni (1967) e outros, serve como guia e parâmetro para que se avalie
a alteração e a disfunção que a criança com distúrbio neurológico pode
apresentar no funcionamento do seu Sistema Nervoso Central (SNC).
Segundo Gusman & Torre (2006), ao longo do desenvolvimento motor
infantil, a grande variabilidade de movimentos é normal e a diminuição
desta variabilidade leva a suspeitar de sinais patológicos.
As mudanças durante o primeiro ano de vida são as mais importantes
modificações, onde se processam os maiores saltos evolutivos em curtos
perı́odos de tempo (Bly, 1994). No primeiro ano, a criança passa de uma
posição horizontal para uma posição vertical, quando aprende a se mover
contra a gravidade (caminhar) (Levitt, 1995). Também é nesta faixa etária
motora que se encontram a maior parte das crianças que possuem atrasos
motores, devido à permanência de reflexos tônicos (Levitt, 1995).
As modificações nos marcos do desenvolvimento tı́pico geralmente são
percebidas e relatadas pela literatura mês a mês, de forma que as crianças
podem ser classificadas como pertencentes a uma determinada faixa etária
motora (Flehmig, 2005; Bly, 1994).
Segundo Castilho-Weinert & Lopes (2010), para determinar a faixa
etária motora se considera a presença dos seguintes critérios que compõem
o desenvolvimento tı́pico: reações, reflexos, planos de movimento, padrões
de movimento e habilidades motoras voluntárias (Figura 1).
Cada um destes critérios pode assumir diferentes caracterı́sticas, com
variações mês a mês. Estes critérios são analisados para que o fisioterapeuta
determine a faixa etária motora de seu paciente ou cliente, e verifique se
esta é condizente com sua idade cronológica, ou se há defasagem (Castilho-
Weinert & Lopes, 2010). A Figura 1 apresenta os principais marcos do
desenvolvimento tı́pico agrupados segundo estas categorias.
Um reflexo pode ser conceituado como uma mesma resposta motora a
um determinado estı́mulo sensorial. Os reflexos são movimentos simples,
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 5

Figura 1. Marcos do desenvolvimento tı́pico.


6 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

cujo controle motor é realizado principalmente pela medula, e, algumas


vezes com modulação mesencefálica. Ao longo do desenvolvimento tı́pico
eles são suprimidos ou substituı́dos por reações automáticas (Papalia et al.,
2000).
As reações são movimentos automáticos controlados pelo mesencéfalo
e que incluem padrões rı́tmicos, já bem aprendidos, como a mastigação, a
preensão e até mesmo a marcha. As reações posturais de equilı́brio, prote-
ção e retificação, são movimentos ativos ou mudanças de tônus automáticas.
Estas atuam em conjunto para fornecer o mecanismo de controle postural
normal, cujo papel é fundamental para que o movimento voluntário ocorra
(Shumway-Cook & Woollacott, 2001).
Os padrões de movimento se referem às posturas adotadas para pos-
sibilitar a execução das habilidades motoras, tais como: supino, prono,
sentado, gatas, em pé, entre outros. Estes padrões dependem do com-
ponente neuromaturacional e permitem o ajuste e a adaptação de acordo
com o contexto. Desta forma, os padrões motores básicos, inerentes a
todos, ocorrem pelos mecanismos de feedback e feedforward. O feedback
fornece as pistas sensoriais necessárias e o feedforward realiza os ajustes
posturais antecipados, após a automatização do feedback (Shumway-Cook
& Woollacott, 2001).
As habilidades motoras se referem aos movimentos com controle corti-
cal, que demandam intenso aprendizado motor, e são o foco principal da
intervenção do fisioterapeuta. Estas são consideradas o nı́vel mais elevado
de controle motor (Papalia et al., 2000).
Os planos de movimento fazem parte de uma categoria que tem mere-
cido atenção recentemente e dizem respeito à aquisição de movimentos nos
planos sagital, coronal e transverso. Somente após dominar o plano trans-
verso é que se consegue realizar movimentos complexos, como as rotações,
e até mesmo a escrita (Castilho-Weinert & Lopes, 2010).
Todos estes itens abordados na Figura 1 possuem relação direta com o
desenvolvimento motor importante que ocorre no primeiro ano de vida. Por
exemplo, a criança quando nasce responde ao meio ambiente de maneira
reflexa. Isto ocorre porque o SNC ainda é imaturo e as vias da motricidade
voluntária não possuem mielinização suficiente na cápsula interna para
que o córtex motor tenha ação principal. Assim, mesmo que intencional
qualquer resposta será meramente reflexa, comandada pela medula e pelo
mesencéfalo.
Durante seu amadurecimento o SNC estabelece novas sinapses, e pro-
gressivamente o comportamento motor se transforma. Alguns reflexos se
automatizam e se transformam em reações (como o reflexo de sucção que
se transforma no sorver voluntário). As reações de equilı́brio, proteção e
retificação evoluem e proporcionam estabilidade para que os padrões de
movimento voluntários se estabeleçam (Lent, 2010).
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 7

Ao mesmo tempo, durante a movimentação espontânea a criança ad-


quire mobilidade nos diferentes planos de movimento. Inicialmente domina
o plano sagital pelo desenvolvimento da extensão e da flexão em prono e
supino, respectivamente. Posteriormente o plano coronal, com as transfe-
rências de peso latero-laterais, por exemplo. Por último, adquire o plano
transverso ou rotacional. Este proporciona os movimentos de dissociação
que são imprescindı́veis para as transferências de postura, para a marcha
cruzada, entre outras habilidades (Flehmig, 2005).
Na sequência deste capı́tulo aborda-se os principais aspectos motores
evolutivos do desenvolvimento motor tı́pico durante o primeiro ano de vida.
Agrupou-se os dados da seguinte forma: recém-nascido (do primeiro ao vi-
gésimo oitavo dia de vida), primeiro trimestre (do inı́cio do primeiro ao
final do terceiro mês), segundo trimestre (inı́cio do quarto ao final do sexto
mês), terceiro trimestre (inı́cio de sétimo ao final do nono mês) e, por úl-
timo, o quarto trimestre (inı́cio do décimo até o final do décimo segundo
mês de vida). Considerou-se o recém-nascido um bebê tı́pico quando nas-
cido a termo, ou seja, entre trinta e oito e quarenta e duas semanas de
idade gestacional.

4.1.1 O recém-nascido
O recém-nascido possui como caracterı́stica fisiológica a hipotonia de tronco
que facilita sua passagem pelo canal de parto materno e a hipertonia flexora
apendicular oriunda no crescimento e na permanência no útero da mãe
(Diament et al., 2010).
Em supino sua cabeça encontra-se lateralizada, e observa-se retração da
cintura escapular, com elevação, adução e rotação externa ou interna dos
ombros. Há flexão de cotovelos com pronação de antebraços, flexão de pu-
nhos e dedos, e adução de polegares. Os membros superiores movimentam-
se em bloco e as mãos podem se abrir, porém os polegares são menos mó-
veis e muitas vezes encontram-se aduzidos dentro das palmas das mãos.
Os membros inferiores são mais móveis e apresentam flexões e extensões
alternadas. A pélvis fica em retroversão com os membros inferiores fletidos
sobre o abdômen, quadris em abdução e rotação externa, flexão de joelhos,
dorsiflexão dos tornozelos e inversão dos pés. No puxado para sentar, a
cabeça cai para trás sem controle, os braços, a coluna lombar e o tronco
permanecem em flexão (Bly, 1994).
Em prono o peso do corpo se encontra mais transferido sobre a cabeça e
o tronco superior. Isto impede a ampla mobilidade dos membros superiores.
Há flexão dos membros inferiores com os quadris sem tocar o plano de
apoio. O bebê pode virar a cabeça para liberar as vias aéreas e levantá-la
por alguns segundos (Flehmig, 2005).
Embora o recém-nascido assuma este comportamento na maioria das
vezes, ele não é um ser estático, pois realiza movimentos amplos, variados,
8 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

e normalmente estereotipados. Esta movimentação é reflexa, pode ser in-


tencional pela variedade de adaptação às exigências do ambiente, mas é
involuntária (Shepherd, 1996).
Os principais reflexos observados na avaliação do recém-nascido são:
de sucção, dos quatro pontos cardeais, de Moro, de preensão tônica pal-
mar e plantar, de liberação de vias aéreas, de Galant, de sustentação do
membro inferior, de colocação do membro e de marcha automática. O
Reflexo Tônico Cervical Assimétrico (RTCA) pode estar presente, porém
quando aparece é fraco, ocasional e não interfere na habilidade do bebê
colocar à mão na boca. Observa-se também a reação cervical de retificação
(Shepherd, 1996).

4.1.2 O primeiro trimestre


Em prono o reflexo de liberação das vias aéreas evolui para a reação labi-
rı́ntica de retificação. Progressivamente, com a elevação da cabeça se ativa
os músculos extensores de tronco e diminui-se o padrão flexor. A descarga
de peso desce em direção ao abdome e no final deste trimestre, há controle
cefálico, descarga de peso dos membros superiores nos antebraços, e estabi-
lidade da cintura escapular. Ainda há encurtamento de flexores de quadril
com abdução e rotação externa de coxo-femoral (Bly, 1994).
Em supino, pela mobilidade frente à gravidade, o padrão flexor fisioló-
gico diminui aos poucos. O marco deste trimestre é a presença do RTCA
que confere uma caracterı́stica assimétrica ao bebê. No final do trimestre
a cabeça e os membros superiores estão na linha média, pois o RTCA de-
saparece. Há chutes alternados que causam trabalho ativo dos abdominais
(Shepherd, 1996).
Ocorre evolução da reação labirı́ntica de retificação, que repercute em
uma melhora progressiva do controle cervical. No final do trimestre, no pu-
xado para sentar a cabeça acompanha o movimento. Há também aumento
do controle extensor em prono, do controle flexor em supino, e transferência
de peso no sentido ântero-posterior, no plano sagital (Bly, 1994).
Neste trimestre diminuem os reflexos de sucção, dos quatro pontos car-
deais, de Moro e de preensão tônica palmar. Os reflexos de sustentação,
colocação e marcha automática desaparecem, e a reação labirı́ntica de reti-
ficação surge e se fortalece. Ainda, o RTCA fica evidente, mas desaparece
ao longo do trimestre. Deve-se ressaltar que é positivo encontrar posturas
assimétricas, devido ao RTCA, mas estas devem ser suprimidas no final do
trimestre (Flehmig, 2005).

4.1.3 O segundo trimestre


Este é um trimestre extremamente significativo para a aquisição de com-
ponentes indispensáveis ao desenvolvimento de um comportamento motor
coordenado e sinérgico. Durante este perı́odo as reações posturais estão
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 9

em pleno desenvolvimento e a criança experimenta as sensações de trans-


ferência de peso latero-lateral (plano coronal ou frontal) e de rotações de
tronco (plano transversal) (Bly, 1994).
Chama-se atenção para a substituição da reação cervical de retificação,
existente desde o nascimento, pela reação corporal de retificação. Esta
reação proporciona que a criança passe de supino para decúbito lateral e
para prono, por meio da rotação do tronco (Flehmig, 2005). Observa-se
isto espontaneamente quando se coloca um brinquedo ao lado da criança
e ela roda a cabeça e o tronco roda simultaneamente com dissociação de
cinturas.
Em supino verifica-se as mãos na linha média, a extensão dos cotovelos
contra a gravidade, a retirada da cabeça do plano de apoio, a ponte, a
colocação das mãos nos joelhos e nos pés, o levar os pés à boca, e o rolar
para decúbito lateral e para prono (Shepherd, 1996).
Em prono ocorre a posição de balconeio dos membros superiores. O
peso do corpo se transfere para a pelve, desenvolve-se a anteroversão e
ocorre a liberação de um membro superior para explorar o ambiente, com
descarga de peso no hemicorpo contralateral. Observa-se também a posição
de avião, a descarga de peso nas mãos com cotovelos estendidos, a reação
de anfı́bio, o pivoteio e o treino da posição de gatas (Shepherd, 1996).
É comum que a partir do anfı́bio a criança inicie o sentar lateral, pela
transferência de peso a partir dos MMSS. No final deste trimestre passa
para sentada de maneira independente e mantém-se nesta posição com au-
mento da cifose dorsal, da base de sustentação e com os membros inferiores
em abdução e rotação externa de quadril. Apóia-se nas mãos à frente do
corpo por meio da reação de proteção pra frente (Bly, 1994).
A partir do quarto mês observa-se uma tentativa de endireitamento du-
rante a suspensão ventral. Nesta posição, a partir do quinto mês verifica-se
a cabeça alinhada com o tronco e o tronco alinhado com os membros infe-
riores em extensão. Esta é uma tentativa de vencer a gravidade conhecida
como reação de Landau. Quando isto ocorre a criança passa a sustentar
o peso nos membros inferiores quando colocada em ortostase, o que signi-
fica um evidente fortalecimento de seus músculos antigravitacionais e um
amadurecimento dos seus sistemas neurofisiológicos (Flehmig, 2005).
Este perı́odo caracteriza-se pela simetria corporal, com variedade de
padrões motores e ampla mobilidade nas posições supina e prona. Isto se
deve ao aumento das reações posturais e à aquisição dos planos sagital e
transversal, que proporcionam as transferências e as dissociações. Este pe-
rı́odo é importante para a exploração do meio ambiente e tem repercussões
significativas nos perı́odos subsequentes (Bly, 1994).
Entre os reflexos apenas o de preensão tônica plantar permanece, porém
mais fraco. A reação corporal de retificação em supino, de anfı́bio em prono,
de Landau na suspensão ventral, e de proteção para frente no sentado, são
10 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

eventos significativos e que devem ser observados neste trimestre (Flehmig,


2005).

4.1.4 O terceiro trimestre


Este trimestre é um perı́odo de ampla exploração, em que a criança possui
controle dos três planos de movimento. Ela já não permanece muito tempo
em supino e, se assim colocada, rola para prono com dissociação de cin-
turas. O engatinhar ocorre inicialmente de forma primitiva e depois com
dissociação de cinturas. A criança senta nos calcanhares, senta de lado,
passa para ajoelhada e semi-ajoelhada e, segurando-se nos móveis, fica em
ortostase (Flehmig, 2005).
Neste perı́odo a criança refina suas reações posturais, possui bom equilı́-
brio sentado e tem grande liberdade de movimento de tronco e em membros
superiores. Ocorre descarga de peso nos membros superiores, estabilidade
em cintura escapular e trabalho da musculatura intrı́nseca da mão. As mãos
se moldam aos objetos pelo mecanismo de feedforward. Senta-se em long-
sitting funcional e apresenta a reação de proteção para os lados. Também
pode sentar-se entre os calcanhares (em W), e isto faz parte das variações
do comportamento motor tı́pico, porém nem todas as crianças têm esta
tendência. Quando em ortostase transfere peso para lateral e ativa os mús-
culos plantares intrı́nsecos, pois não há mais o reflexo de preensão tônica
plantar (Bly, 1994).

4.1.5 O quarto trimestre


Neste trimestre a criança aperfeiçoa a posição de ortostase, surge a re-
ação de proteção para trás nos membros superiores, há transferência de
peso e passos para a lateral com apoio, e, finalmente realiza a marcha in-
dependente. A marcha inicial ocorre com a base de sustentação alargada,
abdução e rotação externa da coxo-femoral, elevação dos membros superio-
res e fixação da cintura escapular. A criança tem este comportamento para
aumentar a sua estabilidade, pois neste momento suas reações de equilı́brio
ainda precisam ser aprimoradas (Bly, 1994).
No final deste perı́odo a maioria das crianças tı́picas deambula. Porém,
há uma preferência pelo engatinhar, que possibilita uma exploração mais
rápida do mundo que a rodeia (Flehmig, 2005).

4.1.6 Considerações gerais sobre o desenvolvimento típico


Embora esta sequência do desenvolvimento tı́pico seja um consenso entre
a maioria dos autores, sabe-se que o desenvolvimento motor depende de
questões neuromaturacionais, genéticas e ambientais. Assim, durante a
avaliação da criança estas caracterı́sticas também devem ser consideradas
(Shumway-Cook & Woollacott, 2001; Papalia et al., 2000; Newell, 1991).
Qualquer fator que interfira nas questões orgânicas e ambientais da cri-
ança pode repercutir no seu comportamento motor. Por exemplo, uma cri-
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 11

ança tı́pica sem a experiência da posição prona, provavelmente terá atraso


na reação labirı́ntica de retificação nesta postura. Da mesma forma, uma
criança tı́pica que não explora o ambiente e não interage com o mesmo,
pode ter um atraso na aquisição dos marcos básicos do desenvolvimento,
se comparada àquela que teve esta oportunidade. Ainda, qualquer lesão
que interfira na evolução neuromaturacional das áreas motoras do encé-
falo, provoca repercussão no desenvolvimento e no comportamento motor
(Fonseca & Lima, 2008; Levitt, 1995).

4.2 Paralisia cerebral


A PC é caracterizada por uma lesão no SNC em desenvolvimento que cursa
com alteração no comportamento motor. Alguns autores consideram-na
como uma desordem do tônus, da postura e do movimento. Esta é uma
lesão não progressiva e estática, porém com repercussões clı́nicas mutáveis
(Bax et al., 2005).
Deve-se compreender que as causas da PC ocorrem nos perı́odos pré,
peri ou pós-natal. Nesta época o SNC é um sistema imaturo que sofre uma
agressão e continua a se desenvolver na presença de uma lesão. Esta é uma
situação complexa, pois envolve sintomas patológicos em um contexto de
desenvolvimento do SNC (Rosenbaum et al., 2007).

4.2.1 Classificações da paralisia cerebral


A classificação clı́nica da PC embasa a intervenção clı́nica, bem como a
compreensão e a troca de informações entre os diferentes profissionais que
atuam com estas crianças. Porém, para Ostenjo et al. (2003), crianças
com classificações similares têm padrões de comportamento motor distin-
tos. Isto se deve a assimetria das lesões e às respostas individuais dos or-
ganismos que recebem influências dos aspectos neuromaturacionais e plás-
ticos do SNC, da genética, da demanda do meio ambiente e dos aspectos
sensoriais, perceptivos e cognitivos próprios.
A classificação usual da PC é baseada tanto na qualidade quanto na
distribuição topográfica do tônus (Shevell et al., 2009), e foi inicialmente
sugerida pelo casal Bobath.

4.2.1.1 Tipos de tônus em paralisia cerebral


Na PC o tônus pode ser classificado em espasticidade, hipotonia, flutuações,
ataxia e misto (Diament et al., 2010; Fonseca & Lima, 2008), conforme se
segue:
Espasticidade: é uma condição clı́nica relacionada à lesão de neurônios
da via córtico-espinhal (antiga via piramidal) que modula os mo-
toneurônios no corno ventral da medula espinhal. O paciente com
espasticidade apresenta aumento de tônus, acompanhado de hiperre-
flexia, e resistência ao movimento passivo que varia de acordo com o
12 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

grau de hipertonia. Clinicamente, a observação mostra que a espasti-


cidade pode mudar de grau, relacionar-se à qualidade do movimento,
e se expressar em padrões diferentes de acordo com o movimento vo-
luntário e com o posicionamento assumido. Esta alteração de tônus
aparece normalmente a partir dos quatro meses de idade e pode ser
leve, severa ou moderada. Há uma tendência preferencial que a es-
pasticidade flexora seja mais evidente nos membros superiores e a
extensora nos membros inferiores;
Hipotonia: é o tônus postural baixo, com co-contração insuficiente de
tronco e pescoço, o que impede a aquisição de posturas frente à gra-
vidade. O corpo apresenta-se excessivamente no plano de apoio, e
há falta de alinhamento devido a uma insuficiente estabilidade proxi-
mal. Em PC é normalmente um estado transitório, cuja persistência
pode ser sinal de atraso cognitivo ou prognóstico reservado;
Flutuações ou Atetoses: são um grupo de alterações de tônus variável,
cujo prejuı́zo motor é resultado da lesão nos núcleos da base, ou
nas vias aferentes e eferentes a estes núcleos. A principal caracte-
rı́stica deste grupo é a alteração no planejamento da função motora
com consequentes movimentos involuntários associados ao quadro
clı́nico. Pode se manifestar de maneiras diferentes. Na atetose pura
o tônus varia de normal para baixo, há presença de movimentos
involuntários mais distais, sem grandes prejuı́zos nas reações de ba-
lance (equilı́brio, proteção e retificação). Na coreoatetose ou atetose
com coréia o tônus varia de baixo para alto, há presença de mo-
vimentos involuntários mais proximais e maior prejuı́zo nas reações
de balance. Na atetose com distonia ocorrem mudanças repentinas
no tônus que varia de hipertônico para hipotônico, com flutuações
extremas, grande assimetria e influência do RTCA. Os movimentos
involuntários são proximais e normalmente em grandes amplitudes,
e as reações de balance são ausentes ou inadequadas. Na atetose
com espasticidade o tônus flutua entre aumentado e normal, ocorre
espasticidade proximal e movimentos involuntários distais;
Ataxia: normalmente está associada a uma lesão cerebelar e caracteriza-
se pelo tônus postural baixo, falta de co-contração, incapacidade
de manter posturas e grande instabilidade durante o movimento.
Há alteração na coordenação motora, com padrões de movimentos
sem seletividade, tremor, dismetria, disdiadococinesia, oscilação de
cabeça e tronco, marcha com a base alargada e nistagmo. Pode haver
associação com a espasticidade;
Misto: a maioria dos pacientes possui mais de um tipo de tônus. É co-
mum se observar que na região axial (tronco), o tônus seja diferente
daquele observado na região apendicular (membros)
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 13

4.2.1.2 Topografia funcional e paralisia cerebral


A classificação topográfica clássica em PC diz respeito ao local de predo-
mı́nio da atividade tônica e está relacionada com a espasticidade. Embora
classificações como triplegia e dupla-hemiparesia sejam descritas na lite-
ratura as classificações mais usualmente utilizadas são as que se seguem
(Fonseca & Lima, 2008; Bobath, 1971):
Hemiparesia: quando há comprometimento de apenas um hemicorpo,
membro superior, tronco e membro inferior e, usualmente, o prejuı́zo
é mais acentuado no membro superior;
Diparesia: quando há comprometimento de tronco, membros superiores
e membros inferiores, porém o prejuı́zo é mais evidente em tronco
inferior e membros inferiores;
Quadriparesia: quando há envolvimento global dos membros superiores,
inferiores e do tronco e, não raramente, os membros superiores são
mais comprometidos do que os inferiores.
Convém ressaltar que inicialmente o casal Bobath classificou topogra-
ficamente o tônus em hemiplegia, diplegia e quadriplegia. Porém, atual-
mente estas expressões são utilizadas somente quando há comprometimento
dos segmentos corporais como descrito anteriormente, somado a ausência
de movimento voluntário. A plegia é considerada a total falta de força
para a realização da movimentação ativa. Como exemplo, um hemiplégico
é aquele indivı́duo com acometimento em um hemicorpo e com a total au-
sência de movimento voluntário nos segmentos afetados. Se houver alguma
movimentação ativa preservada, o indivı́duo será um hemiparético.

4.3 Desenvolvimento motor típico e atípico e a paralisia cerebral


A função do SNC em relação à motricidade é proporcionar a habilidade
do movimento, as atividades especializadas, e manter simultaneamente a
postura e o equilı́brio (Bobath, 1971). Para se executar isto com elegância,
fluidez e uma base de sustentação em relação às variações do centro de
gravidade são necessários diferentes mecanismos de controle motor. Es-
tes mecanismos são acionados para que se tenha mobilidade, estabilidade
(equilı́brio estático), mobilidade controlada (transferência de peso e disso-
ciações) e habilidade. Tais elementos do controle motor são dependentes
do tônus postural normal, da variedade de interação entre as forças mus-
culares opostas com ação da inervação recı́proca e da variedade de padrões
de postura e movimentos que são a herança comum do homem (neuroma-
turacional, genética e ambiental) (Shumway-Cook & Woollacott, 2001).
A evolução fisiológica neuromaturacional do SNC, em relação às es-
truturas do controle motor, provoca o desenvolvimento e capacita para a
ocorrência dos atos motores. Este desenvolvimento motor, entre outros fa-
tores, também estimula a evolução do SNC que evolui e adapta as destrezas
adquiridas de acordo com a demanda do meio ambiente (Lent, 2010).
14 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

Quando há lesão no SNC, como na PC, há falha ou interrupção em um


sistema neuromaturacional em pleno desenvolvimento. O resultado disto é
a ocorrências de padrões motores atı́picos em competição com os padrões
tı́picos. Quando os primeiros prevalecem, as alterações do comportamento
motor observável tendem a ser limitantes e prejudicam o desenvolvimento
global da criança (Fonseca & Lima, 2008).
Embora se utilize o termo atı́pico para designar os padrões inadequados
e compensatórios que se observa em crianças com alterações neurológicas,
deve-se lembrar que estes são resultados de um SNC que tenta se adaptar
a uma situação inesperada (Rosenbaum et al., 2007; Bax et al., 2005).
A Tabela 1 representa um paralelo entre o desenvolvimento motor tı́pico
e o atı́pico. Compara-se as principais aquisições que são observáveis na
evolução motora durante o primeiro ano de vida.
Ao observar-se uma criança tı́pica durante o primeiro trimestre do seu
desenvolvimento verifica-se que ela tem intensa atividade reflexa, apresenta
posturas assimétricas, desenvolve a flexão em supino, melhora a extensão
em prono, e possui algum controle cefálico pela reação labirı́ntica de retifi-
cação. Há harmonia nos seus movimentos, e os planos coronal e transverso
ainda não estão presentes. No desenvolvimento atı́pico, principalmente nos
quadros mais leves, o primeiro trimestre se assemelha ao da criança tı́pica
(Flehmig, 2005).
O segundo trimestre é um perı́odo importante para a detecção de risco
de lesão no SNC ou atraso no desenvolvimento. Neste perı́odo ocorrem
aquisições motoras, reações posturais, transferências de peso e rotações de
tronco. A criança com PC tem dificuldades de ultrapassar este perı́odo. É
comum que seu desenvolvimento fique estagnado no primeiro trimestre do
desenvolvimento tı́pico, onde realiza movimentos apenas no plano sagital,
devido a sua grande instabilidade postural (Flehmig, 2005; Levitt, 1995).

Tabela 1. Caracterı́sticas do desenvolvimento motor tı́pico e atı́pico.


Desenvolvimento motor tı́pico Desenvolvimento motor atı́pico
Reflexos primitivos são suprimidos Permanência de reflexos primitivos
Reações de balance integradas Insuficiência de reações de balance
Normotonia Hipotonia, hipertonia ou flutuação
Ausência de reflexos tônicos Presença de reflexos tônicos
Movimentos em padrões sinérgicos, Movimentos estereotipados, pobres,
coordenados e variados sem seletividade
Desenvolve habilidades motoras Dificuldade nas habilidades motoras
Variedade de movimentos Padrões compensatórios e fixações
Sem encurtamentos e deformidades Alterações músculo esqueléticas
Controla três planos de movimento Não aquisição de algum plano
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 15

As Figuras 2 e 3 apresentam padrões atı́picos em supino e prono, que


são observados no desenvolvimento de crianças com lesão no SNC.

Figura 2. Comportamentos no desenvolvimento atı́pico em supino.


Adaptado de Levitt (1995).

Figura 3. Comportamentos no desenvolvimento atı́pico em prono


Adaptado de Levitt (1995).

A extensão do déficit funcional na PC depende da época, da locali-


zação e do grau da lesão encefálica. De maneira geral, ocorre atraso ou
16 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

interrupção no desenvolvimento sensoriomotor, com mecanismos de rea-


ções posturais insuficientes (Diament et al., 2010). Os reflexos primitivos e
patológicos exacerbados podem estar presentes, com maior frequência dos
reflexos tônicos (Fonseca & Lima, 2008). Com relação ao tônus postural, a
criança com PC geralmente apresenta hipotonia axial (principalmente de
tronco) e espasticidade ou espasmos intermitentes em região apendicular
(membros) (Bobath, 1971). Assim, o tipo de alteração do tônus não é uni-
forme em todos os segmentos corporais. Na PC não ocorrem os diferentes
graus de inervação recı́proca, e em lugar da variedade de movimentação
ocorrem os padrões anormais de coordenação devido à liberação dos pa-
drões reflexos anormais (Levitt, 1995).
Na PC há deficiência no mecanismo de controle postural normal, com
alterações nas reações posturais que são a base estável para a realização dos
movimentos contra a gravidade (Cunha et al., 2009). O papel das reações
posturais de equilı́brio, proteção e retificação são fundamentais ao movi-
mento humano. As reações de retificação alinham o olhar, a cabeça sobre
o tronco, e o tronco sobre os membros durante os movimentos. Assim,
proporciona-se a capacidade de rotação dos eixos corporais para separar
o tronco superior do inferior e dissociar os movimentos. As reações de
equilı́brio causam os ajustes adaptativos corporais durante o deslocamento
do eixo da gravidade, e as reações de proteção atuam quando as reações
de equilı́brio falham, para proteger o corpo das quedas. Na falha destas
reações, o produto final é um corpo com poucas possibilidades de movi-
mento, pois não há a base postural necessária. Torna-se difı́cil realizar
as transferências de peso lateralmente, bem como realizar movimentos no
plano coronal e transverso. Além da instabilidade postural, a criança com
PC pode apresentar a permanência de reflexos primitivos (Flehmig, 2005).
Por exemplo, a não exploração do meio, a falta de descarga de peso nas
mãos e a alteração do tônus, faz com que o reflexo de preensão tônica
palmar permaneça. Isto dificulta ainda mais a exploração manual e todas
as atividades perceptivo-motoras que dependem desta. O mesmo ocorre
com o reflexo de preensão tônica plantar, cuja permanência dificulta o ali-
nhamento do pé no chão, impede a postura de ortostase e inviabiliza a
ocorrência da marcha.
Outro problema muito comum na PC é a permanência dos reflexos
tônicos desencadeados pelo estiramento dos proprioceptores dos músculos
e dos ligamentos da cabeça e pescoço. O RTCA impede o alinhamento
dos membros superiores, dificulta as atividades em linha média, e causa
assimetrias em tronco e membros inferiores (Fonseca & Lima, 2008).
O Reflexo Tônico Cervical Simétrico (RTCS) produz o aumento da
hipertonia extensora em membros superiores e flexora em membros infe-
riores com a extensão da cabeça, e causa flexão dos membros superiores
e extensão dos membros inferiores com a flexão da cabeça. Este reflexo é
bastante frequente no paciente com diparesia e pode ser observado quando
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 17

este é tracionado para sentado pelos membros superiores e permanece fixo


nesta posição com flexão de cabeça e membros superiores, e forte padrão de
adução e rotação interna de coxo-femoral. O RTCS também surge quando
este mesmo paciente passa para sentado entre os calcanhares (sentado em
W) e mantém a cabeça e os membros superiores em extensão. Ressalta-se
que este último padrão deve ser evitado ao máximo, por não ser funcional
e principalmente pelo risco de subluxação e luxação de coxo-femoral, que
torna o prognóstico de marcha obscuro (Shepherd, 1996).
O Reflexo Tônico Labirı́ntico (RTL) é um reflexo patológico desenca-
deado pelos órgãos otolı́ticos do labirinto durante as mudanças de posição
da cabeça no espaço. A flexão da cabeça, que comumente ocorre em prono,
leva a um padrão de flexão corporal total; e a extensão, que ocorre com
frequência em supino, causa um padrão de extensão total. Este reflexo
é sempre associado à hipertonia espástica e aos espasmos intermitentes,
e ocorre bastante entre os espásticos quadriparéticos ou mais graves. O
RTL causa grande dificuldade nas transferências de postura, pois qualquer
movimento de cabeça desencadeia um padrão global corporal (Shepherd,
1996).
Quando há interrupção na evolução do SNC, como na PC, a hipotonia
fisiológica da criança para a passagem pelo canal de parto perdura. Esta
hipotonia proximal resulta em instabilidade de sustentação do alinhamento
corporal pela baixa co-contração muscular. Então a criança busca padrões
compensatórios de fixações para que consiga algum tipo de movimento e
sustentação contra a gravidade. Esta repetição dos movimentos inadequa-
dos, com falta de seletividade, e fixações, gera aprendizado inadequado
de padrões não funcionais de movimentos, encurtamentos e deformidades.
Tais alterações no sistema musculoesquelético podem causar dor, ser es-
teticamente inaceitáveis, dificultar o manuseio da criança pelos familia-
res, e prejudicar ainda mais a funcionalidade e a exploração do ambiente
(Murphy., 2009).
A criança com PC com comprometimento leve ou moderado utiliza
mecanismos compensatórios para vencer a força da gravidade. Assim, so-
licita ação de grupos musculares habitualmente não requisitados, para que
consiga a estabilidade que originalmente lhe falta pelo déficit de controle
postural de tronco. A repetição na realização destas compensações gera
desequilı́brios musculares, deformidades, aumento da hipertonia e prejuı́zo
na funcionalidade da criança.
A falta de controle de cabeça, tronco superior e tronco inferior faz
com que a criança tenha desequilı́brios musculares, e consequente alteração
nas curvaturas fisiológicas da coluna vertebral, como hipercifose dorsal,
retificação lombar e escoliose. A hipercifose prejudica a respiração e a
deglutição, dificulta as habilidades manuais, limita o olhar horizontal e
prejudica a marcha da criança. A escoliose causa assimetria de tronco,
18 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

dificulta o sentar e a utilização das mãos, e pode facilitar a luxação do


quadril do paciente (Murphy., 2009).
Na PC do tipo diplegia espástica é comum haver padrões motores anor-
mais. Na coluna ocorre hipercifose dorsal ao sentar, nos membros inferio-
res adução e rotação interna de coxo-femoral com flexão de joelhos e pés
equino-valgos, e, nos membros inferiores há fixação e flexão na busca de
estabilidade, o que dificulta as atividades manuais. Este padrão também
pode aparecer na quadriparesia espástica leve, com tendência a assimetria
e escoliose, devido à permanência do RTCA.
Nos pacientes com hemiparesia as deficiências sensório-motoras, a ne-
gligência do lado comprometido e a repetição dos movimentos em padrão
flexor de membro superior e extensor de membro inferior, tendem a causar
contraturas e deformidades, escoliose de tronco e prejuı́zo da funcionalidade
manual do paciente.
Quando ocorre flutação tônica, como nas atetoses e na ataxia, há ins-
tabilidade proximal que compromete a utilização funcional dos segmentos
distais. Isto causa prejuı́zo nas habilidades manuais e no controle do tronco
contra a gravidade, e pode comprometer a aquisição de habilidades motoras
como o sentar e o deambular.
O paciente gravemente comprometido, que não consegue desenvolver
mecanismos compensatórios para se sustentar contra a gravidade tende a
ficar mais restrito às posturas menos evoluı́das, e a permanecer sentado
com apoio.

5. Considerações Finais
Sabe-se que o aprendizado motor ocorre pela experimentação, pela repe-
tição e pela prática das atividades funcionais. Isto ocorre com a criança
durante seu desenvolvimento tı́pico, conforme ela interage com o meio e
evoluem as suas capacidades de controle motor. Na criança com PC isto
não existe de maneira satisfatória, pois há repetição de atos motores em
padrões primitivos, falta seletividade de movimentos, ocorre poucas trans-
ferências de peso e rotações de tronco, e permanecem reflexos patológicos
associados à movimentação. Isto acarreta em um aprendizado motor ina-
dequado e consolida os desequilı́brios musculares, e o déficit funcional e de
interação social.
As teorias modernas sobre o controle motor reconhecem que não é ape-
nas o sistema nervoso que amadurece e dita os comportamentos motores.
Há uma dependência da interação entre os sistemas orgânicos (nervoso e
musculoesquelético) e os estı́mulos do ambiente onde a criança está inse-
rida. Ou seja, o controle motor é dependente de questões orgânicas neurais
e não neurais, do meio que o rodeia e de variáveis determinadas de acordo
com o código genético do indivı́duo. Esta teoria, chamada de Teoria dos
Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 19

Sistemas Dinâmicos, orienta os profissionais que trabalham em neurorea-


bilitação. Ela recomenda que se analisem todas as variáveis relacionadas
ao desenvolvimento motor, desde a entrevista com os pais, até a avaliação
do paciente e a seleção de parâmetros e técnicas a serem utilizadas.
Outro fator que deve ser observado pelos profissionais que trabalham
em neurologia é a capacidade que o SNC tem de se adaptar a novas si-
tuações, mecanismo conhecido como plasticidade. A neuroplasticidade é
um evento fisiológico que ocorre durante toda a vida, mas é mais evidente
durante a embriogênese e nos primeiros anos do desenvolvimento. Nela
existem eventos macro e microscópicos variados, como a substituição fun-
cional de áreas lesadas por outras similares não lesadas e a reorganização
das sinapses por mecanismos moleculares especı́ficos.
Desta forma, um sistema nervoso em desenvolvimento tem maiores
chances de se adaptar plasticamente e buscar estratégias de reorganiza-
ção após uma lesão. O fisioterapeuta deve estar atento para este evento,
estimular as estratégias que reforçam os mecanismos plásticos do SNC e
lembrar que: quanto mais precoce se iniciar a intervenção, mais plástico
será o sistema nervoso e haverá melhor potencial de recuperação.
Com base nestas premissas, uma abordagem efetiva em PC deve: con-
siderar o meio onde o indivı́duo está inserido como parte de sua avaliação
e intervenção, buscar a automatização do aprendizado motor durante a
terapia, despertar o interesse da criança com atividades lúdicas prazero-
sas e adequadas ao seu desenvolvimento cognitivo, orientar aos familiares
e cuidadores sobre manuseios e posicionamentos, reforçar a importância
dos pais assistirem aos atendimentos de seus filhos para que possam dar
continuidade ao processo.
Conclui-se que o estudo do desenvolvimento tı́pico possibilita identificar
e intervir precocemente nas situações em que há atraso no desenvolvimento.
A compreensão da sequencia do desenvolvimento motor tı́pico permite de-
terminar a faixa etária motora da criança. Isto é fundamental, pois na
terapia deve-se estimular o paciente a evoluir para a próxima faixa, ou
idade motora. Assim, o conhecimento das etapas do desenvolvimento elu-
cida quais são as próximas habilidades motoras que devem ser estimuladas
e que reflexos devem ser suprimidos durante o tratamento. Reforça-se que
a estabilidade é a base do movimento voluntário, e não adianta treinar a
função motora se não há postura para realizá-la. O estabelecimento das
reações automáticas é o que proporciona a ocorrência das posturas de base,
como o controle de cabeça e tronco, que são indispensáveis à estabilidade
e à função.

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22 Forti-Bellani & Castilho-Weinert

Notas Biográficas
Luciana Vieira Castilho-Weinert é Fisioterapeuta (PUC-PR, 2003), Espe-
cialista em Fisiologia Humana e da Nutrição (PUC-PR, 2006), Mestre e Doutor
em Ciências – Engenharia Biomédica (UTFPR, 2004 e 2010, respectivamente)
e tem formação pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é Professor
Adjunto da UFPR – Setor Litoral, no Curso de Fisioterapia.

Claudia Diehl Forti-Bellani é Fisioterapeuta (ULBRA-RS, 2001), Mestre em


Ciências Biológicas – Neurociências (UFRGS, 2005) e tem formação pelo Conceito
Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é coordenadora e docente do Curso de Pós-
Graduação Lato Sensu em Neurologia com ênfase em Neuropediatria do IBRATE.
Capítulo 2

Escalas de Avaliação do Desenvolvimento e Habilidades


Motoras: AIMS, PEDI, GMFM E GMFCS

Tainá Ribas Mélo∗

Resumo: O desenvolvimento motor é caracterizado por mudanças


qualitativas e quantitativas de ações motoras ao longo da vida. As-
sim, o objetivo deste capı́tulo é elucidar as principais caracterı́sticas
e aplicabilidade de algumas escalas relacionadas ao desenvolvimento
motor: AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS. Além disto, busca-se esti-
mular a utilização de tais escalas pelos profissionais de reabilitação.
O material utilizado foi obtido por acesso a livros e artigos publi-
cados entre os anos 2000 e 2011, nos portais PUBMED e SciELO.
Pode-se observar que a escolha e a utilização do instrumento de-
pendem tanto dos objetivos quanto da população alvo. As escalas
de avaliação são ferramentas clı́nicas importantes. No entanto, não
se deve desconsiderar a experiência e o julgamento clı́nico do tera-
peuta.

Palavras-chave: Desenvolvimento motor, Escalas, Avaliação.

Abstract: The motor development has qualitative and quantitative


changes of motor activities throughout life. This chapter aims at
presenting the main topics and the applicability of some scales rela-
ted to the motor development: AIMS, PEDI, GMFM and GMFCS.
Besides, we also encourage the use of such scales by the rehabi-
litation professionals. The research material was from books and
articles published between 2000 and 2011, accessed in PUBMED
and SciELO portals. We observed that the choice and the use of
those scales depend on the needs and the target population. They
are important clinical tools, but one should not ignore the experi-
ence and clinical trial of the therapist.

Keywords: Motor development, Scales, Assessment.

∗ Autor para contato: ribasmelo@gmail.com

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


24 Mélo

1. Introdução
O desenvolvimento motor é um fenômeno que permeia a vida de todas
as pessoas, possibilitando as habilidades motoras e a realização de ativi-
dades diárias em padrões de movimento que são adquiridos ao longo da
vida. Estes padrões de movimento são caracterizados por duas mudanças
fundamentais: o aumento de diversificação e o aumento de complexidade
(Mascarenhas, 2008).
Na infância o desenvolvimento motor caracteriza-se pela aquisição de
um amplo espectro de habilidades motoras que possibilitam à criança um
domı́nio do seu corpo em diferentes posturas (estáticas e dinâmicas). Por-
tanto, considera mudanças qualitativas e quantitativas das ações motoras
do ser humano ao longo de sua vida (Connolly, 2000; Santos et al., 2004).
Piper & Darrah (1994) afirmam que o desenvolvimento motor pode ser
considerado como um dos melhores indicativos do desenvolvimento e bem
estar da criança no seu primeiro ano de vida. Assim, dar atenção ao de-
senvolvimento e aos fatores que o influenciam é de extrema importância.
Aqueles autores afirmam, ainda, que a avaliação motora do desenvolvi-
mento infantil difere dos paradigmas de outras avaliações motoras, porque
sua estrutura conceitual tem mais ênfase no processo que no resultado.
Portanto, os terapeutas devem usar abordagens modificadas para avaliar o
desenvolvimento motor na infância.
Assim, o conhecimento das escalas que atendam às diversas demandas
referentes à população avaliada e estudada torna-se necessário, não só em
ambiente de pesquisa, mas como ferramenta clı́nica importante.
Existem várias escalas que avaliam o desenvolvimento infantil tı́pico ou
com alterações. Neste capı́tulo, aborda-se as escalas AIMS, PEDI, GMFM
e GMFCS, amplamente citadas em pesquisas, e bastante utilizadas na prá-
tica clı́nica. O objetivo deste capı́tulo é elucidar quais as principais ca-
racterı́sticas e aplicabilidade destas escalas e estimular sua utilização pelos
profissionais de reabilitação, ressaltando a importância de se utilizar men-
surações para que a área da Fisioterapia Neuropediátrica tenha respaldo
em estudos cientı́ficos.

2. Fundamentação Teórica
Inicialmente o bebê é bastante reflexivo (Cole & Cole, 2004) e com o de-
senvolvimento, o crescimento e os estı́mulos do meio passa a ser cada vez
mais ativo, com movimentação voluntária. Esta movimentação se aperfei-
çoa até que com um ano a criança apresente marcos importantes como a
deambulação independente e a fala.
Vieira et al. (2009) relatam que devido aos avanços tecnológicos há uma
diminuição de mortalidade de bebês de alto risco, e em decorrência disto
um aumento de incidência de patologias infantis relacionadas ao sofrimento
Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 25

pré, peri e pós-natal. Isto causa grande impacto para a saúde e demanda
maior atenção a novas formas de abordagem no que se refere à avalia-
ção e acompanhamento do desenvolvimento neuropsicomotor. Este fato
corrobora a necessidade da atuação preventiva com detecção precoce das
anormalidades, por meio de avaliações especı́ficas, visando um tratamento
adequado.
Quando algum fator acarreta lesão no Sistema Nervoso Central (SNC)
pode-se esperar a ocorrência de sequelas que afetam o desenvolvimento
neuropsicomotor (DNPM) normal, ou numa nomenclatura mais atualizada,
o desenvolvimento tı́pico.
Ao considerar este aumento de incidência de patologias infantis, no
Brasil, existem programas de acompanhamento (originado do inglês, pro-
gramas de follow-up) do crescimento e desenvolvimento do bebê de risco.
Estes programas surgiram na década de 80 por meio da iniciativa de pe-
diatras e neonatologistas e propõem estratégias de avaliação e intervenção
precoce (Vieira et al., 2009).
Os profissionais de reabilitação devem possuir um conhecimento apro-
fundado sobre o processo das aquisições tı́picas do desenvolvimento global
da criança, o qual é composto por diversas categorias: tônus muscular, pos-
tura, reflexos primitivos, reações posturais, coordenações sensório-motoras
e movimentos espontâneos. Além disto, o profissional deve estar familiari-
zado com os diversos instrumentos de avaliação existentes, para selecionar
o mais adequado para o seu serviço de prevenção, ou reabilitação ou pes-
quisa. Devido à escassez de instrumentos padronizados para a avaliação
de crianças no Brasil, há a necessidade de utilização de testes e escalas
internacionais que, na maioria dos casos, possuem manuais publicados em
lı́ngua inglesa (Vieira et al., 2009), sendo que alguns foram traduzidos e/ou
têm adaptação cultural, como é o caso da PEDI (Pediatric Evaluation of
Disability Inventory).
Dentre as patologias infantis que ocasionam alterações no desenvolvi-
mento, Stanley et al. (2000) relatam que a Paralisia Cerebral (PC), tam-
bém denominada de Encefalopatia Crônica Não-Progressiva da Infância
(ECNPI) é a mais comum. Isto motiva estudos para o desenvolvimento de
escalas que atendam às capacidades diferenciadas destas crianças.
Mascarenhas (2008) investigou dentre as diversas escalas que avaliam
o desenvolvimento e as habilidades motoras, quais seriam especı́ficas para
PC. As escalas PEDI e AIMS (Alberta Infant Motor Scale) avaliam o dé-
ficit motor de um modo geral, verificam a função motora independente da
doença, e, não são especı́ficas para PC. Já as escalas GMFM (Gross Motor
Function Measure) e GMFCS (Gross Motor Function Classification Sys-
tem) são escalas que podem ser utilizadas na avaliação do déficit motor
causado pela PC, de forma especı́fica. Estas duas escalas proporcionam
maior coleta de dados, pois permitem o enfoque direto na deficiência mo-
tora e a avaliação quantitativa do movimento e de sua evolução.
26 Mélo

Para Piper & Darrah (1994), autores da escala AIMS, a GMFM e a


PEDI avaliam mudanças em atividades funcionais em crianças com desor-
dens neuromotoras, enquanto a AIMS analisa a maturação motora infantil
em crianças com desenvolvimento tı́pico ou em risco.

3. Metodologia
O material utilizado foi obtido por meio do acesso as bases de dados PUB-
MED e SciELO, pelos unitermos AIMS, PEDI, GMFM, GMFCS, deve-
lopmental e cerebral palsy. Foram selecionados artigos e livros publicados
entre os anos de 2000 e 2011.

4. Resultados e Discussão
Neste estudo descreve-se e discute-se uma revisão sucinta sobre as escalas
AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS. Relata-se sua aplicabilidade, seus bene-
fı́cios e alguns estudos que as utilizaram.

4.1 Alberta motor infant scale (AIMS)


No departamento de Medicina e Reabilitação da Universidade de Alberta,
Canadá, Pipper e colaboradores construı́ram e validaram1 a escala Alberta
com o objetivo de avaliar o desenvolvimento motor (Piper & Darrah, 1994).
Para validar a escala avaliaram uma amostra de 506 crianças. Esta escala
foi publicada em 1994 e tem como objetivo avaliar o desenvolvimento motor
amplo, ao longo do tempo, de recém-nascidos a termo e pré-termo, com
idade entre zero e dezoito meses. A escala identifica bebês cujo desempenho
motor esteja atrasado ou atı́pico em relação ao grupo normativo. Ela é uma
medida observacional da performance motora infantil que aborda conceitos
do desenvolvimento motor, tais como: neuromaturação, perspectiva da
dinâmica motora e avaliação da sequência do desenvolvimento motor.
As crianças que apresentem lesões no SNC podem apresentar desen-
volvimento motor dentro do repertório tı́pico, e a avaliação infantil não
deve ter como foco apenas as limitações ou restrições. Assim, é necessário
que os profissionais da reabilitação (fisioterapeutas, fonoaudiólogos, tera-
peutas ocupacionais, e demais) conheçam as habilidades que as crianças
apresentam e de que maneira estas podem ser aperfeiçoadas. A ênfase da
avaliação deve ser no processo e não somente no resultado. Isto significa
uma mudança de paradigma importante no processo de avaliar e observar
o desenvolvimento das crianças (Piper & Darrah, 1994).
Dentro desta concepção, o objetivo principal da AIMS é avaliar o desen-
volvimento sequencial das crianças com relação ao controle de movimento
em quatro posturas ou decúbitos (Saccani, 2009). A escala considera tanto
1 Validade é a adequação de um instrumento.
Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 27

aspectos da neuromaturação como da teoria motora dinâmica (Piper &


Darrah, 1994).
As crianças devem ser avaliadas pela observação de seus movimentos
espontâneos, sem restrições, manuseios ou facilitações. Os pais devem estar
próximos e os seus próprios brinquedos podem ser utilizados. Caso seja ne-
cessário, a avaliação pode ser interrompida e posteriormente retomada. As
observações são realizadas em diferentes posturas antigravitacionais (Piper
& Darrah, 1994).
A escala possui cinquenta e oito itens que avaliam os padrões motores
e as posturas utilizando três critérios: o alinhamento postural, os movi-
mentos antigravitacionais e a superfı́cie de contato (sustentação de peso).
As sub-escalas da AIMS são então determinadas por cada decúbito: prono,
supino, sentado e em pé. A pontuação é anotada como passou ou como
falhou e, ao final, os pontos em cada postura são somados em uma pon-
tuação total dos itens observados (Manacero & Nunes, 2008). Estes itens
são ilustrados com figuras e com a descrição de cada postura, como exem-
plificado na Figura 1. Esta pontuação total é então comparada a escores
referenciais para a idade de acordo com percentis (Anexo I).
A AIMS é uma escala observacional, de fácil aplicabilidade, baixo custo
e que não exige manuseio excessivo do lactente. É necessário conhecimento
sobre desenvolvimento infantil e prática para a utilização da escala (Al-
meida et al., 2008). A escala permite também o aprendizado sobre desen-
volvimento ao mesmo tempo em que se aprende a usá-la.

Figura 1. Primeiros itens avaliados em supino (Adaptado de Piper &


Darrah (1994)).

Durante a aplicação da escala pontua-se os itens observados em cada


postura ou decúbito (1 ponto para cada item observado). Caso um item
não seja observado, mas a criança se encontre num item mais avançado
ou mais “maduro”, os itens anteriores mesmo não sendo observados são
28 Mélo

computados. Deve-se observar que as posturas evoluem em dificuldade no


sentido horizontal da escala, para cada postura. Os itens motores obser-
vados no momento da avaliação são considerados como a janela motora da
criança. A pontuação final é composta pela soma de pontos obtidos em
cada um dos quatro decúbitos.
A Tabela 1 apresenta a forma de pontuação da escala. Segundo Piper &
Darrah (1994), para calcular a pontuação posicional da criança é necessário:
• Identificar o item menos maduro em cada posição;
• Identificar o item mais maduro em cada posição;
• O item entre o mais e o menos maduro é considerado a janela motora;
• Soma-se os pontos para obter uma pontuação posicional;
• Soma-se as quatro pontuações posicionais para obter a pontuação
final.

Tabela 1. Pontuação da escala AIMS.


Posturas ou Itens prévios Itens Pontuação
decúbitos creditados creditados na da sub-escala
janela
Prono
Supino
Sentado
Em pé
Total de pontos:

O instrumento fornece um gráfico (Anexo I) para identificar o percentil


do desempenho motor da criança comparada com amostras normativas da
mesma idade. No gráfico deve-se utilizar a interseção da idade corrigida
da criança (eixo horizontal do gráfico) e a pontuação total da AIMS (eixo
vertical). Quanto mais alta a posição do percentil, menos provável será a
existência de um atraso (Piper & Darrah, 1994).
Quanto às propriedades psicométricas, a AIMS apresenta alta confia-
bilidade2 interobservadores (0,96-0,99) e de teste-reteste (0,86-0,99). A
sensibilidade varia de 77,3 a 86,4% aos 4 meses e a especificidade é de
65,5% aos 8 meses (Santos et al., 2008). Este é um teste de critério de
referência, não de diagnóstico, com a classificação percentual normatizada
2 Confiabilidade representa a consistência ou reprodução dos resultados quando
o mesmo grupo de indivı́duos é acessado mais de uma vez com o mesmo ins-
trumento (mesmo observador em momentos diferentes ou entre observadores
diferentes) (Piper & Darrah, 1994).
Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 29

para permitir a determinação de onde o indivı́duo se encontra em uma me-


dida de habilidade comparado com aqueles do grupo de referência (Vieira
et al., 2009).
O uso da classificação percentil deve ser feito com cautela, pois uma
pequena mudança na pontuação bruta pode resultar em uma grande mu-
dança no percentil da classificação.
Devido às influências das questões culturais sobre o repertório motor
Manacero & Nunes (2008) relataram que enquanto a AIMS não fosse tra-
duzida oficialmente seu uso teria limitações com relação à população bra-
sileira. Porém, Valentini & Saccani (2011) a validaram nesta população.
Saccani (2009) estudou a AIMS em 561 crianças gaúchas encontrando
validade e fidedignidade para esta população. Almeida et al. (2008) uti-
lizaram a AIMS para a avaliação de prematuros e verificou sua grande
utilidade na rede pública de saúde brasileira, tanto para o acompanha-
mento do desenvolvimento motor de lactentes prematuros no primeiro ano
de vida como para a utilização em pesquisas.
Harris et al. (2009) utilizaram a AIMS para comparar com a escala
de validação de crianças propostas por estes autores e encontraram boa
validade para a mesma. Assim, a AIMS também é utilizada como escala de
referência para a elaboração de novas escalas, é abrangente aos profissionais
da reabilitação e facilita a comunicação e o trabalho multidisciplinar e
interdisciplinar.
A escala também é utilizada como forma de acompanhar a evolução
do desenvolvimento de crianças submetidas a determinadas intervenções.
Silva et al. (2006) utilizaram a AIMS para verificar o efeito das práticas
maternas sobre o desenvolvimento de crianças nascidas a termo e saudáveis
e observaram que a escala é uma ferramenta útil para este objetivo.
Mancini et al. (2002) utilizaram a AIMS e a PEDI para comparar a
movimentação espontânea, as habilidades e a independência de crianças a
termo e pré-termo. Neste estudo verificaram que na ausência de outros
distúrbios, e, com a correção da idade em pré-termos, o desenvolvimento
motor pode ser semelhante ao de crianças nascidas a termo.
Embora o objetivo da AIMS seja identificar atrasos de desenvolvimento
e seu uso seja maior em crianças ditas tı́picas ou prematuras, alguns estudos
utilizam a escala para caracterizar o perfil de populações com condições
especiais. O estudo de Pereira (2008), em lactentes com sı́ndrome de Down,
observou com a AIMS que apesar de existir um atraso na aquisição de
marcos de referência, o desenvolvimento motor ocorreu de forma crescente
e permitiu descrever o perfil de desenvolvimento para esta população.
Assim, além da utilização para detectar atrasos e acompanhar a evo-
lução do desenvolvimento motor, esta escala também pode ser estudada
quanto a sua aplicação em condições especiais de saúde e desenvolvimento.
30 Mélo

4.2 The pediatric evaluation of disability inventory (PEDI)


A PEDI, cuja tradução é avaliação pediátrica do inventário de incapacida-
des, foi desenvolvida por Haley e colaboradores com o propósito de avaliar
as capacidades funcionais e o desempenho tı́pico em crianças jovens com
limitações funcionais (Mascarenhas, 2008).
Este instrumento é utilizado para descobrir déficits funcionais, acom-
panhar progressos e analisar o resultado de intervenções. A PEDI é um
instrumento de avaliação infantil que caracteriza o desempenho funcional
de crianças com idade cronológica entre 6 meses e 7 anos e 6 meses. Po-
rém, pode ser utilizada quando apesar da idade cronológica ser superior
ao limite indicado, o indivı́duo apresentar desempenho funcional condi-
zente com esta faixa etária. com objetivo de acompanhamento evolutivo
da criança (Mancini, 2005; Silva & Daltrário, 2008).
De acordo com Mancini et al. (2002) e Silva & Daltrário (2008) o teste
PEDI é uma avaliação realizada através de entrevista estruturada com os
pais ou responsáveis pela criança, ou através da observação dos profissi-
onais. O tempo para observação varia entre 30 e 40 minutos conforme
a habilidade do observador. No caso das entrevistas, estas podem durar
cerca de 60 minutos ou mais (Mancini, 2005). Este teste foi recentemente
traduzido para o português e adaptado para contemplar as especificida-
des sócio-culturais do Brasil, com permissão e colaboração dos autores da
avaliação original.
O perfil documentado pelo PEDI informa três aspectos importantes
do desenvolvimento funcional: as habilidades presentes no repertório da
criança (parte I), a independência no desempenho de atividades diárias ou
a influência do cuidador (parte II) e as modificações do ambiente utilizadas
para facilitar o desempenho funcional (parte III).
Os construtos de mensuração que deram origem às escalas do teste
foram definidos com base nas abordagens desenvolvimental, contextual e
ambiental. Eles foram criados a partir de uma versão adaptada do modelo
de disfunção proposto pela Organização Mundial de Saúde, e influenciados
pela Classificação Internacional de Deficiência, Incapacidade e Limitação
Social (Mancini, 2005).
A escala possibilita identificar as alterações no desempenho funcional
precocemente, pois é um teste que pode ser realizado na casa e na comu-
nidade através de perguntas.
Empelen et al. (2005) relatam que a escala foi desenvolvida para me-
dir, em cada uma de suas partes, mudanças funcionais em atividades de
auto-cuidado, mobilidade e função social. O auto-cuidado consiste na ali-
mentação, no vestir e nas necessidades fisiológicas; a mobilidade consiste
em utilizar carro, cadeira, banheiro, andar em recinto fechado, ao ar livre
e em escadaria; a função social consiste em compreensão, fala, interações
com amigos e na comunidade.
Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 31

A capacidade é medida pela identificação de habilidades funcionais para


as quais a criança demonstrou domı́nio e competência. O desempenho
funcional é medido pelo nı́vel de ajuda que a criança precisou para realizar
atividades funcionais principais como comer ou locomover.
Apesar do PEDI apresentar três áreas de desempenho, cada área pode
ser avaliada de forma independente, de acordo com o interesse funcional
(Silva & Daltrário, 2008). A avaliação foi projetada para servir como uma
medida descritiva do desempenho funcional atual da criança e também
como um método para localizar mudanças com o passar do tempo (Mancini,
2005).
A Tabela 2 ilustra a parte I (Habilidades funcionais) da escala, relaci-
onada a área de mobilidade. A pontuação da parte I é zero se a criança é
incapaz de realizar a atividade e um se ela é capaz de realizar.

Tabela 2. Parte I (Habilidades funcionais), item A da área Mobilidade.


Adaptado de Mancini (2005).
Área de (Marque o correspondente para cada item;
mobilidade escores dos itens: 0-incapaz; 1=capaz)
A: Transferências no Banheiro 0 1
-Fica sentado se estiver apoiado em equipamento ou no adulto
-Fica sentado sem apoio na privada ou no troninho
-Senta e levanta de privada baixa ou troninho
-Senta e levanta de privada própria para adulto
-Senta e levanta da privada sem usar seus próprios braços

A pontuação da Parte II, relacionada à Assistência do cuidador (ajuda)


é graduada em: independente (pontuação cinco), supervisão (quatro), mı́-
nima (três), moderada (dois) e máxima (um). A Tabela 3 ilustra o formu-
lário da PEDI para a Parte II.
A pontuação da Parte III (Modificação do Ambiente) é feita de forma
categórica e também pode ser observada na Tabela 3: nenhuma modificação
recebe N, modificações relacionadas à criança recebem C (exemplo: fralda),
modificações relacionadas à reabilitação recebem R (exemplo: órtese) e
modificações extensivas recebem E (exemplo: tecnologia assitiva).
Pode-se observar na Tabela 3, que a pontuação das Partes II e III é
feita para os itens anteriormente avaliados na Parte I, porém de forma
agrupada.
Após pontuar todos os itens é possı́vel estabelecer o escore bruto da
criança para cada área, e, baseado na sua idade cronológica, comparar com
o escore normativo (±erro-padrão).
Os escores normativos foram estimados e estão presentes no manual
de utilização da PEDI. Caso a criança tenha idade superior a 7 anos e 6
meses pode-se utilizar apenas o escore contı́nuo, com objetivo de comparar
32 Mélo

Tabela 3. Partes II e III (Assistência do Cuidador e Modificações do


Ambiente), itens relacionados a área de Auto-Cuidado (Adaptado de
Mancini (2005)).
Assistência Modificações
Partes II e III: Assistência do Cui- do Cuidador
dador e Modificações do Ambiente

independente

reabilitação
supervisão

moderada

extensiva
nenhuma
máxima
mı́nima

criança
total
Circule o escore apropriado para avaliar cada
item
Área de Auto-Cuidado 5 4 3 2 1 0 N C R E
A. Alimentação: Come e bebe nas refeições re- 5 4 3 2 1 0 N C R E
gulares; não inclui cortar carne, abrir recipientes
ou servir comida das travessas
B. Higiene Pessoal: escova dentes, escova ou 5 4 3 2 1 0 N C R E
penteia o cabelo e limpa o nariz
C. Banho: lava e seca rosto e mãos, toma ba- 5 4 3 2 1 0 N C R E
nho; não inclui: entrar e sair do chuveiro ou ba-
nheira, preparar a água e lavas costas e cabelos
D. Vestir – parte superior do corpo: rou- 5 4 3 2 1 0 N C R E
pas de uso diário, inclui ajudar a colocar e retirar
splint ou prótese; não inclui: tirar roupas do ar-
mário ou gavetas, lidar com fechos nas costas
E. Vestir – parte inferior do corpo: roupas 5 4 3 2 1 0 N C R E
de uso diário, incluindo colocar e tirar órtese ou
prótese; não inclui tirar as roupas do armário ou
gavetas

a criança com ela mesma ao longo do tempo e definir quais itens de cada
área ela já deveria realizar. Isto é possı́vel através de mapas de atividades
(também disponibilizados no manual), traçando-se uma linha vertical na
pontuação obtida pela criança. Os itens à esquerda da linha significam os
que ela deveria estar fazendo independente da sua idade cronológica. As
Tabelas 4 e 5 ilustram estes escores.
Desde sua publicação em 1992, muitas mudanças foram incorporadas
à prática de aplicação, inclusive itens de avaliações que considerem novas
tecnologias (Haley et al., 2010). A PEDI é utilizada em pesquisas com o
objetivo de avaliar, identificar e acompanhar a evolução do tratamento.
Silva & Daltrário (2008) utilizaram a PEDI para verificar o desempenho
da marcha no treinamento funcional em esteira de uma criança com PC e
verificaram que houveram ganhos para esta habilidade funcional. Mancini
et al. (2004) utilizaram a PEDI para verificar a influência entre risco bio-
lógico e desempenho funcional infantil. Marinho et al. (2008) compararam
crianças com hemiparesia e diparesia em relação ao desempenho funcional,
evidenciando dificuldades maiores das crianças com diparesia nos itens re-
lacionados à locomoção, mas sem diferenças nas atividades relacionadas ao
Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 33

Tabela 4. Quadro de pontuação para todas as áreas avaliadas. Adaptado


de Mancini (2005).
Área Escore Escore Erro Escore Erro Escore
Bruto Normativo padrão Contı́nuo padrão Fit*
Auto- Habilidades
cuidado funcionais
Função Habilidades
social funcionais
Auto- Assistência
cuidado do cuidador
Mobilidade Assistência
do cuidador
Função Assistência
social do cuidador
* Obtido pelo cálculo realizado por um software especı́fico

Tabela 5. Escores Normativo e Contı́nuo para a área de Auto-cuidado.


Adaptado de Mancini (2005).
Escore Escore
Normativo Contı́nuo
Auto- Habilidades
Cuidado Funcionais

auto-cuidado. Sorsdahl et al. (2010) utilizaram a PEDI como instrumento


para verificar os efeitos da intervenção fisioterapêutica sobre as habilidades
motoras de crianças com PC. Bailes et al. (2010) usaram a PEDI para ve-
rificar efeitos de intervenção e da frequência da mesma em 2 crianças com
diplegia espástica.
O foco da terapia ocupacional está voltado para o desempenho e a inde-
pendência das crianças nas tarefas de vida diária, em contextos relevantes.
Guerzoni et al. (2008) revisaram vários estudos que incluı́am a utilização da
PEDI e concluı́ram que o contexto no qual a criança com PC está inserida
parece ser um fator importante no seu desempenho funcional. Porém, em-
bora a área da função social do PEDI compreenda a avaliação de aspectos
de comunicação, Mayrand et al. (2009) verificaram que em relação às alte-
rações motoras evidenciadas em crianças com deficiências de linguagem, a
PEDI não é suficientemente acurada para identificar estas alterações.

4.3 Gross motor function measure – GMFM


A escala GMFM, traduzida como escala de Medida da Função Motora
Grossa, foi desenvolvida para permitir uma avaliação quantitativa de as-
pectos motores estáticos e dinâmicos (Drouin et al., 2006).
De acordo com Mascarenhas (2008) a GMFM é uma escala de confiança
e sensibilidade para descobrir mudanças clı́nicas importantes na função
34 Mélo

motora de crianças com PC. Esta escala foi desenvolvida em duas versões,
com 88 itens e a mais atual com 66. Ambas avaliam atividades motoras
desde rolar e sentar, até andar e correr. A escala original (GMFM-88) é
composta por 88 itens, avaliados através da observação, e que se agrupam
em cinco dimensões: rolando (17 itens), sentando (20 itens), rastejando e
ajoelhando (14 itens), estando de pé (13 itens), e caminhando, correndo e
saltando (24 itens).
Os itens são agrupados no formulário de classificação pela sequência de
desenvolvimento (Cury et al., 2006). As pontuações são feitas por porcen-
tagens para cada uma das cinco dimensões do GMFM. Quanto mais altas
forem, melhor será a capacidade funcional da criança.
Drouin et al. (2006) relatam alto ı́ndice de coeficiente intraclasse na
utilização da GMFM, ou seja, alto ı́ndice de confiança quando comparada
à análise por vı́deo.
Na GMFM-88 havia limitações como o escore percentual limitado para
demonstrar crianças com perfis clı́nicos diferentes. A análise total não
permitia identificar qual item era o que se encontrava atrasado, e o tempo
prolongado para avaliação e o uso da escala ordinal não permitia que a
distância entre os escores fosse igual, sub ou superestimando as mudanças
(Russell et al., 2002). Assim, em setembro de 2000 foi desenvolvido um
novo sistema utilizando 66 itens principais, validado somente para crianças
com PC, o GMFM-66.
Russell et al. (2000) realizaram um estudo com 537 crianças com PC
para verificar a validade e a confiabilidade do GMFM-66. Os autores ob-
tiveram como resultados que a confiabilidade teste re-teste foi de 0,99 e
concluı́ram, portanto, que o instrumento apresenta boas propriedades psi-
cométricas.
A GMFM-66 permite o cálculo do escore total mesmo quando todos os
itens não foram administrados e analisa as mesmas dimensões do GMFM-
88: deitar e rolar (4 itens), sentar (15 itens), engatinhar e ajoelhar (10
itens), de pé (13 itens), e, andar, correr e pulas (24 itens).
Os itens são marcados em quatro pontos ordinais: 0 (não pode iniciar),
1 (inicia, mas completa menos que 10%), 2 (parcialmente completa - 11 a
99%), 3 (completa independentemente).
Na Tabela 6 apresenta-se um trecho da escala traduzida com a dimen-
são atividade funcional deitar e rolar, composta por 17 itens. Cada item
é observado e pontuado e, então, os valores são somados para se obter o
valor total da dimensão avaliada. Cabe ressaltar que a pontuação men-
cionada serve apenas para fornecer uma diretriz geral sobre a escala. É
indispensável seguir as instruções de pontuação especı́ficas de cada item.
Além do menor tempo de administração, da menor dificuldade, da
maior confiabilidade, da validade e da responsividade, a GMFM-66 per-
mite uma estimativa dos escores da criança utilizando uma amostra de
Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 35

pelo menos 13 itens. No entanto, quanto maior a quantidade de itens


avaliados, mais acurado será o escore analisado.
Os escores do GMFM-66 requerem um software denominado Gross Mo-
tor Ability Estimator (GMAE). Este software fornece escore total, desvio-
padrão, intervalo de confiança e mapas de interpretação das habilidades
motoras grosseiras (Russell et al., 2002).
Drouin et al. (2006) analisaram a correlação de aspectos espaço-
temporais da marcha com a GMFM e também encontraram ı́ndices de
excelentes a moderados com a utilização da escala.

Tabela 6. Itens que compõem a dimensão deitar e rolar da GMFM-66.


Item A. Deitar e Rolar Escore
1. SUP: cabeça na linha média: vira a cabeça 0 1 2 3
com as extremidades simétricas
2. SUP: traz as mãos para a linha média, dedos 0 1 2 3
se tocam
3. SUP: levanta a cabeça a 45o 0 1 2 3
4. SUP: flete quadril e joelho D em toda a am- 0 1 2 3
plitude
5. SUP: flete quadril e joelho E em toda a ampli- 0 1 2 3
tude
6. SUP: estende o braço D, mão cruza a linha 0 1 2 3
média em direção do brinquedo
7. SUP: estende o braço E, mão cruza a linha 0 1 2 3
média em direção do brinquedo
8. SUP: rola para prono sobre o lado D 0 1 2 3
9. SUP: rola para prono sobre o lado E 0 1 2 3
10. PR: levanta a cabeça verticalmente 0 1 2 3
11. PR: sobre antebraços: levanta a cabeça ver- 0 1 2 3
tical, extensão de cotovelos, peito elevado
12. PR: sobre antebraços: peso no antebraço D, 0 1 2 3
extensão total, outro braço para frente
13. PR: sobre antebraços: peso no antebraço E, 0 1 2 3
extensão total, outro braço para frente
14. PR: rola para supino sobre lado D 0 1 2 3
15. PR: rola para supino sobre lado E 0 1 2 3
16. PR: gira (pivots) para D 90o usando as ex- 0 1 2 3
tremidades
17. PR: gira (pivots) para E 90o usando as extre- 0 1 2 3
midades
Dimensão A TOTAL
SUP = supino; PR = prono; D = direita; E = esquerda
36 Mélo

4.4 Gross motor function classification system (GMFCS)


A GMFCS, traduzida como Sistema de Classificação da Função Motora
Grossa, foi desenvolvida para classificar crianças com PC em nı́veis. A
escala pode ser aplicada em crianças com idade entre 1 e 12 anos e as
classifica de acordo com suas capacidades e limitações.
A escala apresenta cinco nı́veis ordinais. O que caracteriza a diferença
entre os nı́veis é o conhecimento das incapacidades da criança e do nı́vel
de assistência que ela necessita. A classificação é feita baseada na função
motora grossa em atividades diárias com ênfase na mobilidade e no ficar
sentado (Beckung et al., 2007; Palisano et al., 2009). Atualmente existe
uma versão ampliada que enquadra indivı́duos de até 18 anos.
A escala é ordinal, porém sem a intenção de que as distâncias entre os
nı́veis sejam consideradas iguais, ou de que as crianças com PC sejam dis-
tribuı́das igualmente entre os cinco nı́veis. O objetivo é classificar a função
motora grossa atual da criança, e não julgar a qualidade do movimento ou
o potencial de melhora (Palisano et al., 1997). Existe caracterização para
nı́veis nas faixas etárias inferior a 2 anos, de 2 a 4 anos, de 4 a 6 anos, de
6 a 12 anos e de 12 a 18 anos.
Como exemplo, os nı́veis dividem-se em:
• Nı́vel 1: caminha sem restrições, limitações nas atividades motoras
mais avançadas;
• Nı́vel 2: caminha sem restrições, limitações ao ar livre e na comuni-
dade;
• Nı́vel 3: caminha com recurso auxiliar, limitações ao ar livre e na
comunidade;
• Nı́vel 4: mobilidade com limitações, crianças são transportadas ou
usam recursos assistivos para mobilidade ao ar livre e na comunidade;
• Nı́vel 5: mobilidade severamente limitada, sempre utiliza tecnologia
assistiva.
Palisano et al. (2009) relatam que a GMFCS tem validade de cons-
tructo, validade discriminativa e confiança. Estes autores ainda estudaram
a relação do nı́vel funcional de crianças com PC com a participação em
atividades na comunidade e verificaram que existe uma relação direta. As-
sim, as crianças que têm maior participação são as que apresentam melhor
nı́vel funcional pela escala.
Shevell et al. (2009) realizaram um estudo coorte com 243 crianças
onde foi identificado que 35% apresentaram quadriplegia espástica, 31%
hemiplegia espástica, 21% diplegia espástica, 7% PC discinética, 4% atá-
xica e 2% classificados como “outro”. Destas crianças, funcionalmente, 66%
podem deambular sozinhas ou com algum tipo de recurso auxiliar.
Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 37

Damiano et al. (2006) compararam o desempenho funcional de crian-


ças com hemiplegia e diplegia, discutindo que a GMFCS enfatiza mais as
habilidades dos membros inferiores.
Blair & Watson (2006) utilizaram a GMFCS para discutir a definição
e a classificação da PC. Os profissionais da reabilitação e os pesquisadores
utilizam amplamente o GMFCS para classificar funcionalmente seus paci-
entes e sujeitos de pesquisa, a fim de facilitar a comunicação e a descrição
(Ju et al., 2010; Burton et al., 2009; Chagas et al., 2008; Marinho et al.,
2008; Eek & Beckung, 2008).

5. Conclusão
Este capı́tulo fornece aos profissionais de reabilitação um contato com as es-
calas de avaliação em fisioterapia neuropediátrica. Incentiva-se o interesse
na utilização de ferramentas clı́nicas que propiciem melhor manejo dos pa-
cientes e evidências cientı́ficas para busca e aperfeiçoamento das metas de
reabilitação.
A AIMS permite identificar atrasos no desenvolvimento até os 18 me-
ses de idade. Porém, sua utilização com populações em condições especiais
ainda precisa de maiores estudos e evidências. O PEDI caracteriza o desem-
penho funcional de crianças com idade cronológica entre 6 meses e 7 anos e
6 meses e pode ser utilizado também em casos em que, apesar da idade cro-
nológica ser superior ao limite indicado, o indivı́duo apresente desempenho
funcional condizente com esta faixa etária. A GMFM e a GMFCS per-
mitem quantificar em nı́veis funcionais as habilidades das crianças, porém
sem considerar a qualidade de movimento.
Assim, é importante ressaltar que as escalas são ferramentas que auxi-
liam o profissional a caracterizar as capacidades de cada criança, mas que
não dispensam o julgamento e o conhecimento clı́nico do profissional de
reabilitação.
Para a utilização de cada escala é necessário conhecimento prévio, aqui-
sição de manuais e realização de treinamentos. Além disto, a utilização das
escalas por si só não garante uma descrição completa de todo o repertório
motor da criança.

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Notas Biográficas

Tainá Ribas Mélo é Fisioterapeuta (UNIOESTE, 2004), Especialista em


Neuropediatria (UFSCar, 2005) e Mestre em Comportamento Motor (UFPR,
2011. Atualmente é fisioterapeuta concursada pela Prefeitura Municipal de
Paranaguá, PR e docente do Curso de Pós-graduação em Neurologia com Ênfase
em Neuropediatria do Instituto Brasileiro de Therapias e Ensino – IBRATE.
42 Mélo

Anexo 1: Percentis da Escala AIMS


Capítulo 3

Abordagem Fisioterapêutica pelo Conceito


Neuroevolutivo Bobath

Luciana Vieira Castilho-Weinert∗, Cláudia Diehl Forti-Bellani

Resumo: Este capı́tulo tem como objetivo principal descrever uma


das mais difundidas formas de intervenção em fisioterapia em neuro-
pediatria, o Conceito Neuroevolutivo Bobath. Inicialmente define-se
o Conceito, descreve-se sua história, sua evolução e sua importân-
cia. Na sequência revisa-se as técnicas para inibição e facilitação
que fazem parte da abordagem Bobath. Com base nestes recur-
sos apresenta-se exemplos de intervenção em casos hipotéticos. São
discutidos os resultados de alguns estudos que utilizaram o referido
Conceito como tratamento fisioterapêutico. Conclui-se o capı́tulo
com direcionamentos e incentivos para que se realizem mais estudos
sobre o Conceito, fornecendo respaldo cientı́fico para sua utilização
pela comunidade acadêmica.

Palavras-chave: Fisioterapia, Intervenção, Conceito Neuroevolu-


tivo Bobath.

Abstract: This chapter aims to describe one of the most widespread


forms of neuropediatrics physiotherapy, the Bobath Neurodevelop-
ment Treatment. We define de Concept, its history, evolution and
importance. So we review the Bobath approach techniques and pre-
sent some examples of intervention in hypothetical cases. Finally
we discuss the results of some studies that used the Neurodevelop-
ment Treatment in physiotherapy and conclude encouraging the re-
alization of more studies about Bobath Treatment, to give scientific
support for its use by academic community.

Keywords: Physiotherapy, Intervention, Neurodevelopment Treat-


ment.

∗ Autor para contato: luciana.weinert@ufpr.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


44 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

1. Introdução
O Conceito Neuroevolutivo Bobath é uma abordagem para a solução de
problemas, para a avaliação e para o tratamento de indivı́duos com distúr-
bios da função, do movimento e do controle postural, devido a lesões do
sistema nervoso central (Raine, 2006; IBITA, 2008).
Há inúmeras abordagens para o tratamento de pacientes com déficits
neurológicos, porém o Bobath é uma das mais comumente utilizadas (Da-
vidson & Walters, 2000; Lennon, 2003; Gusman & Torre, 2010). As téc-
nicas utilizadas pelo Conceito fornecem ao fisioterapeuta o embasamento
teórico e o protocolo de intervenção clı́nica necessários à intervenção em
fisioterapia neuropediátrica (Raine et al., 2009).
O Conceito teve sua origem através do casal Bobath, Berta Bobath (fi-
sioterapeuta) e Karel Bobath (neurologista e psiquiatra). Em 1942, Berta
Bobath recebeu como paciente um famoso pintor, hemiplégico adulto, com
uma espasticidade importante. Durante seu tratamento ela observou que a
espasticidade poderia ser modificada por meio de posturas e movimentos,
e assim começou a elaborar o que hoje se conhece como Conceito (Schlei-
chkorn, 1992). Nos anos 50 o casal fundou o Centro Bobath em Londres,
na Inglaterra. Por meio deste Centro e de seus profissionais (seguidores do
Conceito) esta abordagem continua em constante evolução, mesmo após a
morte dos Bobath.
Esta forma de intervenção passou a chamar-se Conceito e deixou de
ser um Método porque é uma abordagem que está em constante evolução.
Denomina-se Neuroevolutivo porque obedece a sequência do desenvolvi-
mento motor normal (ou desenvolvimento tı́pico, conforme nomenclatura
atual). Esta sequência é respeitada tanto no planejamento de objetivos
e aquisições do paciente em longo prazo, quanto durante o próprio aten-
dimento que evolui a partir de posturas mais simples até posturas que
demandem maior controle motor. O nome Bobath teve origem em seus
desenvolvedores.
Ao longo dos anos o desenvolvimento do Conceito avançou com mo-
dificações relacionadas à nomenclatura das técnicas e também à forma de
intervenção junto aos pacientes. Isto reitera a constante evolução da abor-
dagem.
Inicialmente o Conceito utilizava posturas estáticas para a inibição de
alterações do tônus e de padrões anormais de movimento. Como somente a
inibição do padrão reflexo não era suficiente para facilitar os movimentos,
o casal Bobath estudou aprofundadamente a sequência do desenvolvimento
motor tı́pico, e a intervenção passou a inibir os padrões reflexos e posici-
onar a criança em posturas neuroevolutivas. Porém, mesmo com o tônus
organizado e o treinamento das posturas neuroevolutivas, a realização das
transferências de uma postura a outra ainda não era possı́vel. Neste mo-
mento o casal identificou que a base para o movimento frente à gravidade
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 45

está nas reações posturais automáticas e, a partir deste ponto o tratamento


tornou-se mais dinâmico. Assim o Conceito englobou os Padrões de Movi-
mento Influenciando o Tônus ou somente Padrões Influenciando o Tônus
(PIT).
Os PIT inibem os padrões anormais e facilitam a ocorrência da movi-
mentação ativa o mais próximo possı́vel do normal simultaneamente. Eles
substituem os chamados Padrões de Inibição Reflexa (PIR), utilizados ini-
cialmente no conceito. Segundo Mayston (1995) nos anos recentes ocorreu
algumas mudanças na base teórica e na aplicação prática do Conceito. A
terminologia das técnicas de facilitação chamadas de PIR foi modificada
para PIT, refletindo uma mudança na compreensão do controle motor e do
tônus postural.
Por último, adicionou-se ao Conceito a importância do treino das re-
ações de balance (reações de equilı́brio, proteção e retificação) e das ati-
vidades funcionais, com o objetivo de promover o aprendizado da função
motora.
Desde o começo da abordagem Bobath, o tônus postural era atribuı́do
à atividade tônica reflexa. A definição clássica de espasticidade é proporci-
onal a esta visão ao considerar que esta é uma desordem caracterizada pela
velocidade de aumento dos reflexos tônicos de estiramento (tônus muscu-
lar), com retrações tendı́neas exageradas, e, componente da sı́ndrome do
neurônio motor superior. Assim, classicamente, quando se pensava em
avaliar tônus considerava-se apenas movimentos passivos, mas atualmente,
pelo Conceito Bobath, a análise do tônus remete à sua qualidade associada
aos movimentos ativos (Centro Bobath, 1997).
Com sua difusão e evolução, além dos benefı́cios proporcionados aos
pacientes neuropediátricos, uma das principais contribuições do Conceito
Neuroevolutivo Bobath foi a comprovação de que o sistema nervoso é capaz
de aprender a responder a estı́mulos inibitórios dos padrões de movimento
que interferem com a movimentação normal (Gusman & Torre, 2010). Esta
comprovação ocorreu em tempos em que ainda não se conhecia com pro-
priedade os mecanismos plásticos do sistema nervoso, porém era notória a
capacidade do fisioterapeuta em influenciá-lo através do Bobath.
Como critérios de indicação, o Conceito pode ser utilizado em indivı́-
duos de todas as idades e déficits funcionais (Raine, 2006; IBITA, 2008),
nas situações em que há interferência no desenvolvimento normal do sis-
tema nervoso que cursem com atrasos no desenvolvimento tı́pico, ou na
presença de alterações do movimento, da postura e do tônus.
Este capı́tulo é motivado pela necessidade de se difundir o conheci-
mento relativo a uma abordagem tão importante para o fisioterapeuta que
atua em neurologia infantil, pois se sabe que o acesso a literatura traduzida
sobre o assunto é difı́cil, devido a sua quase inexistência. O conhecimento
sobre o Conceito Bobath é indispensável, devido ao seu importante papel
46 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

na promoção da funcionalidade e autonomia dos pacientes, considerando-


os individualmente. O Conceito visa preparar o paciente para executar
atividades funcionais, tentando torná-lo o mais independente possı́vel, de
acordo com suas potencialidades. É uma forma de tratamento global, mas
que se adéqua às necessidades individuais. Nele o paciente recebe experi-
ência sensório-motora normal de movimentos básicos, que pela repetição e
integração em suas atividades de vida diária geram o aprendizado motor e
posteriormente o automatismo.
Este capı́tulo tem como objetivo principal descrever as técnicas de tra-
tamento utilizadas pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath e sugerir alguns
exemplos de sua aplicação em casos hipotéticos. Como objetivo especı́fico
também pretende contribuir para o compartilhamento deste conhecimento
tão escasso e discutir alguns estudos que utilizaram tal abordagem de in-
tervenção em pacientes neurológicos.

2. Fundamentação Teórica
O objetivo da intervenção pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath é realizar
manuseios que utilizem técnicas de inibição, facilitação e estimulação de
padrões de movimento normais, para possibilitar a aquisição da funciona-
lidade dos pacientes (Gusman & Torre, 2010). Para isto, inibe padrões
de tônus postural anormal e facilita o surgimento de padrões motores nor-
mais, o que viabiliza a ocorrência de movimentos ativos e mais próximos
do normal.
Para Gusman & Torre (2010) as técnicas de tratamento dividem-se
em técnicas de facilitação, inibição e estimulação. Ressalta-se que as duas
primeiras são executadas por meio de pontos-chave de controle. Porém, as
mesmas autoras salientam que, mais importante que conhecer as técnicas,
é saber utilizá-las no momento apropriado e modificá-las de acordo com as
caracterı́sticas de cada paciente.
Na década de 1990, Berta Bobath percebeu a importância do trata-
mento não se limitar a um conjunto estruturado de exercı́cios. Assim, na
intervenção deve haver uma variedade de técnicas adaptadas para atender
a evolução das necessidades individuais. Cada terapeuta deve atuar de
forma diferenciada e de acordo com suas experiências e personalidade. Po-
rém, todo o tratamento deve ser embasado na teoria e prática do Conceito.
Segundo o Bobath, a referência para que se saiba se a intervenção é
eficiente, é a ocorrência de movimentos funcionais, com adequado alinha-
mento biomecânico, coordenação motora e controle motor.
Antes de se realizar qualquer facilitação é necessário organizar o tônus
do paciente, seja por meio de uma inibição ou de uma estimulação, de
acordo com o seu tônus, conforme se apresenta na Figura 1.
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 47

Figura 1. Utilização das técnicas de acordo com o tônus do paciente.

2.1 Pontos-chave de controle


As técnicas de inibição e facilitação são guiadas pelo fisioterapeuta através
de pontos-chave de controle, pelos quais o manuseio influencia seguimen-
tos à distância, seguindo o preceito de que o movimento modula o tônus.
Conforme ocorre a aprendizagem motora e melhora-se o controle motor do
paciente, deve-se diminuir gradualmente o suporte fornecido pelo fisiotera-
peuta. Esta diminuição ocorre com o uso de pontos-chave em regiões mais
distais, o que contribui para a aquisição da sua independência.
Os pontos-chave de controle são, na maioria das vezes, as articulações
do paciente. Como estes são pontos móveis em nosso esqueleto, permitem
a condução do movimento com maior facilidade e menor desgaste tanto
para o fisioterapeuta quanto para o paciente. Costuma-se evitar estı́mulos
nos ventres musculares, pois estes podem causar maior alteração do tônus
devido ao estı́mulo aos receptores sensoriais de estiramento. Além disto, o
fisioterapeuta deve tocar o mı́nimo possı́vel o paciente e utilizar a palma
de suas mãos para conduzir o ponto-chave. Evita-se o toque dos dedos,
pois estes podem se tornar estı́mulos excessivos aos receptores sensoriais.
Como o ponto-chave é um local para condução do movimento, também é
inadequado pegar com força, ou agarrar a articulação do paciente, deve-se
permitir liberdade de movimentação.
Quando está muito difı́cil facilitar um movimento por determinado
ponto-chave, deve-se procurar outro ponto mais proximal, e o inverso tam-
bém é verdadeiro. Quanto menor o controle motor e a independência do pa-
ciente, mais proximal deve ser o ponto-chave, pois este permite maior con-
dução pelo fisioterapeuta e menor autonomia do paciente. Porém quanto
mais avançado o controle motor do paciente e maior a sua autonomia, deve-
se utilizar pontos-chave mais distais, até que progressivamente se retire o
suporte ao paciente.
Considera-se como pontos-chave mais proximais a cabeça (Figura 2), o
esterno (Figura 3), o ombro (Figura 4) e o quadril (Figura 5). Os pontos
48 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

mais distais são o cotovelo (Figura 4), o punho (Figura 6), o joelho e o
tornozelo.

Figura 2. Ponto-chave cabeça.

Figura 3. Ponto-chave esterno.


Os pontos-chave de controle viabilizam a execução das técnicas de ini-
bição e facilitação (os PIT), bem como das técnicas de estimulação tátil e
proprioceptivas (tapping, placing e holding).

2.2 Técnicas de inibição e facilitação


As técnicas de inibição e facilitação podem ser compreendidas como os
Padrões Influenciando o Tônus (PIT) (Centro Bobath, 1997; Gusman &
Torre, 2010).
Para Mayston (1995) quando se aplica os PIT pelos pontos-chave de
controle produz-se mudanças no tônus que influenciam o controle postural
e a performance das atividades funcionais. Isto ocorre porque se fornece ali-
nhamento biomecânico adequado, mecanismos de realimentação (feedback )
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 49

e antecipação para o movimento (feed-forward ), e, padrões (normalmente


de extensão, abdução e rotação externa) que estão entre os dois extremos
de flexão e extensão, formando a base para o movimento e para a postura
normal.
Em sı́ntese, estes padrões são utilizados para modificar os padrões anor-
mais de posturas e de movimentos e assim inibir o desenvolvimento da
hipertonia nos pacientes. Eles inibem porque ocorrem em posturas que
não permitem desencadear reflexos patológicos e facilitam porque possibi-
litam o alinhamento biomecânico adequado ao alongamento e à contração

Figura 4. Pontos-chave ombro e cotovelo.

Figura 5. Ponto-chave quadril.


50 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

Figura 6. Ponto-chave punho.

muscular, e também porque influenciam os mecanismos de feedback e feed-


forward.
Os PIT ocorrem pelo manuseio do fisioterapeuta guiando atividades
funcionais, ou por meio de um comando verbal, ou pela demonstração de
uma atividade funcional. Este padrão visa uma inibição combinada com
uma facilitação.
Durante a aplicação de um manuseio de facilitação o objetivo é real-
mente possibilitar ou facilitar a movimentação da criança, por meio dos
pontos-chave de controle.
A inibição, também realizada com manuseios por pontos-chave, é a
habilidade de refrear uma noção em favor de outra. É possı́vel incluir
uma resposta normal do indivı́duo que iniba uma resposta patológica. No
tratamento, busca-se inibir ou refrear uma ação ou situação em que se
encontram padrões anormais de postura ou movimento. Este processo pode
ser executado por meio da inibição dos movimentos ou padrões indesejados,
ou da facilitação de padrões normais que se sobrepõem aos anormais, ou
ainda pela indução do paciente a inibir em si mesmo as alterações na busca
de padrões sensoriomotores mais normalizados (Gusman & Torre, 2010).
Sabe-se que em pacientes com alteração do tônus, da postura e do
movimento, há um desequilı́brio entre a excitação e a inibição sináptica
durante a a fase de planejamento, de programação ou de execução de um
movimento, o que resulta em padrões de movimentos inadequados. Desta
forma, a inibição do padrão motor inadequado é um fator de controle do
movimento e da postura, importante para a seletividade e a graduação da
função, e para o adequado controle motor (velocidade, amplitude e direção
dos movimentos).
Entende-se que inibição e facilitação do movimento podem ser promo-
vidas em conjunto, ou simultaneamente, durante o manuseio do paciente.
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 51

Segundo o Centro Bobath (1997) os PIT são aplicados com o uso das mãos
do fisioterapeuta ou pela alteração na direção das atividades funcionais.
Por exemplo, alcançando para o lado em um padrão de abdução, extensão
e rotação externa, ao invés de alcançar para frente aumentando o tônus
flexor e a rotação interna que favorecem a espasticidade e dificultam os
movimentos livres das mãos.
A união das mãos na linha média ou a cabeça centralizada podem
funcionar como fatores de inibição. A inibição é considerada uma parte
importante do tratamento. A melhor inibição deve ser aquela através de
uma atividade que o próprio paciente execute de maneira mais normal
possı́vel, por si mesmo, e que possibilite iniciar algum movimento funcional
ativamente.
Nas técnicas de facilitação do movimento ativo deve-se saber previ-
amente que tipo de resposta motora se espera do paciente, qual seria a
resposta em uma criança com desenvolvimento tı́pico, bem como experi-
mentar e vivenciar o movimento antes de solicitá-lo. Isto é necessário para
que o fisioterapeuta tenha consciência exata de todos os movimentos que
compõem a atividade solicitada. Também é preciso saber qual o estı́mulo
adequado, qual o local a ser estimulado, e a que velocidade, para que se
obtenha uma resposta adequada (Centro Bobath, 1997).
Na cabeça, manuseios de extensão facilitam a extensão do restante
do corpo, porém deve-se evitá-los se houver presença de atividade reflexa
tônica simétrica ou labirı́ntica. Neste caso um manuseio de extensão de
cabeça causará a extensão exagerada em todo o corpo. Já os manuseios de
flexão da cabeça irão inibir a espasticidade ou os espasmos extensores, po-
rém deve-se analisar se esta postura não aumenta a espasticidade extensora
em membros inferiores pela presença da atividade reflexa tônica simétrica.
Na cintura escapular e nos membros superiores a rotação interna inibe
o espasmo extensor e é boa para atetóides, já a rotação externa inibe a
flexão e é boa para os espásticos. Pode-se associar a abdução horizontal
para inibir a atividade flexora, e, ainda a supinação para facilitar a abdução
do polegar.
Na cintura pélvica e nos membros inferiores a flexão da perna ou a dor-
siflexão dos artelhos, facilitam a abdução, a rotação externa e a dorsifexão.
A rotação externa também auxilia na abdução e na dorsiflexão.
Em prono facilita-se a extensão da coluna e do quadril. No sentado,
em plano inclinado (mais baixo anteriormente) facilita-se a extensão da
coluna. A adução dos membros superiores facilita o controle de cabeça.
O ajoelhado e o em pé são facilitados com a rotação externa e a extensão
de membros superiores em diagonal para trás.
As Figuras 7 a 9, adaptadas de Finnie (2000), apresentam alguns ma-
nuseios de inibição de padrões patológicos e facilitação para que ocorram
movimentos ativos.
52 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

Figura 7. Inibição do padrão de rotação interna e flexão do membro


superior. Adaptado de Finnie (2000).

Figura 8. Facilitação da extensão do quadril e do tronco em pé. Adaptado


de Finnie (2000).

Figura 9. Inibição da rotação interna e da adução do membro inferior.


Adaptado de Finnie (2000).
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 53

2.3 Técnicas de estimulação tátil e proprioceptiva


As técnicas de estimulação aumentam o tônus postural e regulam a ação
conjunta dos músculos agonistas, antagonistas e sinergistas. Elas são muito
úteis em crianças com ataxia, atetoses e hipotonia. Estas técnicas devem
ser utilizadas na espasticidade somente se o tônus postural for baixo e
durante a ausência da atividade reflexa tônica (reflexo tônico cervical si-
métrico, reflexo tônico cervical assimétrico e reflexo tônico labirı́ntico).
A indicação das técnicas de estimulação é especı́fica. Elas devem ser
utilizadas em combinação com os PIT, somente quando e enquanto o tô-
nus postural estiver baixo, e evitando reações associadas e movimentos
involuntários. Estas técnicas são embasadas em estimulação tátil e propri-
oceptiva, analogamente a estimulação proposta por Kabat, com a somação
de estı́mulos por repetição (Centro Bobath, 1997).
A estimulação pode ter origem no corpo ou no ambiente. O Conceito
Neuroevolutivo Bobath considera como técnicas de estimulação a transfe-
rência de peso, o tapping, o placing e o holding.

2.3.1 Transferência de peso


A transferência de peso causa pressão e recrutamento de unidades motoras,
além de seu papel fundamental em liberar os outros segmentos que não
estão sustentando peso para que executem movimentos.
Quando não há transferência de peso, não há movimento. Portanto,
transferir peso é pré-requisito fundamental para a movimentação ativa dos
pacientes, e, esta transferência pode ser facilitada pelos pontos-chave de
controle. Deve-se realizar transferências de peso para os lados, para frente,
para trás e diagonalmente, em várias posições e atividades.
Nos pacientes espásticos estas transferências são realizadas em movi-
mento constante e com grande amplitude. Nos pacientes atáxicos e ate-
tóides a transferência de peso deve ser feita de maneira mais estática, de
forma mais lenta e em pequenas amplitudes (Centro Bobath, 1997).
Um exemplo de transferência de peso pode ser dado imaginando-se um
paciente em pé, e pelo ponto-chave quadril o fisioterapeuta desloca seu peso
em direção lateral, para ser suportado por um membro inferior, e depois
pelo outro. Esta transferência pode ser considerada uma preparação para
a marcha.

2.3.2 Placing, holding e tapping


Placing e holding (colocação e manutenção) são técnicas que envolvem a
habilidade em controlar e manter os movimentos e as posições de forma
automática e voluntária, em toda a amplitude de movimento.
O placing é a habilidade de interromper um movimento em qualquer
amplitude, voluntariamente ou automaticamente. É um auto-ajuste pos-
tural que demanda um ajuste automático dos músculos às mudanças de
postura, o que faz parte do mecanismo de contração postural normal. Uma
54 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

resposta normal ao placing garante a harmonia de um movimento voluntá-


rio. O placing é o auto-ajuste aos movimentos que se objetiva ao final da
terapia. Já o holding é a habilidade de manter o segmento cujo movimento
foi interrompido, na posição em que se colocou este segmento quando se
realizou o placing.
O tapping é uma maneira de se atingir o placing. Esta técnica é um
meio de aumentar o tônus postural pelo estı́mulo tátil e proprioceptivo,
ativar grupos musculares fracos, obter graduação adequada da inervação
recı́proca, estimular as reações de balance (equilı́brio, proteção e retifi-
cação), e promover padrões sinérgicos de movimento (ativação muscular
adequada de agonistas, antagonistas e sinergistas).
A técnica consiste em pequenas batidas sobre segmentos do corpo. Es-
tas batidas podem desencadear uma estimulação tátil e proprioceptiva, ou
uma co-contração, que é a contração simultânea de agonistas antagonistas
e sinergistas que possibilitam movimentos com estabilidade. O objetivo
desta técnica é possibilitar a manutenção automática de uma posição de-
sejada (Gusman & Torre, 2010). Ou seja, chegar ao placing e ao holding.
O tapping é utilizado somente quando o paciente está no melhor alinha-
mento biomecânico possı́vel e em casos de fraqueza de um grupo muscular,
hipotonia global, ou necessidade de aumentar o tônus de atetóides e atáxi-
cos. Não se utiliza o tapping na presença de espasticidade ou espasmos, a
menos que se objetive melhorar as reações de balance para ativar o ajuste
às mudanças de postura.
Em pacientes com muita hipotonia deve-se aplicar um novo tapping
rapidamente, em seguida do anterior, para que haja uma somação de es-
tı́mulos e o efeito não se perca. Assim, inicia-se a aplicação de forma
bastante rápida e quando se percebe as primeiras contrações musculares e
um esboço de manutenção do membro pelo paciente, diminui-se progres-
sivamente a velocidade dos estı́mulos. O paciente é tocado somente por
curto perı́odo de tempo, para que assuma o controle quando estiver sem
apoio (Centro Bobath, 1997).
Há 4 tipos de tapping: de inibição, de pressão, por deslizamento e
alternado. Abaixo se descreve a forma de aplicação de cada um.
O tapping de inibição serve para ativar grupos musculares fracos. Ele
aumenta a função de músculos que não conseguem se contrair porque seus
antagonistas são hipertônicos. Este tipo de tapping é chamado de inibitório
porque inibe a atividade de músculos antagonistas hipertônicos. Antes de
aplicá-lo é necessário reduzir a espasticidade com os PIT. O tapping de
inibição é aplicado com a rápida liberação da parte do corpo que se quer
ativar, seguida de uma contenção imediata (Centro Bobath, 1997).
Um exemplo de tapping de inibição é quando se deseja inibir a atividade
extensora excessiva dos músculos posteriores de tronco e para isto precisa-se
aumentar a atividade dos músculos abdominais. Então se aplica o tapping
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 55

de inibição sobre os músculos abdominais, com uma forte pressão sobre


estes, seguida de rápida liberação (Figura 10).

Figura 10. Exemplo de tapping de inibição.

O tapping de pressão objetiva aumentar o tônus e permitir a susten-


tação de posturas contra a gravidade. Este tapping ocorre através da
co-contração (aproximação de superfı́cies articulares) que ativa simulta-
neamente a contração de músculos agonistas e antagonistas. Ele deve ser
iniciado em uma posição de atividade intermediária entre os músculos ago-
nistas e antagonistas. O tapping de pressão é muito utilizado em atetóides
e atáxicos por terem mobilidade excessiva e tônus flutuante. Na espasti-
cidade, deve ser utilizado com critério para que esta não aumente. Um
exemplo pode ser representado quando se coloca um paciente na posição
sentada e necessita-se que o mesmo mantenha o apoio podal. A Figura 11
apresenta um tapping de pressão em joelho e tornozelo.
O tapping por deslizamento é utilizado para ativar um músculo ou
um grupo muscular deficiente ou inativo. Este tapping inibe um padrão
motor patológico e facilita um padrão motor adequado, pela ativação de
padrões sinérgicos da função muscular desejada. Sua execução ocorre por
meio de um firme deslizamento, com os dedos do terapeuta estendidos,
pelo comprimento do músculo ou dos músculos estimulados. Quanto à
velocidade, um novo tapping deve ser dado quando o paciente começa a
perder o efeito do estı́mulo anterior. Ele pode ser utilizado em posições
56 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

Figura 11. Exemplo de tapping de pressão para dorsiflexão.

necessárias para a estabilidade e a fixação, ou em posições intermediárias


necessárias para que se alcance posições estáveis (Centro Bobath, 1997). A
Figura 12 apresenta um exemplo de tapping para extensão do punho.
O tapping alternado estimula o controle de posições intermediárias,
isto é, a graduação apropriada da inervação recı́proca. Este tapping é
aplicado quando o paciente é capaz de manter uma posição intermediária
de maneira eficaz. Ele é muito útil em atetóides e atáxicos porque melhora
a contração e o relaxamento dos músculos agonistas e antagonistas. Nos
pacientes com espasticidade serve para estimular e regular as reações de
balance (equilı́brio, proteção e retificação). Este tapping ocorre por meio
de um toque suave e que busca desestabilizar uma posição alcançada pelo
paciente. Apresenta-se um exemplo na Figura 13.
Uma possı́vel sequência para a aplicação das técnicas de inibição, faci-
litação e estimulação é o exemplo que segue. Primeiramente executa-se os
PIT, seguido de um tapping de inibição para a redução da espasticidade
e a organização do tônus. Na sequência, aplica-se um tapping de desliza-
mento para ativar o grupo muscular inativo, e segue-se com um tapping
de pressão para a sustentação da postura. A seguir, aplica-se um tapping
alternado para estimular o controle de posições intermediárias e finaliza-se
com o placing e o holding.

3. Metodologia
Nesta seção se descreve as caracterı́sticas e objetivos em cada perfil de paci-
ente e na sequência a metodologia de aplicação do Conceito Neuroevolutivo
Bobath em alguns destes perfis.
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 57

Para Gusman & Torre (2010) na maioria dos casos deve-se utilizar as
técnicas básicas do Conceito, como transferência de peso, mudanças de
postura, tapping, placing e holding.
Como o Conceito é Neuroevolutivo segue-se a sequência do desenvol-
vimento tı́pico tanto durante os atendimentos como nas metas a serem
atingidas em curto e médio prazo. Assim, começa-se em posturas mais
simples e evolui-se para posturas mais complexas e que demandam maior
controle motor. Durante o atendimento a sequência de manuseios obedece
ao sentido céfalo-caudal e inicia-se sempre com os manuseios mais proxi-
mais ou axiais.
Os manuseios devem ser realizados por pontos-chave de controle e em
PIT. Os alongamentos são executados de forma ativa e em contextos fun-
cionais, durante atividades especı́ficas. O uso de recursos como bola, rolo,
mobiliários, andadores e brinquedos deve ser criteriosamente avaliado e
indicado somente se adequado ao perfil do paciente.
Além da capacidade motora, o programa de tratamento também precisa
ser adequado à idade e aos interesses da criança.

3.1 Objetivos nos diferentes perfis dos pacientes


Embora se saiba que a maioria dos pacientes possui caracterı́sticas mis-
tas, devido a sua finalidade didática, este capı́tulo aborda os objetivos e as
sugestões de intervenção para determinados perfis de pacientes. Os paci-
entes foram agrupados de acordo com o tônus em: hipotônicos, espásticos,
flutuantes e atáxicos. Os espásticos foram divididos em quadriparéticos,
diparéticos e hemiparéticos.

Figura 12. Exemplo de tapping de deslizamento.


58 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

Figura 13. Tapping alternado na abdução do membro superior.

3.1.1 Características e objetivos na hipotonia


Na hipotonia, a ativação muscular ocorre por somação de estı́mulos e todos
os tappings são bastante úteis. O paciente hipotônico geralmente possui
acometimento em todos os segmentos corporais e grande dificuldade em
reagir contra a gravidade. Os principais objetivos com este tipo de paciente
são organizar o tônus, prevenir contraturas e deformidades, e estimular a
aquisição das posturas anti-gravitacionais de acordo com a sequência do
desenvolvimento tı́pico.

3.1.2 Características e objetivos na espasticidade


Na hipertonia, devido à mobilidade escassa, deve-se optar por manuseios
de inibição combinados com facilitação, por meio dos PIT.
O paciente com quadriparesia espástica possui acometimento no tronco
e nos quatro membros, porém os membros superiores são mais acometidos.
Além disto, ocorre a presença de reflexos patológicos em muitos casos,
como o reflexo tônico cervical assimétrico e o reflexo tônico labirı́ntico. Os
objetivos nestes casos são organizar o tônus e inibir a atividade reflexa,
promover a simetria corporal, evitar as complicações respiratórias, as con-
traturas e as deformidades, e, se possı́vel, estimular o controle das posturas
do desenvolvimento tı́pico.
Na diparesia espástica o paciente possui os quatro membros e o tronco
acometidos, porém com membros superiores mais funcionais. A atividade
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 59

reflexa predominante na diparesia é o reflexo tônico cervical simétrico.


Neste perfil de paciente os objetivos são organizar o tônus, transferir o
peso e facilitar as mudanças de postura, ganhar mobilidade pélvica, forta-
lecer a musculatura abdominal, inibir as assimetrias e ganhar mobilidade
de tronco.
Na hemiparesia ocorre acometimento principalmente em um hemicorpo
e no tronco, e o membro superior é o segmento mais afetado. Há um
excelente prognóstico de marcha e o cognitivo está preservado. Não há
presença de atividade reflexa que dificulte a terapia, porém deve-se cuidar
com a presença das reações associadas. Como objetivos para este paciente
deve-se organizar o tônus, transferir o peso para o lado afetado, promover
a simetria e fornecer noções de linha média, favorecer a mobilidade e o
controle de tronco, promover a integração bimanual, evitar a instalação de
deformidades, inibir as reações associadas e treinar a marcha.

3.1.3 Características e objetivos nas flutuações


Os discinéticos ou flutuantes possuem como caracterı́sticas o acometimento
global dos quatro membros e tronco, porém os membros superiores são mais
afetados. Além disto, possuem movimentos involuntários, assimetrias e di-
ficuldades em manter a simetria e a linha média. Geralmente, há desordem
postural desencadeada pelo posicionamento da cabeça, e o cognitivo é pre-
servado.
Os objetivos para estes pacientes são organizar o tônus, promover a
estabilidade, estimular o controle de cabeça e de tronco, e evitar as assi-
metrias. Deve-se conter os movimentos involuntários com manuseios que
forneçam estabilidade proximal e movimentos mais controlados. Isto pode
ser alcançado com facilitações e tappings de pressão (co-contração).

3.1.4 Características e objetivos na ataxia


Na ataxia há acometimento dos quatro membros e do tronco, geralmente
o tônus de base é hipotônico e há importantes dificuldades de coordena-
ção e de equilı́brio. Nestes pacientes se tem os objetivos de estimular as
reações de equilı́brio e as transferências, ganhar mobilidade pélvica, rea-
lizar transferências de peso e melhorar a coordenação e a alternância de
movimentos.

3.2 Exemplos de manuseios em pacientes


Esta seção considera três exemplos de pacientes hipotéticos e alguns ma-
nuseios que podem ser utilizados com os mesmos. É muito importante
considerar que o tratamento deve ser individualizado e adequado a cada
paciente. Assim, estas sugestões devem ser adaptadas às necessidades e
interesses de cada criança ou indivı́duo, principalmente no que diz respeito
ao uso de recursos lúdicos que devem estar de acordo com a faixa etária.
60 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

3.2.1 Quadriparesia espástica


Neste primeiro exemplo considera-se um paciente com quadriparesia cujo
tônus apresenta uma espasticidade importante, e na atividade reflexa pos-
sui reflexo tônico cervical assimétrico e reflexo tônico labirı́ntico.
A Figura 3 apresenta uma inibição do reflexo tônico labirı́ntico, em
que uma das mãos do fisioterapeuta utiliza o ponto-chave esterno e a outra
inibe a extensão da cabeça pelo apoio na região occipital. Assim cumpre-se
com o objetivo de inibir a atividade reflexa e promover simetria corporal.
Para organizar o tônus do paciente o mesmo é posicionado em decúbito
lateral, e realiza-se os PIT em sua cintura escapular por meio da circundu-
ção, no sentido da rotação externa (Figura 14).

Figura 14. Organização do tônus em cintura escapular.

Em todos os manuseios deste paciente deve-se cuidar com o posiciona-


mento de sua cabeça. Ele apresenta reflexo tônico labirı́ntico, e este reflexo
é desencadeado pelo posicionamento da cabeça, principalmente a extensão.
Na sequência, enfoca-se o objetivo de evitar os encurtamentos e as con-
traturas. Para que se ganhe extensão de cotovelo, aproveita-se o decúbito
para realizar tapping de inibição (Figura 15) e deslizamento sobre o mús-
culo trı́ceps. Nesta posição ainda é possı́vel trabalhar o alongamento dos
músculos peitorais e todas as amplitudes de movimento para as articulações
de ombro e cotovelo.
Na Figura 16 apresenta-se uma sugestão de manuseio para organizar o
tônus em cintura pélvica. Em decúbito lateral, utilizam-se os pontos-chave
quadril e ombro, e move-se uma cintura em direção oposta a outra, no
sentido ântero-posterior. Nesta mesma postura também é possı́vel alongar
os músculos flexores de quadril, por meio dos pontos-chave de controle.
Para estimular a aquisição de posturas anti-gravitárias, mais especifi-
camente o controle de cabeça e de tronco, evolui-se para a posição sentada,
com o uso de pontos-chave de controle. Nesta posição pode-se trabalhar
a transferência de peso entre membros superiores e inferiores, e a rotação
de tronco (Figura 17). Também é possı́vel realizar alguns manuseios para
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 61

Figura 15. Tapping de inibição para extensão do cotovelo.

Figura 16. Dissociação de cinturas.

membros inferiores, como o tapping de pressão ou a co-contração em jo-


elhos e tornozelos para melhorar o apoio podal (Figura 11). Salienta-se
que o apoio podal adequado é fundamental para o equilı́brio, e a manuten-
ção do equilı́brio em posturas estáveis evita a desorganização do tônus do
paciente.

3.2.2 Diparesia espástica


O segundo exemplo é um paciente com diparesia espástica. Considerando-
se os objetivos expostos com este perfil de paciente (Seção 3.1.2), pode-se
62 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

Figura 17. Transferência de peso e rotação de tronco utilizando


ponto-chave.

iniciar a intervenção com enfoque em organizar o tônus, e simultaneamente


promover o ganho de mobilidade pélvica e estimular a transferência de peso.
A Figura 18 apresenta a facilitação para a aquisição da postura em gatas,
na qual parte-se do sentado de lado e retorna-se a esta posição.
Uma possibilidade de continuidade da intervenção é a solicitação da
rotação ativa do tronco com o objetivo de organizar o tônus, dissociar as
cinturas, ganhar mobilidade de tronco e fortalecer os músculos abdominais.
Para a criança deve-se associar esta solicitação a um contexto funcional,
como colocar ao seu lado um brinquedo de seu interesse.
Para melhorar o controle de tronco, sugere-se o sentado em plano incli-
nado (mais baixo anteriormente). Esta posição, com adequado apoio po-
dal, incentivará a extensão ativa do tronco. Ainda, na diparesia utiliza-se
com sucesso a postura ortostática, se necessário encostado em uma parede.
Nesta postura, o alinhamento biomecânico e a descarga de peso auxiliam
na organização do tônus, na redução do padrão de adução em membros
inferiores e na inibição das assimetrias.
Para treino de marcha utiliza-se a marcha lateral com apoio em uma
barra ou na parede, com o objetivo de estimular a abdução em membros
inferiores e inibir o padrão de adução. Também se deve realizar o treino de
marcha com suporte do fisioterapeuta em pontos-chave cotovelo, ou ombro,
ou quadril, posicionado atrás do paciente.

3.2.3 Sugestões na hemiparesia


Na hemiparesia, para se atingir os objetivos de organizar o tônus e favo-
recer a mobilidade e o controle de tronco deve-se procurar atividades que
envolvam a rotação ativa do tronco, e os manuseios que realizem a disso-
ciação entre as cinturas escapular e pélvica. Uma sugestão é o treino em
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 63

Figura 18. Facilitação do sentado de lado para gatas.

atividades funcionais como retirar a meia de um pé com a mão do lado


oposto.
Para melhorar as reações de balance (equilı́brio, proteção e retificação),
ganhar simetria e evitar a negligência do lado afetado, é muito importante
o trabalho das transferências de peso em posições variadas, associado ao
aumento de estı́mulos pelo lado afetado. Para transferir peso ao mem-
bro inferior afetado, pode-se fazer uso de um degrau sob o outro membro
inferior (Figura 19).
Este degrau pode ser mantido durante a execução de várias atividades,
por exemplo, com uma mesa à frente do paciente em atividades para os
membros superiores na linha média. As atividades em linha média têm o
importante objetivo de promover simetria e realizar a integração bimanual.
As reações de balance (equilı́brio, proteção e retificação) devem ser
treinadas ao se desestabilizar o equilı́brio do paciente nas posições sentada
64 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

Figura 19. Transferência de peso ao membro inferior parético.

e em pé. E a prevenção de encurtamentos deve ser executada por meio de


alongamentos funcionais, durante as atividades propostas.
Com estes pacientes, ainda é preciso inibir a ocorrência de reações asso-
ciadas, que são caracterizadas pela desorganização do tônus no lado afetado
durante a execução de atividades. Para tal, não se pode exigir mais que
o controle motor do paciente permite, nem submetê-lo a atividades em
superfı́cies muito instáveis que perturbem demais o seu equilı́brio.
Como neste perfil funcional tem-se excelente prognóstico de marcha,
deve-se utilizar estratégias para treinar a sua deambulação. A condução
do paciente, quando necessária, é feita pelos pontos-chave e com o fisiote-
rapeuta atrás do mesmo.
Quando são necessários treinos mais refinados para adequar compri-
mento, altura, largura e tempo dos passos e da passada, pode-se executar
alguns exercı́cios como: caminhar sobre uma linha reta, caminhar encos-
tando o calcâneo de um pé nos artelhos do outro, caminhar como Chaplin,
em rotação externa de membro inferior, encostando o calcâneo de um pé
na borda medial do outro, caminhar de costas, e caminhar ultrapassando
obstáculos.

4. Discussão
Nesta seção apresenta-se os resultados de alguns estudos que utilizaram o
Conceito Neuroevolutivo Bobath em intervenção com pacientes.
No que diz respeito a terapia com perfis funcionais especı́ficos de pa-
cientes a literatura disponı́vel recente traz vários estudos com enfoque na
hemiparesia. Pomeroy & Tallis (2002) investigaram a reabilitação funcional
Abordagem fisioterapêutica pelo conceito neuroevolutivo Bobath 65

em pacientes com acidente vascular encefálico e relataram que a interven-


ção pelo Conceito Bobath tem relevância neurofisiológica e influencia os
mecanismos de neuroplasticidade. Porém sugere-se mais estudos cientı́fi-
cos para comprovar a eficiência da abordagem. Estes autores relatam a
escassez de embasamento teórico e cientı́fico sobre o Conceito.
Hesse et al. (1998) investigaram os efeitos do treino de marcha pelo
Conceito Bobath em indivı́duos hemiparéticos e observaram melhora na
transferência e na sustentação de peso, além de aumento na velocidade
da marcha. Hesse et al. (1993) analisaram a simetria da marcha de 40
crianças antes e após o tratamento pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath
e constataram ganhos de velocidade máxima e de velocidade de subida.
Bütefisch et al. (1995) analisaram os efeitos da intervenção com Bobath
nas habilidades motoras manuais de vinte e sete hemiparéticos e constata-
ram melhoras porém não significativas. Edwards et al. (1990) propuseram
um protocolo para reabilitação do ombro hemiparético e verificaram que a
intervenção combinada com Bobath e crioterapia é eficiente.
As intervenções conjugando mais de uma técnica também são frequen-
temente relatadas na literatura. Wu et al. (2007) analisaram os efeitos da
terapia combinando o Método Vojta e o Conceito Bobath e como resulta-
dos verificaram que as crianças participantes, cujo perfil era de alto risco
para atraso, desenvolveram muito bem suas habilidades motoras, sociais,
inteligência e fala.
Li et al. (2007a) analisaram os efeitos de baclofem e terapia neuroe-
volutiva em pacientes com espasmos e verificaram significativa melhora se
comparado a pacientes que utilizam somente a terapia medicamentosa. Li
et al. (2007b) utilizaram o Conceito Bobath, o método Vojta e a acupun-
tura em cento e trinta e oito crianças com Paralisia Cerebral e observaram
melhores resultados quanto mais jovens e menos acometidas eram as cri-
anças.
Lettinga et al. (1997) buscaram comparar qualitativamente os efeitos
das abordagens Bobath e Brunnstrom e verificaram que ambas são eficien-
tes, porém possuem objetivos diferenciados e, consequentemente os resul-
tados atingidos também são diferentes e de difı́cil análise.
Nos poucos estudos sistemáticos disponı́veis utilizando-se o Conceito
Neuroevolutivo Bobath como forma de intervenção terapêutica percebe-se
que há uma tendência para a focalização e a análise de segmentos corporais
isolados. As análises globais e em contextos funcionais ainda são pouco
realizadas.

5. Conclusões
Este capı́tulo teve como objetivo principal desenvolver um material de
apoio para o estudo, a aplicação e a divulgação do Conceito Neuroevo-
lutivo Bobath em fisioterapia neuropediátrica, em lı́ngua portuguesa. No
66 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

entanto, compreende-se que este é um conteúdo introdutório e que deve


ser complementado com outras fontes de conhecimento, tais como os cur-
sos especı́ficos sobre o Conceito.
Conforme relatos da literatura esta abordagem pode ser considerada
uma das mais importantes formas de intervenção em fisioterapia em neu-
ropediatria. Porém, os relatos sobre sua forma de utilização e sobre estudos
cientı́ficos que comprovem a sua eficiência ainda são escassos, mesmo em
outros idiomas. Desta forma abre-se importante oportunidade e necessi-
dade de trabalhos futuros relativos a este tema.
Como considerações finais, talvez a mais importante seja o papel fun-
damental de Berta Bobath no desenvolvimento deste Conceito. Ela viveu
em uma época de pequeno conhecimento sobre Neurociências, e mesmo
assim realizou muitas descobertas e acrescentou grande contribuição para
a atuação da fisioterapia em neurologia e neuropediatria.

Agradecimentos
Agradecemos ao bebê Bento Straub Perlin e a seus pais Michele e Hugo que
tão pacienciosamente contribuı́ram com as fotos para ilustrar este capı́tulo.

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68 Castilho-Weinert & Forti-Bellani

Notas Biográficas
Luciana Vieira Castilho-Weinert é Fisioterapeuta (PUC-PR, 2003), Espe-
cialista em Fisiologia Humana e da Nutrição (PUC-PR, 2006), Mestre e Doutor
em Ciências – Engenharia Biomédica (UTFPR, 2004 e 2010, respectivamente)
e tem formação pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é Professor
Adjunto da UFPR – Setor Litoral, no Curso de Fisioterapia.

Claudia Diehl Forti-Bellani é Fisioterapeuta (ULBRA-RS, 2001), Mestre em


Ciências Biológicas – Neurociências (UFRGS, 2005) e tem formação pelo Conceito
Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é coordenadora e docente do Curso de Pós-
Graduação Lato Sensu em Neurologia com ênfase em Neuropediatria do IBRATE.
Capítulo 4

Alcance Manual em Lactentes Típicos

Aline Martins de Toledo, Eloísa Tudella∗

Resumo: O alcance manual é uma importante habilidade motora,


pois sua emergência é uma das primeiras fases do desenvolvimento
motor voluntário durante a infância. Identificar precocemente quais-
quer desvios na aquisição ou aprimoramento do alcance manual em
lactentes é extremamente importante, pois tais desvios podem es-
tar relacionados com disfunções futuras do desenvolvimento infantil.
Desta forma, este capı́tulo tem como objetivos mostrar como ocorre
o alcance manual em lactentes tı́picos, as variáveis utilizadas para a
avaliação desta habilidade, os fatores que influenciam o seu desen-
volvimento e suas implicações terapêuticas.

Palavras-chave: Alcance manual, Lactentes, Desenvolvimento


motor, Avaliação e intervenção fisioterapêutica.

Abstract: The reaching behavior is an important motor skill, be-


cause its emergence is one of the first stages of voluntary motor de-
velopment during childhood. The early identification of deviations
in the acquisition or improvement of reaching behavior in infants
is extremely important, because such deviations may be related to
future dysfunctions of the child development. Thus, the objective of
this chapter is to show how the reaching behavior takes place in ty-
pical infants, the variables used to evaluate this ability, the factors
that influence their development and their therapeutic implications.

Keywords: Reaching behavior, Infants, Motor development, Phy-


siotherapeutic assessment and intervention.

∗ Autor para contato: tudella@terra.com.br


Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2
70 Toledo & Tudella

1. Introdução
Quem não se encanta ao olhar para um bebê e ver seu interesse quando
busca um objeto que lhe é mostrado ? Desde muito cedo no desenvolvi-
mento os lactentes se vislumbram por objetos que estão ao seu redor e
tentam alcançá-lo.
Os movimentos iniciais dos membros superiores proporcionam as expe-
riências sensório-motoras pelas quais as crianças aprendem primeiramente
o controle neuromotor necessário para que o contato com os objetos visu-
alizados possa ser realizado (Thelen et al., 1993). Os lactentes aprendem
sobre as relações entre o movimento e a propriocepção, explorando suas
próprias ações, pela movimentação dos membros superiores (Piaget, 1953).
O alcance manual ocorre consequentemente a movimentação espontâ-
nea dos membros superiores. Os lactentes aprendem a controlar e a mo-
dular seu padrão de movimento por meio do alcance (Corbetta, 1998). O
alcance possibilita as primeiras explorações e manipulações no ambiente,
contribuindo amplamente para o desenvolvimento motor (Corbetta & Bo-
jezyk, 2002), social (Fogel et al., 1992), perceptual (Corbetta et al., 2000)
e cognitivo (Thelen et al., 2001).
Identificar precocemente quaisquer desvios na aquisição ou no apri-
moramento do alcance manual em lactentes é extremamente importante.
Tais desvios podem estar relacionados com disfunções futuras do desen-
volvimento infantil. Desta forma, o presente capı́tulo tem como objetivos
demonstrar como ocorre o alcance manual em lactentes tı́picos, quais são
as variáveis utilizadas para a avaliação desta habilidade, os fatores que
influenciam o seu desenvolvimento e suas implicações terapêuticas.

2. Fundamentação Teórica
O alcance manual é definido como o movimento do membro superior em
direção a um objeto (Thelen et al., 1996) e está entre uma das demons-
trações mais precoces de integração entre os diferentes sistemas motores e
perceptuais. Esta é uma importante habilidade motora, pois sua emergên-
cia é uma das primeiras fases do desenvolvimento motor voluntário durante
a infância (Fallang et al., 2003).
Quando se observa um lactente alcançando e apreendendo um objeto
não se imagina como este movimento é complexo e quantas variáveis estão
envolvidas para que isto aconteça.
Para que os objetos sejam alcançados e apreendidos com precisão vários
tipos de ajustes no movimento dos membros superiores devem ocorrer.
Dentre estes ajustes destacam-se aqueles relacionados a análise cinemática
do movimento (variáveis contı́nuas) e aos ajustes proximais e distais do
alcance (variáveis categóricas).
Alcance manual em lactentes típicos 71

2.1 Variáveis contínuas


A análise cinemática ocorre por meio da reconstrução tridimensional do
movimento pelo deslocamento das marcas afixadas nos centros articulares
dos membros superiores. O sistema de análise tridimensional oferece as
coordenadas X, Y e Z das marcas afixadas em cada quadro do movimento
capturado.
Por meio desta reconstrução tridimensional é possı́vel analisar, dentre
outras, as seguintes variáveis contı́nuas do alcance:
• Índice de retidão: obtido pela razão entre a distância percorrida pela
mão e a menor distância que poderia ser percorrida nesta trajetória.
Quanto mais próximo de um for o ı́ndice, mais próximo de um seg-
mento será sido a trajetória (Thelen et al., 1996; Toledo & Tudella,
2008), o que indica que o lactente realiza o movimento na menor
trajetória possı́vel (Figura 1);
• Velocidade média: obtida pela razão entre a distância percorrida e o
tempo gasto ao longo do movimento (Mathew & Cook, 1990);
• Unidade de movimento: definida como a velocidade máxima entre
duas velocidades mı́nimas, sendo a diferença maior que um centı́me-
tro por segundo (Thelen et al., 1996). A velocidade é obtida pela
norma do vetor, calculada pela raiz quadrada da soma dos quadrados
do vetor velocidade em X, Y e Z (Figura 2);
• Índice de ajuste: calculado pela razão entre o tempo após o pico de
velocidade e a duração do alcance. Indica a proporção de tempo que
foi necessário para desacelerar o movimento do braço até que a mão
tocasse o objeto (Toledo & Tudella, 2008). Quanto maior o ı́ndice de
ajuste, maior o tempo gasto para desacelerar o movimento do braço;
• Velocidade final: indica a velocidade da mão no momento em que o
lactente toca o objeto (Toledo & Tudella, 2008).

2.2 Variáveis categóricas


A análise das variáveis categóricas ocorre por meio da observação visual do
comportamento do alcance. O observador analisa qualitativamente como o
movimento acontece. Dentre as variáveis categóricas do alcance, destacam-
se:
• Ajustes proximais: considerados como a iniciativa de direcionar um
ou ambos os membros superiores ao alvo apresentado. Os ajustes
proximais podem ser classificados como:
a) Alcance unimanual: ocorre quando o lactente desloca somente
um dos membros superiores em direção ao alvo (Corbetta et al.,
2000), ou quando ambos os membros saem em direção ao ob-
jeto com uma diferença superior à vinte quadros do inı́cio do
72 Toledo & Tudella

(a)

(b)
Figura 1. Trajetórias aos 4 (a) e aos 6 (b) meses de vida. Adaptado de
Rocha et al. (2006).

movimento de um membro para o outro (Toledo et al., 2011).


Considera-se ainda um ajuste unimanual quando um dos mem-
bros superiores realiza o alcance do objeto e o outro fica parado
ou produzindo pequenos movimentos que não são orientados ao
objeto (Corbetta & Thelen, 1996) (Figura 3(a));
b) Alcance bimanual: ocorre quando o lactente estende simultanea-
mente os membros superiores em direção ao alvo (Corbetta et al.,
2000), ou quando os membros superiores saem da posição inicial
com um atraso de uma mão em relação à outra igual ou inferior
a vinte quadros (Toledo et al., 2011). Além disto, as mãos devem
se deslocar simultaneamente até pelo menos a metade do arco de
Alcance manual em lactentes típicos 73

Figura 2. Unidades de Movimento (UM) aos 4 meses (à esquerda) e aos 6


meses (à direita). Adaptado de Rocha (2006).

movimento (50% da trajetória). O toque pode ser com ambas as


mãos simultaneamente, ou iniciado por apenas uma (Figura 3(b)).
• Ajustes distais: considerados como os ajustes realizados pelas mãos
e pelos dedos durante a trajetória do movimento. Os ajustes distais
são divididos em:
a) Orientações da palma da mão: diz respeito ao posicionamento da
mão no momento do toque do objeto e da preensão. Considera-
se como toque o primeiro sinal de deslocamento do objeto, ou
quando ocorre a deformação deste (como em objetos de látex).
A preensão é considerada quando os dedos fletem e agarraram o
objeto, e pode ser classificada como: horizontal quando o ante-
braço está em pronação com a palma da mão voltada para baixo,
vertical quando o antebraço está em posição neutra e a palma da
mão orientada para a linha média do corpo do lactente, e, oblı́qua
quando a mão está em posição intermediária em relação à vertical
e à horizontal (Fagard, 2000; Toledo et al., 2011) (Figura 4);
b) Abertura da mão: diz respeito à posição dos dedos no inı́cio e no
momento do toque do objeto. Pode ser classificada como: mão
aberta quando as articulações metacarpofalangeanas e interfalan-
geanas estão estendidas, mão fechada quando as articulações me-
tacarpofalangeanas e interfalangeanas estão fletidas, e, mão semi-
aberta quando somente as articulações metacarpofalangeanas ou
somente interfalangeanas estão fletidas (independentemente do
grau de flexão) (Toledo et al., 2011) (Figura 5).
• Preensão: classificada em preensão com sucesso quando o lactente
consegue tocar e apreender o objeto ou parte dele com uma ou ambas
as mãos, e em preensão sem sucesso quando consegue tocar o objeto
sem apreendê-lo (Fagard, 2000; Toledo & Tudella, 2008);
74 Toledo & Tudella

• Lateralidade: classificado em mão direita quando o lactente toca o


objeto com a mão esta mão, e mão esquerda quando o toca com a
mão esquerda (Figura 6).

(a) (b)
Figura 3. (a) Alcance unimanual, (b) alcance bimanual.

3. Métodos
Os dados apresentados no presente capı́tulo foram compilados das bases
de dados eletrônicas MEDLINE, SciELO e LILACS, assim como de teses e
dissertações disponı́veis nas Bibliotecas Virtuais das universidades federais
brasileiras. Buscou-se principalmente por publicações realizadas a partir
do ano de 1995.

4. Resultados e Discussão
Os resultados deste estudo se embasam na discussão sobre o desenvolvi-
mento do alcance e os fatores que o influenciam.

4.1 Desenvolvimento do alcance


É surpreendente notar a mudança que ocorre na trajetória da mão do
lactente em direção ao objeto quando esta habilidade se inicia e com o
passar dos meses.
Os primeiros movimentos de alcance ocorrem por volta dos três e quatro
meses de idade. Porém, alguns estudos demonstraram que os lactentes
apresentam uma movimentação dos membros superiores antes desta idade,
Alcance manual em lactentes típicos 75

(a) (b)

(c)
Figura 4. Mão verticalizada (a), horizontalizada (b) e oblı́qua (c).
76 Toledo & Tudella

(a) (b)

(c)
Figura 5. Mão aberta (a), semi-aberta (b) e fechada (c).
Alcance manual em lactentes típicos 77

(a) (b)
Figura 6. Alcance com a mão direita (a) e esquerda (b).

os movimentos pré-alcances (Ennouri & Bloch, 1996). O número de pré-


alcances diminui por volta do segundo mês de vida e volta a aumentar no
terceiro mês (Trevarthen et al., 1981). Segundo Brandão (1992) o alcance
inicia seu desenvolvimento entre o final do segundo e o inı́cio do terceiro
mês de vida do lactente, e completa-se no final do quarto mês. Entre as
idades de quatro e cinco meses o alcance torna-se bem sucedido (van der
Fits et al., 1999a).

4.2 Fatores que influenciam a aquisição e desenvolvimento do al-


cance
O aprendizado do movimento de alcance possui uma grande complexidade
biomecânica e neural. O lactente deve posicionar sua mão e visualizar o
alvo especı́fico em um espaço tridimensional. A trajetória do movimento
de alcance deve ser produzida por uma atividade muscular que suporte a
gravidade e gere forças necessárias para mover a mão ao alvo (Thelen &
Spencer, 1998).
Funcionalmente, as crianças enfrentam dois problemas no desenvolvi-
mento do alcance. Primeiro, precisam transportar a mão para alcançar
o alvo com sucesso. Em seguida, devem ajustar a mão ao objeto com a
finalidade de realizar uma preensão. Ambos os problemas são complexos
devido à dinâmica que o braço deve adquirir e pela imaturidade relativa
do sistema neuromuscular infantil. Frente a estes problemas os lactentes
encontram soluções por meio de uma busca interativa com o meio em um
processo de descobertas (Bertheir et al., 1999).
78 Toledo & Tudella

Outro fator importante envolvido no desenvolvimento do alcance refere-


se ao controle postural. Segundo van der Fits et al. (1999a) e van der
Fits & Hadders-Algra (1998) o controle postural é um pré-requisito para a
performance acurada dos movimentos de alcance mais fluente e maduro.
Além desta complexidade que envolve o movimento direcionado dos
membros superiores ao alvo, vários outros fatores influenciam e modificam
a trajetória do alcance em lactentes. Dentre estes, destacam-se as restrições
intrı́nsecas e as extrı́nsecas.

4.2.1 Restrições intrínsecas


Com relação às restrições intrı́nsecas observa-se a influência da idade do
lactente (Toledo & Tudella, 2008; Thelen et al., 1993; Rocha et al., 2006) e
das alterações orgânicas, como a prematuridade (Toledo & Tudella, 2008;
Fallang et al., 2003).

4.2.1.1 Idade
A influência da idade refere-se a como ocorre a mudança nas caracterı́sticas
do alcance ao longo do tempo.
Na fase inicial, entre três e quatro meses, os movimentos de alcance
são tortuosos e não direcionados ao alvo, possuem uma trajetória sinuosa
e são compostos por diversas frações de aceleração e desaceleração do mo-
vimento (von Hofsten, 1991). Além disto, o perfil da velocidade não está
bem definido. Há variabilidade dos ajustes realizados durante a trajetória
do movimento, até que um padrão de resposta predomine, com base na
aprendizagem e nas repetições do movimento (Fagard & Lockman, 2005).
Após a realização consistente dos primeiros alcances, os lactentes mo-
dificam a maneira de realizar este movimento. Isto envolve mudanças com-
plexas em vários aspectos do movimento e da postura. Ao longo dos meses,
os movimentos de alcance tornam-se mais regulares e suaves, com trajetória
mais retilı́nea (von Hofsten, 1991; van der Heide et al., 2003). A orienta-
ção da mão para a realização da apreensão passa a ser predominantemente
vertical (Fagard, 2000) e a frequência de apreensão dos objetos aumenta
(Toledo et al., 2011).
Aos seis meses de idade, os lactentes parecem ajustar o movimento de
alcance de acordo com a percepção espacial e as caracterı́sticas fı́sicas do
objeto, tais como: o tamanho, a maleabilidade (von Hofsten & Rönnqvist,
1988; Rocha et al., 2006), a orientação espacial (Lockman et al., 1984) e a
distância (Mackenzie et al., 1993). Nesta idade, o movimento de alcance dos
lactentes ocorre por diferentes atrações, de acordo com as caracterı́sticas
do objeto. Isto demonstra o planejamento e a preparação para realização
do alcance precoce.
Apesar da notável diferença entre o alcance que ocorre por volta dos
três a quatro meses e aquele que ocorre aos seis meses, no perı́odo entre
cinco e sete meses parece não haver tantas alterações nas caracterı́sticas
Alcance manual em lactentes típicos 79

cinemáticas do alcance na postura sentada, em lactentes a termo. Toledo &


Tudella (2008) verificaram que o ı́ndice de retidão, a velocidade média, as
unidades de movimento, o ı́ndice de ajuste e a velocidade final são variáveis
que permanecem inalteradas nesta faixa etária. Esta constância relativa
parece indicar que os lactentes selecionaram um padrão adaptativo no al-
cance e que as grandes modificações nos parâmetros do alcance ocorrem
quando se considera o quarto mês de idade com os meses subsequentes (To-
ledo & Tudella, 2008). Desta forma, parece que o quarto mês representa
um marco no desenvolvimento do alcance de lactentes a termo. Nas idades
de cinco a sete meses inicia-se uma fase de estabilidade em que os lactentes
selecionam um padrão mais adaptativo.
Apesar desta constância nas caracterı́sticas cinemáticas do alcance nas
idades de cinco a sete meses, Toledo et al. (2011) identificaram que as va-
riáveis categóricas continuam em constante modificação. A frequência dos
alcances unimanuais torna-se maior que a dos bimanuais, e a frequência
de orientação vertical da mão e de mão aberta aumentam significativa-
mente ao longo dos meses analisados. Além disto, também há aumento na
frequência de preensão com sucesso.
De acordo com Rocha et al. (2006) a constância de certas variáveis
e a variância em outras pode ser atribuı́da ao fato dos lactentes estarem
aprendendo a dominar suas forças biomecânicas e neurais para controlar
os seus movimentos.
Por volta do oitavo e do nono mês de idade, a trajetória da mão torna-se
mais retilı́nea e suave e a alta variabilidade dos alcances precoces é reduzida
(Konczak & Dichgans, 1997; Thelen et al., 1996).

4.2.1.2 Prematuridade
A prematuridade ganhou destaque entre as populações de risco estudadas
na área da pediatria, devido ao aumento da sobrevida destes lactentes e ao
risco de apresentarem atrasos no desenvolvimento motor. No entanto, há
poucos estudos na literatura relacionados ao desenvolvimento do alcance
no lactente pré-termo.
Alguns estudos relacionam a verificação dos ajustes posturais durante o
alcance em lactentes prematuros (Fallang et al., 2003; van der Heide et al.,
2004). Este interesse ocorre porque um bom controle postural é um pré-
requisito para a coordenação adequada das mãos, que pode, por exemplo,
ser necessária para uma boa habilidade no ato de escrever (Von Hofsten,
1993). No estudo realizado por van der Fits et al. (1999b) verificou-se
que lactentes pré-termo nas idades de três a dezoito meses apresentaram
disfunção na capacidade de modular a atividade postural.
As diferenças relacionadas ao movimento de alcance e ao ato de agarrar
entre lactentes a termo e pré-termo foram demonstradas por Gorga et al.
(1988). Neste estudo, os autores verificaram que a qualidade nos com-
portamentos de alcançar e agarrar eram menos satisfatórias nos lactentes
80 Toledo & Tudella

prematuros. Plantinga et al. (1997) mostraram que os prematuros de baixo


risco apresentam menor qualidade na função das mãos, principalmente em
relação a coordenação entre os músculos flexores e extensores dos dedos e
a antecipação para agarrar o objeto.
Em um estudo longitudinal com lactentes pré-termo de alto e de baixo
risco e a termo, Fallang et al. (2003) observaram que aos quatro meses os
lactentes pré-termo de baixo risco apresentam uma trajetória mais fluente e
mais veloz que os lactentes a termo. Os autores relacionaram este compor-
tamento motor melhor ao desenvolvimento e comportamento motor geral
melhor durante o primeiro ano de vida, devido a vantagens pela experiência
precoce de vida extra-uterina. No entanto, aos seis meses esta vantagem
desaparece. Assim, os autores concluı́ram que o lactente pré-termo de
baixo risco pode possuir uma aceleração temporária no desenvolvimento
do alcance.
Toledo & Tudella (2008) realizaram um estudo comparativo entre os
lactentes a termo e pré-termo com idade corrigida na faixa etária de cinco
a sete meses de idade. Neste estudo verificaram que os lactentes pré-termo
apresentam-se mais lentos em determinadas variáveis cinemáticas. Os pre-
maturos precisam controlar os parâmetros da velocidade por meio de uma
estratégia diferente para alcançar e apreender o objeto. Os autores não
consideraram que o desenvolvimento dos prematuros seja menos satisfató-
rio que o dos lactentes a termo, pois os prematuros conseguiram realizar a
função. No entanto, sugerem mais estudos de seguimento destes lactentes
para verificar se a velocidade mais lenta nesta faixa etária pode indicar
alguma anormalidade em idades mais tardias.
Toledo et al. (2011) verificaram que as variáveis categóricas dos lacten-
tes pré-termo apresentam maior frequência de mão aberta aos seis meses
quando comparado ao a termo.

4.2.2 Restrições extrínsecas


Verifica-se que as seguintes restrições extrı́nsecas influenciam o alcance ma-
nual: as propriedades fı́sicas dos objetos (Rocha et al., 2006), a postura
corporal (Carvalho et al., 2007) e o peso adicional (Out et al., 1997; Rocha
et al., 2009).

4.2.2.1 Propriedades físicas dos objetos


As propriedades fı́sicas dos objetos referem-se as caracterı́sticas que podem
influenciar e modificar os ajustes realizados pelo lactente ao alcançar um
objeto. Dentre as propriedades fı́sicas do objeto destacam-se o tamanho e
a textura.
O tamanho é analisado ao se verificar como os lactentes ajustam seus
movimentos frente a um objeto grande e a um objeto pequeno. A tex-
tura pode ser analisada com o alcance frente a objetos de textura rı́gida e
maleável.
Alcance manual em lactentes típicos 81

Rocha et al. (2006) analisaram a influência do tamanho e da textura do


objeto no comportamento do alcance de lactentes de quatro a seis meses de
vida. Nas variáveis cinemáticas houve aumento no número de unidades de
movimento quando os lactentes alcançaram o objeto pequeno. Discute-se
que os lactentes modificaram seus movimentos para se adaptar as deman-
das da tarefa, o que indica flexibilidade em suas ações. Além disto, o objeto
pequeno requer maior controle na trajetória do braço e os lactentes foram
capazes de perceber as mudanças no tamanho e ajustar suas trajetórias
para manter a acurácia do movimento e alcançar os objetivos. Nas variá-
veis categóricas os autores verificaram que os lactentes desta faixa etária
realizam alcance dos objetos grandes com a mão verticalizada e aberta, e
que há maior sucesso na preensão de objetos maleáveis, independente do
tamanho. Conclui-se que os lactentes guiaram seus movimentos a partir
da informação visual do tamanho e da textura dos objetos.
Rocha et al. (2006) demonstraram que nas idades de seis a oito meses
e trinta e seis meses, os lactentes realizam mais alcances unimanuais para
os objetos pequenos e utilizam mais a mão aberta para os objetos rı́gidos
grandes. Tais resultados demonstram que em idades posteriores os lacten-
tes continuam ajustando e refinando seus movimentos frente de acordo com
as propriedades dos objetos.

4.2.2.2 Postura corporal


A postura corporal refere-se a posição que o lactente está quando alcança
o objeto. Grande parte dos estudos avalia as diferenças encontradas no
alcance quando os lactentes estão sentados ou em supino.
Carvalho et al. (2007) observaram que, aos quatro meses de idade, na
postura sentada os lactentes apresentam maior frequência de alcances, com
menor duração e tempo de desaceleração da mão que na postura supina,
o que indica um melhor padrão de movimento. Os autores argumentam
que assim que os lactentes aprendem a alcançar os objetos, eles enfrentam
dois problemas centrais: a tendência do membro superior em oscilar (Out
et al., 1997) e a produção da quantidade necessária de torque na presença de
torques externos desconhecidos, como a gravidade (Konczak & Dichgans,
1997). Estes problemas aumentam quando o lactente está em supino devido
ao maior torque muscular necessário no inı́cio do movimento e também
porque a gravidade amplifica a oscilação do braço nesta posição. Com isto,
os lactentes precisam desenvolver estratégias para resolver tais restrições.

4.2.2.3 Peso adicional


O uso do peso adicional é explorado em diferentes habilidades motoras,
como o chute (Chen et al., 2002; Landgraf & Tudella, 2008), a marcha
(Adolph & Avolio, 2000) os movimentos de fidgety (movimentos circula-
res de pequena amplitude observados nos membros) (Dibiasi & Einspieler,
82 Toledo & Tudella

2004) e o alcance (Rocha et al., 2009; van der Fits & Hadders-Algra, 1998;
Out et al., 1997).
Apesar do crescente interesse nos efeitos do peso nas diferentes habili-
dades motoras de lactentes saudáveis, ainda não há um consenso sobre o
seu real efeito. Chen et al. (2002) relatam que o peso altera a frequência de
chutes. Out et al. (1997) referem que o peso aumenta a velocidade média e
diminui o número de unidades de movimento do alcance, levando a um mo-
vimento mais fluente e proporcionando um acoplamento entre os membros
superiores em alcances bimanuais (Rocha et al., 2009) em lactentes a termo
saudáveis. Os estudos atribuem tais resultados, em parte, ao aumento da
propriocepção e a ativação neural causados pelo peso. Por outro lado, há
evidências de que os movimentos fidgety (Dibiasi & Einspieler, 2004), a
amplitude da angulação de joelho e do quadril, a velocidade de pico du-
rante os movimento de chutes (Vaal et al., 2002) e a velocidade média do
membro superior durante o alcance (van der Fits & Hadders-Algra, 1998)
não são alteradas pelo peso adicional. Tais controvérsias acontecem, pro-
vavelmente, pelos diferentes objetivos, metodologias, quantidades de peso
e variáveis empregados em cada estudo.

5. Considerações Finais
Os resultados dos estudos discutidos neste capı́tulo podem auxiliar os te-
rapeutas no momento da avaliação e da intervenção com lactentes de risco.
É importante conhecer as fases do alcance em lactentes de risco no intuito
de detectar precocemente possı́veis alterações nesta habilidade. Além do
conhecimento das etapas do desenvolvimento do alcance, é importante ava-
liar a qualidade do movimento, analisando as caracterı́sticas de seus ajustes
proximais e distais, a preensão do objeto, a velocidade, a precisão e a fluên-
cia.
Durante a intervenção é importante que o fisioterapeuta estimule a
ocorrência do alcance de forma que o lactente apresente diferentes ampli-
tudes articulares, velocidades e direções de movimento. Isto proporciona
o aprendizado do controle dos movimentos. Ainda, deve-se considerar que
a postura sentada favorece o movimento dos membros superiores e faci-
lita o alcance e a apreensão do objeto, os objetos pequenos favorecem a
diminuição das unidades de movimento e os alcances unimanuais, e os ob-
jetos grandes favorecem a mão aberta e verticalizada. Além da postura e
do objeto, pode-se considerar a possibilidade de utilizar peso adicional no
punho para aumentar a velocidade média do braço, diminuir o número de
unidades de movimento e proporcionar um acoplamento entre os membros
superiores em alcances bimanuais.
O alcance manual é uma das primeiras fases do desenvolvimento vo-
luntário do lactente e por meio desta habilidade é possı́vel verificar como
o lactente se relaciona com o ambiente. A falta de habilidade no alcance
Alcance manual em lactentes típicos 83

pode estar relacionada com disfunções futuras do desenvolvimento infantil.


Isto reitera a importância de se conhecer e saber identificar anormalida-
des nas variáveis relacionadas a esta habilidade para prevenir até mesmo
atrasos globais no desenvolvimento.

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Notas Biográficas

Aline Martins de Toledo é Fisioterapeuta (Faculdades Integradas de Santa


Fé, 2003), Especialista em Intervenção em Neuropediatria (UFSCar, 2005),
Especialista em Ativação em Processos de Mudança na Formação Superior
(FIOCRUZ, 2011), Mestre e Doutor em Fisioterapia (UFSCar, 2007 e 2011,
respectivamente). Atualmente é Professor Adjunto da UFMS, Centro de Ciências
Biológicas e da Saúde.

Eloisa Tudella é Educadora Fı́sica (PUCCamp, 1976), Fisioterapeuta (PUC-


Camp, 1977), Especialista em Análise e Programação do Ensino (UFSCar, 1982),
Mestre em Educação Fı́sica (UGF, 1989) e Doutor em Psicologia – Psicologia
Experimental (USP, 1996). Atualmente é Professor Associado da UFSCar,
Departamento de Fisioterapia.
Capítulo 5

Função do Membro Superior em Crianças com Paralisia


Cerebral e o Uso de Tarefas Direcionadas

Sheila Schneiberg∗, Felicia Cosentino

Resumo: A terapia por tarefas direcionadas utiliza atividades que


focalizam nos déficits principais da criança, baseadas na biomecâ-
nica do movimento, nos princı́pios de aprendizagem motora, nos
fatores ambientais e nos contextos pessoais. Este estudo investigou
o efeito de um protocolo inovador de terapia por tarefas direcionadas
em um ambiente padronizado que inclui atividades com realidade
virtual no aumento da função do membro superior em um grupo
de onze crianças com paralisia cerebral, com idade entre seis e onze
anos. Foram usadas escalas que investigam a independência funci-
onal, a satisfação e a colaboração. A maioria das crianças (60%)
que participaram deste estudo melhorou a independência funcional,
mostraram plena satisfação com o protocolo de intervenção e coo-
peraram na maior parte dos quinze atendimentos.

Palavras-chave: Tarefas direcionadas, Membro superior, Paralisia


cerebral, Independência funcional.

Abstract: The task oriented therapy consists of activities that con-


cern with children’s deficits. These activities are based on the bi-
omechanics of movements, motor learning principles, environment
constrains and personal factors. This study investigated the effect
of an original protocol with task oriented approach in a standard
environment with application of virtual reality to improve the up-
per limb functionality in a group of eleven children with cerebral
palsy, aged from six to eleven. The outcomes were functional in-
dependence during performance of specific activities, satisfaction
and collaboration. The majority of children (60%) improved func-
tional independence. They demonstrated full satisfaction with the
intervention and cooperated most of the time during all the fifteen
sessions.

Keywords: Task oriented, Upper limb, Cerebral palsy, Functional


independence.

∗ Autor para contato: sheilaschneiberg@gmail.com


Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2
88 Schneiberg & Cosentino

1. Introdução
Durante a aprendizagem de uma nova habilidade motora as crianças têm
que coordenar fatores cognitivos e perceptuais, e as restrições impostas
pela tarefa e pelo contexto ambiental (Newell, 1989, 1991). Crianças com
paralisia cerebral (PC) podem apresentar dificuldades na aprendizagem
motora (Olney & Wright, 2006). A aprendizagem motora engloba uma nova
aquisição e a recuperação ou a modificação de um movimento (Gabbard,
2004).
As crianças com PC possuem déficits sensoriais e motores que impe-
dem a habilidade de perceberem e agirem como crianças que tenham um
desenvolvimento tı́pico (DT). A maneira que uma criança com PC aprende
ou adquire um novo padrão motor pode ser muito diferente de uma criança
com DT. Apesar de vários estudos terem investigado a aprendizagem mo-
tora em adultos com sequelas neuromotoras, poucos investigaram a apren-
dizagem motora em crianças com PC. A criança com PC aprende melhor
quando obtém o conhecimento do seu desempenho (feedback de como ela
realizou o movimento) combinado com uma estratégia cognitiva adequada.
Ou seja, só o resultado final da tarefa realizada não é suficiente. A criança
precisa de um conhecimento dos componentes de movimento necessários
e de um estı́mulo cognitivo adequado para aprender a realizar uma tarefa
com sucesso (Wann & Turnbull, 1993; Thorpe & Valvano, 2002).
A habilidade de realizar movimentos de preensão, manipulação e al-
cance de objetos e de manter o equilı́brio durante a marcha, são funções
dos Membros Superiores (MMSS) que requerem integridade dos sistemas
motores e somatosensoriais. A criança com PC frequentemente apresenta
um déficit nestes sistemas que resulta em uma diminuição da função dos
MMSS prejudicando sua habilidade de interagir e participar no meio am-
biente usando os braços e mãos. Há poucos estudos que demonstram a
eficiência de tratamentos fisioterapêuticos no aumento da atividade dos
MMSS em crianças com PC (Boyd et al., 2001). Uma terapia promissora,
mas sem investigação empı́rica até o momento, é a terapia por tarefas di-
recionadas.
O objetivo deste capı́tulo é apresentar o efeito de uma intervenção
por tarefas direcionadas sobre os aspectos de independência funcional nas
Atividades Funcionais (AFs) dos MMSS, na satisfação, e, na colaboração
da criança com PC, durante os atendimentos. Esta pesquisa faz parte
de um estudo maior (ensaio clı́nico randomizado) que utilizou a mesma
intervenção para comparar tarefas direcionadas com e sem restrição de
movimentos compensatórios do tronco (Schneiberg et al., 2010).
Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 89

2. Fundamentação Teórica
2.1 Paralisia cerebral: uma síndrome com múltiplas etiologias
A obtenção de uma definição consensual de PC é um desafio há muitos
anos. As principais razões da dificuldade de elaborar um conceito que
capte a essência não ambı́gua do amplo aspecto desta patologia são sua
etiologia múltipla e a diversidade de sintomas que ocorrem nesta sı́ndrome
(Shevell & Bodensteiner, 2004). Em 2004, uma força tarefa formada por
profissionais da pesquisa e da prática clı́nica foi realizada em um workshop
internacional, com o objetivo de elaborar uma definição da PC que repre-
sente da melhor forma todo o seu amplo aspecto e que possa ser utilizada
de forma multidisciplinar (Bax et al., 2005).
A definição eleita como a mais eficiente foi: “A PC consiste em um
grupo de desordens do desenvolvimento do movimento e da postura que
causam limitações nas atividades, e podem ser atribuı́das a distúrbios que
ocorrem durante o desenvolvimento fetal ou no encéfalo durante a infân-
cia. As desordens motoras da PC são frequentemente acompanhadas por
distúrbios na sensibilidade, na cognição, na comunicação, na percepção e
no comportamento, e por ataques convulsivos” (Bax et al., 2005).
Esta nova definição engloba os aspectos multidimensionais da sı́ndrome
e, consequentemente, facilita o diagnóstico, o tratamento, a comunicação
e a transferência de conhecimentos multidisciplinar com a finalidade de
aprimorar cada vez mais a prática clı́nica com esta população.

2.2 Classificação da paralisia cerebral: grupamento de uma popula-


ção extremamente heterogênea
A PC pode ser classificada de diversas maneiras, tradicionalmente a classi-
ficação é feita de acordo com a distribuição anatômica, ou seja, de acordo
com as partes do corpo afetadas. Por exemplo, na monoplegia (condição
rara) apenas um membro é afetado, a diplegia acomete os principalmente
os Membros Inferiores (MMII), na hemiplegia há acometimento de apenas
um Membro Superior (MS) e um Membro Inferior (MI) de um lado do
corpo, e, na quadriplegia todos os membros são afetados, com predomı́nio
dos MMSS.
Há também a classificação por distúrbio do tônus muscular baseada
na alteração de tônus mais evidente, por exemplo: espástico, atetóide ou
atáxico (Olney & Wright, 2006; Baxter, 2005). Porém, a classificação tra-
dicional ainda gera confusão, pois na prática clı́nica há muitas descrições
de tônus como misto, sem maiores detalhes.
Rosenbaum & Stewart (2004) e Bax et al. (2005) propõem que se utilize
os princı́pios da Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) para
classificação da PC, agregando os seguintes elementos:
90 Schneiberg & Cosentino

• Tipo de desordem motora e de tônus muscular: os termos ambı́guos


ou classificações duvidosas do tônus (como tônus misto) devem ser
evitados.
• Habilidades motoras: as funções e atividades motoras devem ser
classificadas de acordo com escalas padronizadas como a Gross Mo-
tor Function Classification System (GMFCS) para MMII (Palisano
et al., 1997) e o Sistema de Classificação da Habilidade Manual
(MACS) para MMSS (Eliasson et al., 2006). Estas escalas avaliam o
nı́vel de acometimento (severidade) da PC no desempenho de diver-
sas atividades de deambulação e manipulação respectivamente. Sua
classificação varia do nı́vel I a V, onde o nı́vel I é o menos afetado,
menos comprometido ou mais leve, e o nı́vel V é o mais comprome-
tido, mais afetado ou mais grave.
• A classificação por distribuição anatômica deve ser mantida. Porém,
é fortemente recomendado que o comprometimento motor e postural
de outras áreas do corpo, como o tronco, cada membro e região da
orofaringe, seja descrito detalhadamente.

2.3 Impacto da paralisia cerebral na função do membro superior e


abordagem terapêutica por tarefas direcionadas
A importância dos movimentos dos MMSS para a realização de atividades
de vida diária (AVDs) é reconhecida pelos clı́nicos e pesquisadores que tra-
balham com movimento. Sem o movimento do braço a habilidade motora
da mão fica limitada e muitas funções de motricidade fina da mão podem
se tornar difı́ceis ou impossı́veis.
As principais atividades afetadas pelos déficits dos MMSS são os mo-
vimentos de alcance, preensão e manipulação de objetos. Os movimentos
dos MMSS também contribuem para habilidades motoras grossas como o
engatinhar, o andar e a manutenção do equilı́brio (Shumway-Cook & Wo-
ollacott, 2001). Além disto, os problemas de função nos MMSS podem
representar sérias barreiras nas atividades e nas interações sociais em cri-
anças com PC (Shikako-Thomas et al., 2008; Wright et al., 2008).
Arner et al. (2008) realizaram um estudo na Suécia com 367 crianças
com PC. Nesta pesquisa 36% das crianças examinadas foram classificados
no nı́vel III do MACS, isto é, não eram independentes em tarefas manuais
mesmo utilizando os dois braços. O estudo de (Hanna et al., 2003) inves-
tigou o desenvolvimento da função da mão em crianças com PC de um a
cinco anos de idade. O resultado deste estudo demonstrou que as crianças
com PC possuem um desenvolvimento da função motora da mão bem mais
lento do que o das crianças com DT. O resultado também demonstrou que
o desenvolvimento da função da mão era relacionado com a severidade da
PC. Assim, as crianças mais acometidas, ou com MACS maior que III,
tinham o desenvolvimento motor manual bem mais lento.
Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 91

Os resultados dos dois estudos citados denotam que o impacto da PC


na função motora dos MMSS é evidente. Porém, nenhum tratamento em
fisioterapia ou terapia ocupacional tem um nı́vel de evidência e sucesso alto.
Isto torna a reabilitação dos MMSS em crianças com PC uma lamentável
lacuna a ser preenchida.
O uso de tarefas orientadas ou direcionadas é uma forma de terapia que
parece promissora para a obtenção de ganhos funcionais em crianças com
PC. Porém, esta terapia ainda não foi extensamente investigada (Shumway-
Cook & Woollacott, 2001). As tarefas direcionais seguem o modelo da CIF
(Farias & Buchalla, 2005) e consideram os fatores da função e da estrutura
do corpo, as atividades, a participação, e os fatores ambientais e pessoais
na elaboração das estratégias de intervenção. A intervenção por tarefas
direcionais origina-se nos novos conhecimentos adquiridos em desenvolvi-
mento motor, biomecânica do movimento e aprendizagem motora (Smith
& Thelen, 2003).
As tarefas direcionais consideram também a criança e os seus familiares
como o centro da terapia, e, utilizam estratégias individualizadas e moti-
vadoras para preencher a necessidade fı́sica e cognitiva de cada criança.
A terapia direcionada tem o objetivo de facilitar a atividade, tratando
os componentes básicos do movimento (funções e estrutura do corpo). É
importante enfatizar que a terapia por tarefas direcionadas realizadas pelos
fisioterapeutas não tem como objetivo final a realização da Atividade Fun-
cional (AF), pois este objetivo cabe aos terapeutas ocupacionais. O fisio-
terapeuta utiliza as tarefas direcionadas para tratar padrões de movimento
necessários à atividade e que como consequência podem vir a facilitá-la.
Logo, não se deve confundir a terminologia tarefas direcionadas e AFs. As
primeiras podem significar um tipo de intervenção terapêutica para os fi-
sioterapeutas e, as últimas, outro tipo de abordagem para os terapeutas
ocupacionais.
Nas tarefas direcionadas no contexto fisioterapêutico os componentes
do movimento (funções e estrutura do corpo, como a amplitude de movi-
mento) são tratados de forma sequencial e com um objetivo funcional na
atividade. Utiliza-se como exemplo uma criança que tem dificuldades de
se alimentar sozinha e na avaliação percebe-se que o seu maior problema
é a Amplitude de Movimento (ADM), mais especificamente a supinação
do antebraço. Pode-se utilizar atividades ou jogos como o de cartas ou de
memória, onde a criança deve virar cartas de diversos tamanhos e espes-
suras, aumentado sempre o grau de dificuldade e visando o aumento da
ADM. Assim, brincando de uma forma dinâmica e funcional trabalha-se a
supinação.
Na abordagem terapêutica através de tarefas direcionadas o fisiotera-
peuta deve avaliar de forma detalhada como a criança realiza a AF dese-
jada, quais componentes de movimento ela usa e quais estão faltando. Para
92 Schneiberg & Cosentino

isto necessita-se de um bom embasamento em conceitos de cinesiologia e


biomecânica do movimento.
Há poucos estudos publicados sobre a abordagem terapêutica por tare-
fas direcionadas, pois esta ainda é uma forma de intervenção considerada
recente. Os trabalhos de Salem & Godwin (2009) e Schneiberg et al. (2010)
descrevem as bases de tal abordagem. O estudo que segue é um exemplo de
intervenção por tarefas direcionadas com um grupo bastante heterogêneo
de crianças com PC.

3. Metodologia
Este estudo foi do tipo coorte, experimental, descritivo, para verificar a
viabilidade do protocolo de intervenção por tarefas direcionais em crianças
com PC.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo comitê de ética do Centro Inter-
disciplinar de Pesquisa em Reabilitação da área metropolitana de Montreal
(CRIR), e, os pais ou responsáveis legais e as crianças com mais de onze
anos assinaram o formulário de consentimento voluntário de participação
no estudo.
A pesquisa ocorreu em cinco centros de reabilitação pediátrica no es-
tado do Québec, no Canadá. As onze crianças incluı́das na amostra ti-
nham PC do tipo espástica, déficits sensórios-motores em pelo menos um
dos MMSS (hemiplegia, ou diplegia, ou quadriplegia), idade entre cinco a
doze anos, permanência na posição sentada sem suporte, e capacidade de
entender instruções básicas.
As crianças com PC de origem traumática, com presença de desordens
motoras do tipo atetose, ataxia e coreoatetose, com problemas ortopédicos
ou dor em MMSS, tronco ou pescoço, e com contraturas de mais de dez
graus em cotovelo ou mão não foram incluı́das no estudo.

3.1 Medidas
As caracterı́sticas clı́nicas de cada criança foram avaliadas com seis tipos
de testes de função sensório-motora:
1. ADM passiva dos MMSS: testada com uma escala onde o valor má-
ximo de 24 representa amplitude passiva completa e sem dor;
2. Sensibilidade proprioceptiva quanto a posição e ao toque dos MMSS:
testada com uma escala onde o valor máximo de 8 e 20, respectiva-
mente, representam propriocepção e sensibilidade ao toque normais;
3. Discriminação tátil e pressão: a discriminação foi testada com o
aparelho de discriminação de dois pontos e a pressão com o teste de
monofilamentos Semmes-Weinstein. Nestes testes as crianças com
Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 93

DT e idade de 5 a 9 anos obtém como valor normal para a discri-


minação de dois pontos, 2 a 3 milı́metros; e para os monofilamentos
Semmes-Weinstein, 2,83 a 3,61 milı́metros (Cooper et al., 1995);
4. Classificação do nı́vel funcional dos MMSS: avaliada pelo MACS (Eli-
asson et al. 2006). O MACS possui 5 nı́veis, no nı́vel I a criança não
apresenta incapacidade quando comparada aos pares e no nı́vel V
apresenta uma incapacidade manual grave;
5. Espasticidade: avaliada com o index composto de espasticidade
(Composite Index of Spasticity). Esta escala tem validade compro-
vada (Levin & Hui-Chan, 1992) e verifica os três componentes básicos
da espasticidade: a excitabilidade fásica do reflexo, a resistência ao
estiramento muscular, e a presença de clônus. O valor máximo de
16 representa espasticidade grave;
6. Habilidade de reconhecimento de objetos sem o auxı́lio da visão (es-
tereognesia).
Todas as avaliações visavam obter as caracterı́sticas clı́nicas de cada
criança e nortear a elaboração das tarefas direcionadas (Figura 1).
Para avaliar se as tarefas direcionadas facilitaram à aprendizagem de
uma função, cada criança escolheu uma tarefa funcional que considerava
importante e na qual tinha dificuldades de realização com os MMSS.
A independência funcional durante a realização desta tarefa foi testada
através de uma escala adaptada da Medida de Independência Funcional
(MIF) modificada (pediátrica), continuamente, durante todos os atendi-
mentos. Na pontuação da MIF os valores podem variar de um a cinco,
onde um representa total dependência e cinco, total independência na rea-
lização da AF. O Anexo I ilustra o registro do estado inicial e final de cada
criança.
Para medir a satisfação da criança com a terapia utilizou-se uma escala
de cinco pontos com faces. A face um refletia insatisfação total e a face
cinco, satisfação completa (Anexo II).
A colaboração durante os atendimentos foi julgada pelos fisioterapeutas
em uma escala de cinco pontos. A criança que não colaborava na maior
parte do tempo recebia 1 e a criança que colaborava recebia 5:
1 : não colabora durante toda a sessão;
2 : não colabora em quase toda sessão;
3 : colabora em metade da sessão;
4 : colabora na maior parte da sessão;
5 : colabora durante toda a sessão.
94 Schneiberg & Cosentino

Figura 1. Avaliação sensorial.

3.2 Intervenção por tarefas direcionadas


A abordagem da terapia era realizar tarefas em um ambiente fı́sico padroni-
zado que possibilitasse a realização de movimentos variados para os MMSS.
Este ambiente utilizava vantagens biomecânicas para capacitar funcional-
mente o uso dos MMSS. A motivação era mantida com jogos e tarefas de
acordo com a preferência da criança. Estes jogos e tarefas foram adaptados
pelo terapeuta (com base nas avaliações individuais prévias) e direcionados
para tratar os déficits existentes na forma de um treinamento funcional.
Cada intervenção tinha uma hora de duração com a frequência de três
vezes por semana, durante cinco semanas, totalizando quinze atendimen-
tos. O atendimento era dividido em cinco blocos. No primeiro ocorriam os
alongamentos ativos e passivos que duravam em torno de cinco minutos.
No segundo, as tarefas direcionadas eram feitas no ambiente padronizado
durante de vinte minutos. Após um intervalo de cinco minutos, começava
o bloco com realidade virtual que tinha a duração de vinte minutos. A in-
tervenção finalizava com o bloco de prática das AFs escolhidas pela criança
ou por seus responsáveis, durante dez minutos.
O ambiente fı́sico consistia de uma caixa de madeira colocada sobre uma
mesa, uma cadeira adaptada com altura ajustável e diversos brinquedos
com dificuldade, tamanhos, pesos e texturas diversos (Figura 2).
A caixa de madeira possuı́a dois planos principais: um horizontal e
um vertical. O plano horizontal era dividido em ipsilateral e contra lateral,
baseado na linha média da criança sentada em frente à caixa, de acordo com
o MS utilizado na tarefa, quando esta era unilateral. O plano horizontal era
Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 95

Figura 2. Ambiente padronizado.

dividido em próximo ao corpo e longe do corpo, de acordo com a extensão


ou a ADM de alcance.
O plano vertical da caixa era uma parede que poderia ser movida e
posicionada de acordo com ADM de alcance de cada criança. Esta parede
vertical foi pintada com tinta magnética para possibilitar a utilização de
brinquedos com propriedade magnética. Neste plano também foi inseriu-se
uma prateleira ajustável e que se adaptava a amplitude do ombro a ser
trabalhada.
Assim, realizou-se a divisão do plano vertical da seguinte forma: em
ipsilateral e contralateral baseando-se baseada na linha média da criança, e
em quadrantes inferiores e superiores, baseando-se na altura da prateleira
(Figura 3).
A parte superior da Figura 3 mostra a classificação do plano horizontal,
onde 1 representa as áreas próximas do corpo e 2 as áreas localizadas mais
distantes do corpo para exigir maior ADM de alcance. Na parte inferior
da Figura 3 há as divisões do plano vertical, onde A representa as áreas
localizadas abaixo da prateleira posicionada a 90o de flexão do ombro,
B representa as áreas localizadas acima da prateleira e C representa a
prateleira. As tarefas poderiam ser progredidas de acordo com a diminuição
na dificuldade de preensão, de manipulação e de alcance do objeto.
96 Schneiberg & Cosentino

Figura 3. Divisão do ambiente padronizado de treino.

Para manter a motivação da criança durante o atendimento, introduziu-


se um ambiente virtual (Figura 4) composto por um computador, um mo-
nitor e webcam, acoplados ao plano horizontal da caixa de madeira.

Figura 4. Ambiente virtual – exemplos de jogos.

A companhia IREX c desenvolveu um software que projetava o MS da


criança na tela, imergindo no jogo de vı́deo game (Figura 4). Este software
possibilitou que o terapeuta direcionasse os movimentos realizados pela
criança com o MS, enquanto ela se divertia jogando. Os jogos possuı́am
Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 97

diferentes nı́veis que variavam em velocidade e dificuldade (quantidade de


objetos).

3.3 Análise dos resultados


Os resultados foram analisados de forma descritiva com médias e desvio-
padrão. Não foram realizados testes estatı́sticos devido ao tamanho pe-
queno da amostragem, ao formato das medidas realizadas (sem linha de
base múltipla e avaliação pós-tratamento) e, principalmente, porque o ob-
jetivo do estudo não foi testar hipótese, mas verificar a viabilidade e o efeito
das tarefas orientadas na independência funcional.

4. Resultados
Todas as crianças que participaram do estudo completaram quinze atendi-
mentos. Porém, o grupo selecionado demonstrou ser bastante heterogêneo
em relação aos déficits motores e sensoriais (Tabela 1).
As AFs de MS escolhidas pelas crianças na primeira sessão foram bas-
tante variadas. Lembrando que cada criança escolhia pelo menos uma AF
que considerava como a mais importante. Durante um atendimento era
possı́vel treinar mais de uma AF.
Na Tabela 2, segunda coluna, consta o número de AFs total que cada
criança escolheu. O número de tarefas variou entre um e quatro, sendo
que apenas a criança 4 e a criança 9 conseguiram praticar quatro AFs. A
partir da terceira coluna começa a análise de cada AF, por exemplo, a AF1
é a primeira AF escolhida pela criança em seu primeiro atendimento. Na
terceira coluna estão os valores da MIF modificada representados por dois
números, sendo o primeiro o valor inicial (como a criança está quando a
AF é avaliada), e o segundo o valor final (atingido após uma quantidade
especı́fica de atendimentos). A quarta coluna apresenta a quantidade de
atendimentos realizados para chegar ao valor final da MIF modificada.
Na Tabela 2 observa-se que sete crianças conseguiram chegar ao nı́vel
cinco ou independência total na AF1. Elas estão identificadas por um cı́r-
culo. A criança 11, por exemplo, escolheu aprender a dar laços nos sapatos,
pois não conseguia dar sozinha. O número de tarefas totais praticado com
esta criança foi apenas um, então, sua análise concentra-se apenas em AF1.
No primeiro atendimento ela obteve nı́vel um na MIF porque precisava de
assistência máxima, mas conseguiu chegar ao nı́vel cinco, independente, no
décimo terceiro atendimento.
A criança 4 teve a oportunidade de treinar quatro AFs. Na AF1 co-
meçou com assistência mı́nima (nı́vel quatro) e conseguiu atingir a inde-
pendência (nı́vel cinco) em apenas dois atendimentos. Ela conseguiu fazer
as AF2 e AF3 de maneira independente, mas segundo a terapeuta ocupa-
cional o modo como fazia ainda não era eficiente. Na AF4, ela não tinha
independência total e a conseguiu ao final de mais cinco atendimentos.
Schneiberg & Cosentino

Tabela 1. Caracterı́sticas demográficas e clı́nicas da amostra.


# Sexo Idade Distrib. MMMS MACS† Semmes- 2-pontos* Stereo.\ Toque Prop.‡ CIS§ ADM
dos mais Weinstein (mm) n/5 n/20 n/8 n/16 n/24
déficits afetado D E D E D E
1 M 11 Hemiplegia Dir. 4 4,74 2,44 >9 4 1 5 20 6 9 24
2 M 11 Hemiplegia Esq. 2 2,83 2,36 3 3 5 4 14 8 7 24
3 F 10 Hemiplegia Esq. 2 2,83 2,44 2 2 5 5 20 8 4 23
4 M 10 Hemiplegia Esq. 2 2,83 2,44 3 3 5 4 19 4 7 24
5 F 9 Hemiplegia Dir. 2 2,83 2,83 2 2 4 5 18 8 6 23
6 F 9 Hemiplegia Dir. 4 3,22 3,22 2 2 5 5 20 8 6 24
7 F 9 Hemiplegia Dir. 3 1,65 2,83 2 2 5 5 20 5 6 22
8 F 9 Hemiplegia Esq. 4 3,61 2,83 3 3 5 5 17 8 9 22
9 F 8 Hemiplegia Dir. 3 3,22 2,83 9 2 3 5 14 6 10 20
10 F 8 Quadriplegia Esq. 4 2,83 4,08 nd nd 4 0 19 0 9 17
11 F 7 Diplegia Esq. 3 3,22 3,22 2 4 5 4 20 6 9 24
† = Manual Ability Classification System (Sistema de Classificação da Habilidade Manual)
* = Teste de discriminação de 2-pontos, uma das crianças se recusou a fazer o teste (nd)
\ = Stereognosia
‡ = Propriocepção
§ = Composite Index of Spasticity (Índice Composto de Espasticidade
 = Amplitude de Movimento
98
Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 99

Tabela 2. Resultados da escala MIF modificada.


AF1 AF2 AF3 AF4
# #AFs M. #ses. M. #ses. M. #ses. M. #ses.
1 1 3a4 14
2 3 4a5X 2 5a5X 2 4a4 9
3 1 3a4 8
4 4 4a5X 2 5a5X 7 5a5X 3 4a5X 5
5 2 4a5X 8 4a4 7
6 2 3 a 5 X 10 4 a 5 X 4
7 2 3 a 5 X 12 3 a 5 X 6
8 1 1a4 14
9 4 3a5X 4 2a4 3 1a2 3 4a5X 5
10 2 3a4 3 3a3 11
11 1 1 a 5 X 13
M. = MIF modificado
#ses. = número de sessões
X = independência completa alcançada

Observou-se que quando a tarefa exigia muito da motricidade fina era


necessário mais tempo para atingir a independência completa. As crianças
com um comprometimento sensorial maior, como a criança 1, tinham uma
aprendizagem mais lenta, e provavelmente se beneficiaria de um maior
número de sessões.
Considerando-se apenas a tarefa funcional mais importante (AF1), ou
seja, a primeira que cada criança escolheu, observa-se que 64% alcançaram
independência funcional completa durante ou até o final do estudo (Tabela
2).
As crianças mostraram-se satisfeitas com o protocolo de tarefas dire-
cionadas. Segundo os terapeutas as crianças foram cooperativas nos dois
ambientes e não houve diferença significativa entre o ambiente fı́sico e o
virtual. Os valores das escalas de satisfação e colaboração para cada cri-
ança, no ambiente fı́sico (AF) e no ambiente virtual (AV) são apresentados
nas Figuras 5 e 6.

5. Discussão
Este estudo demonstrou a viabilidade da terapia por tarefas direcionadas
quando esta terapia é realizada com crianças com PC do tipo espástica,
classificadas como hemiplégicas, ou diplégicas ou quadriplégica, e com sin-
tomas sensoriomotores e habilidades funcionais variadas nos MMSS.
O uso de tarefas direcionadas para os déficits motores e para a prática
funcional possibilitou um aumento da independência no desempenho de
AFs em 64% das crianças. Todas as crianças compareceram em todos os
100 Schneiberg & Cosentino

Figura 5. Escala de satisfação: média dos atendimentos por criança.

Figura 6. Escala de colaboração: média dos atendimentos por criança.


Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 101

atendimentos e responderam que estavam satisfeitas ou muito satisfeitas


com a terapia.
Houve preferência pela terapia realizada no ambiente fı́sico sobre a
realizada no ambiente virtual. Este achado corrobora com a descrição de
(Guberek et al., 2009) que compara a satisfação do ambiente fı́sico com a do
ambiente virtual e verifica diferença significativa (p < 0, 05). Os terapeutas
envolvidos no projeto julgaram que a colaboração das crianças variou de
boa a excelente.
Os benefı́cios da terapia por tarefas direcionais alcançados neste estudo
podem ser atribuı́dos aos elementos utilizados que incluem: princı́pios de
aprendizagem motora, repetições, feedback do resultado e da performance,
estratégias cognitivas que apelam para a atenção e a motivação da criança,
e ambiente com estı́mulos ricos e variados (Thorpe & Valvano, 2002).
A terapia por tarefas direcionais deve ser feita em um ambiente ade-
quado, que proporcione vantagem a capacidade funcional máxima e que
possibilite também a progressão dos exercı́cios. Por isto cada terapia di-
recionada deve ser individualizada e baseada nas dificuldades e anseios de
cada criança (Damiano, 2008).
Existem alguns elementos essenciais na elaboração de um plano de tra-
tamento fisioterapêutico por tarefas direcionais. O primeiro é a avaliação
funcional que deve seguir o modelo da CIF com informações sobre a fun-
ção das estruturas do corpo (ADM, espasticidade, dor, e outras) (Farias &
Buchalla, 2005). Ainda, é necessário investigar as atividades de uma forma
dinâmica e identificar os componentes do movimento utilizados. Ou seja,
avalia-se como tarefa é realizada (performance), não se limita a analisar
apenas se a tarefa é realizada ou não (resultado final). Os detalhes do
padrão de movimento utilizado durante a atividade embasam a elabora-
ção do tratamento. O terceiro elemento essencial na elaboração da terapia
por tarefas direcionais consiste na participação e nos fatores pessoais da
criança.
O presente estudo utilizou os elementos essenciais na elaboração da
terapia por tarefas direcionais. Houve uma avaliação funcional com inves-
tigação dinâmica dos componentes dos movimentos envolvidos, além de um
ambiente propı́cio para o treinamento funcional do MS.
Desenvolveu-se a terapia de forma individualizada e centrada nos an-
seios da famı́lia e da criança, com estratégias cognitivas e motivacionais por
estı́mulos visuais e auditivos de feedback e incentivo a solução de proble-
mas). Como o atendimento era longo e exigia que a criança permanecesse
sentada, para manter a motivação e a atenção introduziu-se um ambiente
com realidade virtual. Acredita-se que a adesão máxima (presença em
tempo integral em todos os atendimentos) se deve a diversidade dos recur-
sos utilizados.
Os resultados deste e de demais estudos (Salem & Godwin, 2009; Sch-
neiberg et al., 2010) mostram efeitos positivos da tarefa orientada ou dire-
102 Schneiberg & Cosentino

cionada. Porém, para a comprovação de sua eficiência mais investigações


são necessárias comparando esta terapia a outras.

6. Conclusão
A terapia por tarefas direcionadas tem efeitos positivos na função motora e
no desempenho de AFs do MS em crianças com PC. Contudo mais estudos
precisam ser desenvolvidos comparando a terapia por tarefas direcionais
com outros tipos de terapia.
Este estudo foi realizado no Canadá, contendo uma população de ori-
gem étnica bastante diversificada, onde a realidade do sistema de saúde
deste paı́s é diferente da do Brasil. Assim, sugere-se a realização de tra-
balhos futuros empregando a terapia por tarefas direcionadas em crianças
brasileiras para investigar se os resultados serão semelhantes.

Agradecimentos
Os autores agradecem a todas as crianças que participaram deste estudo,
a seus familiares, e aos fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais dos cinco
centros de reabilitação do Québec. Sheila Schneiberg agradece o suporte
financeiro da CAPES durante parte da elaboração do projeto principal que
engloba este estudo e atualmente ao suporte financeiro do CNPq no seu
pós-doutorado.

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Função do membro superior em crianças com PC e o uso de tarefas direcionadas 105

Anexo 1: Escala Utilizada para a Avaliação da Independência


Funcional

Anexo 2: Escala de Satisfação com Faces


106 Schneiberg & Cosentino

Notas Biográficas
Sheila Schneiberg Valença Dias é graduada em Fisioterapia (Universidade
Católica de Salvador, 1996), tem Mestrado em Ciências Biomédicas opção
Reabilitação (Université de Montreal, Canadá, 2002) e Doutorado em Ciências
da Reabilitação (McGill University, Montreal, Canadá, 2009). Atualmente
realiza estágio pós-doutoral em Neurociências na Universidade Federal do Rio de
Janeiro e é professora do curso de pós-graduação em Reabilitação Neurofuncional
da Faculdade Inspirar (Curitiba).

Felicia Cosentino é graduada em Fisioterapia (McGill University, Montreal,


Canadá, 1985) e tem Mestrado Profissional em Reabilitação (McGill University,
2010). Atualmente atua como fisioterapeuta no Centro de Reabilitação para
Crianças MacKay, Montreal, Quebéc, Canadá.
Capítulo 6

Função Motora, Fadiga e Dor


em Adolescentes e Adultos com Paralisia Cerebral

Aline Duprat Ramos∗, Adriana Ferreira Dias,


Rosane Luzia de Souza Morais, Ana Paula Santos

Resumo: Neste capı́tulo investigou-se a percepção da fadiga e da


dor cotidiana em vinte adolescentes e adultos com Paralisia Cerebral
(PC), idade superior a 12 anos e cognição preservada. Os instrumen-
tos instrumentos utilizados foram os questionários sociodemográfico,
de fadiga e de dor, Medida de Função Motora Grossa (GMFM), Sis-
tema de Classificação da Função Motora Grossa (GMFCS), Sistema
de Classificação de Habilidade Manual (MACS), e Critério de Deam-
bulação. Os dados obtidos foram relacionados com a função motora
(FM). Todos os sujeitos da pesquisa relataram dor no corpo e fadiga
mental ou fı́sica, porém de baixa intensidade para a maioria. Houve
correlação significativa apenas entre fadiga mental e o MACS.

Palavras-chave: Fadiga mental, Dor, Atividade motora, Paralisia


cerebral.

Abstract: This chapter investigated the daily fatigue and pain per-
ception in twenty adolescents and adults with Cerebral Palsy (CP),
with age 12 and above, and with preserved cognition. The instru-
ments used were: Sociodemographic, fatigue and pain questionnai-
res, Gross Motor Function Measure (GMFM), Gross Motor Func-
tion Classification System (GMFCS), Manual Ability Classification
System (MACS), and the Ambulation Criteria. Acquired data were
correlated with the motor function (MF). All the individuals re-
ported body pain as well as mental or physical fatigue, however of
low intensity, for most of them. We found a positive correlation
between mental fatigue and manual motor function.

Keywords: Mental fatigue, Pain, Motor activity, Cerebral palsy.

∗ Autor para contato: alineduprat@gmail.com

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


108 Duprat Ramos et al.

1. Introdução
A Paralisia Cerebral (PC) é um grupo de perturbações permanentes no
desenvolvimento do movimento e da postura, que causa limitações nas
atividades funcionais, atribuı́das a distúrbios não progressivos que ocorrem
no encéfalo imaturo (Rosenbaum et al., 2007). A PC é uma condição
permanente e, embora a lesão neurológica possa ser estática, as sequelas
musculoesqueléticas mudam significativamente ao longo da vida (Paterson,
2004).
A expectativa de vida de indivı́duos com PC tem aumentado (Jones,
2009), e junto a isto complicações como: deformidades ósseas (Paterson,
2004) degeneração articular (Carter & Tse, 2009), fraqueza e diminuição de
força muscular (Moreau et al., 2009; Shortland, 2009) déficits de equilı́brio
corporal (Opheim et al., 2009), fadiga (Jahnsen et al., 2003) e dor (Jahnsen
et al., 2004a).
As alterações musculoesqueléticas, como a fadiga e a dor, contribuem
para a deterioração da função motora de indivı́duos com PC e a marcha é
a mais estudada (Jahnsen et al., 2004b; Moreau et al., 2008; Opheim et al.,
2009; Maanum et al., 2010). Opheim et al. (2009) analisaram a marcha, a
dor e a fadiga de 226 adultos com PC num perı́odo de sete anos. Os autores
observaram que a deterioração da marcha estava associada à fadiga fı́sica e
a relatos de aumento da frequência, da intensidade e do número de regiões
do corpo com dor, além de um alto impacto causado pela dor nas atividades
de vida diária. Segundo Jahnsen et al. (2004b), em um estudo com 406
adultos com PC, a fadiga e a dor influenciaam na deterioração da marcha.
Embora estudos descritivos indiquem uma associação entre a fadiga, a
dor e a função, apenas Moreau et al. (2008) investigaram a relação entre a
função motora grossa e a fadiga em indivı́duos adultos com PC. Estes auto-
res estudaram a fadiga muscular induzida por um protocolo de atividades
fı́sicas realizado em um ambiente controlado com o uso de um dinamômetro
isocinético. Como conclusão, observaram que a fadiga muscular mensurada
poderia ou não estar relacionada a um relato subjetivo do sintoma. Deve-se
considerar que as demandas fisiológicas requeridas para a deambulação e a
realização de atividades de vida diária podem aumentar a percepção de es-
forço, pois ocorre maior geração de força muscular associada e contribuição
do sistema cardiorrespiratório.
Embora a literatura (Andersson & Mattsson, 2001; Jahnsen et al., 2003,
2004a,b; Moreau et al., 2008; Jones, 2009; Opheim et al., 2009) reporte a
presença de dor e fadiga em adultos com PC e ressalte a interferência destas
variáveis na função motora grossa, ainda não há evidências suficientes que
sustentem tal proposição. A literatura sugere novos estudos com diferentes
desenhos de pesquisa, nos quais se considere a influência destes fatores em
contexto de vida real (Jahnsen et al., 2003, 2004b; Moreau et al., 2008;
Opheim et al., 2009). A partir da compreensão dos fatores que interferem
Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos com PC 109

na função motora de adultos com PC será possı́vel desenvolver intervenções


para as necessidades especı́ficas desta população.
Desta forma, o presente estudo teve como objetivo geral investigar a
percepção da fadiga e a dor que adolescentes e adultos com PC apresentam
em seu cotidiano e, como objetivo especı́fico, verificar de que forma estas
variáveis se correlacionam com função motora destes indivı́duos.

1.1 Fundamentação Teórica


A dor e a fadiga são sintomas de natureza subjetiva, comum na população
em geral (Loge et al., 1998). Entretanto, em crianças com PC estes sin-
tomas são mais frequentes e chegam a influenciar no convı́vio social e na
função escolar das mesmas (Berrin et al., 2007). Entende-se por fadiga a
sensação de exaustão, cansaço, fraqueza ou falta de energia (Kaasa et al.,
1999). Por outro lado, a dor é um sintoma que pode variar com a experi-
ência subjetiva do indivı́duo a danos reais ao tecido, bem como com o seu
limiar de tolerância (IASP Task Force on Taxonomy, 1994).
Crianças com PC geralmente apresentam, ao longo de suas vidas, uma
pobre capacidade aeróbia e padrões neuromusculares anormais que favore-
cem o aparecimento de alterações musculoesqueléticas como deformidades
articulares, fraquezas musculares e instabilidade postural (Bottos & Ge-
ricke, 2003). Todas estas alterações favorecem a realização da função den-
tro de uma incongruência biomecânica. Isto aumenta os gastos energéticos
durante a realização das tarefas e se torna importante fonte de dor e fadiga,
que geralmente perduram e se agravam na fase adulta (Jahnsen et al., 2003,
2004a). Fowler et al. (2007) sugerem que abordagens com gesso seriado,
toxina botulı́nica, cirurgias, treinamento aeróbio e de força muscular, são
boas alternativas para o controle da fadiga e da dor.
Tradicionalmente, o tratamento fisioterapêutico em crianças com PC
tem como foco principal a aquisição da marcha independente, sem conside-
rar quanto tempo poderá levar para se atingir tal objetivo, ou por quanto
tempo esta capacidade poderá ser mantida pelo indivı́duo. Ao se planejar
uma intervenção em crianças com PC deve-se ter em vista uma perspec-
tiva de uma vida inteira, não só da infância, para minimizar situações que
podem ser futuras limitantes da função motora (Bottos et al., 2001).

2. Metodologia
Este trabalho foi um estudo transversal, aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri
(protocolo no 001/10).
A amostra foi composta por vinte indivı́duos que atendiam aos crité-
rios de inclusão: possuir PC diagnosticada e registrada em prontuário de
um dos centros de reabilitação de referência do municı́pio de Diamantina
(MG), ter idade igual ou superior a doze anos e possuir cognição preservada
110 Duprat Ramos et al.

conforme resultados obtidos no Mini-Exame do Estado Mental (MEEM)


versão adaptada para a população brasileira (Brucky et al., 2003).
Para caracterização da amostra, foram coletados dados econômicos e
demográficos. Para a classificação econômica utilizou-se um questionário
proposto pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Associação
Brasileira de Empresas de Pesquisa, 2009).
Para a classificação da função motora grossa foi utilizado o Sistema de
Classificação da Função Motora Grossa (Gross Motor Function Classifica-
tion System – GMFCS), que se baseia no movimento iniciado voluntaria-
mente, enfatizando a posição sentada e a marcha. As distinções entre os
nı́veis de função motora, I a V, são baseadas nas limitações funcionais e na
necessidade de tecnologia assistiva (Palisano et al., 1997).
Para classificar a função motora fina utilizou-se o Sistema de Classi-
ficação das Habilidades Manuais (Manual Ability Classification System –
MACS), que é um sistema para classificar o modo como indivı́duos com PC
manuseiam os objetos em atividades diárias, necessidades de assistência e
adaptações. O MACS é composto pelos nı́veis I a V, crescentes quanto às
limitações presentes (Eliasson et al., 2006).
Para avaliar a função motora grossa utilizou-se o Gross Motor Function
Measure – GMFM (Russell et al., 2002) que avalia quantitativamente a
função motora grossa em cinco dimensões: (1) deitar e rolar, (2) sentar,
(3) engatinhar e ajoelhar, (4) de pé e andar e (5) correr e pular.
Na avaliação da marcha, utilizou-se o Critério de Deambulação Funcio-
nal e Não Funcional (CDFNF) (Montgomery, 1998) que classifica a marcha
baseando-se na necessidade do uso de dispositivo de auxı́lio, no nı́vel de in-
dependência e na distância percorrida. A avaliação da percepção subjetiva
da fadiga foi feita por meio do Questionário de Fadiga (Fatigue Question-
naire – FQ) (Chalder et al., 1993) que avalia a gravidade da fadiga fı́sica
e mental através de 11 perguntas. Também utilizou-se a Escala de Seve-
ridade da Fadiga (Fatigue Severity Scale – FSS) (Krupp et al., 1989) que
avalia a intensidade do sintoma por meio de uma escala visual analógica.
Para avaliação da percepção da intensidade de dor no corpo, bem como
do impacto que ela possa causar nas atividades do dia a dia, foram uti-
lizadas as perguntas sete e oito do Medical Outcomes Study 36 – Item
Short-Form Health Survey (SF-36), conforme a metodologia utilizada nos
estudos de Jahnsen et al. (2004a) e Opheim et al. (2009). Estas perguntas
objetivam identificar quanta dor no corpo o indivı́duo teve durante os últi-
mos seis meses e quanto esta dor interferiu no trabalho normal, incluindo
o trabalho dentro de casa, durante as últimas quatro semanas.
Para avaliar a frequência de dor em diferentes seguimentos do corpo,
utilizou-se o domı́nio “problemas musculoesqueléticos” do questionário de-
senvolvido por Andersson & Mattsson (2001). Quanto à avaliação da inten-
sidade da dor nestes locais, utilizou-se como instrumento a Escala Visual
Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos com PC 111

Analógica (EVA) que variam de zero (ausência total de dor) a dez (dor
máxima suportável).
Os questionários de fadiga e de dor foram respondidos pelos próprios
participantes. Os participantes que apresentaram dificuldades para se ex-
pressar verbalmente, foram orientados a utilizar gestos e movimentos com
os olhos e com a cabeça. Foram feitas adaptações para os questionários FQ,
SF-36 e questionário sobre seguimentos corporais dolorosos. Para tal, fo-
ram utilizados frascos contendo lı́quidos coloridos a diferentes nı́veis, cada
qual representando uma opção de resposta (Figura 1). Com relação ao FSS
e a intensidade da dor nos seguimentos corporais dolorosos, confeccionou-se
uma EVA em maior dimensão para facilitar a indicação da resposta pelo
participante (Figura 2). Segundo Sabbadini et al. (2001) e Varni et al.
(2005), tais estratégias oferecem autonomia àqueles que apresentam dificul-
dades de expressão verbal e minimizam a chance do examinador influenciar
a resposta do participante.
As alterações musculoesqueléticas foram avaliadas através de um breve
exame postural e fı́sico.
Para análise dos dados, utilizou-se o software aplicativo SPSS (Statisti-
cal Package for the Social Sciences) versão 17.0, e para a caracterização da
amostra da função motora, da dor e da fadiga realizou-se análise descritiva
dos dados. Para avaliar a relação entre função motora e fadiga ou dor,
efetuou-se a análise de correlação de Spearman, com nı́vel de significância
de 0,05.

Figura 1. Adaptações para opções de resposta aos questionários de dor e


fadiga.
112 Duprat Ramos et al.

Figura 2. EVA confeccionada em tamanho maior.

3. Resultados
A Tabela 1 apresenta a caracterização da amostra quanto aos dados de-
mográficos, as informações sobre a PC, a realização de atividade fı́sica ou
fisioterapia e a presença de alterações de linguagem.
A Tabela 2 caracteriza a função motora dos vinte participantes do es-
tudo. Quanto ao GMFM, as pontuações totais dos participantes se situa-
ram, principalmente, nas faixas entre 0 e 25% (40% dos sujeitos) e entre
76 e 100% (45% dos sujeitos). Dos vinte participantes, apenas treze de-
ambulavam, nove com deambulação do tipo funcional e quatro do tipo não
funcional. Dos sete (35%) participantes classificados como não deambu-
lantes, quatro (20%) nunca adquiriram a função da marcha e três (15%)
perderam tal função ao longo da vida. Pode-se observar também uma
maior concentração de pessoas no nı́vel I do GMFCS (40%) seguida de
maior concentração no nı́vel IV (35%). No que diz respeito ao MACS, uma
grande proporção foi encontrada no nı́vel I (60%).
No FQ todos os participantes relataram possuir algum nı́vel de inten-
sidade de fadiga, de origem fı́sica ou mental. A maioria dos indivı́duos se
encontrava na faixa de pontuação de até 25% no que se refere à fadiga ge-
ral, fı́sica e mental, seguida de maior concentração na faixa de 26 a 50% e
51 a 75%, respectivamente, para os três tipos de fadiga citadas (Tabela 3).
De acordo com os resultados da FSS, todos os participantes relataram
que os sintomas de fadiga causaram alguma incapacidade em diferentes
nı́veis. Dentre as incapacidades geradas pelo sintoma de fadiga fı́sica esta-
vam a dificuldade em se manter em atividades já iniciadas como o andar,
o brincar com outros colegas e a auto higienização. Dentre as relaciona-
das com a fadiga mental estavam a dificuldade em manter a concentração,
Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos com PC 113

Tabela 1. Caracterização sociodemográfica dos participantes.


Idade Sexo NE Escolaridade Tipo Complicações A.F./ Linguagem
(anos) PC Musculares Fisio
54 F E 1a a 4a série Quadriplegia 1, 2, 3, 4, 5 Fisio Afasia
12 F B2 5a a 8a série Quadriplegia 1, 2, 5 Fisio Afasia
20 F D Analfabeto Quadriplegia 1, 3, 5 Fisio Disartria
16 F C1 Médio inc. Discinético 1, 2, 5, 6 Não Disartria
38 M C2 Médio comp. Quadriplegia 1, 3, 5 A.F./Fisio Disartria
a a
17 M D 5 a 8 série Quadriplegia 1, 5 A.F./Fisio Disartria
a a
59 F D 1 a 4 série Ataxia 1, 3, 4 Não Disartria
a a
20 M D 5 a 8 série Diplegia 1 A.F. Disartria
32 M C2 Analfabeto Diplegia 1, 3, 4, 5 A.F./Fisio Disartria
34 M C2 Analfabeto Quadriplegia 1, 2, 3, 5 Fisio Disartria
15 M C2 5a a 8a série Diplegia 1 Fisio Disartria
36 M C1 Médio comp. Hemiplegia 1 A.F./Fisio Disartria
12 F C1 5a a 8a série Hemiplegia 1, 5 A.F./Fisio Disartria
40 F B2 1a a 4a série Quadriplegia 1, 5 Fisio Disartria
15 M C2 Analfabeto Discinético 1, 2, 4, 5, 6 Fisio Afasia
17 M B2 Médio inc. Quadriplegia 1, 3, 5 A.F. Disartria
a a
24 M C2 5 a 8 série Misto 1 Fisio Disartria
14 M E 5a a 8a série Hemiplegia 0 A.F./Fisio Disartria
a a
17 M D 1 a 4 série Diplegia 1, 4 Fisio Disartria
20 M C1 Médio inc. Quadriplegia 1, 2, 5 Fisio Disartria
M = Masculino, F = Feminino, NE = Nı́vel Econômico, Médio inc. = Ensino Médio incompleto,
Médio comp. = Ensino Médio completo, Complicações. Musc. = Complicações Musculoesque-
léticas: (1) escoliose, (2) cifose, (3) alterações nos tornozelos/pés, (4) contraturas de joelho ou
tornozelo ou punho ou cotovelo, (5) obliquidade pélvica, (6) luxação de quadril. A.F. = Atividade
Fı́sica, Fisio = Fisioterapia

em organizar os pensamentos e a memória. Tais relatos de incapacidade


se concentraram na faixa de porcentagem compreendida entre 51 e 75%
seguida de maior concentração na faixa de 26 a 50%, e de igual proporção
nas faixas até 25% e entre 76 e 100% (Tabela 3).
A Tabela 4 mostra a frequência e a intensidade da dor no corpo e em
suas diferentes partes. Treze participantes (65%) relataram dor e todos os
seguimentos corporais citados no questionário obtiveram relato de dor. Os
seguimentos com maior frequência de relato de dor foram a cabeça com
80%, seguida das costas com 70% e o tornozelo ou o pé com 60%. Houve
um predomı́nio das intensidades de dor leve e moderada no que se refere
aos vários locais do corpo (Tabela 4).
A Tabela 5 mostra a intensidade da influência da dor no corpo nas
atividades do cotidiano. Dos treze participantes que relataram sentir dor
no corpo, dez (76,92%) relataram que tal sintoma influenciou na realização
de atividades do dia a dia.
A Tabela 6 apresenta os coeficientes de correlação de Spearman obtidos
entre as variáveis relacionadas à fadiga e a dor, com as relacionadas à função
motora. A única correlação com significância estatı́stica observada foi entre
a fadiga mental e o MACS.
114 Duprat Ramos et al.

Tabela 2. Caracterização da função motora grossa e do tipo de marcha.


Classificação GMFM* Tipo de Marcha
Motora 0-25% 26-50% 51-75% 76-100% F. N.F. N.D.

GMFCS (n)
Nı́vel I (8) – – – 8 8 – –
Nı́vel II (1) - - - 1 1 - -
Nı́vel III (3) 1 1 1 - - 3 -
Nı́vel IV (7) 6 - 1 - - 1 6
Nı́vel V (1) 1 - - - - - 1

MACS (n)
Nı́vel I (12) 1 1 1 9 9 2 1
Nı́vel II (3) 2 - 1 - - 1 2
Nı́vel III (1) 1 - - - - - 1
Nı́vel IV (2) 2 - - - - 1 1
Nı́vel V (2) 2 - - - - - 2
n = número de participantes; * = distribuição dos participantes por faixa
de pontuação atingida em porcentagem, F. = Funcional, N.F. = Não Fun-
cional, N.D. = Não Deambula.

Tabela 3. Nı́veis de intensidade de fadiga e incapacidade gerados.


Questionários Ausência de ≤25%* 26–50%* 51–75%* 76–100%*
fadiga (n) (n) (n) (n) (n)
Fadiga geral (FQ) – 13 6 1 –
Fadiga fı́sica (FQ) 1 10 8 1 –
Fadiga mental (FQ) – 15 4 1 –
Incapacidade gerada – 2 6 10 2
por fadiga (FSS)
n = número de participantes; * = faixa de pontuação atingida em porcentagem, FQ =
Fatigue Questionnaire, FSS = Fatigue Severity Scale.

4. Discussão
Segundo a literatura recente (Hirsh et al., 2010; Horsman et al., 2010), uma
das maiores razões de procura pelos serviços de fisioterapia por adultos com
PC são a dor e a fadiga, bem como as consequências que estes sintomas
trazem para a função motora.
A dor crônica é um sintoma bastante comum em adultos com PC e
uma das causas de incapacidades (Engel et al., 2003; Jahnsen et al., 2004a;
Vogtle, 2009; Riquelme et al., 2011). Engel et al. (2003) concluı́ram que
67% de sua amostra relatou dor crônica em um ou mais locais do corpo,
e as costas e os membros inferiores foram os locais mais relatados. No
presente estudo, todos os participantes relataram ter sentido dor no último
Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos com PC 115

Tabela 4. Frequência de relatos e intensidades de dor em diferentes partes


do corpo e a influência do sintoma nas atividades.
Dor Número de Intensidade de dor
participantes relatada segundo EVA (n)
Leve Moderada Grave
(1 a 3) (4 a 7) (8 a 10)
Dor no corpo 13 6 6 1
(SF36-7)
Costas 14 9 5 –
Pescoço 11 8 2 1
Tornozelo/pé 12 5 5 2
Ombro 6 4 2 –
Joelho 9 4 2 3
Quadril 4 1 2 1
Braço 9 4 3 2
Cabeça 16 1 9 6

Tabela 5. Influência da dor no corpo nas atividades do cotidiano.


Participantes que Intensidade de dor relatada
relataram influência segundo EVA (n)
da dor (SF36-8)
Leve (1 a 3) Moderada (4 a 7) Grave (8 a 10)
10 6 2 2

ano em um ou mais locais do corpo. No entanto, a cabeça apresentou


maior frequência de relato de dor, seguida das costas, do tornozelo e pé, e
do pescoço. Jahnsen et al. (2004a), em um estudo com 406 adultos com
PC, observaram que os relatos de dor na cabeça eram mais prevalentes em
indivı́duos com PC do tipo discinética. No presente estudo, a quantidade de
indivı́duos com PC do tipo espástica foi maior do que a do tipo discinética.
Embora ainda não haja uma compreensão mais aprofundada sobre as fontes
de dor em adultos com PC (Vogtle, 2009) a literatura pesquisada aponta as
alterações musculoesqueléticas como importantes causas (Paterson, 2004;
Jones, 2009; Vogtle, 2009).
Assim como nos resultados encontrados por Jahnsen et al. (2004a), no
presente estudo, nem todos os participantes que referiram dor no corpo
relataram que o sintoma influenciou as atividades de vida diária. Segundo
Riquelme et al. (2011), a dor na PC parece ser um fenômeno relevante
desde tenra idade, cuja intensidade não sofre alterações relacionadas com
o avançar da idade, diferentemente do que se observa em indivı́duos sau-
dáveis.
Apesar de todos os participantes relatarem dor em um ou mais locais
do corpo, nem todos relataram sentir dor no corpo de acordo com as per-
116 Duprat Ramos et al.

Tabela 6. Resultado das correlações de Spearman.


Questionários GMFCS GMFM Tipo de MACS
marcha
Fadiga geral r = -0,339 r = -0,379 r = -0,335 r = -0,350
(FQ) ρ = 0,143 ρ = 0,099 ρ = 0,263 ρ = 0,131

Fadiga fı́sica r = -0,249 r = -0,277 r = -0,394 r = -0,108


(FQ) ρ = 0,289 ρ = 0,238 ρ = 0,183 ρ = 0,651

Fadiga mental r = -0,386 r = -0,377 r = -0,047 r = -0,617*


(FQ) ρ = 0,093 ρ = 0,101 ρ = 0,879 ρ = 0,004

Incapacidade gera- r = -0,003 r = 0,070 r = -0,014 r = 0,346


da por fadiga (FSS) ρ = 0,989 ρ = 0,752 ρ = 0,963 ρ = 0,136

Dor no corpo r = 0,170 r = 0,039 r = 0,279 r = 0,271


(SF36-7) ρ = 0,472 ρ = 0,869 ρ = 0,356 ρ = 0,248

Influência da dor r = 0,102 r = -0,040 r = 0,394 r = 0,087


nas atividades (SF36-8) ρ = 0,667 ρ =0,867 ρ = 0,183 ρ = 0,714

Intensidade geral r = 0,095 r = 0,167 r = 0,073 r = 0,415


da dor (EVA) ρ = 0,691 ρ = 0,482 ρ = 0,761 ρ = 0,690
* Correlação estatisticamente significativa (ρ < 0, 05).

guntas do SF-36. Durante a coleta dos dados observou-se que, ao fazer as


perguntas padronizadas do referido questionário (a sete e a oito), a maioria
dos participantes entendeu o termo “dor no corpo” como mialgia, artralgia,
moleza e mal estar generalizados. Entende-se que isto ocorreu porque estes
termos são bastante utilizados pelo Ministério da Saúde para descrever os
sintomas de doenças comuns no paı́s, como a dengue.
Horsman et al. (2010) observaram em um estudo qualitativo, realizado
com doze adultos com PC, que ao aceitarem que o sintoma é um crescente
em suas vidas, os indivı́duos buscam descansar mais e gerenciar melhor
suas energias com atividades mais funcionais e práticas. Tais estratégias
de enfrentamento foram percebidas pelos participantes do estudo como
uma derrota, gerando uma angústia psicológica devido às limitações nas
atividades e às restrições sociais causadas.
Os resultados deste estudo mostram que todos os participantes relata-
ram fadiga seja ela fı́sica ou mental, porém para a maioria, esta fadiga é
de pequena intensidade. Porém, a faixa etária dos participantes era predo-
minantemente abaixo de vinte e cinco anos e a maioria dos participantes
Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos com PC 117

realizava fisioterapia há mais de um ano ou praticava atividades fı́sicas li-


vres. Há evidências sobre os efeitos benéficos do exercı́cio fı́sico, bem como
da fisioterapia, nos sintomas de fadiga e também de dor em adolescentes
e adultos com PC (Allen et al., 2004; Taylor et al., 2004; Slaman et al.,
2010). Porém, um estudo recente de revisão sistemática sobre as evidências
da intervenção fisioterapêutica em adolescentes e adultos com PC concluiu
que as evidências sobre o assunto são escassas e que há uma necessidade
urgente de estudos nesta população (Jeglinsky et al., 2010).
Quanto à função motora grossa, os participantes dividiram-se princi-
palmente em dois grupos: um grupo com maiores limitações (GMFCS IV
e V, GMFM com pontuação baixa e ausência de marcha) e um grupo com
melhor desempenho funcional (GMFCS I e II, GMFM com pontuação alta
e presença de marcha funcional). Por outro lado, na função motora fina
houve maior número de indivı́duos com menores limitações (MACS I).
Hanna et al. (2009) acompanharam o desenvolvimento motor grosso de
657 indivı́duos com PC desde os dezesseis meses de vida até os vinte e um
anos de idade. Observaram que, para cada nı́vel do GMFCS, existia uma
curva de pico e declı́nio da função motora grossa em relação à idade. Os
nı́veis III, IV e V estavam sob maior risco de declı́nio nesta curva. Acredita-
se que a combinação entre o crescimento fı́sico e a diminuição da função
motora voluntária pode estar associada a uma tendência de aumento de
custos energéticos, de contraturas e de rigidez muscular, que perduram nos
anos seguintes.
Há interesse na comunidade cientı́fica atual em compreender o que
ocorre em termos de função motora em adultos com PC. Especula-se que
há uma deterioração funcional ao longo dos anos, principalmente no que
se refere à locomoção (Bottos et al., 2001; Day et al., 2007; Hanna et al.,
2009).
Neste estudo, dos sete participantes que não deambulavam, três perde-
ram a função da marcha ao longo da fase adulta. O participante 1 iniciou
a marcha aos 12 anos e perdeu aos 20. O participante 7 iniciou aos quatro
anos e perdeu aos 39. O participante 10 iniciou com um ano e perdeu aos
28. As idades de perda de marcha dos participantes do estudo reforçam os
resultados obtidos por Bottos & Gericke (2003) sobre a faixa etária mais
comum de deterioração e perda da marcha, ou seja, entre 20 e 40 anos.
Segundo Shortland (2009), em um estudo de revisão, o atraso na aqui-
sição dos marcos motores, o comprometimento neurológico e o envelheci-
mento podem comprometer o aumento da reserva muscular e, consequen-
temente, a realização de tarefas motoras como a marcha em adultos com
PC. Outros autores (Jahnsen et al., 2003, 2004a,b; Opheim et al., 2009;
Vogtle, 2009; Palisano et al., 2010) associaram o achado também a fato-
res intrı́nsecos e extrı́nsecos ao indivı́duo: o desequilı́brio entre a demanda
energética da atividade e a capacidade fı́sica, as alterações musculoesque-
léticas que se desenvolvem no decorrer da vida, a falta de atividades fı́sicas
118 Duprat Ramos et al.

que se adaptem às necessidades de adultos com PC, os relatos de fadiga,


e o aumento da frequência e do impacto causado pela dor em vários locais
do corpo.
Embora vários estudos descritivos citem a fadiga e a dor como contri-
buintes para o declı́nio das funções motoras de adultos com PC, o presente
estudo não verificou correlação entre a percepção subjetiva da fadiga e da
dor com a função motora. A única correlação com significância estatı́s-
tica encontrada foi entre a fadiga mental e o MACS, a qual foi classificada
como forte, e com poder estatı́stico de 85% ao considerar-se o tamanho da
amostra (Cohen, 1988).
A literatura pesquisada na área de adultos com PC é escassa ao des-
crever a função motora fina. Não houve registro de estudos publicados
correlacionando função motora fina e a fadiga geral ou mental. Segundo
Eliasson et al. (2006) a avaliação da função motora manual em indivı́duos
com PC através do MACS requer um controle motor fino associado a uma
demanda cognitiva. Assim, a parte motora envolve o indivı́duo fazer a ta-
refa corretamente, e a parte da cognição se refere a saber o que se deve fazer.
Desta forma, é possı́vel que a dificuldade no controle muscular seletivo em
indivı́duos com PC requeira maior esforço mental. Wittemberg (2009), em
um estudo para mapeamento motor cortical da mão de hemiplégicos e di-
plégicos com PC, observou que havia uma reorganização da representação
motora da mão afetada e que o hemisfério cerebral não afetado continha a
representação motora da mão não afetada e da mão afetada.
Estudos sobre fadiga mental em indivı́duos com lesão nervosa central
são mais frequentes em condições como a poliomielite (Bruno et al., 1995;
Schanke & Stanghelle, 2001) e a esclerose múltipla (Tartaglia et al., 2008).
Ao associar a realização de tarefas motoras manuais a uma demanda cog-
nitiva Marcora et al. (2009) e Tartaglia et al. (2008) conseguiram induzir
fadiga mental em indivı́duos saudáveis e com esclerose múltipla, respecti-
vamente. Em indivı́duos saudáveis, a fadiga mental limita a tolerância ao
exercı́cio fı́sico através do aumento da percepção de esforço (Marcora et al.,
2009).

5. Conclusão
O presente estudo indica que a fadiga e a dor, apesar de serem sintomas
com baixa intensidade, foram relatos comuns entre os participantes. No
entanto, a única correlação encontrada entre estas variáveis e a função
motora, ocorreu entre a fadiga mental e o MACS. Apesar de a literatura
relatar que a fadiga e a dor são sintomas associados à deterioração da função
motora de adultos com PC, há uma escassez de estudos que mostrem a
correlação destes sintomas com a função motora.
Como a fadiga e a dor são sintomas de prevalência importante nesta
população, sugere-se a realização de estudos controlados e com amostras
Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos com PC 119

significativas, a fim de se entender como tais sintomas limitam as atividades


e a participação social em adolescentes e adultos com PC. Além disto, as
intervenções fisioterapêuticas em indivı́duos com PC, desde tenra idade,
devem focar estratégias preventivas ou de alı́vio destes sintomas.

Agradecimentos
As autoras agradecem ao Núcleo de Reabilitação Fı́sica Nossa Senhora da
Saúde de Diamantina, MG, da Associação de Pais e Amigos dos Excepci-
onais (APAE) e da Clı́nica-Escola de Fisioterapia da Universidade Federal
dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) pelo apoio fornecido. As
autoras agradecem também à Revista Brasileira de Fisioterapia pelo apoio.

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124 Duprat Ramos et al.

Notas Biográficas
Aline Duprat Ramos é Fisioterapeuta (UFVJM, 2010) e atua como fisio-
terapeuta no Hospital Pronto Socorro João XXIII - Rede FHEMIG de Belo
Horizonte, MG.

Adriana Ferreira Dias é Fisioterapeuta (UFVJM, 2010).

Rosane Luzia de Souza Morais é Fisioterapeuta (UFMG, 1996), Especialista


em Fisioterapia (USP, 1998) e Mestre em Ciências da Reabilitação (UFMG,
2005). Atualmente é doutoranda em Saúde da Criança e do Adolescente (UFMG)
e Professor Assistente da UFVJM, Departamento de Fisioterapia.

Ana Paula Santos é Fisioterapeuta (UEL, 1999), Especialista em Fisioterapia


Neurológica (UEL, 2001), Mestre e Doutor em Ciências Médicas – Neurociências
(USP, 2004 e 2009, respectivamente). Atualmente é Professor Adjunto da
UFVJM, Departamento de Fisioterapia.
Capítulo 7

Terapia Ocupacional e Tecnologia Assistiva:


Possibilidades de Adaptações
para Pessoas com Paralisia Cerebral

Cristina Antunes de Almeida∗, Paula Valéria da Costa Lima

Resumo: As pessoas com paralisa cerebral (PC) podem apresentar


dificuldades no desempenho das AVD’s (Atividades de Vida Diária).
Este é um estudo de caráter exploratório baseado em revisão de
literatura, e teve como objetivo identificar as adaptações funcionais
que favorecem a facilitação dos familiares e das pessoas com PC nas
AVD’s. Para tal, realizou-se revisão da literatura recente disponı́vel
e compatı́vel com o tema, incluindo livros e periódicos publicados
entre os anos de 2000 e 2011. Identificou-se ampla gama de recursos
assistivos, bem como se verificou que os conteúdos são facilmente
acessı́veis na mı́dia eletrônica. Tal fato promove a divulgação deste
conhecimento a profissionais e usuários.

Palavras-chave: Terapia Ocupacional, AVD’s, Tecnologia assis-


tiva, Paralisia cerebral.

Abstract: People with cerebral palsy (CP) may present difficul-


ties in performing ADL’s (Activities of Daily Living). This is an
exploratory study based on a literature review, and it is aimed at
identifying the functional adaptations that can promote facilitation
of family members and people with PC in ADL’s. Recent available
literature related to the subject was revised, comprising books and
papers published form 2000 to 2011. A wide range of assistive de-
vices was identified, as well as contents can be easily accessed on
the electronic media. This fact enables sharing the knowledge with
professionals and users.

Keywords: Occupational therapy, AVL’s, Assistive technology, Ce-


rebral palsy.

∗ Autor para contato: cristinaantunesdealmeida@yahoo.com.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


126 Almeida & Lima

1. Introdução
O profissional terapeuta ocupacional tem como premissa atuar com a fun-
cionalidade pessoal e social em todas as fases da vida. As suas competên-
cias apontam para um profissional que, por intermédio da aplicação das
atividades cotidianas, incrementa a independência, possibilita o desenvol-
vimento, e previne a doença. Assim, utiliza adaptações, nas tarefas ou no
meio ambiente para proporcionar ao indivı́duo o máximo de independên-
cia e melhorar a sua qualidade de vida (American Occupational Therapy
Association, 1972).
Entende-se que a base da Terapia Ocupacional é a capacidade de au-
tonomia e independência do indivı́duo. O profissional desta área poten-
cializa o desempenho funcional nas atividades do cotidiano. O terapeuta
ocupacional utiliza diversas abordagens para melhorar o desempenho e a
independência de pessoas com Paralisia Cerebral (PC) na realização de
suas atividades. Entre estas, destaca-se a Tecnologia Assistiva (TA) que
atua como agente facilitador no processo de autonomia e independência
nas Atividades de Vida Diária (AVD’s).
As AVD’s incluem as tarefas de automanutenção (alimentação), ves-
tuário, banho, uso do banheiro, higiene oral e comunicação (Torquetti &
Alvim, 2006). Todo ser humano necessita destas atividades como meio de
vida, e as pessoas com disfunções cognitiva, motora ou sensorial podem
apresentar dificuldades na sua realização.
A PC é uma lesão estática, ocorrida no perı́odo pré, peri ou pós-natal,
que afeta o sistema nervoso central em fase de maturação estrutural e
funcional. É uma disfunção sensoriomotora que envolve distúrbios no tônus
muscular, na postura e na movimentação voluntária (Mancini et al., 2002).
Os distúrbios caracterizados pela falta de controle sobre os movimentos,
como a PC, resultam em deformidades ósseas, interferem e comprometem
o processo de aquisição de habilidades e dificultam o desempenho nas ati-
vidades cotidianas (Mancini et al., 2004). Assim, tem-se a necessidade de
utilizar meios facilitadores nas AVD’s como a TA.
O uso da TA deve ser introduzido logo após a detecção de dificuldades
observadas na realização das atividades ou através das informações colhidas
com os familiares. Para que isto ocorra, cabe ao profissional inserido na
equipe interdisciplinar, encaminhar o paciente para avaliação do terapeuta
ocupacional. Desta forma, a prescrição adequada da TA torna efetiva a
funcionalidade e a qualidade de vida da pessoa com PC e de seus familiares.
Considerando a abordagem da TA, este estudo objetivou identificar e
revisar a literatura sobre as adaptações funcionais que favorecem as AVD’s
dos indivı́duos com PC, bem como a relação entre estes e seus familiares.
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 127

2. Fundamentação Teórica
A atuação da Terapia Ocupacional ocorre na análise e na interpretação das
etapas de execução da atividade, por intermédio da observação, da avali-
ação e do relacionamento do desempenho funcional da demanda atendida
com o produto utilizado. As atividades abordadas se referem a todas as
áreas do cotidiano, como as atividades de casa, da escola, do trabalho e do
lazer (Ribeiro, 2007).
Uma das atribuições do terapeuta ocupacional é de identificar as dificul-
dades nos aspectos motores, cognitivos, sensoriais e psı́quicos envolvidos na
utilização do produto, bem como todos os mecanismos de acessibilidade ao
mesmo (Marins & Emmel, 2011). Para isto, se avalia, planeja e apresenta
resultados que compatibilizem as necessidades, as habilidades e as condi-
ções de desempenho com a concepção e o planejamento do produto. Desta
forma o terapeuta ocupacional promove desempenho e funcionalidade para
os usuários, condições de participação social e qualidade de vida.
A TA é um recurso que auxilia ou promove a ampliação de uma ha-
bilidade funcional deficitária, ou possibilita o aumento da autonomia e a
realização de uma função impedida por circunstância da deficiência (Bax
et al., 2005).
O programa de certificação em aplicações da TA, ATACP da California
State University Northridge, College of Extended Learning and Center on
Disabilities, a classifica em categorias: auxı́lios para vida diária e prática,
comunicação aumentativa e alternativa, recursos de acessibilidade ao com-
putador, sistemas de controle de ambiente, projetos arquitetônicos para
acessibilidade, órteses e próteses, adequação postural, auxı́lios de mobili-
dade, auxı́lios para cegos, auxı́lios para pessoas com surdez ou com déficit
auditivo, e adaptações em veı́culo (Comitê de Ajudas Técnicas, 2011).
As nomenclaturas de TA tendem atualmente a uma categorização base-
ada na abordagem funcional. Porém, a funcionalidade deve ser entendida
em um sentido maior do que apenas a habilidade em realizar tarefas de
interesse. Deve-se realizar avaliação e intervenção nas funções e estruturas
do corpo, nas atividades e participação e nos fatores contextuais ambientais
e pessoais (Farias & Buchalla, 2005).
As disfunções da pessoa com PC envolvem partes distintas do corpo.
Isto resulta em classificações topográficas especı́ficas: hemiparesia (acome-
timento de um hemı́dio do corpo, quando geralmente o membro superior é
mais afetado que o inferior), diparesia (acometimento principalmente dos
membros inferiores) ou tetraparesia (quando afeta todos os membros). Ou-
tro tipo de classificação baseia-se nas alterações clı́nicas do tônus muscular
e no tipo de desordem do movimento, que podem produzir os tipos espás-
tico, atetóide, atáxico, hipotônico ou misto (Mancini et al., 2002).
Além das alterações do tônus e do comprometimento dos seguimentos
corporais, a pessoa com PC tende a utilizar mecanismos compensatórios
128 Almeida & Lima

para vencer a força da gravidade. Assim, utiliza grupos musculares que ha-
bitualmente não estão envolvidos na ação, para alcançar a estabilidade que
originalmente lhe falta, devido ao déficit de controle postural de tronco.
Consequentemente ocorrem os desequilı́brios musculares, as deformidades
e o aumento da hipertonia. Este conjunto de ocorrência prejudica o indivı́-
duo com PC no desenvolvimento de suas atividades (Mancini et al., 2004;
Teixeira et al., 2003; Oliveira et al., 2008). Ainda, há casos em que as
sequelas da PC se agravam pelas dificuldades destas pessoas em explorar
o meio e comunicar-se com o mundo externo (Cury et al., 2006).
Devido às vastas possibilidades de quadros motores da PC, é necessá-
rio realizar uma avaliação criteriosa do aspecto motor, cognitivo e sensorial
destes indivı́duos, para a detecção das disfunções e a prescrição e confecção
dos dispositivos adequados. Neste processo a interdisciplinaridade torna-se
necessária, e o terapeuta ocupacional contribui com seu conhecimento espe-
cı́fico para melhora da funcionalidade, autonomia pessoal e social daqueles
que estão com o desempenho de sua vida ocupacional comprometido.
Na TA, a Terapia Ocupacional realiza as indicações, confecções e adap-
tações adequadas. O terapeuta ocupacional treina o paciente no uso e no
manuseio do equipamento, bem como orienta os familiares e demais mem-
bros da equipe terapêutica no uso adequado e correto da TA prescrita,
Assim, a TA adquire sucesso e eficiência durante seu uso (Rodrigues, 2000;
Oliveira, 2002; Pelosi, 2005; Trombly & Radomski, 2005).

3. Métodos
Este estudo caracterizou-se como do tipo exploratório, baseado em revisão
da literatura. Realizou-se busca nas seguintes bases de dados: LILACS,
SciELO, MEDLINE e BIREME, e definiu-se o perı́odo compreendido entre
os anos de 2000 e 2011 para a seleção das publicações relativas ao tema.
Além dos artigos de periódicos, buscou-se artigos publicados em livros e
algumas páginas comerciais da internet.
A pesquisa foi limitada aos idiomas português e inglês, e os artigos fo-
ram selecionados pela leitura de seu tı́tulo e resumo. Para a seleção dos
artigos foi necessário agregar assuntos correlacionados a Terapia Ocupaci-
onal, TA, AVD’s e PC. Houve também a inclusão de artigos de áreas do
conhecimento que são correlatas ao tema, como fisioterapia, engenharia,
ciências da computação e pedagogia.
Após a seleção dos artigos, realizou a análise e a definição dos disposi-
tivos a serem demonstrados nesta pesquisa. Como critério de inclusão dos
dispositivos considerou-se a disponibilidade de ilustração.
Identificou-se as categorias de TA e selecionou-se modelos diferencia-
dos de adaptações, para que não houvessem sobreposições e repetição de
conteúdo.
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 129

4. Resultados e Discussão
Na prática da Terapia Ocupacional utiliza-se o termo “recurso terapêutico”
para designar todo e qualquer dispositivo que vise a aquisição ou a am-
pliação de autonomia e independência de um indivı́duo em suas ações do
cotidiano (Watanabe et al., 2003).
Durante a pesquisa foram encontrados 32 trabalhos relacionados ao
tema abordado. Dentre estes, 1 dissertação de mestrado, 16 artigos, 1
anais de congresso, 8 artigos de livros e 5 sites da internet.
Foi necessário utilizar as ilustrações dos recursos de tecnologias assisti-
vas provenientes de materiais comercializados e industriais, pois há poucos
materiais ilustrativos nas bases de dados cientı́ficas.
Nos trabalhos encontrados, 16 continham figuras, com um total de
69 ilustrações. Houve 22 adaptações para alimentação, 8 para vestuário,
10 para higiene e cuidados pessoais, 7 para banheiro e toalete, e 22 para
comunicação (acesso ao computador e escrita).
No entanto, o processo de tratamento em Terapia Ocupacional no que
se refere a adaptações, não envolve somente o conhecimento e a indicação
em si. Para que haja o uso funcional da TA é necessário considerar a análise
da tarefa, a identificação do problema, o reconhecimento dos princı́pios de
compensação, as propostas de solução, o conhecimento de recursos alter-
nativos para a solução do problema, a verificação periódica da adaptação
e o treinamento (Teixeira et al., 2003).
Além do conhecimento destes aspectos é importante que o terapeuta
ocupacional tenha alguns cuidados no processo de indicação de uma adap-
tação, como: a terapia não deve ser substituı́da pela adaptação, o paciente
e o terapeuta não podem se tornar dependentes da mesma e negligenciar
a evolução do desenvolvimento voluntário normal, a adaptação deve ser
acompanhada por um profissional da área e caso o paciente não esteja mais
em terapia os familiares devem ter a consciência de que o paciente e sua
adaptação precisam ser avaliados periodicamente, e a adaptação não pode
causar desconforto e nem dificultar a rotina dos familiares e cuidadores
(Crepeau et al., 2003).
No processo de prescrição de qualquer recurso de TA é necessário en-
focar os objetivos de tratamento nas ocupações significativas ao paciente
e nos hábitos familiares. Somente desta forma o paciente atingirá o maior
grau de funcionalidade em suas atividades cotidianas (Teixeira et al., 2003).
As ilustrações de adaptações mostradas neste capı́tulo podem ser uti-
lizadas como exemplo e modelo para a criação de outras que poderão ser
confeccionadas com material alternativo e de acordo com a criatividade de
cada terapeuta ocupacional. Porém, salienta-se que toda a adaptação deve
ser antropometricamente planejada e individualizada.
130 Almeida & Lima

4.1 Dispositivos para alimentação


No quesito alimentação, as Figuras 1 a 22 ilustram facilitadores de preen-
são, talheres angulados que facilitam o trajeto da colher à boca, substitutos
de preensão que são utilizados com pessoas com dificuldade na manutenção
da preensão, pratos com ventosas ou bordas elevadas que facilita a retirada
do alimento, modelos de copos com duas alças que favorecem a bimanua-
lidade e a simetria em hemiparéticos, e copos com bordas recortadas que
facilitam o controle da extensão cervical e a dosagem de lı́quido.
Ressalta-se que para melhor autonomia na alimentação a pessoa primei-
ramente deve estar posicionada adequadamente e, para isto, deve adquirir
recursos de alinhamento postural como cadeira de posicionamento, cadeira
e mesa de chão ou ainda, cadeira de rodas adaptada.

Figura 1. Talheres engrossados. Figura 2. Colher pré-fabricada.


Adaptado de MN (2010). Adaptado de Bersch (2008).

Figura 4. Adaptadores. Adaptado


Figura 3. Talheres com peso. de Sanville Produtos Ortopéditos
Adaptado de MN (2010). e Terapêuticos Ltda (2011).
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 131

Figura 5. Substituição de preensão Figura 6. Substituição de preensão


com suporte. Adaptado de MN sem suporte. Adaptado de MN
(2010). (2010).

Figura 7. Engrossador em EVA e Figura 8. Colher adaptada em


substituição de preensão em PVC. Adaptado de Siaulys et al.
elástico. Adaptado de Siaulys (2010).
et al. (2010).

Figura 9. Engrossador em EVA. Figura 10. Borda artesanal.


Adaptado de Siaulys et al. (2010). Adaptado de Siaulys et al. (2010).
132 Almeida & Lima

Figura 12. Contentor de


Figura 11. Prato com bordas alimentos. Adaptado de MN
elevadas. Adaptado de MN (2010). (2010).

Figura 13. Prato com ventosa. Figura 14. Suporte para canudo.
Adaptado de Teixeira et al. (2003). Adaptado de MN (2010).

Figura 16. Copo com facilitação


Figura 15. Copo com recorte. de preensão. Adaptado de MN
Adaptado de MN (2010). (2010).
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 133

Figura 17. Copo com alças. Figura 18. Alça para copo.
Adaptado de MN (2010). Adaptado de Teixeira et al. (2003).

Figura 19. Mesa recortada.


Adaptado de Instituto de Figura 20. Suporte em madeira.
Tecnologia Social (2008). Adaptado de Teixeira et al. (2003).

Figura 21. Mesa Adaptada em Figura 22. Cadeira com mesa em


PVC. Adaptado de Gasparini & PVC. Adaptado de Gasparini &
Zoratti (2009). Zoratti (2009).
134 Almeida & Lima

4.2 Vestuário
As Figuras 23 a 30 apresentam as adaptações para vestuário. Na PC a
habilidade de manipular os complementos do vestuário, como zı́per, botão
e cadarço, nem sempre é realizada funcionalmente. Assim, há exemplos
com adaptações em velcro embutido ou por complementos que permitem
a autonomia na tarefa por meio de preensões grossas.

Figura 23. Adaptação para zı́per. Figura 24. Adaptação para botão.
Adaptado de Bersch (2008). Adaptado de Teixeira et al. (2003).

Figura 25. Camisa com velcro. Figura 26. Calça com velcro.
Adaptado de Teixeira et al. (2003). Adaptado de Teixeira et al. (2003).

Figura 27. Adaptação para calçar Figura 28. Gancho para vestuário.
meia. Adaptado de MN (2010). Adaptado de MN (2010).
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 135

Figura 29. Cadarço com mola. Figura 30. Cadarço elástico.


Adaptado de Teixeira et al. (2003). Adaptado de MN (2010).

4.3 Higiene e cuidados pessoais


Nas Figuras 31 a 40 se apresenta os adaptadores para atividades de higiene
e cuidados pessoais. Há adaptações com cabos engrossados, cabos longos,
substituidores de preensão, mobiliário inclinado para banho, suporte para
banheira em PVC.

Figura 31. Substituição de Figura 32. Substituição de


preensão. Adaptado de Instituto preensão. Adaptado de Teixeira
de Tecnologia Social (2008). et al. (2003).

Figura 33. Adaptação para fio


dental. Adaptado de Teixeira Figura 34. Escova com cabo longo.
et al. (2003). Adaptado de MN (2010).
136 Almeida & Lima

Figura 35. Adaptação para


preensão. Adaptado de Teixeira Figura 36. Escova com alça.
et al. (2003). Adaptado de Teixeira et al. (2003).

Figura 37. Cadeira inclinada em Figura 38. Motoca em PVC para


PVC para banho. Adaptado de banho. Adaptado de Gasparini &
Gasparini & Zoratti (2009). Zoratti (2009).

Figura 40. Suporte de banho.


Figura 39. Cadeira para banho. Adaptado de Siaulys et al. (2010).
Adaptado de Siaulys et al. (2010).

4.4 Adaptações para banheiro e toalete


Nas Figuras 41 a 47 são apresentadas as adaptações para banheiro e toa-
lete. Há exemplos como penico adaptado em caixa de papelão, mobiliário
em PVC e, ainda, as cadeiras comercializadas para uso do sanitário com
autonomia.
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 137

Figura 41. Adaptação para penico Figura 42. Adaptação para penico
em papelão. Adaptado de Levitt dentro de banco virado. Adaptado
(1997). de Levitt (1997).

Figura 43. Cadeira sanitária em Figura 44. Cadeira sanitária em


PVC com bandeja. Adaptado de PVC sem bandeja. Adaptado de
Gasparini & Zoratti (2009). Gasparini & Zoratti (2009).

Figura 45. Urinol. Adaptado de MN (2010).


138 Almeida & Lima

Figura 46. Assento de vaso. Figura 47. Cadeira higiênica.


Adaptado de Sanville Produtos Adaptado de Sanville Produtos
Ortopéditos e Terapêuticos Ltda Ortopéditos e Terapêuticos Ltda
(2011). (2011).

4.5 Adaptações para a comunicação escrita


A comunicação por meio da escrita está frequentemente alterada na pessoa
com PC, pois a habilidade necessária ao grafismo depende do refinamento
da função manual. Isto reforça a importância das adaptações para melhorar
esta atividade. As adaptações que possibilitam o grafismo estão represen-
tadas nas Figuras 48 a 53. Há exemplos de engrossadores de lápis e giz de
cera, substituidores de preensão palmar ou trı́pode, cavalete e dispositivos
de posicionamento para membro contralateral.

Figura 48. Adaptação para lápis


Figura 49. Pincel adaptado em
em madeira. Adaptado de
cone. Adaptado de Instituto de
Instituto de Tecnologia Social
Tecnologia Social (2008).
(2008).
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 139

Figura 50. Aranha mola.


Adaptado de Sanville Produtos Figura 51. Adaptação para giz de
Ortopéditos e Terapêuticos Ltda cera. Adaptado de Bersch (2008).
(2011).

Figura 53. Recurso para


Figura 52. Cavalete. Adaptado de posicionamento de membro
Teixeira et al. (2003). contralateral. Adaptado de
Teixeira et al. (2003).

4.6 Comunicação alternativa


Nas Figuras 54 e 55 ilustra-se dois exemplos de pranchas de comunicação
que podem ser utilizadas com pessoas que apresentam defasagem na fala
ou escrita funcional. A Figura 55 ilustra uma prancha de comunicação
construı́da com simbologia gráfica, já a Figura 54 ilustra um vocalizador de
alta tecnologia. Ambos favorecem grande eficiência à função comunicativa.

4.7 Adaptações para acesso ao computador


Os recursos para acessibilidade ao computador são ilustrados nas Figuras 56
a 69. São ilustradas ponteiras e órteses para digitação, teclados modifica-
dos e virtuais, mouses adaptados e diversos acionadores. Enfatiza-se que
no processo de adaptação é importante que o terapeuta esclareça à famı́lia
as etapas da atividade a serem realizadas em casa. É necessária a revisão
140 Almeida & Lima

Figura 55. Prancha de


Figura 54. Vocalizador. Adaptado
comunicação. Adaptado de
de Bersch (2008).
Schirmer et al. (2007).

constante das adaptações e dos equipamentos. Estes podem ser substituı́-


dos ou gradualmente suspensos à medida que se ganha autonomia (Teixeira
et al., 2003).

Figura 56. Ponteira para


Figura 57. Órtese para digitação.
digitação. Adaptado de Instituto
Adaptado de Bersch (2008).
de Tecnologia Social (2008).

5. Considerações Finais
O foco desta revisão foi identificar e demonstrar as adaptações que po-
dem ser utilizadas no tratamento de pessoas com PC para a promoção da
participação e a facilitação nas AVD’s.
Os resultados encontrados evidenciam a disponibilidade de diferentes
tipos de adaptações e a presença de informações relevantes sobre a relação
da adaptação com o contexto ambiental em que a pessoa está inserida.
Percebe-se que somente o uso da adaptação não implicará no alcance de
maior independência nas AVD’s. É necessário conhecer as caracterı́sticas
dos diferentes ambientes em que a pessoa está inserida, para identificar as
barreiras e os facilitadores do desempenho funcional, e modificá-los quando
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 141

Figura 58. Órtese para digitação


Figura 59. Pulseira de peso.
com estabilizador de punho e
Adaptado de Galvão Filho &
abdutor de polegar. Adaptado de
Damasceno (2008).
Ferrada (2009).

Figura 60. Teclado sensı́vel.


Figura 61. Mouse adaptado.
Adaptado de Schirmer et al.
Adaptado de Bersch (2008).
(2007).

Figura 62. Acionador adaptado


para pé. Adaptado de Ferrada Figura 63. Acionadores. Adaptado
(2009). de Schirmer et al. (2007).

necessário. Além disto, deve haver acompanhamento constante do paciente


e de sua adaptação pelo terapeuta ocupacional, pois as indicações se mo-
dificam com a evolução do caso e o tratamento globalizado.
Os modelos exemplificados orientam o padrão de adaptação em alguns
casos, entretanto a heterogeneidade das deformidades ou as limitações in-
dividuais exigem que o terapeuta ocupacional treine a utilização da TA e
142 Almeida & Lima

Figura 64. Mouse adaptado em Figura 65. Teclado Amigo.


fichário. Adaptado de Oliveira Adaptado de Borges & Watanabe
(2002). (2001).

Figura 67. Teclado virtual livre.


Figura 66. Teclado Comunique. Adaptado de Jordan et al. (2009).
Adaptado de Pelosi (2005).

Figura 68. HeadDev. Adaptado de


Instituto de Tecnologia Social
(2008).
Figura 69. Camera mouse.
Adaptado de Instituto de
Tecnologia Social (2008).
Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com PC 143

a aperfeiçoe. Estes princı́pios, quando bem aplicados, promovem o equi-


lı́brio da adaptação, tornam a mesma adequada ao paciente e evitam o
surgimento de lesões.
Ressalta-se que os exemplos ilustrados são comercializados sem a ne-
cessidade da prescrição profissional. Porém deve-se ter cautela, pois o uso
da TA sem a indicação terapêutica adequada pode atrapalhar o desenvolvi-
mento do indivı́duo, predispor a alterações das valências fı́sicas e prejudicar
ainda mais o seu comportamento motor.
A TA deve ser entendida como um recurso do usuário e não do pro-
fissional ou de uma área especı́fica de atuação. Este recurso serve para a
pessoa com necessidades especiais que necessita desempenhar funções do
cotidiano de forma participativa, ou, como facilitador para os familiares
desta pessoa. O uso da TA proporciona maior independência, evita de-
formidades, favorece o posicionamento adequado e a execução das AVD’s,
auxilia na comunicação, e contribui como facilitador para a famı́lia quando
seus membros precisam desempenhar as tarefas para o indivı́duo com PC.
O trabalho em conjunto de profissionais com especialidades distintas
permite identificar e integrar o tratamento das disfunções e repercussões
no cotidiano de pessoas com PC. Desta forma a troca contı́nua de infor-
mações entre estes profissionais é de suma importância para que os dispo-
sitivos de TA cumpram sua função, sejam revistos quando necessário, e,
proporcionem funcionalidade e qualidade de vida às pessoas com disfunções
decorrentes da PC.

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146 Almeida & Lima

Notas Biográficas
Cristina Antunes de Almeida é Terapeuta Ocupacional (ACE, 2004),
Especialista Reabilitação do Membro Superior – Terapia da Mão (IBRATE,
2007) e Especialista em Neurologia com ênfase em Neuropediatria (IBRATE,
2010). Atualmente é Terapeuta Ocupacional da Associação do Deficiente Motor
(Curitiba, PR) e da Associação Franciscana de Educação ao Cidadão Especial
(Curitiba, PR).

Paula Valéria da Costa Lima é Terapeuta Ocupacional (Universidade


de Sorocaba, 2003). Atualmente é Terapeuta Ocupacional do Instituto de
Neurologia de Curitiba, PR.
Capítulo 8

Adequação de Mobiliário e Controle Postural


da Criança com Paralisia Cerebral

Lígia Maria Presumido Braccialli, Franciane Teixeira de Oliveira Codogno∗

Resumo: Sabe-se que o mobiliário adaptado é muito importante


para a postura sentada adequada de crianças com paralisia cerebral.
Este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão sistemática
da literatura sobre controle postural e mobiliário adaptado para in-
divı́duos com paralisia cerebral. Foi realizada uma revisão sobre a
temática nas bases de dados: Scopus, BIREME e SciELO. A par-
tir da literatura consultada foi possı́vel descrever a importância do
posicionamento adequado para o sentar de indivı́duos com paralisia
cerebral. Concluiu-se também que esta adequação faz com que o
indivı́duo tenha uma postura melhor e consequentemente melhore
sua qualidade de vida.

Palavras-chave: Educação especial, Paralisia cerebral, Mobiliário,


Equilı́brio postural.

Abstract: Adapted furniture is very important for an adequate sit-


ting posture of children with cerebral palsy. This study aimed at
conducting a systematic literature review about postural control and
adapted seats for individuals with cerebral palsy. A review of the
literature about the subject was done in the following databases: BI-
REME, Scopus and SciELO. Based on this search, it is possible to
point out the importance of an adequate positioning in the seat of
individuals with cerebral palsy. Also, this adjustment means that
the individual has a better posture and, consequently, improvement
in his quality of life.

Keywords: Special education, Cerebral palsy, Furniture, Postural


balance.

∗ Autor para contato: fisiofran2003@yahoo.com.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


148 Braccialli & Codogno

1. Introdução
Evidências mostram que a capacidade do controle postural durante o de-
senvolvimento tı́pico é refinada nos 10 primeiros anos de vida de crianças
(Barela et al., 2000).
O controle neural da postura ocorre em dois nı́veis. O primeiro nı́vel se
refere a perturbações da postura sentada que induzem a oscilação corporal
para frente. Tal como o movimento de alcance, estas perturbações serão
sempre acompanhadas por atividade dos músculos posturais dorsais. No
entanto, perturbações que induzem uma oscilação do corpo para trás são
acompanhadas por atividade dos músculos ventrais (de Graaf-Peters et al.,
2007). O segundo nı́vel envolve a participação e integração dos sistemas
sensorial, vestibular e visual para que ocorra a modulação dos estı́mulos.
Em crianças com paralisia cerebral (PC), o déficit no controle postural
pode estar vinculado à dificuldade de controlar o grau de contração dos
músculos posturais durante a execução de uma tarefa especı́fica, principal-
mente naquelas crianças com comprometimento espástico bilateral (Heide
& Hadders-Algra, 2005). Isto ocorre devido à ativação estereotipada e não-
variável dos músculos ventrais, uma disfunção na ordem do recrutamento
muscular e um grau excessivo de co-ativação dos antagonistas nas articu-
lações proximais (Carlberg & Hadders-Algra, 2005; Gan et al., 2008; de
Graaf-Peters et al., 2007; Heide & Hadders-Algra, 2005).
O déficit no controle postural é um dos maiores problemas enfrentados
por crianças com PC (de Graaf-Peters et al., 2007; Hatta et al., 2007; La-
coste et al., 2006; Liao et al., 2003; McDonald et al., 2007; Vekerdy, 2007),
pois frequentemente limita o desempenho de muitas atividades. Tal limita-
ção ocorre na mobilidade, na comunicação, nos relacionamentos interpesso-
ais, no cotidiano em geral (Hadders-Algra et al., 1999) e na aprendizagem
(Vekerdy, 2007).
O gerenciamento do controle postural de crianças com paralisia cerebral
é um dos aspectos mais importantes a ser considerado durante a intervenção
terapêutica, pois pode prevenir deformidades de coluna, como a escoliose
(Gericke, 2006; Hatta et al., 2007; Vekerdy, 2007), e de membros superiores
e inferiores. Além disto, pode prevenir a formação de úlceras de pressão
(McDonald et al., 2007), melhorando sua qualidade de vida. A preocupa-
ção de clı́nicos e pesquisadores com os fatores que interferem ou contribuem
para este gerenciamento resultou, em 2006, no Encontro Multidisciplinar
de Mac Keith. Este evento estabeleceu o seguinte consenso: o programa
de gerenciamento do controle postural é uma abordagem planejada, que
engloba todas as atividades e intervenções provocadoras de impacto sobre
a postura e função do indivı́duo. Os programas são adaptados especifica-
mente para cada criança e podem incluir assentos especiais, suportes para
dormir, suportes para posicionamento em pé, exercı́cios ativos, órteses,
intervenções cirúrgicas, e sessões de terapia individual (Gericke, 2006).
Adequação de mobiliário e controle postural da criança com PC 149

Portanto, este trabalho tem o objetivo de realizar uma revisão siste-


mática da literatura sobre o controle postural e mobiliário adaptado para
indivı́duos com paralisia cerebral. Pretende-se, como objetivos especı́ficos,
identificar como as propriedades fı́sicas do mobiliário interferem no controle
postural de crianças com paralisia cerebral e verificar como as adequações
de mobiliário se relacionam com o desempenho motor de membros superi-
ores nestes indivı́duos.

2. Fundamentação Teórica
A dificuldade apresentada pela criança com PC no controle postural re-
sulta em um desempenho funcional com membros superiores ineficazes, em
relação ao alcance, preensão e deslocamento de objetos.
Crianças com PC espástica gastam mais tempo para execução de mo-
vimentos de alcance que exigem precisão. Portanto, a espasticidade está
correlacionada com o tempo de execução do movimento: quanto maior a
espasticidade, maior o tempo gasto para sua execução (Chang et al., 2005).
Para os mesmos autores, a suavidade do movimento de alcance tem rela-
ção com o tamanho do objeto a ser alcançado e, portanto, com a precisão
necessária para a execução do movimento.
Para Mackey et al. (2006), parece ser improvável que a diferença de
controle motor distal em indivı́duos com PC espástica seja o único fator que
contribui para o aparecimento de assimetrias na velocidade do movimento.
Os autores sugerem que outras possı́veis causas destes déficits possam ser
uma combinação de fraqueza muscular e fadiga, associada ao excesso de co-
contração muscular e falta de capacidade em gerar força muscular suficiente
para a execução do movimento.
Crianças com PC espástica têm mais dificuldade para soltar o objeto do
que para realizar o alcance, o transporte ou a preensão do objeto. O mem-
bro superior comprometido consome um tempo significativamente maior
para soltar um objeto. Estas crianças, durante o alcance de um alvo,
realizam uma flexão de tronco exagerada para compensar o movimento di-
minuı́do de flexão de ombro (Coluccini et al., 2007). Elas também realizam
movimentos exagerados de flexão e lateralização de tronco para compensar
a limitação de amplitude de movimento de supinadores de antebraço e ex-
tensores de cotovelo, necessários para realizar o alcance e preensão de um
objeto (Kreulen et al., 2007).
Choi & Mark (2004) afirmaram que o alcance e a preensão não são
apenas influenciados pela distância no espaço que se localiza o objeto a ser
alcançado e apreendido e pelo seu tamanho e peso, mas também pela força
que será necessária para o desempenho de tal execução.
Para realizar o movimento de alcance de um objeto, é necessário não só
um movimento coordenado de tronco e membros superiores, mas também
uma contribuição ativa de membros inferiores para suportar e equilibrar
150 Braccialli & Codogno

a massa corpórea. Fatores como a direção e a distância do alcance e a


extensão do apoio fornecido na coxa podem interferir na estabilidade do
indivı́duo (Dean et al., 1999).
A partir destas considerações, a execução de uma atividade de alcance
e preensão de forma bem sucedida pelo individuo com PC tem relação com
o tipo de mobiliário utilizado.
Deste modo, uma intervenção comum utilizada para melhorar o con-
trole postural, a mobilidade sentada e o desempenho funcional de membros
superiores de pessoas com PC é a indicação e prescrição de dispositivos de
suporte postural adequado.
Estudos mostram que a cadeira adequadamente indicada para a criança
com PC compensa a falta de estabilidade postural, aperfeiçoa as habilida-
des funcionais de membros superiores, as habilidades de comunicação e de
alimentação, a coordenação olho-mão, o controle de cabeça e a manutenção
de postura de cada indivı́duo, otimizando como um todo o seu potencial
(Vekerdy, 2007).
Para Lampe & Mitternacht (2010), o posicionamento inadequado pode
gerar o desenvolvimento de uma extensão exagerada de quadril e a tendên-
cia de sentar-se sob o sacro. Como consequência pode haver hipotonia dos
músculos dorsais, o desenvolvimento de uma escoliose e perda da função
do sentar. Por isto, crianças com paralisia cerebral necessitam de equipa-
mentos especı́ficos para permanecerem na postura sentada, por conta de
suas dificuldades motoras já explicitadas.

2.1 Estudos sobre mobiliários adaptados


Na literatura, são encontrados estudos sobre mobiliários: quanto às mu-
danças de inclinação de assento e encosto e a relação com o desempenho
de membros superiores, quanto às mudanças na inclinação do assento e
mudanças na inclinação da mesa, relacionadas ao desempenho manual e à
melhor postura de indivı́duos com PC.
Dupuis et al. (1991) observaram que o sistema de assento com suporte
torácico e sacral é efetivo na distribuição da massa corporal superior e,
melhora significantemente a postura sentada de crianças com paralisia ce-
rebral. A cadeira para uma criança com paralisia cerebral deve ter encosto
baixo, apoio convexo em região lombar, órtese abdutora de coxa com fixa-
ção de joelho e apoio para os pés (Ratliffe, 2000).
Sochaniwskyj et al. (1991) também analisaram a inclinação do assento,
com respeito à função de membros superiores de crianças com paralisia
cerebral. Estes autores verificaram que a inclinação do assento de 0 a 15
graus anterior melhorou o controle postural e possibilitou a liberação das
mãos das crianças para realizar atividades.
Myhr & von Wendt (1993) pesquisaram os efeitos, em crianças com
PC, de várias inclinações no assento da cadeira e a utilização de órteses
Adequação de mobiliário e controle postural da criança com PC 151

abdutoras em músculos posteriores dos membros inferiores durante a reali-


zação de tarefas com os membros superiores. Os resultados indicaram que
o uso da órtese abdutora e as inclinações do assento horizontal e inclinado
anteriormente diminuem a atividade muscular dos membros inferiores e
melhoram a função de membros superiores.
Myhr & von Wendt (1990) realizaram um trabalho com crianças com
PC para verificar a dinâmica dos segmentos corporais e o posicionamento
espontâneo de membros superiores e inferiores em diferentes posições senta-
das. Os resultados encontrados revelaram que, quando houve a inclinação
do assento, os pés das crianças mantiveram-se em posição anterior à ar-
ticulação dos joelhos. Não foram encontradas diferenças significativas na
função de mãos com a inclinação do assento.
Stavness (2006) estudou a melhora da função de membros superiores
em relação à postura sentada e observou que a função de mãos melhora em
uma inclinação de neutra a leve (10o ) anterior da cadeira como um todo.
Michael et al. (2007) também estudaram os efeitos da inclinação do
assento em indivı́duos com desordens neurológicas e neuromusculares que
não possuı́am marcha. Foi realizada uma revisão sistemática e foi concluı́do
que a inclinação posterior pode reduzir a pressão de contato na região de
quadril.
Hadders-Algra et al. (2007) observaram se a inclinação do assento me-
lhora a função motora de crianças com PC, no controle postural e na qua-
lidade do alcance. Como resultados encontraram que o controle postural
e a qualidade do alcance de crianças com paralisia espástica unilateral fo-
ram beneficiadas pela inclinação anterior, e crianças com paralisia espástica
bilateral foram beneficiadas pela posição sentada horizontal.
Vekerdy (2007) investigou um tipo de assento especial, com o uso de
uma órtese tóraco-lombo-sacral, em crianças com PC sem marcha. Foi
concluı́do que a órtese foi capaz de melhorar a postura e, consequentemente,
a alimentação destas crianças.
Hatta et al. (2007) estudaram o polimorfismo fisiológico de usuários de
cadeira de rodas com paralisia cerebral e proprietários do Seating Buggy
(assento de carrinho de bebê). Como resultados foram encontrados que o
Seating Buggy ofereceu uma postura adequada. Neste estudo foi sugerido
que a profundidade ajustada do suporte torácico e a distância do suporte
lombar estavam relacionadas com o resultado satisfatório do alinhamento
de cabeça e pescoço e equilı́brio de indivı́duos com paralisia cerebral grave.
Braccialli et al. (2008) estudaram a influência da flexibilidade da su-
perfı́cie de assento da cadeira na velocidade e no tempo despendido por
alunos com PC espástica durante a execução de uma tarefa de manuseio.
Concluı́ram que o assento de um mobiliário escolar para um aluno com PC
espástica não deve ser confeccionado com material muito flexı́vel, pois a
base instável pode dificultar o desempenho destes alunos.
152 Braccialli & Codogno

Oliveira & Braccialli (2008) analisaram o desempenho de alunos com


PC espástica durante a realização de atividades em dois tipos de assentos:
lona e madeira. Com o trabalho foi possı́vel concluir que maioria dos
participantes obteve maior pontuação no assento de lona. Além disto, a
distribuição topográfica da paralisia cerebral influenciou na realização das
atividades.
Cimolin et al. (2009) observaram que, para melhorar a estabilidade
postural de indivı́duos com PC distônica, é importante o uso de um assento
dinâmico. Em seu estudo, um experimento para a aquisição do movimento
durante um padrão extensor em um sistema de assento foi elaborado e
aplicado a um grupo de indivı́duos distônicos. O objetivo era comparar
um sistema dinâmico versus um sistema de assento rı́gido, por meio da
análise quantitativa do movimento. O sistema de assento na configuração
dinâmica foi capaz de reduzir o padrão extensor, bem como aumentar o
movimento na direção ântero-posterior. Isto fez com que o tronco não
escorregasse na cadeira e melhorasse a função de membros superiores.
Cherng et al. (2009) também verificaram a influência da inclinação do
assento no alcance de crianças com PC. Neste estudo as crianças permane-
ciam sentadas estaticamente e em seguida realizavam um alcance. Posteri-
ormente, sentavam-se em uma cadeira com inclinação de assento anterior e
posterior. Com isto, pôde ser observado que o alcance com inclinação afe-
tou a estabilidade postural destas crianças, principalmente na inclinação
posterior.
Rigby et al. (2009) observaram o impacto de dois sistemas de adaptação
de assento no desempenho de crianças com PC. Os sistemas de adaptação
eram: um suporte de assento para chão ou cadeira e um para o controle
postural no banheiro. Como conclusão do estudo, relataram que os pais
observaram melhor engajamento nas tarefas de auto-cuidado no dia-a-dia
e no brincar com o auxı́lio dos sistemas de adaptação.
Em outro estudo, Ryan et al. (2009) também observaram o impacto de
dois sistemas de adaptação do assento no desempenho de crianças jovens
com paralisia cerebral, de 2 a 7 anos. Os sistemas de adaptação eram:
um suporte de assento para chão ou cadeira e um para o controle postural
no banheiro. Foi verificado que a introdução de dispositivos de assentos
adaptáveis para as crianças que precisam de apoio para se sentar teve um
impacto positivo na vida da criança e da famı́lia. No entanto, com a re-
moção dos equipamentos, houve um impacto negativo concomitante sobre
os aspectos essenciais de vida da criança e da famı́lia. Recursos ambientais
tais como assentos e outros dispositivos de tecnologia assistiva podem de-
sempenhar um papel importante na vida das crianças com deficiência fı́sica
e suas famı́lias.
Costigan & Light (2010) investigaram o efeito da postura sentada na
função dos membros superiores para a comunicação alternativa de crianças
Adequação de mobiliário e controle postural da criança com PC 153

com PC. Os resultados mostraram o efeito positivo da adaptação do mobi-


liário no acesso de membros superiores à comunicação alternativa. Houve
melhora de velocidade para acertar os alvos e melhora na fala.
Braccialli et al. (2010) realizaram um estudo para determinar a influên-
cia da flexibilidade no assento da cadeira no pico de pressão e na área de
contato durante a execução de uma tarefa de manuseio na posição sentada
em indivı́duos com PC. As tarefas foram realizadas em uma cadeira com
assento de lona e em uma cadeira com assento de madeira. Os resultados
mostraram que o uso do assento de lona aumentou a área de contato e
diminuiu o pico de pressão, assim como o deslocamento médio-lateral do
centro de pressão na postura sentada foi diminuı́do.
Alguns autores relatam, também, o uso de mesa para apoio e realiza-
ção de atividades, com regulagem de altura e recorte em semicı́rculo (Myhr
et al., 1995; Ratliffe, 2000; Braccialli & Manzini, 2003). Em relação à uti-
lização de uma superfı́cie de apoio para a realização de atividades, Utley
(2007) confirmou que a superfı́cie de apoio influencia na extensão de mem-
bros superiores, o que resultou na melhora da realização da atividade. A
Figura 1 mostra um exemplo de mesa adaptada de policloreto de vinila
(PVC) para crianças com PC.

Figura 1. Mesa adaptada de PVC para crianças com PC.

O mobiliário adaptado deve sempre proporcionar conforto para o usuá-


rio, bem como uma postura adequada, principalmente para indivı́duos com
154 Braccialli & Codogno

PC ou com outro tipo de deficiência fı́sica. Os estudos apontam que um


posicionamento sentado adequado pode trazer inúmeros benefı́cios:
1. a neutralização do tônus muscular anormal;
2. a ampliação das funções do corpo;
3. a prevenção de deformidades músculo-esqueléticas;
4. a prevenção de úlceras de decúbito;
5. a promoção do conforto;
6. a diminuição do cansaço;
7. a facilitação do desenvolvimento normal.
O mecanismo de posicionamento das crianças com paralisia cerebral
começa pela pelve, a qual deve ser acomodada em posição neutra, com
distribuição de peso nas tuberosidades isquiáticas (Braccialli & Manzini,
2003; Teixeira et al., 2003).
O alinhamento postural favorece a estabilidade de tronco e, consequen-
temente, a liberação dos movimentos da cintura escapular. É o tronco que
estabiliza os membros superiores e cintura escapular, para que possam exis-
tir os movimentos seletivos e controlados. Com isto, as mãos ficam livres
para o manuseio de objetos (agarrar e soltar) e ainda propicia o controle
olho-mão.

3. Método
Foi realizada uma revisão da literatura sobre a temática nas seguintes bases
de dados: Scopus (de 1980 a 2011), BIREME (de 1980 a 2011) e SciELO
(de 1980 a 2011). O ano de 1980 foi estabelecido como inicial visto que
na década de 80 o interesse sobre a temática aumentou e vários autores
pesquisaram sobre o assunto. O espaço de 30 anos é um perı́odo adequado
para historiar e verificar as mudanças ocorridas ao longo do tempo.
Para a busca dos artigos foram utilizadas palavras-chaves nos idiomas
inglês e português. No idioma português foram utilizadas as seguintes pala-
vras: mobiliário, mobiliário escolar, mobiliário adaptado, assento, cadeira
adaptada e cadeira escolar. Todas estas palavras foram cruzadas com o
termo “paralisia cerebral”. No idioma inglês foram utilizadas as palavras:
seat, seating, sit, sitting, furniture, postural control, upper extremity, up-
per extremities e upper limb. Da mesma forma, todas as palavras foram
cruzadas com o termo “cerebral palsy”.
Como critério de inclusão das publicações, foram aceitos os artigos que
datavam de 1980 a 2011, com estudos realizados com crianças com PC e
que abordavam o tema adequação de mobiliário ou controle postural na
postura sentada destes indivı́duos.
Adequação de mobiliário e controle postural da criança com PC 155

Os critérios de exclusão das publicações foram: artigos que não se refe-


riam ao assunto, ao ler o resumo ou abstract, ou os que não estavam dentro
da data estabelecida e as revisões sistemáticas.
A seleção dos estudos e a avaliação dos tı́tulos e dos resumos identifi-
cados na busca inicial foram realizadas por dois pesquisadores, de forma
independente e cega, e ambos obedeceram rigorosamente aos critérios de
inclusão e exclusão. Quando o tı́tulo e o resumo não eram esclarecedores,
realizou-se a busca do artigo na ı́ntegra, para não deixar estudos impor-
tantes fora da revisão, conforme preconizam Sampaio & Mancini (2007).

4. Resultados e Discussão
Crianças com PC geralmente apresentam instabilidade na postura sentada,
e a manutenção da estabilidade postural é essencial para a realização da
maioria dos atos motores, principalmente de membros superiores. Por-
tanto, é essencial entender os parâmetros associados à instabilidade postu-
ral de crianças com PC nesta postura (Lacoste et al., 2009).
Várias pesquisas têm mostrado avaliações e adaptações da postura sen-
tada de crianças com PC (Sochaniwskyj et al., 1991; Dupuis et al., 1991;
Reid, 1996; Braccialli & Manzini, 2003; Teixeira et al., 2003).
A literatura aponta convenções a serem adotadas para o sentar de modo
a melhorar a função de membros superiores (Gregorio-Torres, 2006; Mor-
ress, 2006). Estas convenções, conhecidas como “convenções do sentar fun-
cional”, incluem:
1. inclinação da pelve neutra ou anterior, com ângulo de flexão neutra
de quadril;
2. superfı́cies de sustentação de peso que suportam os pés e as coxas;
3. alinhamento vertical do tronco (Creel et al., 2001; Perr, 1998).
As convenções do sentar funcional foram feitas para melhorar o controle
e o movimento de membros superiores de vários modos:
1. pelo estabelecimento de uma base de suporte para acomodar o peso
do corpo, tal que o equilı́brio seja facilmente alcançado e mantido;
2. pelo estabelecimento de uma relação com a estabilidade que facilite
o equilı́brio de tronco e pelve, de modo a agir como base para o
movimento de membros superiores;
3. pelo suporte do movimento pélvico, que complementa e melhora o
movimento de membros superiores;
4. pelo posicionamento individual para melhorar a visualização das
ações dos membros superiores, de tal forma que melhore a coor-
denação olho-mão nas tarefas de precisão (Kangas, 2000; Stavness,
2006).
156 Braccialli & Codogno

Harris & Roxborough (2005) relataram que intervenções na postura


sentada estabilizam a pelve e aumentam a base de suporte no assento, e
isto faz com que o controle postural seja melhorado.
Com relação às diferentes posturas sentadas, Brogren et al. (2001) mos-
traram que a postura sentada com cifose, frequentemente observada em cri-
anças com PC, não é a causa de ajustes posturais anticonvencionais nestas
crianças. Os autores indicaram, ainda, que os ajustes posturais de crianças
com PC espástica não dependem somente da postura sentada, mas também
da severidade do quadro e de sua idade.
No entanto, a cadeira ideal para crianças com PC é aquela que pro-
porciona maior estabilidade postural e, desta maneira, maximiza o grau de
independência funcional nos movimentos de braços e mãos (Myhr & von
Wendt, 1990).
A Figura 2 mostra uma criança com PC sentada adequadamente em
uma cadeira adaptada individualmente.

Figura 2. Criança com PC em uma cadeira adaptada de PVC.

Para sentar-se em uma postura adequada, o aluno deve estar com os


dois pés apoiados no chão e com os joelhos flexionados em ângulo reto de
90o . O assento deve ser suficientemente profundo, de frente para trás, para
apoiar as coxas adequadamente, mas a profundidade não deve interferir na
flexão dos joelhos. O encosto deve prover suporte para a coluna.
Adequação de mobiliário e controle postural da criança com PC 157

A Figura 3 mostra os ajustes posturais que a criança pode realizar com


a utilização de abdutor de coxas, apoio para os pés e mesa para apoios de
braços.

Postura inicial Postura final

Cabeça na linha média


Restauração da
curvatura torácica

Restauração da
curvatura lombar
Anteversão pélvica

Figura 3. Ajustes posturais com a utilização de abdutor para coxas, apoio


para os pés e mesa para apoio dos braços.

Desta forma, a norma NBR 9050/2005 da ABNT (Associação Brasi-


leira de Normas e Técnicas, 2003) estabelece medidas para a construção de
cadeira de rodas:
• largura do assento e do encosto de cadeiras: 0,40 a 0,46 m (metros),
• profundidade do assento: 0,42 a 0,45 m,
• altura dos braços da cadeira até o chão: 0,71 a 0,725 m,
• altura do assento ao chão: 0,49 a 0,53 m,
• altura do apoio dos pés ao chão: 0,07 m,
• largura do assento ao apoio de pé: 0,30 a 0,40 m,
• altura do encosto ao chão: 0,925 m,
• largura de roda a roda: 0,60 a 0,70 m,
• ângulos de 90o entre encosto e assento,
• assento e apoio de pés.
No entanto, o mobiliário ideal é aquele ajustado para cada indivı́duo,
principalmente quando se trata de crianças com PC.
158 Braccialli & Codogno

5. Conclusões
Foram encontrados vários estudos na literatura, entre os anos de 1980 e
2011, sobre mobiliários adaptados. A revisão realizada ressaltou a impor-
tância do posicionamento adequado no sentar de indivı́duos com PC. A
prescrição de um mobiliário deve proporcionar ao usuário estabilidade de
tronco, alı́vio da pressão no assento, não ter dores, não desenvolver úlceras
de pressão e melhorar as funções de membros superiores. Consequente-
mente, tal situação faz com que a qualidade de vida destes indivı́duos
melhore efetivamente.
No entanto, mais trabalhos ainda devem ser realizados com esta popu-
lação, visto que se trata de uma população muito heterogênea e que muitas
variáveis devem ser melhor investigadas.

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Notas Biográficas
Ligia Maria Presumido Braccialli é Fisioterapeuta (UFSCAR, 1983),
Mestre e Doutora em Educação Fı́sica (UNICAMP, 1997 e 2000), Livre-docente
em Reabilitação Fı́sica (UNESP-Marı́lia, 2009). Atualmente é docente do
Departamento de Educação Especial e do Programa de Pós-Graduação em
Educação da UNESP (Marı́lia, SP).

Franciane Teixeira de Oliveira Codogno é Fisioterapeuta (Universidade


de Marı́lia, 2003), Especialista em Intervenção em Neuropediatria (UFS-
CAR, 2005), tem aprimoramento profissional em Fisioterapia Aplicada às
Necessidades da Educação Especial (UNESP-Marı́lia, 2006), é Mestre em
Educação (UNESP-Marı́lia, 2007) e doutoranda em Educação. Atualmente é
Fisioterapeuta da Prefeitura Municipal de Marı́lia e docente da FAIP, Marı́lia, SP.
Capítulo 9

Variabilidade da Frequência Cardíaca


em Crianças com Paralisia Cerebral

Andréa Baraldi Cunha∗, Antonio Roberto Zamunér,


Marlene Aparecida Moreno, Eloisa Tudella, Ester da Silva

Resumo: Crianças com paralisia cerebral (PC) apresentam disfun-


ções autonômicas. Isto torna relevante estudar o controle autonô-
mico da frequência cardı́aca (FC) para compreender o comporta-
mento do seu sistema neurocárdico. Os objetivos deste capı́tulo são:
abordar os procedimentos de avaliação e análise linear da variabili-
dade frequência cardı́aca (VFC) no domı́nio da frequência, verificar
a VFC em crianças com PC, e discutir a sua relação com o com-
prometimento motor. Os resultados mostram que as crianças com
PC apresentam alterações nos ı́ndices de VFC quando comparadas
com crianças com desenvolvimento motor adequado na mesma faixa
etária, indicando desequilı́brio simpatovagal. Conclui-se que estas
alterações estão relacionadas ao grau de comprometimento motor
das crianças.

Palavras-chave: Criança, Paralisia cerebral, Avaliação, Variabili-


dade da frequência cardı́aca.

Abstract: Children with cerebral palsy (CP) present autonomic dys-


function. Thus, it is relevant to study the autonomic control of he-
art rate (HR) to understand the behavior of the neurocardiac system
of this population. The purposes of this chapter are: to review the
evaluation procedures and the linear analysis of the heart rate va-
riability (HVR) in the frequency domain, to evaluate the HVR in
children with CP, and to discuss the relation between HVR and
motor impairment. Results show that children with CP present al-
terations in the HVR indices when compared to children with typical
motor development at the same age. This indicates sympathovagal
imbalance. We concluded that these alterations are related to the
level of motor impairment in the children.

Keywords: Child, Cerebral Palsy, Evaluation, Heart rate variabi-


lity.

∗ Autor para contato: andreabaraldi@gmail.com


Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2
164 Cunha et al.

1. Introdução
Crianças com Paralisia Cerebral (PC) apresentam alterações nas proprie-
dades intrı́nsecas do sistema neuromuscular (Bax et al., 2005; Rosenbaum
et al., 2007). Além destas alterações, também apresentam disfunção au-
tonômica associada, incluindo alteração intestinal e vesical, hiperhidrose
(Reid & Borzyskowski, 1993; Rose et al., 1993), baixa resistência cardio-
pulmonar (Gorter et al., 2009), maior gasto energético e altos valores de
frequência cardı́aca (FC) nas atividades diárias (Bartonek et al., 2002;
Duffy et al., 1996; Negri et al., 2010).
As disfunções autonômicas estão relacionadas ao desequilı́brio entre os
ramos eferente simpático e parassimpático do Sistema Nervoso Autonômico
(SNA). Isto provavelmente se origina na perda da influência hemisférica na
modulação autonômica, devido às lesões encefálicas destas crianças (Kor-
pelainen et al., 1993; Linden & Berlit, 1995; Yang et al., 2002).
A modulação da FC é dependente da integração dos componentes sim-
pático e parassimpático, que determinam de maneira variável as oscilações
de seus batimentos. As oscilações temporais entre duas contrações ventri-
culares consecutivas, correspondem aos intervalos R-R (iR-R) do Eletro-
cardiograma (ECG), designado como Variabilidade da Frequência Cardı́aca
(VFC) (Longo et al., 1995). Os ajustes autonômicos do SNA são atribuı́dos
à integridade do sistema neurocárdico (Zuttin et al., 2008) e as condições
patológicas promovem alterações na modulação autonômica da FC e na
dinâmica do sistema cardiovascular.
A avaliação do controle autonômico da FC em crianças com PC trata-
se de um tema incipiente dentro da fisioterapia em neuropediatria. Porém,
este tema é de grande relevância, pois possibilita um enfoque cardiovas-
cular, que nem sempre é abordado nos programas de reabilitação. Deste
modo, pretende-se incentivar a utilização da análise da VFC de crianças
com PC na área da fisioterapia em neuropediatria.
Diante do exposto, o presente capı́tulo teve como objetivos abordar os
procedimentos de avaliação e análise linear da VFC no domı́nio da frequên-
cia, analisar a VFC em crianças com diagnóstico clı́nico de PC e discutir a
sua relação com o comprometimento motor de acordo com o Gross Motor
Function Classification System (GMFCS).

2. Fundamentação Teórica
2.1 Paralisia cerebral
O termo PC descreve um grupo de desordens do movimento e da postura
atribuı́das ao distúrbio não progressivo que ocorre no encéfalo em desenvol-
vimento (Bax et al., 2005; Rosenbaum et al., 2007). O problema motor dos
indivı́duos com PC se origina fundamentalmente da disfunção do Sistema
Nervoso Central (SNC), que interfere diretamente no desenvolvimento do
Variabilidade da frequência cardíaca em crianças com PC 165

controle postural contra a gravidade e impede o desenvolvimento motor


normal (Howle, 2002). As desordens motoras da PC causam limitações
das Atividades de Vida Diária (AVD’s) e são frequentemente acompanha-
das por distúrbios da sensação, da percepção, da cognição, da comunicação,
do comportamento e por alterações musculoesqueléticas secundárias (Bax
et al., 2005; Rosenbaum et al., 2007).
A classificação da PC pode ser baseada no comprometimento da distri-
buição topográfica, do tônus muscular e do nı́vel de funcionalidade. Quanto
à distribuição topográfica, a PC pode ser classificada como: hemiplegia, di-
plegia e quadriplegia (Koman et al., 2004). Quanto ao tônus muscular: em
espástica, discinética, atáxica e mista, sendo que a forma espástica é a mais
frequente (75% dos casos) (Koman et al., 2004). Estudos evidenciam que
a espasticidade acarreta em alterações nas propriedades intrı́nsecas da cri-
ança. Assim, há redução da força muscular, da velocidade do movimento
e modificações adaptativas no comprimento muscular e na amplitude do
movimento ativo (Siebes et al., 2002; Lieber et al., 2004). Estas crian-
ças demonstram alto gasto energético na execução das AVD’s e são mais
suscetı́veis à fadiga (Duffy et al., 1996; Durstine et al., 2000; Fernhall &
Unnithan, 2002; Gracies, 2005). Para a classificação da PC quanto ao nı́vel
de funcionalidade, o instrumento mais utilizado atualmente é o GMFCS.
Esta escala é baseada no movimento auto-iniciado, com ênfase no sentar e
no andar. Ela apresenta cinco nı́veis diferentes de função motora, de acordo
com a limitação funcional e a necessidade de assistência externa. Crianças
classificadas no nı́vel I do GMFCS (Figura 1(a)) apresentam baixa severi-
dade, bom desempenho motor e limitações funcionais pouco pronunciadas.
Crianças classificadas no nı́vel V (Figura 1(b)) apresentam múltiplas desor-
dens, com restrições no controle voluntário dos movimentos e na habilidade
de manter postura anti-gravitária do pescoço e do tronco (Palisano et al.,
1997).
As crianças dos nı́veis IV e V do GMFCS apresentam desempenho mo-
tor inferior em atividades nas posturas sentada e em pé (Ostenjo et al.,
2003; Cunha et al., 2009) e em atividades funcionais de autocuidado e mo-
bilidade (Mancini et al., 2002) quando comparadas com crianças com menor
comprometimento motor. As crianças quadriplégicas destes nı́veis mostra-
ram curso de comprometimento da função motora grossa menos favorável
que as crianças dos nı́veis I a III. Tal comprometimento foi principalmente
na mobilidade, que é devido: à maior espasticidade, ao pior controle motor
seletivo, à fraqueza muscular e às limitações de amplitude de movimento
dos membros inferiores (Ostenjo et al., 2004; Bjornson et al., 2007; Voor-
man et al., 2007).

2.2 Variabilidade da frequência cardíaca


A regulação da frequência dos batimentos cardı́acos ocorre em decorrência
do controle intrı́nseco, dos fatores humorais e da atuação do SNA por meio
166 Cunha et al.

(a) (b)
Figura 1. Ilustração representativa de crianças com PC dos nı́veis I (a) e V
(b) do GMFCS na postura sentada.

de seus eferentes simpático e parassimpático. O SNA promove ajustes


rápidos no sistema cardiovascular durante diferentes estı́mulos (exercı́cio
fı́sico, estresse mental e mudanças posturais), a fim de suprir a demanda
dos sistemas orgânicos (Warwick & Williams, 1973; Hainsworth, 1998).
O sistema nervoso parassimpático, representado pelo nervo vago, inerva
o nodo sinoatrial, o nodo átrio-ventricular e o miocárdio atrial, e é respon-
sável por reduzir a FC.
O sistema nervoso simpático inerva todas as regiões do coração, ou
seja, o nodo sinoatrial, o nodo átrio-ventricular e todo o miocárdio (átrios
e ventrı́culos). Ele é responsável por aumentar a FC e a força de contração
do miocárdio (Warwick & Williams, 1973; Hainsworth, 1998).
Em repouso observa-se predomı́nio da modulação vagal sobre o coração.
Esta reduz os valores da FC intrı́nseca de 110-120 para 60-80 batimentos
por minuto (bpm). No entanto, valores de FC acima da FC intrı́nseca
representam predomı́nio simpático (Hainsworth, 1998).
A influência da estimulação ou da inibição das fibras nervosas simpáti-
cas e parassimpáticas nas respostas da FC sobrepõe ao ritmo inerente do
miocárdio. A interação complexa entre estas duas eferências resulta em
oscilações da FC instantânea e dos iR-R do ECG, as quais se denomina de
VFC (Longo et al., 1995; Novak et al., 1996; Grupi & Moraes, 2001).
O reconhecimento de que a FC e a pressão arterial apresentam vari-
ações batimento a batimento vem de longa data. A constatação inicial
Variabilidade da frequência cardíaca em crianças com PC 167

deste fenômeno foi feita por Stephens Hales em 1973, ao realizar a pri-
meira medida quantitativa da pressão arterial. Isto forneceu bases para o
aprofundamento dos estudos nesta área. Assim, sabe-se que as flutuações
periódicas da FC constituem um indicador de um sistema cardiovascular
saudável e que a análise da VFC representa um dos mais significativos indi-
cadores quantitativos da resposta neuro-regulatória batimento a batimento
(Hartikainen et al., 1998).
Os ajustes do SNA são atribuı́dos à integridade do sistema neurocárdico
e a posição corporal afeta o controle e reposta da FC (Zuttin et al., 2008).
As condições patológicas promovem alterações na modulação autonômica
da FC e na dinâmica do sistema cardiovascular. Isto compromete os ajus-
tes rápidos e compensatórios da FC, determinados pela ação autonômica
sobre o nodo sinusal para garantir a homeostase (Mitchell, 1990). Assim,
alterações na modulação autonômica da FC e na dinâmica do sistema cardi-
ovascular podem ser identificadas por meio do estudo da VFC nas posturas
supina e ortostática (Acharya et al., 2005; Zamunér et al., 2011).

2.3 Análise da variabilidade da frequência cardícaca no domínio da


frequência
Existem diversos métodos para a análise da VFC e os que ocorrem no do-
mı́nio do tempo são os mais difundidos. No entanto, estes não mostram es-
pecificidade e sensibilidade suficientes, uma vez que seu uso é relativamente
limitado (Novak et al., 1996). Estes métodos descrevem o comportamento
de um fenômeno ao longo do tempo, e avaliam basicamente a variabilidade
estatı́stica por meio de médias e desvios-padrão.
Os métodos de análise no domı́nio da frequência são os mais aceitos,
pois a VFC envolve fenômenos periódicos que se relacionam com ajustes e
adaptações fisiológicas às mudanças no meio interno, externo e na presença
de doenças. Para isto se utilizam ferramentas matemáticas que possibilitam
estudar as ondas a partir da análise espectral. Para a análise dos dados,
inicialmente deve ser realizada uma inspeção visual da distribuição dos iR-
R (em milissegundos) obtidos durante a coleta, para observar ou eliminar os
trechos que contenham interferências ou ruı́dos no sinal. Assim, seleciona-
se um intervalo que apresente maior estabilidade do traçado dos iR-R do
ECG e que contenha no mı́nimo 256 batimentos (Novak et al., 1996).
Para os registros de longa duração, do tipo Holter de 24 horas,
recomenda-se a avaliação a partir da análise no domı́nio da frequência,
também denominada de análise espectral. Porém, alguns estudos afirmam
que cinco minutos de registro, ou 256 pontos, proporcionam tempo sufici-
ente para se obter a estabilidade do sinal (Novak et al., 1996; Hartikainen
et al., 1998).
A análise espectral permite decompor a VFC de um determinado
tempo em seus componentes oscilatórios fundamentais, definindo-os pela
sua frequência e amplitude (Longo et al., 1995). Assim, a análise espectral
168 Cunha et al.

envolve a decomposição de um sinal numa soma de ondas senoidais de dife-


rentes amplitudes e frequências (Appel et al., 1989). A partir desta análise
identifica-se e quantifica-se a frequência com que aparecem determinados
elementos repetitivos nas variações da FC (Longo et al., 1995).
Nesta análise, a série de iR-R sofre inicialmente um processamento
matemático por meio de um microcomputador que resulta no tacograma
(Figura 2). O tacograma expressa a variação da FC (iR-R) em função
do tempo e contém um sinal quase periódico que oscila no tempo. Ele
é então manipulado por vários algoritmos matemáticos, por meio de mé-
todo não paramétrico como a transformada rápida de Fourier, ou método
paramétrico como modelo auto-regressivo.

Figura 2. Tacograma dos valores absolutos da FC (bpm) no software Polar


Precision Performance durante 15 minutos.

Os principais componentes, identificados a partir da análise espectral


são mostrados na Tabela 1: Ultra Baixa Frequência (UBF), Muito Baixa
Frequência (MBF), Baixa Frequência (BF) e Alta Frequência (AF) (Novak
et al., 1996).
A natureza da UBF e da MBF não está completamente esclarecida.
Para obtê-las são necessários longos perı́odos de aquisição, com registros
de vinte e quatro horas. Acredita-se que estas frequências de oscilações
são mais lentas. Alguns autores relatam que elas sofrem influências de
fatores ligados aos controles de termorregulação, do tônus vasomotor pe-
riférico (Akselrod et al., 1981, 1985; Appel et al., 1989), e do controle
neuro-hormonal, ligado ao sistema renina-angiotensina-aldosterona (Ak-
selrod et al., 1985; Pomeranz et al., 1985). Outros autores acreditam que
a MBF seja dependente tanto da ação do simpático, como do parassimpá-
tico (Akselrod et al., 1981, 1985; Pomeranz et al., 1985; Appel et al., 1989;
Hayano et al., 1991; Akselrod, 1995).
A BF é dependente do reflexo barorreceptor. Esta faixa de frequência
é utilizada principalmente como marcadora da modulação simpática sobre
o sistema cardiovascular (Malliani et al., 1991; Longo et al., 1995; Novak
Variabilidade da frequência cardíaca em crianças com PC 169

Tabela 1. Variáveis espectrais com valores correspondentes das faixas de


frequência e significado fisiológico. Adaptado de Novak et al. (1996).
Componente Faixa Significado
Espectral espectral
(Hz)
Espectro total Entre 0 e 0,4 Representa a variabilidade total da
frequência cardı́aca no perı́odo estu-
dado.
Alta frequência Entre 0,15 e Representa a modulação vagal. Seu
0,4 pico máximo varia com as incur-
sões respiratórias. Encontra-se geral-
mente em 0,25 Hertz e corresponde a
15 incursões respiratórias por minuto,
aproximadamente.
Baixa Entre 0,03 e Representa a modulação conjunta do
frequência 0,15 simpático e parassimpático, com pre-
dominância do simpático. É modu-
lada pelo barorreflexo e pelas oscila-
ções cı́clicas da pressão arterial, com
pico máximo em torno de 0,1 Hertz.
Relação baixa Representa um ı́ndice do balanço
frequência e simpato-vagal.
alta frequência

et al., 1996). Porém, alguns autores afirmam que nesta faixa de frequência
também há contribuição do componente parassimpático (Skyschally et al.,
1996).
A AF corresponde à modulação respiratória, pois coincide com a arrit-
mia sinusal respiratória. Portanto, ela é indicativa da atuação vagal sobre
o nó sino atrial (Akselrod et al., 1981; Pagani et al., 1986; Lombardi et al.,
1987; Malliani et al., 1991; Novak et al., 1996).
Os componentes de BF e AF podem ainda ser expressos em unidades
normalizadas (un) conforme as Equações 1 e 2, onde: AF un e BF un são,
respectivamente, os componentes de alta e baixa frequência em unidades
normalizadas; AF é o componente de alta frequência em valor absoluto,
BF é o componente de baixa frequência em valores absolutos, e MBF é o
componente de muito baixa frequência (Novak et al., 1996).

AF (ms2 )
AF un = × 100 (1)
P otencia T otal(ms2 ) − M BF
BF (ms2 )
BF un = × 100 (2)
P otencia T otal(ms2 ) − M BF
170 Cunha et al.

3. Metodologia
3.1 Procedimentos para a avaliação da VFC em crianças com PC
A literatura relata que a VFC é dependente da idade, devido às alterações
relacionadas à mediação parassimpática e simpática da FC que ocorrem
ao longo do desenvolvimento. Isto resulta em uma grande variação do seu
comportamento em cada década de vida (Finley & Nugent, 1995). Assim,
em pesquisas é importante que as crianças não apresentem discrepância em
relação à idade e também em relação ao gênero. Estas variáveis devem ser
cuidadosamente observadas para manter a homogeneidade dos grupos.
Nos dias anteriores aos testes, as crianças e seus responsáveis devem
receber orientações relevantes, tais como: evitar o consumo de bebidas
estimulantes (café, chá preto e refrigerante), não realizar atividade fı́sica,
fazer refeições leves e ter repouso noturno.
Todas as crianças devem ser familiarizadas com os procedimentos ex-
perimentais a fim de minimizar a influência de fatores como a ansiedade
nas variáveis estudadas.
Uma forma de avaliar o ajuste autonômico cardiovascular é promover
a captação da FC e dos iR-R batimento a batimento nas posturas supina e
ortostática. Para isto, pode-se utilizar a manobra postural ativa, uma vari-
ante da manobra postural passiva (tilt table test). Esta manobra é efetiva
para avaliar a resposta cardı́aca simpática, juntamente com a liberação
vagal. Além da estimulação reflexa provocada sobre os barorreceptores,
envolve a contração dos músculos dos membros inferiores (Smitt et al.,
1999).
Para a coleta de dados, as crianças devem ser orientadas a permanecer
em silêncio, evitar movimentos bruscos, não dormir e manter a respira-
ção espontânea. A última é registrada pelo avaliador minuto a minuto.
Ressalta-se ainda a importância das coletas da FC serem realizadas no
mesmo perı́odo do dia, para reduzir possı́veis influências das variações cir-
cadianas.
A coleta dos dados deve ser iniciada com a criança em decúbito dorsal
sobre uma maca (Figura 3(a)). Para a postura ortostática, a coleta deve
ser realizada com a criança em pé e apoiada na maca. Para crianças que
não conseguem ficar em pé somente com apoio na maca, um apoio adicional
em tronco superior ou inferior pode ser fornecido (Figura 3(b)). O tempo
de coleta da FC e dos iR-R deve ser de 15 minutos na postura supina e 15
minutos na postura ortostática.

4. Resultados e Discussão
Os resultados deste estudo foram organizados com base na discussão das re-
lações entre a PC, o comprometimento motor e a VFC. Além disto, buscou-
se uma reflexão sobre como a VFC implica nas ações do fisioterapeuta.
Variabilidade da frequência cardíaca em crianças com PC 171

(a) (b)
Figura 3. Captação em supino (a) e em ortostatismo (b), de uma criança
com PC nı́vel IV do GMFCS.

4.1 Paralisia cerebral e variabilidade da frequência cardíaca


Estudos mostram que crianças com PC apresentam maior FC em repouso
e durante a prática de atividades fı́sicas quando comparadas com crianças
com desenvolvimento motor tı́pico (Duffy et al., 1996; Bartonek et al.,
2002). A análise da VFC no domı́nio da frequência demonstra que as
crianças com desenvolvimento tı́pico possuem valores de AF un superiores
e de BF un inferiores aos das crianças com PC, em supino (Park et al.,
2002; Negri et al., 2010; Zamunér et al., 2011). Estes achados podem
estar relacionados a alterações de tônus e movimentos involuntários, que
resultam em maior gasto energético.
Na postura ortostática, crianças com desenvolvimento tı́pico apresen-
tam redução do valor de AF un, e aumento do valor de BF un (Park et al.,
2002; Yang et al., 2002; Zamunér et al., 2011). Isto indica diminuição da
VFC quando se muda de supino para em pé. Entende-se que estas cri-
anças apresentam os ajustes esperados na modulação autonômica da FC
durante a mudança postural. Porém, esta resposta não foi observada na
PC (Park et al., 2002; Yang et al., 2002; Zamunér et al., 2011). Autores
afirmam que na PC, além da perda das influências hemisféricas sobre a mo-
dulação autonômica decorrente das lesões encefálicas (Korpelainen et al.,
172 Cunha et al.

1993; Linden & Berlit, 1995; Yang et al., 2002), há diminuição do reser-
vatório adaptativo da modulação autonômica cardı́aca. Algumas funções
autonômicas cardı́acas, como a retirada vagal e a ativação simpática, talvez
não sejam suficientes para superar o estresse ortostático (Park et al., 2002;
Yang et al., 2002; Zamunér et al., 2011).

4.2 Variabilidade da frequência cardíaca e o comprometimento motor


Outro aspecto importante acerca do assunto é que maiores valores de FC
são atribuı́dos a um maior comprometimento motor, como o das crianças
com PC classificadas nos nı́veis IV e V do GMFCS. Este fato sugere que
crianças com maiores alterações neuromotoras e que não deambulam apre-
sentam redução do condicionamento cardiovascular quando comparadas
com crianças que deambulam, classificadas nos nı́veis I ao III do GMFCS
(Dirienzo et al., 2007).
Zamunér et al. (2011) observaram correlação entre a classificação do
GMFCS e as variáveis AF un, BF un e razão BF/AF (Figura 4(a-c)). O
estudo demonstrou que quanto maior o comprometimento motor da cri-
ança, menor a VFC. Assim, crianças com limitações funcionais mais severas
apresentam menor mobilidade, maior gasto energético e menor resistência
cardiopulmonar. Acredita-se que estes fatores causem menor contribuição
da modulação autonômica parassimpática nos ajustes autonômicos da FC.

Figura 4. Valores de correlação entre o GMFCS e os ı́ndices espectrais


BF un (a), AF un (b) e razão BF/AF (c). Adaptado de Zamunér et al.
(2011).
Variabilidade da frequência cardíaca em crianças com PC 173

4.3 Implicações para a fisioterapia


A fisioterapia em neuropediatria busca fundamentação cientı́fica para nor-
tear a prática clı́nica e subsidiar a escolha das intervenções, bem como
realizar uma abordagem mais abrangente e global do paciente.
A relação do controle autonômico cardı́aco com o comprometimento
motor remete à importância do tratamento fisioterapêutico ser também
direcionado à melhora do sistema cardiovascular. Desta forma, deve-se
buscar minimizar o predomı́nio da modulação autonômica simpática e con-
sequentemente sua sobrecarga ao sistema cardiovascular.

5. Considerações Finais
As crianças com PC apresentam maiores valores de FC, dos ı́ndices BF un
e BF/AF e menores valores de AF un em repouso, quando comparadas
com crianças com desenvolvimento motor tı́pico na mesma faixa etária.
É possı́vel concluir que as crianças com PC apresentam alterações nos
ajustes autonômicos posturais e que, quanto maior o comprometimento
motor, menor a capacidade do sistema neurocárdico em realizar ajustes
autonômicos.
Entende-se que é bastante importante incentivar o uso da análise da
VFC na clı́nica fisioterapêutica em neurologia infantil. Esta técnica pode
ser utilizada para avaliar e reavaliar a modulação autonômica da FC antes
e após as intervenções. Também se sugere a realização de mais estudos
com diferentes perfis funcionais de pacientes.

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178 Cunha et al.

Notas Biográficas
Andréa Baraldi Cunha é Fisioterapeuta (UNIMEP, 2005) e Mestre em Fisio-
terapia (UFSCar, 2011). Atualmente é doutoranda em Fisioterapia (UFSCar).

Antonio Roberto Zamunér é Fisioterapeuta (UNIMEP, 2008) e Mestre


em Fisioterapia (UNIMEP, 2011). Atualmente é doutorando em Fisioterapia
(UFSCar).

Ester da Silva é Fisioterapeuta (PUCCamp, 1977), Mestre e Doutor em


Ciências – Fisiologia (UNICAMP, 1988 e 1998, respectivamente). Atualmente
é docente do curso de graduação em Fisioterapia da Universidade Metodista
de Piracicaba (UNIMEP) e professora colaboradora de pós-graduação em
Fisioterapia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Eloisa Tudella é Educadora Fı́sica (PUCCamp, 1976), Fisioterapeuta (PUC-


Camp, 1977), Mestre em Educação Fı́sica (UGF, 1989), Doutor em Psicologia
– Psicologia Experimental (USP, 1996) e tem pós-doutorado (Universidade de
Samamanca, Espanha, 2009). Atualmente é professora associada da Universidade
Federal de São Carlos (UFSCar), Departamento de Fisioterapia.

Marlene Aparecida Moreno é Fisioterapeuta (UNIMEP, 1993), Mestre em


Biologia e Patologia (UNICAMP, 2000) e Doutor em Fisioterapia (UFSCar,
2007) e tem pós-doutorado em Biodinâmica do Movimento e Esporte (UNI-
CAMP, 2011). Atualmente é docente do curso de graduação e pós-graduação em
Fisioterapia da Universidade Metodista de Piracicaba UNIMEP.
Capítulo 10

A Fonoaudiologia e a Facilitação Neuromuscular


Proprioceptiva na Síndrome de Down

Kariane Eliza Souza, Luciana Vieira Castilho-Weinert∗,


Cláudia Diehl Forti-Bellani

Resumo: A Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva (FNP) é


um conjunto de técnicas que promove respostas dos mecanismos
neuromusculares, realiza fortalecimento muscular e melhora a fun-
cionalidade. A hipotonia da Sı́ndrome de Down (SD) traz prejuı́zos
nas funções neurovegetativas e na fala, devido à falta de força mus-
cular e a desorganização do movimento. O objetivo deste capı́tulo
é analisar a utilização da FNP com enfoque fonoaudiológico na SD.
Verificou-se aumento do grau de força muscular e houve percepção
da melhora na qualidade da fala. Conclui-se que a FNP é eficiente
na área da fonoaudiologia apesar de não se encontrar registros na
literatura.

Palavras-chave: Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva, Fono-


audiologia, Sı́drome de Down.

Abstract: The Proprioceptive Neuromuscular Facilitation (PNF)


is a set of techniques that enhance the neuromuscular mechanisms,
the muscular strength and the use of motor functions. In the Down
Syndrome (DS) the hypotonia causes damages to neurovegetative
functions and speech due to loss on muscular strength and move-
ment disorganization. This chapter aims at analyzing the benefits of
speech therapy and PNF in SD. Improvement on muscular strength
and in the quality of speech were observed. We concluded that the
PNF is efficient in the speech therapy area, even though there is no
such a register in the literature.

Keywords: Proprioceptive Neuromuscular Facilitation, Speech


Therapy, Down Syndrome.

∗ Autor para contato: luciana.weinert@ufpr.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


180 Souza et al.

1. Introdução
A fonoaudiologia é a ciência que tem como objeto de estudo a comunicação
humana. Para tal, o foco de atuação está no desenvolvimento da comu-
nicação, nos distúrbios e diferenças em relação aos aspectos envolvidos na
função auditiva periférica e central, nas funções vestibulares e cognitivas,
na linguagem oral e escrita, assim como na fala, na fluência, na voz, nas
funções orofaciais e na deglutição (Marchesan & Sanseverino, 2004).
O fonoaudiólogo se aproxima da neurologia quando atua em casos de
pacientes com distúrbios da linguagem oral ou escrita, dos órgãos fonoarti-
culatórios e das funções neurovegetativas, decorrentes de comprometimento
neurológico. O objetivo da terapia fonoaudiológica nestes casos é adequar
os aspectos alterados da melhor maneira possı́vel para promover a funcio-
nalidade do indivı́duo.
A pessoa com Sı́ndrome de Down (SD) frequentemente é acometida por
distúrbios auditivos, de linguagem, do sistema estomatognático (dentes,
oclusão, lábios, lı́ngua e bochechas), e das funções neurovegetativas (sucção,
mastigação, deglutição, respiração e fala).
A terapia fonoaudiológica na SD varia de acordo com o caso, com as
funções mais comprometidas e com a idade do indivı́duo. Desta forma,
baseia-se em exercı́cios respiratórios, de fortalecimento muscular, aumento
da mobilidade e melhora do controle motor.
A Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva (FNP), também conhecida
como Método Kabat, é uma forma de trabalho utilizada para tratamento
de diversos diagnósticos. Trata-se de um conjunto de técnicas que promo-
vem e aceleram as respostas dos mecanismos neuromusculares, através da
estimulação de todos os receptores possı́veis, visando atingir uma função
motora eficiente (Cruz-Machado et al., 2007).
A literatura indica que a FNP pode promover e acelerar os aspectos
neuromusculares do indivı́duo (Moreno et al., 2005; Favarão & Pieretti,
2004; Adler et al., 2007). Assim, acredita-se que esta seja uma intervenção
adequada para pessoas com SD. A estimulação neuromuscular pode ser
utilizada para recrutar unidades motoras e melhorar a hipotonia orofacial
importante que classicamente se observa em pacientes com SD. No en-
tanto, a aplicação da FNP com enfoque fonoaudiológico na SD, não possui
registros na literatura pesquisada, o que motivou a realização deste estudo.
Este capı́tulo teve como objetivo analisar a aplicação da FNP em pes-
soas com SD, sob o enfoque terapêutico fonoaudiológico oromiofuncional
para melhora do sistema estomatognático e das funções neurovegetativas
destes indivı́duos.
A fonoaudiologia e a facilitação neuromuscular proprioceptiva na síndrome de Down 181

2. Fonoaudiologia e Fonoaudiologia em Pediatria


A Fonoaudiologia é uma profissão da área da saúde que estuda os aspectos
relacionados com a comunicação humana e que atua comumente em quatro
grandes áreas: audiologia, linguagem, motricidade oral e voz. Desta forma,
é responsável pela promoção da saúde, pela avaliação e pelo diagnóstico,
pela orientação, pela terapia (habilitação e reabilitação) e pelo monitora-
mento e aperfeiçoamento de aspectos fonoaudiológicos (Farias et al., 2009;
Scherma, 2008).
A medicina e a pedagogia fornecem parte das bases teóricas para dirigir
as condutas fonoaudiológicas nas suas diferentes especialidades. Comenta-
se que a atividade fonoaudiológica esteve articulada à pedagogia desde sua
origem. Porém sempre foi marcada pelo discurso da medicina que tinha em
seus objetivos o tratamento dos distúrbios da comunicação, mas seu modelo
de formação acadêmica não incluı́a a atuação terapêutica nos moldes de
uma clı́nica de reabilitação. Desta forma, surgiram outros profissionais para
complementar a atividade médica com o objetivo de suprimir os sintomas
fonoaudiológicos (Steinberg et al., 2003).
Grande parte dos pacientes encaminhados para a clı́nica fonoaudio-
lógica apresenta diagnósticos de falhas cognitivas, motoras e perceptuais
(Guarinello et al., 2008). Assim, salienta-se a importância da atuação di-
agnóstica e interventiva do fonoaudiólogo em equipe multidisciplinar nos
quadros de sı́ndromes genéticas (Lima et al., 2007). Pesquisas realizadas
referem o reconhecimento da atuação da fonoaudiologia em neurologia, pois
muitas patologias neurológicas incluem alterações de linguagem, cognição
e deglutição (Guarinello et al., 2008; Porto-Cunha & Limongi, 2008; Lima
et al., 2007; Almeida & Rosa, 2003).

2.1 Síndrome de Down


A SD é um conjunto de estigmas fı́sicos causados por uma alteração gené-
tica. Seu nome ocorre em homenagem ao primeiro médico que a descreveu
entre uma população com deficiência mental, em 1866, Dr. John Lang-
don Down. Em 1959 o cientista francês Jerome Lejeune descobriu que um
cromossomo extra no par 21 era a causa da SD.
A SD ou Trissomia par do 21 representa a anomalia cromossômica mais
comum da espécie humana (Oliveira et al., 2008). Estima-se que afete um
em cada seiscentos bebês nascidos vivos (Boff & Caregnato, 2008).
Os indivı́duos com a SD apresentam caracterı́sticas fı́sicas tı́picas e
suas funções cognitivas e motoras frequentemente estão alteradas. Na SD
há atraso no desenvolvimento psicomotor e hipotonia muscular importante,
que se manifesta de forma distinta entre cada indivı́duo (Nahas, 2004).
A criança com diagnóstico de SD apresenta alterações do sistema es-
tomatognático, caracterizadas por diminuição de tônus e por alteração de
dentição. Estas alterações prejudicam as funções alimentares e a respiração
182 Souza et al.

(Ideriha & Limongi, 2007). Assim, o fonoaudiólogo, por meio de técnicas


especı́ficas, é um dos principais profissionais que atua para amenizar as
dificuldades causadas pelas alterações encontradas na SD com relação ao
sistema estomatognático (Ideriha, 2005).

2.2 A facilitação neuromuscular proprioceptiva


O método de Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva (FNP) foi desen-
volvido nos Estados Unidos pelo Dr. Kabat e duas fisioterapeutas: Mar-
garet Knott e Dorothy Voss (Adler et al., 2007).
Este método fez uso de padrões funcionais de movimento em conjunto
com uma variedade de estı́mulos sensoriais para facilitá-los. Esta é uma
técnica que exige manipulação habilidosa para que seja efetiva. Os estı́mu-
los envolvem toque e pressão com as mãos do terapeuta sobre a superfı́cie
corporal na direção do movimento, estiramento rápido no músculo a ser
facilitado, tração ou compressão conforme apropriado e uso da voz para
que o paciente seja incentivado ao movimento (Favarão & Pieretti, 2004).
A técnica pode ser utilizada para: iniciar uma contração muscular,
fortalecer os músculos, aumentar a mobilidade e melhorar a coordenação
dos movimentos. Para os autores do método, a FNP promove e acelera
as respostas dos mecanismos neuromusculares através da estimulação dos
receptores. Segundo Adler et al. (2007) explica-se o nome da técnica como:
Facilitação: por tornar mais fácil a movimentação;
Neuromuscular: pelo envolvimento de nervos e músculos;
Proprioceptiva: pela ativação dos receptores sensitivos que fornecem in-
formações a respeito do movimento e do posicionamento corporal, o
que facilita a movimentação do indivı́duo.

3. Métodos
Este estudo caracterizou-se por ser do tipo experimental, e foi realizado
com uma amostra intencional. Selecionou-se quatro pacientes com SD, em
atendimento regular de fonoaudiologia, em uma instituição de educação
especial. Como critérios de inclusão da amostra estavam a capacidade de
compreender os comandos verbais utilizados no trabalho com a FNP e a
disponibilidade em realizar terapia fonoaudiológica apenas na instituição
onde o trabalho foi realizado.
Nesta pesquisa, todos os sujeitos fizeram parte do mesmo grupo e
só participaram da amostra aqueles cujos responsáveis legais assinaram
o termo de consentimento livre e esclarecido. A Tabela 1 apresenta a faixa
etária e o gênero dos sujeitos da pesquisa.
Os procedimentos considerados nesta pesquisa consistiram em avali-
ação inicial (Tabela 2), atendimentos individuais aos sujeitos, e análise
dos resultados obtidos através da comparação da avaliação inicial com a
A fonoaudiologia e a facilitação neuromuscular proprioceptiva na síndrome de Down 183

Tabela 1. Dados da amostra.


Sujeito Idade em anos Sexo
1 57 feminino
2 28 feminino
3 19 masculino
4 13 feminino

avaliação final (Tabela 2). Estas avaliações foram parte das avaliações fo-
noaudiológicas de cada paciente, onde dentre outros aspectos relacionados
à Fonoaudiologia, está a investigação da força muscular facial de cada um.

Tabela 2. Avaliação muscular facial Adaptada de Hoppenfeld (2007).


Músculo Grau de força muscular observado
Risório
Orbicular dos lábios
Zigomático maior
Elevador do ângulo da boca
Elevador do lábio superior
Depressor do ângulo da boca
Mentoniano
Bucinador
Masseter
Temporal

Para analisar o grau de força presente em cada músculo aplicou-se a


escala de força de Hoppenfeld (2007) nas avaliações inicial e final. Esta
avaliação considera diferentes graus de força, onde se pontua:
Zero: quando não há evidência de contratilidade;
Um: quando o movimento é difı́cil, há evidência de pouca contratilidade
e não há mobilidade articular;
Dois: quando o movimento é sofrı́vel, mas ocorre movimentação completa
eliminada a gravidade;
Três: quando o movimento é mediano, e há movimentação completa con-
tra a gravidade;
Quatro: quando o movimento é bom, e há movimentação completa contra
a gravidade e com alguma resistência;
Cinco: quando o movimento é normal, e ocorre movimentação completa
contra a gravidade e com resistência total.
184 Souza et al.

Outro aspecto importante constante nas avaliações, a fim de identifi-


car a funcionalidade dos órgãos fonoarticulatórios, foi o questionamento
do professor sobre a qualidade de articulação da fala ao sujeito da pes-
quisa. Solicitou-se ao professor que observasse uma Escala Visual Analógica
(EVA) (Figura 1) e assinalasse uma nota entre zero e dez para qualidade
da fala de seu aluno. Este procedimento ocorreu antes do inı́cio e após o
término da intervenção com a FNP. A elaboração desta EVA embasou-se
no trabalho de Gomez et al. (2007).

Figura 1. EVA para mensuração da qualidade da articulação da fala.

Realizou-se dez atendimentos fonoaudiológicos com a técnica de FNP,


com frequência de uma vez por semana, em atendimentos de trinta minutos.
Respeitou-se a disponibilidade de tempo dos alunos e a condição de cansaço
ou fadiga de cada um.
Os músculos observados nesta pesquisa foram aqueles que têm maior
influência na região oral: risório, orbicular dos lábios, zigomático maior,
elevador do ângulo da boca, elevador do lábio superior, depressor do ângulo
da boca, mentoniano, bucinador, masseter e temporal.
Durante os atendimentos os sujeitos permaneciam em decúbito dorsal.
Utilizou-se comandos verbais, resistência e contato manual do terapeuta.
A intervenção ocorreu da seguinte forma (Adler et al., 2007):
1. Nos músculos risório e zigomático maior: utilizou-se o comando ver-
bal “sorria sem mostrar os dentes” e aplicou-se a resistência nos can-
tos da boca, medial e caudalmente (Figuras 2(a) e 2(b)).
2. No músculo orbicular dos lábios utilizou-se o comando verbal “junte
os lábios e assovie”. Aplicou-se resistência lateral e superiormente no
lábio superior, e lateral e inferiormente no lábio inferior (Figuras 3(a)
e 3(b)).
3. Para o músculo elevador do lábio superior utilizou-se o comando
verbal “levante seu lábio superior e mostre seus dentes de cima” e
aplicou-se resistência no lábio superior, para baixo e medialmente
(Figuras 4(a) e 4(b)).
4. No músculo mento utilizou-se o comando verbal “enrugue seu queixo”
e a resistência no queixo, inferior e lateralmente (Figuras 5(a) e 5(b)).
A fonoaudiologia e a facilitação neuromuscular proprioceptiva na síndrome de Down 185

(a) (b)
Figura 2. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

(a) (b)
Figura 3. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

5. Para o músculo elevador do ângulo da boca utilizou-se o comando


verbal “eleve os cantos da boca e dê um sorriso de desprezo” e como
resistência empurrou-se os cantos da boca para baixo e para dentro
(Figuras 6(a) e 6(b)).
6. No músculo depressor do ângulo da boca utilizou-se o comando ver-
bal “leve os cantos da boca para baixo, como se estivesse triste” e
efetuou-se resistência nos cantos da boca, superior e medialmente
(Figuras 7(a) e 7(b)).
7. No músculo bucinador houve o comando verbal “aperte suas boche-
chas contra as espátulas” e a resistência ocorreu na superfı́cie in-
terna das bochechas com afastadores de lı́ngua úmidos. Aplicou-se
186 Souza et al.

(a) (b)
Figura 4. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

(a) (b)
Figura 5. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

a resistência em diagonal para cima, ou para baixo, ou para fora


(Figuras 8(a) e 8(b)).
8. Para os músculos masseter e temporal estabeleceu-se o comando ver-
bal “feche a boca e morda” e a resistência na mandı́bula, em diagonal
para baixo, para a direita e para a esquerda (Figuras 9(a) e 9(b)).
Cada diagonal da FNP foi repetida por dez vezes, ou menos vezes, caso
o paciente apresentasse limitação por fadiga muscular.
A fonoaudiologia e a facilitação neuromuscular proprioceptiva na síndrome de Down 187

(a) (b)
Figura 6. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

(a) (b)
Figura 7. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

4. Resultados e Discussão
A Tabela 3 apresenta os resultados da análise da força muscular facial dos
sujeitos, segundo a escala de Hoppenfeld (2007), antes e após os atendi-
mentos fonoaudiológicos.
Nesta tabela os resultados da avaliação inicial estão dispostos na coluna
Av1 e os resultados da avaliação final na coluna Av2.
Os resultados apresentados nesta tabela evidenciam que o uso da FNP
foi satisfatório para os sujeitos pesquisados. A qualidade da articulação da
fala aumentou em pelo menos 100% em todos os sujeitos pesquisados, e
a força muscular também se mostrou no mı́nimo com o dobro de melhora
durante a avaliação final, após o tratamento com a FNP.
188 Souza et al.

(a) (b)
Figura 8. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

(a) (b)
Figura 9. Em (a) posição inicial e em (b) posição final.

Tabela 3. Resultados da mensuração da força muscular.


Músculos Sujeito 1 Sujeito 2 Sujeito 3 Sujeito 4
Av1 Av2 Av1 Av2 Av1 Av2 Av1 Av2
Risório e zigomático maior 1 2 1 4 2 4 2 4
Orbicular dos lábios 1 2 1 4 2 4 2 4
Elevador do lábio superior 1 2 1 4 2 4 2 4
Mentoniano 1 2 1 4 2 4 2 4
Elevador do ângulo da boca 1 2 1 4 2 4 2 4
Depressor do ângulo da boca 1 2 1 4 2 4 2 4
Bucinador 1 2 1 4 2 4 2 4
Masseter e temporal 1 2 1 4 2 4 2 4
A fonoaudiologia e a facilitação neuromuscular proprioceptiva na síndrome de Down 189

A Tabela 4 apresenta os resultados obtidos com o questionamento feito


ao professor sobre a qualidade da articulação da fala do aluno. Neste
questionamento a resposta era atribuı́da com base na EVA.

Tabela 4. Resultados da qualidade da articulação da fala.


Sujeitos Análise Inicial Análise Final
Sujeito 1 1 2
Sujeito 2 1 4
Sujeito 3 1 4
Sujeito 4 1 4

Como se observa na Tabela 4, a pergunta realizada ao professor do


sujeito pesquisado após o tratamento demonstra que o mesmo qualifica
a articulação da fala do aluno como melhor. Este resultado se mostra
condizente com os resultados da avaliação fonoaudiológica (Tabela 3).
Em pesquisa realizada com pessoas sedentárias (Moreno et al., 2005),
com enfoque na musculatura respiratória, concluiu-se que a FNP melhora
a força muscular e a funcionalidade dos pacientes. Desta forma, os re-
sultados encontrados nesta pesquisa, apontam que a FNP pode ser um
recurso adicional no tratamento da motricidade oral do paciente com SD.
Considera-se que a técnica aumentou a força dos músculos faciais em to-
dos os indivı́duos, e comprova-se a repercussão disto pela na melhora da
oralidade referida pelos professores.
Os resultados obtidos no presente trabalho estão de acordo com ou-
tros estudos (Serapompa & Maia, 2006; Moreno et al., 2005; Favarão &
Pieretti, 2004; Adler et al., 2007) que relatam que a reabilitação fonoaudi-
ológica em neurologia é uma área bastante promissora e que merece grande
atenção nas pesquisas. Além disto, o trabalho fonoaudiológico com pessoas
com necessidades especiais enriquece a abordagem profissional e amplia a
qualidade de vida destes indivı́duos (Serapompa & Maia, 2006).

5. Considerações Finais
A FNP pode ser utilizada com sucesso em Fonoaudiologia para a melhora
das funções do sistema estomatognático e das funções neurovegetativas de
indivı́duos com SD. A utilização deste método pode repercutir benefica-
mente na função oral destes indivı́duos.
Apesar de não haver registros na literatura sobre a aplicação do mé-
todo na fonoaudiologia, entende-se que os esforços empreendidos pelo fo-
noaudiólogo nesta área podem ser bastante promissores. Assim, sugere-se
que trabalhos futuros repliquem este estudo em uma amostra com maior
número de sujeitos, bem como utilizem a FNP na terapia fonoaudiológica
de outros distúrbios neurológicos.
190 Souza et al.

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192 Souza et al.

Notas Biográficas
Kariane Eliza Souza é Fonoaudióloga (UNIVALI, 2006) e Especialista em
Neurologia com ênfase em Neuropediatria (IBRATE, 2011). Atualmente é
fonoaudióloga da APAE de Alfredo Wagner, SC.

Luciana Vieira Castilho-Weinert é Fisioterapeuta (PUC-PR, 2003), Espe-


cialista em Fisiologia Humana e da Nutrição (PUC-PR, 2006), Mestre e Doutor
em Ciências – Engenharia Biomédica (UTFPR, 2004 e 2010, respectivamente)
e tem formação pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é Professor
Adjunto da UFPR – Setor Litoral, no Curso de Fisioterapia.

Claudia Diehl Forti-Bellani é Fisioterapeuta (ULBRA-RS, 2001), Mestre em


Ciências Biológicas – Neurociências (UFRGS, 2005) e tem formação pelo Conceito
Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é coordenadora e docente do Curso de Pós-
Graduação Lato Sensu em Neurologia com ênfase em Neuropediatria do IBRATE.
Capítulo 11

Síndrome de Rett: Histórico, Expectativa de Vida,


Genética e Habilidades Funcionais

Carlos Bandeira de Mello Monteiro∗, Zodja Graciani,


Camila Torriani-Pasin, Emília Katiane Embiruçu, Fernando Kok

Resumo: Devido às dificuldades sensório-motoras e funcionais so-


fridas pelos indivı́duos com Sı́ndrome de Rett (SR) é fundamental
que os profissionais da saúde conheçam as principais caracterı́sticas
da sı́ndrome, assim como suas dificuldades na realização de habilida-
des funcionais. O objetivo deste trabalho é apresentar as principais
caracterı́sticas da SR, considerando seu histórico, sua expectativa de
vida, a genética e as habilidades funcionais. Para tanto, utilizou-se
o método teórico-conceitual, por meio de pesquisa e análise crı́tica
da literatura sobre as caracterı́sticas da sı́ndrome. Com base nos
aspectos apontados na presente revisão, é possı́vel afirmar que as
caracterı́sticas clı́nicas da SR a tornam uma doença incapacitante e
uma condição particularmente desafiadora para a equipe de reabili-
tação.

Palavras-chave: Comunicação em saúde, Autocuidado, Limitação


da mobilidade, Sı́ndrome de Rett.

Abstract: Due to sensory-motor and functional difficulties presen-


ted by individuals with the Rett Syndrome (RS), it is essential that
health professionals be aware of the main features of the syndrome,
as well as its related difficulties regarding functional skills. The
purpose of this paper is to present review of the features of RS,
considering its historical perspective, life expectancy, genetics and
functional skills. The theoretical-conceptual method was used, th-
rough research and critical appraisal of the literature regarding the
characteristics of the syndrome. Based on the points raised in this
review, it is possible to mention that the clinical RS characteristics
make this an incapacitating disease and a especially challenging
condition for the rehabilitation team.

Keywords: Health communication, Self care, Mobility limitation,


Rett syndrome.

∗ Autor para contato: carlosfisi@uol.com.br


Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2
194 Monteiro et al.

1. Introdução
A sı́ndrome de Rett (SR) é uma condição neurológica de caráter progres-
sivo, com caracterı́sticas fenotı́picas peculiares, caracterizada por desacele-
ração do crescimento do crânio, deficiência cognitiva profunda, movimentos
estereotipados das mãos e alterações no crescimento (Pozzi & Rosemberg,
2003; Fehr et al., 2010).
A SR foi relatada inicialmente em 1966, pelo médico austrı́aco An-
dreas Rett, que descreveu uma série de meninas que apresentavam com-
portamento autı́stico, demência, apraxia, estereotipias manuais, perda da
expressão facial, e que não apresentavam alterações ao nascimento e tive-
ram desenvolvimento neuropsicomotor normal nos primeiros meses de vida
(Rett, 1992). Entre seis e 18 meses de vida, as meninas desenvolviam perda
de interesse pelo meio ambiente, irritabilidade e estagnação no desenvolvi-
mento neuromotor (Bruck et al., 2001). Neste momento, observa-se a perda
de habilidades funcionais das mãos, podendo estar associada a crises epilép-
ticas, alterações de tônus, alteração da marcha, ataxia no tronco, disfunção
autonômica e grave alteração cognitiva (Pozzi & Rosemberg, 2003; Nissen-
korn et al., 2010). A manifestação clı́nica mais tı́pica da sı́ndrome surge
meses após por meio de movimentos repetitivos e estereotipados das mãos,
do tipo esfregar, torcer ou bater, em substituição às habilidades manuais
habituais (Julu et al., 2001; Downs et al., 2010). Com a progressão da do-
ença os indivı́duos com SR tornam-se, em geral, incapazes de comunicar-se
verbalmente, no entanto mantém contato com o olhar, e são profundamente
dependentes nas atividades da vida diária (AVD’s) (Monteiro et al., 2009).
A SR é uma condição particularmente desafiadora para os profissionais
da área de reabilitação, considerando a gravidade do comprometimento mo-
tor e cognitivo, a ocorrência de deformidades e a progressiva imobilidade
nas fases mais avançadas da doença. Para tanto, é importante a elaboração
de trabalhos que ofereçam informações atuais sobre as principais caracte-
rı́sticas da doença, o que auxiliará os profissionais na compreensão e no
tratamento assistencial aos pacientes. O objetivo deste capı́tulo é apre-
sentar as principais caracterı́sticas da SR, considerando seu histórico, sua
expectativa de vida, a origem genética, suas caracterı́sticas clı́nicas e as
habilidades funcionais.

2. Fundamentação Teórica
A SR é uma condição crônica e incapacitante que possui caracterı́sticas
fenotı́picas bastante peculiares. A doença foi descrita pela primeira vez pelo
Dr. Rett em 1966, no entanto o interesse por esta doença universalizou-se
somente a partir da publicação de Hagberg et al. (1983) relatando casos de
trinta e cinco meninas com SR.
Síndrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais 195

Após dezesseis anos as bases genéticas da SR foram desvendadas (Amir


et al., 1999). O reconhecimento de que o gene MECP2 encontra-se mutado
em indivı́duos com SR (Walsh & Hochedlinger, 2010) renovou o interesse
na investigação desta doença (Laurvick et al., 2006).
No Brasil, a primeira descrição de caso de SR deu-se por Rosemberg
et al. (1986). O primeiro estudo epidemiológico no paı́s ocorreu em 2003,
com 33 meninas com formas tı́picas e variadas da sı́ndrome, que apresenta-
vam mutações identificadas no gene MECP2 (Pozzi & Rosemberg, 2003).
Estima-se que a prevalência de SR seja de aproximadamente um em
cada 10-15 mil meninas (Pozzi & Rosemberg, 2003; Shahbazian & Zoghbi,
2001).
Segundo Hagberg et al. (2002) apenas nove entre 130 indivı́duos com SR
(7%) ultrapassam a idade de 40 anos. A sub-representação de faixas etárias
mais avançadas foi atribuı́da ao excesso de óbitos precoces em consequência
de problemas respiratórios, crises epilépticas e morte súbita durante o sono.
Nielsen et al. (2001) relataram que a mortalidade na SR é 13 vezes
maior do que a de mulheres normais e que a probabilidade de se alcançar
os 30 anos é de 67%. A idade de sobrevida na SR é sempre questionada.
Um trabalho mais recente apresentado por Freilinger et al. (2010) sobre
expectativa de vida e causas de óbito na SR em um grupo Austrı́aco, relata
que a idade média de óbito é de 13 anos e 4,8 meses e a probabilidade de
sobreviver acima dos 25 anos é de 21%. É importante enfatizar que este
valor é bastante superior em estudos Australianos, com 71% de sobrevida
acima de 25 anos (Freilinger et al., 2010).

3. Metodologia
Neste capı́tulo realizou-se uma revisão de artigos cientı́ficos seguida de sua
análise crı́tica. A metodologia foi dividida em duas etapas: a coleta e
apresentação de material teórico sobre a SR, e a organização dos resul-
tados sobre as habilidades funcionais publicados pelos autores em artigos
cientı́ficos.
Na primeira etapa, foram coletados artigos cientı́ficos publicados sobre
SR utilizando o termo “sı́ndrome de Rett” como descritor nas seguintes
bases de dados: MEDLINE, LILACS, SciELO e PubMed. Após a busca
em tais bases, utilizou-se como estratégia complementar a busca manual de
referências de artigos encontrados. Foram utilizadas as combinações entre
os seguintes descritores da lı́ngua portuguesa: sı́ndrome de Rett, Autocui-
dado, Limitação da mobilidade, Relações interpessoais e Cuidadores. Na
lı́ngua inglesa buscou-se por: Rett syndrome, selfcare, mobility, limitation,
interpersonal relations e caregivers. Além da combinação dos descrito-
res, utilizou-se a busca das seguintes palavras em português: mobilidade,
função social e mutação em MCP2; e em inglês: social function e MCP2
mutation. A partir dos resumos dos artigos encontrados procedeu-se a
196 Monteiro et al.

busca pelos trabalhos completos. Apenas os trabalhos obtidos com texto


completo foram incluı́dos neste estudo.
Na segunda etapa, no que se refere às habilidades funcionais, foram se-
lecionados os resultados experimentais publicados pelos autores a partir da
avaliação de 64 pacientes com SR que preenchiam os critérios para forma
clássica ou tı́pica da doença. A idade da população estudada variou de dois
a 26 anos e nove meses. Estes estudos foram aprovados pelos Comitês de
Ética em Pesquisa do Hospital das Clı́nicas e da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (protocolo no 1033/03) e desenvolvidos medi-
ante a obtenção da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido
pelos responsáveis legal pelos pacientes.

4. Resultados
Para a organização dos resultados optou-se por apresentar discussões relati-
vas à genética, caracterização clı́nica, tratamento e habilidades funcionais.

4.1 Genética
Durante muitos anos, as bases genéticas da SR permaneceram obscuras.
Sabia-se que a quase totalidade era de casos isolados e a ocorrência de
agregados familiares da doença mostrou-se ser extremamente rara. Pelo
fato da doença manifestar-se quase exclusivamente em indivı́duos do gênero
feminino postulou-se tratar de uma doença geneticamente determinada,
dominante, ligada ao X, letal no gênero masculino.
Os estudos em busca de uma causa genética levaram 16 anos até o
reconhecimento de mutações no gene MECP2 associado a SR. A maioria
dos casos isolados ou esporádicos dentro de uma mesma famı́lia e uma
aparente exclusividade no sexo feminino dificultava os estudos de ligação
(Amir et al., 1999; Villard, 2007; Christodoulou & Ho, 2009).
Somente em 1999 foram identificadas mutações no gene MECP2 em
meninas com SR (Amir et al., 1999). Este gene codifica uma proteı́na
que se liga a dinucleotı́deos CpG metilados e que está envolvida com a
inibição de transcrição de genes (MeCP2, Methyl-CpG-binding Protein 2).
Os pacientes com a SR apresentam perda parcial ou total da função desta
proteı́na (Shahbazian & Zoghbi, 2001; Christodoulou & Ho, 2009).
Nas mulheres, o fenótipo parece ser dependente de duas premissas: a
mutação no gene MECP2 e o padrão de inativação do cromossomo X. Em
cada célula, existem dois cromossomos X, mas apenas um deles encontra-se
ativo. A determinação de qual dos cromossomos X, o de origem materna
ou paterna, será inativado em cada célula, ocorre ao acaso durante a fase
embrionária da vida. Desta forma, algumas células terão o cromossomo
X paterno ativo, e outras o X materno. Assim, mulheres com quadros
clı́nicos mais graves tiveram o cromosso X com mutação no gene MECP2
ativo, e as mulheres com manifestações leves ou assintomáticas, tiveram
Síndrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais 197

o cromossomo X com mutação inativado. Estas podem ser genitoras de


crianças com fenótipos variados da SR, independente do sexo da criança
(Colvin et al., 2004; Shahbazian & Zoghbi, 2001).
Já foram descritas mais de 200 mutações patogênicas diferentes no gene
MECP2 em pacientes com SR. Algumas ocorrem de forma recorrente, e oito
destas mutações são responsáveis por aproximadamente 50% dos casos de
SR. As mutações encontradas são variáveis e podem ser: mutação pontual,
que promove à substituição simples de um aminoácido, modificando o có-
digo de leitura do DNA, ou inserindo um códon de parada prematura da
tradução ou, ainda, alterando o processamento do RNA mensageiro (splice
site mutation). Também são encontradas deleções ou duplicações levando,
em geral, a uma alteração do quadro de leitura, podendo haver rearranjos
extensos e complexos (Shahbazian & Zoghbi, 2001; Colvin et al., 2004).
Considerando a variedade de fenótipos relacionados à SR e o grande nú-
mero de mutações identificadas, alguns pesquisadores tentaram determinar
uma correlação genótipo-fenótipo, porém os resultados foram inconsisten-
tes. Indivı́duos com a mesma mutação podem ter fenótipos diferentes, na
dependência do padrão de inativação do cromossomo X (Shahbazian &
Zoghbi, 2001; Christodoulou & Ho, 2009).
Identifica-se a mutação do gene MECP2 em pacientes com a forma
clássica da SR, e também se observa várias outras sı́ndromes clı́nicas des-
critas com a mutação no mesmo gene, variando desde leves distúrbios de
aprendizagem em meninas, até deficiência mental grave, crises epilépticas,
ataxia e encefalopatia neonatal em meninos.

4.2 Características clínicas e critérios diagnósticos


O diagnóstico de SR é baseado em critérios clı́nicos (Temudo et al., 2011).
Neul et al. (2010) apresentaram um trabalho de revisão de diagnóstico,
critérios e nomenclatura para SR. Neste capı́tulo se apresenta os critérios
estabelecidos por Hagberg et al. (1985) e atualizados por Hagberg et al.
(2002), por ser o mais utilizado e citado no momento.
Os critérios de inclusão para a SR são:
1. Perı́odos pré e perinatais normais; desenvolvimento psicomotor
normal durante os primeiros seis meses; frequentemente dos 12
aos 18 meses de vida;
2. Perı́metro cefálico normal ao nascimento; desaceleração na ve-
locidade de crescimento do perı́metro cefálico entre seis meses
e quatro anos de idade;
3. Involução no comportamento social e psicomotor (perda de ha-
bilidades); disfunção no desenvolvimento da comunicação e si-
nais de demência;
4. Perda de habilidades manuais intencionais adquiridas entre um
e quatro anos de idade;
198 Monteiro et al.

5. Surgimento de estereotipias do tipo esfregar, lavar e bater das


mãos, entre um e quatro anos de idade;
6. Surgimento de marcha apráxica e apraxia ou ataxia de tronco,
entre um e quatro anos de vida.
Os critérios de apoio para a SR são:
1. Disfunção respiratória: perı́odos de apnéia durante vigı́lia; hi-
perventilação intermitente, episódios de perda de fôlego, expul-
são forçada de ar ou saliva;
2. Anormalidades eletroencefalográficas: alentecimento rı́tmico
intermitente (3-5 Hz) e da atividade de base, descargas epi-
leptiformes com ou sem crises epilépticas;
3. Crises epilépticas;
4. Espasticidade, frequentemente associada com perda de massa
muscular e distonia;
5. Distúrbio vasomotor periférico;
6. Escoliose;
7. Retardo no crescimento;
8. Pés pequenos e hipotróficos.
Os critérios de exclusão para a SR são:
1. Evidência de retardo de crescimento intra-uterino;
2. Organomegalia ou outras evidências de moléstia de depósito;
3. Retinopatia ou atrofia óptica;
4. Microcefalia ao nascimento;
5. Evidência de dano cerebral adquirido no perı́odo perinatal;
6. Comprovação de distúrbios neurológicos progressivos de causa
metabólica ou outra natureza;
7. Distúrbio neurológico adquirido resultante de infecções graves
ou traumatismo craniano.
Algumas caracterı́sticas clı́nicas da SR são bastante peculiares e mere-
cem comentários adicionais.

4.2.1 Movimentos estereotipados das mãos


Os movimentos estereotipados das mãos são comuns na SR (Temudo et al.,
2011; Fehr et al., 2010). Estes ocorrem em vigı́lia e surgem quando se inicia
a perda do uso funcional das mãos. As estereotipias mais caracterı́sticas
são as realizadas junto à linha média, com as mãos unidas ou ao redor da
boca (Segawa & Nomura, 2005). Os movimentos das mãos mais frequente-
mente observados são comparados a torcer, lavar, abanar, aplaudir, bater
Síndrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais 199

e esfregar (Segawa & Nomura, 2005; Hagberg, 1989). Apesar do grande


comprometimento funcional das mãos, Downs et al. (2010) realizaram um
trabalho com 144 indivı́duos com SR e demonstraram que dois terços con-
seguem algum tipo de função, seja pegar ou manipular um objeto.
Monteiro et al. (2009) referem que 75% das pacientes avaliadas
mostraram-se incapazes de alimentar-se com os dedos. Larsson et al. (2005)
relatam que 57% das 125 pacientes avaliadas perderam a capacidade de se
alimentar de forma autônoma. Na série de 143 pacientes de Mount et al.
(2002) 70,6% dos pacientes não utilizavam a mão com alguma finalidade.
A falta de funcionalidade com as mãos é caracterı́stica da SR e fator de
muitas discussões. Fabio et al. (2009) verificaram que a contenção das este-
reotipias manuais, o controle postural e a organização de estı́mulos externos
podem ser opções para estimular a funcionalidade na SR.

4.2.2 Bruxismo
O bruxismo em vigı́lia pode ser considerado um critério de apoio ao diag-
nóstico de SR e é encontrado na grande maioria das pacientes. As caracte-
rı́sticas sonoras são diferentes do ranger agudo que ocorre durante o sono
(Hagberg, 1989). O bruxismo na SR não se limita aos perı́odos de sono.

4.2.3 Episódios de hiperventilação e apnéia


As alterações do padrão respiratório são frequentes na SR. Cerca de 50%
das meninas com SR apresentam episódio de hiperventilação, frequente-
mente interrompidos por apnéias com duração de cerca de 30 segundos
(Hagberg et al., 2001). Estas ocorrem durante a vigı́lia e geralmente são
acompanhados por manobra de Valsalva. Durante os perı́odos de hiper-
ventilação as crianças ficam agitadas, com movimentos das mãos mais in-
tensos, pupilas dilatadas, taquicardia, movimentos de balançar o corpo e
tônus muscular aumentado (Bruck et al., 2001; Julu et al., 2001).

4.2.4 Distúrbios da comunicação


Na forma tı́pica da SR observa-se ausência da fala com manutenção de
vocalizações simples e balbucio. Como a capacidade de verbalização é
bastante limitada é preciso atenção para reconhecer formas não verbais de
comunicação, normalmente sutis (Fehr et al., 2010).
Monteiro et al. (2009) observaram que 92,2% não utilizavam uma única
palavra com significado adequado e que 20,3% chegavam a empregar algum
gesto com propósito. Estes dados foram comparados aos de Velloso et al.
(2009) que avaliaram os conceitos de comunicação em pacientes com SR por
meio da avaliação da cor, da forma, do tamanho e da posição de objetos,
por rastreamento visual na tela do computador. O estudo não verificou
funcionalidade no grupo avaliado. De acordo com Segawa (2005) 53% das
38 pacientes estudadas não falavam qualquer palavra. Para Larsson et al.
(2005) 65% de 125 pacientes pesquisadas eram capazes de expressar de
200 Monteiro et al.

alguma forma o que queriam. Gratchev et al. (2001) refere que 34% de seus
38 pacientes eram capazes de pronunciar alguma palavra. No trabalho de
Hetzroni & Rubin (2006) das oito meninas avaliadas, quatro apresentavam
algum tipo de comunicação, e uma tinha comunicação verbal funcional. A
comunicação verbal efetiva é considerada como uma variação diagnóstica
rara e atı́pica na SR (Renieri et al., 2009).

4.2.5 Riso noturno e distúrbios do sono


Na SR é frequente a ocorrência de alterações do sono, entre as quais a
eclosão paroxı́stica de episódios de riso (Hagberg, 1989). Em investigação
de oitenta e três pacientes com SR. Ellaway et al. (2001) determinaram
que a qualidade do sono é pobre, quando comparada com crianças normais.
Normalmente, na criança com SR as horas totais de sono diminuem com a
idade, principalmente até os quatro anos, quando os cochilos diurnos quase
desaparecem. No entanto, isto não foi observado no grupo de pacientes com
SR que mantinha um padrão imaturo. Neste grupo não houve a diminuição
do sono relacionada à idade e ocorreu a manutenção do sono durante o dia.
Mount et al. (2002) relatam que 60,8% das pacientes avaliadas têm cochilos
frequentes durante o dia. Segawa (2001) afirma que o ciclo do sono na SR
equivale ao de uma criança de quatro meses de idade.

4.2.6 Crescimento
Dois parâmetros do crescimento podem ser significativamente afetados na
SR: o desenvolvimento pondoestatural e o perı́metro cefálico. Para Hag-
berg et al. (2001) a desaceleração do crescimento craniano ocorre já a partir
do terceiro mês de vida. Esta é uma das caracterı́sticas mais constantes
nesta condição. Para Segawa (2001) o peso corporal encontra-se significa-
tivamente abaixo do normal. Outra caracterı́stica de alteração do cresci-
mento é o crescimento desproporcional dos pés (Hagberg, 1989). Larsson
et al. (2005) relatam que 97 entre 125 pacientes com SR (77,6%) tinham
os pés pequenos para a idade cronológica.

4.2.7 Ataxia e apraxia


As pacientes com SR que permanecem ambulantes apresentam marcha ca-
racterı́stica, realizada com os membros em extensão e alargamento da base
de sustentação. Os passos são curtos e as mãos permanecem unidas, junto
à linha média, sem oscilação recı́proca dos membros superiores. Algu-
mas vezes, há preferência de caminhar na ponta dos pés (Larsson & Witt-
Engerstrom, 2001). A falta de direção e de planejamento faz com que a
marcha assuma um caráter apráxico. Sobre a deambulação, Monteiro et al.
(2009) apontam que 51,6% das pacientes avaliadas mostraram-se incapazes
de andar em ambiente externo sem auxı́lio. Estes achados se assemelham
aos de Segawa (2005) que investigou 38 indivı́duos com SR e detectou que
Síndrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais 201

47% eram incapazes de deambular em ambientes externos sem auxı́lio. Col-


vin et al. (2004) detectaram que 68% das 147 pacientes de sua série nunca
andaram. Gratchev et al. (2001) relataram que 10 entre 38 pacientes ava-
liados (26,3%) eram incapazes de andar.

4.2.8 Epilepsia
As crises epilépticas ocorrem em aproximadamente 70% a 80% dos indivı́-
duos com SR e, em geral, iniciam após os três anos de idade (Nissenkorn
et al., 2010). A epilepsia pode ter inı́cio mais precoce, nos primeiros meses
de vida. Nas fases mais avançadas da doença, as manifestações epilépticas
tendem a ser menos frequentes e intensas (Hagberg, 1989).

4.3 Formas clínicas


Costuma-se reconhecer duas formas clı́nicas da SR: a clássica ou tı́pica e,
a atı́pica. A forma clássica da SR é observada em pelo menos 80% dos
casos da doença e, de acordo com Witt-Engerstrom & Hagberg (1990),
possui quatro estágios clı́nicos: estagnação precoce do desenvolvimento
psicomotor, involução precoce, pseudo-estacionário e deterioração motora
tardia.
O estágio I, estagnação precoce do desenvolvimento psicomotor, ocorre
entre cinco meses e dois anos de idade. Neste estágio a criança para de ad-
quirir habilidades psicomotoras e verificam-se as seguintes caracterı́sticas:
estagnação no desenvolvimento psicomotor, mudanças da comunicabilidade
e do contato ocular, distúrbios inespecı́ficos da personalidade, diminuição
do interesse por jogos ou brincadeiras, estereotipias manuais episódicas e
desaceleração do crescimento craniano.
No estágio II, involução precoce, que ocorre entre um e três anos de
idade, há perdas das habilidades motoras já adquiridas e demenciação
grave. Neste estágio encontram-se as seguintes caracterı́sticas: estereo-
tipias manuais tı́picas, caracterı́sticas autı́sticas (um dos problemas princi-
pais), perda das habilidades manuais adquiridas com manutenção da fun-
ção motora axial, marcha apráxica e atáxica, respiração irregular e crises
epilépticas.
No estágio III, pseudo-estacionário, que ocorre na fase pré-escolar ou
escolar, observa-se uma falsa parada no processo de regressão neuropsi-
comotora, que passa a ocorrer de forma mais lenta. Neste estágio estão
presentes as seguintes caracterı́sticas: relativa estabilização clı́nica, regres-
são parcial dos sintomas autı́sticos, apraxia e ataxia de marcha, ataxia
de tronco, estereotipias manuais tı́picas, retardo mental grave ou demên-
cia, crises epilépticas, espasticidade, distúrbios respiratórios, perda de peso
apesar de se alimentar adequadamente, escoliose e bruxismo.
O estágio IV, deterioração motora tardia, tem inı́cio após a perda da
marcha ou a progressiva redução da mobilidade e pode durar décadas,
pois esta perda é mais lenta do que no estágio II. Neste estágio ocorrem
202 Monteiro et al.

as seguintes caracterı́sticas: marcha reduzida, mobilidade restrita ao leito


ou a cadeira de rodas, sı́ndrome de múltiplas deficiências graves, para ou
tetraparesia, escoliose, distúrbios tróficos e vasomotores em pés, melhora
do contato emocional, melhora das manifestações epilépticas, olhar fixo e
intenso, linguagem expressiva e receptiva praticamente ausente.
O estágio I é habitualmente diagnosticado retrospectivamente e
caracteriza-se pela ocorrência de dissociação no desenvolvimento motor.
Este estágio pode estar ausente ou rapidamente evoluir para o estágio sub-
sequente, e caracteriza-se por inadequada aquisição de funções motoras
manipulatórias finas e atraso no controle do tronco, no engatinhar e na
marcha independente (Hagberg, 1993). Cerca de dois terços das meninas
com forma tı́pica de SR apresentam atraso na aquisição da marcha e cerca
de 40% jamais adquire esta habilidade, o que se constitui no grupo de pior
desempenho (Witt-Engerstrom, 1987).
A perda rápida das habilidades previamente adquiridas é o que me-
lhor caracteriza o ingresso no estágio II ou de involução precoce. Esta
fase tem inı́cio a partir do final do primeiro ano, intensificando-se entre
um e dois anos de idade e persistindo até os 30 a 42 meses, com duração
média de 17 meses (Witt-Engerstrom, 1987). Nesta fase é bastante fre-
quente a ocorrência de alterações de humor, irritabilidade, crises de choro
aparentemente sem motivos ou episódios de risos durante o sono. Ocor-
rem também comportamentos autı́sticos, isolamento social, movimentos
corporais de balanceio rı́tmico, perda de linguagem verbal e evidente di-
ficuldade nas habilidades manuais, como a preensão fina. Estas perdas
podem estabelecer-se de forma rápida, em semanas, ou insidiosa, ao longo
de meses. Segundo Hagberg (1993) no final desta fase ocorrem movimentos
involuntários e repetidos de mãos, com padrões estereotipados. As estere-
otipias mais precoces são movimentos circulares de levar uma ou as duas
mãos à boca, com movimentos faciais, de lı́ngua e labiais, além de ranger
dos dentes em vigı́lia. Todos estes sinais caracterı́sticos permitem suspeitar
do diagnóstico de SR.
O estagio III, pseudo-estacionário, caracteriza-se por recuperação es-
pontânea do contato interpessoal e da comunicação não verbal (Hagberg,
1993). Ele ocorre em média aos trinta meses de idade, podendo variar
de vinte a cinquenta meses. Um fenômeno conhecido como apontar com o
olhar (eye pointing) é uma forma caracterı́stica de comunicação que emerge
nesta fase (Hagberg et al., 1983). Apesar desta melhora, os movimentos
estereotipados de mãos, na linha média, tornam-se mais evidentes e surgem
padrões definidos de estereotipias manuais, como torcer, esfregar e bater.
A incapacidade de executar movimentos manuais intencionais fica mais evi-
dente. O estágio III pode durar décadas e é observado em alguns pacientes
com SR que permanecem andando de forma independente ao longo de toda
a vida.
Síndrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais 203

O estágio IV, ou deterioração motora tardia, é caracterizado por perda


da marcha independente nas pacientes que adquiriram esta função (estágio
IV A), ou por progressiva redução da mobilidade nas meninas que nunca
adquiriram marcha, vista em geral a partir dos 10 anos de idade (estágio IV
B) (Witt-Engerstrom & Hagberg, 1990). Nesta fase da doença, a escoliose
está quase constantemente presente, bem como a osteopenia. Estas mani-
festações costumam ser mais precoces e intensas no subgrupo previamente
não ambulante (IV B). Apesar de ocorrer uma progressão dos sintomas mo-
tores, não ocorre perda adicional da função cognitiva (Segawa & Nomura,
2005; Bruck et al., 2001).
Ainda quanto à classificação, as formas atı́picas de SR são aquelas em
que nem todas as caracterı́sticas da doença estão presentes. Reconhecem-
se as formas: frusta com linguagem preservada, congênita e a de involução
inicial tardia (Mari et al., 2005).
A forma frusta com linguagem preservada é uma variante descrita por
Yamashita et al. (2001). Ela representa cerca de 10% dos casos de SR,
constituindo-se a forma de evolução mais lenta e menos grave da doença.
O uso funcional das mãos é relativamente preservado, ocorrem menos este-
reotipias e há manutenção do uso de linguagem, com permanência do uso
de frases agramaticais ou palavras isoladas. Os sinais adicionais de envol-
vimento motor central (espasticidade, distonia e escoliose) podem ocorrer
após a puberdade. Segundo Hagberg et al. (2001) a forma frustra é restrita
ao grupo que após os dez anos de idade apresenta quadro clı́nico atenuado
e incompleto de SR. Mari et al. (2005) relataram que em 50% das paci-
entes de forma frustra de SR encontra-se mutação em MECP2, resultado
inferior ao observado na forma clássica, em que cerca de 90% dos casos tem
anormalidade neste gene.
A forma congênita caracteriza-se por grave atraso inicial do desenvol-
vimento psicomotor e microcefalia congênita. Nesta forma nenhuma outra
etiologia pode ser definida e há caracterı́sticas bastante nı́tidas de SR a
partir de 18 meses de idade (Hagberg, 1995).
A forma com involução inicial tardia caracteriza-se por inı́cio da involu-
ção entre os três e seis anos de idade. As caracterı́sticas comportamentais
são muito similares às observadas na forma clássica de SR. Este quadro
também apresenta melhor prognóstico, com manutenção da marcha inde-
pendente. Há poucos os relatos desta forma de SR (Hagberg, 1995).

4.3.1 SR no sexo masculino (fenótipos correlacionaos a mutações do


gene MECP2 no sexo masculino)
Existem relatos de meninos com caracterı́sticas fenotı́picas similares às ob-
servadas na SR clássica, como os sete casos descritos por Christen & Hane-
feld (1995) antes da identificação do gene MECP2 como responsável pela
SR. A cada ano há mais estudos de casos de meninos com mutação no
MECP2 (Villard, 2007; Christodoulou & Ho, 2009).
204 Monteiro et al.

Villard (2007) propôs uma classificação para as sı́ndromes relacionadas


a mutações ou a aumento do número de cópias de MECP2 no sexo mas-
culino: no grupo um inseriu a forma clássica da SR no sexo masculino, no
grupo dois a deficiência mental de leve a grave e, no grupo três, o fenótipo
grave associado a duplicação no gene MECP2.
A encefalopatia neonatal é considerada a forma clássica e a mais fre-
quente da SR no sexo masculino. Estes casos foram associados a deleção ou
mutação de ponto no gene MECP2. A genitora assintomática ou com difi-
culdades de aprendizagem leve, pode ser portadora da mutação, às vezes,
com filhas afetadas com a forma clássica da SR. Os meninos acometidos
apresentam microcefalia, hipotonia axial desde o perı́odo neonatal, espasti-
cidade dos membros, movimentos involuntários, incluindo os maneirismos
manuais, crises epilépticas e anormalidades respiratórias, como hipoventi-
lação central, podendo evoluir para insuficiência respiratória. Tais crianças
falecem antes dos três anos de idade (Villard, 2007; Christodoulou & Ho,
2009).
O segundo grupo é caracterizado por meninos com deficiência men-
tal não progressiva de leve a grave. A sobrevida destes indivı́duos é mais
longa, alcançando a quarta ou quinta década de vida. Os sinais clı́nicos
mais frequentemente associados são: sinais piramidais, caracterı́sticas par-
kinsonianas e macroorquidismo, o que levou a denominação de sı́ndrome
PPM ligada ao X (PPM-X). Estes pacientes também podem apresentar
ataxia, tremor, incoordenação motora, afasia, apraxia, escoliose, epilepsia
e transtornos psiquiátricos, como esquizofrenia e autismo (Villard, 2007;
Christodoulou & Ho, 2009).
O fenótipo grave associado a duplicações no Xq28, região onde está
localizado o gene MECP2, foi descrito em meninos com deficiência mental
grave associada a hipotonia facial com protusão da lı́ngua, espasticidade
progressiva e hiperreflexia em membros, predomı́nio nos inferiores e infec-
ções respiratórias recorrentes. A última é uma das causas do óbito, que
ocorre por volta da segunda década de vida. Podem apresentar também
microcefalia e assimetria do crânio, atraso do desenvolvimento neuropsi-
comotor, ausência da fala, hipotonia axial e crises epilépticas de difı́cil
controle. Geralmente, estes meninos não adquirem a marcha e apresentam
dismorfismo faciais leves (Villard, 2007; Christodoulou & Ho, 2009).
A forma clássica e as variantes mais leves da SR foram descritas entre
meninos que apresentavam alterações cromossômicas, como 47XXY (ca-
riótipo de indivı́duos com sı́ndrome de Klinefelter) (Topcu et al., 2002;
Clayton-Smith et al., 2000), ou com mutação no MECP2 pós-zigótica re-
sultante do mosaicismo somático, em que algumas células apresentam mu-
tação do gene e outras não (Villard, 2007; Christodoulou & Ho, 2009).
Síndrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais 205

4.4 Diagnóstico
A confirmação do diagnóstico de SR em indivı́duos com quadro clı́nico
sugestivo desta condição pode ser feita por meio da pesquisa de mutações
no gene MECP2. Recomenda-se que a investigação da SR seja feita por
sequenciamento bidirecional que identificará a maioria das mutações. Caso
este estudo seja negativo e a clı́nica sugestiva, deve-se proceder a pesquisa
para grandes duplicações ou deleções, por meio de técnicas como o MLPA
(Multiplex Ligation Probe Amplification) (Villard, 2007; Christodoulou &
Ho, 2009).
É importante enfatizar que o diagnóstico da SR é baseado em critérios
clı́nicos, não sendo necessária a confirmação genética para se estabelecer
este diagnóstico (Hagberg et al., 2002). Ocorre identificação de mutação
em MECP2 em 70 a 90% dos pacientes com a forma clássica e 40 a 50% dos
com formas atı́picas (Shahbazian & Zoghbi, 2001; Julu & Witt-Engerstrom,
2005; Christodoulou & Ho, 2009). A presença de grandes deleções no gene
está presente em 10% dos indivı́duos com a forma clássica e 7% com as
formas atı́picas (Christodoulou & Ho, 2009).
Um outro gene, também localizado no cromossomo X e conhecido como
CDKL5, é responsável por formas atı́picas de SR, com manifestações mais
graves e precoces, em especial epilepsia de difı́cil controle medicamentoso.

4.5 Tratamento medicamentoso


Não existe tratamento efetivo para a SR, uma condição neurodegenerativa.
Além da reabilitação multidisciplinar, algumas medicações são utilizadas
visando o tratamento medicamentoso sintomático.
Nas crianças com crises epilépticas, a administração do Topiramato,
droga com efeitos GABAérgicos e glutaminérgicos, ambos sistemas envol-
vidos na SR, melhora as anormalidades respiratórias e tende a controlar as
crises (Segawa & Nomura, 2005; Christodoulou & Ho, 2009).
A risperidona, neuroléptico atı́pico, em baixas doses, ou drogas inibido-
ras da recaptura da serotonina, são opções para o tratamento da agitação
psicomotora. Porém, elas devem ser ministradas com cautela nos casos das
crianças com crises epilépticas não controladas. A melatonina pode melho-
rar o padrão do sono. Entretanto, como não é comercializada no Brasil,
outras opções são o hidrato de cloral, a hidroxizina e a difenidramina (Ch-
ristodoulou & Ho, 2009).
Alguns autores sugerem que a SR é uma das formas secundária de
deficiência de folato no cérebro, e a administração de ácido folı́nico poderia
promover algum benefı́cio, principalmente no controle das crises epilépticas
(Ramaekers e Blau (2005), apud Segawa & Nomura (2005)).

4.6 Habilidades funcionais na SR


Um aspecto interessante para ser analisado nos pacientes com SR são as
habilidades funcionais e a necessidade de assistência por parte dos cuida-
206 Monteiro et al.

dores. Para tanto optou-se em apresentar dados baseados nos trabalhos de


Monteiro et al. (2009) e Monteiro et al. (2010).
Estes trabalhos utilizaram como sistema de avaliação a o Inventário
de Avaliação Pediátrica de Incapacidade (PEDI - Pediatric Evaluation of
Disability Inventory), desenvolvido por Haley et al. (1992) e validado para
a população brasileira por Mancini (2005). Este instrumento de avaliação
tem como caracterı́stica principal coletar informações a respeito da capa-
cidade dos indivı́duos e da necessidade de auxı́lio oferecida pelo cuidador
nas áreas de autocuidado, mobilidade e função social. A Tabela 1 mostra
a comparação entre as habilidades funcionais e a Tabela 2 a necessidade
de assistência do cuidador.
Tabela 1. Habilidades funcionais na SR. Adaptado de Monteiro et al.
(2009)).
Área do PEDI Média± Pior Melhor
desvio-padrão desempenho desempenho
Autocuidado 8,9±5,4 0 26
Mobilidade 30,2±25,7 1,7 74,5
Função social 5,2±4,9 0 21,5

Tabela 2. Assistência do cuidador na SR. Adaptado de Monteiro et al.


(2009)).
Área do PEDI Média± Pior Melhor
desvio-padrão desempenho desempenho
Autocuidado 0,9±2,7 0 15
Mobilidade 32,2±32,2 0 83
Função social 0,4±1,9 0 12

A Figura 1 apresenta a sobreposição dos resultados das habilidades


funcionais e assistência do cuidador.
Analisando os dados apresentados, na SR a habilidade funcional que se
mostra mais preservada é a mobilidade, e o desempenho nas áreas de fun-
ção social e autocuidado apresentam sempre valores muito baixos, mesmo
em fases iniciais da doença (Monteiro et al., 2009). O prejuı́zo do uso funci-
onal das mãos, presente precocemente na SR (Segawa, 2005; Mount et al.,
2002; Larsson et al., 2005) provavelmente é o responsável pelo desempe-
nho bastante baixo nas áreas de autocuidado e, desta forma, verificou-se a
necessidade de muito auxı́lio por parte do cuidador (Monteiro et al., 2009).
A perda ou falta de aquisição da expressão da linguagem (Larsson et al.,
2005; Segawa, 2001; Gratchev et al., 2001) responde pela baixa pontuação
na área de função social (Monteiro et al., 2009). Para viabilizar função na
Síndrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais 207

Figura 1. Comparação entre os escores de desempenho no PEDI.

área de autocuidado, na maioria dos itens do PEDI, foi necessário auxı́lio


total do cuidador.
Nas habilidades funcionais a área que necessitou de menor assistência
por parte do cuidador foi à de mobilidade (Monteiro et al., 2009). Laurvick
et al. (2006) também concluı́ram que a SR é associada com incapacidade
grave, e que a maioria das crianças e adultos jovens são altamente de-
pendentes no autocuidado, na mobilidade, na comunicação e na cognição
social.
Na comparação entre a habilidade funcional e a assistência do cuidador,
este estudo sugere que, na área de mobilidade, as pacientes encontram-se
assistidas de forma adequada, uma vez que o desempenho das habilidades
funcionais foi similar ao do auxı́lio prestado pelo cuidador. Nas áreas de
autocuidado e função social, no entanto, as pacientes com SR recebem
mais assistência do cuidador do que é necessário. Todavia, o desempenho
global nestas duas áreas já é significativamente comprometido e as poucas
habilidades podem não possibilitar qualquer função sem auxı́lio.

5. Considerações Finais
Com base nos aspectos apontados na presente revisão, é possı́vel afirmar
que as caracterı́sticas clı́nicas da SR a tornam uma doença incapacitante
e uma condição particularmente desafiadora para a equipe de reabilitação,
tendo em vista a gravidade do comprometimento motor com presença de
208 Monteiro et al.

escoliose, retrações osteotendı́neas e a progressiva imobilidade nas fases


mais avançadas da doença.
Além do comprometimento motor, as alterações cognitivas evidentes
nesta população, associadas às alterações músculo-esqueléticas, podem im-
pactar negativamente no nı́vel de independência funcional. Para tanto,
o presente trabalho fornece informações úteis e atuais sobre as principais
caracterı́sticas da doença, o que auxiliará profissionais da saúde na compre-
ensão dos fenômenos relacionados, bem como no tratamento e atendimento
de seus pacientes.

Referências
Amir, R.E.; Van den Veyver, I.B.; Wan, M.; Tran, C.Q.; Francke, U.
& Zoghbi, H.Y., Rett syndrome is caused by mutations in X-linked
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Notas Biográficas
Carlos Bandeira de Mello Monteiro: é Educador Fı́sico (Faculdade do
Clube Náutico Mogiano, 1987), Fisioterapeuta (Universidade do Grande ABC,
1993), Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento (Universidade Presbiteriana
Mackenzie, 2001), Doutor em Neurologia (USP, 2007). Atualmente é docente do
curso de Ciências da Atividade Fı́sica da USP.

Zodja Graciani é Fisioterapeuta (Universidade de Santo Amaro, 2000),


Especialista em Genética das Deficiências (Universidade Presbiteriana Macken-
zie, 2002), Mestre em Neurologia (USP, 2009). Atualmente é supervisora da
Associação Brasileira de Sı́ndrome de Rett.

Camila Torriani-Pasin é Fisioterapeuta (UNICID, 2000), Especialista em


Fisioterapia Motora (UNIFESP, 2002), Doutor em Neurologia (USP, 2010).
Atualmente é docente da Escola de Educação Fı́sica e Esporte da USP.

Emı́lia Katiane Embiruçu é Médica (UFBA, 1995), Especialista em Neuro-


logia (Hospital Universitário Edgard Santos, 1999), Especialista em Neurologia
Infantil (FMUSP, 2007), Mestre em Medicina e Saúde (UFBA, 2003), Doutor
em Neurologia (USP, 2009). Atualmente é docente do Departamento de Ciências
da Vida da UNEB.

Fernando Kok é Médico (USP, 1977), Doutor em Neurologia (USP, 1990), tem
pós-doutorado (Johns Hopkins University, 1995) e é Livre-docente (USP, 2006).
Capítulo 12

Fisioterapia na Unidade de Terapia Intensiva:


Enfoque na Criança Crítica Neurológica

Adriana Yuki Izumi∗,


Dirce Shizuko Fujisawa, Márcia Regina Garanhani

Resumo: Este capı́tulo apresenta um estudo qualitativo sobre a


atuação fisioterapêutica intensiva em neurologia pediátrica. O ob-
jetivo foi conhecer a concepção dos fisioterapeutas sobre os cuida-
dos à criança neurológica na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Realizaram-se entrevistas semi-estruturadas e os relatos dos par-
ticipantes foram gravados, transcritos, analisados e categorizados.
Os entrevistados compreendem que o cuidado à criança é global,
de alta complexidade e seus objetivos são a promoção da vida, a
prevenção de complicações respiratórias, musculoesqueléticas e cir-
culatórias, além do estı́mulo ao desenvolvimento neuropsicomotor.
Destaca-se que o fisioterapeuta é integrante fundamental da equipe
multiprofissional na UTI pediátrica e neonatal.

Palavras-chave: Unidade de terapia intensiva, Fisioterapia, Cri-


ança.

Abstract: This chapter shows a qualitative study about the phy-


sical therapeutic intensive care in pediatric neurology. The aim
was to unveil the conceptions of the physical therapists about child
treatment in the Intensive Care Unit (ICU). We conducted semi-
structured interviews and the reports were recorded, analyzed and
categorized. The participants understand that child care is global,
involves high complexity and the goals are the promotion of life, pre-
vention of respiratory, musculoskeletal and respiratory complicati-
ons, as well as stimulation of the neuropsichomotor development.
We highlight that the physical therapist has a central function in a
pediatric and neonatal ICU multi-professional team.

Keywords: Intensive care unit, Physical therapy, Child.

∗ Autor para contato: adriyuki@yahoo.com.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


214 Izumi et al.

1. Introdução
As Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) são unidades hospitalares desti-
nadas a pacientes crı́ticos que necessitam de cuidados complexos e especi-
alizados (Leite & Vila, 2005). As UTIs e desempenham um papel decisivo
na chance de sobrevida de pacientes gravemente enfermos (Pereira et al.,
1999).
Em virtude da constante expectativa de situações de emergência, da
alta complexidade tecnológica e da concentração de pacientes graves sujei-
tos a mudanças súbitas no estado geral, a internação na Unidade de Terapia
intensiva (UTI) necessita de profissionais especializados e qualificados, com
equipe multidisciplinar envolvendo médicos, enfermeiros, fisioterapeutas,
nutricionistas, psicólogos e terapeutas ocupacionais (Leite & Vila, 2005;
Pereira et al., 1999).
A atuação do fisioterapeuta, no convı́vio com a equipe multidisciplinar
favorece a recuperação dos pacientes (Zorzi et al., 2008). Sua presença cons-
tante auxilia decisivamente na recuperação respiratória e motora precoces,
e na motivação do paciente. Isto reduz o número de dias de internação e
os custos hospitalares (Pereira et al., 1999).
A assistência fisioterapêutica em UTI pediátrica e neonatal, embora
com objetivos semelhantes àqueles traçados na UTI de adultos, apresenta
particularidades relacionadas às diferenças anatômicas e fisiológicas da cri-
ança (Nicolau & Lahóz, 2007).
A maioria dos pacientes internados em UTI pediátrica e neonatal pos-
sui doenças respiratórias ou complicações pulmonares decorrentes de pro-
cedimentos cirúrgicos e de Ventilação Pulmonar Mecânica (VPM). Assim,
os cuidados técnicos, próprios da atuação da fisioterapia, devem ser bem
estabelecidos, estudados e empregados (Carvalho et al., 2004).
Uma vez estabilizados os parâmetros cardiopulmonares no paciente crı́-
tico, a atenção deve ser dirigida ao Sistema Nervoso Central (SNC), pois
sua estabilidade é essencial para assegurar a recuperação e o desenvolvi-
mento infantil (Berk & Sampliner, 1991).
A fisioterapia tem papel essencial no tratamento do paciente crı́tico in-
ternado UTI, tanto na reabilitação cardiopulmonar, quanto na reabilitação
e na profilaxia dos danos neurológicos (Knobel, 2006).
A atuação do fisioterapeuta na UTI pediátrica e neonatal requer habi-
lidades técnicas especializadas, trabalho em equipe e atuação com enfoque
no cuidado global da criança e famı́lia (Molina et al., 2007).
Desta forma, o objetivo do presente estudo foi investigar a concepção
dos fisioterapeutas que desenvolvem atividade profissional em UTI pediá-
trica e neonatal sobre sua atuação com a criança crı́tica internada, con-
siderando as suas competências, estratégias e o seu papel junto à equipe
multiprofissional.
Fisioterapia na UTI: enfoque na criança crítica neurológica 215

2. Fundamentação Teórica
2.1 Cuidado em UTI
A UTI nasceu da necessidade de se oferecer suporte avançado de vida a
pacientes agudamente doentes, que porventura possuam chances de sobre-
viver. Assim, destina-se à internação de pacientes com instabilidade clı́nica
e com potencial de gravidade (Carvalho et al., 2006). Trata-se de um am-
biente de alta complexidade, reservado e único no ambiente hospitalar,
pois se propõe a estabelecer monitorização completa e vigilância em tempo
integral (Freire et al., 1998).
O cuidado em UTI é orientado pelo modelo médico biologicista, cuja
atenção está voltada principalmente para o órgão doente, para a doença,
para os procedimentos técnicos (Nascimento & Trentini, 2004) e para os
aspectos fı́sicos e de controle das funções vitais do paciente (Leite & Vila,
2005).
O paciente internado em UTI necessita de cuidados de excelência não
apenas para os problemas fisiopatológicos, mas também para as questões
psicossociais, ambientais e familiares, que se tornam intimamente interli-
gadas à doença fı́sica (Vila & Rossi, 2002).
Além de uma concentração de pacientes crı́ticos e de tecnologia avan-
çada, nas últimas décadas a UTI se tornou um local de prática da equipe
multiprofissional experiente e que possui competências e formações espe-
cı́ficas (Nozawa et al., 2008). A complexidade deste serviço, em termos
de equipamentos, de recurso humano e da maior quantidade de casos com
indicação de internação, fez com que os cuidados ao paciente crı́tico envol-
vessem profissionais médicos das diversas especialidades, enfermeiros, fisi-
oterapeutas, nutricionistas, psicólogos e terapeutas ocupacionais (Pereira
et al., 1999).
A necessidade de uma equipe multidisciplinar dentro da UTI favorece
e influencia a qualidade da assistência prestada aos pacientes (Zorzi et al.,
2008).
De acordo com a portaria no 3432, de 12 de agosto de 1998 do Minis-
tério da Saúde, a UTI deve contar uma equipe básica composta por: um
responsável técnico com tı́tulo de especialista em medicina intensiva ou com
habilitação em medicina intensiva pediátrica, um médico diarista com tı́-
tulo de especialista em medicina intensiva ou com habilitação em medicina
intensiva pediátrica para cada dez leitos ou fração nos turnos da manhã e
da tarde, um médico plantonista exclusivo para até dez pacientes ou fração,
um enfermeiro coordenador exclusivo da unidade e responsável pela área
de enfermagem, um enfermeiro exclusivo da unidade para cada dez leitos
ou fração por turno de trabalho, um fisioterapeuta para cada dez leitos ou
fração no turno da manhã e da tarde, um auxiliar ou técnico de enferma-
gem para cada dois leitos ou fração por turno de trabalho, um funcionário
216 Izumi et al.

exclusivo responsável pelo serviço de limpeza, acesso a cirurgião geral (ou


pediátrico), torácico, cardiovascular, neurocirurgião e ortopedista.
O esforço de todos estes profissionais deve ser concentrado para me-
lhorar o cuidado com o paciente crı́tico. O sucesso da assistência na UTI
depende das atividades desenvolvidas por esta equipe multidisciplinar. É
necessário que se tenha objetivos comuns, treinamento adequado, capaci-
tação para oferecer suporte avançado de vida por meio de conhecimentos
atualizados, equipamentos e habilidades técnicas e humanas, e um processo
de educação continuada (Pereira et al., 1999).
A comunicação entre a equipe multiprofissional da UTI Pediátrica e
Neonatal e a famı́lia deve ser frequente e em intervalos preestabelecidos.
As terminologias utilizadas devem ser consistentes e de fácil entendimento,
com oportunidade para a formulação de questionamentos e a expressão de
sentimentos. Se necessário deve-se oferecer a assistência de profissionais de
suporte como assistente social e psicólogo (Molina et al., 2007; Carvalho
et al., 2004).

2.2 UTI pediátrica e neonatal


As UTIs pediátrica e neonatal foram desenvolvidas por volta de 1950 no
sul da Califórnia devido ao uso de dispositivos de pressão positiva inter-
mitente em crianças em estado crı́tico, durante a epidemia de poliomielite
(Shoemaker et al., 1992).
Entre os principais quadros que levam a criança à internação na UTI
destacam-se a insuficiência respiratória aguda e o choque hipovolêmico
(Knobel, 2006).
Na apresentação, progressão e manuseio das diversas doenças e condi-
ções tratadas em UTI existem diferenças importantes entre as crianças e os
adultos. Estas incluem as alterações anatômicas e fisiológicas dos diversos
sistemas em desenvolvimento, as alterações na distribuição de fluı́dos intra
e extracelulares, entre outros (Knobel, 2006).
O problema mais comum na UTI neonatal está relacionado à imaturi-
dade dos órgãos e sistemas do Recém Nascido (RN). Estes podem apresen-
tar deficiências de visão, audição e problemas relacionados ao desenvolvi-
mento intelectual e neurológico. Quanto mais prematuro for o RN, maior
será a incidência de problemas como crises de apnéia, desconforto respira-
tório, infecções e hemorragia intracraniana (Sousa et al., 2008). Segundo
Kreling et al. (2006) a prematuridade associada ao baixo peso ao nasci-
mento determinam risco de atraso no desenvolvimento. As piores evoluções
neuropsicomotoras estão associadas a doenças neonatais como convulsão,
infecção (meningite e sepse), hemorragia cerebral, doença e insuficiência
respiratória.
O ambiente tecnológico da UTI Pediátrica ou Neonatal oferece à cri-
ança os benefı́cios da rápida identificação de complicações e a possibilidade
de intervenções imediatas, o que contribui para o aumento da sobrevida.
Fisioterapia na UTI: enfoque na criança crítica neurológica 217

Todavia este mesmo ambiente pode provocar uma série de malefı́cios fı́sicos
e psicossociais à criança, desencadeados pelo estresse e pelos procedimentos
necessários (Freire et al., 1998). O ambiente da UTI é totalmente diferente
e estranho à criança e a sua famı́lia. É necessário programar estratégias de
redução de ruı́dos e controle da luminosidade (Vila & Rossi, 2002), redu-
ção do número de manipulações e educação da equipe quanto aos efeitos
deletérios destas práticas, com o objetivo de diminuir o estresse deste paci-
ente (Sousa et al., 2008). Um dos elementos essenciais para o atendimento
global e individual da criança gravemente enferma é a promoção do cui-
dado centrado no atendimento das necessidades do binômio criança-famı́lia
(Carvalho et al., 2004).

2.3 Fisioterapia em UTI pediátrica e neonatal


A fisioterapia é uma profissão reconhecida no Brasil recentemente, cuja
inserção profissional em UTI começou no final da década de 1970. Sua
afirmação como integrante da equipe de assistência intensiva tem sido pro-
gressiva (Nozawa et al., 2008).
Segundo a portaria do Ministério da Saúde no 3432, em vigor desde 12
de agosto de 1998, as UTIs de hospitais com nı́vel terciário devem contar
com assistência fisioterapêutica em perı́odo integral, devido à diminuição
nas complicações, no perı́odo de hospitalização e nos custos hospitalares.
Segundo Nozawa et al. (2008), os serviços de fisioterapia atendem prin-
cipalmente pacientes adultos em vários campos da terapia intensiva. Po-
rém, destaca-se a expressiva percentagem de atendimento na área de neo-
natologia e pediatria, segmento que conquistou espaço mais recentemente,
devido à complexidade e especificidade dos pacientes.
A fisioterapia na UTI neonatal pode ser considerada como uma nova
modalidade de terapia intensiva e consiste em procedimentos realizados
pelo fisioterapeuta no perı́odo situado entre o clampeamento do cordão
umbilical até vinte e oito dias após o parto. Estes procedimentos compre-
endem o manuseio com ênfase no sistema neuropsicomotor e respiratório
do RN (Selestrin et al., 2007). Embora os objetivos da fisioterapia na UTI
infantil sejam semelhantes àqueles traçados para os adultos, a assistência
fisioterapêutica à criança e ao RN apresenta particularidades (Nicolau &
Lahóz, 2007). Desta forma, a abordagem fisioterapêutica pediátrica difere
de forma substancial das práticas utilizadas no adulto e deve ser continua-
mente adaptada a estes pacientes, pois eles estão em constante crescimento
e desenvolvimento (Sarmento, 2007).
Segundo Sarmento (2007), a escolha e a aplicação das técnicas fisio-
terapêuticas em UTI infantil devem respeitar os seguintes fatores: idade
do paciente, fatores anatômicos e fisiológicos relativos, doença pulmonar e
associadas, condições clı́nicas e evolução do quadro, cooperação e aderência
ao tratamento, e crescimento e desenvolvimento neuropsicomotor.
218 Izumi et al.

Durante a infância, especialmente no primeiro ano de vida, se a criança


for privada de estı́mulos, como em hospitalizações prolongadas, o desenvol-
vimento neuropsicomotor pode ser comprometido (Sarmento, 2007).
A fisioterapia no paciente crı́tico é fundamental para a manutenção e
a prevenção de vários aspectos da fisiologia (Carvalho et al., 2006). A
assistência ventilatória é uma necessidade fundamental realizada pelo fisio-
terapeuta, que efetua higienização brônquica diária por meio de técnicas
especı́ficas e controle do ventilador mecânico (Carvalho et al., 2004). O
fisioterapeuta também evita as complicações osteo-artro-musculares que
pioram a condição fı́sica do paciente para a função como a preensão e a
marcha. Para tal objetivo utiliza estratégias de exercı́cios e posicionamen-
tos que evitem o aparecimento de calcificações heterotópicas, Trombose
Venosa Profunda (TVP), osteoporose, encurtamentos tendı́neos, fixações
articulares e perda de força muscular (Carvalho et al., 2006). Além disto, o
fisioterapeuta realiza abordagem individualizada para estimular e prevenir
possı́veis desvios do desenvolvimento neuropsicomotor da criança (Tecklin,
2002).
Segundo Tecklin (2002) entre os objetivos comuns da intervenção do
desenvolvimento infantil na UTI são: promover o estado de organização e
interação apropriada entre os pais e o bebê, aumentar o comportamento
auto-regulatório por meio da modificação do ambiente, promover o alinha-
mento postural e os padrões normais de movimento mediante o manuseio e
o posicionamento terapêutico, aprimorar as habilidades motoras e ajudar
na alimentação oral, melhorar reações visuais e auditivas, prevenir anorma-
lidades musculoesqueléticas iatrogênicas, proporcionar a terapêutica apro-
priada para complicações ortopédicas, orientar os membros da equipe e da
famı́lia em relação à intervenção no desenvolvimento, e participar de uma
colaboração integrada para facilitar a transição para o ambiente domiciliar.
Salienta-se que todas as atividades propostas a estes pacientes imobi-
lizados e acamados devem ser realizadas de acordo com as possibilidades
de cada criança, sempre respeitando os limites da dor e da doença de base
(Sarmento, 2007).
Devido à fragilidade do bebê, o manuseio especı́fico do terapeuta pode
estar limitado a curtos perı́odos de tempo. Tecklin (2002) sugere como
ideal, de dez a quinze minutos. Os riscos do excesso de manuseio com
o bebê internado em UTI, principalmente o pré-termo, estão relaciona-
dos com infecção, hipoxemia, apnéia, aumento da Pressão Intracraniana
(PIC) e alteração do fluxo sanguı́neo cerebral. Isto pode culminar com
hemorragia intraventricular, evoluir para hidrocefalia e comprometer o de-
senvolvimento neuropsicomotor da criança (Moreira, 2003). Atualmente,
as equipe multidisciplinar em UTI neonatal sugerem o uso de protocolos
para manipulação mı́nima do RN (Sousa et al., 2008).
Segundo Carvalho et al. (2004) pode-se considerar para indicação de
fisioterapia respiratória em pediatria os seguintes critérios clı́nicos: necessi-
Fisioterapia na UTI: enfoque na criança crítica neurológica 219

dade de relaxamento muscular e suporte ventilatório, quadro de obstrução


de vias aéreas por hipersecreção ou espasmo brônquico, graus variados de
atelectasias, processo de desmame de VPM durante e após a retirada do
tubo orotraqueal, e deterioração dos gases sanguı́neos e quadros de dessa-
turação.
Anteriormente as estratégias e métodos fisioterapêuticos utilizados para
desobstrução brônquica e reexpansão pulmonar eram técnicas convencio-
nais (Freire et al., 1998) como a drenagem postural, as percussões torácicas
manuais, as vibrações (Sarmento, 2007), a facilitação da tosse e a aspira-
ção das vias aéreas (Antunes et al., 2006). Atualmente, outras técnicas
baseadas principalmente no fluxo expiratório do paciente permitem melho-
rar a depuração mucocilicar e realizar a reexpansão pulmonar (Freire et al.,
1998). Dentro destas técnicas destacam-se: Aumento do Fluxo Expiratório
(AFE), Expiração Lenta e Prolongada (ELPr), Drenagem Autógena (DA),
Desobstrução Rinofarı́ngearetrógrada (DRR) e técnicas instrumentais com
incentivadores respiratórios (Sarmento, 2007).
Sabe-se que as técnicas fisioterapêuticas podem acarretar em compli-
cações com o aumento da PIC, que pode evoluir com: hemorragia ce-
rebral, edema cerebral, hipoxemia aguda, hemorragia pulmonar, vômitos
com broncoaspiração, brocoespasmo e arritmias cardı́acas (Carvalho et al.,
2004). Entretanto, Thiesen et al. (2005) concluı́ram que as manobras de
fisioterapia respiratória podem ser usadas com segurança em pacientes com
PIC menor que trinta milı́metros de mercúrio. Assim, torna-se necessário
a capacitação do profissional fisioterapeuta por meio de treinamento ou
especialização em UTI, para realizar a avaliação criteriosa do paciente e
eleger a técnica mais adequada para evitar complicações e promover uma
assistência global (Antunes et al., 2006).

3. Métodos
Neste estudo realizou-se uma pesquisa qualitativa, com coleta de dados
por meio de entrevistas semi-estruturada, em hospitais da cidade de Lon-
drina, PR, no perı́odo 2007 a 2008. O projeto de pesquisa foi submetido e
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNOPAR, sob parecer no
0168/08, e segue os preceitos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional
de Ética em Pesquisa.
A população do estudo foi composta por quatro profissionais com gra-
duação em fisioterapia e atuação profissional em UTI Pediátrica e Neonatal.
Neste tipo de estudo, a seleção da amostragem é determinada pela parti-
cipação de pessoas vinculadas ao tema investigado e a representatividade
pela possibilidade de abranger a totalidade do objeto em estudo em seus
diversos aspectos. O número de participantes não é estabelecido previa-
mente mas, sim, à medida que ocorre saturação das informações (Minayo,
1992).
220 Izumi et al.

As entrevistas foram agendadas por meio de contato prévio com os


fisioterapeutas que atuavam em UTIs de hospitais da cidade de Londrina,
PR, respeitando a disponibilidade dos mesmos. Inicialmente, o objetivo do
trabalho foi explicado para cada participante que leu e assinou o termo de
consentimento livre e esclarecido. Na sequência iniciaram-se as entrevistas,
cujos áudios foram gravados em MP3 e transcritos integralmente para o
software editor de texto Microsoft Word r. Seguiu-se com as etapas de
codificação, categorização e interpretação dos dados. A seguir, as gravações
foram destruı́das. Também foram coletados dados sobre a identificação
pessoal e profissional dos participantes.
As informações oriundas das entrevistas foram analisadas em dois mo-
mentos, segundo Martins & Bicudo (2005). No primeiro ocorre a análise
da inteligibilidade que se articula nos significados presentes em cada dis-
curso, nas suas inter-relações e na sua unidade estrutural. No segundo há
a análise que visa alcançar a estrutura geral, por meio da compreensão e
da articulação das informações individuais, como exemplos particulares.
Para análise dos dados pessoais e profissionais dos participantes foram
feitos cálculos de média e frequência absoluta e relativa no software Micro-
soft Excel r.

4. Resultados e Discusão
Foram entrevistados quatro fisioterapeutas que atuam em UTI Pediátrica
e Neonatal, dois (50%) em UTI Pediátrica, um (25%) em UTI Neonatal e
um (25%) em UTI Pediátrica e Neonatal.
A idade dos participantes variou entre trinta e cinco e quarenta e cinco
anos, com média de quarenta e um anos. Dois (50%) eram do gênero
masculino e dois (50%) do feminino. O tempo de formação profissional
em fisioterapia em anos (TF), o tempo de atuação profissional em UTI
pediátrica e neonatal em anos (TA) e a carga horária semanal de trabalho
em UTI em horas (CH) estão apresentadas na Tabela 1.
A análise das entrevistas permitiu discutir sobre os seguintes temas
em UTI Pediátrica e Neonatal: o cuidado, as estratégias de fisioterapia, a

Tabela 1. Perfil profissional dos entrevistados.


Participantes TF TA CH
P1 13 8 18
P2 19 18 30
P3 24 4 18
P4 18 15 25
Média 18,5 11,25 22,75
Fisioterapia na UTI: enfoque na criança crítica neurológica 221

criança crı́tica internada, a famı́lia da criança crı́tica internada, a equipe


de trabalho e a evolução da atuação do fisioterapeuta nesta área.
Os participantes quando questionados sobre o cuidado à criança crı́tica
neurológica internada em UTI relataram dificuldade no entendimento de
cuidado e sua abrangência, pois há diferentes formas, como os cuidados
emocional, fı́sico e ambiental. Ao falarem de cuidado, os entrevistados se
remeteram a concepção generalista e global de saúde e de assistência.
Segundo Vila & Rossi (2002) o paciente internado na UTI necessita de
cuidados de excelência dirigidos não apenas para os problemas fisiopatoló-
gicos, mas também para as questões psicossociais, ambientais e familiares,
que se tornam interligadas à doença fı́sica.
O cuidar em UTI é tecnicista e mecânico, desprovido dos sentimentos do
doente e de seus familiares (Nascimento & Trentini, 2004). Porém, o cuidar
com pacientes crı́ticos deve ser de âmbito global, envolvendo cuidados com
aspectos fı́sicos, emocionais e sociais (Lamego et al., 2006).
Mesmo com esta percepção global das formas de cuidado relatadas
pelos entrevistados, destacou-se os cuidados no âmbito fı́sico, com ênfase
nos objetivos de promover a sobrevida do paciente crı́tico internado em
UTI. Os discursos demonstraram que em uma criança internada em UTI
a estabilização de parâmetros ligados ao sistema respiratório é prioridade,
visto que o primordial é salvar a vida do pequeno paciente.
A internação em UTI é precedida de comprometimentos orgânicos pre-
sentes e potenciais que colocam em risco a vida do ser doente. Assim, o
cuidado de tais pacientes é bastante voltado para os aspectos fı́sicos, como o
controle e a manutenção das funções vitais (Nascimento & Trentini, 2004),
prevalecendo ações curativas que valorizam as técnicas e as tecnologias
(Vila & Rossi, 2002).
Nos relatos dos fisioterapeutas também houve destaque quanto às dife-
renças entre os cuidados para adultos, crianças e recém-nascidos (RNs). Os
entrevistados consideraram o fato de que a criança apresenta seus sistemas
em desenvolvimento, principalmente o neurológico, o que torna necessários
os cuidados de prevenção de danos a este sistema.
Sarmento (2007) destaca que os RNs, lactentes e crianças apresentam
particularidades anatômicas e fisiológicas dependentes da idade, devido ao
constante desenvolvimento dos sistemas respiratório, cardı́aco, neurológico
e imunológico. Assim, há particularidades como o menor suporte respirató-
rio cartilaginoso, o menor calibre das vias aéreas inferiores, o menor número
de fibras musculares resistentes à fadiga, o sistema nervoso em formação,
frequência respiratória e cardı́aca aumentada, maior resistência das vias
aéreas, maior complacência pulmonar, maior predisposição a mudanças de
temperatura, entre outras.
Quando os participantes relatam sobre as estratégias de cuidado de
fisioterapia em UTI Pediátrica e Nenonatal, relacionam os objetivos da
222 Izumi et al.

fisioterapia com a sobrevida da criança e a prevenção de complicações pul-


monares, bem como de danos neurológicos, osteomioarticulares e vascula-
res. Os participantes ainda apontaram a redução do tempo de internação
da criança na unidade, o que reflete em menor custo ao sistema de saúde.
A presença constante do fisioterapeuta na UTI auxilia decisivamente na
recuperação respiratória e motora mais precoce e na motivação do paciente,
o que reduz o número de dias de internação e os custos hospitalares (Pereira
et al., 1999; Ministério da Saúde, 1998).
Os entrevistados relataram os procedimentos de cuidado como técni-
cas especı́ficas e de alta complexidade, e ressaltaram o papel diferenciado
do fisioterapeuta como observador e avaliador crı́tico. Estas habilidades
requerem conhecimentos que são especı́ficos na formação do fisioterapeuta.
As estratégias de cuidado de fisioterapia foram citadas por todos os en-
trevistados, que consideraram as estratégias respiratórias como principais
e, mais uma vez, apontaram o objetivo de preservar a vida, bem como a
relação de cuidado dos diferentes sistemas.
Durante a fase aguda de internação em UTI enfatizam-se os cuidados
respiratórios, que são prioridade, pois as complicações respiratórias são as
mais frequentes precoces. Iniciam-se também os cuidados com a manuten-
ção da amplitude de movimento, a facilitação dos movimentos ativos e o
fortalecimento muscular (Pereira et al., 1999).
Quando os participantes relataram as estratégias utilizadas, descreve-
ram outros procedimentos técnicos, evidenciados pela literatura, além dos
relativos ao cuidado respiratório. Dentre eles: o posicionamento, as mobi-
lizações gerais, os exercı́cios ativos, o ortostatismo, e o treino de atividades
funcionais para manter as amplitudes de movimento, evitar as deformida-
des articulares e estimular o sistema nervoso e o circulatório.
Nozawa et al. (2008) relataram que as estratégias mais realizadas pelos
fisioterapeutas brasileiros em UTI estão relacionadas com as ações de re-
moção de secreções brônquicas, a reexpansão pulmonar, o posicionamento
e as mobilizações. O mesmo estudo ressalta que a atuação fisioterapêutica
caracteriza-se predominantemente pela aplicação de técnicas de remoção
de secreção brônquica e de reexpansão pulmonar (99,3%), mas a preocu-
pação com a mobilização do paciente é tão importante quanto às técnicas
de terapia respiratória (91,5%).
Em relação ao posicionamento e as trocas de decúbito, os discursos
revelaram a importância dada a esta estratégia para prevenir deformidades
osteomioarticulares, alterações vasculares, estimular o sistema nervoso e
promover o conforto do paciente. Quanto à promoção do conforto houve
relatos de preocupação com o bem estar e o cuidado no sentido global, sem
restrições apenas às técnicas de fisioterapia.
Outra estratégia descrita pelos entrevistados é a orientação a outros
profissionais com o objetivo de evitar complicações. Segundo Zorzi et al.
Fisioterapia na UTI: enfoque na criança crítica neurológica 223

(2008) entre os objetivos comuns da intervenção do fisioterapeuta estão os


de orientar os membros da equipe, incluindo os enfermeiros e os pais.
Os participantes relataram que as restrições do cuidado são muito im-
portantes e demonstraram preocupação com o quadro geral e as consequên-
cias das estratégias da fisioterapia com a criança crı́tica na UTI.
Algumas alterações fisiológicas podem ser induzidas pelas manobras fi-
sioterapêuticas, principalmente a aspiração endotraqueal que pode causar
hipoxemia, vasoconstrição periférica, aumento da pressão arterial, aumento
do fluxo sanguı́neo cerebral e aumento da pressão intracraniana (Nicolau
& Lahóz, 2007). Porém, outros estudos relatam que as manobras de fisio-
terapia respiratória podem ser realizadas com segurança em pacientes com
PIC abaixo de trinta milı́metros de mercúrio (Thiesen et al., 2005) e trazem
benefı́cios como o aumento da saturação de oxigênio, a queda da frequên-
cia cardı́aca e respiratória (Antunes et al., 2006; Thiesen et al., 2005) e a
redução da fração inspirada de suporte de oxigênio (FiO2 %) (Vasconcelos
et al., 2011).
Isto reitera que o fisioterapeuta precisa ser hábil e capacitado para
tomar decisões rápidas, eficientes e no momento adequado à condição da
criança.
Os entrevistados revelaram precaução com os cuidados da criança in-
ternada na UTI em relação ao estresse, tentando minimizá-lo com a di-
minuição dos ruı́dos e das manipulações desnecessárias, com o objetivo de
prevenir danos neurológicos.
Sousa et al. (2008) consideram que o estresse constante pode causar
alterações psicológicas, que agravam o quadro clı́nico da criança. A ilumi-
nação, os ruı́dos e as manipulações frequentes causam distúrbios do sono,
irritabilidade, choro, taquicardia, hipoxemia, crises de apnéia, desconforto
respiratório, aumento da PIC, hemorragia intracraniana, infecções e dor.
O mesmo estudo cita que os RNs em UTI são manipulados várias vezes ao
dia, sem agrupamento de procedimentos. Isto cansa e interrompe o sono,
desencadeando o estresse. Sugere-se a utilização de um protocolo de ma-
nipulação mı́nima por toda equipe multiprofissional da UTI com objetivo
de reduzir a incidência de estı́mulos nocivos, reduzir o estresse e contribuir
para o desenvolvimento do recém-nascido.
Os fisioterapeutas referiram que a estratégia denominada de mobiliza-
ção mı́nima previne os danos neurológicos maiores, conserva a energia e
diminui o estresse da criança e do RN assistido em estado crı́tico na UTI.
Tal discurso enfatizou a importância da participação de toda a equipe de
profissionais da UTI para o alcance dos objetivos do protocolo de mobili-
zação mı́nima.
Nicolau & Lahóz (2007) revelam que existe a tendência de evitar mani-
pulações frequentes e intensas em RNs, principalmente nos pré-termo, pelo
risco de efeitos adversos.
224 Izumi et al.

Nos RNs, principalmente os de menores idades gestacionais e baixo


peso, a manipulação causa perda de calor e água para o ambiente, gerando
necessidade de maior gasto energético para manutenção de temperatura e
pressão arterial. Isto se deve à imaturidade de órgãos e sistemas (Selestrin
et al., 2007).
Os relatos também revelaram a importância da equipe multiprofissi-
onal na UTI, destacando a necessidade de tal equipe ser especializada e
da presença do fisioterapeuta junto a equipe. Os participantes falaram do
objetivo principal e básico da UTI de recuperar ou manter as funções fisio-
lógicas normais da criança e também da participação do fisioterapeuta em
avaliar e cumprir metas que são comuns a todos da equipe. Além disto,
o fisioterapeuta também pode ser chamado a colaborar com a tomada de
decisões sobre o pequeno paciente.
Os cuidados dispensados à criança e ao RN em UTI são os controles de
sinais vitais, temperatura, pressão arterial, saturação de oxigênio, frequên-
cia cardı́aca e respiratória, higiene corporal, administração de medicamen-
tos e alimentação, troca de roupas e fraldas, punção venosa, sondagens,
curativos, aspiração orotraqueal, mudança de decúbito e manuseios pela
equipe multidisciplinar (Sousa et al., 2008). Assim faz-se presente no tra-
balho em equipe o esforço de todos profissionais para o melhor cuidado
com o paciente (Lamego et al., 2006; Pereira et al., 1999).
O trabalho em equipe multiprofissional em UTI exige intercâmbio de
informações e a construção de uma unidade, pois cria perspectivas únicas
de trabalho, com o investimento integrado de conhecimentos em favor do
paciente e de seu tratamento (Lucchesi et al., 2008; Zorzi et al., 2008).
Este estudo também revelou a importância do profissional fisiotera-
peuta na equipe multiprofissional que atua em UTI, com habilidades de
tomada de decisões em conjunto, de comunicação e de orientações de cui-
dados para a prevenção das complicações.
Os discursos dos entrevistados também revelaram a importância da
convivência da criança crı́tica com a famı́lia. Os fisioterapeutas enfatizaram
o valor da presença de mães e pais nas UTIs para a evolução e a recuperação
das crianças.
O adoecimento de uma criança e sua internação na UTI implica numa
modificação da dinâmica familiar (Lucchesi et al., 2008). A comunicação
entre a equipe multiprofissional da UTI e a famı́lia deve acontecer de modo
a favorecer o cuidado de qualidade. O conhecimento e a implementação
de instrumentos que facilitem a interação com a famı́lia são fundamentais
na busca por assistência humanizada (Nascimento & Trentini, 2004). O
profissional que atua na UTI tem papel importante como mediador das re-
lações de vı́nculo entre a famı́lia e a criança, proporcionando maior consolo
e auxiliando no manejo da dor dos bebês (Lamego et al., 2006).
A permanência de mães e pais na UTI e a orientação para a participa-
ção deles nos cuidados ao filho hospitalizado, possibilita o vı́nculo afetivo,
Fisioterapia na UTI: enfoque na criança crítica neurológica 225

colabora para a redução do estresse causado pela hospitalização (Molina


et al., 2009) e inicia de forma precoce o preparo para o cuidado à saúde da
criança no domicı́lio (Gaiva & Scochi, 2005; Molina et al., 2007).
Camargo et al. (2004) apontaram o quanto as mães se sentem acolhidas,
após a primeira visita, quando os membros da equipe as acompanham e
esclarecem o quadro do seu filho RN na UTI.
Ainda, durante as entrevistas os participantes relataram sobre a evo-
lução da atuação da fisioterapia em UTI Pediátrica e Neonatal. Os fisio-
terapeutas destacaram que atualmente são mais solicitados e reconhecidos
como membro efetivo da equipe da UTI e possuem maior carga horária de
atuação.
Segundo Zorzi et al. (2008) a função que o fisioterapeuta exerce na UTI
varia consideravelmente de uma unidade para outra, dependendo do paı́s,
da instituição, do grau de treinamento e da situação do paciente.
A fisioterapia nas UTIs pediátrica e neonatal pode ser considerada uma
nova modalidade de terapia (Selestrin et al., 2007). No Brasil os fisiote-
rapeutas estão cada vez mais presentes nas UTI, mas sua atuação e carga
horária diferem em cada instituição. A inserção do fisioterapeuta em UTI
começou no final da década de 1970 e sua afirmação como integrante da
equipe de assistência intensiva tem sido progressiva (Nozawa et al., 2008).

5. Considerações Finais
As entrevistas realizadas revelaram que o cuidado à criança crı́tica inter-
nada é global e de alta complexidade. Segundo os fisioterapeutas entrevis-
tados, os objetivos do cuidado de fisioterapia nas UTIs neonatal e pediátrica
estão relacionados com a preservação e a promoção da vida, e a prevenção
de complicações. Os cuidados de fisioterapia mais relatados foram as es-
tratégias respiratórias, com a finalidade de promoção da vida do pequeno
paciente. Outras estratégias também foram descritas como importantes:
as destinadas ao sistema osteo-mioarticular e circulatório, e a estimula-
ção do sistema neuropsicomotor. Os participantes da pesquisa reforçam a
necessidade de treinamento especializado para capacitá-los na tomada de
decisões e na avaliação e seleção de estratégias fisioterapêuticas.
Concluiu-se que os cuidados de fisioterapia ocorrem no âmbito fı́sico,
psicossocial e emocional, e podem contribuir para minimizar o estresse
destas crianças, principalmente os RNs, para a comunicação entre a equipe
de trabalho e a famı́lia, para as orientações a estes, e para a convivência
familiar em UTI que possibilita a assistência humanizada.
O estudo também destacou a evolução da atuação do fisioterapeuta na
equipe de trabalho na UTI pediátrica e neonatal. Hoje este profissional
é considerado membro efetivo e necessário para o tratamento da criança
crı́tica, e possui treinamento e habilidades especı́ficas para tal fim. Em tal
função, é imprescindı́vel que realize uma assistência global e humanizada.
226 Izumi et al.

Durante o desenvolvimento deste estudo encontrou-se como dificulda-


des a escassez de estudos qualitativos relacionados ao tema para a discussão
de sua complexidade, além do pequeno número de fisioterapeutas que acei-
taram participar das entrevistas.
Para maior compreensão do fenômeno estudado, sugere-se a realização
de novas pesquisas qualitativas em outras localidades, com número maior
de participantes e com os outros profissionais da equipe e os familiares da
criança.

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Zorzi, A.; Silva, A.; Petry, M.; Martins, M.M.; Peixoto, M.; Lima, M.C.
& Fagundes, M.C.C., Principais patologias atendidas pela fisioterapia
nas unidades de terapia intensiva de Foz do Iguaçu. In: Lopes, A.
(Ed.), Anais do II Seminário de Fisioterapia da Uniamérica: Iniciação
Cientı́fica. Foz do Iguaçu, PR, p. 109–115, 2008.

Notas Biográficas

Adriana Yuki Izumi é fisioterapeuta (UEL, 2006), Especialista em Fisiote-


rapia Hospitalar (UNOPAR, 2009), tem Residência na área de Fisioterapia em
Pediatria (UEL, 2010). Atualmente é mestranda em Ciências da Reabilitação
(UEL) e bolsista da Fundação Araucária.

Dirce Shizuko Fujisawa é Fisioterapeuta (UEL, 1984), Mestre e Doutora em


Educação (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, 2000 e 2003).
Atualmente é professor adjunto da UEL do Departamento de Fisioterapia.

Márcia Regina Garanhani é Fisioterapeuta (UEL, 1985), tem Residência na


área de Fisioterapia (Hospital Sarah Kubistchek, 1986), Mestrado Profissional
(UNIFESP-EPM, 2003), aperfeiçamento em Conceito Neuroevolutivo Bobath
(Hemiplegia no Adulto e Reeducação Postural – Convergências). Atualmente é
professor assistente da UEL do Departamento e Fisioterapia.
Capítulo 13

Avaliação Neuromotora em Pré-Escolares

Tereza Cristina Carbonari de Faria∗, Sílvia Regina M. S. Boschi,


Janaína P. de Souza, Érica Mie Okumura

Resumo: O objetivo desta pesquisa foi avaliar e comparar o de-


senvolvimento psicomotor em crianças de 3 a 6 anos, de uma escola
particular e de uma pública. Foram avaliadas 80 crianças, 40 em
cada instituição, por meio de um protocolo de avaliação baseado
no exame neurológico evolutivo de Lefèvre (1975). Este protocolo
avaliou equilı́brio, coordenação, persistência motora e sensibilidade.
Nos resultados observou-se diferença entre as escolas, sendo que a
particular obteve uma pontuação maior do que a pública, tanto no
equilı́brio dinâmico, quanto na coordenação apendicular. Porém,
tais diferenças não apontam déficits no desenvolvimento psicomo-
tor.

Palavras-chave: Psicomotricidade, Crianças, Coordenação, Equi-


lı́brio.

Abstract: This research aimed at assessing the psychomotor deve-


lopment in children from 3 to 6 year old, of a private and a public
elementary schools. A total of 80 children were evaluated, 40 of
each institution. An assessment protocol based on the neurological
evolutional protocol of Lefèvre (1975) was applied to all subjects. It
analyzes balance, motor persistence, coordination and sensibility.
Results showed differences between the schools. The private school
obtained a better score. The most significant differences were in the
dynamic balance and in limbs coordination. However, such diffe-
rences do not show impairments in the psychomotor development
in those children.

Keywords: Psychomotor, Children, Coordination, Balance.

∗ Autor para contato: t.faria@uol.com.br


Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2
230 de Faria et al.

1. Introdução
O desenvolvimento motor é a contı́nua alteração no comportamento motor
ao longo do ciclo da vida, proporcionada pela interação entre as necessida-
des da tarefa, a biologia do indivı́duo e as condições do ambiente (Gallahue
& Ozmun, 2005).
Os padrões do desenvolvimento expandem-se desde o inı́cio, no indivı́-
duo normal em crescimento, como uma unidade perfeitamente integrada.
Ao mesmo tempo normas parciais crescem no interior do padrão total e, por
um processo de individualização, adquire-se posteriormente vários graus de
independência (Diament & Cypel, 1996).
A intensa etapa de mudanças no perı́odo da infância é uma caracte-
rı́stica inerente ao ser humano. A criança reflete o dinamismo do seu pro-
cesso maturacional, expressando seu desenvolvimento por atos motores ou
comportamentos sucessivamente mais complexos, seguindo uma sequência
progressiva de estruturação do sistema nervoso (Caon & Ries, 2003).
Este processo de alteração no comportamento motor, o qual está re-
lacionado com a idade, ocorre tanto na postura quanto no movimento da
criança. Quando a criança nasce, o seu Sistema Nervoso Central (SNC)
ainda não está completamente desenvolvido. Ela percebe o mundo pelos
sentidos e age sobre ele, criando uma interação que se modifica no decorrer
do seu desenvolvimento. Deste modo, por meio de sua relação com o meio,
o SNC se mantém em constante evolução, em um processo de aprendizagem
que permite sua adaptação ao meio em que vive.
Um bom desenvolvimento motor repercute na vida futura da criança,
nos aspectos sociais, intelectuais e culturais. Assim, uma dificuldade mo-
tora faz com que a criança se refugie do meio que não domina, deixando
de realizar ou realizando com pouca frequência determinadas atividades
(Diament & Cypel, 1996).
Do ponto de vista neuropsicossensorial e motor, o desenvolvimento da
criança, depende do processo de maturação do SNC, principalmente no
primeiro ano de vida (Olhweiler et al., 2005).
No perı́odo de 3 a 6 anos de idade a criança adquire movimentos mais
controlados e coordenados, consegue se movimentar com certa habilidade
dando ritmo à coordenação de braço e perna, e, uma das principais carac-
terı́sticas é a espontaneidade e a naturalidade de seus gestos motores (Le
Boulch, 2001).
O aprendizado do movimento está envolvido em todas as atividades
motoras (correr, saltar, rolar, saltitar, entre outras) e capacidades fı́sicas
(força, resistência, velocidade). O enfoque deste aprendizado é o desenvol-
vimento motor (Mattos & Neira, 2000; Freire, 2001; Rodrigues & Amadeu,
2002).
Avaliação neuromotora em pré-escolares 231

A motivação na realização desta pesquisa foi o interesse pela compre-


ensão dos fatores que afetam o desenvolvimento psicomotor em crianças
que estão inseridas em diferentes contextos de vida.
Este trabalho teve como objetivos principais avaliar e comparar o de-
senvolvimento psicomotor em crianças de 3 a 6 anos inseridas numa unidade
de educação pré-escolar (educação particular) e crianças da mesma idade
inseridas num programa institucional (creche – educação pública). Como
objetivos especı́ficos, o equilı́brio estático, o equilı́brio dinâmico, a coorde-
nação apendicular, a persistência motora, a sensibilidade e a coordenação
tronco-membros, foram avaliados. Os dados obtidos nas avaliações foram
analisados e comparados.

2. Fundamentação Teórica
2.1 Desenvolvimento Neuropsicomotor
O desenvolvimento motor é fundamental, considerando que a criança de-
senvolve sua linguagem e cognição no intercâmbio com o ambiente, pela
exploração ativa, por meio da manipulação dos objetos, pela repetição das
ações, pelo domı́nio do próprio corpo e pelas relações que estabelece no
ambiente (Amaral et al., 2005).
O desenvolvimento da criança do ponto de vista neuropsicomotor de-
pende do processo de maturação do SNC (Olhweiler et al., 2005). A ma-
turação cerebral promove melhora nas funções motoras. Este desenvolvi-
mento está intimamente ligado às estimulações que a criança recebe do
meio ambiente em que está inserida. Assim, o ritmo próprio de cada cri-
ança pode variar conforme a qualidade das estimulações propiciadas pelos
meios sociais em que ela cresce (Bobbio et al., 2006).
O ambiente é uma importante fonte de informações com as quais as
crianças podem aprender a apreciar as experiências de aprendizagem do
movimento (Castanho & Assis, 2004). As fases evolutivas devem ser res-
peitadas, evitando ensinar à criança qualquer atividade antes que ela possa
estar madura para aprender (Martins & Moser, 1996).
As capacidades fı́sicas estão relacionadas com a forma que as crianças
utilizam seu próprio corpo, na expressão de suas emoções e na locomoção
de modo seguro, reconhecendo suas potencialidades corporais (Brandão,
2006).
Erckert (1993) e Rodrigues (2003) propõem um resumo sobre o desen-
volvimento das habilidades motoras das crianças de 3 a 6 anos, descrevendo
as mudanças que ocorrem de um ano para o outro nas diferentes habilida-
des, como se segue:
Andar: aos 3 anos a criança é capaz de andar para trás e andar nas pontas
dos pés, dos 3 aos 4 anos possui um andar mais coordenado, dos 4
aos 5 anos possui um andar firme e dos 5 aos 6 anos adquire maior
velocidade;
232 de Faria et al.

Correr: aos 3 anos corre sem controle adequado e tocando o pé por inteiro
no chão, dos 3 aos 4 anos tem um melhor controle e consegue correr
sobre a ponta dos pés, dos 4 aos 5 anos a passada é um pouco maior,
possui mais força e é bem controlada, e dos 5 aos 6 anos é capaz de
correr de modo eficiente nos jogos;
Pular com um dos pés, galopar e saltitar: aos 3 anos consegue
equilibrar-se em um dos pés e saltar para o alto, dos 3 aos 4 anos
salta com os dois pés de forma consecutiva, dos 4 aos 5 anos possui
ritmo no seu galope e dos 5 aos 6 anos salta mais de dez vezes
com um pé, possui melhor habilidade no galopar e saltita de forma
alternada;
Subir escadas: aos 3 anos sobe escadas e desce sozinha e sem alternância
dos membros inferiores, dos 3 aos 4 anos alterna os pés na subida, e,
com ajuda, na descida. Dos 4 aos 5 anos sobe e desce bem escadas e
dos 5 aos 6 anos sobe e desce escada de mão sozinha, alternando os
pés e dando ritmo ao movimento;
Pular: aos 3 anos o salto e o alcance são efetuados de forma rudimentar,
dos 3 aos 4 anos pula corda mais baixa que 2 cm e utiliza os braços
como estabilizadores, dos 4 aos 5 anos há um aumento na distância
e na altura do salto e utiliza os braços para ampliar a ação de forma
mais eficiente, e dos 5 aos 6 anos há um aumento contı́nuo relacionado
à distância e altura dos saltos;
Chutar: aos 3 anos consegue fazer contato com a bola enquanto anda, dos
3 aos 4 anos faz contato com a bola de forma direta pela frente, dos
4 aos 5 anos faz maior lançamento para trás e ajusta-se a bola e dos
5 aos 6 anos apresenta melhor coordenação na execução do chute;
Arremessar: aos 3 anos apresenta alguma força na ação do movimento
de arremessar, dos 3 aos 4 anos melhora a coordenação durante o ato
de arremesso, dos 4 aos 5 anos inclui ao movimento de arremessar a
rotação do tronco e dos 5 aos 6 anos faz a ação horizontal dos braços
junto com a rotação do tronco.
A criança é um ser dinâmico, em constante mudança, que apresenta
uma sequência previsı́vel e irregular de crescimento fı́sico e de desenvol-
vimento neurológico. Esta sequência sofre influências contı́nuas de forças
internas e externas, provocando variações de um indivı́duo para outro, tor-
nando o seu desenvolvimento individual. Desta forma, um ambiente pobre
de estı́mulos pode ter influência direta no desenvolvimento motor desta
criança (Castanho & Assis, 2004).

2.2 Psicomotricidade
A psicomotricidade constitui uma abordagem multidisciplinar do corpo e
da motricidade humana. Seu objeto é o sujeito humano total e suas relações
Avaliação neuromotora em pré-escolares 233

com o corpo, sejam elas integradoras, emocionais, simbólicas ou cognitivas


propondo desenvolver faculdades expressivas do sujeito (Fonseca, 2004).
A ação da psicomotricidade encontra-se na sua intervenção sobre as
funções do corpo, da mente, do comportamento e psicológicas (Menezes &
Hartmann, 2009). A organização psicomotora humana engloba em primeiro
lugar a organização de base, e, posteriormente, a organização propriocep-
tiva. Nesta ocorre a suspensão dos reflexos, como produto da maturação
mesencefálica e medular. Seguindo com a organização do plano motor,
isto é, o movimento, a socialização, o ritmo e a percepção corporal, como
produto da maturação cortical (Bretas et al., 2005).
A educação psicomotora atua com crianças em desenvolvimento e seu
objetivo é propiciar experiências que possibilitem e viabilizem a formação
neurológica bem constituı́da pela estimulação correta da criança (Loren-
zon, 1995). A imagem do corpo representa uma forma de equilı́brio entre
as funções psicomotoras e a sua maturidade. Ela não corresponde só a
uma função, mas a um conjunto funcional, cuja finalidade é favorecer o
desenvolvimento infantil (Le Boulch, 2001; Fonseca, 1996).
O termo geral de desenvolvimento psicomotor compreende ao mesmo
tempo motricidade, adaptação, socialização e linguagem (Métayer, 2001).
A infância é a etapa mais importante a caminho da maturidade para a vida
adulta, por isto há necessidade de garantir que este perı́odo traga condições
propı́cias e pertinentes ao aprendizado e ao desenvolvimento motor.
A aprendizagem é um processo de mudança de comportamento influ-
enciada pelo meio ambiente. Esta influência interfere, auxiliando ou atra-
sando o desenvolvimento neurológico e psicomotor da criança (Martins &
Moser, 1996). Ao longo do ciclo do desenvolvimento, os movimentos cres-
cem em independência e coordenação: ao mesmo tempo em que é capaz de
controlar separadamente cada seguimento motor, a criança torna-se, aos
poucos, capaz de coordenar estes movimentos independentes, formando
movimentos complexos. Além disto, a criança torna-se capaz de automati-
zar a sequência que forma estes movimentos, sem precisar prestar atenção
neles enquanto os executa (Corso, 2007).
Diversos autores buscam compreender o funcionamento dos elementos
da cognição humana (percepção, atenção, memória, tomada de decisão,
respostas motoras, entre outros) em termos de estrutura, conteúdo e funci-
onalidade, através da preposição de modelos de controle cognitivo (Henriq-
son et al., 2009). As habilidades especiais se tornam importantes, e parece
haver uma ação recı́proca entre o comportamento motor de uma criança e
suas respostas emocionais, pois a atividade promove um bem-estar à cri-
ança e isto, por sua vez, está associado com o sucesso no desempenho da
atividade (Flinchum, 1981).
Segundo Silva et al. (2009) percebe-se que as práticas de atividades
fı́sicas elaboradas, auxiliam a construção do processo cognitivo que levam
ao desenvolvimento do raciocino lógico e à tomada de decisão. Assim, o
234 de Faria et al.

trabalho da psicomotricidade deve ser iniciado logo nas primeiras fases da


vida das crianças, visando derrubar ou impedir a formação de barreiras
cognitivas, possibilitando o desenvolvimento da motricidade, da afinidade
e da mente.
A coordenação motora é uma estrutura psicomotora básica, concreti-
zada pela maturação motora e neurológica da criança e desenvolvida atra-
vés da sua estimulação psicomotora (Bessa & Pereira, 2002).
O equilı́brio é a forma mais básica do movimento humano, portanto,
refere-se à capacidade que se tem em manter a estabilidade em relação à
força da gravidade, ao centro de gravidade e à base de suporte. O equilı́-
brio é básico para todos os movimentos, desde aqueles do cotidiano até os
mais elaborados, que permeiam as categorias de locomoção e manipulação
(Papalia & Olds, 2000).
A lateralidade é um elemento importante para a adaptação psicomotora
(Erckert, 1993). Para Gomes (1998) ela é a tendência que o ser humano
possui de utilizar mais um lado do corpo que o outro, em três nı́veis: mão,
olho e pé. Existe uma dominância de um dos lados, e o lado dominante
apresenta maior força muscular, precisão e rapidez. Este lado executa a
ação principal, enquanto o outro auxilia esta ação, e tem igual importância.
O conceito de criança, infância e educação variam de acordo com a
classe social a que se refere. Para conhecê-la e compreendê-la melhor é
necessário sempre considerar suas condições sociais e culturais, pois é a
partir deste contexto determinante que ela constrói seu conhecimento. A
alimentação, as condições de saúde e habitação, a organização familiar, a
linguagem e os valores culturais e sociais influenciam e afetam todos os
aspectos do desenvolvimento (Aroeira et al., 1996).
A criança com dificuldade de adaptação, com experiências de fracasso
escolar, com distúrbios instrumentais (alterações de coordenação, equilı́-
brio, lateralidade, esquema corporal, espaço, tempo, ritmo, relaxamento)
e com distúrbios de comportamento psicomotor (instabilidade e inibição)
pode beneficiar-se da atividade psicomotora (Lorenzon, 1995).
Crianças com atrasos importantes em seu desenvolvimento e que não
recebem intervenção precocemente podem desenvolver padrões anormais de
posturas e movimento, transitórios ou permanentes, que podem dificultar
sua recuperação neuromotora tardia (Caon & Ries, 2003).
Além da necessidade de movimentação, é importante ressaltar que, na
maioria das vezes, a motricidade da criança é pouco explorada durante a
infância, gerando alterações em seu desenvolvimento psicomotor que vão
refletir na idade adulta (Bessa & Pereira, 2002).

2.3 Educação Infantil


A creche (instituição pública) e as unidades de educação pré-escolar (infan-
til) são contexto de desenvolvimento da criança. Além de prestar cuidados
Avaliação neuromotora em pré-escolares 235

fı́sicos, criam condições para o desenvolvimento cognitivo, simbólico, so-


cial e emocional. Nelas ocorrem os cuidados e a educação de crianças que
convivem, exploram, conhecem, e, constroem uma visão do mundo e de si
mesmas, constituindo-se desta forma como sujeitos. Porém, é importante
que estes ambientes não substituam a ação da famı́lia (Silva & Bolsanello,
2002).
Houve um enfraquecimento da visão estigmatizante e assistencialista
da educação. Este processo instalou um movimento social e governamental
pelo atendimento de novas demandas que resultou no recente reconheci-
mento da educação infantil em creches e pré-escolas como um dever do
Estado e um direito da criança, legalmente estabelecido no artigo 208, in-
ciso IV, da Constituição Federal de 1988. Esta mudança foi reafirmada
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) na década de 1990, e,
em 1996, pela Lei no 9394 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(Vokoy & Pedroza, 2005).
Com a Lei de Diretrizes e Bases, surge a Educação Infantil com novos
objetivos e que engloba as crianças entre 0 e 6 anos. Passa-se a olhar o
momento de desenvolvimento da criança, vendo-a como um sujeito inte-
grado, sem dissociar aspectos cognitivos, afetivos, expressivos, motores ou
simbólicos (Vokoy & Pedroza, 2005).
A necessidade das mulheres saı́rem de casa para trabalhar faz com que
tenham seu tempo de dedicação para os cuidados da casa e dos filhos redu-
zido. Assim a creche (instituição pública) torna-se um lugar propı́cio para
o desenvolvimento da criança e uma opção para os cuidados dos filhos de
mães trabalhadoras durante o dia todo. Enquanto as unidades de educação
pré-escolar (instituições particulares) geralmente oferecem tais atividades
somente em um perı́odo do dia (Pacheco & Dupret, 2004).
Para a sociedade, a creche é vista como uma instituição que visa apenas
suprir as necessidades de sobrevivência infantil, ou seja, como uma solução
para atender crianças cujos pais não podem cumprir seu papel (Verı́ssimo
& Fonseca, 2003). De acordo com Abramowicz & Wajskop (1999) a pa-
lavra creche tem origem francesa e significa manjedoura. Assim a creche
foi criada para educar, guardar e abrigar crianças pequenas cujas mães ne-
cessitavam trabalhar ou crianças que necessitavam de assistência. Muitos
fatos ocorreram e influenciaram mudanças nas creches: o desenvolvimento
urbano, as reivindicações populares, o trabalho da mulher, a transformação
das funções familiares, as idéias de infância e as condições sócioculturais
para o desenvolvimento das crianças.
Na creche, com as cuidadoras, a criança passa boa parte de seu tempo
e desenvolve suas atividades cotidianas. Nesta fase passa a ter noções mais
claras de tempo e de espaço (antes e depois, perto e longe, acima e abaixo)
e de lateralidade (direita e esquerda). Amplia-se, também a sua consciência
do esquema corporal, a coordenação motora fina e o equilı́brio (Martins &
Moser, 1996).
236 de Faria et al.

O momento em que a criança passa a ir às instituições de educação


está marcado pelo instante da separação da famı́lia e pelo tempo que ficará
distante dela. A instituição representa um espaço privilegiado para oferecer
à criança oportunidades e alternativas que estimulem suas potencialidades.
Neste ambiente a criança estará em interação constante com outros sujeitos
que interferirão em seu desenvolvimento. Assim, os profissionais ligados à
educação devem compreender a importância e a amplitude de seu papel
no desenvolvimento infantil dos usuários deste serviço (Pacheco & Dupret,
2004).
A instituição de educação infantil não pode desconhecer a natureza
do conhecimento infantil ou como ele se processa. Precisa conhecer como
as crianças pequenas constroem sua inteligência, na faixa marcada pela
possibilidade de representar (3 a 6 anos), isto é, nesta idade falam e brincam
simbolicamente (Rodrigues & Amadeu, 2002). A criança em idade pré-
escolar é um ser dinâmico, cheio de indagações espontâneas e com múltiplas
habilidades fı́sicas. Sua habilidade motora é utilizada para expansão de seu
desenvolvimento afetivo e cognitivo (Flinchum, 1981).
De nada vale um enorme esforço para alfabetizar se a aprendizagem
não for significativa. O significado nesta primeira fase de vida depende da
ação corporal. Entre os sinais gráficos de uma lı́ngua escrita e o mundo
concreto, existe um mediador que é a ação corporal (Freire, 2001).
As instituições particulares que lidam com a infância estão ampliando
seus serviços para além do suprimento das necessidades básicas da criança,
rumo a uma função pedagógica e educacional, e não só assistencialista.
Isto inclui a introdução de atividades psicomotoras desde o momento do
ingresso da criança na pré-escola, fato que é muito importante para o seu
desenvolvimento (Bhering & Nez, 2002; Stokoe, 1987).
Atualmente a inatividade motora das crianças é cada vez maior. Dentro
da faixa etária de 3 a 6 anos é raro aquele que não sabe escrever, ou pelo
menos reconhecer letras do alfabeto. Porém, há grande dificuldade em
pular corda ou subir em uma árvore.
Além da preocupação com a violência, a vida moderna, coloca nas
crianças uma exigência em termos de desenvolvimento intelectual. Esta
preocupação é tão grande, que mesmo crianças bem pequenas são matri-
culadas em escolas de lı́ngua estrangeira, diminuindo ainda mais a sua
mobilidade. O ser humano é constituı́do de corpo, mente e espı́rito. É
impossı́vel matricular só a mente de crianças em pré-escolas e esquecer o
corpo em movimento. Como ser completo deve-se considerar a formação
infantil como um todo (Oliveira, 2005).
Segundo a Secretaria de Educação Fundamental (1998) do Ministério
da Educação e do Desporto, cada criança possui maneiras diferentes de
desenvolver suas capacidades. Assim a educação infantil deve ter como
objetivo oferecer condições para que elas se desenvolvam de modo integral
levando em consideração as possibilidades de aprendizagem, de acordo com
Avaliação neuromotora em pré-escolares 237

a sua faixa etária. Para que este trabalho seja eficiente é necessário oferecer
atividades direcionadas ao seu desenvolvimento psicomotor.
As unidades de educação infantil devem ir além da função de “guarda
e cuidado” e realizar um trabalho organizado com espaços adequados para
estimular o processo de desenvolvimento (motor, cognitivo, emocional e
social) das crianças (Silva & Bolsanello, 2002).

3. Método
Para a realização dos objetivos desta pesquisa foram selecionadas, aleato-
riamente, 80 crianças de ambos os sexos, com idade de 3 a 6 anos, de uma
pré-escola particular (escola A), e outra pública (escola B). Foram 40 cri-
anças de cada instituição, 20 crianças de cada faixa etária. As instituições
se localizam na região do Alto Tietê.
Os critérios de inclusão foram crianças com idade de 3 a 6 anos, de
ambos os sexos, matriculadas na instituição e com frequência regular. Os
critérios de exclusão foram crianças com idade inferior a 3 anos ou supe-
rior a 6 anos, comprometimento neurológico e/ou ortopédico, presença de
distúrbio visual, auditivo ou labirı́ntico.
Para a coleta dos dados utilizou-se o protocolo de avaliação baseado no
exame neurológico evolutivo de Lefèvre (1975). Aplicou-se testes especı́ficos
para cada faixa etária, para obter informações sobre o desenvolvimento
psicomotor (Anexo 1). Os materiais utilizados para a aplicação do exame
foram uma bola de 14 cm de diâmetro, uma corda de pular com madeira na
ponta, uma caixa de lápis de cor com 12 cores, papel sulfite, fita métrica,
fita adesiva, 10 cubos de 4 cm de aresta e uma escada com corrimão.
Após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de
Mogi das Cruzes (CAAE 0051.0.237.000-07), encaminhou-se um ofı́cio as
diretoras de cada instituição solicitando a autorização para a realização da
pesquisa e explicando os objetivos da mesma. Posteriormente obteve-se
a assinatura dos responsáveis pelas crianças no termo de consentimento
livre e esclarecido, e, agendou-se uma data para explicação do protocolo
de avaliação. Então realizou-se a avaliação com o protocolo de Lefèvre,
aplicando-se testes especı́ficos para cada faixa etária.
A pontuação do exame varia de 1 a 3, a pontuação 1 é atribuı́da quando
a criança não consegue realizar a tarefa, a pontuação 2 quando a criança
realiza parcialmente e a pontuação 3 quando completa a tarefa.
De acordo com o protocolo, na avaliação das crianças de 3 anos, fo-
ram avaliados itens relacionados a equilı́brio estático, equilı́brio dinâmico
e coordenação apendicular. Na avaliação do equilı́brio estático realizou-se
a posição de Romberg (em pé com membros inferiores unidos e superiores
flexionados a 90o , e olhos abertos, permanecendo nesta posição por trinta
segundos). Na avaliação do equilı́brio dinâmico foram realizadas cinco ati-
vidades: andar em linha reta por cinco metros, subir escadas sem apoio,
238 de Faria et al.

descer escadas sem apoio, correr contornando obstáculos e apanhar um ob-


jeto do chão sem o auxı́lio da outra mão. Na avaliação da coordenação
apendicular foram executadas quatro atividades: construir uma torre com
nove cubos ou mais, jogar uma bola para cima na direção do examinador,
manobra index(dedo)- nariz com olhos abertos e chutar uma bola.
Na avaliação das crianças de 4 anos, foram observados os seguintes
itens: equilı́brio estático, equilı́brio dinâmico, coordenação apendicular e
persistência motora. Na avaliação do equilı́brio realizou-se a posição de
Romberg. Na avaliação do equilı́brio dinâmico, foram realizadas três ativi-
dades: andar nas pontas dos pés por cinco metros, subir escadas sem apoio
alternado os pés e descer escadas sem apoio alternando os pés. Na avaliação
da coordenação apendicular foram realizadas três atividades: copiar uma
cruz do modelo desenhado em um cartão, manobra index-nariz com olhos
abertos e fazer uma bolinha de papel com a mão dominante. Na avaliação
da persistência motora foram realizadas também três atividades: manter
os olhos fechados durante vinte segundos, reconhecer a cor branca e a cor
preta).
Com as crianças de 5 anos, foram avaliados os seguintes itens: equi-
lı́brio estático, equilı́brio dinâmico, coordenação apendicular, persistência
motora e sensibilidade. Na avaliação do equilı́brio estático foi realizada a
atividade de ficar em pé, com apoio plantar, a ponta de um pé encostado no
calcanhar do outro e olhos abertos, permanecendo nesta posição por dez
segundos. Na avaliação do equilı́brio dinâmico, foram realizadas quatro
atividades: andar para frente colocando o calcanhar de um pé encostado
na ponta do outro por dois metros, saltar de uma corda de quinze cm de
altura com os pés juntos, deslocar-se cinco metros pulando em um pé só e
ficar parado depois do salto. Na avaliação da coordenação apendicular, fo-
ram realizadas três atividades: copiar um cı́rculo do modelo desenhado em
um cartão, sentado bater com os pés alternadamente num ritmo escolhido
e abrir uma mão e fechar a outra alternadamente com os membros supe-
riores horizontalmente para frente. Na avaliação da persistência motora,
foi realizada a atividade de manter a lı́ngua protusa com os olhos fecha-
dos durante quarenta segundos. Na avaliação da sensibilidade também foi
realizada somente uma atividade de reconhecimento de cores.
Na avaliação das crianças de 6 anos verificou-se equilı́brio estático, equi-
lı́brio dinâmico, coordenação apendicular, coordenação tronco- membros e
sensibilidade. Na avaliação do equilı́brio estático solicitou-se a posição em
pé com apoio plantar e a ponta de um pé encostado no calcanhar do outro,
com os olhos fechados, durante dez segundos. Na avaliação do equilı́brio
dinâmico foram realizadas duas atividades: andar para trás colocando o
calcanhar de um dos pés encostados na ponta do outro por dois metros
e deslocar-se cinco metros pulando sobre um pé só com o pé dominante.
Na avaliação da coordenação apendicular foram realizadas três atividades:
Avaliação neuromotora em pré-escolares 239

descrever um cı́rculo com os dedos indicadores com os braços estendidos ho-


rizontalmente para os lados, bater o indicador e o pé do mesmo lado no chão
e alternar os lados. Na avaliação da coordenação de tronco-membros foi
realizada a posição em pé com o examinador forçando o tronco da criança
para trás e observando a flexão de joelhos. Na avaliação da sensibilidade
foram realizadas três atividades: reconhecimento dos dedos, dominância
de lateralidade direita e dominância de lateralidade esquerda.
Logo com o término da avaliação, os dados foram registrados nos pro-
tocolos de avaliação, para que fossem analisados, tabulados e discutidos.
De acordo com protocolo de Lefèvre, os testes somente foram considerados
satisfatórios e os resultados positivos quando atingiu-se um percentual de
acertos igual ou superior a 75%.

4. Resultados
Os dados obtidos no presente estudo foram estruturados de acordo com as
faixas etárias avaliadas, comparando-se as duas escolas: escola A (particu-
lar) e escola B (pública). Os gráficos apresentados correspondem a linha
de base de cada atividade, da qual participaram 40 sujeitos de cada escola,
10 de cada faixa etária. Foi realizado o teste t para verificar possı́veis alte-
rações no desenvolvimento psicomotor de cada grupo, adotando p < 0, 05
como significância estatı́stica.
A Figura 1 representa a comparação dos resultados das atividades psi-
comotoras aplicadas nas crianças de 3 anos. Observa-se pequena diferença
no percentual e nas médias de uma escola para outra. Na comparação
do equilı́brio estático não houve diferença entre as escolas, obteve-se uma
pontuação de 100% correspondente a uma média 3. No equilı́brio dinâ-
mico a escola A obteve uma pontuação de 96%, correspondente a média
de 14,4 pontos, e a escola B 86%, correspondente a média de 12,9 pontos,
com diferença significativa entre as escolas (p= 0,005). Na comparação da
coordenação apendicular a escola A atingiu 99% (11,9 pontos em média)
e a escola B 90% (10,9 pontos em média) e também houve uma diferença
significativa (p=0,007).
Nesta faixa etária, a comparando-se todas as atividades, a escola A
obteve uma pontuação de 97% (29,3 pontos em média), e a escola B uma
pontuação de 89% (26,8 pontos), e houve diferença significativa entre as
escolas (p=0,0004).
A Figura 2 mostra a comparação dos resultados das atividades psico-
motoras realizadas nas crianças de 4 anos de idade entre as escolas A e B,
onde se observa uma pequena diferença no percentual e nas médias de uma
escola para outra.
No equilı́brio estático, a escola A obteve 96% (média de 2,9 pontos)
e a escola B 93% (média de 2,8) e não houve uma diferença significativa
(p=0,29). No equilı́brio dinâmico a escola A atingiu 92% (média de 8,3
240 de Faria et al.

pontos) e a escola B 87% (média de 7,9), e também não houve uma dife-
rença significativa (p=0,27). Na coordenação apendicular a escola A obteve
uma pontuação de 97% (média de 8,8 pontos) e a escola B uma pontua-
ção de 85% (média de 7,7 pontos), havendo uma diferença significativa
(p=0,0016). Na persistência motora a escola A obteve 96% (8,7 pontos) e
escola B 88% (8 pontos), não havendo uma diferença significativa (p=0,12).
Na comparação total entre as escolas, nesta faixa etária, obteve-se na
escola A uma pontuação de 95% (28,7 pontos em média), e na Escola B
88% (média de 26,4 pontos), havendo uma diferença significativa (p= 0,01).
A Figura 3 mostra a comparação dos resultados das atividades psico-
motoras realizadas nas crianças de 5 anos de idade entre as escolas A e B,
onde se observa uma pequena diferença no percentual e nas médias de uma
escola para outra.
No equilı́brio estático não houve diferença entre as escolas, obtendo uma
pontuação de 100%. No equilı́brio dinâmico a escola A obteve 98% (média
de 11,8 pontos) e a escola B 99% (11,9 pontos) e não houve uma diferença
significativa (p= 0,27). Na coordenação apendicular a escola A obteve
uma pontuação de 97%, correspondente a uma média de 8,8 pontos, e a
escola B 96%, 8,7 pontos e também não houve uma diferença significativa
(p= 0,33). Na comparação da persistência motora a escola A obteve uma
pontuação de 90% (média de 2,7 pontos) e a escola B 96% (2,9 pontos)
e não houve diferença significativa (p= 0,17). Na sensibilidade as duas
escolas obtiveram 100%.
Na comparação total entre as escolas, na idade de 5 anos, a escola A
obteve uma pontuação total de 97% (média de 29,3 pontos) e a escola
B uma pontuação de 98% (média de 29,5 pontos). Não houve diferença
significativa entre as escolas (p= 0,29).
A Figura 4 mostra a comparação dos resultados das atividades psico-
motoras realizadas nas crianças de 6 anos de idade entre as escolas A e B,
onde se observa uma pequena diferença no percentual e nas médias de uma
escola para outra. No equilı́brio estático as duas escolas obtiveram 100%.
No equilı́brio dinâmico a escola A obteve 93% (5,6 pontos) e a escola B
98% (5,9 pontos), havendo diferença significativa (p= 0,04). Na coorde-
nação apendicular a escola A obteve 97% (8,8 pontos) e a escola B 100%
(9 pontos), não havendo diferença significativa (p= 0,17). Na coordena-
ção tronco-membros não houve diferença entre as escolas, ambas atingiram
100%. Na sensibilidade a escola A obteve uma pontuação de 81% (média
de 7,3 pontos) e a escola B 82% (7,4 pontos), e também não houve diferença
significativa (p= 0,44).
Na comparação total entre as escolas nesta idade, a escola A obteve uma
pontuação de 92% (média de 27,7 pontos) e a escola B uma pontuação de
95% (média de 28,5 pontos), e não houve diferença significativa entre as
escolas (p= 0,10).
Avaliação neuromotora em pré-escolares 241

Figura 1. Comparação das médias entre as escolas A e B, com relação às


atividades psicomotoras em crianças de 3 anos de idade.

Figura 2. Comparação entre as escolas A e B, com relação às atividades


psicomotoras em crianças de 4 anos de idade.

5. Discussão
No presente estudo avaliou-se 80 crianças, 46% do sexo feminino e 54%
do sexo masculino. No entanto, não se observou diferenças com relação
ao sexo nas atividades aplicadas. Bessa & Pereira (2002) ressaltam que é
importante respeitar as diferenças entre os sexos. Cada um apresenta um
ritmo diferente no desenvolvimento psicomotor. Os meninos desenvolvem o
equilı́brio e a coordenação motora bem mais cedo do que as meninas, porém
242 de Faria et al.

Figura 3. Comparação entre as escolas A e B, com relação às atividades


psicomotoras em crianças de 5 anos de idade.

Figura 4. Comparação entre as escolas A e B, com relação às atividades


psicomotoras nas crianças de 6 anos de idade.
Avaliação neuromotora em pré-escolares 243

as meninas são mais habilidosas em atividades que exploram a coordenação


motora fina.
Observa-se nos resultados, nas diferentes faixas etárias, que não houve
diferenças entre as escolas A e B com relação ao teste de equilı́brio está-
tico. Para Meinel (1976) o equilı́brio é uma capacidade que pode alcançar
nı́veis muito bons na idade pré-escolar. É normal um desenvolvimento pre-
coce neste aspecto, porque esta capacidade é iniciada quando bebê. Com
o passar do tempo, há uma solicitação muito grande nas oportunidades de
atividades que necessitam de equilı́brio, isto acontece muito nas brincadei-
ras.
Como se observa na Figura 1, houve diferença significativa entre as
escolas A e B quanto ao equilı́brio dinâmico, sendo que a escola A alcan-
çou uma pontuação maior. Segundo Erckert (1993) e Rodrigues (2003) a
criança com 3 anos já consegue subir e descer escadas sem alternância e
equilibra-se em um dos pés, o que demonstra uma melhora da maturação
cerebelar e labirı́ntica. Gallahue & Ozmun (2005) relatam que, neste pe-
rı́odo, a criança é capaz de andar com mais equilı́brio e coordenação, pois
nesta fase a marcha já se assemelha com o padrão de maturação da marcha
de um adulto, e o correr encontra-se ainda meio desajustado, com passos
curtos, pouca movimentação de braços, e menor evolução no saltar e no
lançar.
Como as crianças da escola A (particular), obtiveram uma pontuação
maior, este resultado pode estar relacionado ao fato de que estas crianças
têm aulas de educação fı́sica desde os 3 anos e na escola B (creche) isto
não foi observado. Além disto, as crianças da escola A realizam atividades
ao ar livre diariamente. Para Soler (2003), a criança na fase pré-escolar é
extremamente ativa e, por meio de movimentos experimenta suas possibi-
lidades e seus limites motores. A educação fı́sica é a única disciplina que
se caracteriza por trabalhar a criança em seus movimentos mais amplos,
com os quais é estimulada a compreender progressivamente seu corpo, para
obter a autoconfiança necessária à sua autonomia.
Quanto à coordenação apendicular, como observado na Figura 1 (cri-
anças de 3 anos) e na Figura 2 (crianças de 4 anos), houve diferença signi-
ficativa e a escola A obteve uma pontuação maior. Segundo Moura (1993)
a ludicidade evidenciada nas atividades de educação fı́sica, possibilita que
o professor oportunize as crianças em programa educativo de atividades.
Observou-se também neste trabalho que as crianças da escola particu-
lar, já começam a realizar atividades que estimulam a coordenação motora
fina e a coordenação motora grossa, através de atividades inseridas na pró-
pria instituição, como aula de piano, de dança, de informática, e práticas
esportivas Estas atividades extras estimulam precocemente tais habilida-
des. Em comparação, foi visto neste trabalho, que a instituição pública
(creche) por apresentar carências econômicas, torna-se impossibilitada de
oferecer estas atividades para suas crianças. Para Barbosa (2007) a prática
244 de Faria et al.

destas atividades favorece estı́mulos importantes para o desenvolvimento,


que às vezes são pouco explorados nestas idades, como, a coordenação mo-
tora.
Na comparação total a escola A obteve uma pontuação maior do que
a B. Estes resultados corroboram os achados de Bhering & Nez (2002) e
Stokoe (1987) que relatam que estas diferenças são notadas porque as insti-
tuições particulares estão ampliando seus serviços, introduzindo atividades
psicomotoras desde o momento do ingresso da criança na pré-escola.
Nos resultados da avaliação psicomotora em crianças de 4 anos, não
houve diferença entre as escolas, talvez por já estarem inseridas há pelo
menos um ano nestes programas educacionais. Isto poderia propiciar ex-
periências psicomotoras por um maior perı́odo de tempo, com consequente
aprendizado. Le Boulch (2001) relata que, neste perı́odo a criança já possui
seus movimentos mais controlados e coordenados, conseguindo se movimen-
tar com certa habilidade e ritmo à coordenação dos membros.
Com relação aos resultados obtidos na avaliação das crianças de 5 anos,
não houve diferença entre as escolas em nenhuma das atividades realizadas.
O presente resultado pode estar relacionado ao fato de que nesta idade
todas as crianças já iniciaram os projetos educacionais que objetivam a
pré-alfabetização, permanecendo por mais tempo na sala de aula, com
atividades mais formais em termos pedagógicos. Rodrigues & Amadeu
(2002) afirmam que a instituição de educação infantil não pode desconhecer
a natureza do conhecimento infantil ou de como ele se processa.
Quanto aos resultados da avaliação das crianças de 6 anos, houve uma
diferença significativa com relação ao equilı́brio dinâmico, onde a escola B
obteve uma pontuação maior que a escola A. Este resultado pode estar
relacionado ao fato da inatividade das crianças de uma classe social mais
favorecida (escola A) ser cada vez maior, a exemplo do que acontece com
o mundo adulto. A vida sedentária dos adultos, a rotina e a cobrança
intelectual têm levado as crianças à condição de domı́nio motor cada vez
menor, trazendo danos aos aspectos motores, cognitivos, afetivos e sociais.
Esta imobilidade é chamada por Oliveira (2005) de “analfabetismo motor”.
Atualmente as crianças de classe média alta e alta quase não possuem
a chance de fazer aquelas brincadeiras de ruas como pega-pega, esconde-
esconde, entre outras. Estas atividades oferecem às crianças oportunidade
de vivenciar experiências motoras diversas. De acordo com Rodrigues &
Amadeu (2002) é preciso haver mudanças na preparação destes alunos para
a vida, e não apenas para um mero acúmulo de informações. É preciso,
também, conscientizar o trabalho pedagógico para a importância da forma-
ção das crianças como um todo, com sua afetividade, percepção, sentido,
crı́tica, criatividade e expressão corporal. É possı́vel orientar o aluno a
ampliar seus referenciais de mundo e trabalhar com todas as linguagens
(escrita, sonora, corporal, dramática, artı́stica, entre outras), integrando-o
para que construa sua própria visão do universo.
Avaliação neuromotora em pré-escolares 245

6. Conclusão
As avaliações foram realizadas em ambas as instituições e as diferenças mais
significantes nos resultados foram nas avaliações do equilı́brio dinâmico e
da coordenação apendicular, onde se observou maior pontuação na escola
A (particular) em relação à escola B (pública). Assim, deve-se orientar
dirigentes, professores e cuidadores para fornecer um estı́mulo adequado a
estas faixas etárias.
Sugere-se a realização de mais estudos referentes a este assunto, para
que os profissionais envolvidos com o desenvolvimento infantil conheçam a
importância da psicomotricidade como um recurso facilitador na aquisição
das habilidades neuromotoras.
Por todos estes conhecimentos é, hoje, imprescindı́vel que os profis-
sionais das áreas da saúde preocupem-se com o desenvolvimento global
do indivı́duo, pois não há aprendizagem do movimento sem um estı́mulo
adequado e contı́nuo.

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248 de Faria et al.

Notas Biográficas
Tereza Cristina Carbonari de Faria é Fisioterapeuta (FCNM, 1989), Mestre
em Reabilitação (UNIFESP-EPM, 2000) e Doutor em Neurologia/Neurociência
(UNIFESP-EPM, 2009). Atualmente é docente da Universidade de Mogi das
Cruzes (UMC).

Sı́lvia Regina M. Silva Boschi é Fisioterapeuta (PUCCAMP, 1988) e


Mestre em Engenharia Biomédica (UMC, 2003). Atualmente é doutoranda em
Engenharia Biomédica na UMC e docente da mesma instituição.

Janaı́na Pereira de Souza é Fisioterapeuta (UMC, 2008) e atua na Prefeitura


Municipal de Guararema (SP).

Érica Mie Okamura é Fisioterapeuta (UMC, 2009) e atua no Hospital A.C.


Camargo (SP).
Avaliação neuromotora em pré-escolares 249

Anexo 1: Protocolo de avaliação


250 de Faria et al.
Capítulo 14

Análise Sequencial do Desenvolvimento


Neuropsicomotor Infantil

Eliane Roseli Winkelmann∗,


Luciana Meggiolaro Pretto, Elenita Costa Beber Bonamigo

Resumo: Este capı́tulo apresenta a análise do perfil neuropsicomo-


tor (DNPM) de crianças de 2 a 7 anos de idade matriculadas em
escolas públicas da rede municipal de Ijuı́/RS em 3 anos consecuti-
vos (2008, 2009 e 2010). Foram realizadas 871 avaliações do DNPM
pelo exame neurológico evolutivo (ENE). A média de acertos dos
testes de 2 a 7 anos foram: 0,93±0,03 (2008), 0,89±0,02 (2009),
0,92±0,04 (2010). Observou-se diferença significativa somente en-
tre 2008 e 2009 (p < 0, 01), embora sem relevância clı́nica, pois a
média de acertos nos três anos foi muito semelhante. As crianças
possuem, em geral, um bom DNPM.

Palavras-chave: Criança, Pré-escolar, Desempenho psicomotor,


Desenvolvimento infantil.

Abstract: This chapter aims at assessing the neuropsychomotor de-


velopment of children from 2 to 7 years old enrolled at elementary
public schools of Ijuı́/RS during 3 consecutive years (2008, 2009
and 2010). A total of 871 children were evaluated using the neu-
rological development test. The average accuracy of the tests from
2 to 7 years was: 0.93±0.03 (2008), 0.89±0.02 (2009), 0.92±0.04
(2010). We observed significant difference only between 2008 and
2009 (p < 0, 01), although without clinical relevance, because the
average accuracy of the three years was very similar. In general,
children had good neuropsychomotor development.

Keywords: Child, Preschool, Psychomotor performance, Child de-


velopment.

∗ Autor para contato: elianew@unijui.edu.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


252 Winkelmann et al.

1. Introdução
O acompanhamento do desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) tem
papel fundamental na atenção à saúde da criança. Este processo
fundamenta-se na investigação do seu processo evolutivo. A ausência de
determinados comportamentos, esperados em idades especı́ficas, ou a per-
sistência de sua presença após idades em que deveriam ter desaparecido,
assim como certas caracterı́sticas habituais nas respostas das crianças, po-
dem indicar um atraso na sua maturação.
Analisar adequadamente o desenvolvimento permite avaliar o grau de
maturidade e a integridade funcional do sistema nervoso, possibilitando a
intervenção precoce. Esta intervenção é necessária para readequar a criança
em seu processo natural, que inclui, além do crescimento, a maturação, a
aprendizagem e os aspectos psı́quicos e sociais.
A infância é uma das fases da vida onde ocorrem as maiores modifica-
ções fı́sicas e psicológicas do corpo. Estas mudanças caracterizam o cresci-
mento e o desenvolvimento infantil, e necessitam de acompanhamento para
delimitar as condições de saúde e vida da criança. Isto visa a promoção e
a manutenção na atenção da saúde, bem como intervir sobre fatores capa-
zes de comprometê-la (Carabolante & Ferriani, 2003). Para acompanhar
o desempenho psicomotor é necessário ter conhecimento adequado sobre
o processo dinâmico de cada etapa evolutiva do desenvolvimento normal
da criança. Em cada uma destas há dados semióticos diferentes e com
diferentes significações (Rotta & Pedroso, 2004).
O desenvolvimento motor atı́pico ou as crianças que apresentam maior
risco de atrasos merecem atenção e ações especı́ficas, pois os problemas
de coordenação e controle do movimento poderão se prolongar até a fase
adulta. Além disto, atrasos motores frequentemente associam-se a prejuı́-
zos psicológicos e sociais, como baixa auto-estima, isolamento, hiperativi-
dade, entre outros, atrapalhando a vida e o desempenho escolar (Willrich
et al., 2009; Miranda et al., 2003).
A aquisição das habilidades motoras e a identificação de anormalidades
no desenvolvimento motor são aspectos de destaque em várias pesquisas
que buscam avaliar o desenvolvimento integral da criança. Estas pesquisas
tentam estabelecer o diagnóstico e o prognóstico de crianças que apresen-
tam algum distúrbio ou dificuldade no desempenho, antecipando a inter-
venção precoce necessária. Entretanto, é notório o fato de que pesquisas
sobre o crescimento fı́sico são mais frequentes do que as referentes ao desen-
volvimento. Portanto, a realização de estudos que acompanhem o DNPM é
importante para o conhecimento dos padrões que se estabelecem à medida
que a sociedade evolui juntamente com a grande influência tecnológica.
Este capı́tulo apresenta um estudo que teve como objetivos verificar o
perfil psicomotor de crianças de 2 a 7 anos de idade matriculadas em esco-
las públicas da rede municipal de uma cidade do interior do Estado do Rio
Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil 253

Grande do Sul (Ijuı́) em 3 anos consecutivos (2008, 2009 e 2010), e iden-


tificar as habilidades em que as crianças apresentam maiores dificuldades
de aquisição e execução.

2. Fundamentação Teórica
2.1 Aquisição e desenvolvimento psicomotor
O desenvolvimento infantil é um processo sequencial, relacionado à idade
cronológica, originado pela interação entre os requisitos das atividades, a
biologia do indivı́duo e as condições ambientais. Além disto, influenci-
ado pelas mudanças sociais, intelectuais e emocionais (Gallahue & Ozmun,
2005; Rosa Neto et al., 2010). Na aquisição motora, Haywood & Getchell
(2004) afirmam que o ser humano adquire uma grande quantidade de mo-
vimentos simples e desorganizados, mas na medida em que experimenta e
pratica, estes se tornam habilidades motoras organizadas e complexas.
Cada nova aquisição influencia as anteriores, tanto no domı́nio mental,
como no domı́nio motor. Isto valoriza as relações com o meio, através da
adaptação às novas circunstâncias vividas e experimentadas.
O desenvolvimento motor pode ser visto pelo desenvolvimento progres-
sivo das habilidades de movimento, ou seja, a abertura para o desenvolvi-
mento motor é dada através do comportamento de movimento observável
do sujeito (Gallahue & Ozmun, 2005). No desenvolvimento infantil ocorre
a interação indivı́duo, ambiente e tarefa, com os domı́nios cognitivo, afetivo
e motor. O processo de desenvolvimento motor ocorre em fases sucessivas
de movimentos reflexos, rudimentares, fundamentais e especializados. Para
cada fase do processo de desenvolvimento motor são indicados estágios com
idades cronológicas correspondentes.
Segundo Gallahue & Ozmun (2005) os movimentos podem ser caracte-
rizados como: estabilizadores, locomotores e manipulativos. Eles se com-
binam na execução das habilidades motoras ao longo da vida. Nos movi-
mentos estabilizadores, a criança é envolvida em constantes esforços contra
a força da gravidade na tentativa de obter e manter a postura vertical.
É através desta dimensão que ganham e mantém um ponto de origem na
exploração que realizam no espaço. No primeiro ano de vida, os marcos re-
lacionados à estabilidade são: o controle cervical aos três meses, o controle
de tronco superior e a postura sentada aos seis meses, e o ficar em pé com
ampla base de apoio aos dez meses.
No ENE a avaliação da estabilidade utiliza testes classificados como de
equilı́brio estático. No segundo ano de vida estes movimentos são represen-
tados pela diminuição na base de apoio evoluindo aos dois anos para pés
paralelos e perpendiculares ao quadril. Aos três anos realiza a posição de
Romberg de olhos abertos e aos quatro anos de olhos fechados. Aos cinco
anos realiza apoio plantar com a ponta de um pé no calcanhar do outro,
254 Winkelmann et al.

com os olhos abertos e aos seis anos a mesma posição com os olhos fecha-
dos. Aos sete anos esta habilidade se completa com a posição ortostática
em apoio uni podal durante trinta segundos e agachamento com apoio bi
podal, calcanhares unidos e membros superiores abertos durante dez se-
gundos. Destaca-se que em um ano a criança adquire o controle com os
olhos abertos, e no próximo com os olhos fechados.
Na Escala de Desenvolvimento Motor (EDM) proposta por Rosa Neto
(2002) os marcos são parecidos, o autor preconiza uma prova por idade
e destaca que aos dois anos a criança permanece em pé sobre um banco
de quinze centı́metros, aos três anos faz o semi-ajoelhado, aos quatro faz
inclinação anterior do tronco, aos cinco fica na ponta dos pés, aos seis faz
apoio uni podal e aos sete fica na posição de cócoras. O autor continua
até os onze anos. Aos oito anos a criança deve ficar na posição de avião de
olhos abertos na ponta dos pés, aos nove anos na posição uni podal com
membro inferior contra lateral cruzado (fazendo um “quatro”), aos dez anos
ficar na ponta dos pés de olhos fechados e aos onze anos em apoio uni podal
de olhos fechados.
A segunda categoria de movimentos refere-se aos locomotores. Gallahue
& Ozmun (2005) referem-se aos movimentos que indiquem uma mudança
na localização do corpo em relação a um ponto fixo na superfı́cie. No
primeiro ano observa-se o rolar aos seis meses, o arrastar aos oito meses,
o engatinhar aos nove meses e a marcha aos doze meses. Outras tarefas
locomotoras são: subir escadas, correr, saltar, pular ou saltitar.
A locomoção no segundo ano é avaliada pelo ENE com a marcha cru-
zada com dissociação de cinturas, a capacidade de deslocar-se puxando um
carrinho, o subir e descer escadas sem apoio e correr livremente. No ter-
ceiro ano observa-se que a criança consegue andar em uma linha reta, puxar
o carrinho andando para trás e correr contornando obstáculos. No quarto
ano consegue subir e descer escadas alternando os pés. No quinto corre e
salta com os pés unidos uma corda em uma altura de trinta centı́metros,
salta e gira meia volta sem desviar do lugar de origem, se desloca cinco
metros pulando com os pés juntos, se desloca cinco metros pulando sobre
um só pé e salta para um lado e depois para outro. Aos seis anos anda
para trás colocando o calcanhar de um pé encostado na ponta de outro
por dois metros e se desloca cinco metros pulando somente sobre o pé não
dominante. Aos sete anos consegue pular alto e bater palmas duas vezes
antes de encostar-se ao chão. Aos oito anos salta quarenta centı́metros,
aos nove anos salta e toca os calcanhares, aos dez anos desloca-se chutando
uma caixa de fósforos por cinco metros e aos onze anos salta sobre uma
cadeira.
A relação entre estabilidade e mobilidade é importante no estudo do
desenvolvimento. A observação clı́nica demonstra que a criança adquire
uma habilidade ao consolidar outra. Assim, ao conseguir equilibrar-se em
supino e prono adquire a postura sentada, e ao adquirir equilı́brio sentado é
Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil 255

capaz de manter-se de gatos. Os profissionais que trabalham com avaliação


e estimulação percebem que a possibilidade de agachar e levantar-se sem
apoio está associada à aquisição da marcha independente, demonstrando a
relação entre a estabilidade e a mobilidade.
A terceira categoria de movimento é a manipulativa e refere-se a ma-
nipulação de objetos, ou motricidade fina, ou coordenação apendicular.
Gallahue & Ozmun (2005) descrevem como marcos dos movimentos mani-
pulativos a preensão grosseira aos seis meses e a preensão digital superior
aos nove meses. Na sequência estão as tarefas de manipular, arremessar, re-
ceber, chutar e interceptar objetos, como movimentos manipulativos gros-
sos. Costurar e cortar com tesoura são movimentos manipulativos finos.
Os componentes manipulativos envolvem um relacionamento do indivı́duo
com os objetos e envolvem a força cedida para os objetos e a força recebida
deles.
No segundo ano marca-se a capacidade de rabiscar e construir torre
com cinco cubos. No terceiro ano observa-se melhor motricidade com riscos
verticais e a coordenação no movimento de levar o indicador ao nariz com
os olhos abertos. Aos quatro anos a criança copia uma cruz, realiza o
movimento do indicador ao nariz com os olhos fechados, faz bolinhas de
papel com a mão dominante e enrola um fio no carretel. Aos cinco anos
copia um cı́rculo ou um quadrado e joga uma bola em um alvo estabelecido
a uma distância de dois metros. Aos seis anos a motricidade fina está mais
associada à mobilidade e permite que a criança enrole uma linha na mão
dominante enquanto caminha, e realize movimentos bilaterais e cruzados
com os pés e as mãos, como bater alternadamente com o pé direito no
chão e a mão esquerda na mesa. Nesta idade se observa a definição da
lateralidade. Aos sete anos a criança consegue copiar um losango e repetir
as batidas manuais do avaliador na mesa conforme seis ritmos padronizados
e diferenciados.
Rosa Neto (2002) destaca provas de rapidez, consideradas como es-
quema corporal, como a capacidade de realizar cinquenta e cinco traços
verticais por minuto aos seis anos, evoluindo até cento e quinze aos onze
anos. Para Manoel (2000) outro aspecto do desenvolvimento refere-se ao
aumento da complexidade do comportamento.
A evolução das habilidades motoras também depende do desenvolvi-
mento da sensibilidade visual, do esquema corporal, da organização espa-
cial e temporal e da lateralidade. A linguagem evolui significativamente em
complexidade e também recebe influência do ambiente em que a criança
está inserida.
Na infância, particularmente, no inı́cio do processo de escolarização,
ocorre um amplo incremento das habilidades motoras. Isto possibilita a
criança o domı́nio do seu corpo em diferentes atividades, como saltar, cor-
rer, rastejar, chutar uma bola, arremessar um arco, equilibrar-se unilateral-
mente, escrever, entre outras (Santos et al., 2004). Segundo Medina et al.
256 Winkelmann et al.

(2006) a conquista de habilidades motoras e da formação escolar está vin-


culada ao desenvolvimento da percepção do esquema corporal e da noção
de espaço e de tempo. Ao conquistar um bom controle motor, a criança es-
tará construindo as noções básicas para o seu desenvolvimento intelectual.
Portanto, uma das formas de prevenção do comprometimento de habili-
dades escolares ocorre ao se proporcionar o maior número de experiências
motoras e psicossociais as crianças (Rosa Neto et al., 2010).

2.2 Avaliação do desenvolvimento psicomotor


A avaliação da sequência do desenvolvimento pode ser identificada através
dos marcos tradicionais. Estas referências constituem uma abordagem sis-
temática para a observação dos avanços da criança no tempo. Analisa-se
a aquisição de determinada habilidade que se baseia nas adquiridas previ-
amente e raramente pulam-se etapas. Estes marcos constituem a base dos
instrumentos de avaliação (Sacanni et al., 2007).
Muitos destes instrumentos necessitam de sensibilidade, embora pro-
porcionem um método estruturado para observação do progresso da criança
e ajudem na indicação do atraso do desenvolvimento. Quando a atenção
direciona-se em apenas um marco, pode haver incapacidade de identificar
os processos estruturais que afetam o grau de desenvolvimento da criança
como um todo.
Segundo Burns & MacDonald (1999), em qualquer idade a criança pode
manifestar caracterı́sticas do seu desenvolvimento motor, podendo variar de
um indivı́duo para o outro de acordo com a hereditariedade, as influências
e as experiências. O desenvolvimento não é mensurado com precisão ou
pela existência de uma idade absoluta de aquisição de habilidades. Podem
ocorrer diferenças na idade de aquisição de determinadas habilidades, que
é singular para cada ser humano (Souza et al., 2008).
Na avaliação do desenvolvimento motor, não se deve apenas investigar
em que idade a criança adquiriu uma habilidade. É preciso avaliar a qua-
lidade destas habilidades e observar a integração e a sı́ntese das respostas
de vários testes para a validação do resultado. Um comportamento isolado
não é suficiente para que se possa chegar a um diagnóstico. As crianças po-
derem reagir de diferentes maneiras, em diferentes momentos, ao enfrentar
o solicitado pelo avaliador.
Sacanni et al. (2007) afirmam que a identificação precoce de alterações
no desenvolvimento é uma tarefa complexa para profissionais que atuam na
atenção primária. Devido à plasticidade do DNPM da criança, é necessário
que a avaliação seja repetida, principalmente durante os primeiros anos de
vida, quando o desenvolvimento é mais acelerado e o efeito do atraso é
mais importante. Através desta identificação pode ser possı́vel o estabele-
cimento de programas de intervenção que visem à prevenção de distúrbios
do desenvolvimento.
Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil 257

Porém, quando não se observa alteração no desenvolvimento da cri-


ança, isto não é suficiente para assegurar um prognóstico definitivo quanto
à normalidade (Silva & Ferreira, 2001). Deve-se avaliá-la anualmente para
verificar a evolução do desenvolvimento. Assim se confirma o perfeito de-
sempenho ou se observa alguma irregularidade que surgiu durante o perı́odo
entre uma avaliação e outra e a partir daı́ se estabelece a intervenção para
ajustá-la (Zilke et al., 2009).
A avaliação do DNPM também tem o propósito de estabelecer aná-
lises longitudinais dos perfis do desenvolvimento nas habilidades. Como
no acompanhamento de uma criança que foi submetida à intervenção fi-
sioterapêutica devido ao atraso na aquisição de suas habilidades motoras.
A avaliação permite reconhecer avanços no seu tratamento e neste caso,
recomenda-se reavaliar através dos testes realizados antes da intervenção,
além dos testes especı́ficos conforme sua idade cronológica (Santos et al.,
2009).
Em muitos casos, a identificação de problemas no desenvolvimento neu-
rológico ou de distúrbios de aprendizagem e de comportamento ocorre
quando a criança ingressa na escola. Portanto, recomenda-se que todas
as crianças recebam um acompanhamento do seu desenvolvimento motor
desde seu nascimento, a fim de se verificar precocemente alterações e, se
necessário, realizar a intervenção precoce. Isto evita danos futuros e a
identificação tardia, já em idade escolar (Santos et al., 2009).

3. Metodologia
Este estudo é do tipo retrospectivo, longitudinal, descritivo e observacional.
Foram realizadas análises em banco de dados, a partir das avaliações re-
alizadas pelo projeto de extensão “Acompanhamento do Desenvolvimento
Neuropsicomotor em Crianças”, do curso de Fisioterapia do Departamento
de Ciências da Vida da Universidade Regional do Noroeste do Estado do
Rio Grande do Sul (UNIJUÍ).
O estudo foi desenvolvido em conformidade com a resolução no 196/96
do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta as pesquisas envolvendo
seres humanos, e foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pes-
quisa da UNIJUÍ (protocolo no 0106/2010).
A amostra foi composta de crianças selecionadas de forma aleatória, de
ambos os gêneros, na faixa etária de 2 a 7 anos, matriculadas em quatro
escolas municipais de educação infantil do municı́pio de Ijuı́, RS, nos anos
de 2008, 2009 e 2010. Foram excluı́das crianças com história de patologias
neuromusculares que pudessem causar atrasos no desenvolvimento.
A partir deste banco de dados foram identificadas 879 crianças. Entre-
tanto, destas, 8 foram excluı́das por não cooperarem durante a execução
da avaliação, restando uma amostra final de 871 crianças.
258 Winkelmann et al.

Os avaliadores receberam um treinamento anterior, para a padroniza-


ção da aplicação dos testes e o manuseio do instrumento utilizado. As
avaliações foram realizadas no ambiente escolar, com um tempo máximo
de aplicação de trinta minutos. Todos os testes foram feitos de forma lúdica
e interativa. Antes da realização do exame as crianças passavam por um
perı́odo de adaptação para que pudessem se familiarizar com os avaliadores
e com os instrumentos a serem usados durante o teste.
Para este estudo foi utilizado o Exame Neurológico Evolutivo, a fim
de se avaliar o DNPM. Este exame tem se caracterizado como importante
recurso semiológico para a análise da maturidade e do desempenho do
sistema nervoso da criança (Lefèvre, 1976; Diament & Cypel, 1990; Coelho,
1999; Guardiola et al., 2001; Barros et al., 2003). A aplicação ocorreu
conforme o proposto por Lefèvre (1976) e Coelho (1999). O ENE é um
instrumento simples de avaliação do DNPM, de baixo custo, facilmente
aplicável por profissionais dos serviços de saúde e sem a necessidade de
recursos, instalações e materiais especializados. No Brasil, Coelho (1999)
realizou uma proposta de itens do ENE a serem testados (Rotta, 2006).
O ENE (Coelho, 1999) possui testes especı́ficos para cada faixa etária.
O mesmo tem como base verificar as habilidades isoladas e associadas,
considerando:
• a fala;
• a motricidade global e fina;
• a coordenação motora ampla, fina, digital, visomotora e visual;
• a lateralidade da mão, do pé, do olho e do ouvido;
• o equilı́brio estático e dinâmico;
• a organização corporal, espacial e temporal.
O grau de complexidade da tarefa aumenta conforme a idade progride.
As variáveis coletadas foram obtidas das avaliações individuais realizadas
conforme a idade cronológica da criança. Foram realizadas três tentativas
em cada teste para que o resultado fosse válido e confiável.
As variáveis coletadas aos dois anos foram: fala com frase agramati-
cal (duas palavras diferentes por expressão), observação da postura ereta,
marcha cruzada, andar para frente puxando um carrinho por cinco metros,
subir e descer escadas com apoio, correr livremente, sentar-se em uma ca-
deira sem olhar para trás, construir uma torre com cinco cubos ou mais,
rabiscar uma folha de papel.
As variáveis coletadas aos três anos foram: fala com superação das
etapas da palavra-frase e frase agramatical (pode-se observar dislalias de
supressão, como no fonema de articulação difı́cil suprimido, em lugar de fa-
lar “brinquedo” a criança fala “binquedo”), posição de Romberg (equilı́brio
estático com olhos abertos durante trinta segundos), andar em linha reta
Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil 259

por cinco metros, andar para trás puxando um carrinho por cinco metros,
subir e descer escadas sem apoio, correr contornando obstáculos, apanhar
um objeto do chão com uma mão, construir torre com nove cubos ou mais,
copiar um traço vertical, jogar uma bola por cima do examinador, teste de
levar o indicador ao nariz (com os olhos abertos) na posição ortostática e
com os membros superiores abduzidos horizontalmente, chutar uma bola
observando o pé escolhido.
As variáveis coletadas aos quatro anos foram: fala com superação de
todas as etapas (palavra-frase, agramatical e dislalias de supressão), po-
sição de Romberg durante trinta segundos de olhos fechados, andar nas
pontas dos pés por cinco metros, subir e descer escadas sem apoio alter-
nando os pés, virar páginas de livros, copiar uma cruz, teste de levar o
indicador ao nariz com os olhos fechados, fazer uma bolinha de papel com
a mão dominante, enrolar um fio de carretel, manter olhos fechados por
vinte segundos, manter a boca aberta durante quarenta segundos, manter
a lı́ngua protusa com os olhos abertos por quarenta segundos, reconhecer
posições segmentares (abaixo, acima e laterais), reconhecer objetos famili-
ares, reconhecer as cores branca e preta, observar a preferência lateral dos
olhos, ouvidos, mãos e pés, recortar sobre uma linha reta.
As variáveis coletadas aos cinco anos foram: fala com superação de
todas as etapas (palavra-frase, agramatical, dislalia de supressão, adição
e troca), em posição ortostática com apoio plantar e a ponta de um pé
encostado no calcanhar do outro, com os olhos abertos, por dez segundos,
andar para frente colocando o calcanhar de um pé na ponta do outro por
uma distância de dois metros, correr e saltar uma corda fixada a uma altura
de trinta centı́metros, saltar com os pés unidos uma corda fixada a uma
altura de trinta centı́metros, saltar e girar meia volta sem desviar do lugar
de origem, deslocar-se cinco metros pulando com os pés juntos, deslocar-
se cinco metros pulando sobre um só pé, saltar para um lado e depois
para o outro, copiar um cı́rculo, copiar um quadrado, jogar uma bola em
um alvo estabelecido a uma distância de dói s metros, sentado bater os
pés alternados num ritmo solicitado, tocar com a ponta do polegar todos
os dedos, abrir uma mão e fechar a outra por dez segundos, reconhecer
todas as cores, manter a lı́ngua protusa com os olhos fechados por quarenta
segundos, observar a preferência lateral dos olhos, ouvidos, mãos e pés.
As variáveis coletadas aos seis anos foram: fala com superação de todas
as etapas, em posição ortostática a ponta de um pé encosta no calcanhar
do outro, com os olhos abertos, por dez segundos, andar para trás colo-
cando o calcanhar de um pé encostado na ponta do outro por dois metros,
deslocar-se cinco metros pulando somente sobre o pé não dominante, bra-
ços estendidos horizontalmente para os lados descrevendo cı́rculos no ar
com os dedos indicadores por dez segundos, andar e enrolar um carretel no
dedo indicador da mão dominante, reconhecer as cores, bater o indicador
direito na mesa e o pé direito no chão ao mesmo tempo, alternado-os com
260 Winkelmann et al.

os esquerdos por dez segundos, em pé forçar o tronco para trás e obser-
var se realiza a flexão de joelho, reconhecer os dedos, reconhecer direita e
esquerda, observar a preferência lateral dos olhos, ouvidos, mãos e pés.
As variáveis coletadas aos sete anos foram: fala com superação de todas
as etapas, posição ortostática, sobre um pé durante trinta segundos, posi-
ção ortostática com apoio plantar sobre um pé e braços ao lado do corpo,
realizando a flexão do joelho durante dez segundos, agachado com apoio bi
podal, calcanhares unidos e membros superiores abertos durante dez segun-
dos, sentar equilibrando uma régua no dedo indicador por dez segundos,
pular alto e bater palmas duas vezes antes de encostar-se ao chão, copiar
um losango; repetir as batidas manuais do avaliador conforme seis ritmos
padronizados e diferenciados imitando batidas na mesa, reconhecer as co-
res, passar das posições deitado para sentado e para em pé, olhar externo
lateral para a esquerda mantido por trinta segundos, olhar externo lateral
para a direita mantido por trinta segundos, membros superiores para frente
com dedos afastados e polegares de cada mão separados a um centı́metro
por trinta segundos, observar a preferência lateral de olhos, ouvidos, mãos
e pés.
Os dados foram analisados no pacote estatı́stico SPSS (versão 18.0,
Chicago, IL, EUA), atribuindo-se 1 ponto para o padrão presente (acerto)
e 0 ponto para o ausente (alterado) na avaliação do DNPM. Na pontuação
média de acertos (MA) nos testes por idade, valores inferiores a 1 mos-
traram que a criança não conseguiu realizar corretamente todos os testes
de sua faixa etária. Os dados descritivos foram apresentados como média
desvio padrão e percentagem. Os dados foram analisados pelo teste de
multivariância, considerando como significativo um p ≤ 0, 05.

4. Resultados
Foram realizadas 871 avaliações em crianças com idade média de 4,44±1,42
anos, em três anos consecutivos. Ocorreram 324 avaliações em 2008, 379
em 2009, e 168 em 2010. A Tabela 1 mostra o número de escolares em
cada faixa etária, de acordo com ano de participação na pesquisa.
As crianças avaliadas possuem um bom DNPM independente da idade
avaliada e mantém o padrão deste desenvolvimento nos três anos consecu-
tivos (Tabela 2 e Figura 1). A média de acertos dos testes de dois a sete
anos foram 0,93±0,03 (2008), 0,89±0,02 (2009), 0,92±0,04 (2010).
No ano de 2008, o pior desempenho foi na faixa etária dos seis anos.
Nos anos de 2009 e 2010 os piores desempenhos nas faixas etárias de dois,
três e seis anos.
Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil 261

Tabela 1. Número de crianças avaliadas.


o
Idade N crianças No crianças No crianças No total
(anos) (2008) (2009) (2010)
2 37 40 18 95
3 47 63 36 146
4 85 73 32 190
5 86 93 42 221
6 47 84 33 164
7 22 26 07 55
Total 324 379 168 871

Tabela 2. Média dos acertos nos testes em cada faixa etária.


Idade No crianças Média e desvio-padrão do sucesso
(anos) por idade nos testes realizados por faixa etária

2008 2009 2010


2 9 0,95±0,08 0,93±0,09 0,96±0,09
3 13 0,93±0,07 0,87±0,13 0,86±0,11
4 19 0,94±0,09 0,88±0,13 0,88±0,13
5 21 0,95±0,07 0,90±0,12 0,91±0,10
6 14 0,88±0,12 0,87±0,10 0,90±0,10
7 11 0,95±0,11 0,89±0,13 0,96±0,05
2a7 – 0,93±0,03 0,89±0,02 0,92±0,04

Comparando-se todas as idades entre os anos avaliados observou-se


diferença significativa entre 2008 e 2009 (p < 0, 01) e 2008 e 2010, embora
sem relevância clı́nica, pois a média de acertos nos três anos foi muito
semelhante. Já na comparação por faixa etária, a diferença foi significativa
aos três, quatro e cinco anos de idade (p < 0, 05).
As maiores dificuldades observadas, em média, nos três anos avalia-
dos (Tabela 3), aos dois e aos três anos foi a fala (0,74±0,09 acertos) e
(0,59±0,05 acertos). Aos quatro, cinco e seis anos a maior dificuldade foi
a sensibilidade. A média de acertos aos quatro anos foi de 0,78±0,03 (cor
preta) e 0,73±0,04 (cor branca), aos cinco anos a média foi de 0,80±0,04,
e aos seis anos de 0,63±0,08 acertos. Nos escolares com sete anos, a maior
dificuldade foi na habilidade de equilı́brio dinâmico (0,85±0,13 acertos).

5. Discussão e Conclusões
Neste estudo observou-se que em geral as crianças que frequentam esco-
las municipais de educação infantil em uma cidade do interior do estado
262 Winkelmann et al.

Figura 1. Comparação do desempenho neuropsicomotor.

Tabela 3. Principais dificuldades apresentadas pelas crianças.


Idade Dificuldades Tipo de teste avaliado Média de acertos
encontradas nos três
anos avaliados
2 Fala Frase agramatical 0,74±0,09
3 Fala Frase completa 0,59±0,05
4 Sensibilidade Reconhecimento da cor preta 0,78±0,03
4 Sensibilidade Reconhecimento da cor branca 0,73±0,04
5 Sensibilidade Denominar todas as cores 0,80±0,04
6 Sensibilidade Reconhecer direita e esquerda 0,63±0,08
7 Equilı́brio Pular alto e bater palma 2 0,85±0,13
dinâmico vezes

do Rio Grande do Sul, apresentam um bom DNPM, pois obtiveram uma


média de acerto acima de 85% nos testes avaliados. Este achado está de
acordo com os dados de outros estudos (Palacio-Quintin, 2000; Pacheco &
Dupret, 2004; Rezende et al., 2005) em que verificaram que crianças que
frequentam escolas de educação infantil apresentam melhores resultados
no desenvolvimento que crianças que as que não frequentam. Porém, ao
comparar crianças que frequentam escolas públicas e particulares Barros
et al. (2003) mostram que o desenvolvimento motor de crianças de escolas
públicas é menor. Este resultado também foi descrito em outros estudos
realizados por Winkelmann et al. (2008) e Zilke et al. (2009). Além disto,
resultados de avaliações de crianças através do ENE em escolas de educa-
Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil 263

ção infantil, de âmbitos públicos e particulares, de outra cidade do interior


do estado do Rio Grande do Sul, apresentam tendência de aceleração do
DNPM, em média de dois anos (Zilke et al., 2009).
Dentro desta análise pode-se citar o estudo de Caetano et al. (2005)
realizado na cidade de Rio Claro, SP, em que trinta e cinco crianças com
idade de três a sete anos de idade, de ambos os gêneros, alunos de uma
escola particular, foram avaliadas e reavaliadas treze meses depois. A mai-
oria das crianças apresentou avanço motor após treze meses para todos os
componentes da motricidade. Este resultado também corrobora com a afir-
mação de que nos anos iniciais da infância ocorrem mudanças substanciais
no comportamento motor a cada ano, sendo que o repertório motor torna-
se cada vez mais diversificado à medida que a idade aumenta. A criança
vai progredindo na execução dos testes do exame motor.
Vários autores descrevem que determinantes biológicos, assim como
condições ambientais e socioeconômicas podem determinar atraso ou um
melhor desempenho no DNPM (Knoche et al., 2006; Pilz & Schermann,
2007). Desta forma, a escola é um ambiente que pode trazer vários be-
nefı́cios na aquisição das habilidades quando esta possibilita a riqueza na
estimulação das crianças.
Na análise das habilidades por idade observou-se maior dificuldade de
aquisição da fala, nas idades iniciais (dois e três anos). Salienta-se que
este é o perı́odo em que a criança adquire e aperfeiçoa esta habilidade,
para completá-la aos quatro anos. Esta dificuldade na aquisição também
foi observada e alguns mostram atrasos também em idades mais avança-
das. Souza et al. (2008) avaliaram o desenvolvimento de pré-escolares entre
quatro e seis anos incompletos, na educação infantil de Cuiabá, utilizando
a escala de Denver, e observaram atraso na aquisição a linguagem. Se-
gundo os autores este atraso pode ser um comportamento particular do
pré-escolar de Cuiabá, porém pode ser um sinal da falta de estı́mulo para
que esta competência se estabeleça.
Aos quatro, cinco e seis anos a habilidade que apresentou maior déficit
foi a sensibilidade. Aos quatro anos o teste da sensibilidade do exame de
ENE identificou dificuldade no reconhecimento da cor preta e branca, e aos
cinco anos em denominar todas as cores. Esta pode ser uma habilidade a
ser trabalhada através de vários exercı́cios de estimulação como mostra
a experiência de trabalhos em grupos de crianças (Sacon et al., 2009).
Da mesma forma pode-se acentuar-se o incentivo ao reconhecimento da
lateralidade, dificuldade verificada em maior ênfase aos seis anos.
Aos sete anos a habilidade que as crianças apresentaram maior dificul-
dade foi o equilı́brio dinâmico (teste de pular o mais alto e bater palmas
duas vezes). No estudo de Amorim et al. (2009) o equilı́brio estático foi a
maior dificuldade encontrada, além da coordenação apendicular e da per-
sistência motora em crianças de cinco anos de idade.
264 Winkelmann et al.

Embora existam vários métodos de exame do DNPM, é importante


salientar a necessidade do acompanhamento do desenvolvimento para a
detecção precoce de alterações para que se tenha uma intervenção ade-
quada já nas fases iniciais. Quanto mais precoce o diagnóstico e o inı́cio da
intervenção, maior é a chance de minimizar os efeitos de problemas futuros,
que muitas vezes são identificados tardiamente já no perı́odo escolar.
O monitoramento do desenvolvimento infantil por meio de uma me-
todologia simples, de baixo custo e facilmente aplicada, como a utilizada
neste estudo, pode constituir um meio importante de detecção precoce de
desvios do desenvolvimento. Alguns estudos já relatam este fato (Amorim
et al., 2009). Os testes que compõem o ENE, além de serem indicados para
utilização em serviços de atenção primária, podem ser usados diretamente
nas escolas, pois apenas alertam para riscos de desvios no desenvolvimento
infantil, reforçando a necessidade de confirmação por outros testes diag-
nósticos (Coelho, 1999; Rotta, 2006).
A obtenção dos dados através da inserção do fisioterapeuta diretamente
na escola de educação infantil traz contribuições relevantes, como o maior
diálogo com os professores e a identificação precoce de habilidades com-
prometidas através de testes especı́ficos. De acordo com a Secretaria de
Polı́ticas Públicas de Saúde (2002) os profissionais de saúde deverão estar
aptos a identificar crianças que devem ser encaminhadas para tratamento
especializado. Entre estes, o fisioterapeuta é capacitado para a avaliação do
desenvolvimento infantil e tem potencial para realizar estas avaliações de
forma precoce, com papel importante nas ações primárias de saúde dentro
das comunidades. Halpern et al. (2002) enfatizam que, quanto mais precoce
for o diagnóstico de atraso no desenvolvimento e as ações de intervenção,
menor será o impacto de danos futuros.
Se a avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor for realizada nos
primeiros anos de vida, e a identificação de distúrbios no desenvolvimento
motor for precoce, é possı́vel realizar uma intervenção adequada, a fim de
que as crianças com diagnóstico de atraso possam seguir a mesma sequência
que as crianças com desenvolvimento tı́pico ou normal.

Agradecimentos
Os autores agradecem a colaboração das escolas de educação infantil do
municı́pio de Ijuı́, RS, e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cien-
tı́fico e Tecnológico – CNPq pelo auxı́lio na pesquisa através da bolsa de
iniciação cientı́fica PIBIC/CNPq.

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Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil 265

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268 Winkelmann et al.

Notas Biográficas
Eliane Roseli Winkelmann é Mestre em Ciências Biológicas (UFRGS,
2003) e Doutor em Ciências da Saúde (UFRGS, 2008). Atualmente é docente
da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ.

Luciana Meggiolaro Pretto é acadêmica do Curso de Fisioterapia da UNIJUÍ


e bolsista PIBIC/CNPq.

Elenita Costa Beber Bonamigo é Mestre em Ciências do Movimento


Humano (UDESC, 2002). Atualmente é docente da Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ.
Capítulo 15

Correlações entre o Desenvolvimento Neuropsicomotor


e o Estado Nutricional Infantil

Fernanda Hack, Elenita Costa Beber Bonamigo,


Eliane Roseli Winkelmann∗

Resumo: Foi realizado um estudo observacional transversal com


137 crianças, objetivando verificar o desempenho motor e o estado
nutricional de crianças de 2 a 6 anos selecionadas aleatoriamente de
duas escolas municipais de Ijuı́, RS. O desenvolvimento neuropsico-
motor (DNPM) foi avaliado pelo protocolo proposto por Coelho e
o estado nutricional foi classificado pelo Índice de Massa Corporal.
Verificou-se que o DNPM das crianças está adequado para a idade
cronológica dos testes. As crianças que apresentaram um estado nu-
tricional acima do esperado obtiveram um desempenho motor pior
nos testes em relação àquelas que se apresentaram com o estado
nutricional eutrófico.

Palavras-chave: Avaliação neuropsicomotora, Fisioterapia, Es-


tado nutricional infantil.

Abstract: An observational study with 137 children was performed.


This study aimed at verifying the motor performance and nutritio-
nal status of children from 2 to 6 years, randomly selected, from two
elementary schools in Ijuı́/RS. The neuropsychomotor development
was evaluated by the protocol proposed by Coelho and the nutriti-
onal status of the children was classified by the Body Mass Index.
We concluded that the children’s neuropsychomotor development is
adequate for the chronological age of the tests. Also, children that
presented a nutritional status above the expected achieved a worse
motor performance in the tests than those with eutrophic nutritio-
nal status.

Keywords: Neuropsychomotor assessment, Physical therapy, Child


nutritional status.

∗ Autor para contato: elianew@unijui.edu.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


270 Hack et al.

1. Introdução
O desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) vem sendo tema de várias
pesquisas nos últimos anos. Nos primeiros anos de vida a criança passa
pelo perı́odo mais crı́tico do desenvolvimento do sistema nervoso central
(SNC) e vários fatores podem interferir neste processo.
No momento do nascimento, mesmo no nascimento a termo, o bebê
ainda não tem todos os seus sistemas corporais completamente desenvol-
vidos e estes continuam a desenvolver-se durante toda a infância até a
adolescência. O desenvolvimento normal nos primeiros anos de vida se dá
em uma sequência ordenada, permitindo certa previsão do que se pode
esperar de acordo com a idade da criança. Porém, cada criança é única
e apresenta um padrão caracterı́stico de desenvolvimento que depende de
inúmeros fatores, como nı́vel socioeconômico familiar, ambiente (Halpern
et al., 1996; Knoche et al., 2006; Resegue et al., 2007; Pilz & Shermann,
2007; Saccani et al., 2007), estado nutricional (Guardiola et al., 2001), des-
nutrição materna (Engstrom & Anjos, 1999), quantidade de estı́mulos que
a criança recebe (Souza et al., 2008), idade gestacional (IG) (Resegue et al.,
2007), ambiente escolar, peso ao nascimento (Miranda et al., 2003), entre
outros.
Para Sabatés & Mendes (2007) todo ser humano nasce com potencial
genético de crescimento e desenvolvimento, que poderá ou não ser alcan-
çado, dependendo das condições de vida que lhe sejam propiciadas. O inı́cio
da fase escolar é uma etapa importante de aquisição e aperfeiçoamento de
habilidades motoras e combinação destas, que permitirão que a criança
desenvolva o domı́nio corporal em diferentes posturas e movimentos.
O aumento no sedentarismo, acompanhado pelos péssimos hábitos ali-
mentares, fruto desta época industrializada, vem fazendo crescer significa-
tivamente os ı́ndices de sobrepeso e obesidade na população infantil, o que
é demonstrado por vários estudos (Biscegli et al., 2007; Salomons et al.,
2007; Berleze et al., 2007).
Assim como a desnutrição (Guardiola et al., 2001), a obesidade (Conti
et al., 2005) também pode acarretar problemas no desenvolvimento e cres-
cimento das crianças. Por isto, além de observar o DNPM de crianças de
2 a 6 anos, e os principais déficits apresentados em cada idade, este estudo
também buscou verificar a presença de alterações nutricionais nos escolares
e relacionar o estado nutricional com o DNPM.

2. Fundamentação Teórica
2.1 Desenvolvimento neuropsicomotor
Segundo Burns & MacDonald (1999), o desenvolvimento é um processo de
mudanças complexas e interligadas das quais participam todos os aspectos
de crescimento e maturação dos aparelhos e sistemas do organismo. O
Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil 271

desenvolvimento, de acordo com Souza et al. (2008), não pode ser aferido
com precisão, pois seu entendimento e definição dependem do referencial
teórico que se queira adotar e dos aspectos que se quer abordar.
Para Morais et al. (2005), a aquisição de novas habilidades está dire-
tamente relacionada não apenas à faixa etária da criança, mas também às
interações vividas com outros seres humanos do seu grupo social. Miranda
et al. (2003) citam um conceito mais amplo, que diz que o desenvolvimento
infantil é um processo que se inicia desde a vida intrauterina e envolve
vários aspectos, como o crescimento fı́sico, a maturação neurológica e a
construção de habilidades relacionadas ao comportamento, às esferas cog-
nitiva, social e afetiva da criança.
Os primeiros observadores da motricidade infantil registraram cada um
dos progressos verificados no desenvolvimento de lactentes e crianças, des-
crevendo as suas atividades e registrando a idade de inı́cio de determinadas
formas de comportamento (Shepherd, 1996). A criança é um ser dinâmico,
complexo, em constante transformação, que apresenta uma sequência pre-
visı́vel e regular de crescimento fı́sico e de DNPM. De acordo com Coitinho
et al. (2002), este desenvolvimento sofre a influência contı́nua de fatores
intrı́nsecos e extrı́nsecos que provocam variações de um indivı́duo para ou-
tro e que tornam único o curso do desenvolvimento de cada criança. Para
o autor, os fatores intrı́nsecos são aqueles que determinam caracterı́sticas
fı́sicas e outros atributos geneticamente determinados, e os extrı́nsecos são
todos os fatores que influenciam o desenvolvimento desde a vida intraute-
rina como condições de saúde, nutrição e bem estar emocional da mãe, até
a vida pós-natal, que compreende estı́mulos que a criança recebe.
Para Flehmig (2000), o desenvolvimento ocorre por uma adaptação a
estı́mulos externos, sendo que o organismo e o meio ambiente são depen-
dentes um do outro neste processo. Todos os aspectos que fazem parte da
vida da criança, desde os cuidados e carinho dos pais para com ela, alimen-
tação e estı́mulos, fazem parte também do processo de maturação desta,
levando-a da dependência à independência.

2.2 Protocolos de avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor


Os testes de avaliação do desenvolvimento motor segundo Tecklin (2002) e
Shepherd (1996), utilizam critérios de seleção variados, como a idade da cri-
ança e a área a ser avaliada (força muscular, motricidade fina, motricidade
ampla, fala, ou avaliação abrangente das capacidades funcionais) e permi-
tem a verificação de possı́veis atrasos no desenvolvimento e o planejamento
de ações que possam minimizar os efeitos destes atrasos.
Existem vários estudos trazendo diferentes protocolos que podem vir
a ser utilizados para avaliar o DNPM infantil. Dentre eles pode-se citar a
Escala de Desenvolvimento Motor (EDM) proposta por Rosa Neto (2002),
a Escala Motora Infantil de Alberta (AIMS), o Teste de Triagem de Denver
(DDST), o Pediatric Evaluation of Disability Inventory (PEDI), o Exame
272 Hack et al.

Neurológico Evolutivo (ENE) do protocolo de Avaliação Neurológica In-


fantil de Coelho (1999), utilizado no presente estudo.
A EDM proposta por Rosa Neto (2002) compreende um conjunto de
diversas provas de dificuldade graduada que permite avaliar o nı́vel de de-
senvolvimento motor da criança de acordo com a idade cronológica entre 2 a
11 anos de idade. Esta escala avalia a motricidade fina, motricidade global,
equilı́brio, esquema corporal, organização espacial, organização temporal e
a lateralidade.
A AIMS é uma escala canadense e, segundo Manacero & Nunes (2008),
é composta por testes predominantemente observacionais e incorpora o
conceito neuromaturacional e a teoria dos sistemas dinâmicos, além de ser
usada para medir a maturação motora ampla desde o nascimento até os 18
meses de idade. Consiste de 58 itens organizados em quatro posturas: 21
itens são avaliados com a criança em prono, 9 em supino, 12 sentado e 16
em pé. Ao término da avaliação, é creditado um escore total (0-60 pontos),
que é convertido em percentis, variando de 5 a 90%.
Para Saccani et al. (2007) e Sabatés & Mendes (2007), o Teste de
Triagem de Denver (DDST) como o nome indica, é um teste para triagem
e não para diagnóstico de anormalidades de desenvolvimento. Pode ser
aplicado em crianças de 15 dias a 6 anos de idade. O teste é composto por
125 itens que são divididos em quatro domı́nios:
1. Pessoal-Social, que avalia os aspectos da socialização da criança den-
tro e fora do ambiente familiar;
2. Linguagem, que avalia a produção de som, capacidade de reconhecer,
entender e usar a linguagem;
3. Motricidade Fina Adaptativa, que avalia a coordenação olho mão e
manipulação de pequenos objetos;
4. Motricidade Ampla, que avalia o controle motor corporal, sentar,
caminhar, pular e todos os demais movimentos realizados pela mus-
culatura ampla.
De acordo com Mancini et al. (2003), o teste PEDI é um instrumento
padronizado norte-americano que documenta de forma quantitativa a ca-
pacidade funcional da criança (habilidades) e a independência para realizar
atividades de auto-cuidado, mobilidade e função social. O teste é realizado
com crianças na faixa etária dos 6 meses aos 7 anos e meio.
Ainda Mancini et al. (2003)dizem que o teste PEDI é administrado
através de entrevista estruturada com o cuidador da criança, com duração
de 50 a 60 minutos. O teste é constituı́do de três partes. A primeira parte
avalia as habilidades funcionais da criança para desempenhar atividades
nas áreas de auto-cuidado, mobilidade e função social. A segunda parte do
teste avalia a independência da criança para realizar tarefas funcionais nas
mesmas três áreas e a terceira parte do teste informa sobre as modificações
Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil 273

necessárias para o desempenho das tarefas funcionais nas mesmas três áreas
descritas anteriormente.
Dentre as avaliações padronizadas que avaliam o pré-escolar e o es-
colar (3 a 7 anos), pode-se ainda citar o ENE desenvolvido por Lefèvre
(1972) e padronizado em crianças brasileiras. O ENE foi padronizado no
Brasil por Coelho (1999) e se constitui num conjunto de 124 provas que
são divididas em blocos que compõe os exames da fala, do equilı́brio está-
tico, do equilı́brio dinâmico, da coordenação apendicular, da coordenação
tronco-membro, das sincinesias, da persistência motora, do tono muscular
e da sensibilidade. Em cada exame as provas são distribuı́das desde as de
mais fácil execução às mais difı́ceis, sendo divididas em grupo por idade,
subentendendo-se que a criança aos sete anos seja capaz de realizar todas
as provas selecionadas. A avaliação é realizada individualmente e a criança
recebe os escores: “passou” quando conseguiu realizar o que foi solicitado
ou “falhou”, quando não foi capaz de realizar a solicitação.
O protocolo utilizado na presente pesquisa, desenvolvido por Coelho
(1999), contém provas para crianças na faixa entre 0 e 12 meses e também
para crianças entre 15 meses a 7 anos de idade. Este último é composto por
provas para exame da fala, do equilı́brio estático, do equilı́brio dinâmico, da
coordenação apendicular, da coordenação tronco-membros, da persistência
motora e da sensibilidade. Segundo Coelho (1999), não estão incluı́dos
testes para o exame de tônus muscular, pois este é feito indiretamente,
já que o desempenho na realização das provas requer um bom equilı́brio
sinérgico, o que não acontece quando a criança apresenta alguma alteração
patológica do tônus muscular.

2.3 Aspectos que influenciam no desenvolvimento neuropsicomotor


Existem vários aspectos que podem influenciar ou afetar o desenvolvimento
das crianças, os quais, de acordo com Coitinho et al. (2002), podem ser
intrı́nsecos (genéticos) ou extrı́nsecos (ambientais). Podem ainda ser clas-
sificados em fatores de risco pré-natais, peri-natais e pós-natais. Exemplos
de fatores de risco pré-natais são as infecções congênitas (toxoplasmose,
rubéola, sı́filis, citomegalovı́rus, imunodeficiência adquirida (AIDS) e ou-
tras); retardo de crescimento intrauterino (RCIU), provocado por doenças
maternas, como hipertensão, doenças renais, drogadição, incluindo o uso
de álcool e cigarro; doenças hereditárias; malformações; irradiações e into-
xicações.
Os fatores de risco peri-natais, para a autora, são o sofrimento fetal
– Apgar menor que 5 e 6; hiperbilirrubinemia; prematuridade; baixo peso
ao nascer; dificuldade respiratória grave; distúrbios metabólicos de difı́cil
controle, como no caso de filhos de mães diabéticas; infecção peri-natal
grave (meningite e sepsis); traumas intencionais e não intencionais (aci-
dentes). E os fatores de risco pós-natais que são convulsões neonatais;
infecções agudas graves (meningite, encefalite, pneumonias, entre outros);
274 Hack et al.

infecções crônicas como otites; desidratação e traumas intencionais e não


intencionais (acidentes).
Lima (2000) diz que existe uma interação importante entre o cresci-
mento e o desenvolvimento, sendo que um determinado aspecto do cresci-
mento pode ser necessário para que uma fase do desenvolvimento aconteça
e vice-versa. Shepherd (1996) garante que o modo como a criança é criada
desde o nascimento influencia sobre a velocidade do desenvolvimento mo-
tor, especialmente nos primeiros 12 a 18 meses de vida. Rae-Grant et al.
citados por Pilz & Shermann (2007) afirmam que um problema de ordem
biológica pode ser agravado por um ambiente não-estimulante ou reduzido
por um ambiente rico em estı́mulos.
Whaley & Wong (1989) declaram ser impossı́vel a discussão de todos
os aspectos que influenciam o desenvolvimento infantil, já que as crianças
estão engajadas em uma série contı́nua de constantes mudanças de intera-
ções ambientais e interpessoais. Para Lima (2000), quem lida com crianças
tem que ter compreensão de que, pela alta complexidade dos fenômenos
envolvidos e sua ı́ntima dependência de fatores inerentes ao organismo da
criança os quais, por sua vez, são frequentemente afetados pelo meio am-
biente, as causas de atraso do crescimento ou desenvolvimento podem ser
múltiplas.

2.4 Estado nutricional


O estado nutricional de uma população é um dos principais indicadores
de sua qualidade de vida. Para Sigulem et al. (2000) a avaliação do es-
tado nutricional tem por objetivo verificar o crescimento e as proporções
corporais em um indivı́duo ou em uma comunidade, visando a estabelecer
atitudes de intervenção. De acordo com Guardiola et al. (2001), o estado
nutricional de uma criança depende de fatores como peso ao nascimento,
episódios de infecção, internações hospitalares, espaçamento intergestaci-
onal, disponibilidade adequada de alimentos em qualidade e quantidade,
idade da mãe, escolaridade e ocupação dos pais e condições de moradia.
O monitoramento do estado nutricional, de acordo com Silva et al.
(2003), deve ser feito em todas as faixas etárias, mas principalmente na
infância e na adolescência. Sua importância nestes perı́odos de vida advém
do acompanhamento do processo de crescimento e desenvolvimento, aten-
tando precocemente para possı́veis agravos à saúde e riscos de morbimorta-
lidade, especialmente com a crescente prevalência de sobrepeso/obesidade
no Brasil e no mundo.
Segundo autores como Bueno & Fisberg (2006), Silva et al. (2003), entre
outros, existem diversos métodos para avaliar o estado nutricional infan-
til, não havendo um consenso sobre qual é mais fidedigno, sendo que, os
mais utilizados são os recomendados pela Organização Mundial da Saúde
(OMS), pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC) e pelo
Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil 275

International Obesity Task Force (IOTF), diferenciando-se no ı́ndice, po-


pulação e/ou concepção.

2.4.1 Interferência do estado nutricional na aptidão física e desenvol-


vimento
Meredith et al. citados por Gallahue & Ozmun (2003) comentam que o
estado nutricional pode inibir ou melhorar o nı́vel de funcionamento fı́sico
de um indivı́duo. Para Conti et al. (2005), uma consequência da obesi-
dade que está fortemente relacionada ao desenvolvimento psicomotor, diz
respeito aos transtornos no esquema corporal, que são caracterizados por
distúrbios no reconhecimento das medidas e funções corporais. Assim, uma
caracterı́stica importante em obesos é, geralmente, a depreciação da pró-
pria imagem fı́sica, demarcada pela insegurança em relação aos outros.
Segundo Bouchard (2003), o sobrepeso e a obesidade na infância têm
sido relacionados com diversos fatores de risco como as doenças cardiovas-
culares, hipertensão, diabetes, menor concentração plasmática de colesterol
de alta densidade (HDL), distúrbios psicológicos, doenças renais, apople-
xia, males hepáticos e ainda dificuldades motoras.
De acordo com Bracco et al. (2002) e Berleze et al. (2007) as crianças
obesas demonstram capacidade cardiorrespiratóia inferior, além de maior
gasto energético no decorrer das atividades, pois despendem maiores esfor-
ços para a mesma intensidade de atividade fı́sica, e baixo nı́vel de aptidão
fı́sica, quando comparadas às crianças eutróficas.

3. Metodologia
Foi realizado um estudo do tipo observacional transversal com crianças de
2 a 6 anos regularmente matriculadas em Escolas Municipais de Educação
Infantil (EMEI) de Ijuı́, RS no ano de 2009. Foram selecionadas através
de sorteio duas escolas com disponibilidade para a avaliação do desenvolvi-
mento e dados nutricionais atualizados. Foram incluı́das todas as crianças
na faixa etária estipulada cujos pais assinaram o termo de consentimento,
totalizando uma amostra de 137 crianças, sendo 67 da escola A e 70 da
escola B. Foram excluı́das da pesquisa, crianças com história de qualquer
patologia que pudesse causar atrasos no desenvolvimento. Foram coleta-
dos dados referentes à idade, sexo, altura, peso, dados nutricionais e do
desenvolvimento motor.
O DNPM das crianças foi avaliado e comparado através dos testes
previstos no exame neurológico evolutivo (ENE) (Coelho, 1999), o qual
avalia fala, equilı́brio estático, equilı́brio dinâmico, coordenação apendi-
cular, coordenação tronco-membros, persistência motora, sensibilidade e
lateralidade da criança de acordo com a faixa etária (Anexo 1).
O estado nutricional das crianças foi determinado pelo Índice de Massa
Corporal (IMC) utilizando as tabelas de escore-Z da Organização Mundial
276 Hack et al.

da Saúde (Organização Mundial da Saúde, 1995; de Onis et al., 2007) e


os pontos de corte referidos nas Orientações para a coleta e análise de
dados antropométricos em serviços de saúde – Norma Técnica do SISVAN
(Ministério da Saúde – SISVAN, 2008).
Os dados coletados foram formatados através do programa SPSS,
atribuindo-se 1 ponto para o padrão presente e 0 ponto para o ausente
na avaliação do DNPM. Após, os dados obtidos foram analisados através
dos cálculos de média, desvio padrão e percentagem. Para correlacionarem
variáveis como status nutricional e DNPM foi utilizado o coeficiente de
correlação de Pearson.
O estudo foi projetado de acordo com a resolução no 196/96 que regu-
lamenta as pesquisas envolvendo seres humanos e foi submetido e aprovado
sob o protocolo no 112/2009 pelo Comitê de Ética da Universidade Regio-
nal do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ.

4. Resultados
Das 137 crianças que participaram do estudo, 77 (56,20%) eram do sexo
feminino e 60 (43,80%) do sexo masculino. Das 67 crianças da escola A,
38 (56,72%) eram meninas e 29 (43,28%) eram meninos. Na escola B, do
total de 70 crianças, 39 (55,71%) eram meninas e 31 (44,29%) meninos.
Observando-se a Tabela 1, pode-se notar que o desempenho das crianças
nas diferentes idades foi semelhante e adequado para a idade, em média
ocorreram 91% de acertos dos testes. Merecem destaque as crianças na
idade de 2 anos, que alcançaram o melhor desempenho, obtendo em média
98% de acertos.
Considerando o número de crianças que não conseguiram executar cada
teste da avaliação do DNPM foi possı́vel perceber os principais déficits
apresentados pelas crianças em cada idade. Aos 2 anos o teste que obteve
menor número de acertos foi a fala (frase agramatical), que foi realizado
com sucesso por 12 (86%) das 14 crianças avaliadas, aos 3 anos construir

Tabela 1. Desempenho por idade na avaliação do DNPM das crianças de 2


a 6 anos matriculadas em duas escolas municipais de educação infantil de
Ijuı́, RS.
Idade No de No total Média de % de
(anos) crianças de testes acertos acertos
2 14 9 8,79 ± 0,07 98
3 20 13 11,50 ± 0,26 88
4 28 15 13,86 ± 0,18 92
5 43 17 15,47 ± 0,21 91
6 32 10 8,66 ± 0,26 87
Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil 277

torres com 9 cubos ou mais foi o teste de maior dificuldade e foi realizado
por 15 (75%) das 20 crianças avaliadas, aos 4 anos 22 crianças (79%) sou-
beram conhecer cores como o branco e o preto, aos 5 anos denominar todas
as cores foi conseguido com êxito por apenas 30 crianças (70%) das 43 ava-
liadas nesta faixa de idade e aos 6 anos a maior dificuldade se mostrou
no reconhecimento dos lados direito e esquerdo, o que somente 20 crianças
(63%) conseguiram fazer.
Os testes propostos pelo ENE (Coelho, 1999) são divididos em habili-
dades: fala, equilı́brio estático e dinâmico, coordenação apendicular e de
tronco-membros, persistência motora e sensibilidade. Conforme observado
na Tabela 1, algumas crianças não conseguiram realizar 100% dos testes,
comprometendo algumas habilidades.
Na idade de 2 anos, somente 2% das crianças não realizaram todos os
testes, aos 3 anos, a percentagem de crianças que não realizaram todos os
testes aumentou para 12% e aos 4 anos, 8% das crianças não realizaram
todos os testes, sendo que nestas três faixas etárias a fala foi a habilidade
mais comprometida (Tabela 2). Na idade dos 5 anos, 9% das crianças
não completaram todas as provas correspondentes a sua faixa etária e a
habilidade mais comprometida foi a sensibilidade. Por fim, aos 6 anos, a
habilidade mais comprometida foi a coordenação tronco-membros e nesta
faixa etária a percentagem de crianças que não realizaram todas as provas
foi de 13%
O estado nutricional foi classificado como baixo IMC para a idade,
normal ou eutrófico, sobrepeso e obesidade, onde se pode observar grande
prevalência de sobrepeso e obesidade, totalizando 30,66% das crianças (Ta-

Tabela 2. Desempenho das crianças de 2 a 6 anos matriculadas em duas


escolas municipais de educação infantil de Ijuı́, RS, conforme habilidades
por idade.
2 anos 3 anos 4 anos 5 anos 6 anos
Habilidades
No (%) No (%) No (%) No (%) No (%)
Fala 1(86) 2(78) 1(89) 1(95) 1(94)
Eq. estático 1(100) 1(95) 1(96) 1(91) 1(94)
Eq. dinâmico 5(99) 5(92) 2(93) 7(93) 2(97)
CA 1(100) 5(88) 5(91) 6(90) 3(92)
PM — — 3(96) 1(95) —
Sensibilidade — — 3(91) 1(70) 2(72)
CTM — — — — 1(66)
No : número de total de testes por habilidade; %: percentual de acertos
realizados por habilidade; —: indica que não possui o teste nesta faixa etária;
Eq: equilı́brio; CA: coordenação apendicular; PM: Persistência motora; CTM:
Coordenação Tronco-membros
278 Hack et al.

Tabela 3. Percentual de acertos nos testes e distribuição das crianças de 2


a 6 anos matriculadas em duas escolas municipais de educação infantil de
Ijuı́, RS, de acordo com o estado nutricional.
Estado nutricional No crianças % de crianças % DNPM
Baixo IMC 1 0,73 100
Eutrófico 93 68,61 92
Sobrepeso 28 20,44 89
Obeso 15 10,22 77

bela 3). Por outro lado, das 137 crianças avaliadas, apenas uma foi classifi-
cada como IMC baixo para idade. Quando relacionamos o estado nutricio-
nal com a faixa etária, notamos que em todas as idades houve predomı́nio
do estado nutricional eutrófico. O sobrepeso esteve presente em maior
quantidade na faixa de 5 e 6 anos e a obesidade aos 3 anos (Tabela 4).
A distribuição do estado nutricional por sexo mostrou que o sobrepeso
prevaleceu nas crianças do gênero feminino correspondendo a 17 (60,71%) e
a obesidade esteve presente em maior escala nos meninos, correspondendo
a 14 crianças (57,14%). O baixo IMC esteve presente somente em 1 criança
e esta era do gênero masculino.
Com o objetivo de verificar se existe alguma relação entre o desem-
penho motor e o status nutricional das crianças avaliadas, foi realizado o
teste de correlação de Pearson. A análise estatı́stica demonstrou que a
obesidade está relacionada negativamente com o desempenho motor (r =
-0,94), ou seja, quanto mais obesa, pior o desempenho motor. Esta corre-
lação somente foi feita entre crianças eutróficas e acima do peso ideal, pois,
conforme citado anteriormente, somente uma criança foi classificada como
estando abaixo do peso ou com baixo IMC.

Tabela 4. Distribuição do estado nutricional por idade das crianças de 2 a


6 anos matriculadas em duas escolas municipais de educação infantil de
Ijuı́, RS.
Idade Baixo IMC Eutrófico Sobrepeso Obeso
(anos) No (%) No (%) No (%) No (%)
2 0 (0) 7 (50) 4 (28) 3 (22)
3 0 (0) 10 (10,64) 5 (17,85) 5 (35,71)
4 0 (0) 23 (24,47) 4 (14,29) 1 (7,14)
5 0 (0) 33 (35,11) 8 (28,57) 2 (14,29)
6 1 (100) 21 (22,34) 7 (25) 3 (21,43)
Total 1 (100) 94 (100) 28 (100) 14 (100)
Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil 279

5. Discussão e Conclusões
O presente estudo avaliou 137 crianças de 2 a 6 anos de idade quanto ao seu
desenvolvimento neuropsicomotor e seu estado nutricional e demonstrou
que em geral as crianças avaliadas obtiveram um bom desempenho nos
testes executados em cada idade, apresentando um DNPM considerado
normal. Estes resultados estão de acordo com os encontrados por Zilke
et al. (2009) que utilizaram o mesmo protocolo deste estudo, assim como
por Souza et al. (2008) e Biscegli et al. (2007) que avaliaram através do
protocolo de Denver II, Guardiola et al. (2001) que utilizaram o Exame
Neurológico Evolutivo (ENE) e Caetano et al. (2005) que avaliaram pela
EDM. Por outro lado, Halpern et al. (1996) e Saccani et al. (2007) através
do protocolo de Denver verificaram um atraso de DNPM.
Porém, nem todas as crianças conseguiram completar com destreza
todos os testes propostos neste estudo, sendo possı́vel observar que algu-
mas habilidades apresentaram-se mais comprometidas, tais como a fala,
a coordenação tronco-membros e a sensibilidade. O estudo de Guardiola
et al. (2001) que avaliaram crianças da 1a série do ensino fundamental
em Porto Alegre, utilizando como protocolo o ENE também encontraram
desempenho normal na maioria das crianças, mas destacaram como prin-
cipais déficits as habilidades de sensibilidade e coordenação apendicular.
Outros estudos envolvendo crianças menores de 6 anos de idade, como o de
Biscegli et al. (2007) e Saccani et al. (2007) utilizando o protocolo de Den-
ver, também detectaram suspeitas de atrasos em algumas crianças, sendo
a linguagem a área mais acometida.
Para Cury & Magalhães (2006) o equilı́brio estático e dinâmico são
fundamentais para a aquisição e manutenção da postura ortostática e para
a realização de várias tarefas do dia-a-dia, incluindo a deambulação. No
presente estudo, tais habilidades mostraram-se bem desenvolvidas em todas
as idades avaliadas. Porém, Caetano et al. (2005) que avaliaram 35 crianças
entre 3 e 7 anos de idade em uma escola particular de Rio Claro, SP,
encontraram dificuldades na realização dos testes de equilı́brio entre as
crianças de 5 e 6 anos, afirmando que nesta faixa etária as crianças passam
por uma fase de instabilidades no desempenho de tarefas de equilı́brio, o
que não pôde ser observado na presente pesquisa.
Neste estudo a coordenação apendicular foi avaliada através de testes
especı́ficos para cada idade como, rabiscar uma folha de papel, copiar um
traço reto ou uma cruz, construir torres com cubos de madeira, virar as
páginas de um livro, entre outros, sendo que as crianças desta pesquisa
conseguiram realizar com sucesso a maior parte destes testes (88 a 100%).
Porém, na pesquisa de Bobbio (2006) que avaliou somente a habilidade da
coordenação apendicular de crianças de primeira série do ensino fundamen-
tal em escolas públicas e particulares por meio do ENE, encontrou 73,3%
das crianças da escola pública com esta habilidade inadequada, contra ape-
280 Hack et al.

nas 22,5% na escola particular. Segundo esta mesma autora, a coordenação


apendicular é uma etapa importante do desenvolvimento, sendo primordial
para realizar movimentos de pinça e oponência do polegar, indispensáveis
para a escrita.
Os estudos que verificaram o DNPM adequado foram realizados com
crianças entre uma faixa que variou entre 2 e 7 anos de idade (Guardiola
et al., 2001; Souza et al., 2008; Zilke et al., 2009; Caetano et al., 2005), com
exceção de Biscegli et al. (2007) que avaliou crianças entre 6 meses e 6 anos.
Já Halpern et al. (1996), que verificaram um atraso de DNPM, estudaram
somente crianças menores, ou seja, de 12 meses e Saccani et al. (2007) que
verificaram o mesmo resultado incluı́ram crianças de 1 a 6 anos. Halpern
et al. (1996) e Saccani et al. (2007) citaram como possı́veis explicações
para os atrasos encontrados em seus estudos, o fato de que fatores biológi-
cos, assim como condições ambientais e socioeconômicas podem determinar
atraso no DNPM.
O estado nutricional neste estudo que avaliou crianças de escolas mu-
nicipais de educação infantil, mostrou porcentagem significativamente alta
de crianças acima do peso ideal (30,66%), corroborando com outros autores
(Biscegli et al., 2007; Tolocka et al., 2008) que também avaliaram crianças
de escolas municipais, assim como Silva et al. (2003), Vieira et al. (2005)
que estudaram crianças de escolas particulares e também apresentaram
aumento da obesidade e sobrepeso em relação à desnutrição.
Tolocka et al. (2008) avaliaram o estado nutricional de crianças entre 2
e 6 anos em Piracicaba, SP, e assim como no presente estudo, observaram
que a maioria das crianças estava dentro dos ı́ndices considerados normais.
Porém, também encontraram alto número de crianças acima do peso (23%
das meninas e 25% dos meninos). Silva et al. (2003) realizaram um es-
tudo com crianças da educação infantil de duas pré-escolas particulares
de Recife, PE, utilizando os critérios da Organização Mundial de Saúde
(OMS), e observaram que os ı́ndices de obesidade e de sobrepeso foram,
respectivamente, 11,3% e 22,6%, o que também considerado alto. Vieira
et al. (2005) avaliaram 121 crianças de 8 a 10 anos de uma escola particu-
lar de Maringá, PR, considerando o IMC para a classificação nutricional
e, assim como no presente estudo, encontraram também um alto ı́ndice de
sobrepeso (20,66%) e obesidade (18,18%) nas crianças avaliadas. Por outro
lado, Corso et al. (2003) avaliaram o estado nutricional de 3806 crianças
entre 0 e 6 anos que chegavam às Unidades de Saúde de Florianópolis, SC,
e observaram ı́ndices mais baixos de sobrepeso (6,8%). Porém, ainda assim
este ı́ndice se mostrou maior que os ı́ndices de desnutrição (1,9%) daquela
população.
No presente estudo houve uma maior proporção de sobrepeso em me-
ninas e de obesidade em meninos. Estes dados discordam de autores como
Abrantes et al. (2002), Terres et al. (2006), Triches & Giugliani (2005),
Giugliano & Carneiro (2004) e Leite et al. (2008) que encontraram maior
Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil 281

número de meninos com sobrepeso e número semelhante de crianças obe-


sas entre ambos os sexos. No Brasil, segundo a Pesquisa de Orçamentos
Familiares, nos últimos 30 anos a prevalência de adolescentes com baixo
peso diminuiu 68% nos meninos e 70% nas meninas e o excesso de peso au-
mentou 359% no sexo masculino e 105% no feminino (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatı́stica – IBGE, 2008). Isto pode ser em decorrência do
aumento no sedentária infantil. Antigamente as brincadeiras das crianças
envolviam atividade fı́sica, como correr, pular e jogos. Atualmente as crian-
ças passam um grande perı́odo de tempo assistindo televisão ou em frente
ao computador, até mesmo por questões de segurança que fazem com que
as crianças fiquem restritas a espaços menores. Estes fatores não foram
avaliados na população estudada, mas são confirmados por Berleze et al.
(2007). Estes autores descrevem que desde a década de 70, a obesidade
vem aumentando nos paı́ses em desenvolvimento, decorrente da mudança
nos hábitos alimentares e do estilo de vida sedentário. A obesidade reflete
ainda negativamente nos nı́veis de aptidão fı́sica e na saúde. Além disto,
segundo Abrantes et al. (2002) pessoas obesas, particularmente crianças
e adolescentes, frequentemente apresentam baixa auto-estima, afetando o
desempenho escolar e os relacionamentos. Esta mudança no perfil nutrici-
onal, segundo Biscegli et al. (2007) já é motivo de preocupação a nı́vel de
saúde pública, já que a obesidade é fator de risco para inúmeras doenças
como diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, doenças cardiovas-
culares, além de distúrbios psicológicos e sociais (Guedes et al., 2006).
No presente estudo foi possı́vel verificar que existe associação entre o
nı́vel do desenvolvimento neuropsicomotor e o sobrepeso e obesidade. Ana-
lisando os resultados obtidos percebeu-se que quanto mais acima do peso
a criança estava, pior foi seu desempenho nos testes executados, estabele-
cendo uma relação inversa. Berleze et al. (2007) também compararam o
desempenho motor e o estado nutricional em 424 crianças entre 6 e 8 anos
de idade e seus resultados mostraram que as crianças obesas apresentaram
desvantagem em seu estágio de maturidade motora em relação as eutrófi-
cas. Já Biscegli et al. (2007) avaliaram 113 crianças entre 6 e 70 meses, que
frequentavam uma creche em Catanduva, SP, através do protocolo de Den-
ver e de medidas como peso e estatura. Eles não encontraram diferenças
estatisticamente significativas na prevalência de casos suspeitos de atraso
motor entre a população eutrófica, com desnutrição e com obesidade.
Portanto, neste estudo, o desempenho das crianças foi semelhante e
adequado de acordo com a idade cronológica. Merecem destaque as crian-
ças na idade de 2 anos, que alcançaram o melhor desempenho, obtendo em
média 98% de acertos. O estado nutricional eutrófico predominou em todas
as faixas etárias. Porém, houve uma percentagem relativamente alta de so-
brepeso e obesidade (30,66%), sendo que somente uma criança apresentou
baixo IMC para a idade.
282 Hack et al.

No presente estudo, a relação entre o DNPM e o estado nutricional


infantil mostrou que quanto maior a classificação nutricional em que a cri-
ança se encontra, pior é seu desempenho motor. Portanto, o DNPM das
crianças está adequado para a idade cronológica de acordo com os testes
do ENE (Coelho, 1999). Porém, as crianças que apresentaram um estado
nutricional acima do esperado tiveram um desempenho pior nos testes em
relação àquelas que se apresentaram dentro do estado nutricional eutrófico.
A investigação do desenvolvimento da criança e a identificação de proble-
mas relacionados a este processo, especialmente a monitoração do estado
nutricional, possibilitam a intervenção precoce em atrasos evolutivos e a
implementação de programas de estimulação para crianças com distúrbios
de desenvolvimento ou em risco para tal.

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Notas Biográficas

Fernanda Hack é Fisioterapeuta (UNIJUÍ, 2010).

Elenita Costa Beber Bonamigo é Fisioterapeuta (UFSM, 1989) e Mestre


em Ciências do Movimento Humano (UDESC, 2002). Atualmente é docente do
Departamento de Ciências da Vida da Universidade Regional do Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ.

Eliane Roseli Winkelmann é Fisioterapeuta (UNICRUZ, 2000), Mestre


em Ciências Biológicas (UFRGS, 2003) e Doutora em Ciências da Saúde
(UFRGS, 2008). Atualmente é docente do Departamento de Ciências da Vida
da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ.
Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil 287

Anexo 1: Instrumento de avaliação


Nome: Escola: Data de avaliação:
DN: Idade: Peso: Estatura:
Colocar: 1 ponto para o padrão presente e 0 ponto para o ausente.
2 anos :
1. ( ) fala - frase agramatical
2. ( ) observação da postura ereta
3. ( ) marcha cruzada
4. ( ) andar para frente puxando carrinho
5. ( ) subir e descer escada com apoio
6. ( ) correr livremente
7. ( ) senta-se em cadeira sem olhar para trás
8. ( ) construir uma torre de 5 cubos ou mais
9. ( ) rabiscar uma folha de papel. Obs.:
3 anos:
1. ( ) fala - supera anteriores: dislalia por troca e supressão
2. ( ) Romberg (olhos abertos) 30'
3. ( ) andar em linha reta 5m (anotar desvios)
4. ( ) andar para trás puxando carrinho 5m
5. ( ) subir e descer escada com apoio
6. ( ) correr contornando obstáculo
7. ( ) apanhar objeto do chão sem outra mão
8. ( ) construir torre com 9 cubos ou mais
9. ( ) copiar traço vertical
10. ( ) jogar bola para cima na direção examinador
11. ( ) index-nariz com olhos abertos
12. ( ) chutar 1 bola (anotar o pé direita ou esquerda). Obs.:
4 anos:
1. ( ) fala - supera todas etapas
2. ( ) Romberg (olhos fechados) 30'
3. ( ) andar na ponta dos pés 5m
4. ( ) subir/descer escada sem apoio alternando os pés
5. ( ) virar páginas de livro corretamente
6. ( ) copiar uma cruz
7. ( ) índex-nariz com olhos fechados
8. ( ) bolinha de papel com mão dominante
9. ( ) enrolar o fio no carretel
10. ( ) Na posição parada em pé: manter olhos fechados 20 segundos
11.( ) manter boca aberta 40segundos
12.( )manter boca aberta 40 segundos
13.( ) língua protusa com olhos abertos 40 segundos
14.( ) reconhece posições segmentares
15.( ) conhece cores preto e branco
16. Lateralidade direita: ( ) mão ( ) olho ( )ouvido ( ) pé
17. Lateralidade esquerda: ( ) mão ( ) olho ( ) ouvido ( ) pé
5 anos:
1. ( ) fala - superada etapas
2. ( ) ponta de um pé encosta calcanhar do outro pé com olhos abertos
3. ( ) andar para frente colocando calcanhar de um pé encostando ponta de outro (2m
4. ( ) saltar corda 30 cm de altura correndo
5. ( ) saltar corda 30 cm estando parado com os pés juntos
6. ( ) saltar girando sobre si mesmo
7. ( ) pular 5m com os 2 pés juntos
8. ( ) pular 5m com 1 pé só (qual?)
9. ( ) saltar para um lado - parar depois
10. ( )copiar um círculo
11. ( ) copiar um quadrado
12. ( ) jogar bola ao alvo 2m de distância
13. ( ) sentado bater pés alternando
14. ( ) tocar com a ponta do polegar todos dedos
15. ( ) abrir 1 mão e fechar outra alternadamente
16. ( ) língua protusa com olhos fechados 40 segundos
17. ( ) denominar todas as cores
18. Lateralidade direita: ( ) mão ( ) olho ( ) ouvido ( ) pé ( )
19. Lateralidade esquerda: ( ) mão ( ) olho ( ) ouvido ( ) pé
288 Hack et al.

6 anos
1. ( ) fala - supera etapas
2. ( ) em pé apoio plantar ponta de um pé encosta calcanhar outro
3. ( ) andar para trás colocando o calcanhar de 1 pé na ponta do outro 2m
4. ( ) 5 m pulando num pé só (pé no dominante)
5. ( ) braços estendidos para os lados descreve círculos c indicadores
6. ( ) andar e enrolar linha do carretel no indicador (mão dominante)
7. ( ) bater indicador direito na mesa e pé direita no chão ao mesmo tempo
8. ( ) alternando com esquerda
9. De pé: ( ) examinar força do tronco para trás e observa o joelho
10. ( ) reconhecimento dos dedos
11. ( ) reconhecimento de direita/esquerda: ( ) lateralidade direita ( ) esquerda.
Obs.:
Capítulo 16

Acessibilidade de Crianças Portadoras de Necessidades


Especiais em Escolas

Silvia Regina Matos da Silva Boschi∗,


Tereza Cristina Carbonari de Faria, Jéssica dos Santos Tolentino,
Wellington Yoshihide Harada, Cecília Augusto Ribeiro

Resumo: O objetivo desta pesquisa foi verificar a acessibilidade


de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas da rede
pública do Alto Tietê. Foram analisadas 26 escolas de ensino fun-
damental e médio, onde se avaliou piso, escadas, rampas de acesso,
portas, corredores, banheiros, carteira de sala de aula, local para
alimentação e bebedouro. Os dados obtidos foram comparados com
a norma NBR-9050, e demonstraram que apenas uma escola, que
foi projetada e construı́da para acessibilidade, estava totalmente de
acordo com a norma. Conclui-se que os projetos das escolas estu-
dadas estão em desacordo com a ABNT NBR 9050:2004.

Palavras-chave: Escolas, Acessibilidade, Fisioterapia, Norma


NBR-9050.

Abstract: The objective of this research was to verify the accessibi-


lity of children with special needs in public schools in Alto Tietê. A
total of 26 elementary and secondary schools were analyzed. Items
evaluated included: floor, stairs, stair rail, ramp, doors, corridor,
bathroom, chair of classrooms, feeding place and water fountain.
The data obtained was compared with the NBR-9050 Brazilian stan-
dard. Results showed that only one school, which was projected and
built for accessibility, was totally according to the standard. It is
concluded that the schools analyzed were projected in disagreement
with the standard ABNT NBR 9050:2004.

Keywords: Schools, Accessibility, Physiotherapy, Standard NBR-


9050

∗ Autor para contato: boschi@umc.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


290 Boschi et al.

1. Introdução
Os espaços fı́sicos amplos e seguros são aconselhados para a realização
das atividades com crianças com necessidades especiais como forma de
prevenção de possı́veis acidentes (Diehl, 2006).
Ressalta-se a importância do desenvolvimento de uma polı́tica de edu-
cação inclusiva na escola, que proporcione possibilidades de intervenções
pedagógicas. É fundamental capacitar o corpo docente e a equipe pedagó-
gica para a inclusão de alunos com necessidades especiais no ensino regular.
Além disto, é necessário criar as condições para um espaço acessı́vel e que
não ofereça impedimento à participação em todas as atividades escolares
(Porter & Richler, 1991).
O fisioterapeuta tem o papel de instruir o professor sobre o posiciona-
mento adequado para determinada deficiência fı́sica, assim como orientá-lo
na seleção e uso de equipamentos, mobiliários, dispositivos de suporte e
adaptações. Também cabe ao fisioterapeuta a orientação sobre a facilita-
ção dos padrões posturais, bem como sobre as condições de funcionalidade
do aluno, tanto no ambiente de sala de aula quanto em atividades extra-
classe (Garavelo et al., 2006).
Assim, o objetivo geral deste capı́tulo é analisar a acessibilidade do Por-
tador de Necessidade Especial (PNE) em escolas do ensino fundamental e
médio da rede pública do Alto Tietê, Estado de São Paulo. Como objetivos
especı́ficos verificou-se a incidência de escolas estaduais com acessibilidade
para pessoas portadoras de necessidades especiais dentre as avaliadas e as
principais barreiras arquitetônicas nas escolas.

2. Fundamentação Teórica
2.1 Inclusão escolar e portadores de necessidades especiais
A deficiência fı́sica é a alteração completa ou parcial de um ou mais seg-
mentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função fı́sica.
Ela pode se apresentar sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia,
monoparesia, tetraplegia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, os-
tomia, amputação de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com
deformidade congênita ou adquirida, excetuando-se as deformidades esté-
ticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções
(Secretaria Nacional de Polı́ticas de Turismo, 2006).
Este comprometimento pode ser consequência de fatores traumáticos,
fisiológicos ou genéticos que podem ocorrer de forma congênita ou adquirida
ao longo das diferentes fases do desenvolvimento humano (Diehl, 2006).
As deficiências adquiridas podem ser provocadas por catástrofes naturais,
acidentes diversos, doenças incapacitantes, moléstias cardiovasculares, vio-
lência urbana, subnutrição, guerras, torturas. As deficiências instaladas no
indivı́duo podem ser permanentes ou temporárias (Gabbard, 2008).
Acessibilidade de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas 291

A deficiência congênita é uma condição presente ao nascimento onde a


hereditariedade não pode ser imediatamente excluı́da e não está necessari-
amente causando a anomalia que se apresenta. Pode ser definida, portanto,
como qualquer defeito na constituição de algum órgão ou conjunto de ór-
gãos que determine uma anomalia estrutural presente no nascimento por
causa genética, ambiental ou mista (Gabbard, 2008).
Adquiridas ou congênitas, as deficiências vêm crescendo e as organiza-
ções relacionadas, governamentais ou não-governamentais (ONGs), traba-
lham cada vez mais pela integração daqueles com necessidades especiais à
sociedade e às estratégias de prevenção, reabilitação, formação profissional,
lazer, apoio psicológico, entre outros. Assim, as áreas de saúde, educação,
esporte e cultura vêm se especializando em atividades de inclusão, integra-
ção e apoio ao PNE (Gindis, 1995).
Ao se deparar com um PNE, imagina-se o quanto é difı́cil viver em
locais onde as barreiras arquitetônicas são tantas e impedem o seu acesso
aos espaços sociais ou de trabalho. Esta é uma dificuldade fı́sica e um
obstáculo visı́vel (Costa & Rodrigues, 1999).
A incapacidade existe em função da relação entre o PNE e o seu ambi-
ente. Ela ocorre quando estas pessoas se deparam com barreiras culturais,
fı́sicas ou sociais que impedem o acesso aos diversos sistemas da sociedade
que estão à disposição dos demais cidadãos. Incapacidade é, portanto, a
perda ou a limitação das oportunidades de participar da vida em igualdade
de condições com os demais (Pagliuca et al., 2007).
De acordo com Costa & Oliveira (2006) muitas crianças com deficiência
fı́sica têm capacidade cognitiva semelhante à de colegas e podem realizar
as atividades com bom desempenho, desde que as limitações fı́sicas se-
jam contornadas. A grande limitação é o deslocamento na escola, pois há
dificuldades ou barreiras em relação às edificações. Uma barreira é qual-
quer entrave ou obstáculo que limite ou impeça o acesso, a liberdade de
movimentos, a circulação com segurança e a possibilidade das pessoas se
comunicarem ou terem acesso à informação (Tagliari et al., 2006).
O princı́pio de integração prega a possibilidade e o direito do PNE
viver inserido em sociedade e é um facilitador na medida que repudia qual-
quer forma de excepcionalidade, tanto aquela que segrega mantendo o PNE
longe, quanto aquela que superprotege, considerando o PNE. A integração
impõe a todos o desafio de convı́vio com pessoas “diferentes”, permite cons-
truir mecanismos de igualdade pela educação especial, pela reabilitação,
pelas complementações tecnológicas, pela inserção profissional adequada e
pelo esporte adaptado (Bishop, 1997).
Para caracterizar as estratégias de integração e inclusão escolar é ne-
cessário esclarecer que o conceito de integração social através da escola se
refere a todas as atividades que se desenvolvam no ambiente da escola. Não
somente as atividades em sala de aula, mas também em todas as experiên-
cias que são vivenciadas na situação escolar (Ingram, 1971).
292 Boschi et al.

Para implementar a integração na escola devem ser incluı́das as mais


variadas modalidades de aprendizagem que o ambiente possa oportunizar.
Ajudas técnicas como produtos, instrumentos, equipamentos e tecnologia
adaptados ou especialmente projetados para melhorar a funcionalidade do
PNE ou da pessoa com mobilidade reduzida, favorecem a autonomia pes-
soal, total ou assistida (Heidrich et al., 2006).
A educação inclusiva fundamenta-se na concepção dos direitos huma-
nos, conjugando igualdade e diferença como valores inseparáveis, sendo
os educadores os principais agentes de mudança (Secretaria de Educação
Especial do Ministério da Educação, 2008).
A chamada Educação Inclusiva teve inı́cio nos Estados Unidos e, atu-
almente, encontra-se na segunda década de implementação, obtendo bons
resultados (Mrech, 2001). Na Itália também tem sido obtidos resultados po-
sitivos, onde 98% dos alunos PNE estão incluı́dos na rede regular de ensino,
seguida por Espanha e Portugal, com aproximadamente 72% (Grosjean &
Thibaud, 2001).
No Brasil, foi a partir da década de 80 que a abordagem da questão
ligada ao tema deficiência ou necessidade especial passou a incorporar uma
nova dimensão, sustentada nos direitos humanos, procurando expressar a
importância da promoção e do reconhecimento do PNE enquanto cidadão
em pleno direito (Duarte & Cohen, 2004).
A resposta adequada da escola ao atendimento dos PNE só será possı́vel
mediante mudanças que possibilitem sua organização para eliminação das
barreiras pedagógicas, de comunicação, arquitetônicas, entre outras (Melo
& Martins, 2007).
Os sistemas de ensino têm como responsabilidade: garantir que nenhum
aluno seja discriminado, reestruturar as escolas de ensino regular, elaborar
projeto pedagógico inclusivo, programar propostas e atividades diversifi-
cadas, planejar recursos para promoção da acessibilidade nos ambientes e
atender às necessidades educacionais especiais (Rostelato, 2010).

2.2 Ergonomia e acessibilidade


O termo ergonomia é derivado das palavras gregas ergon (trabalho) e no-
mos (regras). Nos Estados Unidos, utiliza-se também como sinônimo o
termo human factors (fatores humanos). Resumidamente, pode-se dizer
que a ergonomia se aplica ao projeto de máquinas, equipamentos, sistemas
e tarefas, com o objetivo de melhorar a segurança, a saúde, o conforto e
eficiência no trabalho (Habicht et al., 1999).
Souza & Mello Filho (1997) afirmam que nos casos de projetos e de
construções de novas edificações, os problemas de acessibilidade podem ser
mais facilmente planejados e resolvidos se algumas precauções forem adota-
das. As recomendações da ergonomia devem ser atendidas tanto nos planos
horizontais (largura e mudança de direção) como nos verticais (alturas e
mudanças de planos).
Acessibilidade de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas 293

O debate sobre direitos e equiparações de oportunidades para todos tem


contribuı́do para a conquista da cidadania plena. Assim, cada vez mais,
o conceito de acessibilidade é valorizado, exigido e adotado pela sociedade
(Schwarz & Haber, 2006).
Acessibilidade é a condição para utilização, com segurança e autonomia,
total ou assistida, dos espaços, dos mobiliários, dos equipamentos urbanos,
das edificações, dos serviços de transporte, dos dispositivos, e dos sistemas
e meios de comunicação e informação, por pessoa com deficiência ou com
mobilidade reduzida (Secretaria Nacional de Polı́ticas de Turismo, 2006).
Desde a publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB), Lei no 9394 de 1996, diversas escolas de ensino regular recebem
crianças PNE, apesar da falta de acessibilidade espacial, o que acaba im-
pedindo a plena integração destas crianças e sua real inclusão no ensino
(Brasil, 1996).
É preciso também estar atento para que a escola preveja a adaptação
do ambiente fı́sico, do mobiliário escolar, dos recursos pedagógicos, entre
outros, permitindo ao aluno PNE o acesso ao currı́culo de modo a assegurar
seu desenvolvimento e aprendizagem (Silva et al., 2006).
A acessibilidade deve ser prevista e almejada desde a concepção do
projeto. Denota-se que não há muita preocupação em se projetar objetos,
edifı́cios, espaços e transporte cujo desenho seja acessı́vel ao PNE e ao
idoso, de modo a possibilitar a sua integração ao meio que o cerca (Heidrich
et al., 2006). A acessibilidade prevista nas etapas iniciais de um projeto
representa acréscimo de apenas 1% no valor da obra. Porém, para realizar
adaptações depois de construı́do, o custo pode alcançar 25%. Portanto,
é mais viável financeiramente planejar do que adaptar (Duarte & Cohen,
2004).
Nas escolas deve existir pelo menos uma rota acessı́vel interligando o
acesso de alunos às áreas administrativas, de prática esportiva, de recre-
ação, de alimentação, salas de aula, laboratórios, bibliotecas, centros de
leitura e demais ambientes pedagógicos (Audi & Manzinni, 2007).
Quaresma (2002) relata que os principais problemas das instituições
de ensino são: falta de acesso, circulação e adaptações nos sanitários, e
que estes obstáculos arquitetônicos interferem diretamente na qualidade
de vida dos PNE.
De acordo com Souza & Mello Filho (1997) as condições mais comuns
que trazem embaraços aos deficientes fı́sicos são: degraus estreitos, escadas
muito inclinadas, portas estreitas ou difı́ceis de abrir, deficiência de espaço
para cadeiras de rodas em auditórios e instalações de esportes, passagens
estreitas em locais como lanchonetes, boxes de banheiros pequenos ou cujas
portas se abrem para dentro, bebedouros fora de alcance, calçadas muito
polidas ou escorregadias quando molhadas e elevadores que não permitem
acesso devido a suas dimensões ou desenho.
294 Boschi et al.

Nas salas de aula, quando houver mesas individuais para alunos ou


cadeiras com prancheta acoplada, pelo menos 1% do total de mesas, com
no mı́nimo uma para cada duas salas de aula, deve ser acessı́vel a pessoas
com cadeira de rodas (ABNT, 2004).
Pelo menos 5% dos sanitários, com no mı́nimo um sanitário para cada
sexo, de uso dos alunos, devem ser acessı́veis. Recomenda-se, além disto,
que pelo menos outros 10% sejam adaptáveis para acessibilidade (Schwarz
& Haber, 2006).
Todos os elementos do mobiliário urbano da edificação, tais como be-
bedouros, guichês e balcões de atendimento, bancos de alvenaria, entre
outros, devem ser acessı́veis. As escadas devem ser providas de corrimãos
em duas alturas (ABNT, 2004).
A escada é a barreira mais importante e isto se verifica na maioria
das escolas. É importante ressaltar que são poucas as limitações encontra-
das dentro das escolas ao compará-las com o que o PNE enfrenta fora da
instituição de ensino, principalmente em bairros de periferia, onde estão
situadas as escolas, e a infra-estrutura externa ainda é precária (Tagliari
et al., 2006).
Todos os elementos do mobiliário interno devem ser acessı́veis,
garantindo-se as áreas de aproximação e manobra e as faixas de alcance
manual, visual e auditivo (Panero & Zelnik, 2002).
A Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação, com
base no Censo Escolar de 2003, informa que, das 176.880 escolas públicas,
apenas 6.489 (3,6%) têm sanitários adequados e 4.863 (2,75%) oferecem
dependências e vias para movimentação apropriadas (Rosa, 2005).

2.3 Legislação
Para que as pessoas com deficiência fı́sica possam ter liberdade de ir e vir e
se sentir parte da comunidade, elas necessitam de um meio fı́sico adequado
e que garanta segurança e acesso.
O direito a acessibilidade está descrito na Lei 10098 (Brasil, 2000a) e
na Lei 10048 (Brasil, 2000b). Estas leis prevêem a adequação das vias e dos
espaços públicos, do mobiliário urbano, da construção e reforma de edifı́-
cios, dos meios de transporte e de comunicação e do acesso à informação
(Schwarz & Haber, 2006).
No Brasil, os parâmetros de acessibilidade são regidos pela Norma Bra-
sileira Recomendada (NBR) 9050, que se caracteriza como um instrumento
confiável que indica os critérios mı́nimos de qualidade e de conforto ambien-
tal (Duarte & Cohen, 2004). A Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT) por meio da NBR-9050 de 1994 deu impulso ao interesse de pes-
quisadores em avaliação de edificações. A partir de então houve subsı́dios
concretos para verificações. As escolas foram alvo de inúmeras pesqui-
sas de avaliação pós-ocupação nos mais diversos enfoques. A avaliação
pós-ocupação hoje é muito difundida em paı́ses de primeiro mundo pela
Acessibilidade de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas 295

importância deste instrumento. Chama-se atenção que a norma ABNT


NBR-9050:1994 foi revista em 2004 (Audi & Manzinni, 2007).
A NBR-9050 faz a abordagem de vários temas que, aliados às legisla-
ções federais, estaduais e municipais, são de fundamental importância para
promover o respeito aos direitos das pessoas deficientes. Porém, poucos
locais se propõem a atendê-la, bem como não se observa o cumprimento
das leis existentes (Secretaria Nacional de Polı́ticas de Turismo, 2006).
Van der Vordt (1997) relata a preocupação em se atender ao conceito
de desenho universal. Desenho universal é uma forma de conceber produ-
tos, meios de comunicação e ambientes para serem utilizados por todas as
pessoas, o maior tempo possı́vel, sem a necessidade de adaptação, bene-
ficiando pessoas de todas as idades e capacidades. De acordo com Souza
& Mello Filho (1997), o objetivo da NBR-9050 é fixar padrões e critérios
para propiciar aos PNE condições adequadas e seguras de acessibilidade
autônoma. Ao atender aos preceitos do desenho universal, aplicam-se os
conceitos de acessibilidade, tanto a novos projetos como a adequação, em
caráter provisório ou permanente de locais já existentes.
A Lei 9394 (Brasil, 1996) reconhece que a educação é um instrumento
fundamental para a integração e a participação de qualquer PNE no con-
texto em que vive. Está disposto nesta Lei que:
“haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na
escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de
educação especial e que o atendimento educacional será feito
em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em
função das condições especı́ficas dos alunos, não for possı́vel a
sua integração nas classes comuns de ensino regular” (Secreta-
ria de Atenção à Saúde, 2006).
A integração escolar, tal como consagrada em preceito constitucional,
preconiza o atendimento preferencial ao PNE na rede regular de ensino.
Assim, também se impõe a melhoria da capacidade das próprias redes fı́-
sicas escolares já instaladas ou a sua ampliação, eliminando as barreiras
arquitetônicas (Schwarz & Haber, 2006).
Os resultados do Censo Escolar, em nosso paı́s, indicam o crescimento
da participação do atendimento inclusivo a PNE, passando dos 24,7%, em
2002, para 41%, em 2005 (Secretaria de Educação Especial, 2006).

3. Método
Antes de iniciado, o projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa da Universidade de Mogi das Cruzes (CAAE 0111.0237.000-
07), regulado pelas Diretrizes e Normas de Pesquisa em Seres Humanos,
através da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.
Os nomes e locais das escolas estaduais e municipais foram adquiridos
por meio da diretoria de ensino dos municı́pios do Alto Tietê, Estado de São
296 Boschi et al.

Paulo. Posteriormente, as escolas foram selecionadas através de visitas e


contatos telefônicos. Após a seleção das mesmas, agendou-se com a direção
uma data para esclarecimentos sobre os objetivos da pesquisa e obtenção
do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelo responsável da escola,
e para a análise do local através do questionário.
A partir da autorização da direção da escola, iniciou-se a análise do
local. Foram analisadas 26 escolas estaduais e municipais dos ensinos fun-
damental e médio na região do Alto Tietê, que possuı́ssem, ou não, PNE
incluı́dos no ensino.
Para a coleta de dados utilizou-se um questionário, elaborado pelos
autores e baseado na NBR-9050 (Anexo I). Este questionário contém 17
questões fechadas e 3 questões abertas, visando obter informação sobre o
espaço fı́sico e a presença de barreiras arquitetônicas. Utilizou-se uma fita
métrica (trena) para a realização das medidas.
O questionário foi preenchido pelos próprios autores da pesquisa du-
rante a visita ao local. Nesta visita também observou-se o espaço fı́sico e as
principais barreiras arquitetônicas e realizou-se as medições. Foi necessária
apenas uma visita na escola para a coleta dos dados.
Após as visitas, a análise dos dados obtidos foi feita comparando-se os
resultados com a NBR-9050.

4. Resultados e Discussão
Os dados obtidos por meio da pesquisa de campo foram analisados de
forma quantitativa através da frequência e porcentagem, e foram expostos
em tabelas, seguidos de descrição e análise de acordo com os critérios da
ABNT NBR-9050.
A NBR-9050 estabelece parâmetros técnicos, visando proporcionar ao
maior número possı́vel de pessoas a utilização de maneira autônoma e se-
gura do ambiente (ABNT, 2004).
Na Tabela 1 são apresentados os dados relativos à existência de escadas
nas escolas. A NBR-9050 não descreve a respeito da existência ou não de
escadas, a norma somente estipula os parâmetros exatos para as mesmas
quando o local as possuı́rem.

Tabela 1. Presença de escadas.


No de escolas %
Sim 23 88,46
Não 3 11,53
TOTAL 26 100,00

Todos os elementos do mobiliário urbano da edificação devem ser aces-


sı́veis, assim como as escadas. A escada é a barreira mais importante e isto
Acessibilidade de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas 297

se verifica na maioria das escolas, pois seguem o mesmo modelo arquitetô-


nico (ABNT, 2004).
Para atividades com portadores de necessidades especiais são acon-
selhados espaços fı́sicos amplos e seguros, como forma de prevenção de
possı́veis acidentes (Porter & Richler, 1991).
Os resultados da Tabela 2 mostram a presença de rampas de acesso nas
escolas.
Tabela 2. Presença de rampas de acesso.
No de escolas %
Sim 10 38,46
Não 16 61,53
TOTAL 26 100,00

A largura das rampas deve ser estabelecida de acordo com o fluxo de


pessoas. A largura livre mı́nima recomendável para as rampas em rotas
acessı́veis é 1,5m, e o mı́nimo admissı́vel é 1,2m (ABNT, 2004).
De acordo com Brito et al. (2006) devem haver ressaltos laterais de
paredes ou guias de balizamento com altura mı́nima de 0,05m e patamares
de dimensão longitudinal mı́nima admissı́vel de 1,2m no inı́cio e no término
da rampa.
A inclinação máxima recomendável é de 1:15 para rampas de uso geral.
Porém, por mais ı́ngreme que seja a rampa, ainda serve a quem depende
de cadeira de rodas, dada a sua impossibilidade de utilizar uma escada. Se
as circunstâncias são tais que só se torne possı́vel uma rampa ı́ngreme, é
melhor que tenha a inclinação máxima de 1:12, do que não exista. Ainda,
as rampas devem ter superfı́cie não escorregadia (Souza & Mello Filho,
1997).
A Tabela 3 apresenta a existência de banheiros adaptados para PNE.
Os sanitários e vestiários acessı́veis devem obedecer aos parâmetros da
NBR-9050 para a instalação de bacia, mictório, lavatório, box de chuveiro,
acessórios e barras de apoio, além das áreas de circulação, transferência,
aproximação e alcance (ABNT, 2004).

Tabela 3. Presença de banheiros adaptados.


No de escolas %
Sim 9 34,61
Não 17 65,38
TOTAL 26 100,00

A quantidade de escolas com banheiro adaptado é muito insatisfatória.


Para a NBR-9050 os sanitários e vestiários de uso comum ou uso público de-
298 Boschi et al.

vem ter, no mı́nimo, 5% do total de cada peça instalada acessı́vel. Quando


houver divisão de sexo, as peças devem ser consideradas separadamente
para efeito de cálculo. Os banheiros devem ter espaço suficiente para a
passagem de cadeira de rodas e em cada andar deve haver ao menos um
banheiro acessı́vel de homens e um de mulheres (Souza & Mello Filho,
1997).
O sanitário deve estar localizado próximo à circulação principal e ser
acessı́vel. A área interna deve ser de, no mı́nimo, 1,5 x 1,7 m (Brito et al.,
2006). Os banheiros são fundamentais para garantir a permanência das
pessoas durante longos perı́odos nas escolas. Mas a maioria é inacessı́vel
(Tagliari et al., 2006).
Neste estudo todas as escolas apresentaram o sanitário em locais pró-
ximos à circulação principal.
Na Tabela 4 estão os dados referentes à existência de barra de apoio
para a transferência junto à bacia. A NBR-9050 descreve que todos os sani-
tários adaptados devem ter barras de apoio para transferência, firmemente
fixadas na lateral e no fundo das paredes ou divisórias (ABNT, 2004).
Porém, nas escolas analisadas o percentual é pequeno.

Tabela 4. Presença de barra de apoio junto à bacia sanitária.


No de escolas %
Sim 8 30,76
Não 18 69,23
TOTAL 26 100,00

Observa-se que, mesmo as escolas onde o banheiro é considerado pelo


responsável como adaptado (34,61%), não há presença de barra de apoio
junto à bacia, pois a porcentagem de escolas que apresentam este requi-
sito é de 30,76%. Este fato ilustra a importância das informações sobre
acessibilidade para os responsáveis e funcionários das escolas.
A Tabela 5 apresenta os dados sobre a existência de barras de apoio
junto ao lavatório. A norma NBR-9050 recomenda que deve existir esta
barra em frente e dos lados do lavatório.
Tabela 5. Presença de barra de apoio junto ao lavatório.
No de escolas %
Sim 1 3,84
Não 25 96,15
TOTAL 26 100,00

Quanto à carteira da sala de aula estar adequada, a Tabela 6 mostra


que em pequeno percentual das escolas as carteiras não eram adequadas.
Acessibilidade de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas 299

A NBR-9050 não é especı́fica quanto a parâmetros para carteiras es-


colares. A norma prevê condições gerais para mesas e superfı́cies para
trabalhos, tais como: as mesas devem estar localizadas junto a rotas aces-
sı́veis, devem possuir altura livre inferior de no mı́nimo 0,73 m do piso, e
a altura da mesa deve ser de 0,75 m a 0,85 m do piso (ABNT, 2004).

Tabela 6. Adequação da carteira da sala de aula.


No de escolas %
Sim 24 92,30
Não 2 7,69
TOTAL 26 100,00

É importante verificar se a sala de aula e a rota para esta são acessı́veis.


Para o atendimento de pessoas em cadeira de rodas é investigada a exis-
tência de carteiras que permitam a acomodação (Audi & Manzinni, 2007).
Em 92,30% das escolas que tinham carteira da sala de aula adequada, estes
critérios anteriormente citados estavam presentes.
Na Tabela 7 são mostrados os dados referentes à altura do local para
alimentação. Os parâmetros para as mesas de alimentação são os mesmos
para mesas de trabalho. Salienta-se que as cantinas devem ser projetadas
de modo a permitir a passagem de cadeiras de rodas pelas circulações de
serviço e entre as mesas. As prateleiras com os alimentos e os talheres
devem ser de fácil alcance aos que se acham em cadeiras de rodas (Souza
& Mello Filho, 1997).

Tabela 7. Adequação da altura do local para alimentação.


No de escolas %
Sim 22 84,61
Não 4 15,38
TOTAL 26 100,00

Quanto à altura do bebedouro, os dados estão representados na Ta-


bela 8. A NBR-9050 recomenda a altura do bebedouro em 0,9 m.
Constatou-se que 30,73% das escolas estão dentro dos parâmetros. Se-
gundo Souza & Mello Filho (1997) a altura recomendada para bebedouros
em escolas de ensino fundamental é de 26 polegadas (66 cm) acima do nı́vel
do piso e em escolas de ensino médio, 30 polegadas (76 cm). Para Tagliari
et al. (2006) os bebedouros devem respeitar a altura de 80 cm. Apesar de
outros autores citarem diferentes medidas para bebedouros, nesta pesquisa
foram consideradas corretas as medidas citadas pela norma (ABNT, 2004).
Ainda, os bebedouros devem ser localizados adequadamente, ter jato
para cima e para frente, e poder ser acionados com a mão e com o pé
300 Boschi et al.

(Souza & Mello Filho, 1997). Porém, em nenhuma das escolas avaliadas
era possı́vel acionar o bebedouro com o pé.

Tabela 8. Adequação da altura do local para alimentação.


No de escolas %
0,8 m 4 15,38
0,9 m 8 30,76
1,0 m 9 34,61
1,1 m 3 11,53
1,2 m 2 7,69
TOTAL 26 100,00

5. Conclusão
O presente trabalho demonstra que as escolas não estão aptas em sua to-
talidade para os PNE. Apenas uma escola, que foi projetada e construı́da
para acessibilidade de PNE, está totalmente de acordo com o recomen-
dado pela norma brasileira. Outras três escolas podem ser consideradas
acessı́veis por não apresentarem rotas inacessı́veis.
As barreiras arquitetônicas presentes em grande parte das escolas fo-
ram: altura inadequada do bebedouro (69,27%), a ausência de rampas
(61,53%) e a ausência de banheiros adaptados (67,38%). Apesar de 34,61%
das escolas terem um banheiro de uso exclusivo a PNE, os itens que o com-
põem não estão adequados ou não estão presentes.
Pode-se detectar através da pesquisa que as escolas estudadas são de
arquitetura excludente, ou pela própria arquitetura, ou pela escolha do
terreno. Os projetos encontram-se em desacordo com a ABNT NBR-
9050:2004.
Sugere-se para trabalhos futuros que o fisioterapeuta elabore aulas ex-
positivas com o intuito de instruir o professor quanto ao mobiliário, as
adaptações e o posicionamento correto do aluno PNE nas atividades no
ambiente escolar.

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Notas Biográficas

Silvia Regina Matos da Silva Boschi é Fisioterapeuta (PUCCAMP, 1988),


Mestre em Engenharia Biomédica (UMC, 2003) e Doutor em Engenharia
Biomédica (UMC, 2011). Atualmente é docente da Universidade de Mogi das
Cruzes (UMC).

Tereza Cristina Carbonari de Faria é Fisioterapeuta (FCNM, 1989),


Mestre em Reabilitação (UNIFESP-EPM, 2000) e Doutor em Neurologia
(UNIFESP-EPM, 2009). Atualmente é fisioterapeuta da EMESP em Mogi das
Cruzes.

Jéssica dos Santos Tolentino é Fisioterapeuta (UMC, 2008) e Especialista


em Terapia Intensiva (ICHC-FMUSP). Atualmente é fisioterapeuta do Instituto
Central do Hospital das Clı́nicas da FMUSP.

Wellington Yoshihide Harada é Fisioterapeuta (UMC, 2008) e Especialista


em Fisioterapia Musculoesquelética (Santa Casa de São Paulo, 2010).

Cecı́lia Augusto Ribeiro é Fisioterapeuta (UMC, 2008).


304 Boschi et al.

Anexo 1: Questionário em relação às barreiras arquitetônicas


1 - Qual o tipo de piso da escola?

2 - Possui escadas?
( ) sim ( ) não

3 - Qual a largura das escadas?


( ) 1,0m ( ) 1,5m ( ) 2,0m
( ) 2,5m ( ) mais de 2,5m ( ) não tem

4 - Existem corrimãos nas escadas?


( ) sim ( ) não

5 - Os corrimãos estão instalados em ambos os lados das escadas?


( ) sim ( ) não ( ) não tem

6 - Qual a largura do corrimão?


( ) 1 e 2cm ( ) 2 e 2,5cm ( ) 3 e 3,5c
( ) 4 e 4,5cm ( ) acima de 4,5 cm ( ) não tem

7 - O espaço livre entre a parede e o corrimão?


( ) 1cm ( ) 2cm ( ) 3,0cm
( ) 4,0cm ( ) acima de 4,0cm ( ) não tem

8 - Qual a altura dos corrimãos do piso?

9 - Existem rampas de acesso para cadeira de rodas?


( ) sim ( ) não

10 - Qual a largura das portas?


( ) 1,0m ( ) 1,20m ( ) 1,5m
( ) 2,0m ( ) maior que 2,0m

11 - Qual a largura dos corredores?


( ) 1,0m ( ) 1,20m ( ) 1,5m
( ) 2,0m ( ) maior que 2,0m

12 - Existe banheiro adaptado para Deficiente Físico?


( ) sim ( ) não

13 - Existe barra de apoio para transferência junto a bacia?


( ) sim ( ) não

14 - Qual a altura da bacia sanitária do piso acabado e as medidas a partir da


borda superior sem o assento?

15 - Qual a altura do acionamento da descarga?


( ) 0,5m ( ) 1,0m ( ) 1,2m
( ) 1,5m ( ) maior que 1,5m

16 - Qual a altura do lavatório?


( ) 0,5m ( ) 0,7m ( ) 0,8m
( ) 0,9m ( ) maior que 0,9m

17 - Existem barras de apoio junto ao lavatório, na altura do mesmo?


( ) sim ( ) não

18 - Carteira está adequada para a criança na sala de aula?


( ) sim ( ) não

19 - O local para alimentação possui altura adequada?


( ) sim ( ) não

20 - Qual a altura do bebedouro?


( ) 0,80m ( ) 0,90m ( ) 1,0m
( ) 1,10m ( ) 1,20m ( ) maior que 1,20m
Capítulo 17

Adultos com a Paralisia Cerebral:


Implicações para Intervenção em Neuropediatria

Anna Luisa Macedo Margre, Maria Gabriela Lopes Reis,


Rosane Luzia de Souza Morais∗, Aline Duprat Ramos

Resumo: O objetivo deste estudo é descrever as condições de saúde,


de incapacidade e de qualidade de vida (QV) de adultos com para-
lisia cerebral (PC). Vinte e dois adultos com PC participaram do
estudo, sendo a maioria quadriplégica espástica, nı́vel IV e V do
GMFCS e MACS. Estavam presentes várias comorbidades e com-
plicações fı́sicas, como escoliose e contraturas musculares. Mais da
metade não deambulava e dois deles perderam a marcha na fase
adulta. A QV apresentava ı́ndices maiores quando relatada pelo
próprio adulto com PC, ou seja, aqueles que apresentavam menores
deficiências e limitações funcionais, do que quando relatada pelos
cuidadores. Desta forma, o fisioterapeuta que atua em neuropedia-
tria deve estar alerta às alterações que ocorrem na fase adulta para
que possa minimizar seus efeitos ainda na infância.

Palavras-chave: Paralisia cerebral, Envelhecimento, Dados socio-


demográficos, Complicações.

Abstract: The purpose of this study is to describe health conditi-


ons, disabilityand quality of life (QL) of adults with cerebral palsy
(CP). Twenty two adults with CP were included in the study, and
most were spastic quadriplegic, GMFCS and MACS level IV and V.
Several co-morbidities were identified, as well as physical complica-
tions such as scoliosis and muscle contractures. More than a half
did not walk, and two of then lost it in adulthood. The QL reported
by the own adults with CP, that is, those with small deficiencies
and functional limitations, had higher rates than when reported by
caregivers. Thus, the physical therapist who works in neuropedia-
trics should be alert to the changes that occur in adulthood in order
to minimize its effects still in childhood.

Keywords: Cerebral palsy, Aging, Social-demographic data, Com-


plications.

∗ Autor para contato: rosanesmorais@gmail.com


Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2
306 Margre et al.

1. Introdução
O curso natural da Paralisia Cerebral (PC) mudou bastante durante os
últimos cinquenta anos. Estudos em vários paı́ses demonstram que a ex-
pectativa de vida de indivı́duos com PC aumentou (Hemming et al., 2006;
Hutton & Pharoah, 2006; Strauss et al., 2008). Segundo Donkervoort et al.
(2007) crianças com PC podem ter sobrevivência semelhante a da popula-
ção em geral quando não apresentam comorbidades significativas e recebem
cuidados médicos adequados.
Pesquisas sobre os aspectos relacionados à saúde de adultos com PC são
importantes para que os fisioterapeutas possam disponibilizar abordagens
terapêuticas adequadas, bem como documentar a necessidade de polı́ticas
públicas voltadas para esta população. Além disto, contribuem para for-
mulação de estratégias fisioterapêuticas preventivas para as crianças com
PC (Bottos et al., 2001; Horsman et al., 2010).
Nos últimos anos há um fluxo crescente de estudos sobre adultos com
PC, principalmente em paı́ses desenvolvidos (Andersson & Mattsson, 2001;
Bottos et al., 2001; Jahnsen et al., 2003; Hemming et al., 2006; Strauss
et al., 2008). Porém, os estudos publicados sobre adultos com PC na po-
pulação brasileira ainda são escassos (Margre et al., 2010). No entanto,
dentro de uma perspectiva biopsicossocial, o ambiente fı́sico, social, cultu-
ral e polı́tico também influenciam na saúde do adulto com PC (Haak et al.,
2009). Assim, é importante conhecer as deficiências, as limitações funcio-
nais, as restrições sociais e a qualidade de vida que envolve os adultos com
PC no Brasil.
O objetivo do presente estudo foi descrever as condições de saúde e de
incapacidade e a qualidade de vida de adultos com PC. Estes adultos foram
caracterizados quanto à saúde geral e condições associadas, classificações
da PC, complicações fı́sicas e modo de locomoção.

2. Fundamentação Teórica
Devido ao interesse multidisciplinar crescente sobre investigações em PC,
há esforços para se estabelecer uma definição padronizada para esta condi-
ção. A definição clássica de PC como alteração da postura e do movimento
devido à lesão do cérebro imaturo foi revisada e modificada para uma de-
finição mais abrangente. Assim, considera-se a PC como um grupo de
perturbações permanentes no desenvolvimento de movimentos e posturas,
causando limitações nas atividades funcionais, atribuı́das a distúrbios não-
progressivos que ocorrem no encéfalo fetal ou infantil (Rosenbaum et al.,
2007; O’Shea, 2008).
Além das classificações tradicionalmente utilizadas, as classificações fo-
cadas no estado funcional dos indivı́duos têm sido incorporadas, seguindo
a tendência de se utilizar um modelo de saúde e incapacidade não focado
Adultos com PC: implicações para intervenção em neuropediatria 307

apenas em aspectos médicos, mas em aspectos biopsicossociais (Rosenbaum


et al., 2007).
Tradicionalmente a PC é classificada quanto a natureza das alterações
neuromotoras e de acordo com o distúrbio motor predominante, em: es-
pástica, ataxica e discinética (coreoatetose ou distonia). Esta classificação
está relacionada ao tipo de tônus muscular anormal e às alterações de mo-
vimentos involuntários. Ela auxilia na compreensão da fisiopatologia e da
etiologia da PC (Rosenbaum et al., 2007; O’Shea, 2008).
No entanto, a distribuição do distúrbio neuromotor pode apresentar
intensidade distinta nos membros inferiores e superiores. Assim, quanto à
sua distribuição topográfica, a PC é classificada em: hemiplegia, quando
o acometimento neuromotor é unilateral; diplegia, quanto o acometimento
neuromotor é bilateral e predominante nos membros inferiores (MMII); e
quadriplegia, quando o acometimento é bilateral e os membros são igual-
mente comprometidos (O’Shea, 2008). Esta classificação tem sido questio-
nada devido à subjetividade na comparação do acometimento entre mem-
bros superiores (MMSS) e MMII e a diversidade estrutural e funcional entre
estes membros (Rosenbaum et al., 2007).
Atualmente há classificações relacionadas à funcionalidade dos MMII e
MMSS. Para a classificação da função motora grossa existe o Sistema de
Classificação da Função Motora Grossa ou Gross Motor Function Classifi-
cation System (GMFCS) que se baseia no movimento iniciado voluntaria-
mente, com ênfase na posição sentada e na marcha. As distinções entre os
nı́veis de função motora, que variam de I a V, são baseadas nas limitações
funcionais e na necessidade de tecnologia assistiva (Palisano et al., 1997).
Para classificar a função motora fina utiliza-se com frequência o Sistema
de Classificação das Habilidades Manuais ou Manual Ability Classification
System (MACS). Este instrumento classifica o modo como os indivı́duos
com PC manuseiam os objetos em atividades diárias e as suas necessidades
de assistência ou adaptações. Esta classificação é composta por nı́veis que
variam de I a V, crescentes quanto às limitações presentes (Eliasson et al.,
2006).

3. Metodologia
Este capı́tulo apresenta um estudo descritivo para a caracterização de uma
população. O estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri
(UFVJM) (registro no 011/09).
Os sujeitos da pesquisa foram vinte e dois adultos com PC, recrutados
em todos os centros de reabilitação da cidade de Diamantina, MG. Foram
considerados como critérios de inclusão: possuir PC diagnosticada e regis-
trada em prontuário pelas instituições de origem, ter idade maior ou igual
a dezoito anos, e residir no Municı́pio de Diamantina. Antes de se iniciar
308 Margre et al.

a pesquisa, todos os participantes, ou seus responsáveis legais, assinaram


ao termo de consentimento livre e esclarecido.
Inicialmente coletou-se informações sobre o tipo de PC e a distribuição
topográfica no prontuário médico e fisioterapêutico da instituição de origem
de cada participante.
A partir da revisão literária (Rapp & Torres, 2000; Andersson & Matts-
son, 2001; Bottos et al., 2001; Jahnsen et al., 2003; Paterson, 2004; Liptak,
2008; Strauss et al., 2008; Horstmann et al., 2009) elaborou-se um questio-
nário sobre as classificações da PC, a saúde geral, as condições associadas
e as complicações fı́sicas.
Para aqueles que deambulavam observou-se o tipo de marcha segundo
uma versão adaptada dos Critérios para Deambulação Funcional ou não
Funcional (Montgomery, 1998). Neste instrumento, a marcha comunitária
é o termo utilizado para aquele indivı́duo que é capaz de deambular em
ambientes externos e comunitários com ou sem auxı́lio de dispositivo para
marcha. A marcha domiciliar ou escolar é aquela em que o mesmo é capaz
de deambular dentro de casa ou dentro da sala de aula com ou sem auxı́lio
de dispositivo, mas necessita de cadeira de rodas, ou auxı́lio, ou apoio de
terceiros para deambulação em ambientes externos ou comunitários. E a
marcha não funcional ou terapêutica é a que o indivı́duo é capaz de dar
alguns passos, em terreno regular, com ou sem auxı́lio de dispositivos, mas
necessita de supervisão.
Embora os instrumentos GMFCS e MACS tenham sido inicialmente
propostos para crianças, o presente estudo fez uso dos mesmos em adultos,
como nos estudos de McCormick et al. (2007) e Van Meeteren et al. (2010).
A qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) foi avaliada através
da versão brasileira traduzida e adaptada do Questionário de Qualidade de
Vida Medical Outcomes Study 36 - Item Short-Form Health Survey (SF-
36). Este instrumento é um questionário genérico e multidimensional para
avaliação da qualidade de vida. O SF-36 possui trinta e seis itens distri-
buı́dos em oito escalas: capacidade funcional, aspectos fı́sicos, dor, estado
geral da saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais e saúde
mental. O escore final varia de zero a cem, onde cem é o melhor estado de
saúde (Ciconelli et al., 1999).
Os questionários e entrevistas foram respondidos pelo participante. En-
tretanto, no caso de dificuldades de expressão ou compreensão que compro-
metesse a entrevista, o cuidador do participante respondeu as perguntas.
Solicitou-se aos entrevistados que apresentassem exames para comprovar a
existência de doenças ou complicações fı́sicas.
Para complementar as informações realizou-se inspeção e avaliação da
movimentação passiva. Verificou-se a existência de contraturas musculares,
deformidades, como escoliose e obliquidade pélvica, e outras alterações.
Adultos com PC: implicações para intervenção em neuropediatria 309

Os dados foram analisados de forma descritiva por meio de média,


desvio padrão, porcentagem, e frequência utilizando o software aplicativo
Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) (versão 15.0, SPSS Inc.).

4. Resultados
A amostra foi composta por vinte e dois participantes, cinco (22,7%) res-
ponderam a entrevista e dezessete (77,3%) tiveram seus dados informados
pelos cuidadores. Os sujeitos da pesquisa tinham idade entre dezoito e
cinquenta e dois anos, em média 28,7±10,6 anos. A amostra teve maior
porcentagem do gênero masculino (63,6%) comparados com o gênero femi-
nino (36,4%).
A Tabela 1 representa as classificações quanto à disfunção neuromotora,
distribuição topográfica e nı́vel de funcionalidade por meio do GMFCS e
MACS. Dos vinte e dois sujeitos, 86,4% tinham PC espática e 13,6% PC
discinética. Não foram encontrados outros tipos de PC, como atáxico e
hipotônico. Como padronização, os pacientes com PC mista (espástica e
discinética) foram classificados como PC discinética.

Tabela 1. Classificação quanto à disfunção neuromotora, distribuição


topográfica, GMFCS e MACS. (n): número de participantes.
Espástica
Hemiplegia Diplegia Quadriplegia Discinética Total
(n) (n) (n) (n) (n)
GMFCS
Nı́vel I 3 3 0 1 7
Nı́vel II 1 1 0 0 2
Nı́vel III 0 1 0 0 1
Nı́vel IV 1 0 1 1 3
Nı́vel V 0 0 8 1 9
Total 5 5 9 3 22
MACS
Nı́vel I 4 0 0 0 4
Nı́vel II 0 2 0 1 3
Nı́vel III 1 1 0 1 3
Nı́vel IV 0 2 4 0 6
Nı́vel V 0 0 5 1 6
Total 5 5 9 3 22

Dos participantes espásticos, 22,7% eram hemiplégicos, 22,7% diplé-


gicos, e 40,9% quadriplégicos. Quanto ao GMFCS, 45,4% pertenciam aos
nı́veis I e II e 54,5% aos nı́veis IV e V. Todos os participantes quadriplégicos
espásticos, bem como dois dos três participantes discinéticos, pertenciam
aos nı́veis IV e V do GMFCS. Dos cinco participantes hemiplégicos, qua-
tro pertenciam aos nı́veis I e II. O mesmo ocorre com quatro dos cinco
diplégicos.
310 Margre et al.

O MACS identificou resultados semelhantes aos do GMFCS. 45,4% de


todos os participantes pertenciam aos nı́veis I e II e 54,5% aos nı́veis IV
e V. Todos os participantes quadriplégicos pertenciam aos nı́veis IV e V e
todos os hemiplégicos aos nı́veis I e II. Três dos cinco diplégicos pertenciam
ao nı́vel I e II, assim como dois dos três discinéticos.
A Tabela 2 apresenta as informações sobre a saúde geral, as condições
associadas e as complicações fı́sicas. Observa-se uma grande porcentagem
de distúrbios orais, escoliose e contraturas musculares. Quanto à loco-
moção, doze participantes (54,5%) não deambulavam. Destes, dez nunca
adquiriram a marcha e dois perderam esta habilidade após a infância. En-
tre os que deambulam, dez (45,5%), oito (36,4%) com marcha comunitária,
um (4,5%) domiciliar e um (4,5%) terapêutica. Três (13,6%) participantes
que deambulavam utilizavam órteses tornozelo-pé sólida. Dos participan-
tes que não deambulavam, nove (40,9%) eram conduzidos por terceiros em
cadeiras de rodas manuais dentro e fora de casa, um (4,5%) arrastava-se
pelo chão, e dois (9,1%) não deambulavam e também não possuı́am cadeira
de rodas (Tabela 3).
Dada à subjetividade da QVRS, os resultados foram distribuı́dos de
acordo com o relato do cuidador (sobre dezessete dos participantes) e do
próprio participante (cinco indivı́duos). Os resultados do SF-36 respon-
dido pelos cuidadores revelaram as seguintes média e desvio-padrão: no
domı́nio capacidade funcional 12,65±22,16, em limitação por aspecto fı́-
sico 5,88±24,25, em relação à dor 72,23±31,83, em estado geral de saúde
51,00±19,43. Já o domı́nio vitalidade obteve média de 75,29±13,05, as-
pectos sociais 69,12±33,40, aspectos emocionais 11,77±33,21, e no domı́nio
saúde mental 71,65±18,82.
Os cinco participantes que responderam ao SF-36 apresentaram os se-
guintes resultados. No domı́nio capacidade funcional a média encontrada
foi de 47,00±42,51. O domı́nio limitação por aspecto fı́sico apresentou mé-
dia de 60,00±54,77. Em relação à dor a média obtida foi de 100,00±0,00.
No domı́nio estado geral de saúde, a média foi 67,00±14. O domı́nio vitali-
dade obteve média de 61,00±15,57, aspectos sociais 85,00 ±22,36, limitação
por aspectos emocionais 60,00±54,77, e em saúde mental a média foi de
72,00±17,20.

5. Discussão
Este estudo caracterizou uma amostra de vinte e dois adultos com PC resi-
dentes em uma cidade do interior do Brasil. Ao se considerar a faixa etária
dos participantes (entre dezoito e cinquenta e dois anos) é possı́vel obser-
var que assim como em outros paı́ses, progressivamente há um aumento
na expectativa de vida na PC. Hemming et al. (2006) acompanharam uma
coorte de indivı́duos com PC nascidos de 1940 a 1960 no Reino Unido e
constataram que entre aqueles indivı́duos vivos aos vinte anos de idade,
Adultos com PC: implicações para intervenção em neuropediatria 311

Tabela 2. Saúde geral, condições associadas e complicações fı́sicas. (n):


número de participantes; (%) porcentagem de participantes

Saúde Geral, Condições Associadas (n) %


e Complicações Fı́sicas
Epilepsia 12 54,5
Afasia/disartria 17 77,3
Visão subnormal 4 18,2
Distúrbios de deglutição 9 40,9
Disfunção intestinal e/ou vesical 12 54,5
Refluxo Gastroesofágico 4 18,2
Problemas dentários 11 50
Luxação de quadril 2 9,1
Obliquidade pélvica 13 59,1
Escoliose 20 90,9
Fadiga 9 40,9
Osteopenia 0 0,0
Osteoartrose 1 4,5
Fraturas 2 9,1
Presença de Contraturas 18 81,8
Contraturas por articulação:
- Cotovelo 4 18,2
- Punho 7 31,8
- Quadril 11 50,0
- Joelho 15 68,2
- Tornozelo 18 81,8

Tabela 3. Locomoção na amostra de adultos com PC.

Hemiplégicos Diplégicos Quadriplégicos Discinéticos Total


(n) (n) (n) (n) (n) (%)
Locomoção:
Já deambularam 0 0 1 1 2 (9,0)*
Deambulam 4 6 0 0 10 (45,5)
Cadeira de rodas 1 0 6 2 9 (40,9)
Arrastam-se 0 0 1 0 1 (4,5)
Nenhuma 0 0 2 0 2 (9,1)
Classificação da marcha:
Comunitária 4 4 0 0 8 (36,4)
Domicı́lio 0 1 0 0 1 (4,5)
Terapêutica 0 1 0 0 1(4,5)
Órteses 1 2 0 0 3 (13,6)
* dois participantes que já deambularam e se locomovem atualmente por meio de cadeira de rodas
312 Margre et al.

86% sobreviveram até cinquenta anos. Segundo Hutton & Pharoah (2006)
a severidade e a quantidade de comorbidades exercem importante papel
na sobrevida de indivı́duos com PC ao longo da vida. No estudo reali-
zado por estes autores, 99% dos indivı́duos com PC leve sobreviveram até
trinta anos, e entre aqueles com quatro comorbidades graves apenas 33%
sobreviveram até esta idade. Segundo Strauss et al. (2008) desde a década
de 1980 foi dada maior importância para o estado nutricional apropriado
em crianças e adultos com deficiências, houve reconhecimento precoce e
tratamento vigoroso de infecções e melhor suporte tecnológico disponı́vel
nos serviços médicos.
A maioria dos participantes deste estudo foi classificada como espástica
e quadriplégica. Embora haja consenso na literatura quanto ao tipo espás-
tico ser o mais prevalente entre indivı́duos com PC, a distribuição topo-
gráfica é variável entre os estudos (Murphy et al., 1995; Turk et al., 1997;
Andersson & Mattsson, 2001). Segundo Andersson & Mattsson (2001)
uma possı́vel justificativa para este fato poderia ser a diferença nas defini-
ções entre pesquisadores, principalmente para distinguir diplégicos graves
de quadriplégicos. A maioria dos participantes hemiplégicos e diplégicos
apresentaram GMFCS nı́veis I e II. Já os quadriplégicos e discinéticos apre-
sentaram GMFCS nı́veis IV e V. Estes dados estão de acordo com o estudo
realizado por Shevell et al. (2009). Estes autores verificaram a relação en-
tre o GMFCS e os tipos de PC em trezentos e uma crianças. Concluiu-se
que há correlação entre PC espástica e discinética e nı́veis de maior inca-
pacidade motora grossa, bem como estre hemiplegia e diplegia e nı́veis de
menor incapacidade motora grossa.
Quanto ao MACS, os participantes quadriplégicos e hemiplégicos apre-
sentaram resultados semelhantes àqueles encontrados no GMFCS. Já para
os participantes diplégicos e discinéticos verificou-se uma distribuição mais
equivalente entre os nı́veis de menores e maiores incapacidade. Estes resul-
tados estão de acordo com estudos que procuraram verificar a associação
entre o GMFCS e MACS (Carnahan & Hägglund, 2007; Gunel et al., 2008).
O MACS está relacionado ao grau do comprometimento neuromotor dos
membros superiores, que é variável entre diplégicos; bem como à preser-
vação da cognição, que é frequente tanto em indivı́duos discinéticos como
diplégicos (Carnahan & Hägglund, 2007; Gunel et al., 2008).
Os principais problemas de saúde e condições associadas foram os dis-
túrbios de comunicação (afasia e disartria), a epilepsia, a disfunção intes-
tinal ou vesical, os distúrbios de deglutição e os problemas dentários. Os
resultados encontrados estão em conformidade com outros estudos. Porém,
refluxo gastroesofágico e déficits auditivos e visuais, também são frequen-
temente relatados na literatura (Turk et al., 1997; Rapp & Torres, 2000;
Bottos et al., 2001; Liptak, 2008; Haak et al., 2009; Turk, 2009). Segundo
Turk (2009) a maioria dos problemas de saúde ou condições associadas
do adulto com PC são os mesmos que os acompanham desde a infância.
Adultos com PC: implicações para intervenção em neuropediatria 313

No entanto, adultos com PC queixam-se mais de problemas dentários, de


bexiga e intestino, dor e principalmente de disfunções do sistema musculo-
esquelético (Turk et al., 1997; Turk, 2009).
No presente estudo observou-se um elevado número de escoliose, obli-
quidade pélvica e contraturas musculares. Apenas dois participantes re-
lataram fraturas, por motivo de queda na infância. Nenhum participante
soube informar sobre osteoporose, apenas um relatou osteoartrose e dois
relataram luxação do quadril. No entanto, estes achados devem ser ana-
lisados com cautela, visto que os participantes negaram possuir exames
complementares para análise e demonstraram pouco conhecimento sobre
os conceitos e a evolução da PC.
Bottos et al. (2001), em um estudo de caracterização de setenta e dois
adultos com PC na Itália, encontraram escoliose acima de trinta graus em
20,3 % dos participantes e 28,2% com luxação ou subluxação de quadris.
Turk et al. (1997), em um estudo com sessenta e três mulheres adultas com
PC, encontraram 40% de deformidades de quadril (obliquidade pélvica ou
luxação), 53% de deformidades na coluna (cifose ou escoliose) e 75% de
contraturas musculares.
Segundo a literatura pesquisada (Andersson & Mattsson, 2001; Bot-
tos et al., 2001; Paterson, 2004; Horstmann et al., 2009; Murphy, 2009)
as deformidades como escoliose, obliquidade pélvica e luxação do quadril
são mais frequentes em adultos com PC grave, geralmente quadriplégica
ou que não deambulam. Por outro lado, as contraturas musculares, as de-
formidades nos pés e a osteoartrose são encontradas em todos os tipos de
PC.
No presente estudo houve uma grande proporção de indivı́duos com
contraturas (81,8%), mais constantes nos extensores de tornozelo, seguidos
dos flexores de joelho, quadril, punho e cotovelo, respectivamente. Dois he-
miplégicos, um diplégico e um discinético não tinham contraturas e todos
os quadriplégicos tinham entre dois e cinco grupos musculares com contra-
turas. As contraturas foram encontradas em todos aqueles participantes
que não deambulavam e em 60% dos que deambulavam.
Os resultados encontrados estão em consonância com os de Maltais
et al. (2010) sobre a associação estatisticamente significante entre a au-
sência da deambulação com a presença de limitações da amplitude de
movimento em adultos com PC. Andersson & Mattsson (2001) também
encontraram 80% de contraturas em estudo com adultos com PC quadri-
plégica que não deambulavam, somente um não relatou possuir contratura;
e dos quarenta e sete hemiplégicos que deambulavam trinta e um relataram
possuir contraturas.
Segundo resultados de estudos de ultrassonografia em músculos de in-
divı́duos com PC (Ohata et al., 2006; Moreau et al., 2009) em casos de
imobilidade, desuso, uso em excesso ou em situação biomecânica desfavo-
rável, ocorrem adaptações teciduais. Estas levam a contraturas, atrofias
314 Margre et al.

musculares e modificações na arquitetura muscular, pois o músculo é um


órgão dinâmico que se adequa às demandas de sua utilização (Andersson
& Mattsson, 2001; Gough, 2009).
A fadiga é descrita como uma diminuição da capacidade de manter
a força muscular e desempenhar tarefas. É uma experiência de se sentir
esgotado, cansado, fraco ou com falta de energia (Jahnsen et al., 2003).
No presente estudo, a fadiga foi relatada por nove (40,9%) participantes,
a maioria deambulava. Segundo Jahnsen et al. (2003) a fadiga exige uma
determinada quantidade de atividade e os indivı́duos com graves incapaci-
dades motoras talvez não tenham habilidades suficientes para se tornarem
fisicamente fadigados.
A marcha foi observada em dez (45,5%) participantes, quatro hemiplé-
gicos e seis diplégicos, e os doze quadriplégicos, não deambulavam. A maior
parte destes indivı́duos que deambulavam possuı́a marcha comunitária. Se-
gundo a literatura (Sola & Grant, 1995; Beckung et al., 2007), embora a
análise de prognóstico de marcha em indivı́duos com PC seja complexa
e multifatorial, o diagnóstico topográfico da PC é um fator importante a
ser considerado. Assim, os hemiplégicos, seguidos dos diplégicos, têm um
prognóstico favorável para o desenvolvimento da marcha, enquanto o prog-
nóstico para os quadriplégicos é desfavorável (Sola & Grant, 1995; Beckung
et al., 2007).
Um participante discinético perdeu a marcha aos trinta e dois anos
devido a espondilolistese, seguida de mielopatia. De acordo com Murphy
(2009) há possibilidade de ocorrer espondilolistese em adultos com PC dis-
cinéticos devido a posturas distônicas contorsionais da cabeça e do pescoço.
Outro participante quadriplégico espástico perdeu a marcha aos doze anos
por deterioração da capacidade funcional.
Indivı́duos com PC tendem a apresentar sinais de envelhecimento em
faixas etárias mais baixas do que a população em geral (Strax et al., 2010).
Os resultados de estudos demonstram que pode ocorrer uma progressiva
limitação funcional em indivı́duos com PC. Alguns, entre vinte e cinco
e trinta e cinco anos, perdem a capacidade de deambular (Andersson &
Mattsson, 2001; Haak et al., 2009; Opheim et al., 2009; Turk, 2009). Se-
gundo Bottos & Gericke (2003) dentre os vários fatores relacionados à perda
da marcha em adultos com PC, os principais são: os processos degenera-
tivos e as dores articulares em consequência do uso de uma biomecânica
desfavorável, o desequilı́brio entre a demanda para a marcha e o contexto
dinâmico ambiental, o surgimento da fadiga e as cirurgias ortopédicas que
não levam em conta as respostas compensatórias e funcionais do indivı́duo.
O questionário para avaliação da qualidade de vida SF-36 foi respondido
pelo próprio participante ou pelo cuidador quando o participante com PC
apresentava dificuldade de expressão e de compreensão. Tal metodologia
foi também adotada por Young et al. (2010) em um estudo que descreveu
a saúde e a qualidade de vida de jovens e adultos com PC no Canadá. Na
Adultos com PC: implicações para intervenção em neuropediatria 315

literatura existem estudos, principalmente relacionados com qualidade de


vida, em que o relato divide-se em três tipos: auto-relato dos pacientes,
apenas o relato de pessoas próximas a ele (membros da famı́lia ou equipe de
cuidados), e as duas formas de obtenção dos dados. O relato do cuidador
não pode ser descartado, pois em alguns casos este é o único meio de se
obter informação sobre o paciente (Prebianchi, 2003).
Neste estudo pode ser observado que em todos os domı́nios houve maior
escore do SF-36 quando o questionário foi respondido pelo próprio parti-
cipante, exceto no domı́nio vitalidade. Estes resultados podem estar re-
lacionados ao fato de que os pacientes que responderam aos questionários
foram aqueles que apresentavam marcha independente, menor deficiência
e menos limitações funcionais. Tarsuslu & Livanelioglu (2010) observaram
que em adultos jovens a qualidade de vida é influenciada pela gravidade
das limitações fı́sicas secundárias à PC. Em relação ao escore mais baixo
para vitalidade quando o questionário foi respondido pelo próprio indivı́duo
com PC, isto pode estar relacionado à presença de fadiga. Este sintoma
geralmente estava presente nos casos de pacientes que deambulavam. Em
um estudo qualitativo realizado com doze adultos com PC, os participantes
relataram uma perda de energia ao longo do dia que limitava a realização
das atividades (Horsman et al., 2010).
Além disto, há diferença na percepção da qualidade de vida na PC
quando se compara a visão do cuidador e a do indivı́duo com PC, embora no
presente trabalho o relato tenha sido feito pelo cuidador apenas nos casos
em que o adulto com PC não apresentava condições para o auto relato.
Varni et al. (2005) reportou uma baixa correlação no relato de qualidade
de vida de crianças e adolescentes comparado com o mesmo relato segundo
a visão de seus pais. Segundo estes autores, os pais tendiam a relatar piores
ı́ndices de qualidade de vida de seus filhos no que concerne aos aspectos
emocionais.

5.1 Implicações para o tratamento de crianças com PC


Embora a literatura sobre PC na fase adulta seja recente e ainda exista
poucos estudos experimentais sobre este tema (Jeglinsky et al., 2010), a
descrição da história natural da PC traz reflexões importantes sobre as
implicações destes achados no tratamento das crianças com PC.
Bottos et al. (2001) afirmam que a neuropediatria é muito voltada
para a aquisição da marcha. O autor alerta para a necessidade de preparar
a criança para a independência funcional, além da aquisição da marcha,
pois que há risco de perda desta habilidade na fase adulta. Sugere-se o
revezamento da marcha com a cadeira de rodas como meio de locomoção
para evitar a sobrecarga do sistema musculoesquelético submetido a uma
biomecânica desfavorável.
Horsman et al. (2010) alertam que o fisioterapeuta que atua em neuro-
pediatria deve estar ciente das alterações que ocorrem na PC na fase adulta
316 Margre et al.

e agir de forma preventiva para evitar ou minimizar os efeitos destas em


seus pacientes ainda na infância.
Recentemente, um estudo longitudinal (Opheim et al., 2009) demons-
trou que em cento e quarenta e seis adultos com PC, 52% declararam
limitação funcional na marcha. Esta deterioração estava associada princi-
palmente ao tipo de PC bilateral e nı́vel III do GMFCS, e, houve correlação
com queixa de dor, fadiga e perda de equilı́brio corporal. Os autores con-
cluem que indivı́duos com PC bilateral e nı́vel III do GMFCS, sobrecarre-
gam mais seus sistemas musculoesqueléticos para cumprir com suas metas
funcionais e sociais. Além disto, os fatores ambientais, o desconhecimento
por parte dos profissionais de saúde sobre o processo de envelhecimento na
PC e a oferta escassa de serviços de reabilitação e treinamento fı́sico para
adultos com PC, favorecem a limitação funcional (Horsman et al., 2010).
Vários estudos (Andersson & Mattsson, 2001; Bottos et al., 2001; Bot-
tos & Gericke, 2003; Haak et al., 2009; Turk, 2009) alertam para a des-
continuidade na reabilitação fı́sica de indivı́duos com PC na fase adulta, e
que as terapêuticas existentes são voltadas para as necessidades de crian-
ças com PC. Horsman et al. (2010) afirmam que o fisioterapeuta que atua
em neuropediatria deve estar ciente disto e promover as condições devidas,
auxiliando na transição do paciente com PC para o tratamento de adultos
com disfunções neurológicas.

6. Conclusão
Os adultos com PC apresentam caracterı́sticas e necessidades especı́ficas.
Neste estudo verificaram-se grandes restrições sociais, instalação de defici-
ências musculoesqueléticas importantes e limitações progressivas na mar-
cha. Além disto, os participantes e cuidadores demonstraram pouco co-
nhecimento sobre a PC e sua evolução.
Ao considerar o aumento na expectativa de vida destes indivı́duos deve-
se pensar em polı́ticas públicas visando melhor e maior acesso a informa-
ções, a serviços de saúde, ao ensino, ao mercado de trabalho, às adaptações
de ambientes fı́sicos e à acessibilidade aos espaços públicos.
Salienta-se a necessidade da elaboração de programas de treinamento
fı́sico especı́ficos com intervenções fisioterapêuticas adequadas às limitações
encontradas em indivı́duos com PC na fase adulta. O fisioterapeuta que
atua em neuropediatria deve estar alerta às alterações que ocorrem no PC
na fase adulta, a fim de minimizar, ainda na infância, os efeitos destas.

Referências
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Adultos com PC: implicações para intervenção em neuropediatria 317

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Notas Biográficas
Anna Luisa Macedo Margre é fisioterapeuta (UFVJM, 2009) e atua em
fisioterapia dermato-funcional e Pilates.

Maria Gabriela Lopes Reis é fisioterapeuta (UFVJM, 2009) e atua como


fisioterapeuta plantonista na UTI neonatal do Hospital Regional Dr. Mario
Dourado Sobrinho em Irecê, BA.

Rosane Luzia de Souza Morais é fisioterapeuta (UFMG, 1996), Especialista


em Fisioterapia (USP, 1998) e Mestre em Ciências da Reabilitação (UFMG,
2005). Atualmente é doutoranda em Saúde da Criança e do Adolescente (UFMG)
e Professor Assistente da UFVJM no Departamento de Fisioterapia.

Aline Duprat Ramos é fisioterapeuta (UFVJM, 2010) e atua como fisiotera-


peuta da FHEMIG.
Capítulo 18

Marcadores de Mineralização e Formação Óssea


em Crianças com Paralisia Cerebral

Egle de Oliveira Netto Moreira Alves∗,


Margarida de Fátima Fernades Carvalho,
Tiemi Matsuo, Anne C. Rumiatto

Resumo: Fraturas com mı́nimo trauma são comuns na Paralisia


Cerebral (PC). Os objetivos deste estudo foram avaliar a minerali-
zação e a formação óssea de crianças com PC, utilizando marcado-
res bioquı́micos. Estes marcadores foram associados com o estado
nutricional, a deambulação e o uso de drogas antiepilépticas. Um
estudo descritivo de 41 crianças avaliou as caracterı́sticas clı́nicas da
PC, alguns aspectos terapêuticos, a nutrição e os nı́veis séricos de
cálcio, fósforo, fosfatase alcalina e osteocalcina. Utilizou-se o teste
de Kruskal-Wallis e o nı́vel de significância de 5% (p < 0, 05), que
apresentou diferença significativa entre os valores do cálcio e o uso
de drogas antiepilépticas.

Palavras-chave: Paralisia cerebral, Marcadores bioquı́micos, Me-


tabolismo ósseo.

Abstract: Fractures with minimal trauma are common in Cere-


bral Palsy (CP). This study aimed to assess the mineralization and
bone metabolism formation with serum levels markers and associate
these measures with the nutritional status, locomotion and use of
antiepileptic drugs. A descriptive study was done with 41 children
assessing the clinical characteristics of CP, some therapeutic as-
pects, the nutritional status and serum levels of calcium, phosphate,
alkaline phosphatase and osteocalcin. There was a significant dif-
ference (p < 0, 05) between the serum levels of calcium and the use
of antiepileptic drugs, using the Kruskal-Wallis test.

Keywords: Cerebral palsy, Biochemical markers, Bone metabo-


lism.

∗ Autor para contato: eglenetto@yahoo.com.br

Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2


322 Alves et al.

1. Introdução
Paralisia Cerebral (PC) é o termo utilizado para designar um grupo de
encefalopatias com distúrbios motores (tônus e postura), de caráter não
progressivo, frequentemente mutável, secundário à lesão no encéfalo em
desenvolvimento (Kuban & Leviton, 1994). A PC é a causa mais comum
de incapacidade fı́sica na infância, com consequências na função, na saúde
e na qualidade de vida dos pacientes e de seus cuidadores (Rosembaum
et al., 2007).
Alguns estudos sugerem que as crianças com PC apresentam redução
da densidade mineral óssea (DMO) e propensão a fraturas não traumáticas
ou com mı́nimo trauma. A fragilidade óssea deve-se à osteopenia que pode
ser decorrente de diversos fatores, como: estado nutricional, ingestão ina-
dequada de cálcio, baixos nı́veis séricos de cálcio, fósforo, 25 OH vitamina
D e osteocalcina, uso de drogas antiepilépticas, diminuição da exposição
ao sol e, principalmente, fatores relacionados à deambulação (Henderson
et al., 2002a; Unay et al., 2003).
Foram identificados alguns preditores de baixa DMO em crianças com
PC que podem ser avaliados clinicamente. Entre estes destacam-se: peso
muito abaixo da média para a idade, idade próxima dos 10 anos, gravidade
do quadro, dificuldades na alimentação, história prévia de fratura e uso de
drogas antiepilépticas (Henderson et al., 2004).
Algumas intervenções são citadas como benéficas para o conteúdo ós-
seo destas crianças. A fisioterapia, por meio de técnicas que utilizem a
sustentação de peso nos membros e tronco, a suplementação de cálcio
e vitamina D, e o uso de bisfosfonatos, fazem parte destas intervenções
(Jekovec-Vrhoysk et al., 2000; Henderson et al., 2002b).
A sobrevida dos pacientes com PC é alta e, dependendo do estado
clı́nico, muitos apresentam osteopenia (Rapp & Torres, 2000). A redução
de massa óssea deixou de ser uma preocupação exclusiva em indivı́duos
adultos e idosos, pois a DMO depende do pico de massa óssea adquirido
até o final da segunda década de vida. Na infância, a forma secundária
de osteopenia é a mais comum, surgindo como complicação de doenças
crônicas ou de seus tratamentos (Van der Sluis & Muinck Keizer-Schrama,
2001).
Em indivı́duos com doenças crônicas que possam evoluir com redução
de massa óssea, todos os fatores de risco presentes devem ser identificados
precocemente para que, preventivamente, possam ser tratados ou atenua-
dos (Campos et al., 2003).
A ausência de estudos sobre a mineralização e a formação de massa
óssea em indivı́duos com PC no Brasil, especialmente em crianças, motiva
o desenvolvimento deste trabalho.
O objetivo deste capı́tulo é apresentar um estudo sobre a avaliação
da mineralização e da formação óssea de crianças com PC, utilizando os
Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com PC 323

marcadores bioquı́micos, cálcio, fósforo, fosfatase alcalina, osteocalcina, e


associando-os com o estado nutricional, a deambulação e o uso de drogas
antiepilépticas.

2. Fundamentação Teórica
2.1 Paralisia cerebral
A PC é a principal causa de incapacidade fı́sica grave na infância e pouco
se conhece sobre sua epidemiologia. Alguns estudos relatam uma preva-
lência de 2 a 2,5 para cada 1000 nascidos (Russman & Ashwal, 2004; Cans
et al., 2004). Durante os últimos vinte anos, tem aumentado a incidência
e a prevalência da PC, devido principalmente ao avanço dos cuidados neo-
natais, com aumento da sobrevivência dos recém-nascidos de muito baixo
peso (Koman et al., 2004).
Tradicionalmente classifica-se a PC com base na apresentação dos sinais
clı́nicos e na distribuição topográfica. Quanto a apresentação dos sinais
clı́nicos pode ser: espática, discinética e atáxica. Em relação à distribuição
topográfica da lesão pode ser classificada como: quadriplegia, diplegia e
hemiplegia.
Recentemente a PC também começou a ser classificada quanto à gra-
vidade do acometimento e o seu prejuı́zo na funcionalidade, por meio do
instrumento Gross Motor Function System (GMFCS) (Pfeifer et al., 2009).
Conforme o sistema de classificação de função motora ampla (GMFCS) há
diferentes nı́veis de gravidade na PC. Este sistema é baseado no movi-
mento auto-iniciado, com ênfase no sentar e no andar, e apresenta cinco
nı́veis diferentes de função motora, de acordo com a limitação funcional e
a necessidade de assistência externa.
Crianças classificadas no nı́vel I do GMFCS apresentam baixa severi-
dade, bom desempenho motor e limitações funcionais pouco pronunciadas.
As do nı́vel V são crianças com múltiplas desordens, que apresentam limi-
tações no controle voluntário dos movimentos e na habilidade de manter
postura antigravitária do pescoço e do tronco (Brianeze et al., 2009).
O número de adultos com PC está aumentando, devido ao crescimento
no número de sobreviventes e também à maior expectativa de vida dos
adultos. Dependendo do estado clı́nico, 65% a 90% das crianças com PC
tornam-se adultos e, com isto aumentam as comorbidades, como as fraturas
(Rapp & Torres, 2000).
A baixa DMO é encontrada em mais de 50% dos adultos com deficiên-
cias, incluindo os com PC, embora ainda com poucos estudos especı́ficos
neste grupo e faixa etária (Sheridan, 2009).

2.2 Alteração na massa óssea de pacientes com PC


Os fatores que influenciam no acréscimo mineral ósseo durante a infância
e determinam o pico de massa óssea são vários: potencial genético, origem
324 Alves et al.

étnica, fatores nutricionais, ingestão de cálcio e vitamina D, e padrões de


crescimento e atividade fı́sica (Stallings, 1997).
Durante a infância e a adolescência a massa óssea é acumulada progres-
sivamente em paralelo ao crescimento linear. Em indivı́duos com algumas
doenças crônicas, o risco de não se atingir um pico de massa óssea ade-
quada nos primeiros 20 anos de vida é maior, resultando em um esqueleto
de pior qualidade (Campos et al., 2003).
Em crianças com PC a diminuição da massa óssea aumenta o risco de
fraturas. Ocorrem também diferenças na alteração da DMO dentro das di-
ferentes classificações e distribuições topográficas da lesão. A DMO é maior
nos pacientes que deambulam quando comparados ao não-deambuladores,
e nos diplégicos e hemiplégicos, quando comparados com os quadriplégi-
cos (Unay et al., 2003). Considerando-se o GMFCS a DMO dos membros
inferiores é menor na PC com nı́veis IV e V (Kilpinen-Loisa et al., 2010;
Chia-Ling et al., 2011).

2.3 Fatores que podem interferir na formação e na manutenção da


massa óssea
2.3.1 Fatores mecânicos
O processo de remodelação óssea parece estar relacionado com certos com-
ponentes da força mecânica presentes em atividades fı́sicas que envolvem
a sustentação do peso corporal (Kilpinen-Loisa et al., 2010).
A atividade muscular exerce um papel dinâmico sobre o tecido ósseo.
As cargas de tensão e compressão geram um estresse e são responsáveis
pelas modificações que ocorrem nas propriedades geométricas e de ajuste
da massa óssea, alterando a sua resistência. O osso é um tecido dinâmico
e, como tal, responde às modificações no tamanho, na frequência e na
distribuição de carga aplicada em relação a sua resistência. O estresse
fı́sico contı́nuo estimula a calcificação e a deposição osteoblástica do osso,
adaptando a força óssea à carga de compressão que o mesmo deve suportar
(Feng & McDonald, 2011).
Alguns destes fatores mecânicos podem estar relacionados com as al-
terações ósseas das crianças com PC. A limitação para sustentar o peso
na deambulação durante o perı́odo de crescimento do esqueleto e os perı́o-
dos de imobilização temporária após alguns procedimentos ortopédicos são
fatores a se considerar (Henderson et al., 2002a).
O fator deambulação deve ser abordado quando se estuda a massa óssea
de crianças com PC, pois parece existir uma associação entre baixa DMO
e osteopenia em indivı́duos não deambulantes (Unay et al., 2003).

2.3.2 Alterações gastrintestinais, nutricionais e dificuldades na ali-


mentação
As alterações gastrintestinais como a deglutição incoordenada, o refluxo
gastroesofágico e a constipação, são relatadas como o maior problema crô-
Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com PC 325

nico das crianças com PC e com outras alterações de desenvolvimento. Tais


problemas ocorrem em 80% a 90% dos casos e, representam um risco para
a desnutrição (Chong, 2001).
Del Giudice et al. (1999) relataram que 92% das crianças com PC
apresentam sintomas sugestivos de alteração gastrintestinal, na seguinte
prevalência: 60% tem alterações da deglutição, 32% vômito e regurgitação,
41% episódios crônicos de aspiração pulmonar e 71% obstipação. Em 45%
dos pacientes foram observados sintomas sugestivos de refluxo gastroesofá-
gico, o que representa risco para a desnutrição e infecções de repetição no
aparelho respiratório.
Os fatores nutricionais, especialmente, a ingestão de proteı́nas e lipı́dios,
têm um papel relevante no processo de crescimento e desenvolvimento,
incluindo o incremento da massa corporal, o amadurecimento gradativo e
a manutenção da capacidade funcional (Barreto et al., 2006).
Os alimentos são a única fonte exógena natural de nutrientes, vitaminas
e sais minerais. Uma dieta adequada é essencial para fornecer os nutrientes
necessários para a mineralização e a manutenção da massa óssea. Estes
nutrientes são principalmente o cálcio, o fósforo, a vitamina D, a vitamina
K e a proteı́na (Ferrari, 2004). Bueno & Czepielewski (2008) relataram
que a baixa ingestão de cálcio e vitamina D na infância e na adolescência
traz efeitos deletérios na saúde óssea do esqueleto e no metabolismo ósseo.
Na PC, as crianças com comprometimento moderado e severo têm baixo
peso e altura para a idade, quando comparadas às saudáveis. O maior
impacto no crescimento aparece nos nı́veis IV e V do GMFCS, pela presença
da disfagia, que interfere na ingestão de uma dieta adequada (Bell et al.,
2010).
Arrowsmith et al. (2010) relatam que nos portadores de formas mais
graves de PC, a alimentação por sonda de gastrostomia, leva a um aumento
da gordura e da proteı́na corporal. Porém, apesar do ganho de peso, não
há alteração significante na altura e na mineralização óssea.

2.3.3 Uso de drogas antiepilépticas (DAE)


Outro fator que contribui para as alterações ósseas em crianças com PC é
o uso de DAE. No entanto, os mecanismos de associação entre estas drogas
e as alterações ósseas ainda não estão suficientemente esclarecidos (Pack &
Morrell, 2001).
Segundo Pack & Morrell (2001) as principais alterações causadas pelas
DAE são a osteopenia, a osteoporose, a osteomalácia e as fraturas. O
grau de acometimento está correlacionado com a duração do tratamento e
com o número de drogas utilizadas. As alterações no metabolismo ósseo são
associadas, mais comumente, com a fenitoı́na, a primidona e o fenobarbital.
Para Farhat et al. (2002) a terapia antiepiléptica, incluindo as novas
drogas, é um fator de risco para baixa DMO, independentemente, dos nı́veis
séricos de vitamina D e do tipo de deambulação dos pacientes. Isto indica
326 Alves et al.

a necessidade de acompanhamento do desenvolvimento esquelético nestes


pacientes.
A fisiopatologia dos distúrbios ósseos em pacientes usuários de DAE
é complexa. Provavelmente, a maioria destas drogas afeta o metabolismo
mineral e ósseo indiretamente. Algumas DAE podem reduzir a absorção
intestinal do cálcio, aumentar o catabolismo hepático de vários metabólitos
da vitamina D (hipovitaminose D), causar hiperparatireoidismo secundário
e osteomalácia (Drezner, 2004; Sheth, 2004; Vestergaard et al., 2004).
A fenitoı́na, o fenobarbital e a carbamazepina estimulam a atividade
hepática da enzima oxidativa, resultando no aumento da degradação de
hormônios esteróides, incluindo o 25-hidroxi-vitamina D (Drezner, 2004).
O valproato de sódio não afeta a atividade da enzima oxidativa mas
pode causar toxicidade renal. O citocromo P 450 do sistema hepático pode
ser alterado pelo uso do ácido valpróico e da lamotrigina (Drezner, 2004).
A literatura relata que 25% a 45% das crianças com PC têm algum tipo
de manifestação epiléptica (Farhat et al., 2002). Há diferenças quanto à
incidência da epilepsia, nas diferentes classificações topográficas da PC. A
maior ocorrência é nos quadriplégicos e hemiplégicos, quando comparados
aos diplégicos (Bruck et al., 2001).

2.4 Metabolismo ósseo


O tecido ósseo é formado por células (osteoblastos e osteoclastos), minerais
(cálcio e fósforo) e matriz orgânica (proteı́nas colágenas e não-colágenas).
Os osteoblastos sintetizam e mineralizam a matriz protéica com cristais
de hidroxiapatita, enquanto os osteoclastos promovem a reabsorção ós-
sea, mantendo assim uma constante remodelação tecidual (Campos et al.,
2003).
Parece haver um sistema de comunicação entre as células envolvidas no
processo de remodelação óssea para que ocorra acoplamento adequado em
suas funções. A partir de um estı́mulo inicial, os osteoclastos removem o
osteóide em certas áreas do osso denominadas de unidades ósseas de remo-
delação. A regulação do equilı́brio deste acoplamento é feita pelo cálcio,
pelo hormônio da paratireóide (PTH), pela calcitonina, pelo calcitriol, pela
insulina, pelos hormônios tireoidianos e sexuais e, localmente, por citocinas
que seriam os efetores destes estı́mulos (Feng & McDonald, 2011).
Na infância, a formação excede a reabsorção e a remodelação óssea é
intensa. Há dois perı́odos de aceleração do crescimento: nos dois primeiros
anos de vida e durante a adolescência.
Os fatores que interferem, na formação óssea, podem ser divididos em
dois grupos: intrı́nsecos e extrı́nsecos. Os fatores intrı́nsecos incluem fato-
res hereditários como a raça, o gênero e os fatores hormonais (hormônio
de crescimento, fator de crescimento dependente de insulina I, estrógeno e
testosterona). Estes fatores são responsáveis por cerca de 80% do pico final
Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com PC 327

de massa óssea. Os fatores extrı́nsecos são aqueles relacionados a aspec-


tos nutricionais, fatores mecânicos, hábitos de vida, presença de doenças
crônicas e uso de medicamentos (Campos et al., 2003).

2.5 Marcadores bioquímicos de mineralização e formação óssea


Os marcadores bioquı́micos do metabolismo ósseo podem ser usados como
um fator preditor de risco de fragilidade óssea. Isto ocorre independen-
temente dos dados obtidos com a densitometria mineral óssea, do mesmo
modo que se utilizam dados como história pessoal ou materna de fraturas
e baixo peso corporal (Clowes & Eastell, 2000).
As variações nestes marcadores podem demonstrar alterações recentes
do metabolismo do osso, constituindo-se em um método não invasivo que
pode ser repetido com frequência. Este método favorece uma intervenção
precoce, antes mesmo de se detectar alterações da DMO pela densitometria
óssea. Os marcadores de formação óssea são produtos dos osteoblastos e os
marcadores da reabsorção são oriundos da degradação da matriz colágena
pela atividade osteoclástica. Estes marcadores são uma forma de avaliação
dinâmica do esqueleto (Pagani et al., 2005).
Os marcadores de mineralização e de formação óssea avaliam o meta-
bolismo dinâmico do esqueleto. Eles refletem o metabolismo do esqueleto
como um todo, e não podem discriminar o tipo de osso envolvido, trabe-
cular ou cortical (Feng & McDonald, 2011). Os marcadores de formação
óssea mais sensı́veis e especı́ficos são as proteı́nas não-colágenas fosfatase
alcalina e osteocalcina (Campos et al., 2003).
A fração óssea de fosfatase alcalina é um marcador de atividade enzi-
mática dos osteoblastos. Já a osteocalcina e o pró-colágeno são produzidos
e liberados pelos osteoblastos durante a formação óssea. A osteocalcina é
a proteı́na não-colágena mais abundante no osso (Pagani et al., 2005).
Alguns ı́ons são os principais componentes quı́micos do osso: ı́on cálcio,
ı́on inorgânico ortofosfato e ı́on hidroxil. O osso responde pela reserva de
99% do cálcio total do organismo. O hormônio da paratireóide (PTH) e
a 25 hidroxivitamina D3 são os hormônios que mantêm a homeostase do
cálcio (Feng & McDonald, 2011).

3. Metodologia
Este estudo descritivo foi realizado no ambulatório e enfermaria de fisio-
terapia pediátrica do Hospital Universitário da Universidade Estadual de
Londrina (HU/UEL) e em duas escolas para atendimento de crianças com
necessidades especiais, a Associação dos Pais e Amigos do Excepcionais
(APAE) e o Instituto Londrinense de Educação de Crianças Excepcionais
(ILECE). O projeto foi realizado após a sua submissão e aprovação pelo
comitê de ética em pesquisa do HU/UEL sob o parecer CEP no 015/04.
328 Alves et al.

A amostra de conveniência foi constituı́da de 41 crianças, com diag-


nóstico clı́nico de PC, idade entre 1 ano e 6 meses a 12 anos, de ambos os
sexos, com dosagem de paratohormônio (PTH) normal e desenvolvimento
puberal de Tanner igual a 1.
A classificação de Tunner é utilizada para avaliar a maturação sexual
de crianças e adolescentes. Para os dois sexos, o estágio 1 de Tanner
caracteriza-se por ausência de sinais puberais, enquanto no estágio 5 o indi-
vı́duo encontra-se com desenvolvimento puberal completo (Azevedo et al.,
2009).
Para coleta dos dados, utilizou-se um protocolo de exame clı́nico da
PC, um protocolo de avaliação nutricional e foram colhidas amostras de
sangue para os exames laboratoriais.
No protocolo de avaliação clı́nica verificou-se os aspectos funcionais e
terapêuticos relacionados a deambulação, realização periódica de fisiotera-
pia, indicação do ortostatismo nos pacientes não deambuladores, história
prévia de fraturas e uso de DAE.
Todos os participantes foram classificados tradicionalmente, conforme
os princı́pios do Conceito Neuroevolutivo Bobath, quanto ao tipo clı́nico,
ao tônus e a distribuição topográfica da lesão. A classificação clı́nica foi
espática, atetóide, atáxica ou mista; a de tônus, hipertônico, hipotônico,
flutuante ou misto; e a distribuição topográfica, quadriplégica, diplégica ou
hemiplégica.
As avaliações nutricionais foram realizadas por uma nutricionista do
HU/UEL, que participou como colaboradora desta pesquisa.
No protocolo de avaliação nutricional realizou-se um exame fı́sico e uma
avaliação de ingesta. No exame fı́sico nutricional realizou-se a análise an-
tropométrica, incluindo as medidas de peso, estimativa de altura, pregas
cutâneas triciptal (PCT), subescapular (PCSe) e circunferência muscular
do braço (CMB). Na avaliação da ingesta realizou-se o recordatório alimen-
tar de 24 horas, obtido segundo informações da mãe ou do acompanhante.
Na sequência estabeleceu-se o Índice de Massa Corpórea (IMC) do
NCHS (National Center for Health Statistics). Este ı́ndice foi expresso
pelo “z-score”, ou seja, como unidades de desvio padrão em relação à po-
pulação de referência internacional, baseada nas curvas do NCHS.
Nos exames laboratoriais a dosagem do paratohormônio (PTH) foi re-
alizada por quimioluminescência, com valores de referência entre 7,0 e 53
pg/ml, para confirmar a inclusão no estudo.
Em todas as crianças foi realizada a análise bioquı́mica dos nı́veis séricos
de alguns dos marcadores de mineralização e de formação óssea, obtidos
em amostras de sangue. Todos os exames laboratoriais foram realizados
no HU/UEL, exceto a dosagem de osteocalcina, realizada pelo Laboratório
Oswaldo Cruz de Análises Clı́nicas (Londrina - PR).
Os marcadores cálcio, fósforo, fosfatase alcalina e osteocalcina foram
avaliados conforme os seguintes métodos:
Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com PC 329

• Cálcio: espectrofotometria de absorção atômica (valores de referên-


cia: 8,4 a 10,2 mg/dl);
• Fósforo: cinético UV, fosfomolibdato (valores de referência: 2,5 a
4,9mg/dl);
• Fosfatase alcalina: Bowers e McComb modificado (valores de refe-
rência: 150 a 408 U/l);
• Osteocalcina: Ensaio imunorradiométrico (os valores de referência
difererem de acordo com a faixa etária: até 4 anos 17,424 ng/ml,
de 4 anos a 10 anos 15,128 ng/ml e dos 10 anos a 14 anos 17,697
ng/ml).
Na análise estatı́stica, foram realizadas as análises descritivas apresen-
tadas em médias, proporções e distribuições de frequência. Para avaliar a
associação de cada um dos marcadores com as variáveis em estudo, utilizou-
se o Teste de Kruskal-Wallis. As variáveis contı́nuas foram expressas como
média ± desvio padrão (DP) e adotou-se o nı́vel de significância de 5% em
todos os testes estatı́sticos (p < 0, 05).

4. Resultados
Na amostra em questão a idade mı́nima encontrada foi de 1 ano e 6 meses
e a máxima de 11 anos, com idade média de 6 anos (± 2,84). Na faixa
etária de 1 ano a 4 anos a frequência foi de 25% e na de 5 anos a 8 anos
de 75%. Vinte e quatro (58,5%) crianças eram do gênero masculino e 17
(41,5%) do feminino.
Quanto à idade gestacional ao nascimento, 23 (56,4%) crianças foram
pré-termos, 16 (38,5%) a termo e 2 (5,1%) pós-termo. Não se calculou a
idade gestacional corrigida, pois apenas uma criança que não era pré-termo,
tinha menos de 2 anos (1 ano e 6 meses).
Nenhum paciente possuı́a história prévia de fraturas. As classificações
clı́nica, de tônus muscular e topográfica da PC podem ser verificadas na
Tabela 1.
Assim como na população geral de crianças com PC, a forma quadriplé-
gica foi a mais encontrada neste estudo. Desta forma, a população estudada
foi distribuı́da em dois grupos: quadriplégicos e não quadriplégicos, para
descrever algumas variáveis, como: distúrbios gastrintestinais associados e
distribuição do z escore IMC.
Dos pacientes que apresentaram alterações gastrintestinais, 14 (34,1%)
tinham aspirações, 15 (36,6%) distúrbios de deglutição, 21 (51,2%) obsti-
pação e 17 (41,5%) refluxo gastroesofágico.
Das 41 crianças, 39 realizaram avaliação nutricional, sendo que 19
(48,7%) eram desnutridas, 12 (30,8%) normais, 5 (12,8%) obesas ou com
sobrepeso e 3 (7,7%) tinham risco de desnutrição. Duas crianças não ti-
veram diagnóstico nutricional, uma por ser institucionalizada e não ser
330 Alves et al.

Tabela 1. Distribuição dos pacientes segundo as classificações da PC.

no (%)
Clı́nica
Espástica 29 (70,7)
Atetóide 11 (26,8)
Mista 1 (2,4)
Total 41 (100)

Tônus Muscular
Hipertonia 28 (68,3)
Tônus Flutuante 11 (26,8)
Misto 2 (4,9)
Total 41 (100)

Topográfica
Quadriplegia 26 (65,0)
Diplegia 9 (20,0)
Hemiplegia 6 (15,0)
Total 41 (100)

possı́vel a obtenção do recordatório alimentar e a outra porque o cuidador


não compareceu no horário agendado.
Para cada valor de IMC encontrado, foi atribuı́do um z escore (z escore
IMC) (Figura 1) que considera como desnutridas, as crianças com ı́ndices
iguais ou inferiores a -2 z escore abaixo da mediana de referência. Crianças
com ı́ndices abaixo de -3 z escore são consideradas desnutridas graves.
A epilepsia foi um dı́stúrbio associado encontrado em 24 (58,5%) das
crianças. Das 41 crianças, 26 (63,4%) fazem ou já fizeram uso de DAE, 7
(26,9%) por menos de 1 ano, 9 (34,6%) entre 1 e 2 anos e 10 (38,5%) por 2
anos ou mais. Ainda, 23 crianças utilizam DAE atualmente e 17 (73,9%)
fazem uso de, no mı́nimo, duas drogas simultaneamente.
A Tabela 2 apresenta os dados sobre as caracterı́sticas funcionais dos
sujeitos da pesquisa.
Os nı́veis séricos dos marcadores de formação e de mineralização óssea
(cálcio, fósforo, fosfatase alcalina e osteocalcina) não apresentaram altera-
ções significantes, portanto, não identificaram crianças com baixa minera-
lização óssea (Tabela 3).
Não foi encontrada associação significante entre os marcadores cálcio,
fósforo, fosfatase alcalina e osteocalcina com o IMC, o uso de drogas anti-
epilépticas e o tipo de deambulação.
Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com PC 331

Figura 1. Distribuição do z escore conforme classificação topográfica.

Identificou-se apenas uma associação significante entre os nı́veis de cál-


cio e o uso de drogas antiepilépticas (Kruskal-Wallis, p = 0, 0193). Não
houve diferença significativa quanto a quantidade de ingestão do cálcio nas
crianças que tomam medicação antiepiléptica e nas que não tomam.

5. Discussão
Neste estudo, os nı́veis séricos dos marcadores não apresentaram alterações
significantes. Portanto, não identificaram crianças com baixa mineralização
e formação óssea. Por outro lado, foi significante a associação de baixos
nı́veis de cálcio com o uso de DAE.
Estes resultados podem ser adicionados aos da literatura que mostram
a limitação destes marcadores, na avaliação da diminuição da massa óssea
em crianças com PC (Henderson et al., 2002a; King et al., 2003).
Henderson et al. (2002b) avaliaram os nı́veis de cálcio, fósforo, fosfatase
alcalina e osteocalcina em 117 crianças e adolescentes com PC, com idade
média de 9,7 anos. Os nı́veis séricos de cálcio estavam abaixo dos valores de
referência em apenas cinco crianças. Os nivéis séricos da fosfatase alcalina
estavam elevados em quatro crianças e somente 13 (17%) tinham um dos
marcadores com valores anormais.
No estudo de King et al. (2003) 48 crianças e adultos com quadriplegia
espástica foram avaliados. Os nı́veis séricos de cálcio, fósforo, magnésio,
332 Alves et al.

Tabela 2. Caracterı́sticas funcionais da amostra pesquisada.

no (%)
Deambuladores
Sim 21 (51,2)
Não 20 (48,8)

Forma de Deambular
Independente 12 (55,6)
Com apoio 9 (44,4)

Tipo de Apoio para Deambular


Andador 2 (22,2)
Apoio de terceiros 7 (77,8)

Ortostatismo nos Não Deambuladores


Sim 18 (90,0)
Não 2 (10,0)

Realização Semanal de Fisioterapia


Sim 40 (97,6)
Não 1 (2,4)

Tabela 3. Distribuição dos pacientes segundo os valores dos marcadores.


Frequência
Marcadores Valores de Referência Abaixo Normal Acima
no (%) no (%) no (%)
Cálcio 8,4-10,2 mg/dl 1 (2,4) 35 (85,3) 5 (12,2)
Fósforo 2,5-4,9 mg/dl 1 (2,4) 13 (31,7) 27(65,9)
Fosfatase Alcalina 150-408 U/l 5 (12,2) 34 (82,9) 2 (2,4)
Osteocalcina 15,12-17,69 ng/ml 2 (4,9) 39 (95,1) 0

25-OD vitamina D e osteocalcina de 43 participantes estavam normais,


tanto nas crianças como nos adultos.
Tadesmir et al. (2001) estudaram a diminuição de massa óssea em 24
crianças com PC (15 deambuladores e 9 não deambuladores) e compararam
com um grupo controle. Os valores séricos de cálcio e fósforo foram signi-
ficantemente mais altos no grupo de crianças com PC. A DMO foi menor
no grupo de estudo, mas não houve diferença significante entre os deam-
buladores e não-deambuladores. No presente estudo 27 (65,9%) crianças
estavam com os valores do fósforo acima do normal.
Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com PC 333

Neste estudo, além dos marcadores, foram avaliados os aspectos nutri-


cionais, os fatores mecânicos relacionados a deambulação e o uso de DAE.
Houve uma associação significante entre baixos nı́veis séricos de cálcio e
o uso de DAE. Embora não se tenha subsı́dios para inferências mais con-
sistentes, uma vez que não se dosou a vitamina D e não se investigou a
exposição aos raios solares, esta associação pode ser decorrente de dificul-
dades na absorção do cálcio pelo intestino. Os resultados sugerem também
que o problema não está ligado à ingestão deste mineral, pois não houve
diferença significante quanto à ingestão do cálcio em ambos os grupos,
crianças que usam e que não usam DAE.
O estado nutricional nesta casuı́stica parece não interferir na minera-
lização e na formação da massa óssea das crianças avaliadas, levando-se
em conta que, pelo IMC, 56,4% das crianças eram desnutridas ou tinham
risco de desnutrição. Estes resultados conflitam com os encontrados por
Henderson et al. (2004) que concluı́ram ser o peso abaixo do normal o me-
lhor preditor clı́nico para baixa DMO em crianças com PC quadriplégicas.
Porém, deve-se considerar que tais autores estudaram somente quadriplé-
gicos.
Neste estudo, encontra-se uma alta frequência da utilização do ortos-
tatismo nas crianças não deambuladoras (90%). O ortostatismo ou pro-
grama de sustentação de peso em pé é um termo utilizado na reabilitação e
pode ser definido como a utilização de órteses ou equipamentos adaptativos
para sustentar por um perı́odo determinado, um paciente na postura em
pé, com finalidade terapêutica ou profilática. O ortostatismo é utilizado
frequentemente, visando conseguir maior alongamento muscular nos mem-
bros inferiores, favorecer o desenvolvimento acetabular e contribuir para
a formação e a manutenção da massa óssea (Martinsson & Himmelmann,
2011).
A literatura aponta que o ortostatismo pode influenciar na formação
ou na manutenção da massa óssea de crianças com PC, apesar dos poucos
estudos sobre o assunto e da falta de padronização quanto ao tempo de
utilização, a frequência e a forma (estática ou dinâmica) (Caulton et al.,
2004).
Unay et al. (2003) estudaram a influência dos fatores nutricionais, da
ingestão de cálcio, da presença ou ausência de deambulação e de um pro-
grama regular de fisioterapia em 40 crianças com PC. Não houve diferenças
significativas nos nı́veis séricos de cálcio, fósforo e fosfatase alcalina e na
densitometria mineral óssea das vértebras, entre o grupo que realizava fisi-
oterapia e seu controle. No presente estudo, praticamente todas as crianças
(97,6%) faziam fisioterapia uma ou duas vezes por semana, assim não foi
possı́vel realizar a diferenciação proposta por estes autores.
Hartman et al. (2004) realizaram Ultra Som Quantitativo (USQ) no
terço distal do rádio e na porção média da tı́bia, de crianças e adolescentes
334 Alves et al.

com PC grave, institucionalizadas. Estas regiões possuem predominante-


mente osso cortical e os autores concluı́ram que a quantidade de massa óssea
estava diminuı́da. Alwren et al. (2011) realizaram Tomografia Computado-
rizada Quantitativa (TCQ) para avaliar a densidade óssea volumétrica da
tı́bia e da 3a vértebra lombar em crianças com PC e também concluı́ram
que a mesma estava diminuı́da na tı́bia de pacientes com diferentes nı́veis
no GMFCS.
Os estudos mostram que ainda se busca melhores métodos para avaliar
a massa óssea de crianças com PC, bem como uma definição mais clara dos
fatores que interferem na mineralização e na formação da massa óssea das
mesmas.
Ainda não parece possı́vel determinar a subpopulação de crianças com
PC que pode ser beneficiada com intervenções para manter ou aumentar
a massa óssea. Desta forma, necessita-se de métodos mais precisos que
possibilitem identificar as crianças com maior risco de alterações na massa
óssea, e, assim, instituir um tratamento efetivo por meio de suplementação
de vitamina D e cálcio, programas de exercı́cios com descarga de peso, e
medicamentos como o bisfosfonato (Leet et al., 2006).

6. Conclusões
Neste estudo os marcadores cálcio, fósforo, fosfatase alcalina e osteocalcina
não identificaram alterações na formação e na mineralização óssea de cri-
anças com PC. É necessário investigar outros métodos de avaliação, além
dos exames de imagem, que são de difı́cil realização nesta população.
Os baixos nı́veis de cálcio da população estudada estavam associados
ao uso de DAE. Este fato merece atenção dos profissionais para futuros
estudos, envolvendo a suplementação deste mineral, pois a ingestão estava
adequada.
A heterogeneidade do grupo em relação ao fator nutricional, ao tipo
de deambulação, ao uso de DAE e às classificações da PC foram uma das
limitações do estudo. Porém, considera-se a sua importância pelo fato de
se desconhecer estudos feitos no Brasil com esta finalidade.
Para a fisioterapia, espera-se que esta pesquisa gere uma motivação
para a realização de novos estudos sobre técnicas de tratamento para in-
fluenciar a formação e a manutenção da massa óssea das crianças com PC.

Agradecimentos
Os autores agradecem todos que colaboraram com os recursos financeiros
para esta pesquisa. Os exames laboratoriais foram realizados e financiados
pelos laboratórios do HU/UEL, exceto a dosagem de osteocalcina, realizada
pelo Laboratório Oswaldo Cruz de Análises Clı́nicas (Londrina). O kit para
dosar osteocalcina foi doado pela Rem – Indústria e Comércio Ltda (São
Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com PC 335

Paulo). Alguns custos adicionais foram cobertos pelo Programa de Pós-


Graduação do Centro de Ciências da Saúde da UEL.

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Notas Biográficas

Egle de Oliveira Netto Moreira Alves é Mestre em Ciências da Saúde (UEL,


2006). Atualmente é Professora Assistente do Departamento de Fisioterapia da
Universidade Estadual de Londrina (UEL) e docente plantonista na Unidade de
Terapia Intensiva Pediátrica do Hospital Universitário da UEL (HU/UEL).

Margarida de Fátima Fernandes Carvalho é Doutora em Reumatologia


Pediátrica (USP, 1998). Atualmente é Professora Associada do Departamento
de Pediatria e Clı́nica Cirúrgica da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e
Diretora Superintendente do Hospital Universitário da UEL (HU/UEL).

Tiemi Matsuo é Doutora em Estatı́stica e Experimentação Agronômica


(Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, 1992). Atualmente é Professora
Associada do Departamento de Estatı́stica da Universidade Estadual de Londrina
(UEL).

Anne Cristine Rumiatto é Mestre em Educação (UNESP-Marı́lia, 2003).


Atualmente é Professora do Curso de Nutrição da Universidade Norte do Paraná
(UNOPAR) e Nutricionista do Setor de Transplante de Medula Óssea e da
Comissão de Suporte Nutricional do Hospital Universitário da UEL (HU/UEL).

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