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METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO JURÍDICA

SABER FAZER - Comentário e Análise do Texto

Preâmbulo da Constituição de Moçambique de 2004

GUIÃO:

1. Situação do texto:
 Data: 16 de Novembro de 2004
 Autor: Assembleia da República (AR)
 Tipo de texto: Narrativo (narra a história) e Descritivo (descreve o objecto – vide o § 4)
– Preâmbulo da CRM
 Fonte: Texto oficial integral, publicado no Boletim da República, I Série, n° 51, de 22 de
Dezembro de 2004, texto alterado pela Lei n.° 26/2007, de 16 de Novembro e Lei n.°
1/2018, de 12 de junho.

2. Investigação das palavras-chave:


 Luta armada, libertação nacional
 Independência nacional, direitos e liberdades
 Constituição de 1990, Estado de Direito Democrático
 Estado de Direito Democrático
 Democracia, Unidade nacional

3. Sentido ou contexto do texto:


 O autor deste texto pretende manter viva a história e os pressupostos que ditaram a luta
de libertação nacional e o valor da independência nacional.

4. Plano:
 Introdução – Desenvolvimento – Conclusão – Referência bibliográfica

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Introdução
O comentário que segue versa em torno do preâmbulo da CRM de 2004. O mesmo pretende
atingir as principais linhas de pensamento do autor enunciadas no texto e que alimentaram o
processo de elaboração da Constituição. Tal como advoga Paulo Carvalho 1, o constituinte insere
nos domínios do direito proposições de ordem introdutória, expondo os motivos e anunciando,
em tom prescritivo, o quadro sobre o qual deve o exegeta manter sua interpretação da mensagem
constitucional. O presente preâmbulo fixou diversos valores fundamentais, porém, nota-se que
tais valores não vêm esgotar toda a disciplina pois, além destes, existe um leque de outros
valores espalhados no corpo da própria Constituição.

É nesta ordem de ideias que se pretende comentar de maneira sucinta às principais ideias do
texto em questão, a saber: A Luta armada da Libertação Nacional; Independência nacional,
direitos e liberdades fundamentais; A Constituição de 1990 e o Estado de Direito Democrático,
e; Reforço da Democracia e da Unidade Nacional.

O comentário visa como objectivo oferecer uma compreensão do preâmbulo da Constituição e


demonstrar a pertinência ou não das ideias do autor. Este comentário não se resume numa
simples questão técnica, mas sim, numa análise realística do Estado moçambicano no contexto
da sua estrutura e ordem que será fundamentada com base na Constituição da República de
Moçambique de 2004.

Comentário

1. Luta Armada da Libertação Nacional


Quando o autor inicia a narração com a frase "A luta armada de libertação nacional” quer
dissipar, a partida, qualquer outra via que pudesse levar a libertação nacional. De facto, depois

1
CARVALHO, Paulo de Barros (2010) O preâmbulo e a prescritividade constitutiva dos textos jurídicos. In:
REVISTA DIREITO GV. SÃO PAULO, 6, p.301.

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de terem sido definidos os objectivos da Frente de Libertação Nacional (FRELIMO) 2 e, como o
governo português recusasse as negociações pacíficas encabeçadas por Eduardo Chivambo
Mondlane3, para conceder a independência de Moçambique, em 25 de Setembro de 1964, a
FRELIMO desencadeou a luta armada para conquistar a independência total e completa de
Moçambique, na localidade de Chai, distrito de Macomia, província de Cabo Delgado, e
terminou com um cessar-fogo a 8 de Setembro de 1974, resultando numa independência
negociada. De salientar que, a tomada dessa decisão de enveredar pelo caminho das armas por
parte da FRELIMO foi devido a intransigência do regime fascista português liderado por
António de Oliveira Salazar e mais tarde por Marcelo Caetano. Daí que, a luta armada de
libertação nacional foi a via sine qua non conducente à independência nacional ou seja para
libertação da Terra e do Homem.

2. Independência nacional, direitos e liberdades fundamentais


O destaque por parte do autor da independência ou direitos e liberdades, leva-nos a entender que
a proclamação total e completa da independência de Moçambique, a 25 de Junho de 1975, pelo
então Presidente da FRELIMO, Samora Moisés Machel e, tomando posse como Presidente da
República Popular de Moçambique, passando a ser o 1º Presidente de Moçambique
independente. Desta feita, foi estabelecido um regime monopartidário sob a direcção da
FRELIMO e em seguida, iniciou-se um processo de construção de um Estado Socialista através
dum processo que consistiu na restituição ao povo moçambicano, dos direitos e liberdades que
lhes tinham sido negados pelo governo colonial. Referimo-nos ao processo de nacionalizações
que decorreram em fases distintas:
 24 de Julho de 1975 – Nacionalização da terra, saúde, educação e justiça;

 24 de Julho de 1976 – Nacionalização dos Prédios de rendimento, onde para a sua


administração, foi criada a APIE4.

Contudo, essa independência apenas foi política, na medida em que não conferiu ao povo
moçambicano uma independência económica, conforme o plasmado nos artigos 111°, 102°,

2
A Frelimo foi fundada a 25 de Junho de 1962, numa reunião que teve lugar em Dar-es-Salam, na Tanzânia, unindo
os três movimentos nacionalistas já existentes constituídos no exílio: UDENAMO, MANU e a UNAMI
3
Primeiro Presidente da FRELIMO
4
Administração do Parque Imobiliário do Estado

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103°, 104°, 105°, 106°, 107°, 108°, 109°, 110° e 111° da CRM de 2004. Por outras palavras, não
tivemos heranças económicas estruturais, uma vez que a função objectiva do governo colonial
era de maximizar a extracção de recursos através de formas de produção assente na exploração
massiva da força de trabalho. Por outro lado, a economia era dependente de factores e recursos
económicos externos, assim como, os sectores económicos possuíam poucas relações inter-
sectoriais, o que de certa forma ocasionava uma clara diferença entre diversas formas de
produção e de economia5.

3. Constituição de 1990 e o Estado de Direito Democrático


Esse é caso para dizer-se que o autor enfatiza a existência do multipartidarimo em Moçambique,
pelo facto de, em 30 de Novembro de 1990, ter entrado em vigor uma nova Constituição, que
introduziu o Estado de direito democrático. Foi esta Constituição que consagrou o princípio da
liberdade de associação e organização política dos cidadãos num sistema multipartidário, o
princípio de separação de poderes (legislativo, executivo e judiciário) e a realização de eleições
livres, criando bases para o estabelecimento de uma sociedade democrática. A partir de então, o
cargo de Presidente seria escolhido em eleições gerais. O Presidente passava a ser eleito por
períodos de cinco (5) anos e só poderia ser reeleito duas vezes. Igualmente foi alterada a
designação de República Popular de Moçambique para República de Moçambique.

Ademais, o autor pretende enaltecer a situação real que o país vive. Moçambique é um Estado de
Direito6 Democrático, o que pressupõe o pluralismo de expressão, na organização política
democrática, no respeito e garantia dos direitos e liberdadades fundamentais do Homem,
conforme o consignado no artigo 2° da CRM de 2004. No que respeita ao pluralismo político, é
devido ao facto do Estado reconhecer os vários sistemas normativos e de resolução de conflitos
que coexistem na sociedade moçambicana, na medida em que não contrariem os valores e os
princípios da Constituição.7

Em contrapartida, temos grandes desafios, a título de exemplo, a crise pós-eleitoral, a


descentralização, confrontos militares e o fenómeno da corrupção, só para citar alguns exemplos.

5
MALOA, Tomé Miranda (2016) História da economia socialista moçambicana. São Paulo: USP-FFLCH., p. 3
6
Cfr., artigo 1, da CRM. Que pressupõe a existência de uma ordem jurídica que se apoia nos órgãos estaduais
instituídos, sem prejuízo de órgãos não estatais, que velam pela ordem e harmonia social. Em segundo lugar, aliado
a este artigo, está o disposto no n.º 2 do artigo 38 da CRM que prevê sanções aos infractores a lei.

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Este quadro negro compromete a construção dum Estado de direito e democrático. Por outro
lado, apesar de ter sido instituido o Estado de Direito Democratico, Moçambique ainda tem um
longo caminho para sua efectivação. De acordo com a realidade existe uma interdependência
entre os poderes, mas não se pode dizer o mesmo quanto a independência dos poderes. Portanto,
o Estado de Direito e a Democracia moçambicana é ainda insipiente e em construção.

4. Democracia e Unidade nacional


O autor acredita que com a participação dos cidadãos na vida politica e social fará com que o
poder continue nas mãos do povo. Não obstante, esta democracia deve ser reforçada para a
manutencao da luta e o alcance da vitoria contra a liberdade economica. As instituições
democráticas devem representar os interesses do povo moçambicano.

Ademais, o autor chama atenção para o reforço e consolidação da abertura democrática, a


transparência e a eficiência das instituições políticas, essa será a condicao sine qua non
importante para a ampla participação dos cidadãos em todos os aspectos da vida do país e para a
inclusão social.

Todavia e, em contraposição a esse desiderato constitucional, multiplicam-se no seio da


sociedade um certo "mal estar" e repúdio a guerra como solução para diferenças políticas entre o
governo e a RENAMO que datam desde 1976 com início da guerra civil que terminou com a
assinatura do Acordo Geral de Paz de Roma, em Outubro de 1992. Aliando à essas diferenças
políticas citadas anteriormente, desde Outubro de 2017 que alguns distritos da província de Cabo
Delgado vem sendo fustigadas por ataques perpetrados por grupos de criminosos, criando uma
instabilidade político-militar naquela zona.

Por outro lado, temos a Unidade nacional com pedra angular, que vem desde a luta armada de
libertação nacional quando, em reconhecimento da necessidade de fortalecimento da Unidade
Nacional dos moçambicanos, do Rovuma ao Maputo e para sanar factores de divisão que
polarizavam os vários movimentos existentes antes da FRELIMO, tais como o tribalismo, o
regionalismo, o racismo, a falta de uma definição correcta do inimigo e dos objectivos da Frente

7
Vide, artigo 4, da CRM

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bem como a falta de uma estratégia comum, entre outros, foi realizado, de 23 a 28 de Setembro
de 1962, em Dar-es-Salaam, o I Congresso da Frente de Libertação de Moçambique
(FRELIMO), dirigido por Eduardo Mondlane. Pela sua importância e seu significado histórico,
este evento foi baptizado por "Congresso da Unidade".

Pelo acima exposto, pode-se depreender que foi a Unidade nacional que permitiu o alcance da
independência nacional, daí que urge a necessidade extrema de consolidá-la como factor para o
desenvolvimento do país. Paralelamente a essa necessidade do seu reforço, está o disposto no
artigo 39° da CRM que prevê sanções nos termos da lei, a todos os actos que atentem contra a
unidade nacional, prejudiquem a harmonia, criem divisionismo, entre outros.

Conclusão
Após o comentário dos cinco parágrafos que corporizam o preâmbulo da CRM de 2004 entre
outros aspectos considerados relevantes, chegamos a seguinte conclusão: A 25 de Setembro de
1964, deu-se início ao processo de construção de Moçambique, como uma nação livre e
independente, com o lançamento da Insurreição Geral Armada contra a ocupação estrangeira. Na
altura, os moçambicanos unidos e guiados pela Frente de Libertação de Moçambique lutaram em
defesa da pátria e da soberania.
A unidade nacional, determinação e perseverança dos moçambicanos logrou os seus intentos a
25 de Junho de 1975, quando foi proclamada a independência de Moçambique, conquistando o
pleno direito de país livre e soberano no concerto das nações.

Pese embora a Consitutição de Moçambique seja programática e os seus ideais sejam ainda
concebidos como uma utopia, é correcto afirmar que a democracia moçambicana está em obras
desde a adopção de reformas constitucionais em 1990 e da assinatura do Acordo de Paz de Roma
em 1992 que acabou com a guerra civil.

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

CARVALHO, Paulo de Barros (2010) O preâmbulo e a prescritividade constitutiva dos textos


jurídicos. In: REVISTA DIREITO GV. SÃO PAULO, 6, p. 295-312,.

MOÇAMBIQUE. CRM de 2004, BR. n.º 51, 1ª Série , de 22 de Dezembro de 2004.

JOÃO, Angélica & CHONGO, Edith. (2015) Moçambique, 40 anos de Independência: Unidade
Nacional, Paz e Progresso. Maputo: ARPAC,.

MALOA, Tomé Miranda (2016) História da economia socialista moçambicana. São Paulo:
USP-FFLCH.

Discente: TIVANE, Sancho Azarias

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