Você está na página 1de 23

Homossexualidade e ministério ordenado

Critérios de análise e correlações incômodas

Pelo Pe. Prof. Dr. Peter Mettler, MSF[i]

Belo Horizonte, MG

Síntese: O autor, apoiando-se em documentos da Congregação para a Educação Católica e em


carta do Secretário de Estado do Vaticano, analisa as motivações pelas quais “não se pode
admitir ao seminário e às ordens sacras aqueles que praticam a homossexualidade, apresentam
tendências homossexuais profundamente radicadas ou apóiam a chamada cultura gay”. Que a
homossexualidade, tal como descrita nos documentos assinalados, representa um impedimento
objetivo à ordenação, provém da própria natureza do sacerdócio: além de dificultar a ação
pastoral, coloca em questão o modo mais adequado com que o presbítero estabelece relações
tanto com homens quanto com mulheres.

1. Introdução

No dia 4 de novembro de 2005, a Congregação para a Educação Católica publicou uma


Instrução sobre os critérios de discernimento vocacional acerca das pessoas com tendências
homossexuais e da sua admissão ao seminário e às ordens sacras.[ii] No texto aprovado pelo
Papa Bento XVI, afirma-se que a Igreja “não pode admitir ao seminário e às ordens sacras
aqueles que praticam a homossexualidade, apresentam tendências homossexuais profundamente
radicadas ou apóiam a chamada cultura gay”.[iii]

Uma confirmação dessa posição veio à luz em maio de 2008. Numa breve carta a todos os
bispos e superiores religiosos, o Secretário de Estado do Vaticano, Cardeal Tarcisio Bertone,
enfatizou que as diretrizes de 2005 têm validade para todos os centros de formação presbiteral.
[iv] Desde a publicação da Instrução, alguns bispos e superiores religiosos haviam perguntado
se a mesma vale para a Igreja em todo o mundo. A carta do Cardeal Bertone, que se propõe
expressamente esclarecer eventuais dúvidas, deu agora uma resposta.

No dia 30 de outubro de 2008, a Congregação para a Educação Católica publicou “Diretrizes


para a utilização da Psicologia na admissão e formação de candidatos ao sacerdócio”.[v] O
prefeito deste dicastério, Cardeal Grocholewski, frisou, em conversa com jornalistas, que
homens com tendências homossexuais não poderiam ser admitidos às ordens sacras. Quem tem
“essas tendências profundamente enraizadas” não poderia ser admitido ao sacerdócio,
exatamente pela natureza deste. De certa forma, trata-se de uma ferida que dificulta a ação
pastoral. Diz respeito também ao modo mais adequado com que o presbítero estabelece
relações, tanto com homens quanto com mulheres, e não simplesmente da questão da
continência.[vi]

Minha tese de doutorado,[vii] orientada pelo Prof. Dr. Hubert Windisch, na Universidade
Albert-Ludwig de Fribourgo (Alemanha), teve por objetivo analisar como essa reiterada
proibição de ordenação[viii] se justifica e como se deve fundamentar que a homossexualidade,
tal como descrita pela referida Instrução, representa um impedimento objetivo à ordenação.

2. Homossexualidade em “transição”

Nos últimos trinta anos, após longa história de avaliação negativa em amplos setores da
sociedade e da Igreja, pelo menos na civilização ocidental-norte-americana, a compreensão da
homossexualidade foi colocada às avessas. Uma prática punível foi arbitrariamente
transformada em constitutivo da dignidade humana, um dos fenômenos mais surpreendentes da
atualidade.[ix] Trata-se, no caso, de uma mudança de consciência intencionalmente produzida,
de uma ruptura cultural proposital,[x] resultante, sobretudo, da decadência de convicções éticas
predominantes desde o final dos anos sessenta do século passado, da influência dos relatórios
Kinsey, artificialmente construídos, ideologicamente motivados e moralmente
desencaminhadores, bem como da incomparável história de sucesso do movimento gay
internacional.[xi]

É, ao mesmo tempo, impressionante e consternador verificar a coerência com que tais objetivos
foram e são perseguidos. Acima de tudo, aflige-nos as estratégias inescrupulosamente
empregadas para a consecução dos mesmos. Em tempo relativamente curto, o movimento gay
conseguiu não apenas tornar o homossexualismo aceito na sociedade, mas também apresentá-lo
como modo de vida normal ou até mesmo preferível, o que, entretanto, contrasta radicalmente
com a realidade da vida homossexual e com seus desdobramentos físicos e psíquicos.[xii]

Amplos setores da sociedade, particularmente o político, deixaram-se instrumentalizar e


doutrinar pelo movimento gay. Um exemplo disso é a resolução do parlamento europeu, de 18
de janeiro de 2006. Não apenas na lógica, mas também na escolha dos termos, fica patente
como a maioria dos parlamentares se identifica enfaticamente com as reivindicações e os
interesses do movimento gay. Trata-se de “extirpar a homofobia” e condenar “qualquer
discriminação com base na orientação sexual”. Na verdade, nem a resolução aprovada nem as
propostas das diversas bancadas chegaram ao ponto de “exigir uma proibição da Bíblia e do
Alcorão como literatura de agitação homofóbica. Porém, é possível que, mais cedo ou mais
tarde, haja um encaminhamento nessa direção”.[xiii]

De acordo com G. Salina, vice-presidente da associação Eurocristians, 120 membros do


parlamento europeu pertencem ao Gay and Lesbian Intergroup. Comentando as mais recentes
mudanças de perspectiva no parlamento europeu, ele afirma: “Se continuar assim, ninguém
mais – nem o Papa, nem outra pessoa – poderá criticar práticas homossexuais, porque incorreria
imediatamente na transgressão da homofobia”. É verdade que essa resolução não tem cunho
obrigatório para os governos de cada país. “Os países-membros podem até mesmo ignorá-la,
mas os diversos tribunais constitucionais empregam as resoluções do parlamento europeu como
fonte de direito”.[xiv]

Também no Senado Federal Brasileiro está tramitando o projeto de “lei da homofobia” (PLC
122/2006). A proposta, iniciada e já aprovada, em 23 de novembro de 2006, na Câmara dos
Deputados (PL 5003-B, de 2001), pretende punir como crime qualquer tipo de reprovação ao
homossexualismo.[xv] Segundo explica a advogada e presidente da Federação Paulista dos
Movimentos em Defesa da Vida, Maria das Dores Dolly Guimarães, “além dos direitos
previstos na Constituição para todas as pessoas, o homossexual, pelo simples fato de ser
homossexual, ganhará privilégios. O homossexualismo deixará der ser um vício para ser um
mérito. E quem ousar criticar tal conduta será tratado como criminoso”. A advogada enfatiza
ainda que “os primeiros a sofrerem perseguição serão os cristãos”, citando como exemplo
alguns artigos da lei. “A proposta pretende punir, com 2 a 5 anos de reclusão, aquele que ousar
proibir ou impedir a prática pública de uma ato obsceno (“manifestação de afetividade”) por
homossexuais (art. 7). A conduta de um sacerdote que, numa homilia, condenar o
homossexualismo, poderá ser enquadrada no artigo 8: “ação [...] constrangedora [...] de moral,
ética, filosófica ou psicológica”, explica. “A punição para o reitor de um seminário que não
admitir o ingresso de um aluno homossexual está prevista para 3 a 5 anos de reclusão (art. 5)”.
[xvi]

Essa submissão solícita e servil aos ditames do movimento gay foi um dos fatores que
contribuíram para dissolver o cânone vigente de valores, criando, assim, as premissas para uma
transformação radical da sociedade, com previsíveis consequências nefastas para a mesma. D.
Prager, por exemplo, define a civilização ocidental, à luz da tradição judaico-cristã, como uma
“conquista extremamente complexa e única. Ela demandou uma constante renúncia à satisfação
imediata e um controle dos instintos naturais. O fundamento dessa civilização é a integridade da
vida familiar. A aceitação do homossexualismo como equivalente ao amor conjugal
heterossexual constitui um sinal tão seguro da decadência da tradição ocidental quanto a
rejeição do homossexualismo e outras formas de sexualidade não-conjugal possibilitou o
surgimento dessa civilização”.[xvii]

Na análise dessa reviravolta, vozes e estudos científicos que não correspondem ao que é
considerado “politicamente correto” são ignorados, rechaçados, condenados e até punidos,
porque supostamente difamam e discriminam uma minoria e seus direitos.[xviii] “A retórica da
tolerância vira ditadura de opinião. Aqui, revela-se o caráter ideológico e ditatorial que conecta
a “nova ideologia do mal” com as demais “ideologias do mal”.[xix] Com efeito, em seu último
livro, “Memória e Identidade”, o Papa João Paulo II definiu tanto o marxismo como também o
nacional-socialismo como “ideologias do mal”.[xx] O mesmo pontífice levanta ali a formidável
pergunta, se também na atualidade haveria a ação de uma “nova ideologia do mal, mais
traiçoeira e dissimulada que as ideologias fracassadas do século passado”.

O finado Papa cita inicialmente, como concretização da “nova ideologia do mal”, a “negação
legal de seres humanos gerados, porém ainda não nascidos”, deliberada por parlamentos
democraticamente eleitos, “em que as pessoas se reportam ao avanço civil das sociedades e da
humanidade toda”. Como mais uma concretização dessa “nova ideologia do mal” ele considera
o reconhecimento de uniões homossexuais, obtido mediante forte pressão do parlamento
europeu, como forma alternativa de família “que também possui o direito de adotar crianças”.

A destrutiva hostilidade diante da vida, característica das conhecidas “ideologias do mal”,


marxismo e nacional-socialismo, prolonga-se, para João Paulo II, na negação de milhões de
vidas humanas no ventre da própria mãe e, por fim, dirige-se “contra o ser humano e a família”
como premissa insubstituível para a continuidade da vida humana. Isso não acontece, como no
marxismo e no nacional-socialismo, contra o direito e as leis, mas através da alegação de “valer-
se dos direitos humanos”.[xxi] Contudo, não existe, nem na vida pública nem na privada, um
direito humano ao homossexualismo, visto que cada direito humano pressupõe que seu
conteúdo seja algo objetivamente valioso, o que, por diversas razões, não coaduna com o
homossexualismo. Ele viola, de modo peculiar, as “esferas dos bens da união, da
complementaridade entre homem e mulher e do horizonte de sentido da procriação, aos quais a
sexualidade humana está ligada. Em favor de um comportamento avesso à natureza e contrário
ao sentido da sexualidade humana, não se pode reivindicar nenhum direito humano”.[xxii]

Na medida em que a Igreja está inserida no mundo e vice-versa, não surpreende o fato de que
essa mudança forçada de mentalidade em relação à homossexualidade e sua avaliação tenham
penetrado as estruturas eclesiais, produzindo efeitos desastrosos. Não por último, tal mudança
encoraja sacerdotes e candidatos ao ministério ordenado a confessarem publicamente suas
tendências homossexuais, ou seja, a “se assumirem”.

Alarmantes são, contudo, os números desproporcionalmente altos, em comparação com a


população geral,[xxiii] de seminaristas, sacerdotes e religiosos com tendências e também
práticas homossexuais, apurados nos EUA, no mundo de língua alemã e no Brasil. Ainda que
seja controversa a quantidade exata, o fato como tal não pode ser negado.

Conforme Richard Sipe, entre 1978 e 1985, os relatos sobre homossexualismo no clero dos
EUA aumentaram tão significativamente que passaram a girar em torno de 38 a 42%. “Entre
1982 e 1985, vários informantes, dentre os quais nenhum tinha tendência ou era
homossexualmente ativo, estimaram que, em suas áreas, os homossexuais perfaziam pouco
menos de 50%. No mesmo período, obtive suficientes informações de dois pequenos subgrupos
separados, para poder confirmar que 50% se enquadravam na categoria dos homossexuais”.
[xxiv]

Acerca desses e de outros dados apurados e de sua credibilidade, Sipe observa: “Alguns
provinciais e peritos examinaram todas as minhas estimativas, tanto durante a elaboração de
meu estudo quanto depois de sua conclusão, considerando-a adequada. Mais de um bispo
confirmou que meus dados coincidiam completamente com suas próprias experiências. Em 28
de maio de 1993, o Cardeal José Sanchez, prefeito da Congregação vaticana para o Clero,
afirmou diante das câmeras da BBC, respondendo a uma verificação de minhas estimativas
sobre o celibato em relação ao posicionamento sexual de sacerdotes norte-americanos: ‘Não
tenho motivos para duvidar do acerto desses dados’”.[xxv]

Em congregações religiosas, a parcela dos que têm inclinações homossexuais parece ser ainda
maior. Donald Cozzens informa sobre um sacerdote, com grande experiência tanto na formação
como também na direção, que declarou publicamente, numa conferência sobre AIDS e missão
da Igreja, que 80% de sua numerosa congregação, localizada na costa Leste, são gays.[xxvi] Em
outra ocasião, ele fala de pelo menos uma comunidade da mesma congregação, situada a Oeste,
em que se realiza uma sessão para membros gays quando a comunidade se reúne.[xxvii]

Se esses dados e informações dos EUA forem corretos, pelo menos de forma aproximada, a
Igreja Católica está criando aí um clero em que predominam as pessoas de tendências
homossexuais. “Está em discussão, no início do séc. XXI, a crescente idéia – que raramente é
questionada por aqueles que conhecem o estado clerical – de que o ministério sacerdotal é, ou
está em vias de se tornar, uma profissão para gays”.[xxviii]

Para a Alemanha e a área de abrangência do idioma alemão, bem como para o Brasil, as
estimativas estão ao redor de 20 a 25%, com tendência de alta.[xxix] “Por isso, os conhecedores
dizem sarcasticamente que a maior organização gay internacional seria, afinal, a própria Igreja
Católica Romana. Se todos se assumissem e depois fossem expulsos”, diz N. Katzenbach, do
grupo de trabalho ecumênico ‘Homossexualismo e Igreja’, “o Vaticano poderia fechar as
portas”.[xxx]

Uma vez que não existe uma explicação monocausal para essa reviravolta, ela não é apenas
provocada conjuntamente pela sociedade, mas, em proporção não desprezível, gerada no âmbito
da própria Igreja. Muitas lideranças na Igreja agiram e agem de modo inconsciente e negligente,
por meio de uma prática, doutrina e pregação baseadas em conceitos, incorretamente
entendidos, de amor e tolerância, e, por último, negando a realidade, minimizando-a,
silenciando e tentando procrastinar o decidido enfrentamento do problema. Isso, porém, não
serve de desculpa para eles e tampouco os exime de sua responsabilidade.

Outros, em contraposição, agiram e agem de modo intencional e consciente pela adoção de


ideologias e posicionamentos do movimento gay e de uma espiritualidade e teologia que
corresponda aos seus intentos, em franca oposição à doutrina da Igreja. Os “dogmas” do
movimento gay acerca do homossexualismo como disposição imutável, geneticamente
condicionada e, por conseqüência, inerente à identidade do envolvido, em cuja cientificidade
muitos evidentemente acreditam de modo incondicional, são traduzidos para uma terminologia
cristã. Por exemplo, fala-se da homossexualidade como variante ou experiência da criação e
equivalente da natureza, deduzindo-se disso que a homossexualidade deve ser intencionada por
Deus e ser boa, e que deve ser permitido agir de acordo com a natureza.[xxxi]

Por ser inato e, por isso, imutável, o envolvido deve se conscientizar de sua identidade
homossexual e, assim, também aceitar os impulsos provenientes dessa condição, o que significa
principalmente que ele pode e deve integrá-los em sua vida amorosa, como expressa, sem
rodeios, o teólogo e psicoterapeuta W. Muller, numa contribuição para o novo Léxico para
Teologia e Igreja: “Objetivo da pastoral é, pois, ajudar as pessoas a aceitarem sua orientação
homossexual e vivê-la no amor. O engajamento pelos direitos humanos e civis de pessoas
homossexuais pode ser entendido nesse sentido como parte da pastoral. Quando se aprecia hoje
o comportamento homossexual, no contexto de uma relação pessoal, de forma não diferente do
comportamento sexual de pessoas heterossexuais em um relacionamento pessoal, então a
pastoral também considerará tarefa sua ajudar pessoas homossexuais na configuração de uma
parceria homossexual”.[xxxii]

As declarações da Bíblia sobre a homossexualidade são classificadas como pertinentes à época


em que foram escritas, surgidas sob outras condições e premissas, não podendo ser lidas como
mera apreciação do homossexualismo irreversível que encontramos hoje. Por isso, devem ser
continuamente reinterpretadas.[xxxiii] Conforme H. Haag, por exemplo, com base na Bíblia,
não se pode declarar pecaminoso nenhum comportamento sexual, exceto o adultério. “Não
temos nenhuma palavra de Jesus contra a masturbação, contra o relacionamento extraconjugal,
contra a prostituição ou contra o homossexualismo. Tampouco, pode-se deduzir da Bíblia a
monogamia. Ela se tornou algo evidente apenas sob a influência greco-romana. Jesus somente
se pronunciou contra a prática frouxa e morna do divórcio de seu tempo”.[xxxiv]

U. Engel se reporta às exposições de R. Guardini sobre a auto-aceitação e opina que a teologia


gay poderia fazer uso da palavra do Salmo: “O quinhão que me coube é o mais belo” (Sl 16,6b).
Ele interpreta biblicamente o “assumir-se” e todo o movimento gay como “êxodo da casa da
escravidão das normas heterossexuais”.[xxxv]

Nessa oposição à doutrina da Igreja, Michael S. Rose constata o motivo decisivo para o número
desproporcionalmente elevado e crescente de seminaristas, sacerdotes e religiosos com
tendências e práticas homossexuais: “Bispos e padres responsáveis pela formação de
presbíteros, com demasiada freqüência, dão um mau exemplo, sobrepondo-se simplesmente à
moral sexual claramente proclamada pela Igreja, uma Igreja à qual prometeram servir. Constitui
um escândalo de proporções imensuráveis que é, pelo menos, cem vezes pior do que aquilo que
os meios de comunicação já desvendaram”.[xxxvi] Rose cita páginas de exemplos de candidatos
ao sacerdócio que não foram aprovados nos testes psicológicos, por causa de sua moral sexual
afirmadora das opiniões da Igreja. Tais testes psicológicos, muitas vezes, foram elaborados e
aplicados por psicólogos ateus, distantes da Igreja ou até mesmo hostis a ela. Nas avaliações dos
referidos candidatos, cuja conduta sexual parecia coadunar com a moral cristã, constava:
“sexualmente subdesenvolvido” ou “dogmático demais”. Quem confessa ser a favor do celibato
e se nega a considerar o homossexualismo como algo normal é considerado como alguém que
apresenta sinais de perversidade sexual.

Essa flagrante discriminação de seminaristas heterossexuais leva, de modo praticamente


forçoso, à formação de uma subcultura homossexual e à constituição de redes homossexuais nos
seminários[xxxvii] e, por conseqüência, também no clero,[xxxviii] o que, por sua vez, exerce
um efeito desestabilizador e repelente sobre seminaristas e presbíteros heterossexuais, causando,
não raro, o êxodo dos mesmos. Deu-se, assim, um passo decisivo no caminho para a
“homossexualização” do clero.

Sem saber como lidar com essa situação, muitos bispos se voltaram sem rodeios à negação.
Uma das consequências desse mecanismo psicológico de defesa é a tolerância de casas
paroquiais e seminários “cor-de-rosa”. Além disso, muitos bispos carecem de autoconfiança
intelectual para discutir com o poder acadêmico em seminários e faculdades teológicas.[xxxix]

Um estudo publicado no final de março de 2008 cita 96 faculdades e universidades católicas em


que existem núcleos que lutam sistematicamente em favor dos interesses dos homossexuais.
“Muitos desses núcleos partilham dos objetivos radicais do movimento gay”, dizem os autores
da pesquisa. “O propósito do lobby é aumentar, mediante pressão maciça, a aceitação social
entre cristãos da América do Norte e inibir manifestações de opinião que não coadunam com a
agenda ideológica do movimento. 45% das 211 faculdades católicas informam, em seus sites,
sobre organizações e eventos do lobby homossexual realizados em suas dependências. Entre
elas, algumas instituições da Ordem dos Jesuítas constituem estatisticamente o grupo de ponta
(23). De acordo com o estudo, também em universidades dos Dominicanos e de outras Ordens,
tanto seus dirigentes quanto seus estudantes se mostram identificados com os objetivos do
movimento gay”.[xl]

Em vista da marcante observação de que, nos EUA dos anos 70, homens homossexuais afluíram
aos seminários, fazendo com que os números disparassem, não se pode descartar que também
forças de fora da Igreja Católica Romana contribuíram intencionalmente para esse
desenvolvimento,[xli] precisamente na época em que o movimento gay começou, após formular
seus objetivos, com a “marcha pelas instituições”. Seria tão somente coerente que essa
“marcha” tivesse incluído a Igreja como adversária declarada dos objetivos propagados.[xlii]

Os casos de abuso sexual de menores por parte de sacerdotes e religiosos, que nos anos
passados causaram à Igreja um imenso dano moral e financeiro, estão estreitamente ligados à
evolução acima delineada, o que é negado com veemência pelo lado envolvido, mas que é
inegável sob uma observação e análise objetivas e sóbrias dos fatos.

Diante da pergunta pelas conclusões que se devem tirar dos dados oferecidos pelos relatórios
John Jay, de 2002, confeccionados a pedido da Conferência Episcopal norte-americana, 80 a
90% dos padres, que nos últimos 52 anos abusaram sexualmente de menores, se envolveram
com rapazes adolescentes entre 14 e 17 anos – efebofilia – e não com meninos pré-pubescentes
– pedofilia – R. Fitzgibbons, eminente representante da Associação Médica Católica dos EUA e
recém-nomeado consultor da Congregação para o Clero, respondeu: “Os relatórios John Jay
mostraram claramente que não existe na Igreja uma crise de pedofilia, mas de
homossexualismo. A maioria das vítimas não era de crianças, mas de jovens adolescentes.
Espero que esse esclarecimento, para considerar o homossexualismo como problema básico
causador da crise, leve a uma série de novos passos para proteger a Igreja, o sacerdócio, bem
como os jovens e as crianças”.[xliii]

Para Antonio Moser, é notório que esses escândalos aconteçam primordialmente no mundo
anglo-saxão que, no passado, se destacava por seu rigor ético e hoje por seu consumo
desenfreado, pela busca incontida de “auto-realização” e “felicidade”, bem como de uma
supremacia jamais vista. “É de se perguntar se a incidência mais numerosa justamente nestas
nações do hemisfério norte se constitui numa mera casualidade, ou se já não é um indicador de
sociedades aparentemente pujantes, mas na realidade decadentes”.[xliv]

As medidas que foram aprovadas por diversas conferências nacionais episcopais, depois da
notícia dos casos de abuso sexual, não podem encobrir o fato de que, em última análise, foram
tomadas por exigência de fora, da sociedade e dos meios de comunicação, o que desnuda uma
violação do dever de muitos bispos. Igualmente, tais medidas podem ser consideradas apenas
como os primeiros passos, ainda vacilantes, de um processo abrangente de purificação e
renovação da Igreja. Seria uma ilusão nefasta crer que medidas administrativas sozinhas são
capazes de solucionar os problemas explicitados. Irrenunciável, no entanto, é retornar à
consideração da “plenitude total da verdade cristã referente à moral sexual”, demandada pelo
Papa João Paulo II, na explicitação da doutrina e em todos os níveis da Igreja, incluindo um
resoluto exercício do poder diretivo por parte dos respectivos ordinários.

3. A homossexualidade na perspectiva bíblica e nas declarações do Magistério

O testemunho das Sagradas Escrituras é inequívoco: nem no Antigo nem no Novo Testamento
encontra-se uma única apreciação positiva da prática do homossexualismo. Pelo contrário, ele é
incontestavelmente rejeitado e condenado como delito grave.[xlv] Essa posição e avaliação
negativa não devem ser entendidas como reação contra a prostituição homossexual sacral, como
pensa, por exemplo, H. J. Schoeps,[xlvi] mas é decorrência lógica da imagem que a Sagrada
Escritura tem de Deus, bem como de suas afirmações sobre a natureza e destinação do ser
humano, da sexualidade, do matrimônio e do pecado, expostas principalmente em Gênesis 1-3.

W. Führer frisa que a proibição estrita ao homossexualismo no Antigo Testamento se situa no


contexto das leis matrimoniais, bem como no fato de que, no centro do código de santidade, está
a “incansavelmente repetida fórmula de auto-apresentação”: “Eu sou o Senhor, vosso Deus”.
“Desses dados resulta que a proibição estrita do relacionamento entre sexos iguais está
alicerçada no Primeiro Mandamento e representa uma diretriz ética do Sexto Mandamento. Ser
santo significa, no contexto de Levítico 17-26, pertencer unicamente a Deus, que é Santo. A
exigência: ‘Sereis santos, porque eu sou santo, o Senhor, vosso Deus’ (Lv 19,2) exclui
peremptoriamente a prática homossexual como incompatível com a existência perante Deus e
com a pertença ao seu povo. Asselvajamento e desencaminhamento sexual constituem marcas
dos cananeus, que foram expulsos por Israel como punição por sua culpa (Gn 15,16). Não
apenas na família extensa dos tempos do nomadismo, mas também e justamente depois do
exílio babilônico, a relação com Deus não pode ser preservada incólume e a congregação do
povo de Deus não pode ser construída, se a proibição do relacionamento homossexual não vale
de modo inviolável. É justamente isso que se expressa em Levítico 18,22 e se repete em
Levítico 20,13, com vistas ao direito penal vigente em Israel. A condenação ao
homossexualismo está alicerçada na fé em Deus, que se revelou no Monte Sinai. É uma
conseqüência que foi tirada, e tinha de ser tirada, do Primeiro e Sexto Mandamentos, porque
sem a proibição da libidinagem não é possível que o povo de Deus tenha um ‘comportamento
condizente com a aliança’ diante de Deus”.[xlvii]

Também para Moser, essa negação categórica ao homossexualismo não remete apenas ao nível
moral, mas também diretamente ao teológico: “No início havia o caos, ou seja, não havia
diferenciação, mas uma mistura desordenada de elementos; Deus começa a colocar ordem,
justamente estabelecendo a diferenciação dos elementos: terra, ar, água… A expressão máxima
da diferenciação organizadora e fecunda encontra-se justamente na diferenciação sexual: Ele os
criou homem e mulher. Ora, o homossexualismo, na compreensão do Levítico, é a expressão de
uma certa volta atrás, da confusão e da esterilidade. Acontece que esquecer a diferença é
também a expressão da idolatria daqueles que esquecem a condição criatural para se igualarem
a Deus, ou então tomam criaturas como se fossem o Criador. Na compreensão bíblica, o
reconhecimento da diferença sexual descentraliza o sujeito de si mesmo e lhe mostra seus
limites; já o desconhecimento desta diferença ameaça aprisionar a pessoa no círculo encantado e
mortal de si mesmo”.[xlviii]

As afirmações e orientações do Antigo Testamento são confirmadas por Jesus Cristo. Seu
silêncio sobre a homossexualidade, muitas vezes destacado e enfatizado na atual discussão, é,
na realidade, um silêncio muito eloqüente, que de forma alguma pode ser interpretado como
aprovação ou como indício de que a questão é irrelevante para seu pensar, agir e ensinar.[xlix]

Sem se reportar a Gênesis 1-3 e às correlações fundamentais ali explicitadas, não é possível
realizar uma exegese teologicamente coerente das afirmações do Antigo e Novo Testamentos
sobre a homossexualidade. O nexo abrangente e a localização no respectivo contexto são
determinantes para a formação de juízo dos documentos bíblicos acerca do tema. São somente
eles que fornecem e atribuem significado a cada afirmação. No entanto, quando uma passagem
for privada de seu contexto pela citação isolada, estará entregue indefesa à arbitrariedade
hermenêutica do leitor.

Contra a acusação de um pensamento “a-histórico” e “fundamentalista”, sempre de novo


imputada à posição da Igreja em relação às declarações bíblicas sobre o homossexualismo, é
preciso salientar que não pensa de forma a-histórica quem analisa com precisão a partir do
contexto bíblico geral e com conhecimentos históricos, mas sim, aquele que, sem justificativa
plausível, descarta e condena afirmações bíblicas cabalmente como “circunscritas à época”.[l]

A reinterpretação arbitrária de afirmações bíblicas acontece sem consideração pela tradição


exegética da Igreja. A Bíblia, no entanto, não pode ser entendida em seu sentido real, se for
interpretada de uma forma que contradiz a tradição viva da Igreja. Sua interpretação, para ser
correta, tem de estar em consonância verdadeira com essa tradição. Por isso, para a exegese de
uma passagem da Bíblia, é sempre importante verificar como, nos primeiros séculos, os Padres
da Igreja a entenderam, uma vez que, afinal, estiveram mais próximos desses escritos. É
estranho “que a maioria dos comentários modernos, particularmente em idioma alemão e inglês,
ignore os Padres da Igreja”.[li] Uma reinterpretação arbitrária despreza, ademais, um princípio
de interpretação das Escrituras, que foi expressamente enfatizado e ensinado pelo Concílio
Vaticano II: “O ofício de interpretar autenticamente a Palavra de Deus foi confiado unicamente
ao Magistério Vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus Cristo” (DV 10).

De acordo com o testemunho de toda a Bíblia, a prática da homossexualidade é contrária à


criação e contradiz a ordem intencionada e estabelecida por Deus. “A diferenciação entre a
norma e a conduta que dela se desvia não pode ser abandonada pela Igreja. Nesse ponto, situa-
se o limite para uma Igreja cristã que se sabe atrelada à autoridade da Escritura. Quem a
pressiona a alterar a norma de sua doutrina nessa questão tem de saber que promove sua cisão.
Porque uma Igreja que se deixasse pressionar a não mais tratar a atividade homossexual como
desvio da norma bíblica, reconhecendo convivências homossexuais como uma forma de
comunhão de amor interpessoal equiparada ao matrimônio, já não estaria firmada no chão da
Escritura, mas contraposta a seu testemunho unânime”.[lii]

Ainda que não seja um tema predominante na Bíblia, o homossexualismo e sua inequívoca
rejeição por ela não são algo marginal que pudesse ser negligenciado como secundário. Quem
exige que o homossexualismo seja reconhecido como variante equivalente da criação ao lado da
heterossexualidade visa, na prática, uma imagem do ser humano diferente e que diverge da
mensagem bíblica. Tais exigências e intenções tentam alvejar o âmago da criação e, por isso, se
voltam, consciente ou inconscientemente, contra o próprio Criador. “O ser humano se rebela
contra milênios de história da humanidade, contra sua própria natureza. Ele reinventa a si
mesmo. Luta contra seu Criador. Não deseja ser imagem dele, mas seu próprio criador e
senhor”.[liii] Em decorrência, pode-se decididamente falar de uma espécie de “antigênesis”, de
um “contraprojeto”, contra a “gramática da vida” concebida e intencionada por Deus.[liv]

No seu discurso dirigido aos membros da Cúria Romana e do governo da Cidade de Vaticano, a
22 de dezembro de 2008, o Papa Bento XVI tocou também neste assunto, pronunciando-se com
toda a clareza: “O que, com freqüência, se expressa e entende com o termo “gender” sintetiza-
se, em definitivo, na auto-emancipação do homem da criação do Criador. O homem quer fazer-
se por sua conta e decidir sempre e exclusivamente sozinho sobre o que lhe afeta. Mas, deste
modo, vive contra a verdade, vive contra o Espírito Criador. Os bosques tropicais merecem,
certamente, nossa proteção, mas não menos a merece o homem como criatura, no qual está
inscrita uma mensagem que não contradiz a nossa liberdade, mas que é a sua condição”.[lv] Por
isso, a Igreja tem que defender não somente a terra, a água, o ar, como dons da criação que
pertencem a todos, mas tem que proteger o homem contra sua própria destruição. “É necessário
que haja algo como uma ecologia do homem, entendida no sentido justo. Quando a Igreja fala
da natureza humana como homem e mulher e pede que se respeite esta ordem da criação, não
está expondo uma metafísica superada. Aqui se trata, de fato, da fé no Criador e da escuta da
linguagem da criação, cujo desprezo significaria uma autodestruição do homem e, portanto, uma
destruição da própria ordem de Deus”.[lvi]
Apesar de todas as unilateralidades e distorções condicionadas pela época na história da teologia
que, no entanto, jamais representaram a “corrente principal” na Igreja e na construção do saber
teológico, ficou preservada a linha fundamental preestabelecida pela Bíblia.[lvii] Foi somente
em tempos mais recentes que também teólogos católicos a abandonaram, sendo que
inicialmente se amoleceu o juízo moral por meio de uma indevida psicologização do
comportamento ético e, finalmente, tentou-se obter a fundamentação de tal juízo atenuado por
meio de interpretação desviante das afirmações das Sagradas Escrituras. Justamente as
considerações acerca das passagens bíblicas de Gn 19,1-29; Jz 19,13-48; Lv 18,22; 20,13; Rm
1,26s; 1Cor 6,9-11; 1Tm 1,10 explicitam, na ponderação das mais diferentes posições
exegéticas e teológico-morais, o quanto a própria Bíblia, em seu trato seletivo, se torna um
documento meramente condicionado pelo seu tempo, sem afirmações substanciais sobre
questões essenciais e que pode ser moldado e pressionado ao bel-prazer até que corresponda às
próprias idéias dos interessados. A exegese se torna “eisegese”.

As insistentes e repetidas exortações nos documentos do Magistério eclesiástico, sobretudo aos


bispos para que cumpram sua responsabilidade na pregação plena do ensinamento eclesiástico
acerca da moral sexual, contêm implicitamente a constatação de que, no caso, bispos faltaram
na necessária determinação, com graves consequências negativas para a Igreja.[lviii]

4. Homossexualidade e suas causas na visão das ciências humanas

Desde que, em 1973, a Associação Psiquiátrica Norte-americana (APA) retirou a


homossexualidade de sua lista de distúrbios psíquicos, sob pressão do movimento gay e não
com base em novas teorias científicas,[lix] a pesquisa sobre as causas do problema foi cada vez
mais onerada ideologicamente. Duas reivindicações de resultados unilateralmente favoráveis à
ideologia gay parecem ter contribuído para a acentuada distorção da compreensão da
homossexualidade: A primeira consiste em afirmar que não se pode levantar características
negativas de personalidade associadas à homossexualidade. A segunda compreende a
homossexualidade como algo diretamente herdado. A discussão sobre a homossexualidade foi e
está sendo conduzida até hoje sob a pressão dessas premissas do movimento gay. Não será fácil
encontrar casos comparáveis na história da ciência moderna, sobretudo nos países livres, onde o
cerceamento do trabalho foi e continua sendo promovido por motivos políticos e ideológicos,
por tanto tempo e com tanta eficácia como no caso do homossexualismo e de suas causas.[lx]

Nenhum dos estudos existentes até agora, que tentaram comprovar fatores biológicos como
causa principal da homossexualidade, pode ser apresentado como definitivo. Tais estudos são,
na melhor das hipóteses, meramente especulativos. Além de não serem livres de contradições,
seus resultados não foram repetidos e confirmados até o presente por outras pesquisas
independentes. Com efeito, a confirmação dos resultados com base em outras pesquisas
constitui-se numa exigência irrenunciável da investigação científica.[lxi] Em seu parecer para o
governo federal alemão, o sociólogo M. Dannecker, cuja identificação com a ideologia gay é de
todos conhecida, também constata: “Todas as tentativas realizadas no passado de ancorar
biologicamente a homossexualidade precisam ser classificadas como fracassadas”.[lxii]

A procura por peculiaridades hormonais ou neuroanatômicas em pessoas de tendências


homossexuais revela uma mentalidade do séc. XIX, segundo a qual as divergências da norma
são originárias de anormalidades no cérebro, que, ademais, são hereditárias. Contudo, não existe
nenhum fundamento científico para, em princípio, não considerar fisicamente normais e
saudáveis pessoas com tendências homossexuais. Várias pessoas que procuram por uma causa
genética da homossexualidade parecem já não acreditar mais na existência de um “gene gay”.
Por exemplo, o próprio D. H. Hamer, já festejado como o descobridor do “gene gay”, admite:
“Não esperamos encontrar (no futuro) um gene que seja igual em todos os homens
homossexuais, a saber, um que esteja ligado à orientação sexual”.[lxiii]
Também o papel, do ponto de vista dos genes, parece se modificar. Se anteriormente eram os
principais determinantes, hoje os genes são contados mais como fatores que predispõem para o
desenvolvimento em direção à homossexualidade. Com isso, no fundo, admite-se tacitamente
que os principais motivos e as causas decisivas se situam na história da vida do indivíduo.[lxiv]
No entanto, quando os fatores e explicações psicológicos realmente recebem atenção nos
estudos sobre as causas biológicas da homossexualidade, em geral são descartados como
secundários. Muitas vezes, nem sequer são mencionados. Isso aponta para o desconhecimento
que leva a não querer conceder à psicologia o peso que lhe cabe, ou para a indisposição, ou
ainda para ambas as coisas.

A pesquisa sobre as causas da homossexualidade é, muitas vezes, realizada por cientistas com
tendências e práticas homossexuais, “muitos dos quais são, pelo menos em parte, motivados
pelo desejo de demonstrar que são normais ou de justificar seu estilo de vida: A ‘ciência’ é
considerada como poderoso instrumento para tal”.[lxv]

Ainda que fossem comprovadas causas biológicas da homossexualidade, o que, no entanto, se


tornou improvável em virtude dos estudos dos últimos anos, não resultaria daí,
automaticamente, que a homossexualidade é “natural”, no sentido de ser condizente com a
natureza criada, que ela é desejável ou que sua prática se justifica eticamente. “Quando se
identifica a ‘natureza existente’ com a ‘criação de Deus’, tudo o que ‘se formou naturalmente’ é
transformado em ‘criado e querido por Deus’. Uma equiparação dessas entre a natureza e a obra
de Deus nega que na natureza nos deparamos não apenas com a criação intencionada por ele,
mas igualmente com o mal que a corrompe, que Deus não criou nem intencionou. Na
perspectiva ética, cai-se numa ‘conclusão falaciosa naturalista’, porque se deduz do ‘existente’
que ele também deve ser e – em perspectiva teológica – corresponde à vontade de Deus”.[lxvi]

Quem, até o momento, ainda não se ocupou suficientemente da homossexualidade na


perspectiva psicológica, tende a surpreender-se com as afirmações dos clássicos da psicologia:
Sigmund Freud, Wilhelm Stekel, Alfred Adler e Carl Gustav Jung, que não a consideraram
como normal no sentido de uma variante equivalente da natureza humana.[lxvii] Especialmente
importante, bem como persistentemente válida e atual, vem a ser a descoberta de Adler acerca
da homossexualidade como inferioridade sexual, que conduz de maneiras distintas a déficits de
personalidade. Os atuais conceitos norte-americanos “impaired gender identity” [identidade de
gênero diminuída] e “gender nonconformity” [não-conformidade de gênero], no fundo, não
fazem outra coisa a não ser confirmar o conceito e as acertadas percepções de Adler.

Estritamente ligado a essa observação da homossexualidade como inferioridade sexual está o


reconhecimento de que o desejo homossexual constitui uma forma patológica de busca da
masculinidade. Trata-se, portanto, de uma tentativa irrealista de contrabalançar esse déficit.
Uma “reparação” da não-masculinidade que, no entanto, por estar baseada sobre um sentimento
duradouro de inferioridade, não pode ser bem-sucedida e fracassa quanto mais vezes for
ensaiada, degenerando em um sentimento de compulsão. Essa constelação, chamada por Adler
de complexo de inferioridade, impede que a respectiva pessoa se torne adulta, por se tratar de
uma fuga da identidade masculina ou feminina.

A homossexualidade adquirida é psicologicamente explicável. Já em 1932, o Prof. Dr. Harald


Schultz-Henke, um dos grandes nomes da psiquiatria alemã, posicionou-se a favor de uma
“explicação cabalmente psicológica” da homossexualidade.[lxviii] Seu posicionamento atraiu a
adesão de pesquisadores e terapeutas como Gerard van den Aardweg, Lawrence Hatterer,
Joseph Nicolosi e Richard Fitzgibbons.[lxix] Para eles, não é fácil ensinar e, consequentemente,
agir contra a corrente psicológica dominante, desde que a pesquisa sobre as causas da
homossexualidade foi cada vez mais onerada e distorcida ideologicamente.
Entre as causas da homossexualidade estão, aparentemente, em primeiro lugar, relacionamentos
mal-sucedidos. Gender nonconformity / impaired gender identity na infância constitui, segundo
ampla concordância, o fator isolado mais frequente, associado à homossexualidade. Uma
autoanálise sincera dos envolvidos resulta na constatação de que os mesmos eram diferentes em
relação às demais crianças nos sentimentos e no comportamento e se sentiam inferiorizados no
mundo dos rapazes ou homens, e excluídos dele.[lxx] Em segundo lugar, ocupa um papel
importante o relacionamento com a figura paterna. Uma apreciação de diversos estudos
empíricos chega à conclusão de que, com poucas exceções, o homossexual masculino declarou
que o pai tinha uma influência negativa sobre sua vida e/ou era emocionalmente ausente.[lxxi]
Com freqüência, em pessoas com tendências homossexuais, ocorrem relacionamentos
patológicos mãe-filho, em diversas variantes, que não foram superados.

As impressões de inferioridade e isolamento no mundo de rapazes ou homens levam à


admiração, romantização e erotização do mesmo sexo. Tais consequências podem desencadear
desejos homossexuais que, potencializados na vivência concreta dos indivíduos, são sintomas de
uma crise mais profunda de identidade. Não escolhidos e intencionados conscientemente, tais
desejos se constituem como um distúrbio de personalidade, adquirindo aos poucos uma
progressiva autonomia, de modo que a pessoa implicada torna-se refém de uma mania sexual.

Por natureza e origem, a homossexualidade não é um problema sexual, mas um problema de


identidade, por meio do qual diversos âmbitos do crescimento da personalidade são bloqueados.
Isso se revela em determinadas formas de conduta das pessoas envolvidas. Ainda que essas
formas de conduta não se verifiquem de modo idêntico em todas as pessoas implicadas, elas,
contudo, ocorrem com tanta freqüência que podem ser consideradas típicas.[lxxii] A
personalidade de pessoas com tendências homossexuais é determinada por forças que atuam
umas contra as outras. Ao lado da personalidade desenvolvida normalmente, atua um lado
imaturo da personalidade em geral: a “criança interior” que estagnou em um patamar e que
influi juntamente no pensamento, nas emoções e na conduta da pessoa adulta.[lxxiii] Como
decorrência da presença e atuação da “criança interior” na pessoa de tendência homossexual, o
egocentrismo e a ocupação narcisista consigo mesmo passam a ter um espaço determinante. O
adulto continua cativo de um egocentrismo infantil, o que pode levar a que uma pessoa, em
última análise, vise a si própria em tudo o que faz.

Estreitamente ligados a esse egocentrismo, estão, muitas vezes, a falta de companheirismo, a


desconfiança, a mania de dominação, a tendência à autoacusação e à autodramatização, a
hipersensibilidade, a facilidade de ser magoado e ferido, o ciúme, sentimentos de vingança e
frieza, atitudes rebeldes, bem como, principalmente naqueles que vivem um homossexualismo
ativo, uma tendência exacerbada a adquirir certas características de personalidade classificáveis
de psicopatas, como desonestidade e dissimulação etc. Fica evidente que tais características
denotam também uma capacidade fortemente diminuída de manter sadios relacionamentos, bem
como uma notável incapacidade de ser sexualmente fiel, como comprovam diversos estudos.

Via de regra, os relacionamentos homossexuais são muito curtos. O estudo de Tuller averiguou
que a maioria desses relacionamentos dura de dois a quatro anos. Somente num dos casos
analisados, a relação durou 7 anos.[lxxiv] Conforme E. Lauman, um morador urbano que vive
homossexualmente passa tipicamente a maior parte de sua vida adulta em relacionamentos de
curta duração de menos de seis meses.[lxxv] Muitos homens que praticam a homossexualidade
têm, no curso da vida, em média centenas de parceiros sexuais. No estudo sociológico realizado
nos anos 70 sobre homossexuais masculinos, na República Federal da Alemanha, Dannecker e
Reiche chegaram ao resultado de que cifras elevadas de parceiros sexuais são totalmente
normais. “Cada sétimo praticou sexo na vida com mais de 600 homens e, no ano passado, com
mais de 50 homens”.[lxxvi] Bell e Weinberg, em 1978, constataram, num célebre estudo sobre a
homossexualidade masculina e feminina, que 26% dos homens brancos homossexuais
alcançavam de 3 a aproximadamente 100 parceiros sexuais. Cerca da metade (47%) dos
inquiridos teve entre 100 e 1.000 parceiros sexuais. E, aproximadamente, um terço (28%)
assinalavam, em sua biografia, mais de mil parceiros sexuais. 79% indicaram que mais da
metade dos parceiros sexuais eram estranhos. Somente 1% dos homens havia tido menos de 5
parceiros sexuais.[lxxvii] Conforme F. Suppe, o homossexualismo requer seus próprios
princípios, que “se situam em total contraste com a cultura heterossexual”, e nos quais “se
precisa aprender a entender o sexo primordialmente como atividade de lazer, na qual se troca de
parceiro com a mesma ausência de compromisso e facilidade com que se arranja um parceiro
para uma partida de tênis”.[lxxviii]

Sem dúvida, o percentual dos matrimônios sexualmente fiéis está significativamente longe de
100%, mas, apesar disso, é muito grande a diferença entre casais heterossexuais e
relacionamentos homossexuais. Entre homens com vida homossexual é ínfima a probabilidade
de fidelidade por toda a vida. Em termos estatísticos, ela é quase insignificante. “A
promiscuidade entre homens homossexuais não é apenas um preconceito ou somente uma
experiência da maioria. Ela, no fundo, representa a única experiência. Tragicamente, a
fidelidade vitalícia em experiências homossexuais, por assim dizer, não existe”.[lxxix] O
conceito de fidelidade recebe uma nova definição. A fidelidade não precisa necessariamente
significar fidelidade sexual, mas simplesmente o apoio mútuo na vida. Cumpre diferenciar entre
fidelidade social, emocional e sexual, sendo que à fidelidade sexual se atribui uma importância
menor.[lxxx]

À primeira vista, esses fatos parecem contrastar com a muitas vezes observada facilidade de
contato e relacionamento de pessoas com tendências homossexuais, bem como com sua
capacidade de atrair outros e prendê-los a si. Contudo, não se trata de relacionamentos
superficiais, ainda que cordiais, mas de relacionamentos profundos, em que a pessoa pode se
abrir e mostrar-se integralmente. Proximidade, intimidade e confiança, porém, não podem ser
obtidas sem fidelidade, sem a qual, tampouco, se pode alcançar a maturidade. Quem joga uma
fidelidade (sexual) contra a outra (social e emocional) cinde o ser humano e esvazia a palavra
fidelidade. O papel “gay” estorva os contatos humanos genuínos e cria um muro de separação.
A evidenciada abertura e facilidade de contato são meras exterioridades. Essa capacidade
fortemente restrita de relacionamentos e a incapacidade para a fidelidade, com freqüência,
levam ao isolamento, solidão, depressão, alcoolismo e risco de suicídio dos envolvidos.

Outra característica de muitas pessoas de tendência homossexual é o predomínio de sua


emotividade, porque a eficácia da “criança interior” geralmente significa que o ser humano
orienta seu agir primordialmente pelos sentimentos. A destacada emotividade, porém, constitui
a característica de um estágio evolutivo já não condizente com a idade. Também o sentimento
de inferioridade sexual de pessoas com as mesmas tendências geralmente traz implícita uma
falta de autoconfiança e autonomia, pusilanimidade, fraqueza do eu e passividade.[lxxxi] Da
mesma forma, há homens que, embora não manifestem tendências homossexuais, apresentam
sintomas de deficiência emocional, “mas essas carências não são características da
heterossexualidade, sendo-o, porém, do homossexualidade”.[lxxxii]

Muitos homens com tendências homossexuais manifestam uma impetuosa atração por
adolescentes do sexo masculino. Ademais, entre eles, a ocorrência de pedofilia é relativamente
mais frequente do que entre heterossexuais. “Estudos cuidadosos mostram que a pedofilia pode
ser constatada com mais frequência entre homossexuais do que entre heterossexuais. O número
absolutamente maior de casos de pedofilia cometidos por heterossexuais resulta do fato de que
os heterossexuais são muito mais numerosos do que os homossexuais, na proporção aproximada
de 36 para 1. A pedofilia heterossexual em relação à pedofilia homossexual está apenas na
proporção de 11 para 1, o que assinala que a pedofilia ocorre com frequência três vezes maior
entre homossexuais”.[lxxxiii]
A hoje alardeada “normalidade” do homossexualismo não se apóia em nenhuma comprovação
cientifica. De fato, o homossexualismo deve ser considerado como “enfermidade psíquica”,
“distúrbio’ ou “neurose”, independentemente de suas variações terminológicas. Van den
Aardweg justifica assim o termo enfermidade: “A palavra enfermidade, que empreguei para
apontar o caráter compulsório da autocomiseração em pessoas homossexuais, não deveria dar
motivo a mal-entendidos. Normalmente, esse conceito é usado para distúrbios físicos ou
psíquicos que provavelmente possuem causas físicas. Contudo, igualmente serve para designar
distúrbios emocionais com causas psicológicas, porque também nesses casos nos deparamos
com dois elementos essenciais daquilo que normalmente chamamos de enfermidade: a função
insuficiente e anormal de uma parte do corpo ou da psique e o fato de que a respectiva pessoa se
encontra nessa situação sem sua vontade ou responsabilidade. A palavra ‘enfermo’ é usada em
sentido análogo, designando ambas as coisas: distúrbios físicos e psíquicos”.[lxxxiv]

O psiquiatra vienense Erich Ringel diagnosticou a homossexualidade “indubitavelmente como


enfermidade”, como “sintoma neurótico”, “resultante de um desenvolvimento doentio na
infância, que leva a uma estrutura anormal da personalidade na esfera sentimental”. A
homossexualidade constitui, para Ringel, “um exemplo ideal de uma sintomatologia sexual, por
trás da qual se oculta um distúrbio de personalidade”.[lxxxv] Também Wilhelm Frankl fala da
“perversão homossexual” e de “enfermos”.[lxxxvi]

O dogma fundamental do movimento gay, de que a homossexualidade é algo inato e pertence


imutavelmente à natureza e identidade do respectivo envolvido, evidencia-se como elaboração
insustentável, como um conceito político-ideológico sem fundamento biológico, nem
psicológico. Constitui uma vitória para o movimento gay o fato de muitos “crerem” nesse
dogma. Entretanto, por meio de uma terapia, é possível alcançar, para as pessoas envolvidas,
muitos resultados positivos, que vão desde uma atenuação das tendências homossexuais e um
domínio sobre as fantasias sexuais até uma mudança completa rumo à heterossexualidade. Essa
mudança, sem dúvida, mostra-se difícil, mas, de qualquer modo, é possível em número maior do
que se supõe. Importa evitar a falsa alternativa: “ou mudança total ou nenhuma” e ver os
resultados positivos de um processo de mudança ainda não concluído para os envolvidos.

Não se pode deixar de mencionar um relevante estudo sobre esse ponto: o estudo de Spitzer.
[lxxxvii] R.L. Spitzer desempenhou um papel-chave, quando, em 1973, a APA retirou a
homossexualidade da lista dos distúrbios psíquicos. Desde então, ele estava convicto, como
afirmou, de que, por um lado, é possível lutar contra os desejos homossexuais, mas, por outro,
ninguém realmente seria capaz de mudar sua orientação sexual. Por ocasião da conferência
anual da APA de 1999, o mesmo pesquisador se dirigiu a pessoas que, no passado, se
consideravam homossexuais e que protestavam diante da entrada do prédio da conferência em
favor de sua autodeterminação e do direito à mudança. Continuando a ser muito cético quanto à
possibilidade de uma mudança na orientação sexual, ele decidiu que nessa questão obteria
clareza unicamente por meio de uma pesquisa realizada por ele próprio. O resultado desse
estudo é sintetizado por ele como segue: “O estudo mostra que alguns homens gays e algumas
mulheres lésbicas, que se submeteram à terapia restauradora, relatam uma grande transformação
de sua orientação predominantemente homossexual. Essa mudança, com base na terapia
restauradora, não se restringe ao comportamento sexual e à autoidentidade sexual. Essas
mudanças se referem à atração, excitação, fantasia, saudade e irritação por causa de sentimentos
homossexuais. As mudanças se referem aos aspectos axiais da orientação sexual. Também
aqueles participantes que experimentaram apenas uma mudança limitada, apesar disso,
consideram a terapia extremamente útil. Participantes relatam o proveito referente a mudanças
não-sexuais como diminuição da depressão, maior experiência de masculinidade em homens e
feminilidade em mulheres e de um desenvolvimento de relacionamentos íntimos não-sexuais
com pessoas do próprio gênero”.[lxxxviii] Essas mudanças não se constituem, ao contrário do
que se costuma afirmar, como perigosas, não-científicas, muito menos como aéticas ou
desumanas, por “mudarem a polaridade” ou serem forçadas por pressão religiosa. Uma vez que,
num processo de mudança, o ser humano está envolvido em toda sua complexa totalidade,
vários terapeutas recomendam uma síntese de tratamento psíquico, por um lado, e de
espiritualidade e ascese cristã, por outro.

Ao contrário do que vem acontecendo nos EUA, na Europa, poucos terapeutas trabalham com
os envolvidos mediante um processo de mudança, sem deixar de aconselhá-los a aceitarem suas
tendências homossexuais e efetivá-las. Entretanto, é possível prevenir uma evolução em direção
à homossexualidade, como também enfatiza a Associação Médica Católica dos EUA: “Quando
se corresponde suficientemente às necessidades emocionais e evolutivas da criança, seja por
parte da família, seja por parte de seus coetâneos, é pouco provável que se desenvolva nela uma
atração homossexual”.[lxxxix]

5. O Codex Iuris Canonici de 1983 e a Instrução de 2005

Conforme o c. 1024 CIC, somente um homem batizado pode receber validamente o sacramento
da Ordem.[xc] Embora um homem com tendências homossexuais consiga se identificar apenas
deficitariamente com sua masculinidade, ele não deixa de ser homem segundo sua natureza real
e psíquica. Portanto, depois de batizado, o mesmo parece cumprir as duas condições citadas
para ser validamente admitido à Ordenação. Uma compreensão puramente formal da
masculinidade, porém, mostra-se insuficiente no que tange ao sacramento da Ordem e a seu
exercício sensato e frutífero.

J. San José Prisco chama a atenção para o fato de que não são os órgãos sexuais masculinos que
definem a condição de homem ou varão. A condição de homem ou mulher se delineia mediante
a interação de três aspectos fundamentais: “A identidade sexual, o papel sexual e a orientação
sexual. A primeira se refere à percepção individual e à consciência pessoal de ser homem ou
mulher; o papel sexual é o comportamento que o indivíduo denota e que o identifica perante os
outros como homem ou mulher; a orientação sexual se refere à atração erótica que um indivíduo
sente por homens ou mulheres”. Neste sentido, “o candidato estará mais ou menos apto na
medida em que se entender pessoalmente como heterossexual, em que viver assim e se der a
conhecer como tal perante os outros”.[xci]

No entanto, são primordialmente razões teológicas que também evidenciam a homossexualidade


como impedimento real e objetivo para a Ordenação. É significativo, porém, constatar que tais
razões estão praticamente ausentes na discussão atual ou não são levadas a sério nem mesmo
pelos teólogos. Em razão da ausência quase total da perspectiva teológica, uma importante
dimensão permanece em grande medida desfocada e desconsiderada. A pergunta se a
homossexualidade constitui um impedimento concreto à Ordenação não pode ser respondida
exclusivamente com base em descobertas psicológicas, científicas, nem tampouco em
considerações pragmáticas. A Igreja tem de introduzir, com mais vigor, sua especificidade
originária e apresentá-la de forma mais incisiva. Até o presente, isso foi alcançado apenas de
modo insuficiente.

O sacerdote, que atua in persona Christi capitis, tem de representar Cristo não apenas como
pessoa, mas fazê-lo por meio de um agir especificamente masculino: em seu agir como “noivo”
perante sua “noiva”, a Igreja. Se o sinal tem de ser semelhante à realidade sinalizada, cumpre
perguntar se um homem com tendências homossexuais é capaz, de fato, de representar Cristo
nesse agir específico como “noivo” perante sua “noiva”, porque essa relação é algo estranho
para ele. Se nem o sentido nem o simbolismo do sacramento da Ordenação, com seu pano de
fundo masculino-feminino, nem tampouco dados antropológicos fundamentais devem ser
obscurecidos, desfocados, consequentemente negados, através de uma identificação pública
com a cultura gay ou de uma valorização da própria homossexualidade como fonte positiva, isso
pressupõe a masculinidade heterossexual não somente como radicalmente mais sensata, mas até
mesmo como imperiosa.[xcii] Parece hoje mais necessário do que nunca exigir um pensamento
lógico coerente na tarefa de fazer teologia.
As vítimas do abuso sexual de clérigos e religiosos, que, em sua suprema maioria, são
adolescentes pós-pubescentes masculinos, evidenciaram a homossexualidade como um fator de
risco que não pode ser negado nem subestimado, sobretudo se levarmos em conta o alto índice
de recaídas.[xciii] A utilidade do futuro sacerdote para o serviço da Igreja, demandada segundo
c. 1025, parágrafo 2 CIC e entendida como possibilidade de ser apropriadamente empregada e
não como periculosidade para a Igreja e para as pessoas a ela confiadas, deve consequentemente
ser avaliada no mínimo como fortemente restrita no caso de candidatos à Ordenação com
tendências homossexuais, porque sua atuação em áreas vitais para a Igreja, como a pastoral com
crianças e jovens, precisa, por princípio, ser classificada como um risco. O respeito por pessoas
que foram confiadas à Igreja, bem como a proteção de sua integridade física e moral têm
prioridade absoluta diante dos sentimentos de homens com tendência homossexual, que se
sentem magoados e tratados injustamente pela não-admissão para a Ordenação. A atuação na
pastoral de casais e da família pressupõe a fundamental aptidão para o matrimônio e a família
por parte do sacerdote e, consequentemente, a masculinidade heterossexual. Ela é condição
irrenunciável para um trabalho frutífero com casais e com aqueles que se preparam para o
matrimônio.

A promessa do celibato, a ser feita conforme c. 1037 CIC, antes da Ordenação, não apenas tem
por conteúdo o compromisso da abstinência sexual, mas também a renúncia genuína ao bem
natural do matrimônio e da família. Também essa renúncia pressupõe por princípio a
masculinidade heterossexual. Homens com tendências homossexuais não conseguem, pois,
cumprir essa condição prévia para a ordenação lícita, visto que são incapazes de cumpri-la, a
não ser que se considere, ao menos indiretamente, ou até mesmo se confirme, a possibilidade do
chamado “casamento gay”. Ademais, existem indícios inequívocos de que viver a abstinência
sexual é mais difícil para homens com tendências homossexuais do que para heterossexuais.

Considerando-se que o sacramento da Ordem não é conferido e recebido para suprir carências
pessoais nem para compensar déficits,[xciv] homens com tendências homossexuais não podem
ser admitidos à ordenação, já que a homossexualidade representa uma desordem objetiva e
precisa ser definida como sexualidade deficitária.[xcv] Como enfermidade psíquica, a
homossexualidade deve ser entendida no sentido dos cc. 1041, n.1, e 1044, parágrafo 2, n. 2
CIC. Primeiro, por causa do grave bloqueio da comunicação interpessoal, que se manifesta no
estabelecimento de contatos distorcidos com homens e mulheres e que não pode ser
compensado por comportamento sensível, empático ou amistoso. Segundo, conforme c. 1031,
parágrafo 1º CIC, por causa da inexistente, mas necessária maturidade suficiente correlata, que
se manifesta, muitas vezes, num comportamento narcisista, egocêntrico, predominantemente
emocional e também sexualmente promíscuo, que aponta “para uma ausência geral de
consciência do pecado”.[xcvi] Isso, no mínimo, constitui um forte entrave para um exercício
frutífero do ministério, quando não incapacita para ele.

A Instrução de 29 de novembro de 2005[xcvii] que, conforme Tony Anatrella, foi solicitada de


Roma por muitos bispos de todo o mundo, por ocasião de suas visitas ad limina, bem como por
reitores de seminários e responsáveis pela pastoral vocacional,[xcviii] tornou explícita e
inequívoca a proibição já contida implicitamente no CIC para homens com tendências
homossexuais. Tal proibição deixa claro que a superação total de tendências homossexuais
constitui uma premissa indispensável para a Ordenação. Com efeito, não se trata apenas de uma
abstinência sexual de três anos antes da Ordenação Diaconal, por parte de homens que
continuam com tendências homossexuais.

A Instrução não enfoca a homossexualidade apenas como um problema de ordem sexual, mas
como um problema mais abrangente. É o que fica evidente quando o referido documento afirma
que a homossexualidade tolhe “gravemente” o estabelecimento de relações corretas com
homens e mulheres, algo que, no entanto, é imprescindível para o desenvolvimento de uma
autêntica paternidade espiritual. Assim, evita-se um enfoque unilateral sobre a “capacidade de
abstinência sexual” como critério decisivo de avaliação e de admissão à Ordenação. Não se trata
apenas de considerar apto aquele candidato ao presbiterato que se mostra capaz de levar uma
vida sexualmente abstinente. Sem dúvida, essa questão é relevante, mas é preciso ponderar
algumas outras coisas. “Tendências homossexuais não são pulsões isoladas, mas sintomas de
um déficit geral no desenvolvimento emocional de uma pessoa rumo à masculinidade ou
feminilidade plenas. Isso não constitui um aspecto subordinado ou secundário da psique. Ser
homem ou mulher é parte da substância de nossa natureza intelectual, parte de nossa identidade
pessoal”.[xcix]

Também um deslocamento unilateral da problemática para o foro íntimo recebe uma negativa
na Instrução. “Embora a Instrução esteja totalmente certa em sua convocatória a cada um desses
candidatos, de tal maneira que os mesmos não prossigam, em sã consciência, na trajetória para a
Ordenação, bem como na exigência de influência pessoal por parte dos acompanhantes
espirituais vinculados ao foro íntimo, também dependerá do conhecimento humano vinculado à
realidade e comprovado por vários anos dos responsáveis últimos… se tais tendências sexuais
contraproducentes são notadas em tempo… Não por último cabe grande importância também à
respectiva comunidade do seminário e da ordem religiosa como tal. Aqui, não se trata de um
‘sistema de espionagem’, mas antes está em jogo que observações relevantes auto-evidentes dos
que convivem em casas religiosas também sejam acolhidas com seriedade pelos superiores. Não
pode mais acontecer que testemunhas sejam forçadas, ‘por razões de política eclesiástica’, a
esquecer e mentir ou sofram desvantagens, ou até mesmo uma clássica pressão difamatória,
apenas porque comunicam ou comunicaram algo claramente detectado, segundo seu melhor
conhecimento e da mais sã consciência”[c].

Quanto à questão das provas e da possibilidade de comprovação de “tendências homossexuais


profundamente arraigadas”, que Dom Klaus Küng, bispo diocesano de St. Pölten (Áustria), em
um posicionamento acerca da Instrução, definiu acertadamente como “uma orientação
homossexual que retrocede até a infância e levou a uma forte marca na personalidade”, [ci] não é
necessário que se tenha de apresentar a alguém provas diretas, mas bastam “claros indícios
secundários que, frequentemente, no quadro geral, não apenas suscitam dúvidas sobre a aptidão
de um candidato, mas, muitas vezes, também levam a uma certeza moral correspondente, a
saber, de que, a médio prazo, esse determinado candidato sucumbiria à tentação homossexual
permanente que habita sua interioridade. A Instrução versa sobre toda a questão de modo
conciso e sábio. No entanto, igualmente é preciso que seja aceitável, com certeza moral, a
comprovação dos três anos absolutamente livres de indícios homossexuais antes da Ordenação
Diaconal. Neste contexto, cabe citar expressamente aquela passagem da Instrução que diz: ‘No
caso de séria dúvida, nesse aspecto, o bispo ou superior não pode admiti-lo à ordenação’”.[cii]

Do teor da Instrução, cabe concluir que ela não deixa espaço para a ordenação de homens que
não superaram inequivocamente suas tendências homossexuais, vivenciadas ou não, e que não
experimentaram uma clara mudança na direção da heterossexualidade. Nesse sentido, a
proibição da Ordenação para homens com tendências homossexuais é absoluta. Sua admissão à
Ordenação de forma alguma é relegada ao espaço da deliberação dos superiores competentes. A
Instrução precisa ser acatada como ordem estrita e concretizada na prática da formação
presbiteral.[ciii] Assim, predomina a segurança jurídica no que tange a esse ponto
controversamente discutido.

Cabe unicamente à Igreja o veredicto sobre quem é chamado ao ministério ordenado. Este não
cabe a homens que não superaram inequivocamente suas tendências homossexuais e não
experimentaram uma clara mudança na direção da heterossexualidade. Isso não tem nada a ver
com proibição vocacional, com discriminação ou homofobia. É insuficiente a “impressão” de
uma inclinação ao sacerdócio ou o desejo pessoal por ele, a partir do qual se quer, hoje, muitas
vezes, reivindicar um direito ao ministério ordenado. O que se requer é, sobretudo, a aptidão
necessária para o ministério e seu exercício sensato e frutífero. Com efeito, a Igreja, apoiada em
percepções teológicas e nas ciências humanas, bem como em experiências concretas do passado
recente, não considera essa aptidão suficientemente assegurada em homens com tendências
homossexuais. A igual dignidade de todos os seres humanos não significa que todos tenham o
mesmo status, as mesmas qualidades e a mesma competência para serem admitidos às Ordens
Sacras.

6. Sugestões e perspectivas

A homossexualidade não é coadunável com o sacramento da Ordem, a menos que se queira


estabelecer na Igreja e na teologia múltiplas contradições de legitimação. Um esclarecimento
também sob o aspecto jurídico e, em última análise, legal constitui o melhor auxílio à verdade, a
única que liberta. Por isso, a homossexualidade deve ser citada expressamente como
impedimento à Ordenação, sendo como tal inserida nas determinações canônicas pertinentes. De
acordo com a Carta Apostólica Ad Tuendam Fidem, do Papa João Paulo II, de 18 de maio de
1998, por meio da qual os dois Códigos foram complementados com normas importantes, uma
nova complementação do CIC, por meio de uma lei papal, já não seria nada de extraordinário.
Além disso, uma lei dessas sublinharia, de forma melhor e mais inequívoca, a importância e a
necessidade dessa determinação para a Igreja, particularmente para o ministério ordenado, que a
Instrução de um dicastério do Vaticano, ainda que ela tenha sido aprovada pelo Papa e que o
mesmo tenha ordenado sua publicação. Não obstante, persiste a pergunta se essa justificada
proibição da Ordenação ainda pode realmente ser concretizada, em vista dos numerosos
adversários que evidentemente existem até nos mais altos círculos eclesiásticos.[civ]

Proibições e documentos isolados não bastam. Entre as autoridades competentes, deve haver,
em primeiro lugar, uma vontade de realmente analisar objetivamente a problemática, tratá-la
com seriedade e tentar solucioná-la aberta e resolutamente, sem jamais silenciá-la, declará-la
inócua e procrastiná-la, como vem acontecendo, na maioria dos casos, até aqui. Tampouco a
questão pode ser deslocada unilateralmente ao forum internum, visto que, ao lado do aspecto da
inclinação, no caso de uma vocação ao ministério ordenado, permanece insuficientemente
iluminado o necessário aspecto da aptidão de um candidato à ordenação.

A comprovação da superação cabal das tendências homossexuais rumo à heterossexualidade,


exigida pela Instrução mediante uma fase mínima de três anos de comportamento e sentimentos
íntimos duradouramente mudados, deveria ser apresentada antes do ingresso no seminário ou
centro de formação. A vantagem de um procedimento desse tipo seria uma atratividade
consideravelmente reduzida do seminário ou do centro de formação para homens com
tendências homossexuais. Desse modo, as sub-culturas e redes homossexuais seriam, em boa
parte, privadas de seu solo de sustentação.

A clarificação interna da problemática assinalada tampouco pode ser deixada por conta do clero.
Os fiéis, como diretamente atingidos, não apenas têm o dever, mas também o direito de dar sua
contribuição. Para tanto, há necessidade de uma regulamentação legal, visto que essa
contribuição não deve depender da benevolência daqueles que, na Igreja, são responsáveis pela
questão. Pode-se imaginar uma comissão que trabalha, em cada nível nacional e de forma
independente da conferência episcopal, com as seguintes características e atribuições:
exclusivamente leigos que estejam comprometidos com a Igreja, imbuídos de sua doutrina e
cujo procedimento esteja em conformidade com ela. Via de regra, leigos casados no mínimo há
10 anos, devidamente nomeados pela Santa Sé, após consulta às conferências episcopais. Ao
presidente da comissão, caberá a elaboração de um relatório anual, que, depois de ter sido
comunicado a conferência episcopal, será levado ao conhecimento da Santa Sé. A relevância de
uma comissão como essa seria, por um lado, o fato de que sua simples existência exerceria uma
pressão “sadia” sobre os superiores eclesiásticos competentes para corresponderem, de forma
mais resoluta e rápida, à sua competência diretiva, ao invés de, muitas vezes, reagir apenas com
hesitação à pressão de fora. Por outro lado, a comissão, como elo de ligação com a base e a
opinião pública, poderia prevenir muitas coisas e eliminar dificuldades já no status nascendi.

Conforme D. Cozzens, a crise espiritual do sacerdócio e, consequentemente, também a crise


espiritual da Igreja são, em parte, uma crise de orientação sexual. “Mais cedo ou mais tarde,
essa questão será tratada com mais objetividade que nas últimas décadas do séc. XX. Mas,
quanto mais tempo demorar, tanto maior será o dano para o sacerdócio e para a Igreja”.[cv]

O homossexualismo é contraproducente e destrutivo espiritual, psicológica e socialmente, para a


saúde daqueles que o praticam e a família, para o sacerdócio e, consequentemente, para a Igreja.
Com isso, não se afirma que a heterossexualidade como tal capacite automaticamente para o
exercício do ministério ordenado na Igreja. Também em relação ao posicionamento frente à
heterossexualidade e sua prática, no que tange à admissão à Ordenação, é preciso que os
critérios bíblico-teológicos da Igreja sejam afirmados e vivenciados.

Esta análise significa para a responsabilidade pastoral da Igreja nesta situação difícil um enorme
desafio. Ela tem como finalidade precípua desencadear um debate sério, profundo e amplo,
tentando vencer o clima de tabu que muitas vezes envolve tal temática. Somente no diálogo
sobre seus desafios a Igreja pode caminhar em busca da verdade, da qual procura sempre ser
parceira na história. Para a Igreja não se trata somente de tirar consequências claras no sentido
de defesa de sua posição. Ao mesmo tempo ela tem que oferecer às pessoas envolvidas –
padres, religiosos e leigos – terapias adequadas. Exatamente isso vai se revelar para todos como
bênção.

Endereço do Autor:

Rua Padre Rossini Cândido, 157

Coração Eucarístico

30535-500 Belo Horizonte – MG / BRASIL

Fone: (31) 91175530

E-mail: p.dr.mettler@hotmail.com

[i]. O autor nasceu 1955 in Morbach / Alemanha, ingressou 1974 na Congregação dos
Missionários da Sagrada Família (MSF) e foi ordenando presbítero em 1981. Em 1988 chegou
ao Brasil e trabalhou até 2001 em várias paróquias e na reserva indígena Xakriabá no Norte de
Minas Gerais, nas dioceses de Januária e Janaúba.

No “Instituto Superior do Direito Canônico” da Arquidiocese de Rio de Janeiro, agregado a


Gregoriana em Roma, fez em 2003 o Mestrado em Direito Canônico. Em 2007 concluiu o
doutorado em Teologia Pastoral e Direito Canônico em Fribourgo / Alemanha.

Atualmente trabalha como Professor de Direito Canônico no ISTA, como juiz e auditor no
Tribunal Eclesiástico da Arquidiocese de Belo Horizonte e como capelão das Servas do
Santíssimo Sacramento.

[ii]. CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA, Instrução sobre os critérios de


discernimento vocacional acerca das pessoas com tendências homossexuais e da sua admissão
ao seminário e às ordens sacras. Disponível em:
http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/ccatheduc/documents/rc_con_ccatheduc_doc
_20051104_istruzione_po.html.

[v] CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA: Diretrizes para a utilização da


Psicologia na admissão e formação de candidatos ao sacerdócio, disponível em:
www.zenit.org/article-16301?!=portuguese.

[vi]. Cf. Ibid.

[vii]. P. METTLER, Die Berufung zum Amt im Konfliktfeld von Eignung und Neigung. Eine
Studie aus pastoraltheologischer und kanonistischer Perspektive, ob Homosexualität ein
objektives Weihehindernis ist [A vocação para o ministério ordenado no campo conflitante de
aptidão e inclinação. Um estudo, a partir de uma perspectiva teológica-pastoral e canônica, se o
homossexualismo constitui um impedimento objetivo à ordenação], Frankfurt am Main, 2008.

[viii]. Em termos de princípio e de conteúdo, reitera-se dois documentos publicados antes do


Concílio Vaticano II. Na carta circular Magna Equidem, de 27 de dezembro de 1955, sobre os
escrutínios, a então Sagrada Congregação para a Disciplina dos Sacramentos declarou que
candidatos que sofrerem de defeitos sexuais ou psíquicos não podem ser admitidos às
ordenações. A carta cita expressamnente pessoas com sentimentos homossexuais como
excluídos da ordenação, em: X. OCHOA, Leges Ecclesiae post Codicem Iuris Canonici editae,
t. II, Roma 1969, n. 2542. Mais enfática ainda é uma Instrução da então Sagrada Congregação
para os Assuntos dos Religiosos, de 2 de fevereiro de 1961: “A admissão aos votos e à
ordenação sacerdotal será vedada a todos os que lutam contra tendências malignas como
homossexualismo e pederastia, porque acarretam sérios perigos para a vida cotidiana e o
ministério sacerdotal”, em: X. OCHOA, Leges Ecclesiae post Codicem Iuris Canonici editae, t.
III, Roma 1972, n. 2962.

[xv]. Cf. “Lei da Homofobia” no Brasil implicaria perseguição religiosa”, disponível em:

www.zenit.org/article-14376?=portuguese.

[xviii]. Em carta de 23 de julho de 1992, dirigida aos bispos dos EUA, a Congregação para a
Doutrina da Fé afirma que existem áreas em que não se pode falar de discriminação injusta,
quando se leva em conta a orientação sexual, por exemplo, na adoção ou no direito de guarda de
crianças, na contratação de docentes, professores esportivos ou no serviço militar. “A
‘orientação sexual’ não representa uma orientação comparável à raça, ao grupo étnico etc., no
que tange à não-discriminação… Incluir a ‘orientação homossexual’ em ponderações segundo
as quais qualquer discriminação é contrária à lei, facilmente poderá levar a que se considere o
homossexualismo como fonte positiva de direitos humanos… Isso é tanto mais nefasto pelo fato
de não haver um direito ao homossexualismo, que por isso não pode alegar nenhum fundamento
legal para exigências de direito. Esse passo até o reconhecimento do homossexualismo como
elemento determinante, sobre cuja base a discriminação é contrária à lei, pode levar facilmente,
se não até mesmo automaticamente, à proteção legal e à propagação do homossexualismo.”
Kongregation für die Glaubenslehre: Anmerkungen zur rechtlichen Nicht-Diskriminierung
Homosexueller”, em: Die Tagespost, 14-08-1992, p. 8.

Para T. Anatrella, o homossexualismo não é “sujeito de direitos, por não possuir valor social.”
T. ANATRELLA, “Omosessualitá e Omophobia”, em: Pontificio Consiglio per la Famiglia
(ed.), Lexicon. Termini ambigui e discussi su famiglia, vita e questioni etiche, Bologna 2003, p.
685-697, 696.

[xxi]. João Paulo II, Identität, p. 26. Conforme o papa Bento XVI, configura-se uma “ditadura
do relativismo, na qual nada é reconhecido como definitivo e que admite como parâmetro
último somente o próprio eu e seus desejos” “Es entsteht eine Diktatur des Relativismus”),
disponível em: www.die-tagespost.com/archiv/titel_anzeige.asp.?ID=13495

[xxiii]. A asserção sempre de novo disseminada, segundo a qual 10% teriam sentimentos
homossexuais é pura propaganda, um mito, como a própria C. Paglia – um ícone do movimento
gay – admite: “a quota dos dez por cento, que é prontamente repetida pelos meios de
comunicação, era pura propaganda. Como cientista, ignoro que ativistas do homossexualismo
desprezem, tão sem escrúpulos, a verdade. Pessoas que vivem homossexualmente sabem muito
bem que justamente não é gay cada décimo homem com que se encontram” (C. PAGLIA,
Vamps e Tramps, Nova Iorque 1994, p. 74). O estudo EUROGAY-EMNID, de 2001, chega a
1,3% entre os homens e 0,6% entre as mulheres que se consideram pessoalmente como
homossexuais. Cf. C. WAGNER et al., Erfassung von sexueller Orientierung und Prävalenz
von Homosexualität und Bisexualität, disponível em: www.crossmarketing.de/pdf/abstract2.pdf.
Trata-se de um resultado realmente assombroso. Evidentemente, o número de homossexuais é
menor que o sugerido pela “onda gay da moda” (Cf. A. GATTERBURG / A. HAEGELE,
“Exoten: witzig und wohlhabend”, em: Der Spiegel, 26-03-2001, p. 80s).

Em uma entrevista à revista Spiegel, a 25 de novembro de 2005, o jesuíta H. Kügler classificou


a Igreja Católica Romana como a “maior organização gay transnacional” (cf. H. KÜGLER,
“Katholische Kirche ist die grösste transnationale Schwulenorganisation”), disponível em:
www.spiegel.de/panorama/0,1518,386709,00.html.

[xxxv]. U. ENGEL, “Ja, mein Erbe gefällt mir gut.” Skizzen zu einer Gay-Spiritualität, em:
Wort und Antwort 39 (1998) 78-87; H. Kügler avalia essas considerações de Engel como “uma
das poucas tentativas bem-sucedidas de uma teologia especificamente gay” (H. KÜGLER,
Gelebte Sexualität als Transzendenzerfahrung, em: Themenzentrierte Interaktion 2 (1999) 255-
259, 259). Acerca da exigência de que, no âmbito feminista, também deveria haver uma
teologia homossexual, observa com razão R. Slenczka: “Nisso, já se mostra aquela compreensão
equivocada de teologia, que não se orienta mais na Palavra de Deus, mas deve ser articulada
com as experiências e os problemas da época. Dessa maneira, a teologia é transformada em
ideologia” (R. SLENCZKA, Zur Beurteilung homosexueller Beziehungen nach dem Wort
Gottes, em: Homiletisch-Liturgisches Korrespondenzblatt – Neue Folge 27 (1990), p. 301-305,
301).

[xxxvii]. “De acordo com ex-seminaristas e sacerdotes novos, essa subcultura homossexual, em
certos seminários, é tão acentuada que essas instituições receberam apelidos como Notre Flame
(para o Seminário de Notre Dame, em Nova Orleães) e Theological Closet (para o Theological
College na Universidade Católica da América, em Washington, D.C). O Seminário de St. Mary
em Baltimore recebeu a alcunha de “The Pink Palace” (ROSE, GoodBye, p. 92).

[xxxviii]. R. Wagner, sacerdote e religioso católico dos EUA, ele próprio envolvido
existencialmente, escreve em um estudo: “Há uma rede informal dos sacerdotes gays em
praticamente todas as regiões do país. Essa rede foi utilizada para conquistar os entrevistados
para a pesquisa. Um empenho considerável de tempo e energia foi necessário para compor uma
amostragem com a maior amplitude geográfica possível. O começo foi estabelecer contato em
diferentes partes do país com sacerdotes que ocupam posições-chave nas redes. Esses, por sua
vez, exerceram a função de mediadores em sua área” (R. WAGNER, “Schwule katholische
Priester in den USA: Empirische Untersuchung einer Dissonanz zwischen Pflicht und
Neigung”, em: R. GINDORF/E.J. HAEBERLE (eds.), Sexualwissenschaft und Sexualpolitik.
(Schriftenreihe Sozialwissenschaftliche Sexualforschung 3), Berlim / Nova Iorque 1992, p. 195-
250, 203).
[xlii]. O que foi apurado para a Igreja Católica Romana vale, de forma similar, para as Igrejas
Anglicanas e Evangélicas, que assim são confrontadas com um teste de ruptura que pode levar a
um cisma (cf. METTLER, Amt, p. 124-132).

[xliii]. “Seminary Reform Needed in Wake of Sex Abuse Study. Dr. Rick Fitzgibbons Suggests
Programs of Priest, Religious, Seminarians”, disponível em:
www.zenit.org/english/visualizza.phtml?sid=52897. Também dados de centros terapêuticos na
Irlanda, bem como as averiguações de Sountdown (Canadá), do St. Luke’s Institute
(Washington) e das John Hopkins Sexual Disorder Clinics (Baltimore) nos EUA, constatam
unanimemente que a maioria dos sacerdotes que abusam de menores prefere como parceiros
sexuais jovens rapazes após a puberdade (cf. E. CONWAY, Theologien des Priesteramts und
ihr möglicher Einfluss auf sexuellen Kindesmissbrauch, em: Concilium 40 (2004) 308-322, nota
9).

[xliv]. A. MOSER, Pedofilia: primeiras reações e interpelações, em: REB 62 (2002) 515-547,
520.

[xlvi]. Nas determinações punitivas da Bíblia contra o homossexualismo, não se trata, segundo
Schoeps, de determinações de caráter ético, mas apenas de ritos de culto. Seria uma “piada
tardia da história das religiões” pretender derivar desses fatos uma rejeição genérica do
homossexualismo. “Não, a suposta proibição divina expressa na Bíblia contra o
homossexualismo é um mito – mais precisamente um mito falso”. H.J. SCHOEPS,
“Überlegungen zum Problem der Homosexualität”, em: ID. et al., Der homosexuelle Nächste.
Ein Symposium, Hamburgo 1963, p. 74-114, 88.

[xlix]. Conforme H. Lutterbach, esse silêncio de forma alguma foi entendido pelos primeiros
cristãos no sentido de um consentimento da prática de relacionamentos entre os mesmos sexos
(cf. H. LUTTERBACH, Gleichgeschlechtliches sexuelles Verhalten: ein Tabu zwischen
Spätantike und früher Neuzeit, em: Historische Zeitschrift 267 (1998) 281-311, 286).

[l]. Com freqüência, se diferencia entre “casca devida à época” e “cerne” da Sagrada Escritura,
“válido para além da época”. “No primeiro caso, trata-se de afirmações da Bíblia que podemos
muito bem ‘esquecer’ literalmente. São condicionadas por uma época atrasada em suas
opiniões. Dentro delas, porém, encontram-se outras convicções que possuem um significado
supratemporal, eterno, que também continuam válidas conforme o entendimento de hoje,
medidas por critérios atuais, ou seja, que não são condicionadas pela época, mas
contemporâneas, condizentes com nosso tempo”. Essa distinção casca-cerne, no entanto,
pressupõe uma posição supra-histórica. “Quem como sujeito histórico, em vista de documentos
do passado, acredita ser capaz de distinguir, principalmente no que tange a textos bíblicos, entre
condicionado pela época e eternamente válido, está pressupondo como verdadeiros, corretos e
superiores os critérios de seu próprio tempo, raciocinando, assim, flagrantemente de forma não-
histórica: como se a própria época também não fosse condicionada por seu tempo em relação às
suas opiniões” (H. HEMPELMANN, “Die Autorität der Heiligen Schrift und die Quellen
theologischer Grundentscheidungen”, em: Homosexualität und christliche Seelsorge.
Dokumentation eines ökumenischen Symposiums, Neukirchen-Vluyn 1995, p. 238-261, 250).

[liv]. Na sétima estação das meditações da via crucis, realizadas pelo arcebispo Comastri e que
aconteceram sob a presidência do Papa Bento XVI, na Sexta-Feira da Paixão de 2006, no
Coliseu de Roma, lemos: “Com certeza, o ataque à família constitui um doloroso sofrimento de
Deus. Parece que existe hoje uma espécie de antigênesis, um contraprojeto, um orgulho
diabólico, que visa eliminar a família. O ser humano pretende reinventar a família, deseja mudar
a gramática da própria vida, concebida e intencionada por Deus. Contudo colocar-se no lugar de
Deus, sem ser Deus, é a mais tola arrogância, é a mais perigosa aventura” (Kreuzweg 2006,
disponível em: www.kath.net/detail.php?id=13380).
[lviii]. A Igreja se esforçou, num passado recente, em explicar sua atitude perante a
homossexualidade e mostrar caminhos de uma prática pastoral apropriada. Sinais desse esforço
são nada menos que 8 documentos, nos quais o Magistério se manifestou com autoridade, entre
1975 e 2003, sobre o tema da homossexualidade e aspectos correlatos (cf. Ibid. p. 204-207).

[lxiv]. O ativista gay A. Sullivan descreve como auto-engano acreditar que o homossexualismo
é transmitido como a cor dos cabelos. ”Sem dúvida seria bem-vindo aos gays se a ‘analogia’ dos
cabelos fosse correta, porque isso os eximiria da auto-análise, que muitas vezes é tão dolorosa,
com a qual teriam de se confrontar em caso contrário. Lamentavelmente, porém, ela não é
correta”. E admite: “Certamente seria estranho se influências do meio não tivessem também
uma importância especial” (A. SULLIVAN, Love Undedectable: Notes on Friendship, Sex and
Survival, New York 1998, p. 164). Também Peter Tatchell, conhecido ativista do movimento
gay, reconheceu recentemente: “Genes e hormônios podem predispor uma pessoa para
determinada orientação sexual. Mas isso não é tudo. Predisposição e fixação são duas coisas
diversas.” P. TATCHELL, “Führender Homo-Aktivist: Es gibt kein ‘Gay-Gen’”, disponível em:
www.kath.net/detail.php?id=20536.

[lxv]. G. VAN DEN AARDWEG, The biological base of Homosexuality: not solid evidence,
much misleading speculation, em: Narth-Bulletin 2004. Contra o perigo de mesclar ativismo
gay e ciência, bem como contra as consequências, adverte enfaticamente a já citada ativista
homossexual, C. Paglia: “Devíamos estar conscientes da possível mistura nociva de ativismo
gay e ciência, que produz mais propaganda que verdade. Cientistas homossexuais precisam ser
primordialmente cientistas, homossexuais somente em segundo lugar” (PAGLIA, Vamps, p.
78).

[lxxxi]. Quando comparamos essas características de personalidade e formas de comportamento


com aqueles presbíteros e religiosos homossexuais que trabalham no Brasil, identificados por G.
Nasini à base de questionários, diálogos e observações pessoais, não há como deixar de notar
convergências nos pontos essenciais. Logo, não se trata, de forma alguma, de observações
isoladas, impossíveis de generalizar, mas de concretizações confirmadoras. Nasini cita,
inicialmente, um sacerdote psicólogo do sul do Brasil, que descreve sacerdotes de tendências
homossexuais em pleno exercício do ministério da seguinte maneira: “Usualmente, esses
ministros (sacerdotes-religiosos ativos no ministério) são descritos por seus colegas como
inteligentes, de muita capacidade criativa e realizadora. Conquistam facilmente as pessoas em
geral. Sabem envolver os que estão à sua volta, pois geralmente são simpáticos e prestativos.
Mas, por outro lado, agem furtivamente, sempre por baixo dos panos, deixando transparecer
insatisfações internas, frustrações afetivas e descontroles psico-emocionais. Buscam preencher
freneticamente os vazios através desse comportamento sexual. Eles parecem ser pessoas
espiritualistas e reflexivas, efeminados nos seus gestos e com tendência à passividade, aceitam
as coisas como elas se apresentam. São pessoas muito informadas e com muitas influências.
Gostam de bajular os poderosos, de disfarçar e fingir. Na visão de um padre que respondeu à
pesquisa, a homossexualidade entre o clero constitui um comportamento marcado pela
violência, preguiça e farisaísmo. Tal comportamento é escandaloso e toda a comunidade é a
primeira a saber: Lamentavelmente, essa coisa não é só de padres, mas também de bispos. O
relacionamento com determinadas pessoas que são subalternas é demasiadamente intenso e
freqüente. Pessoa desconfiada, o ministro homossexual mede as palavras e passa medo e
desconfiança. Autoritário e centralizador, é apegado ao dinheiro para beneficiar seus familiares.
Se ativo em sua orientação sexual, o ministro não é bem-aceito onde trabalha. Pode tornar-se
dependente de álcool e passar facilmente da euforia à tristeza e depressão. Faz-se vítima, pode
causar divisões, negar a realidade dos fatos e esconder seus problemas. Isolado, pode viver na
superficialidade e ser agressivo com os colegas. Movido mais pelo impulso que pela razão,
alguns ministros continuam em seus relacionamentos homossexuais até morrerem de Aids sob o
olhar de seus bispos. Há um crescente corporativismo entre clérigos homossexuais,
caracterizado por carreirismo eclesial e busca de poder econômico: paróquias ricas” (G.
NASINI, Um espinho na carne. Má conduta e abuso sexual por parte de clérigos da Igreja
Católica do Brasil, Aparecida 2001, p. 115s).

[lxxxix]. Homosexualidad y Esperanza. Declaración de la Asociación Médica Católica, de


EEUU, disponível em: www.narth.com/docs/eeuu.html.

[xc]. Houve discussões controvertidas, se o sexo masculino, como condição prévia para a
obtenção válida da ordenação, baseia-se no direito divino ou apenas representa uma
determinação eclesiástica. Essa controvérsia foi definitivamente resolvida pelo papa João Paulo
II (1978-2005), por meio da Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis, de 22 de maio de 1994.

[xcv]. De acordo com T. Anatrella, pessoas com tendências homossexuais sofrem de uma
“desconectividade estrutural” na posição frente à sua sexualidade (cf. T. ANATRELLA,
“Kirche kann unvollständige Sicht der Sexualität nicht akzeptieren”), disponível em:
www.kath.net/detail.php??id=12234.

[xcvii]. Conforme o c. 34, do CIC, as instruções explicam os preceitos de leis, desdobram e


determinam modos de procedimento que devem ser observados em sua execução, são
fornecidas para o uso daqueles que precisam cuidar para que as leis sejam levadas ao
cumprimento, sendo comprometidos na execução daquelas. Por conta disso, W. Aymans
denomina as Instruções “Determinações administrativas”. Os órgãos administrativos são
compromissados juridicamente por meio de uma determinação administrativa (cf. AYMANS-
MÖRSDORF, Kanonisches Recht. Lehrbuch aufgrund des Codex Iuris Canonici, v. I:
Einleitende Grundfragen. Allgemeine Normen, Paderborn 1991, p. 221s). As determinações de
instruções não suspendem leis e quando não podem ser coadunadas com preceitos de leis elas
carecem de qualquer força legal. Uma instrução sempre está relacionada a uma lei, ou seja, não
representa uma criação própria de direito. Cf. ibid. As anotações de uma instrução mostram que
já existem normas claras, no que diz respeito à admissão às ordens sacras. Contudo, chama
atenção que não são citadas nem a carta da Sagrada Congregação para a Ordem dos
Sacramentos, de 27-12-1955, acerca da realização dos escrutínios antes da ordenação nem
tampouco a Instrução da Sagrada Congregação para o Clero, de 02-02-1961, que excluíram
ambas expressis verbis da obtenção da ordenação homens com tendências homossexuais.

[cii]. ANATRELLA, Reflections.

[ciii]. Em sua carta, que acompanha a Instrução, o Cardeal Grocholewski apela aos bispos para
que as prescrições ali apresentadas sejam “cuidadosamente cumpridas” por todos os envolvidos
na formação de sacerdotes. Cumpre, portanto, atualizar as respectivas diretrizes dos seminários
e adaptá-las à Instrução.

Você também pode gostar