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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

Tópicos de Psicologia
Andressa Gonçalves - Curso de Engenharia Química - Ciclo especial /2020

ENSAIO: SONHOS LÚCIDOS, UM MECANISMO PARA REALIZAR OS DESEJOS


CONSCIENTEMENTE

Todas as pessoas sonham. Todas as noites. Elas podem ou não se recordar


depois de despertar. Algumas terão bons sonhos, outros terão pesadelos. Geralmente
o sujeito não tem consciência de estar sonhando durante o sonho e a capacidade de
alterá-lo narrativamente. No entanto algumas pessoas terão os sonhos que desejam
e a capacidade de tomar suas próprias decisões conscientemente de acordo com sua
vontade. Esse fenômeno raro recebe o nome de sonho lúcido.
Anteriormente ao surgimento da psicanálise freudiana, durante os milênios da
sua história, o homem teve considerado a manifestação dos sonhos como natureza
divina ou como premonições do seu próprio destino. No entanto em 1899, em sua
obra “A interpretação dos sonhos”, Sigmund Freud afirmou que “O sonho é a estrada
real que conduz ao inconsciente”, nessa obra Freud postulou as bases de apoio para
o desenvolvimento do que se seria a Psicanálise, símbolo e referência através dos
tempos.
Para Freud, o sonho nada mais é que uma expressão do nosso desejo mais
íntimo e sua essência se traduz em um desejo que fora reprimido na infância, mas
latentes na nossa inconsciência. Foi a partir dos estudos a cerca do tema que Freud
apontou a existência do inconsciente, sendo esse a origem da personalidade humana.
Em resumo, o sonho se apresenta como uma ferramenta poderosa em revelar a
personalidade humana de cada sujeito e seus desejos íntimos que fora suprimido
devido a nossa consciência censurá-los e julgá-los como “proibidos”. Essas censuras
muitas vezes são devido a cultura e costumes sociais impostos. Em resumo é durante
o sono que podemos deleitar-se pelos verdadeiros prazeres, fugindo de uma
sociedade que dita regras e condutas e é através dele, sonho, que de fato podemos

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vivenciar o que realmente gostaríamos de viver. Quando temos o ato de fechar nossos
olhos, temos isso como um passaporte para outro país. O país das maravilhas.
Não faz parte do escopo desse trabalho a abordagem dos tipos de sonhos e a
teoria de psicanálise construída a partir desses elementos por Freud, mas devemos
entender a sistemática da manifestação do fenômeno “sonho” para entender o sonho
lúcido. Entretanto é razoável compreender que o sonho é o resultado de fatores
psíquicos e do sono.
O primeiro aspecto que a psicologia descobriu é que existem dois tipos de
sono: NREM (No Rapid Eye Movements) e REM (Rapid Eye Movements).
É no REM que ocorrem os sonhos. Durante esse tipo de sono é observado uma
variação no Sistema Nervoso Autonomo, a respiração e o ritmo cardíaco, por exemplo,
ficam irregulares e mais rápidos. Além disso, nesse tipo de sono temos quatro estágios
com padrões de ondas cerebrais diferentes entre si. No primeiro estágio, o chamado
sono leve, é o início do sono e dura alguns minutos. No segundo estágio, chamado
de sono intermediário, podem ocorrer experiencias sensoriais, alucinações. No
terceiro estágio, chamado de sono profundo, é o estágio onde estamos insensíveis a
sons e portanto, mais resistentes a acordar. O último estágio denominado sono mais
profundo ocorre a “total entrega” e representa o mais profundo desligamento do
mundo exterior, nessa fase pode ocorrer sonambulismo. Durante esses estágios, o
nível de relaxamento do indivíduo aumenta progressivamente até alcançar o
relaxamento total (“total entrega”).
Nos sonhos comuns não percebemos que estamos sonhando e sempre
acreditamos estar acordados e assim, fugimos dos perigos, enfrentamos os
problemas com os quais surgem, tememos pessoas e animais e suas reações. Já nos
sonhos lúcidos, isso não existe. O sonhador sabe que está sonhando e age de acordo
com este entendimento.
O sonho lúcido é um estado psicofisiológico do sono onde o indivíduo percebe
que está sonhando e consegue tomar decisões de acordo com sua vontade. É uma
experiência onde a consciência é preservada e as sensações são excepcionalmente
realísticas. Esse fenômeno é milenar, transcendendo o tempo e culturas diferentes,
sendo relatados em trabalhos acadêmicos e pesquisas cientificas contemporâneas.
Essas pesquisas foram aporte para a descoberta do sonho lucido ser intrínseco ao
sono e estar relacionado ao REM. Essa descoberta foi de suma importância para o

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fenômeno também ser compreendido e objeto de estudo da psicanálise freudiana –
Freud postulou suas descobertas baseado no inconsciente e o sonho lucido é
consciente.
Apesar desse fenômeno ser raro acredita-se que todos podem desenvolver a
“habilidade” de sonhar lúcido. Devido a todo o ludismo dos sonhos e realizações de
desejos, esse assunto passou a ser cada vez mais do interesse popular.

A técnica MILD, criada por Stephen LaBerge, é dívida em quatro passos:


1) Depois de acordar de um sonho, no início da manhã, repasse os sonhos até
memorizá-los.
2) Quando adormecer novamente, repita para si mesmo: “Na próxima vez em
que estiver sonhando quero me lembrar de reconhecer que estou
sonhando”
3) Visualizar a volta para o sonho ensaiado, com uma diferença: dessa vez,
concentrar-se em perceber que está sonhando.
4) Repetir os itens dois e três ate dormir ou sentir que sua intenção está
“fixada” na sua memória.

No seu livro “A interpretação dos sonhos”, Freud reconhecer a existência desse


fenômeno de maneira discreta. O psicanalista comenta uma situação em que o
individuo reconhece a “hiper realidade” da situação sonhada com a frase “Afinal, isto
é apenas um sonho”. Freud apesar de admitir timidamente o fenômeno com o
conteúdo visual dos sonhos podendo ser modificado, sempre apontou de maneira
implacável que a via régia dos sonhos continuava a ser o inconsciente. O termo “sonho
lucido” foi utilizado pela primeira vez pelo psiquiatra Frederik van Eeden em 1913.
Algumas pesquisas neurocientistas contemporâneas sugerem que a habilidade de
sonhar lucidamente está diretamente relacionada com a capacidade humana de
autorreflexão na vida cotidiana., isto é, pessoas que praticam e cultivam o hábito da
autorreflexão controlam mais facilmente seus sonhos.
Existem muitos relatos clínicos de sonhos lúcidos. Em 1912, Sándor Ferenczi
psicanalista húngaro, descreveu um caso de um paciente que relatava que estava
sonhando e se percebia de algo que não estava gostando, mudava o rumo do sonho
para as coisas ocorrem de uma forma melhor e o uso do sonho como fuga da realidade

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através do que se apresenta como uma realidade paralela / hiper realidade. Os sonhos
lúcidos normalmente apresentam um ego consciente de estar sonhando, permite
satisfação de desejos reprimidos, experimentação de atitudes e sensações novas que
são irreais fora do sonho. É comum que as pessoas que sonham lucidamente, os
chamados “sonhadores lúcidos”, sempre pratiquem a ação de “voar” em seus sonhos,
por exemplo.
Entretanto a habilidade de controlar seus sonhos de acordo com sua vontade
não garante que o indivíduo apenas terá “sonhos bons”. Em sites e blogs na internet
existem milhões de relatos sobre o pesadelo lúcido. Estar lúcido, seja em um sonho
ou pesadelo, no mundo onírico torna todos os sentidos mais intensos e com
dimensões maiores. Durante um pesadelo lucido a experiencia é mais intensa
acompanhadas de alterações fisiológicas e paralisia do sono. Essa última se
caracteriza por um transtorno que ocorre logo após acordar e impede o corpo de se
mexer. Durante o sono REM e o estágio de “entrega total”, o corpo se entra em
profundo relaxamento, durante a paralisia do sono ocorre uma falha na comunicação
do cérebro com o restante do corpo, o cérebro demora para devolver o movimento e
o individuo fica “paralisado” em estado de consciência.
Quando um pesadelo lucido é seguido por uma paralisa do sono, devido as
intensas sensações ruins experimentadas de forma hiper-realista, o transtorno vem
acompanhado de falta de ar, sensação de medo e angústia e alucinações auditivas e
sons não característicos do local. Para evitar a paralisia do sono é sugerido manter
bons hábitos de sono a fim de melhorar a qualidade do mesmo.
Para terminar, listamos algumas curiosidades sobre os sonhos lúcidos de
acordo com Susana Martinez-Conde, Ph.D., professora e diretora do Laboratório de
Neurociência Integrativa do Centro Médico SUNY e o "Doutor do Sono" Michael Breus,
Ph.D., psicólogo clínico e associado à Academia Americana de Medicina do Sono.

1. O sonho lúcido pode ser uma habilidade inata


Os especialistas concordam que ter sonho lucido pode ser uma habilidade
natural com a qual algumas pessoas nascem. Não é uma “vantagem” é apenas
uma capacidade diferente que algumas pessoas apresentam.

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2. Como qualquer habilidade, pode ser aprendida e melhorada com
prática
"A simples intenção de ter um sonho lúcido e dizer a si mesmo que isso vai
acontecer ou que você terá mais controle no sonho antes de dormir pode
ajudar", explica Martinez-Conde.

3. O grau de consciência e controle em um sonho lucido pode variar.


Mesmo pessoas com a habilidade de ter sonhos lúcidos raramente têm um
controle total, e existem limitações.

4. O sonho lucido não influencia sua vida real


"Algumas pessoas chegam a ter medo de sonhos lúcidos porque pensam que
vão ficar presas no sonho ou que se morrerem em um sonho lúcido, vão morrer na
vida real", diz Breus. Mas é apenas um sonho normal, no qual você está consciente
do fato de que está sonhando.

5. Temas comuns incluem aventuras e sexo

6. Sonhos lúcidos não trazem nenhum benefício além da diversão e de


ter sonhos memoráveis.

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Referências

GARCIA-ROZA, LUIZ ALFREDO. FREUD E O INCONSCIENTE. 20. ED. RIO DE


JANEIRO: JORGE ZAHAR, 2004.

SILVA, ELAINE APARECIDA DA; SANCHES, JOSÉ AUGUSTO RODRIGUES. OS


SONHOS COMO MANIFESTAÇÃO DE DESEJOS
INCONSCIENTES. PSICOLOGADO, [S.L.]. (2011). DISPONÍVEL
EM HTTPS://PSICOLOGADO.COM.BR/ABORDAGENS/PSICANALISE/OS-
SONHOS-COMO-MANIFESTACAO-DE-DESEJOS-INCONSCIENTES . ACESSO
EM 22 SET 2020.

SA, JOSÉ FELIPE RODRIGUEZ DE; FERNANDES, ERMELINDA GANEM.


PSICOLOGIA ANALÍTICA E A INTERPRETAÇÃO DOS PERSONAGENS DOS
SONHOS LÚCIDOS. FRACTAL, REV. PSICOL., RIO DE JANEIRO , V. 28, N. 1, P.
146-152, APR. 2016 . AVAILABLE FROM
<HTTP://WWW.SCIELO.BR/SCIELO.PHP?SCRIPT=SCI_ARTTEXT&PID=S1984-
02922016000100146&LNG=EN&NRM=ISO>. ACCESS ON 22 SEPT. 2020.
HTTP://DX.DOI.ORG/10.1590/1984-0292/1141.
MUNIZ, C. M. SONHOS LÚCIDOS: O SURGIMENTO DA LUCIDEZ ONÍRICA E O
SEU ESTUDO. CIÊNCIAS & COGNIÇÃO. PP. 50-66. SÃO PAULO, N. 5. JUL. 2005

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