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INDÍGENA NO BRASIL
Introdução
A forma tradicional de ocupação espacial dos povos indígenas não pode ser
mensurada através da noção capitalista de apropriação do espaço enquanto propriedade
privada. Se quisermos compreender como os grupos indígenas se apropriam de um
território e nele se organizam espacialmente, temos que nos desprender de certas
categorias de representação territorial que bem se aplicam à nossa sociedade, mas que
não fazem tanto sentido para outras culturas.
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Mestre em História pela Universidade Federal da Grande Dourados. Docente do curso de licenciatura
em Ciências Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. E-mail: victor.mauro@ufms.br
O advogado indígena Paulo Celso de Oliveira, da etnia Pankararu, ressalta que
devemos relativizar nossos pressupostos.
Esse mesmo autor nos informa uma coisa muito importante e que de forma
alguma podemos desconsiderar:
O grande problema é que muitas das terras expropriadas dos povos indígenas no
passado passaram para o controle de agentes poderosos: latifundiários, grileiros,
políticos, cooperativas de fachada, projetos agropecuários modernos, incorporadoras
imobiliárias, colonizadoras, grandes empresas comerciais e industriais, etc. Esse tipo de
ocupante costuma impor uma grande resistência ao intento dos indígenas. Contratam
bons advogados para representá-los nas instâncias judiciais e, em casos extremos,
mobilizam forças paramilitares para ameaçar os índios que manifestam a intenção de
retomar por conta própria as terras.
O Art. 231 da Constituição, em seu parágrafo 6°, decreta que são nulos, extintos
e desprovidos de efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio
e a posse das terras indígenas. Isto significa que, se comprovado que uma determinada
comunidade indígena ocupou ou ocupa tradicionalmente uma determinada área, os
títulos de propriedade e escrituras da mesma não possuem nenhum valor legal.
Centenas de grupos indígenas, quando foram expulsos dos locais que ocupavam,
não possuíam nenhum documento escriturado que atestasse a propriedade sobre esse
território. Isso, porém, não invalida o seu direito, que está resguardado nos termos da
Constituição. A concepção da territorialidade indígena e dos povos tradicionais se pauta
por princípios diferentes daqueles que regem o direito da propriedade privada.
Em alguns casos isso era praticamente impossível, pois devemos lembrar que o
histórico de contato de muitos povos indígenas com a sociedade nacional ao longo de
várias décadas, ou mesmo séculos, foi marcado por circunstancias conflituosas que
interferiram na concepção territorial desses povos e na definição dos limites dos espaços
que ocupavam. Em inúmeros casos, os indígenas foram confinados em áreas bem
menores de que o seu território tradicional, e em algumas situações extremas, eles
ficaram sem terra nenhuma. Empreendimentos econômicos se instalavam nos territórios
indígenas, modificando completamente, e de modo irreversível, a paisagem
(OLIVEIRA, 2006, p.16).
O artigo 231, § 1°, da nova Carta Magna, define como terras tradicionalmente
ocupadas pelos índios “as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para
suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais
necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo
seus usos, costumes e tradições”.
Devemos ter em conta aquilo que Santilli (2005, p.40) nos ensina, ou seja, que a
ocupação da terra por parte das comunidades indígenas se baseia em padrões de
propriedade e de uso diferentes dos nossos. A terra não consiste apenas em um meio de
produção. Ela é o espaço em que se conformam modos de vida que não são baseados na
ocupação intensiva e não é algo do qual se possa desfazer em função da recorrência a
outras alternativas.
Esta autora ressalta que o requisito da imemorialidade não pode mais ser levado
em conta, pois, em primeiro lugar, é praticamente impossível de ser comprovado, já que
o processo colonizador avançou sobre esses territórios, modificando as suas
características; em segundo lugar, porque esse mesmo processo obrigou os povos
indígenas a se deslocarem constantemente, forçando a redefinição de sua
territorialização; em terceiro, por estarmos lidando com populações do presente, com
perspectivas de vida atuais e futuras, e que não devem ser condenadas à imobilidade do
passado (DUPRAT, p.174-175).
Conclusão