Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
JORNALISMO
MACAÉ – RJ
DEZ/2016
ANDRÉ SABINE MACEDO DE OLIVEIRA
MACAÉ – RJ
DEZ/2016
5
BANCA EXAMINADORA:
___________________________________________
Prof. MSc. Gerson Dudus (Orientador)
___________________________________________
Prof. MSc. Leonardo Seabra Puglia (Convidado 1)
___________________________________________
Prof. MSc. Daniel Fassa Evangelista (Convidado 2)
6
Dedico este trabalho a todos que acreditam na cultura e na educação como forma de
desenvolvimento ético de uma sociedade. Aos estudantes que nesse momento ocupam escolas
e universidades por todo o país, os meus mais sinceros votos de que vocês sejam a base de
um Brasil melhor. Os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade residem em cada um de
vocês. Que todos nós tenhamos humildade em também aprender com os mais jovens.
7
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer aos meus pais por possibilitarem uma educação de
qualidade e acreditarem em mim durante esses quase 4 anos de muitas batalhas em que muitas
vitórias foram conquistadas e que, quando necessário, os erros serviram de aprendizado e
aperfeiçoamento.
Aos meus professores, meus mais sinceros agradecimentos. Obrigado pela dedicação e
paciência que sempre mostraram. Que nós, estudantes, saibamos dar mais valor a essa
profissão a qual, se não existisse, não haveria hoje.
Aos meus amigos – em especial a Ingryd, que sempre me incentivou nesse tempo que nos
conhecemos –, lhes agradeço pelos momentos de camaradagem e nos de maior necessidade.
Meu muitíssimo obrigado aos meus camaradas Rhuann, Rafael, Antônio, Walace e Luiz. O
tempo que me permitiram conhecê-los um pouco possibilitou que esse trabalho fosse
concluído da melhor forma possível.
Por último, gostaria de fazer o maior dos agradecimentos a este que é meu amigo, mentor,
orientador e professor. Gerson, durante esse tempo que nos conhecemos – que mais parece
uma vida –, você me ajudou a encontrar caminhos que fizeram com que eu me conhecesse
melhor. Esse André não é mais aquele André que você conheceu há 4 anos. Muito obrigado
por esse tempo em que, sempre que possível, se mostrou disponível. De todos, você foi o
melhor dos amigos. Tudo de melhor para você, hoje e sempre.
8
RESUMO
A internet, a partir da web 2.0, tornou-se a principal forma de comunicação bilateral, onde o
indivíduo deixou de ser apenas receptor para também se tornar produtor de conteúdo. Dessa
forma, pessoas que antes não tinham possibilidade de se expressar ganharam voz com esse
meio de comunicação. O mesmo ocorre com a disseminação de culturas variadas. Isso
permite, portanto, que os rappers da cidade de Macaé, no estado do Rio de Janeiro, tenham a
possibilidade de divulgar suas produções (músicas e clipes) e a divulgação de shows. Além
disso, permite que o rap, uma das quatro características do movimento Hip Hop, que surgiu
principalmente entre os negros que viviam nas periferias das cidades dos Estados Unidos na
segunda metade do século XX, se desenvolva como característica principal de expressão
cultural e de resistência social de jovens negros e pobres, permitindo assim a possibilidade de
romper preconceitos que há muito tempo são alimentados por setores mais privilegiados da
sociedade.
ABSTRACT
The internet, from web 2.0, has become the main form of bilateral communication, where the
individual has ceased to be just receiver to also become content producer. In this way, people
who previously had no possibility of expressing themselves gained a voice with this medium
of communication. The same happens with the spread of varied cultures. This allows the
rappers of the city of Macaé, in the state of Rio de Janeiro, to be able to promote their
productions (music and clips) and the release of shows. In addition, it allows that rap, one of
the four Hip Hop movement characteristics, that arose mainly among the blacks that lived in
the peripheries of the cities of the United States in the second half of the twentieth century,
develops like main characteristic of cultural expression and social resistance development of
black and poor young people, thus allowing the possibility of breaking prejudices that have
long been fed by more privileged sectors of society.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................................................9
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................................55
REFERÊNCIAS.................................................................................................................................57
APÊNDICE.........................................................................................................................................63
11
INTRODUÇÃO
O início do século XXI tem sido marcado pela profusão de manifestações das mais
variadas formas, sejam elas culturais jovens ou até mesmo de cunho político. Os personagens
desse processo histórico, que continua em andamento e que insiste em deixar marcas
profundas, elegeram a internet como principal forma de anunciar a proliferação do que ocorre
a todo instante e também do que está por vir na história da humanidade.
Isso se dá pelo fato de que dentro desse meio desenvolveu-se um universo construído
pela interação entre homem e máquina. O ciberespaço, por conveniência e necessidade que o
ser-humano tem de se comunicar e de ser ouvido, tornou-se uma extensão do universo real, o
ambiente físico e palpável no qual todas as formas vivas em conjunção com a natureza
interagem e se afetam.
Dentro desse universo, indivíduos criaram ferramenta de interação social a longa
distância e de aprendizado, tendo acesso a arquivos textuais ou audiovisuais inseridos por
usuários localizados em lugares variados do globo. Ferramentas de pesquisa (Google), de
compartilhamento (Youtube, Soundcloud) e as redes sociais (Facebook, Twitter, Instagram)
aproximaram as pessoas, sem que estas tenham a necessidade de um encontro em um mesmo
espaço físico, mas sim virtual.
Neste Trabalho de Conclusão de Curso, buscou-se analisar como os rappers macaenses
encontraram seu espaço na internet, através do uso das ferramentas por ela disponibilizadas,
para compartilharem seus conteúdos e como isso é feito por eles, tendo como hipótese de que
esta é um contraponto a impossibilidade destes de se comunicarem com a sociedade através
de meios de comunicação tradicionais como o jornal impresso, rádio e a TV.
Para isso, iniciou-se no primeiro capitulo uma ampla análise da internet e de suas
demais características, sendo esta conhecida por seu formato democrático de comunicação,
permitindo que o usuário que nela se move seja ao mesmo tempo receptor e autor de conteúdo
comunicacional. Autores e pensadores relacionados a ciência da comunicação como Manuel
Castells, Pierre Lévy e Raquel Recuero ajudaram a nortear a pesquisa feita sobre temas como
internet, ciberespaço e cibercultura.
No segundo capitulo, buscou-se entender as características socioculturais do rap, sem
de forma alguma separá-lo do movimento Hip Hop, e como os rappers se relacionam com
esse estilo musical e com a mídia tradicional desde a metade final do século XX aos dias
atuais.
12
Por fim, dedicou-se o terceiro e último capitulo a analisar, através de cinco entrevistas
em profundidade realizadas com os rappers Dom Rhuann, Fiel, Kalil, Antônio Rastaman e
Narciso Beats, – com perguntas elaboradas pelo que foi exposto nos dois primeiros capítulos
–, como estes e outros que trabalham com o rap na cidade de Macaé utilizam a internet e suas
demais ferramentas. Procurou-se entender também como o rap os influencia como indivíduos
e como estes percebem a realidade a sua volta através desse que é mais do que uma forma de
expressão musical, mas também de manutenção de uma identidade e de reflexão social.
13
Pode se considerar quase impossível imaginar o mundo ou uma sociedade atual não
conectada à internet. Esse novo universo que se apresenta é uma extensão do nosso universo
natural, onde surgem a cada momento novas possibilidades de interação entre indivíduos ou
entre homem/computador e até mesmo com o espaço urbano.
Como diz Castells (1999), o desenvolvimento cultural de uma sociedade sofre
intervenção direta pela forma como esta se comunica. Portanto, o surgimento de novas
tecnologias é o que possibilita a transformação e evolução de símbolos e crenças,
características estas que constituem o fator identitário de uma determinada cultura.
Esse mundo virtual tem desenvolvido sua cultura e sociabilidade em seu interior,
segundo o filósofo francês Pierre Lévy (1999), devido a criação de novos programas
computacionais, além do aumento da capacidade tecnológica e de suas potencialidades,
possibilitado pela incessante fusão de novas técnicas. Essa interação homem/computador
permitiu a criação de novos símbolos e crenças, servindo como alicerce para o surgimento da
cibercultura.1
De acordo com Lévy (1999, p. 127), a cibercultura é uma forma de cultura constituída
pela “interconexão, criação de comunidades virtuais e as inteligências coletivas” de usuários
dentro do ciberespaço, praticando a “comunicação interativa, recíproca, comunitária e
intercomunitária”.
Para Bolsoni (2014, p. 47), “há o sentido de uma conexão generalizada, o que implica
na alteração da forma de comunicação todos-para-todos”. Este segue dizendo que fatores
como colaboração e cooperação “são palavras de ordem neste novo contexto sociocultural
1
O termo cibercultura é fortemente ligado ao nome do escritor de ficção científica William Gibson, que publicou
em 1984 o livro Neuromancer. O próprio Pierre Lévy em seu livro Cibercultura (1999) atribui o termo ao autor.
“No livro, esse termo designa o universo das redes digitais, descrito como campo de batalha entre as
multinacionais, palco de conflitos mundiais, nova fronteira econômica e cultural” (LÉVY, 1999, p. 92). A obra
de Gibson tornou-se icônica a ponto da jornalista e doutora em comunicação social pela PUC-RS, Adriana
Amaral – que escreveu o posfácio da edição comemorativa dos 25 anos do livro (ver William Gibson,
Neuromancer. São Paulo: Aleph, 2008) –, dizer que “o impacto e a atração de Neuromancer perduram em um
âmbito que extrapola o literário e entra na areia movediça dos fluxos de influência e das representações na
cultura pop, tendo se disseminado em comerciais publicitários, histórias em quadrinho, games, filmes, moda,
música e, até mesmo, no comportamento de gerações que já nasceram em um mundo científico-ficcional e no
qual as distinções entre a vida real e virtual são cada vez mais tênues e se confundem a cada momento”
(AMARAL, 2008, p. 307). Mas sua contribuição é ainda maior em relação aos elementos culturais ao qual se vê
e vive quando um indivíduo está conectado à internet.
14
pós-moderno. Nesse sentido, pode-se afirmar que a cibercultura indica que tudo está em todos
os lugares”.
Essa nova cultura, diz Castells (2003), é uma elaboração também cultural
caracterizada por princípios e valores daqueles que desbravaram esse espaço.
A cibercultura é a interação entre as singularidades dos usuários e o ciberespaço que,
segundo Lévy (1999, p. 111), é um local “vazio, sem conteúdo particular”. A cibercultura,
portanto, cultiva, em consonância com esse espaço, uma ação coletiva de “comunicação
virtual: cada computador do planeta, cada aparelho, cada máquina, do automóvel a torradeira,
deve possuir um endereço na internet” (LÉVY, 1999, p. 127).
André Lemos (2003, p. 11) define cibercultura “como a forma sociocultural que
emerge da relação simbiótica entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias de base
micro-eletrônicas que surgiram com a convergência das telecomunicações com a informática
na década de 70”.
Para efeitos de comparação, Lévy (1999) usa o impacto da escrita na sociedade para
que se entenda melhor o que é a cibercultura.
Dessa forma, Lévy (1999, p. 130) diz: “Um grupo humano qualquer só se interessa em
constituir-se como comunidade virtual para aproximar-se do ideal coletivo inteligente, mais
rápido, mais capaz de aprender e de inventar do que um coletivo inteligentemente
gerenciado”.
A interconexão, as comunidades virtuais e as inteligências coletivas, diz Lévy (1999,
p. 113), possuem um caráter universalizador, pois tendem “a interconexão geral das
informações, das máquinas e dos homens” que ocorre devido “aos projetos de seus criadores e
às expectativas de seus usuários”.
ainda que levem a uma reunião por meio de um aspecto de sua ação, essas máquinas
de produção de universal decompõem de outras formas diversas micrototalidades
contextuais: paganismos, opiniões, tradições, saberes empíricos, transmissões
comunitárias e artesanais. E tais destruições de locais, são, por sua vez, imperfeitas,
ambíguas, já que os produtos das máquinas são, por sua vez, sempre fagocitados,
relocalizados, misturados com os particularismos que gostariam de transcender
(LÉVY, 1999, p. 117).
O que ocorre, segundo Lévy (1999, p. 118), é uma deriva das ideologias socioculturais
dentro do ambiente digital, sendo que “o ciberespaço dissolve a pragmática da comunicação
que, desde a invenção da escrita, havia reunido o universal e a totalidade”.
Dessa forma, não há um controle da cultura do real dentro do ciberespaço, tornando,
em certo sentido, as interações humanas mais globalizadas, não apenas no sentido da
comunicação espacial, entre indivíduos que vivem em locais diferentes, mas também por essa
troca cultural, registrada em diferentes regiões e nacionalidades.
Porém, a essa fusão do universalizante e do totalizante, Lévy (1999) faz uma análise
das mídias de massa como o rádio e a televisão, que são uma via de mão única, onde apenas o
meio é emissor, cabendo ao indivíduo consumidor da informação o papel de receptor.
Na cibercultura, essa relação se torna mesclada, pelo fato de que a interconexão e a
programação do ciberespaço permitem que o usuário seja tanto consumidor de informação
quanto produtor de conteúdo, acabando assim com essa diferenciação. Henrique Antoun
(2009, p. 235) complementa tal pensamento ao dizer que esse novo meio de se comunicar
permite que surjam interesses entre as pessoas, podendo haver a troca de ideias, opiniões ou
de sentimentos mais profundos, havendo assim uma independência do indivíduo por parte
“dos grupos de opinião da imprensa ou das massas de consumo da mídia irradiada”,
permitindo também novas possibilidades de consumo da informação.
Segundo André Lemos (2005, p. 2), a cibercultura tem seu desenvolvimento com o
surgimento da micro-informática nos anos 70, com a convergência tecnológica e o
estabelecimento do personal computer (PC)”.
Para Lévy (1999, p. 125), isso se deu por meio de um movimento chamado Computer
for the People, nos anos 70, na Califórnia, que “quis colocar a potência do cálculo dos
computadores nas mãos dos indivíduos, liberando-os ao mesmo tempo da tutela dos
informatas”.
“O crescimento da comunicação baseada na informática foi iniciado por um
movimento de jovens metropolitanos cultos que veio à tona no final dos anos 80” que, além
17
A criação dessas novas mídias, continua Santaella (2003, p. 27), propicia um novo
desenvolvimento cultural, que possibilita a “segmentação e diversificação, e a hibridização
das mensagens”. Castells (1999) diz que o uso dessas tecnologias permitiu que as pessoas
criassem seus próprios conteúdos, fosse para entretenimento familiar, como a gravação em
arquivo de vídeo de atividades como férias ou celebrações, que pudessem ser guardadas para
a posterioridade.
Com o tempo, surge a possibilidade de uma convergência da cultura das mídias para o
meio digital, que possibilita um entrelaçamento entre elementos textuais, visuais e
audiovisuais em apenas um espaço, fazendo com que a cibercultura ganhe força como ação de
comunicação e construção social dentro do ciberespaço.
A convergência tanto pode ser entendida como um processo “de cima para baixo”
em que as empresas de mídia aproveitam as potencialidades da tecnologia para
distribuir os seus conteúdos por meio de diferentes canais e múltiplos dispositivos,
como pode ser um processo “de baixo para cima”, à medida que os consumidores de
informação “aprendem” a usar estas novas tecnologias para terem controle sobre o
seu consumo e produção de informação (MORENO, 2013, p. 120).
Essa nova trama permitiu que as pessoas construíssem, dentro desse novo universo,
um sentimento de que estão em um local onde é possível uma livre comunicação, não só com
outros indivíduos, mas também com elementos inseridos nesse espaço, que fazem parte de
suas características.
A década de 90, segundo Castells (1999, p. 443), é determinante para o
desenvolvimento da cibercultura, quando surgem milhares de comunidades virtuais em todo o
mundo, “a maioria delas com base nos EUA, porém se expandindo cada vez mais em âmbito
global”.
Com o surgimento dessas comunidades, Castells (1999, p. 443) diz que surge uma
nova forma de comunicação social, causando “uma sensação de comunidade, mesmo que
efêmera, e talvez trouxesse algum alívio a pessoas carentes de comunicação e auto-
expressão”.
O ciberespaço não é um território paralelo ao nosso, mas que está ligado ao nosso. É
um universo maquínico que se desenvolve junto ao território real. É um universo antes de
19
tudo comunicacional, entre dois ou mais indivíduos (multidão), ou dois computadores, ou até
mesmo uma terceira possibilidade: entre homem e computador (COSTA; SOUZA, 2005).
Essa nova interação mais profunda entre homem e tecnologia não determina o
surgimento de uma nova sociedade como diz Castells (1999), mas sim o desenvolvimento
daquela que buscava, através de novas formas de se comunicar, interligar seus aspectos
culturais já existentes a um novo espaço comunicacional, construindo, dessa forma, uma
comunidade virtual.
Para Costa e Souza (2005, p. 7), “quanto mais intenso o contato entre as culturas,
sejam coletivas ou individuais, maior a intensidade das transformações que irão ocorrer”. O
surgimento das novas possibilidades de comunicação que vieram a reboque com a evolução
da computação e da internet permitiu, de acordo com os autores, uma troca igualitária na
comunicação entre indivíduos.
A esse intenso contato cultural permitido pelas características do ambiente virtual,
Maffesoli (2001, p. 30) diz que “as potencialidades do ciberespaço estão longe de esgotar,
mas já testemunham o enriquecimento cultural que está sempre ligado à mobilidade, a
circulação, sejam as do espírito, dos devaneios e até das fantasias”. Ou seja, a comunicação
incessante entre indivíduos ou com a máquina permite cada vez mais a expansão e uma
roupagem deste local que se trafega com tanta intensidade.
Isso porque, diz Castells (2003), a internet
fue diseñada como una tecnología abierta, de libre uso, com la intención deliberada
de favorecer la libre comunicación global. Y cuando los indivíduos y comunidades
que buscan valores alternativos em la sociedad se apropriaron de esa tecnología, ésta
amplificó aún más su carácter libertário, de sistema de comunicación interactivo,
abierto, global y em timpo escogido (CASTELLS, 2003, p. 6).3
A análise que Recuero (2009) faz do advento da internet é que esta permitiu uma
maior liberdade de se expressar e de se socializar. Isso satisfaz necessidades e desejos dos
3
“foi desenhada como uma tecnologia aberta, de uso livre, com a deliberada intenção de favorecer a livre
comunicação global. E quando os indivíduos e comunidades que buscam valores alternativos na sociedade se
apropriaram dessa tecnologia, ampliaram ainda mais seu caráter libertário global e no tempo escolhido”
(Tradução do autor da monografia). Ver em: CASTELLS, Manuel. Internet, libertad y sociedad: una perspectiva
analítica. In: Polis, Revista de la Universidad Bolivariana, vol. 3, nº 4, 2003.
20
indivíduos em se comunicar de uma forma mais facilitada, pela rapidez garantida pelo uso da
tecnologia, sendo que esta premissa irá influenciar, diz Castells (1999), não só a comunicação,
mas também diversos setores da sociedade contemporânea.
Para Antoun (2009, p. 235), a internet e as inovações que nela surgem permitem uma
economia, devido ao fato de que “os problemas de ação coletiva podem ser resolvidos de
modo simples e econômico”.
Levando em conta o processo comunicacional, dois aspectos são de grande
importância, segundo Recuero (2009), para se entender essa interação social no meio virtual:
os atores (usuários do ciberespaço) e suas conexões (socialização do usuário no ciberespaço).
Estes atores, os usuários desse espaço são indivíduos que carregam suas características
socioculturais do ambiente real para o virtual. Recuero (2009, p. 24) diz que estes são
identificados neste local por deixarem pistas de quem são pelo “reconhecimento de padrões de
suas conexões e a visualização de suas redes sociais através desses rastros”.
Os usuários, levados a se conectarem por necessidades e desejos, são os formadores
dessas ligações, surgindo assim diversas redes de comunicação pelo ciberespaço. “Como
partes do sistema, os atores atuam de forma a moldar as estruturas sociais, através da
interação e da constituição de laços sociais” (RECUERO, 2009, p. 25).
Para haver essa comunicação entre os indivíduos, Recuero (2009) diz que são
necessários meios para que estes possam inserir suas características pessoais. Não de uma
forma concreta, mas sim através de um conjunto de elementos textuais e visuais. Ainda de
acordo com Recuero (2009, p. 27), o uso da imagem ou foto, que o uso de palavras não é o
bastante para conhecer alguém. Se faz necessário então o uso de “rostos, informações que
gerem individualidade e empatia, na informação geralmente anônima do ciberespaço”. É
possível também, com essa fusão entre real e virtual, que o usuário desenvolva uma
identidade híbrida.
Assim diz Castells (1999) sobre a construção identitária de um indivíduo:
21
Os grupos de discussão que vão emergir nos anos 80, constituindo a rede USENET e
a base das comunicações virtuais então nascentes, organizavam-se em torno da
partilha do conhecimento sobre algum tópico ou tema. Esta maneira de se ordenar
torna as redes sociais visíveis e duradouras, contribuindo para o seu crescimento e
proliferação (ANTOUN, 2009, p. 235).
Na década de 90, segundo Antoun (2009), as comunicações no meio virtual irão tomar
um patamar que irá sedimentar a internet como o grande meio de comunicação do final do
século XX e para o início deste século XXI.
Isso, diz o autor, pelo fato de que os grupos de interação descobriram que por sua
independência e liberdade de uso por qualquer pessoa, diferente de meios de comunicação
como os jornais, revistas, rádios ou TVs, pode levar suas lutas sociais e políticas para a
internet.
Nos anos 90, o poder integrador das páginas web e do universo WWW trouxeram
para a comunicação distribuída a reunião dos diferentes movimentos em ações
coletivas, seja para empreender uma luta comum, seja para construir uma atividade
comum. A dinâmica da distribuição das informações e dos debates desenvolvidos
4
CASTELLS, Manuel. O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
22
5
CARNEIRO, Henrique Soares. Rebeliões e ocupações em 2011. In: Occupy: movimentos de protesto que
tomaram as ruas. São Paulo: Boitempo, 2012.
6
A Web 2.0 é uma evolução no uso e na percepção de como vemos a internet como ferramenta de comunicação.
Nela, o usuário se comunica através do compartilhamento de informações, das mais variadas formas possíveis
(textual, visual, auditiva e audiovisual), sendo usadas ferramentas como blogs, sites de compartilhamento de
arquivos ou pelas redes sociais. Essa nova era da internet também é marcada pelo surgimento de novos aparelhos
como o smartphone e o tablet, que permitem o consumo e o compartilhamento de informação em qualquer lugar
e em qualquer hora do dia.
23
Através dos tempos, esta vai se tornar uma rede integradora de elementos sociais como
a economia, a educação, transporte e comunicação. A isso, Manuel Castells deu o nome de
Sociedade em Rede.
Para Castells (1999), rede
Esses dispositivos, muitos deles portáteis, comunicam-se entre si, sem necessidade
de sistema operacional próprio. Assim, o poder de processamento, os aplicativos e
os dados ficam armazenados nos servidores da rede, e a inteligência da computação
fica na própria rede: os sítios da web se comunicam entre si e têm à disposição o
software necessário para conectar qualquer aparelho a uma rede universal de
computadores (CASTELLS, 1999, p. 89).
De acordo com Lévy (1999, p. 92-93), esse ambiente “condiciona o caráter plástico,
fluido, calculável com precisão e tratável em tempo real, hipertextual, interativo e, resumindo,
virtual da informação que é, parece-me, a marca distinta do ciberespaço”. Além de dizer que
“tem a vocação de colocar em sinergia e interfacear todo os dispositivos de criação de
informação, de gravação, de comunicação e de simulação”.
Uma vez que uma informação pública se concentra no ciberespaço, ela está virtual e
imediatamente à minha disposição, independentemente das coordenadas espaciais de
seu suporte físico. Posso não apenas ler um livro, navegar em um hipertexto, olhar
uma série de imagens, ver um vídeo, interagir com uma simulação, ouvir uma
música gravada em uma memória distante, mas também alimentar essa memória
com textos, imagens etc (LÉVY, 1999, p. 93-94).
diferente daquele que se buscou com tanto desejo durante os anos 60, 70 e 80 do século
passado.
A viagem espacial exigiu de nações como os Estados Unidos e a antiga União
Soviética um esforço para descobrir e construir novas tecnologias. O desenvolvimento inicial
era normalmente voltado com o objetivo de servir às forças armadas e só algum tempo depois
para o uso civil.
De acordo com Castells (1999, p. 99), “a primeira revolução na tecnologia da
informação foi norte-americana, com tendência californiana”, onde “cientistas e industriais de
outros países tiveram um papel muito importante tanto na descoberta como na difusão das
novas tecnologias”.
O forte impulso tecnológico dos anos 60 promovido pelo setor militar preparou a
tecnologia norte-americana para o grande avanço. Mas a invenção do
microprocessador por Ted Hoff, enquanto tentava atender ao pedido de uma
empresa japonesa fabricante de calculadora de mão em 1971, resultou dos
conhecimentos e habilidades acumulados na Intel, em uma estreita interação com o
meio de inovação criado desde 1950, no Vale do Silício (CASTELLS, 1999, p. 98).
De certa forma, Castells (1999, p. 98) diz que “a disponibilidade de novas tecnologias
constituídas como um sistema na década de 1970 foi uma base fundamental para o processo
de reestruturação socioeconômica dos anos 80”.
O rumo que o mergulho da sociedade no ciberespaço trouxe para o mundo real, físico,
é uma possibilidade, segundo Lévy (1999), do uso da tecnologia digital, que atingiu setores da
sociedade, além de permitirem uma facilidade de práticas cotidianas. Castells (2003, p. 58) dá
como exemplo o surgimento nos anos 90 do e-commerce, permitindo uma “descentralização
interna de grandes corporações, que adotaram estruturas enxutas, horizontais de cooperação e
competição, coordenadas em torno de metas estratégicas para a firma como um todo”.7
7
CASTELLS, Manuel. A galáxia da internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Rio de
Janeiro: Zahar, 2003.
27
Esse caráter horizontal permitiu ainda na última década do século XX, segundo
Castells (1999), a criação de sistemas operacionais livres como o Linux, sendo uma opção e,
ao mesmo tempo, um contraponto aos softwares desenvolvidos pela Microsoft. Um dos
principais diferenciais do Linux é que nenhuma de suas ferramentas são pagas, diferente, por
exemplo, dos pacotes Office do sistema Windows (Microsoft).
Muito se tentou, diz Castells (1999, p. 442), privatizar a internet, torná-la através de
corporações já existentes uma extensão de seu poder, seja pelo controle cultural, econômico,
social e comunicacional. Porém, o autor coloca três características do ciberespaço:
“penetrabilidade, descentralização multifacetada e flexibilidade. Alastram-se como colônias
de microrganismos”.
Assim, o que se vê no ambiente virtual, principalmente nesse início de século XXI, é
uma disposição dos usuários de comporem em conjunto com dezenas, centenas, milhares de
outros usuários, projetos que visem não só ajudar outras tantas pessoas a terem acesso a
informação, como a produção de livros, que é escrito por vários autores, sem também que
estes não percam tempo na procura de editoras que queiram publicar suas obras nem mesmo
gastar com a impressão destes.
Outras tantas possibilidades permitem que o usuário ajude a financiar, de forma
coletiva, projetos que não podem ser quase ou totalmente custeados por seus desenvolvedores.
Por não haver uma possibilidade de representação física no meio virtual, o usuário cria
formas através de meios de se comunicar. Uma simulação do seu eu neste local. Sua
representação virtual em que constrói características humanas as quais desejar.
Isso só é possível através de uma conexão entre computadores que permitiu o
surgimento de algo que iria revolucionar a comunicação humana e toda uma maneira de ver e
de se pensar a sociedade em que vivemos.
28
8
“os usos da Internet moldaram-se através de seu desenvolvimento como rede e nos tipos de aplicações
tecnológicas que vão surgindo. Os valores libertários dos que criaram e desenvolveram a Internet, a saber, dos
pesquisadores acadêmicos, hackers, redes comunitárias contraculturais e dos empreendedores da nova economia,
determinaram uma arquitetura aberta e de difícil controle” (Tradução do autor da monografia). Ver em:
CASTELLS, Manuel. Internet, libertad y sociedad: una perspectiva analítica. In: Polis, Revista de la Universidad
Bolivariana, vol. 3, nº 4, 2003.
29
Com a criação de Lee, necessidades e desejos vão surgindo por parte de quem usa a
internet. Sites como YouTube – assim também como o Vimeo –, segundo Burgess e Green
(2009, p. 14), são ferramentas de vídeos alimentadas por “produtores de mídia e detentores de
direitos autorais como canais de televisão [...] a pequenas e médias empresas em busca de
meios de distribuição mais baratos ou de alternativas aos sistemas de veiculação em massa”,
desenvolvido através de um esforço feito sempre de forma coletiva, sendo “um sistema de
cultura participante”.
Outros sites como o SoundCloud possibilitam a inserção de arquivos de áudio.
Essa rede destaca-se pelo limite maior de músicas compartilhadas e por ser uma
interface mais simples e intuitiva – que não contém chat e não armazena fotos
(somente o avatar). Cria-se uma visualização gráfica de cada faixa compartilhada, na
qual é possível fazer comentários e, a partir da “própria música”, interagir com
outros ouvintes e produtores. (GALAS, 2011, p. 1).
Para isso, diz Renó (2007), basta que o usuário faça um rápido cadastro, inserindo
dados pessoais, para ter acesso as opções oferecidas por estes sites.
“A internet permite acessar informação, educação ou entretenimento com um
potencial de irresistível atração horizontal, baseado no fato de que qualquer um pode emitir
conteúdos, além de recebê-los”. (MORAES, 1997, p. 102).
Reunindo todo esse conteúdo em um único local, ferramentas de busca como o
Google dão a oportunidade por quem quer que seja procurar qualquer tipo de informação à
30
deriva no ciberespaço. Para Oliveira et al (2012, p. 55), este “é visto como a maior e mais
utilizada base de buscas da atualidade, pois sua forma inovadora e de fácil manuseio,
contendo diversas fontes de informação, de diversos campos”, que também “atrai cada dia
mais usuários, tornando-se ferramenta inicial e muitas vezes final, ou até mesmo única, de
qualquer tipo de pesquisa”.
Para Bucci (2009),9 essas ferramentas de compartilhamento de arquivo permitem ao
usuário guardar suas memórias e materiais digitais, ou que podem ser digitalizados, tendo a
oportunidade de lhes ser uteis em uma futura aplicação.
Com o tempo, o Google foi se tornando mais do que uma mera ferramenta de busca,
tornando-se, entre muitas outras coisas, uma empresa que permite a publicidade de diversos
sites.
Os sites de redes sociais permitem aos atores estarem mais conectados. Isso significa
que há um aumento da visibilidade social desses nós. A visibilidade é constituída
enquanto um valor porque proporciona que os nós sejam mais visíveis na rede. Com
isso, um determinado nó pode amplificar os valores que são obtidos através dessas
conexões, tais como o suporte social e as informações. Quanto mais conectado está
o nó, maiores as chances de que ele receba determinados tipos de informação que
estão circulando na rede e de obter suporte social quando solicitar. (RECUERO,
2009, p. 108).
9
BUCCI, Eugênio. Comunicação digital. In: Cultura digital.br. Rio de Janeiro: Azougue editorial, 2009.
Disponível em: <http://culturadigital.br/blog/2009/09/26/baixe-o-livro-culturadigital-br/>. Acesso em 14 set
2015.
10
GONZALEZ, Cristina de Oliveira. O modelo de negócio do Google: entre a eficiência técnico-científica e o
imperativo econômico do retorno do investimento extrafiscalidade como instrumento de proteção ambiental do
Brasil. In: Estudos de direito de autor e interesse público. V Congresso de Direito de Autor e Interesse Público.
Florianópolis: FUNJAB, 2011. Disponível em: <http://www.gedai.com.br/sites/default/files/publicacoes/anais-v-
codaip-versao-final.pdf#page=15>. Acesso em 16 set 2015.
31
De acordo com Recuero (2009), assim como o Google, redes sociais como o
Facebook descobriram que permitir a publicidade em sua programação, devido a quantidade
de usuários e conexões que possuem, poderia ser uma fonte de obtenção de lucro, já que é
gratuito fazer parte desta rede. Além disso, as grandes marcas entenderam que criar material
publicitário para a internet, ainda mais com a possibilidade de atingir uma grande quantidade
de pessoas, tornou-se um excelente negócio.
Para Recuero (2009, p. 109), o aumento da visibilidade na rede possibilita que
empresas e indivíduos tenham amplo acesso a esse capital social, podendo “intencionalmente
aumentar sua visibilidade no Twitter, por exemplo, utilizando-se de artifícios para aumentar o
número de seguidores, apenas para popularizar seu blog”.
E não só as grandes marcas se beneficiaram destas ferramentas. Usuário individuais,
pequenos grupos, produtores de conteúdo, artistas, músicos e políticos ganharam a chance que
talvez não teriam com tanta facilidade quanto nos ditos meios tradicionais de comunicação
(rádio, impresso e televisão) de divulgarem seja lá o que quiserem.
Um grupo musical, por exemplo, pode produzir o clipe de uma música, inseri-la no
YouTube e, ainda no site, compartilhar seu conteúdo no Facebook ou no Twitter. Dependendo
do tamanho de sua rede de conexões, é possível que o resultado seja positivo do ponto de
vista da visibilidade.
Como boa parte da tecnologia usada pelas pessoas foram antes fontes de uso militar,
com a internet não poderia ser diferente. De acordo com Castells (1999), após o início da
corrida armamentista e espacial, o departamento de defesa norte-americano teve de tomar
medidas preventivas para evitar o vazamento de informações que pudesse comprometer a
segurança dos Estados Unidos durante o período da Guerra Fria.
Ainda de acordo com o autor, cientista que contribuíam com o programa começavam a
ter acesso de forma a criarem sua própria rede de comunicação. Com isso, houve uma divisão,
nos anos 80. A ARPANET (ARPA – Agência de Projetos de Pesquisa Avançada do
Departamento de Defesa dos Estados Unidos) teria por finalidade a comunicação com fins
científicos e a MILNET com a comunicação militar.
Segundo Tait (2007), a internet teve grande parte de uso voltado para as áreas
científica e acadêmica, tendo seu uso comercial apenas no final da década de 80.
A autora continua esse histórico ao dizer que a internet entrou na vida das pessoas no
início da década de 90 com o surgimento de empresas que assumiram um compromisso
comercial de disponibilizarem tal ferramenta, fazendo com que não ficasse mais restrita ao
uso militar ou de pesquisas científicas e acadêmicas.
Isso ocorreu, segundo Castells (1999, p. 83), devido a exigência de empresas, que
desejavam que a internet se tornasse privada. “Uma vez privada, a Internet não contava com
nenhuma autoridade surpervisora”. Sendo assim, possibilitou-se que diversos indivíduos ou
grupos fizessem parte importante do desenvolvimento dessa nova tecnologia de comunicação.
O sucesso da internet se tornou tão rápido que, segundo Moraes (1997), no ano de 96,
o número de pessoas conectadas ao redor do mundo passava dos 50 milhões.
De acordo com Tait (2007, p. 2), o número de usuários aumentou ainda mais com o
surgimento do comércio eletrônico e cada vez mais o aparecimento de novas condições deste
se comunicar. “Hoje a internet faz parte da rotina do trabalho, do estudo e da vida das
pessoas”.
A internet se sedimentou como um veículo em que o indivíduo se tornou ao mesmo
tempo emissor e receptor no século XXI, com a criação de redes sociais e de sites de
compartilhamento de arquivo. Isso porque, continua Tait (2007, p. 2), “a tecnologia continua
33
11
MARX, Karl. O dezoito Brumário e cartas a Kugelmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
35
Nesse processo, pode-se considerar o Hip Hop como movimento 12 social e cultural.
“[...]o hip hop é um movimento social ou uma cultura de rua? A indefinição abre espaço para
o uso aleatório de ambas as aplicações” (ROCHA et al, 2001, p. 17).
Hip Hop
O fator que leva o Hip Hop, segundo Rocha et al (2001, p. 19), a ser considerado um
movimento de caráter social é a sua capacidade de unir elementos políticos, culturais e
sociais.13 A principal força desse movimento ocorre através “de atividades culturais e
artísticas, [onde] os jovens seriam levados a refletir sobre sua realidade e a tentar transformá-
la”.
Para isso, é necessário entender os elementos do Hip Hop, cada um com seu
significado para a construção desse movimento. O rap é a voz, o integrante musical do Hip
Hop, que trata de desenvolver suas canções também com a necessidade de mostrar a
insatisfação de um grupo de pessoas – no caso, os negros – contra um modo de vida que os
tornavam indivíduos inferiores diante de uma sociedade que os negava até mesmo como seres
humanos, sendo este um drama vivido desde a escravidão.
O break é o movimento, a dança do Hip Hop, elaborada de forma robótica, era uma
forma de protesto, segundo Rocha et al (2001, p. 47) contra a Guerra do Vietnã. Os breakers,
“por meio de passos da dança simulavam os movimentos dos feridos de guerra” e de veículos
como o helicóptero, que eram usados em ataques aéreos. Os dançarinos imitavam o
movimento das hélices dos helicópteros, ficando “com a cabeça no chão e, com as pernas para
cima, procura girar todo o corpo” (ROCHA et al, 2001, p. 47).
12
O conceito de movimento social está ligado normalmente ao seu caráter politizado, sempre objetivando
mudanças sociais em relação a um determinado grupo. “Em linhas gerais, o conceito de movimento social se
refere à ação coletiva de um grupo organizado que objetiva alcançar mudanças sociais por meio do embate
político, conforme seus valores e ideologias dentro de uma determinada sociedade e de um contexto específicos,
permeados por tensões sociais” (RIBEIRO, s.d., s.l.).
13
Esse movimento social seria conduzido por uma ideologia (ou pelo menos por certos parâmetros ideológicos)
de autovalorização da juventude de ascendência negra, por meio da recusa consciente de certos estigmas
(violência, marginalidade) associados a essa juventude, imersa em uma situação de exclusão econômica,
educacional e racial (ROCHA et al, 2001, p. 18).
36
O grafite é o visual, o texto do Hip Hop grafitado com spray nos muros das cidades –
que, no caso, não é praticado apenas por esse movimento, mas também pelo Punk, que tem o
grafite como “meio de comunicação e uma marca identificadora deste movimento cultural”,
com características multiculturais e de cunho anarquista (LARA, 1996, p. 48) –, que ainda de
acordo com o autor, “significava uma alternativa para o jovens deixarem as páginas policiais
dos jornais e configurava-se como um meio de expressão cultural e artística com grandes
potencialidades” (LARA, 1996, p. 50).
Esses ingredientes políticos, culturais e sociais introduzidos no Hip Hop surgem pela
necessidade de afirmação do negro, principalmente em um histórico de segregação racial
vivido nos Estados Unidos, onde se consolida como movimento social. “O hip hop não foi
inventado, ele nasceu naturalmente no gueto, recebeu a forma dos negros e excluídos e hoje
auxilia o povo a encontrar uma identidade” (MOTTA; BALBINO, 2006, p. 10).
Fazendo um complemento ao que diz Rocha et al (2001) em relação ao Hip Hop como
sendo um movimento social e cultural, Rose (1994) diz que o
Construindo uma identidade própria que tinha por objetivo uma resistência racial e
identitária, a população negra norte-americana tinha em Martin Luther King Jr. e Malcolm X,
seus grandes líderes. O assassinato desses dois líderes gerou “conflitos inter-raciais,
contribuindo também para a criação de mártires e mitos, que deixaram como lema a exaltação
dos negros, fortalecendo a autoestima da raça” (MOTTA; BALBINO, 2006, p. 12).
14
“Hip-hop é uma forma cultural que tenta transpor as experiências de marginalização da opressão e das
oportunidades brutalmente truncadas dentro dos imperativos culturais da história, identidade e comunidades
afro-americanas e caribenhas. É a tensão entre os rompimentos culturais, produzida pela opressão pós-industrial,
e as uniões da expressividade cultural negra, que arma o cenário para o desenvolvimento do hip-hop” (Tradução
do autor da monografia). Ver em: ROSE, Tricia. Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary
America. Wesleyan, 1994.
37
Essa soma entre cultura e movimento social leva, não só um indivíduo, mas sim um
grupo, uma minoria, a um estágio de empoderamento,15 através dos elementos que o Hip Hop
lhes concede.
Para unificar todos esses elementos, é comum que grupos ligados ao Hip Hop se
reúnam em certos locais, denominados de posse, nos quais desenvolvem uma série de
atividades que possibilitam o empoderamento do indivíduo como “estudos e eventos,
produzindo arte, interferindo na linguagem e na metodologia educacional, reivindicando
políticas públicas e propondo resistência, independência, autenticidade, atitude”, que, no
Brasil, teve início com a posse Sindicato Negro, sediada no espaço da Praça Roosevelt, em
São Paulo (ROCHA et al, 2001, 10).
o punk como uma subcultura jovem associada diretamente com a música, que
rapidamente expandiu-se para muitos centros urbanos do mundo. Mesmo sendo o
punk um movimento extremamente urbano, logo sua abrangência chegou a outros
cantos do planeta, através da mídia escrita, televisiva, impressa... Esses jovens,
através da construção de um estilo que incluía a música e um visual chocante e
15
Empoderamento é a capacidade que alguém tem de evoluir e de se fortalecer como indivíduo. Freire e Shor
(1986, p. 72) dizem que, além de um processo individual, o empoderamento um projeto coletivo, ao dizer é
“muito mais do que um invento individual ou psicológico. Indica um processo político das classes dominadas
que buscam a própria liberdade da dominação, um longo processo histórico de que a educação é uma frente de
luta”.
38
Os antecedentes do rap residem nas diversas formas da música popular que incluem
narrações de histórias: o blues falado (talking blues), as passagens faladas da música
gospel e a música de chamado e resposta. Suas influências formais mais diretas
encontram-se no final da década de 1960, nos “toasters” dos DJs do reggae (um
estilo de discussão) e nos estilos despidos da música funk, particularmente em James
Brown, com seus “fluxos de consciência” sobre um funk elementar de fundo
(SHUKER, 1999, p. 231-232).
Para Macedo (2011, p. 3), os elementos musicais do rap levaram-no a ser considerado
um gênero de baixa qualidade, “pois suas letras não seguem a métrica formal das rimas e
versos da canção, por não serem produzidas com instrumentos musicais, mas pela escolha e
combinação de fragmentos de músicas já gravadas, para produzir uma nova música”.
De acordo com Moassab (2011), os rappers não estão preocupados em produzir um
estilo musical com uma linguagem formal, mas sim com a linguagem que usam na rua, sendo
uma extensão de seu linguajar cotidiano, um fator que torna o rap parte da cultura dessas
pessoas.
Em um dos versos de “Negro Drama”, dos Racionais MCs, é afirmado que: “gíria
não, dialeto”. Quer dizer, não se trata de “linguajar rude” ou “pobre”, mas ao
contrário, é um mecanismo de coesão do grupo, no qual ele se reconhece e pensa seu
mundo. A insistência neste modo de falar implica em criar um confronto contra a
imposição externa dos vocabulários da língua culta e de suas regras gramaticais e a
construção de um modo próprio de se expressar (MOASSAB, 2011, p. 144).
O rap, diz Hinkel (2008), é produzido pelo DJ (Disc Joquey) e pelo MC (Mestre de
Cerimônia). Em eventos produzidos, o DJ fica responsável pelo arranjo da música, com seus
aparelhos de mixagem de som ou produção de ruídos, conhecido como o scratch, quando se
desliza o disco, com as mãos, no aparelho de som. Já o MC tem o papel de compor e cantar a
música.
Suas produções musicais possuem temas diversos, que vão desde a discussão social,
relacionada a problemas vividos em sua maior parte pelos negros que vivem nas periferias
como a violência, crime, pobreza, marginalização, exclusão social e preconceito, até letras
que narram a ostentação vivida por alguns rappers, que conseguiram se estabelecer
economicamente através da venda de discos e de shows.
Dessa forma, segundo Hinkel (2008) e Moassab (2011), existem duas linhas de
produção de rap, que se relaciona como parte de um movimento social, que discute as
problemáticas ligadas a pessoas que vivem à margem da sociedade, e o rap de entretenimento,
considerado vazio de significado e que não teria qualquer possibilidade de produzir uma luta
social, sendo ligado a questão da ostentação, onde se fala de dinheiro, carros e mulheres.
Mesmo o rap de protesto, diz Shuker (1999), divide-se em duas vertentes, tendo letras
pacifistas, mesmo as vezes tendo um tom mais pesado como do grupo brasileiro Racionais
MCs ou do rapper Sabotage (1973-2003), e, por outro lado, a produção de músicas que
exaltam o uso da força bruta como forma de luta por espaço na sociedade.
NWA (Niggers With Attitude), de Los Angeles – em seu álbum de estreia, Straight
Outta Compton (Priority, 1989), atacado pelos críticos por sua descrição de vida de
um gueto negro –, e a música “Cop Killer”, de Ice-T, causaram polêmica e pedidos
de proibição das apresentações e das gravações dos artistas (SHUKER, 1999, p. 54).
A separação dos estilos de rap se dá, de acordo com Shuker (1999), entre: 1) o
hardcore rap, que trabalha em suas letras a luta social do negro e dos marginalizados; 2) o
reggae rap, uma mistura entre o rap, pelo fato da música não ser cantada e sim falada, com o
ritmo e a batida do reggae; 3) o rap feminino, que segue um caminho por uma luta de
igualdade entre mulheres e homens no rap; 4) o Dayse Age rap, que tem uma sonoridade que
remete o soul e o funk; 5) e o gangsta rap, onde predomina o machismo, sexismo, ostentação
e a apologia à violência e as drogas.
De acordo com Moassab (2011, p. 57), uma vertente mais rentável do rap acabou
ganhando maior notoriedade na grande mídia, tendo “uma forte influência dos rappers
estadunidenses como Eminem, Snoop Dog, 50 Cent ou Marcelo D2, no Brasil”.
Além dessas variações do gênero trabalhadas por diversos grupos, há no Brasil, por
exemplo, a mixagem de estilos musicais brasileiros que se entrelaçam com o rap, segundo
Alves (2008) e Macedo (2011), pelos elementos similares que possuem entre si. O autor diz
que uma dessas similaridades é o uso da rima, que no Nordeste é utilizado pelo repente.
De acordo com Alves (2008), o repente tem outra semelhança com uma modalidade
do rap que é o freestyle onde criam-se canções através do improviso. Em batalhas de rimas,
feitas em público, tanto os praticantes do rap quanto o repente desenvolvem suas rimas
naquele instante.
Em sua maioria, o rap é ouvido e produzido por jovens (SHUKER, 1999; ALVES,
2008; MACEDO, 2011). Além de ser uma produção que dá voz as lutas de grupos diversos, é
fonte de aprendizado para estes.
Nas palavras de Andrade (1999),
Segundo Dutra (2006) e Moassab (2011), o rap, como se conhece hoje, nasceu nos
anos 70 nos Estados Unidos, em bairros segregados (guetos), reduto de negros e latinos,
como, por exemplo, o Brooklyn e o Bronx, em Nova York, ou em cidades como Chicago e
Detroit, diz Sevcenko (2001), que ao sofrerem com a decadência econômica, em decorrência
da crise econômica mundial que afetou o setor automobilístico do local, causou a demissão de
muitos negros, que também haviam migrado da região Sul do país para estes dois locais.
Esse gênero musical já tinha um caráter de luta social, mas que era usado inicialmente
para embalar as festas que ocorriam nos bairros, seja para animar as pessoas ou para
apaziguar os ânimos, principalmente no que se refere a briga entre gangues rivais (ROCHA et
al, 2001).
Era uma forma desenvolvida, segundo as autoras, pelos DJs Afrika Bambaataa e Kool
Herc, considerados pelos estudiosos do rap e da cultura Hip Hop como sendo dois dos
principais difusores destes elementos nos Estados Unidos. “À época, os próprios DJs
animavam e encorajavam a multidão recitando palavras e versos rimados em tom
reivindicatório, nos quais abordavam fatos do cotidiano marginalizado em que viviam”
(RIGHI, 2011, p. 41).
Porém, as características que vão produzir o rap enquanto ritmo e poesia, além do uso
do canto falado e do uso de aparelhos tecnológicos, como o sound-system, surgem do toaster,
42
que é, segundo Rocha et al (2001) e Righi (2011), um evento onde pessoas se reuniam em um
local público, na Jamaica, para realizarem discursos ideológicos em relação aos problemas
sociais sofridos por estas. Tais características foram levadas por Kool Herc, nascido na
Jamaica, para os Estados Unidos.
De acordo com Shuker (1999, p. 232), com a popularização do rap entre os jovens
negros, estes o transformaram em uma forma de sobreviver, ao gravar discos, sendo que as
grandes gravadoras não tinham interesse no rap, fazendo com que os rappers gravassem “em
selos independentes e inicialmente em singles de doze polegadas, principalmente no selo
Sugar Hill Records, em Nova Iorque”.
Segundo Dutra (2007) e Macedo (2011), o rap se torna no final dos anos 70 e durante
toda a década de 80 um sucesso pela grande quantidade de discos vendidos e,
consequentemente, pelo interesse da mídia. “No fim dos anos 70, o Sugar Hill Gang de Nova
Jérsei gravou pela Sugarhil Records o ‘Rappers Delight’ que foi um grande sucesso de
vendagem e apresentou o rap para o grande público da indústria fonográfica” (DUTRA, 2007,
p. 17).
Sete anos depois o grupo Run-DMC de Nova Iorque lançou a música Suckers MCs
fundindo rap com hard rock, que chamou mais uma vez a atenção para o rap no
cenário da música popular norte-americana vendendo mais de 2 milhões de discos.
A partir daí o rap fez sua estréia na indústria fonográfica saindo do cenário
underground para conquistar o mercado de discos (DUTRA, 2007, p. 17).
Ainda nos anos 80, o rap tem sua difusão no Brasil. Segundo Righi (2011, p. 63), os
“registros de que as primeiras manifestações públicas de RAP no Brasil surgiram em shows
apresentados em 1986 no Teatro Mambembe, em São Paulo, pelo DJ Théo Werneck”. O autor
(2011, p. 63) (apud BARBOSA; RIBEIRO, 2008) diz que “o primeiro registro fonográfico
totalmente de RAP nacional foi a coletânea Hip-Hop Cultura de Rua, lançada em 1988 pela
gravadora Eldorado”.
43
Uma das dificuldades passadas pelo rap são as questões relativas a como a mídia
recebe e como é sua percepção em relação a este gênero musical. Esse embate entre rap e
mídia é por muitas vezes alvo das críticas dos rappers, que se sentem deixados de lado pelos
grandes meios de comunicação, seja por causa da forma em que suas letras são interpretadas
seja pela falta de interesse em saber o que estes pensam sobre o que está acontecendo ao redor
do mundo em que vivem.
Em 2006, o rapper carioca MV Bill foi entrevistado pela revista Isto É. Na entrevista,
MV Bill fala de tais problemas.
O Jornal da Globo disse que meu trabalho era uma mistura de armas, drogas e
música ruim e devia parar na Justiça. Isso, sem sequer ter ouvido a minha música.
Mesmo assim, dois dias depois desse comentário essa música ruim foi usada no
seriado Brava gente e no domingo seguinte no Fantástico, na mesma emissora. Diga-
se de passagem, sem que eu tivesse autorizado. Que música ruim é essa, afinal? (O
RAPPER CONTA..., 2006).
Para Silva (apud ROCHA et al, 2001), os meios de comunicação nunca estiveram
propensos a dar atenção ao rap. Moassab (2011, p. 57) complementa ao dizer que essa busca
por espaço levou canais como a MTV a divulgar estilos de rap, desassociados daqueles que
trabalhavam a crítica social em suas letras, como o gangsta, “de caráter comercial e de
44
Estes jovens são constantemente vítimas de discriminação social e racial, vistos pela
mídia como delinquente, violentos, desinformados e desqualificados
profissionalmente, contrapostos a um modelo de “adolescência formal. A mídia tem
um forte papel na construção do imaginário ao retratar as periferias como o lugar do
“perigo” (MOASSAB, 2011, p. 74).
A aversão criada pelos rappers em relação a mídia é tão grande, segundo Júnior
(2014), que esta é considerada uma das principais inimigas em relação ao que se propõe o rap,
pois, durante os anos 90, muitas reportagens tinham um tom negativo quando o assunto era
este gênero musical.
Essa questão fica evidente em uma entrevista concedida em 2011 a MTV pelo rapper
Dexter, ao dizer que “não é interessante pra mídia divulgar um show do Racionais, do Dexter,
45
ou de outros que seguem a mesma linha, a não ser que ela vá lucrar com isso” (DEXTER:
‘MÍDIA..., 2012).16
Em 2013, o rapper GOG postou em sua página no Facebook uma crítica, que depois
foi republicada pelo site RND (Rap Nacional Download), em que fala como o rap é visto
pelos meios de comunicação, principalmente a Rede Globo, e de certa forma, mesmo que
indiretamente, aos rappers que participam de programas televisivos.
Cada um faz da sua vida profissional o que bem quiser. Inclusive EU. Por isso
expressei aqui a “minha opinião” e relação com a mídia televisiva, Rede Globo.
Uma das justificativas para essa “dificuldade de relação” é que, historicamente, ela
sempre esteve distante das causas, e sempre preconceituosa com que diz respeito às
canções. Pertenço a primeira geração do Hip Hop brasileiro, uma geração que
revolucionou, e passou DISTANTE dessa mídia, hoje vista, como essencial para que
possamos ser divulgados, mais conhecidos. Em tempo, mas que conhecido, seja
reconhecido. E aí: fomos mais fortes SEM a Rede Globo!!! (GOG DEIXA..., 2013).
Além de criticar a mídia, rappers como Dexter e GOG tecem observações, de certa
forma críticas, sobre a aproximação de alguns integrantes do rap com a mídia. Na mesma
entrevista para a MTV, Dexter diz que por não realizarem raps tão contestadores, rappers
como Emicida, Criolo e Rashid acabam ganhando mais espaço nos meios de comunicação.
“Não estou de forma alguma menosprezando o trabalho dos meus companheiros, mas o nosso
rap nunca apareceu e não é feito para aparecer na televisão” (DEXTER: ‘MÍDIA..., 2012).
No mesmo caminho, GOG, em seu depoimento no Facebook, usa palavras mais fortes
ao criticar tal aproximação ao dizer: “Tem uma parte significativa que preferiu esquecer o
passado. Eu não” (GOG DEIXA..., 2013).
“Não desviar na reta do fim das vozes do início” – Trinta anos depois, tenho essa
regra como prática diária. A minha geração, ou melhor, alguns membros dela,
sonhavam com auto gestão, com um nós por nós, em fazermos nós mesmos o nosso
diálogo, bater de frente com todos esses que trabalham para nos alienar, para que
nada mude, e por aí vai… (GOG DEIXA..., 2013).
Tomando como oposição ao pensamento de GOG, o rapper Emicida tem uma postura
diferente, ao dizer, em entrevista à revista Trip, em 2011, que o rap deve começar a se
desassociar ou não ficar na obrigação de sempre levantar a temática social em suas letras.
“Tento construir coisas que gerem mais coisas pro próprio rap, embora eu não me sinta muito
à vontade quando as pessoas obrigam a gente a estar vinculado ao social. Quem tem
16
A entrevista de Dexter não pode ser mais acessada no site da MTV, porém pode ser vista no site Noticiário
Periférico: http://www.noticiario-periferico.com/2012/01/dexter-midia-quer-criar-movimentinho.html. Acesso
em 29 set 2015.
46
obrigação de mudar essa porra é o governo, não é grupo de rap” (EMICIDA: NINGUÉM...,
2011).
O próprio Emicida vê essa radicalização de uma parte dos produtores de rap com
relação a mídia como uma situação que deve começar a ser mudada. “Você tem que ir onde
tem respeito, onde as pessoas falam com você. Tipo, sou preto de favela, quero mudar essa
situação e não vou lá falar com as pessoas do outro lado, vou ficar aqui reclamando?”
(EMICIDA: NINGUÉM..., 2011).
A posição de Emicida é altamente criticada pelo rapper Elemento, principalmente em
relação a uma entrevista que o primeiro concedeu ao jornal Estado de S. Paulo, em 2010, ao
dizer que, quando um álbum de rap aparece em algum edital, “sempre acabam contemplando
trabalho social, aquele discurso padrão de rap” (RAPPER EMICIDA..., 2010) e que sua
música é bastante influenciada pelo samba.
Elemento vê este como uma espécie de marionete da grande mídia, ao dizer o que
esses meios de comunicação querem ouvir. “O caso é que, na entrevista em questão, o
Emicida fez o jogo da grande mídia (no jornal mais conservador de São Paulo). A elite
brasileira aceita ‘tolerar’ o rap, assim como fez com o funk, pois já percebeu que é um ‘mal
que veio pra ficar...’” (EMICIDA..., 2010).
A afirmação das autoras é corroborada pelo rapper Emicida, que em uma entrevista
para o site G1, em 2014, diz que o uso de meios alternativos contribui, por exemplo, “na
medida em que é mais barato e rápido gravar uma música e soltar na internet do que correr
atrás de uma plataforma física pra divulgá-la” (‘AINDA SE SABE..., 2014).
De acordo com Simões (2008), a internet possibilitou uma igualdade entre rappers
profissionais e amadores, pelo fato de que agora os dois compartilham o mesmo meio de
comunicação para distribuir seu conteúdo.
O autor afirma também que torna possível, pelo alcance que permite, que grandes
produtoras do mercado fonográfico também aumentem sua capacidade de expansão comercial
e, por outro lado, permite o crescimento de artista que ainda estão no início de sua carreira.
Sabendo usar as ferramentas certas de forma correta, tem a chance de atingir seus objetivos,
seja o de propagar o rap e o que este representa, ou de alavancar comercialmente suas
produções musicais.
48
Dessa forma os rappers da cidade de Macaé (RJ) encontraram para trabalhar suas
canções, disseminando o rap através da rede. Uma grande aliada no momento em que buscam
atingir o maior número de usuários do ciberespaço, para que estejam cientes da existência
desse gênero musical que não só repercute nas letras as situações diárias de quem vive na
periferia, mas que torna possível mostrar que o rap é um estilo de vida para quem o pratica.
fazer um estudo em profundidade para que se pudesse conhecer melhor os entrevistados e que
se pudesse desenvolver com detalhes o objetivo proposto neste trabalho.
Nas entrevistas, foram realizadas uma série de perguntas, fundamentadas no que foi
discutido nos capítulos 1 e 2.
As perguntas feitas buscaram entender a visão dos entrevistados com relação ao rap,
a forma encontrada por eles para se comunicarem com a sociedade e como estes lidam com
seus dilemas pessoais e do ambiente em que vivem – já que apenas o rapper Antônio
Rastaman vive em um bairro de classe-média alta (Bairro da Glória), enquanto que Dom
Rhuann (Malvinas) e Fiel, Kalil e Narciso Beats (Parque Aeroporto) vivem em bairros
considerados periféricos da cidade Macaé. Dos cinco, Fiel e Narciso Beats completaram o
ensino médio enquanto que os outros três continuam cursando.
Também foram feitas perguntas sobre a internet, que, mais do que um meio de
comunicação e pesquisa, é um universo sincronizado ao universo real, que possibilita a uma
grande quantidade de usuários a se conectarem entre eles, permitindo a troca de informações e
conteúdo, com o intuito de se buscar amizades, conhecimento e aliados em lutas sociais
dentro e fora do mundo virtual.
A quantidade de entrevistas se justifica pelo fato de que as informações, obtidas
através das entrevistas, ajudam a entender a composição do rap na cidade.
Com base nas informações dos entrevistados, será feita uma análise para identificar
como a internet tornou-se o principal meio de comunicação dos rappers macaenses. O que
deve ser feito compreendendo a história destes personagens com o rap, suas ligações e
influências com esse ritmo musical, para que se possa entender como a internet se apresenta
neste processo, pois assim como este meio virtual, o rap é um meio de conectar e aproximar
pessoas, criando um estilo de vida e uma compreensão crítica do mundo e do lugar ao qual
vivem e interagem.
Como toda história surge de uma rede de causas e efeitos que se conectam
incessantemente e a todo momento, é importante esclarecer como foi o primeiro contato
destes cinco jovens com o rap, que se deu na infância, e se assemelha com relação ao que
escutavam, tanto em nível nacional como internacional, desde grupos como Racionais MC’s,
Facção Central, a rappers como Sabotage, Tupac, The Notorious B.I.G, 50 Cent e Eminem.
50
Meu primeiro contato com o rap, eu era muito novo, foi quando eu tava nos Estados
Unidos. Bem novo. Foi de influência dos meus pais. Do meu próprio pai, que meu
pai já gostava também. E também pela cultura ao redor que eu tava, entendeu. Pelas
influências que eu tava. Porque lá é bem black, né. Eu morava em Atlanta. Então as
paradas lá são bem soul, bem blues. Então o que envolve um pouco também do rap,
né. Com o jazz e etc. Porque o jazz, na verdade, é a mãe de todos. E o rap veio das
influências locais mesmo de onde eu morava (FIEL, 2016)
O rap se tornou uma marca forte em todos eles porque se torna uma forma crítica de se
pensar desenvolvida através da criatividade. Para Dom Rhuann (2016), rap é uma forma de se
expressar, “de falar em cima da batida o que eu quiser e para poder passar as visões do que eu
queria, as vivências, o que eu vivi, o que eu ouvia”. Este continua dizendo que também é uma
“forma de falar do sistema, do governo”. Segundo Kalil (2016), o rap não é só uma forma de
fazer críticas, mas serve também para “te mostrar que o mundo não é só sujeira. Também
mostra o lado bom do mundo”.
De acordo com Narciso Beats (2016), a importância que esse gênero musical teve em
sua vida foi significativa, “porque 90% de quem eu andava antes do rap tá morto ou preso”.
Acho que pela minha trajetória de vida, foi a que mais me identifiquei. Eu já vivi
muita coisa. Tendo só 24 anos eu já passei por muita coisa. E o rap, ele descreve
muito...ainda mais...com todo respeito...ainda mais para um cara que é jovem e
negro, entendeu? Ele expressa mais o jovem negro do que outro tipo de música. A
verdade, a dificuldade, o preconceito...os números, as estatísticas...o Hip Hop fala
muito sobre isso. Os outros gêneros de música, assim, é música pra você se divertir,
pra você viajar mais. O Hip Hop fala o que você precisa ouvir, entendeu? Que se eu
não sair do gueto, eu vou ser mais um. Eu preciso sair, eu preciso de uma melhoria.
Eu preciso buscar, eu preciso alimentar minha mente, entendeu? E o Hip Hop ajuda
nisso bastante (FIEL, 2016).
Torna-se perceptível que o rap é um acréscimo cultural como uma forma de ensino,
que permite ao indivíduo ter uma ideologia, algo em que se apegar, mas não no sentido em
que esses jovens apenas recebem a mensagem e obedecem, mas sim no sentido de criar
indivíduos contestadores, que possuam uma liderança para si próprio e para aqueles que
escutam suas músicas e acabam criando uma percepção própria de mundo.
Mas é a verdade, né, cara? A verdade dói, a verdade assusta, a verdade dá medo.
Tem coisas ocultas que se a pessoa souber...fica com medo, entendeu? A verdade
dói. Infelizmente essa é a verdade. A gente tem que mudar. A gente que ter
liderança. Tem que parar de...tem que criar líderes e parar de criar seguidores. Na
nossa educação não tem como a gente criar lideres, só seguidores. Você só vai para
a vitrine de trabalho. Formou? Formou! Próximo! (FIEL, 2016).
Ao longo dos tempos, alguns rappers tinham essa liderança, muito mais pelo que
diziam suas músicas, que nada mais eram do que um reflexo de suas próprias vidas e da visão
51
que tinham em relação a sociedade. “Eu escutei muito Tupac 17 quando eu era novo. Então
tinha muita coisa que o Tupac falava que dava uma liderança pra gente, que tava no escuro
naquela época”. (FIEL, 2016). Para Kalil (2016), essa influência por parte do rapper norte-
americano se deu “mais ou menos uns dois anos atrás, quando eu ingressei, que eu entrei no
primeiro grupo [Un-Lock Rap]. Foi um aprendizado”, servindo também como forma de
diminuir a raiva que tinha de tudo, o que acontecia “ouvindo umas músicas. O estresse que eu
tinha eu descontava em letras. Servia como inspiração. Foi um calmante”.
Além disso, todas as suas vivências e percepções se tornam referência no momento de
escrever uma letra de rap: “Acho que tudo é inspiração. Tudo é poesia, na verdade. O vento,
as dificuldades, a superação...tudo é inspiração” (FIEL, 2016).
Influencia bastante. Porque tem vezes que eu já passei por umas situações de
preconceito. Aí eu quero pegar...eu tô com raiva disso ou não gostei disso...eu pego
e escrevo no papel. Ou se eu passo em frente a uma escola e tá faltando lanche. Eu
fico com aquilo na cabeça e escrevo sobre isso. Esse é o cotidiano influenciando no
rap. Ou quando eu leio ou vejo algo que não me deixou satisfeito eu pego e escrevo
(ANTÔNIO RASTAMAN, 2016).
Para Narciso Beats (2016), o que o influencia na sua escrita são os momentos que já
passou em sua vida ou as situações que ocorrem no dia a dia, quando vê “mendigo na rua e
uma pessoa jogar cinco centavos fora, eu vou ficar arrasado. Eu vou escrever sobre aquilo.
Porque é uma parada que eu já vi acontecer na minha frente”.
Outro elemento que os influenciam são as músicas que escutam, que variam desde o
rap a outros estilos, como diz Fiel (2016), que tem como referências o jazz, o soul e o blues.
Já Kalil (2016) tenta imprimir em seu estilo o rock. Essa variedade de gêneros musicais
permite a eles elaborarem e incrementarem algum beat Box18 com que trabalham.
17
Tupac Amaru Shakur, conhecido na cena rap como Tupac Shakur nasceu em Nova Iorque no dia 16 de junho
de 1971. Sua carreira como rapper teve início em 1991, quando lançou o disco “2Pacalypse Now”. Suas músicas
ficaram mundialmente conhecidas por seu forte apelo em relação a causa negra, além de outros temas sociais
como pobreza e violência policial. Sua influência deriva desde cedo, através do histórico de luta de sua mãe pelo
grupo Panteras Negras, além dos problemas vividos pelos negros na época nos Estados Unidos. O rapper foi
assassinado no dia 13 de setembro de 1996, em Las Vegas, quando saia do local onde havia ocorrido uma luta do
lutador de boxe Mike Tyson. Durante a curta carreira, Tupac lançou seis álbuns. No entanto, é o rapper que mais
vendeu álbuns na história (TUPAC: VIDA..., 2010).
18
Em um português bem claro o significado é ‘caixa de batida’. Na cultura hip hop e no rap em geral o beat Box
tem muita importância, pois ajuda nas batalhas de mcs, nas composições de músicas sem batida e por isso é
muito conhecido e as pessoas deram palavras para definir o beat Box como: som de boca e/ou percussão vocal
onde a pessoa faz com a boca os efeitos que um DJ faz nas instrumentais (INSTRUMENTO..., 2012).
52
A internet tem sido para estes uma fonte infindável de conhecimento próprio, sendo a
principal fonte de busca para se refinamento intelectual e como forma de aprimoramento em
relação ao rap. De acordo com Fiel (2016), seu aprofundamento no rap se deu através da
curiosidade em escutar o que as letras de rap diziam, “porque a internet é uma biblioteca, se
você souber usar ela. Aí você acaba pesquisando e acaba vendo mais conhecimento, mais
coisas que você não aprende no dia a dia”. De acordo com Dom Rhuann (2016), em
complemento a Fiel, diz que “desde a primeira vez que gravei. A primeira vez para conhecer,
depois para divulgar mesmo. Depois fui descobrindo como aumentar a divulgação nessas
redes sociais, patrocinando, pagando”.
Ferramentas como Youtube, diz Antônio Rastaman (2016) foram sua fonte inicial com
relação ao rap, indo “pesquisar os artistas que a galera fala. Alguém me falava de um rap e eu
ficava ouvindo”.
Para Kalil (2016), complementando Narciso Beats, esse contato se deu quando estava
no grupo Un-Lock Rap, quando foram gravar uma música, depois disso “a gente criou a
página do grupo. Começamos a divulgar bastante na internet, usando o Facebook”.
Assim, pode-se perceber a internet sendo usada como a ferramenta para a qual foi
desenvolvida durante as décadas finais do século XX, tornando-se referência na busca por
conhecimento geral.
Outro fator de vital importância para a potencialização da internet é a sua capacidade
cada vez maior de encurtar o espaço/tempo, de modo que uma informação ou algum tipo de
conhecimento esteja à disposição do indivíduo em questão de segundos, dando nova forma à
comunicação a distância. Segundo Dom Rhuann (2016) e Fiel (2016), a busca por
informações sobre o rap se dão nos sites Rap 24 Horas19 e Rap Nacional.20
19
RAP 24 Horas. Disponível em: <http://www.rap24horas.com.br/>. Acesso em 13 jun 2016.
20
RAP Nacional. Disponível em: <http://www.rapnacional.com.br/>. Acesso em 13 jun 2016.
53
Eu acho que eles nunca irão. Os próprios Racionais, o Eduardo...acho que eles nunca
irão com o mesmo alinhamento da mídia porque não vai mudar. Vai ser sempre
aquilo. O poder vai ser sempre de quem tem dinheiro e a minoria vai ser sempre
manipulada. Uns ou outros vão conseguir, mas vai ser sempre assim, entendeu?
(FIEL, 2016).
Porém, Fiel (2016) diz que podem a vir a participar de programas de TV que
estimulem suas participações.
Para Dom Rhuann, Fiel e Kalil, essa realidade não se mostra muito diferente do que
eles vêem acontecer no cenário nacional. De acordo com Kalil (2016), por exemplo, “a rádio
não vai querer que um bando de moleques venha falar mal do governo, falar umas verdades.
Eles não gostam. Eles gostam daquelas musiquinhas pop, leve. Rádio, TV”.
Complementando, Dom Rhuann (2016) diz que “a letra do rap não bate com a mídia. Porque
muitas vezes o rap faz música contra a mídia. Não são a favor da manipulação da mídia. Mas
quando é um rap romântico ou meio zoeira, a mídia abraça”. “O rap vai muito contra o
sistema. Então eu acho que eles têm medo dos MCs”, diz Fiel (2016).
Já Antônio Rastaman e Narciso Beats pensam nessa situação de forma diferente.
Segundo Antônio Rastaman (2016), houve a oportunidade de gravar uma música, na Rádio
101 FM, de Macaé, porém “eu fiquei um tempo afastado do rap e acabou que deixei de lado.
54
Meu irmão foi numa festa e entrou em contato com o pessoal da rádio. Foi meio que na
amizade”. De acordo com Narciso Beats (2016), existe uma exigência por parte de quem
escuta música antiga e por quem trabalha em rádio, mas acha também que “pode ser falta de
interesse da galera daqui de se manifestar pra isso, pra acontecer” de o rap chegar as rádios da
cidade. Porém, este concorda que existe um preconceito com o rap, “que não goste da letra,
achar que aquilo é muito forte.
abraçando a ideia do cara. Acaba trazendo uma pessoa que gosta mais da sua
música. O Facebook hoje é uma das maiores ferramentas. Tem também o Instagram.
Mas o Instragram não tem a mesma função do Facebook. Acho que o Facebook tem
mais poder hoje em dia. É onde você vai trazer ela pro Youtube pra ela ver uma
música (FIEL, 2016).
Deu uma ajuda legal. Ajudou bastante. A gente gastou acho que só uns vinte reais.
Ganhamos bastante likes. A quantidade de pessoas que viu aumentou. Uma música
que a gente lançava tinha quinhentas visualizações, agora tá dando mil. Nosso
último clipe que a gente lançou, Triste Realidade, 22 teve mais de mil visualizações
(KALIL, 2016).
Outros clipes da Família Free Rap no Youtube, “Várias Profissões”, 23 “Então Vem”24 e
“Queremos Mudança”25 tiveram 737, 469 e 553 visualizações respectivamente, que foram
verificadas para este trabalho no dia 20 de junho de 2016.
O patrocínio divulga 24 horas. Se você não usar o patrocínio, você mesmo tem que
divulgar. E as vezes você não tem tempo pra ficar divulgando. Então, você sabe que
o patrocínio tá ali divulgando, ganhando mais uma curtida, compartilhando, pessoas
dando mais visualizações, conseguindo mais público pra você, pra sua música. Pra
reconhecerem mais seu trabalho, sua arte (FIEL, 2016).
21
FAMÍLIA Free Rap. Disponível em: <https://www.facebook.com/familiafreerap/?fref=ts>. Acesso em 13 jun
2016.
22
TRISTE Realidade. Família Free Rap. Macaé, 21 abr 2016. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch ?v= TzxkUXVkN1M>. Acesso em 13 jun 2016.
23
VÁRIAS Profissões. Família Free Rap. Macaé, 3 dez 2015. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch? v=62718qRRL4k>. Acesso em 13 jun 2016.
24
ENTÃO Vem. Família Free Rap. Macaé, 28 out 2015. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=2
kyXTQboWiQ>. Acesso em 13 jun 2016.
25
QUEREMOS Mudança. Família Free Rap. Macaé, 16 dez 2014. Disponível em:
<https://www.youtube.com/wa tch?v=OqkmZlQtTUg>. Acesso em 13 jun 2016.
56
uma realidade próxima. Segundo Narciso Beats (2016), complementando o que disse Fiel, a
venda dos beats tem lhe ajudado financeiramente, porém “não pode vender caro. A galera
aqui não compraria um beat caro. Só se for um conhecido. Se for um Neo Beats, um WC
Beats, Mr. Brake”.
A internet também os tem ajudado a se profissionalizarem, possibilitando com que
ganhem dinheiro com o rap. As conexões que fazem lhes ajudam a conhecer outros rappers,
além de conseguirem trocar informações com eles.
De acordo com Narciso Beats (2016), esse universo sem fronteiras permitiu a ele ter
contato com um rapper de São Gonçalo, que abriu na outra cidade o MóResponsa Records, 26
de Narciso. “E através dele eu tô tendo contato lá pra ver se eu consigo me apresentar numa
roda cultural lá. Uma roda grande, que todo mundo vai”, diz.
O Facebook também permite que os rappers divulguem os eventos em que irão
participar. Assim, pode-se perceber que esse universo virtual se conecta com este universo
físico. É possível estimar pela página do evento quantas pessoas devem ir para assistirem as
apresentações. De acordo com Narciso Beats (2016), “se fosse só no boca a boca, um carro de
som divulgando, até ajuda, mas não funciona tanto quanto um evento no Facebook. Porque
você convida seus amigos e esses convidam outros amigos”.
Antigamente, se você quisesse fazer um evento teria que fazer no boca a boca.
Telefone, ligar. O Facebook faz chegar em tantas pessoas tão rápido. De hoje pra
amanhã você consegue chegar em muita gente, compartilhando no Facebook. Isso
ajuda bastante nos eventos, nos meios de divulgação (KALIL, 2016).
26
MÓRESPONSA Records. Disponível em: <https://www.facebook.com/MoResponsaRecords/?fref=ts>.
Acesso em 13 jun 2016.
57
De acordo com Andréia Moassab, o rap cria suas próprias regras, de forma que
minorias como o negro e o cidadão que vive na periferia se identidade com algo, tornando-se
um grupo coeso, para que sobrevivam às dificuldades do cotidiano.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
por este pesquisador se esse estilo musical não perde sua essência, diz que acha “que não.
Porque tava na hora disso ter acontecido. Igual aconteceu nos Estados Unidos. Só que a nossa
mídia é mais manipuladora. Nossa mídia tem um controle maior que a mídia de lá, nos
Estados Unidos”.
No entanto, percebe-se que o rap que trabalha mais as críticas sociais continua em
processo de afastamento da mídia tradicional. Primeiro, porque esse tipo de rap vê a mídia
como uma forma de alienar a sociedade e de não mostrar a real situação vivida pelas minorias
como negros, pobres etc. Do outro lado, a mídia, segundo Domenech et al (2001) e Moassab
(2011), indicam que o estilo de rap que vai, por exemplo, para a TV é mais romantizado ou
comercial.
Em contrapartida, Fiel (2016) aponta que, para que as pessoas sejam mais conscientes
dessa manipulação midiática, é necessário que se tenha uma educação de maior qualidade.
Outro fato que se percebe é que os rappers macaenses já conseguem, mesmo que aos
poucos, seu espaço na internet para que impulsionem o rap da cidade. Porém, mesmo que os
grupos tenham uma aproximação (em parcerias, troca de informações e eventos), estes ainda
não conseguem trabalhar toda a potencialidade que o rap e o movimento Hip Hop
proporciona, como a conscientização e os trabalhos sociais.
Em Macaé, não existe o conceito da posse, tão características nas periferias das
cidades do estado de São Paulo. Dentro disso, o rapper Narciso Beats (2016) diz ser
importante que um rapper ou grupo esteja “ajudando o outro. Sem nada de separação, de
intriga. Eu acho a parte mais importante do rap é a união. Se não tiver união, o rap não vai
andar”.
Talvez pelo fato de haver uma diferença de locais em que os rappers de Macaé moram,
que variam de bairros de classe média ou na periferia, e também pela possibilidade de não
haver um grande conhecimento histórico do movimento Hip Hop é que não ocorra esse
sentimento de identidade.
Finalizando, as análises e as entrevistas realizadas possibilitam que outros trabalhos
acadêmicos sejam realizados em Macaé, por exemplo, dentro do campo da educomunicação,
estudando como o rap ou até mesmo o Hip Hop é trabalhado (e se é trabalhado) nas escolas;
na sociologia, analisando o rap e o Hip Hop do ponto de vista social; ou antropológico,
verificando como os grupos categorizados dentro do movimento Hip Hop se organizam e se
comportam.
59
REFERÊNCIAS
ABRAMO, H. W. Cenas Juvenis: punks e darks no espetáculo urbano. São Paulo: Scrittta,
1994.
‘AINDA SE SABE, muito pouco sobre o hip hop, diz rapper Emicida. G1, Vale do Paraíba,
21 fev 2014. Disponível em: <http://g1.globo.com/sp/vale-do-paraiba-
regiao/musica/noticia/2014 /02/ainda-se-sabe-muito-pouco-sobre-o-hip-hop-diz-rapper-
emicida.html>. Acesso em 29 set 2015.
ANTOUN, Henrique. Web 2.0 e o futuro da sociedade cibercultural. In: Revista Lugar
Comum, Nº 27, p. 235-245, 2009. Disponível em: <http://uninomade.net/wp-content/files
_mf/112203120942Web%202.0%20e%20o%20Futuro%20da%20Sociedade
%20Ciberculturl.pdf>. Acesso em 08 set 2015.
BUCCI, Eugênio. Comunicação digital. In: Cultura digital.br. Rio de Janeiro: Azougue
editorial, 2009. Disponível em: <http://culturadigital.br/blog/2009/09/26/baixe-o-livro-cultura
digital-br/>. Acesso em 14 set 2015.
BURGESS, Jean; GREEN, Joshua. YouTube e a revolução digital. São Paulo: Aleph, 2009.
CAMPOS, Silvana Isabel F. G. Hip hop na internet: o site Bocada Forte como espaço
hipertextual de construção e expressão de uma cultura jovem. Brasília: UnB, 2004. Disponível
em: <http://www.bdae.org.br/dspace/bitstream/123456789/2221/1/tese.pdf>. Acesso em 31
set 2015.
CASTELLS, Manuel. Internet, libertad y sociedad: una perspectiva analítica. In: Polis,
Revista de la Universidad Bolivariana, vol. 3, nº 4, 2003. Disponível em: <http://polis.revues.
org/7145>. Acesso em 09 set 2015
DEXTER: ‘MÍDIA, quer criar movimentinho paralelo ao rap’. Noticiário Periférico, jan
2012. Disponível em: <http://www.noticiario-periferico.com/2012/01/dexter-midia-quer-
criar-movi mentinho.html>. Acesso em 29 set 2015.
DUTRA, Juliana Noronha. Rap e identidade cultural. In: XVI Congresso da Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Música. Brasília, 2006. Disponível em:
<http://www.anppom.com.br/anais/category/46-etnomusicologia?download=593:rap-e-identi
dade-cultural>. Acesso em 25 set 2015.
DUTRA, Juliana Noronha. Rap: identidade local e resistência global. São Paulo: UNESP,
2007. Disponível em: <http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/95121/dutra_jn_me
_ia.pdf?sequence=1>. Acesso em 25 set 2015.
FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. São Paulo: Paz e
Terra, 1986.
EMICIDA: NINGUÉM, tem paciência comigo. Trip, São Paulo, 05 abr 2011. Disponível em:
<http://revistatrip.uol.com.br/trip/emicida-entrevista>. Acesso em 29 set 2015.
ENTÃO Vem. Família Free Rap. Macaé, 28 out 2015. Disponível em:
<https://www.youtube. com/watch?v=2ky XTQboWiQ>. Acesso em 13 jun 2016.
GOG DEIXA, claro sua opinião sobre o Rap na grande mídia. RND, Porto Velho, 20 ago
2013. Disponível em: <http://www.rapnacionaldownload.com.br/9474/gog-deixa-claro-sua-
opiniao-sobre-o-rap-na-grande-midia/>. Acesso em 29 set 2015.
INSTRUMENTO, vocal – Beatbox. Blog Cultura da rua, 14 fev 2012. Disponível em:
<http:// culturadaruarap.blogspot.com.br/2012/02/beatbox-instrumento-vocal.html>. Acesso
em 13 jun 2016.
LARA, Arthur Hunold. Grafite: arte urbana em movimento. São Paulo: ECA-USP, 1996.
Disponível em: <https://pt.scribd.com/document/157954302/Arthur-Hunold-Lara-Grafite-
Arte -Urbana-Em-Movimento-Tese-Mestrado-USP>. Acesso em 20 set 2015.
LEMOS, André. Cibercultura: alguns pontos para compreender a nossa época. In: Olhares
sobre a Cibercultura. Porto Alegre: Sulina, p. 11-23, 2003. Disponível em:
<http://www.facom. ufba.br/ciberpesquisa/andrelemos/cibercultura.pdf>. Acesso em 07 set
2015.
MARX, Karl. O dezoito Brumário e cartas a Kugelmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1997.
MORAES, Dênis de. A dialética das mídias globais. In: Globalização, Mídia e Cultura
Contemporânea. Campo Grande: Letra Livre, 1997.
MOTTA, Anita; BALBINO, Jessica. Hip Hop: a cultura marginal. São Paulo: UNIFAE,
2006. Disponível em:
<http://www.academia.edu/download/34440289/hip_hop__a_cultura_margina l.doc>. Acesso
em 19 set 2015.
OLIVEIRA, Eliane Silva de Melo et al. Google: um fenômeno informacional? São Paulo:
Revista CRB-8 Digital, p. 54-65, 2012. Disponível em:
<http://www.revista.crb8.org.br/index. php/crb8digital/article/viewFile/70/72>. Acesso em 15
set 2015.
QUEREMOS Mudança. Família Free Rap. Macaé, 16 dez 2014. Disponível em:
<https://www .youtube.com/watch?v=OqkmZlQtTUg>. Acesso em 13 jun 2016.
RAPPER EMICIDA, se sente parte da tradição do samba. O Estadão, São Paulo, 26 mar
2010. Disponível em: <http://cultura.estadao.com.br/noticias/musica,rapper-emicida-se-sente-
parte-da-tradicao-do-samba,529772>. Acesso em 29 set 2015.
RIGHI, Volnei José. Rap: ritmo e poesia: construção identitária do negro no imaginário do
RAP brasileiro. Brasília: UnB, 2011. Disponível em: <http://repositorio.unb.br/bitstream/
10482/10853/1/2011_VolneiJoseRighi.pdf>. Acesso em 24 set 2015.
ROCHA, Janaina et al. Hip Hop: A periferia grita. São Paulo: Editora Fundação Perceu
Abramo, 2001.
ROSE, Tricia. Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary America.
Wesleyan, 1994.
SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: no loop da montanha-russa. São Paulo:
Companhia das Letras, 2001.
SILVA, José Carlos G. da. Rap na cidade de São Paulo: música, etnicidade e experiência
urbana. Campinas: IFCH-UNICAMP, 1998.
SILVA, Raquel Matos. As redes sociais e a revolução em tempo real: o caso do Egito.
Porto Alegre: UFRGS, 2011. Disponível em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/ 37496/000820279.pdf?>. Acesso em 20
set 2015.
SIMÕES, José A. V. Redes, internet e hip-hop: redefinindo os espaços de fluxo. In: VI
Congresso Português de Sociologia. Portugal: Associação Portuguesa de Sociologia, 2008.
Disponível em: < http://www.aps.pt/vicongresso/pdfs/308.pdf>. Acesso em 20 set 2015.
TRISTE Realidade. Família Free Rap. Macaé, 21 abr 2016. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=TzxkUXVkN1M>. Acesso 13 jun 2016.
TUPAC: VIDA, e morte do maior rapper que o mundo conheceu. Beside Colors, 10 dez 2010.
Disponível em: <http://besidecolors.com/tupac-morte-e-vida-do-maior-rapper-que-o-mundo-c
onheceu/>. Acesso em 16 out 2016.
VÁRIAS Profissões. Família Free Rap. Macaé, 3 dez 2015. Disponível em:
<https://www.you tube.com/watch?v=62718qRRL4k>. Acesso em 13 jun 2016.
APÊNDICE
20 anos.
Macaé.
Malvinas.
De início eu escutava o Racionais, 50 Cent, Snoop Dog, o pessoal mais da gringa. Depois
fiquei conhecendo o Sabotage, os caras daqui do Brasil. Mas, assim, de início, não era tanto
rap. Era mais de improviso mesmo, de rimar, sem ser rap. Qualquer batida. Depois fui tendo
contato com outros raps. Outros raps pra melhorar. Fui variando bastante.
Quando eu comecei, devia ter uns 11 anos. Era mais pra ouvir. Mas pra escrever, gravar, tem
uns dois anos.
Foi quando, uns três anos atrás, quando eu comecei no rap lá na praça, nos eventos. Evento de
roda. O pessoal chegava e improvisava. Eu cheguei de início, meio de canto, mais
observando. Aí depois comecei a fazer junto com a galera, perdendo a vergonha. Nisso, teve
uma certa vez que o grupo Pés Descalços, daqui de Macaé, veio e falou comigo: “Escreve
uma letra e grava ela, que depois que você gravar a primeira, se você gostar, você grava
mais”. Aí fui.
Como meio de expressão. Ver que tinha liberdade de me expressar, de falar em cima da batida
o que eu quiser e para poder passar as visões do que eu queria, as vivências, o que eu vivi, o
que eu ouvia e falar de qualquer coisa. Tanto você pode falar do sistema, do governo, ou você
pode falar de uma coisa romântica ou de um momento de diversão seu.
67
Hoje em dia já mudou bastante. Fui conhecendo outros que me identifiquei mais. Hoje me
identifico mais com o Sabotage, SMJ, até o Primeiramente, da nova geração, o Tupac,
Notorious, Joy Bada$$, que é mais um Boom Bap clássico. E de outros estilos, tem uma
galera da nova geração, que eu gosto, que é o Haikai, Costa Gold, o Barril de Rap, que eu
conheci tem pouco tempo e já me identifiquei bastante.
Emicida, Crioulo não escuto tanto, mas tem umas músicas dele que eu gosto. Projota eu gosto,
que é mais das antigas, e tem o 5º Andar, do Rio de Janeiro.
Bastante. Eu costumo dizer que eu sou viciado em freestyle. Então, quando eu comecei a me
dedicar, eu olhava onde passava e via as placas das lojas. Tudo rimava. O que eu observava
bem. Hoje eu vi um menorzinho na rua, vendendo bala, só com um chinelo no pé. O outro ele
tinha perdido. Sem camisa. Ali já veio uma reflexão. Olho os muros pichados, as frases. Só da
pessoa ter feito aquilo já tem um motivo. Tudo é uma reflexão, que você pode colocar em
uma letra e escrever, sair algo de bom para outra pessoa refletir e buscar melhorias também.
Tem muita coisa. Minha vida em si, meus erros, minha família, amigos. A partir do momento
que você começa a refletir, aparecem várias paradas. Abre um leque na sua mente. O rap me
ensina a pensar antes.
Busco como profissão, mas tento não pensar muito nisso, porque quando a gente faz o que
gosta, a gente se diverte também. Mas não pode o momento de diversão ser maior que a
profissão.
Quando eu vi que era possível. Quando vi que tinha uns caras que conseguiam viver disso. E a
gente ainda consegue levar a mensagem, fazer o que gosta.
No Google, Youtube e sites de rap nacional. De site, tem o Rap 24 Horas e o Rap Nacional.
Desde a primeira vez que gravei. A primeira vez para conhecer, depois para divulgar mesmo.
Depois fui descobrindo como aumentar a divulgação nessas redes sociais, patrocinando,
pagando.
O boca a boca.
Vejo muitas. Porque cria muitas facilidades. Porque antigamente, para saber que um grupo de
rap foi criado em São Paulo, até a gente saber aqui, eles já tinham lançado outro CD. Hoje em
dia o cara lançou uma música, já está na internet.
Tem sim.
Tenho sim. Tenho conhecido outros grupos de fora. Tanto que fiz várias amizades, de outras
cidades, outros estados. Tem aquela troca, um divulga o trabalho do outro. As vezes fazer até
uma parceria. O rap é isso. Ele acaba criando amizade. A música tem esse dom de unir.
69
Você tem tido contato com pessoas que não são de Macaé?
Você acha mais fácil compartilhar seu conteúdo na internet do que, por exemplo, em
uma rádio?
Sim. Porque só depende da gente. Na rádio não depende só da gente. Depende também da
disposição dos caras de querer. Porque muitas vezes a letra do rap não bate com a mídia.
Porque muitas vezes o rap faz música contra a mídia. Não são a favor da manipulação da
mídia. Mas quando é um rap romântico ou meio zoeira, a mídia abraça.
Eu tenho 24 anos.
Eu tenho o ensino-médio completo, mas eu tenho uns cursos técnicos de mecânica. Mecânica
de aeronaves.
No momento eu tô trabalhando numa profissão que eu nunca exerci na minha vida, que é
barman.
Meu primeiro contato com o rap, eu era muito novo, foi quando eu tava nos Estados Unidos.
Bem novo. Foi de influência dos meus pais. Do meu próprio pai, que meu pai já gostava
também e também pela cultura ao redor que eu tava, entendeu. Pelas influências de onde eu
tava. Porque lá é bem black, né. Eu morava em Atlanta. Então as paradas lá são bem soul,
bem blues. Então o que envolve um pouco também do rap, né. Com o jazz e etc. Porque o
jazz, na verdade, é a mãe de todos. E o rap veio das influências locais mesmo de onde eu
morava.
Eu fui, na verdade, para uma vida melhor. Porque na época a gente foi pelo México. Meus
pais ainda moram lá. Eu voltei pro Brasil porque eu fui deportado. Eu morava lá pra uma
melhoria.
E pelo fato de que eu fui deportado? Eu fui deportado porque eu não tinha documentação. Eu
era ilegal lá. Eu vim pelo México, então eu não poderia tirar uma carteira de motorista, uma
identidade. Eu poderia estudar, mas seguir...fazer, vamos supor, uma graduação, uma
faculdade...eu não poderia fazer uma faculdade. Então acabei caindo numa enrascada de
dirigir sem carteira, essas paradas, etc...e fui deportado.
E foi com essa idade que você teve contato com o rap...
Isso. Antes era mais samba, porque a minha família é toda do samba.
O rap praticamente me educou. Ele me educou muito, porque eu tava escutando muitas coisas
que eu assimilava, que você via no cotidiano das pessoas. Igual a preservar a mulher, a não
botar a mão na mulher. Eu escutei muito Tupac quando eu era novo. Então tinha muita coisa
que o Tupac dava uma liderança pra gente, que tava no escuro naquela época, né. O rap
praticamente me educou e mostrava, falava as verdades de outras pessoas pra você não seguir
aquela verdade. Pra você alimentar as coisas boas e não cometer os mesmos erros.
Não em todas as músicas. Mas em outras, sim. Tinha umas músicas que ele falava do estilo de
vida dele, mas tinha muita música que ele era mais pessoal, ele era mais povo, né. Ele ouvia
mais a população, as pessoas mesmo.
Com certeza. O rap, na verdade, é um estilo de vida que você tem que alimentar. Hoje em dia
tem um rap que...tem dois gêneros de rap. O boom rap e o trap. Tem aquele rap que as
pessoas fazem como uma coisa mais pra gastação. Mas tem um rap que é um rap de conteúdo.
Então você vai querer buscar, que você aprende, que você escuta uma coisa na música e você
fala, cara o que ele tá falando? Então você vai lá e vai buscar. Igual...tem música do CD do
Damian Marley com o Nas, que se chama Distant Relatives, que é Relativas Distâncias, que
eles falam muitas coisas ocultas do mundo que a gente não aprende na escola. Então você
acaba indo buscar pelo fato de que você escutou aquilo ali. Mas o que que é isso? Do que eles
tão falando? É naquela curiosidade que entra a internet. Você vai pesquisar, porque a internet
é uma biblioteca, se você souber usar ela. Aí você acaba pesquisando e acaba vendo mais
conhecimento, mais coisas que você não aprende no dia a dia na escola.
Eu escuto muito soul, jazz...Amy Winehouse, Erikak Badu. Eu escuto muita coisa fora do
gênero do rap, porque acho que traz...o rap tem uma fórmula de seguir, mas a gente tem que
estudar outras músicas, porque a melodia...as outras coisas...elas compõe tudo, pra você trazer
uma harmonia diferente, entendeu?
Com certeza. O Legião Urbana influencia o cara que faz um rap...o Rappa influencia também.
Tem outros gêneros de música que influenciam o rap.
música é, além de só o rap. Então você vai expandindo outras portas...acabei conhecendo a
MPB, acabei conhecendo o próprio blues, conhecendo o rock também. Aí você vai
conhecendo um pouquinho de cada coisa.
Isso já na adolescência?
Isso já na adolescência.
E quais os estilos de rap que lhe influenciam? Você falou do Tupac. Tem algum nacional
que lhe influencia?
Ah...com certeza. Eu não consigo ir trabalhar sem escutar uma música. Eu não consigo entrar
dentro de um ônibus sem escutar uma música. O que eu acho que, assim, hoje em dia as
pessoas não interagem muito. As pessoas não conversam com a outra dentro do ônibus. Então
eu meio que prefiro viajar no próprio mundo, na minha própria galáxia. Então, música é
acordar, dormir, que eu tô escutando música. Eu sou apaixonado por música.
Com certeza. O que eu vejo, tudo é inspiração. Eu tar aqui com você agora pra mim é uma
inspiração. Acho que tudo é inspiração, tudo é poesia, na verdade. O vento, as dificuldades, a
superação...tudo inspira. Basta você criar, né. Ter aquela criatividade pra você ter uma coisa
pra criar. O que influencia também são entrevistas, são matérias. Coisas relacionadas mesmo
a cultura da arte, da música, do Hip Hop.
Acho que pela minha trajetória de vida, foi a que mais me identifiquei. Eu já vivi muita coisa.
Tendo só 24 anos eu já passei por muita coisa. E o rap, ele descreve muito...ainda mais...com
todo respeito...ainda mais para um cara que é jovem e negro, entendeu? Ele expressa mais o
jovem negro do que outro tipo de música. A verdade, a dificuldade, o preconceito...os
números, as estatísticas...o Hip Hop fala muito sobre isso. Os outros gêneros de música,
assim, é música pra você se divertir, pra você viajar mais. O Hip Hop fala o que você precisa
ouvir, entendeu? Que se eu não sair do gueto, eu vou ser mais um. Eu preciso sair, eu preciso
de uma melhoria. Eu preciso buscar, eu preciso alimentar minha mente, entendeu? E o Hip Ho
ajuda nisso bastante.
Como você vê o rap hoje, pelo fato dele ter ido muito para a mídia?
73
Eu acho que foi bom. O Emicida fez uma coisa que precisava ser feita no Brasil. Ele abriu as
portas pra muito MC que tava parado e hoje trabalha, graças ao que ele trouxe, entendeu? Mas
eu acho que, assim, tem muita coisa que o rap nacional...tem umas coisas muito forçadas.
Tem umas coisas críticas ainda. Mas eu não posso criticar. O maior público crítico é o público
do Hip Hop. Porque o Hip Hop, ele tem o lado da verdade e tem o lado moda. Tem muita
gente que faz pra ostentação, por dinheiro. E tem gente que faz por amor. Eu mesmo faço pelo
amor. Não é de hoje que eu venho fazendo Hip Hop, entendeu? Antes do dinheiro vem o
amor. Tipo, se for pra cantar numa periferia sem ganhar nada eu faço com a maior satisfação,
entendeu? Eu quero passar a mensagem, eu quero tocar as pessoas e etc. Primeiro o amor,
depois a condição financeira, entendeu?
Mas não acha que indo para a mídia, o rap não perde um pouco de sua essência crítica a
própria mídia e ao sistema?
Eu acho que não. Porque tava na hora disso ter acontecido. Igual aconteceu nos Estados
Unidos. Só que a nossa mídia aqui era mais manipuladora. Nossa mídia tem um controle
maior que a mídia de lá, nos Estados Unidos. Lá...lógico que a mídia tem um controle
também, mas as pessoas ainda buscam. Aqui as pessoas...elas estão tão vidradas na mídia que
esquecem de ler um livro, de pesquisar, de conhecer, de querer o buscar. Lógico que a mídia
tem culpa, mas acho que a culpa maior é da educação. A educação é que tem mais culpa,
porque enquanto a educação não mudar, as pessoas vão ser manipuladas cada vez mais. Na
verdade somos marionetes, né? Em cima do sistema que eles criaram.
Mas você acha que, por exemplo, o rap do Racionais, do Facção Central, vai ter um dia
esse espaço na mídia?
Não. O Eduardo é um cara muito inteligente. Ele vai contra a mídia sempre. Ele não vai
fechar com a mídia. E o Mano Brown acredito que...eles sabem o que tá acontecendo, eles
sabem a forma que a mídia trabalha etc. Pode até acontecer, que eu já vi o Edi Rock, um dos
protagonistas do Racionais, ir na mídia. Mas não foi num programinha de fazer bolo. Foi uma
coisa que ele conversou, contou a história da vida dele e etc. Pode até acontecer deles irem na
mídia, mas não vai ser aquela mídia...do MC fechar com a mídia em várias coisas. Pode ir no
Programa do Jô, num de entrevista, pode ir num Danilo Gentilli, que é de entrevista também.
Esses tipos de programa eles podem ir. Mas se for pra fazer bolinho, eles não vão. Acho
muito difícil, porque os caras são muito revolucionários. O Eduardo é um cara muito
revolucionário pra mim. Mano Brown também. Porque os caras vêm falando disso a 20 anos.
Agora que o povo começou a acordar e tem gente que não acordou ainda, entendeu?
Você acha que eles evitam a mídia pelo fato desta ser vista como manipuladora?
Eu acho que eles nunca irão. Os próprios Racionais, o Eduardo...acho que eles nunca irão com
o mesmo alinhamento da mídia porque não vai mudar. Vai ser sempre aquilo. O poder vai ser
sempre de quem tem dinheiro e a minoria vai ser sempre manipulada. Uns ou outros vão
conseguir, mas vai ser sempre assim, entendeu?
O fato das músicas do Racionais e do Facção serem muito pesadas também os impedem
de aparecerem na mídia?
74
Mas é a verdade, né, cara? A verdade dói, a verdade assusta, a verdade dá medo. Tem coisas
ocultas que se a pessoa souber...fica com medo, entendeu? A verdade dói. Infelizmente essa é
a verdade. A gente tem que mudar. A gente que ter liderança. Tem que parar de...tem que
criar líderes e parar de criar seguidores. Na nossa educação não tem como a gente criar
lideres, só seguidores. Você só vai para a vitrine de trabalho. Formou? Formou! Próximo!
Se eu puder, com certeza. Vai ser uma alegria pra mim, entendeu? Mas eu sou daquele tipo de
cara que vive um dia após o outro. Porque hoje eu trabalho como barman. Aí eu posso ser
mandado embora. E amanhã? Entendeu? Eu continuo fazendo as músicas. Eu trabalho como
barman. Eu saio do serviço 4 horas da manhã. Eu chego em casa, eu tiro 1 hora pra escrever.
E as vezes a mente não trabalha como deveria trabalhar, porque sua mente tá tão cansada, que
eu chego em casa 3, 4 linhas e vou dormir. Eu já acordo no outro dia pra vir trabalhar. Eu
como...correria...vem trabalhar. Pra mim não tem como falar. Se eu tivesse uma condição de
viver só disso, aí era outra história.
Eu penso. Mas primeiro eu preciso buscar uma certa melhoria, um conforto, pra começar a
trabalhar e investir. No momento, eu tô vivendo um dia após o outro, entendeu? Eu tô
procurando uma melhoria de emprego. Me qualificar no mercado primeiro, pra depois eu
pensar nisso. Porque eu sei que não vai ser rápido. Interesse eu tenho.
Na época de Orkut. Antes disso eu mexia na internet porque eu gostava de...porque já tinha o
Youtube...e eu gostava de olhar a batalha de MCs. Naquela época tinha muita batalha dos
MCs de Filadélfia. Aí a internet veio disso...de música, de site de relacionamento...Orkut e
etc. Depois disso eu acabei vendo que a internet é uma biblioteca, principalmente, se você
souber usar ela.
Já tem uns três, quatro anos, que eu comecei a usar a internet pra procurar, pra ler, pra estudar
outros músicos, pra estudar a própria música, entendeu? Pra estudar outros gêneros também
pra você trazer pro rap. O MC precisa de base. A gente cria uma base. Então tem muita coisa
que a gente escuta, a gente mescla. Então a gente acaba estudando outros tipos de música pra
tentar criar um beat, né? Ou pro MC criar uma letra. Você acaba estudando outros gêneros.
Você acaba estudando outros artistas. Conteúdo também, porque você tem que sempre ler.
Eu sigo mais produtores. Acompanho o trabalho deles, que a mídia tá sempre divulgando.
75
Google. O Google é o search pra gente. Então não tem um site especifico. Eu vou lá, coloco
uma parada e aparece. Tá achado.
Eu uso mais o Facebook. O Facebook hoje é uma ferramenta fundamental, porque tem muita
gente que tá ligada no Facebook 24 horas. E toda hora que você coloca uma postagem tem
uma pessoa que tá vendo. E hoje o Facebook tem aquela forma de patrocínio, né? Você paga
o patrocínio que ele fica alí 24 horas, 15 dias, 30 dias, e a pessoa vê aquilo em continuum,
todos os dias, e provavelmente alguns vão ter a curiosidade: “Cara, vou escutar, né? O que
essa música tá falando”. E acaba abraçando a ideia do cara. Acaba trazendo uma pessoa que
gosta mais da sua música. O Facebook hoje é uma das maiores ferramentas. Tem também o
Instagram. Mas o Instragram não tem a mesma função do Facebook. Acho que o Facebook
tem mais poder hoje em dia. É onde você vai trazer ela pro Youtube pra ela ver uma música.
Você usa essa ferramenta de patrocínio para impulsionar uma produção no Facebook?
Já usei. Não to usando ela agora pela condição financeira, porque você tem que pagar uma
taxa. Mas eu já usei.
Eu você sentiu alguma diferença de uma postagem impulsionada para uma normal?
Qual é o resultado?
O patrocínio divulga 24 horas. Se você não usar o patrocínio, você mesmo tem que divulgar.
E as vezes você não tem tempo pra ficar divulgando. Então, você sabe que o patrocínio tá ali
divulgando, ganhando mais uma curtida, compartilhando, pessoas dando mais visualizações,
conseguindo mais público pra você, pra sua música. Pra reconhecerem mais se trabalho, sua
arte.
Coloco no Facebook, no Youtube. Mas no Facebook a gente coloca mais pra divulgar mais,
entendeu?
Por que?
Você tem contato com outros rappers que não são de Macaé?
Tenho muito contato com MCs de Goiânia, São Paulo, nos Estados Unidos. Mas contato pela
internet, entendeu?
Em Goiânia, São Paulo, Bahia, Minas, fora do país. Até no México e Peru já chegou. Porque
eu conheci várias pessoas de quando eu morava fora que eu ainda mantenho contato, que
gosta do que eu faço. “E aí, como que tá o som, tal. Manda uma música. Quando tiver uma
música nova me manda”. Eu tenho uma tia que mora lá no Paraguai, Bolívia, sei lá, fazendo
medicina, e ela pede direto. O marido dela gosta, amigo dela passa pra amigo e por ai vai.
Eu compartilho sim. Divulgo pra galera ir. Pra fortalecer mesmo a cena do movimento.
É grande a quantidade de pessoas que informam pelo Facebook que vão comparecer a
um evento?
É grande.
E essas pessoas que dizem que vão ao evento levam outras pessoas?
Tem pessoas que levam até mãe, parente, que acaba conhecendo a cultura, acaba gostando.
Leva prima que vem de fora.
Com certeza. Porque se fosse só de boca a boca não ia. A internet é uma forma de conectar,
trazer as pessoas, de convidar, né? Pro evento, de divulgar o evento também. Porque o boca a
boca é muito difícil.
Você acha que os meios de comunicação de Macaé têm interesse em divulgar algo
relacionado ao rap?
Por que?
Eu acho que eles acreditam que tem coisa mais importante pra eles divulgarem.
77
A gente nunca pensou porque a gente tem medo da rádio não abrir espaço.
Mas isso é porque eles talvez não tenham interesse no tipo de música que vocês fazem?
O rap vai muito contra o sistema. Então eu acho que eles tem medo dos MCs.
17 anos.
Bairro da Glória.
Desde pequeno, quando eu tinha uns 9 anos, que eu comecei a ouvir rap com os meus irmãos.
A gente começou escutando alguma coisa de Racionais, Sabotage. Depois com meu pai, que
ele gostava de escutar muito Gabriel, O Pensador. E o meu irmão do meio começou a cantar
alguma coisa de Facção Central e eu comecei a ouvir. Se bem que teve alguns artistas
internacionais que eu comecei a escutar com uns amigos de escola. E desde lá que eu curtia o
rap, que era uma parada que tava em mim desde pequeno.
A galera botava muito Eminem, 50 Cent, alguma coisa de Notorious e Tupac também.
O rap quando eu comecei não me influenciava. Porque eu não comecei de uma maneira séria.
A primeira música que eu lancei foi em 2013. Eu comecei mais pra ver como é. Fazer um rap
e gravar. Mas depois eu comecei a gostar e a ver que aquilo poderia render frutos. Não
dinheiro, mas como consciência social. Então, a partir dai que começou a influenciar
diretamente na minha vida, porque eu comecei a andar mais com a galera do rap, comecei a
questionar mais as coisas da sociedade. Mudou minha visão sobre muitas coisas.
E quando você percebeu que o rap pode influenciar a sua forma de ver o mundo?
Quando eu parei de escutar só a melodia do rap e comecei a prestar mais atenção nas letras,
foi ai que eu vi que essa ideia pode mudar uma forma de pensar. Essa ideia pode trazer uma
coisa nova. Fazer a pessoa pensar diferente. Assim que o rap transforma a visão.
Quando eu escrevo ou faço um beat não sou influenciado por algum som. Não diretamente. É
mais pelo que tô sentindo no momento. Eu vô pensando naquilo e passo pro papel.
Influencia bastante. Porque tem vezes que eu já passei por umas situações de preconceito. Aí
eu quero pegar...eu tô com raiva disso ou não gostei disso...eu pego e escrevo no papel. Ou se
eu passo em frente a uma escola e tá faltando lanche. Eu fico com aquilo na cabeça e escrevo
sobre isso. Esse é o cotidiano influenciando no rap. Ou quando eu leio ou vejo algo que não
me deixou satisfeito eu pego e escrevo.
É uma diversão que não deixa de ser um investimento. É um investimento para o futuro. Uma
coisa que pode vir a ser meu ganha pão.
Com uns 8, 9 anos. Na escola, na aula de informática, depois em casa, só pra brincar.
Desde que eu conheci o Youtube. É lá que eu vou pesquisar os artistas que a galera fala.
Alguém me falava de um rap e eu ficava ouvindo. Quando eu lia uma matéria sobre alguma
pessoa que faz rap.
Tem o Soundcloud, que a galera daqui usa bastante. Joga as músicas deles lá. E o Facebook,
que tem as páginas de grupo. Aí por lá mesmo a gente entra e vê os eventos que tão rolando
em Macaé.
Geralmente quando eu posto um trabalho, a primeira coisa que eu faço é lançar no Facebook e
lá mesmo falar pra galera que eu vou postar alguma coisa no Youtube. Eu posto uma música
no Youtube e vou passando pra galera no Whatsapp e pelo Facebook, que eu vou marcando
uma galera, vou compartilhando e peço pra compartilhar no Facebook pra expor o trabalho. E
no Soundcloud também.
A gente já usou uma vez a ferramenta de impulsionar publicação, que foi pra um clipe que a
gente lançou uns dois, três meses atrás. A gente criou um clipe, postamos no Youtube e
compartilhamos o link na nossa página. Aí de lá a gente impulsionou. Um amigo falou pra
gente que podia pagar e pagou duzentos reais pra publicação.
Foi porque esse nosso amigo falou que ia pagar pra divulgar. E a gente tá guardando dinheiro
pra comprar o beat de um artista famoso, que é o Neo Beats. E a partir dái vai ajudar na
música, por que é um beat diferente, e na divulgação, porque é um beat de um cara famoso,
que vai postar na página dele. Por isso que a gente não achou necessário ficar impulsionando
agora.
Com certeza. É a nossa forma de divulgação. Antigamente devia ser muito difícil divulgar um
CD. O cara ia fazer duzentas cópias e ia sair entregando na rua?
É importante porque é uma forma de a gente divulgar e de não ter que pagar tão caro por isso.
É mais fácil divulgar pelas redes sociais. Porque rede social tá todo mundo lá e tem uma
possibilidade muito grande da galera ver, ter uma visibilidade melhor. Gente de outro lugar
vai olhar, porque vai ficar lá, exposto.
A gente tá conectado com as pessoas e é por lá que você conhece outros artistas. Você arruma
contatos bons por lá as vezes.
Sim. Eu tenho contato com gente de Campos, Rio das Ostras, Cabo Frio, Goiânia.
Você já teve algum contato com outro meio de comunicação que não a internet?
Uma vez eu tive a oportunidade de gravar na 101. Mas eu fiquei um tempo afastado do rap e
acabou que deixei de lado. Meu irmão foi numa festa e entrou em contato com o pessoal da
rádio. Foi meio que na amizade.
Você acha que os rappers preferem compartilhar suas produções na internet pelo fato
de que, por exemplo, na TV ele não poderia expor certas músicas?
A TV tem essa coisa de alienar, de censurar. Na internet você não vê isso. É por isso que a
galera prefere divulgar pela internet. Você pode falar o que você acha.
Tenho 21.
Macaé.
Parque Aeroporto.
Desde quando eu era menor, sempre escutava rap americano. Só que eu não conhecia como
rap. Pra mim era música comum. Só com os meus 14, 15 anos que eu comecei a ouvir
Racionais que eu vim a me interessar bastante e tive interesse pelo beatbox, que me trouxe até
a cultura. Ouvia muito Fernandinho Beatbox. Quando eu conheci o Marcelo D2. Eu vi um
show dele, vi o Fernandinho fazendo um beat. Vi num vídeo do Youtube. Eu comecei a
pesquisar sobre ele e comecei a treinar beatbox. Isso me trouxe pra cultura em si, porque com
o beatbox eu entrei no grupo 5º Artigo, em 2011, e a gente vinha fazendo um trabalho de rap.
Eu não escrevia. Tava começando a produzir, a fazer beat. Com o tempo eu fui querendo
escrever. Eu me identifiquei com aquilo. Eu consigo colocar meu dia a dia no papel, passar
para uma música. Porque o rap é feito para expressar sua realidade.
E achei um CD de rap em casa. Eu lembro que tinha músicas do 50 Cent, Rihanna, Eminen.
Depois que eu ganhei um computador que eu fui vendo de quem era. Quando eu tive uma
internet melhor eu fui pesquisando, me aprofundando.
O rap mudou a minha vida, porque 90% de quem eu andava antes do rap tá morto ou preso. E
influencia porque eu não consigo viver sem o rap. Tenho que ouvir, pra me influenciar mesmo
no dia a dia.
No momento de produzir um rap, quais são suas influências musicais?
82
O que me influencia é tudo o que eu já passei e tudo que eu sei que eu vou passar. As vezes,
quando eu tô muito puto com um político, eu vou lá na letra e detono ele. Se eu ver um
mendigo na rua e uma pessoa jogar cinco centavos fora, eu vou ficar arrasado. Eu vou
escrever sobre aquilo. Porque é uma parada que eu já vi acontecer na minha frente.
Eu tô tentando levar o rap pro lado profissional. É difícil. Aqui em Macaé então é mais difícil.
Porque aqui a cultura tá crescendo. Tem vários grupos já, mas a cultura ainda não é valorizada
pelos locais. Antes da cultura ser valorizada por alguém de fora, tem que ser valorizada pela
cidade.
Quando eu era do 5º Artigo eu já pensava em viver de rap, mas eu tava nem ai para o dia a dia
em questão financeira. Eu fazia show, ia pra fora, ia pra Campos, mas gastava do nosso bolso,
porque a gente que pedia pra tocar mais. Porque pra você ser chamado pra tocar, você tem que
ter um certo conhecimento. Ninguém vai te chamar. Nem conheço o grupo, vou gastar
dinheiro pra trazer eles aqui? Mas isso faz parte da caminhada mesmo. Hoje em dia por isso
que eu quero levar ele pra profissão. Pela caminhada. E eu quero viver disso. Porque eu gosto
de tar ali passando a mensagem. E quando eu olho no olho das pessoas elas tão se
identificando. Por enquanto eu tô tentando viver de beats. Tô tentando porque aqui não pode
vender caro. A galera aqui não compraria um beat caro. Só se for um conhecido. Se for um
Neo Beats, um WC Beats, Mr. Break.
Comecei a usar na época da net da Velox. Na época não foi nem pelo rap. Em 2009, 2010. Ali
eu fiz Orkut, jogava uns jogos online. Mas isso foi meu acesso a internet. Pra diversão.
Foi quando eu entrei no 5º Artigo. Em 2011. Foi quando tava começando o Facebook. A
galera falou pra fazer. Não era tão conhecido. Não era igual hoje. Ai eu fui e fiz. Tinha grupos
de Hip Hop do Rio, de Botafogo, da Lapa. Tinha de todos os lugares. Ai eu comecei a entrar
em todos os grupos. Você vai entrar no meu Face e vai ver quantos grupos de rap eu tenho lá.
E toda vez que eu lanço um som eu divulgo em todos os grupos. Porque é uma forma de
mostrar seu trabalho. E foi aí que eu comecei a mostrar meu trabalho e pesquisar sobre o Hip
83
Hop. E ver sobre roda cultural, que foi uma parada que me interessou também. Foi através da
internet.
Soundcloud. Pra postar música e ouvir também. Porque muita gente posta lá.
Quando eu produzo um beat ou uma música minha e quando eu vou postar eu crio um evento
no Face para divulgar o lançamento. Ultimamente eu tenho colocado minhas músicas no
Youtube, mas essa semana eu vou dar uma atualizada e colocar no Soundcloud.
Facilita bastante. No Soundcloud ele tem mais visualização. Porque ele conta todas mesmo.
No Youtube eu acho que ele acaba roubando um pouco. Se você dá play pelo Facebook eu
não sei se conta lá no Youtube.
Facebook eu uso o pessoal e o profissional. Pra postar beat, pra postar música, compartilhar e
também pra produzir evento, mas quando eu produzo o Rap do Half, a gente cria pela página.
Eu só usei uma vez agora pra divulgar um EP. Tem três semanas. Eu botei um dinheiro lá e
deixei divulgando. Eu achei que valeu a pena porque deu bastante visualização. Pelo tempo
que eu deixei. E impulsionou bastante a página, que a MóResponsa Records, que é um estúdio
meu.
Eu tô começando a conhecer agora o Spotify. O iTunes eu já ouvia falar, mas tem que pagar
pra colocar música lá. Brevemente eu vou botar lá. Eu tenho que guardar um dinheiro pra
botar minhas músicas lá.
Pretendo sim. Porque faz uma diferença. Porque se fizer sempre só vai ser mais ouvido. Não
adianta você querer ganhar, viver de uma coisa e você vai ter que gastar. Tem que ter um
certo investimento naquilo. Agora tudo o que eu ganhar eu quero investir em divulgação,
publicação, em marketing. Isso é uma parte que eu descobri que é muito importante. É
importante pra as pessoas verem ali o que vai chamar atenção pra elas clicarem e ouvir seu
som. Até sua capa mesmo tem que ser uma coisa bem profissional. Se não for bem produzida,
a galera as vezes no início da música já diz que não gostou. Você tem que trabalhar o melhor
84
que você puder com o recurso que você tem. Eu tenho pouco recurso, mas eu trabalho da
melhor forma que eu posso.
Você utiliza outras formas de compartilhamento de conteúdo que não seja a internet?
Não é. Porque a internet tá em todo lugar. As vezes daqui você pode passar seu som pra um
maluco lá no Rio Grande do Sul e ele gostar e divulgar, ficar conhecido lá. Porque se não
tivesse a internet, o rap seria conhecido hoje, mas não seria como é. Poderia ter tantos grupos
como tem, mas ninguém iria conhecer, tipo, o Costa Gold. Não conheceria Felipe Ret. Tem
gente que precisa muito da internet, mas tem gente que só ajudou a impulsionar ainda mais
seu trabalho.
Tem bastante. Até porque, graças à internet tem várias páginas, tipo, Rap Nacional, Canal Rap
RJ. São páginas que você pode fazer a divulgação por lá. Você vai pagar um certo valor pelo
tanto de divulgação e pelo tanto de visualização como você quer.
O maior propósito das redes sociais é a divulgação mesmo. Divulgação e contato. Porque
através da rede social você consegue contato pra qualquer coisa que você quiser. Porque tem
gente que não tem condição de criar um site, mas tem condição de criar uma página no
Facebook, porque é de graça. E ali ela pode botar todas as informações dela.
E ela tem permitido que você tenha contato com pessoas de outros lugares?
Sim. Até porque eu conheci um pessoal pra contato pra show. Tudo isso através das redes
sociais. Ia lá no evento, procurava evento grande. Entrava em contato com a produtora. As
vezes ligava. Um amigo meu, que eu conheci através da internet, que é o Jazz Beat, que é lá
de São Gonçalo, ele fez uma intenção do MóResponsa Records, só que lá em São Gonçalo. Tá
com um estúdio lá. A gente tá fechado juntos. Ele abriu o MóResponsa lá e tá trabalhando
com a divulgação. E através dele eu tô tendo contato lá pra ver se eu consigo me apresentar
numa roda cultural lá. Uma roda grande, que todo mundo vai. Através da rede social que eu
tive esse tipo de contato. Como eu já tive contato com pessoas quando eu lancei o EP. Que
mandaram mensagem pra mim lá na minha página, pedindo meu Face pra passar o link pra
fazer um som comigo. Outros queriam comprar beat...que gostaram da produção. E tudo isso
através da internet. Já vendi beat pra gente de São Paulo através da rede social. Ela te deixa
livre.
Eu compartilho normalmente os raps que eu gosto. Eu ouço uma música que eu gosto e eu já
vou no Facebook e compartilho. Música de alguém conhecido daqui da cidade, de
lançamento, eu sempre compartilho. Porque eu acho isso importante, um ajudando o outro.
85
Sem nada de separação, de intriga. Eu acho a parte mais importante do rap é a união. Se não
tiver união, o rap não vai andar.
Você já teve algum contato com outro meio de comunicação que não a internet?
Uma vez eu dei um CD para um tio que conhece um dono de rádio daqui de Macaé. Acho que
da rádio 101 FM. Na época eu tava no 5º Artigo ai eu não sei se ele conseguiu mandar. Não
levou pra frente não.
Você acha que os meios de comunicação daqui tem interesse em divulgar o rap?
Não. Até porque a galera que é de música antiga é exigente com música. Normalmente quem
trabalha numa rádio, que bota a música é exigente com a música. Acho que pode ser falta de
interesse da galera daqui de se manifestar pra isso, pra acontecer.
Rola sim. Sempre rola. Tem muito menos, mas ainda tem sim. Pode ser que não goste da
letra, achar que aquilo é muito forte.
Você acha que a internet é importante para a aproximar as pessoas do ambiente urbano,
para levar elas a irem em um evento?
Acho que ajuda sim. Porque se fosse só no boca a boca, um carro de som divulgando, até
ajuda, mas não funciona tanto quanto um evento no Facebook. Porque você convida seus
amigos e esses convidam outros amigos.
86
Eu tenho 17.
Parque Aeroporto.
Meu contato com o rap foi muito cedo com uns rappers gringos. Antigamente não tinha muita
internet. Uns seis, sete anos atrás, mais ou menos. Eu era novinho. Não tinha tanto acesso à
internet. E o que eu ouvia era aqueles CDs piratas que a galera vendia. Aí um amigo meu, que
era lutador, o João Paulo...ele comprava diretos esses CDs gringos, assim...o 50 Cent,
Eminen, Tupac, Notorious. Aqueles bem antigos mesmo. Aí a gente ficava ouvindo. Aí com o
tempo que eu fui me aprimorando, ouvindo som nacional.
Ele começou a influenciar mais ou menos uns dois anos atrás, quando eu ingressei, que eu
entrei no primeiro grupo. Foi um aprendizado. Acho que me deu bastante sabedoria, eu era
um cara bem nervoso, estressado com tudo. Aí eu acabei me acalmando mais, ouvindo umas
músicas. O estresse que eu tinha eu descontava em letras. Servia como inspiração. Foi um
calmante.
Eu gosto muito do Sabotage, Facção Central, Shawlin. Esses caras me influenciam bastante.
O Racionais eu ouvi bastante, mas eu me identifiquei mais com os outros. Eles têm aquela
realidade, mas não é tanto a que eu vi. Eles foram presos. Eu me identifico com o Sabotage
por ter perdido uns amigos por causa das drogas. Aí eu já me identifico mais. O Shawlin, o
que me chamou a atenção foi a levada dele, o jeito dele de distrair a pessoa mesmo criticando
o governo. Eu fui muito influenciado também pelo rock, pelo reggae. O rap é melodia
87
também, não é só batida não. Em algumas músicas eu gosto muito de lembrar a melodia do
rock. Um agressivo, mas não tão agressivo. Tipo o grunge, o que o Nirvana fez. É um som
que a música fica na sua cabeça. Tem aquele refrão irado que todo mundo guarda na cabeça.
E dentro do rap, pra escrever, eu gosto muito do J. Cole. Ele tem umas melodias iradas, uma
ideologia muito forte.
E porque você resolveu fazer rap?
Quando eu ia pro Rap do Half, lá no Aeroporto. Eu comecei a rimar e acabei gostando pra
caramba. Hoje eu escrevo e canto. Produzo um pouco. Crio melodia.
Ajuda a te mostrar que o mundo não é só sujeira. Também mostra o lado bom do mundo...da
natureza...essas coisas.
O que me influencia bastante é os rolês que a gente dá. Ir nas rodas culturais, ver a galera
curtindo um som. Aí você já pega e tira uma letra. Muita coisa que a gente vê na rua. Essa
injustiça.
Eu quero muito o rap como profissão. Mas eu me divirto muito também. Porque é duro. A
gente perde noites de sono produzindo, gravando. Eu e o Rhuann tamos direto divulgando
nosso trabalho em roda cultural. Rio das Ostras, Carapebus.
Foi no tempo que eu entrei pro Un-Lock. Eu e uns moleques juntamos dinheiro três meses pra
gente conseguir gravar uma música. Quando a gente conseguiu gravar, a gente criou a página
do grupo. Começamos a divulgar bastante na internet, usando Facebook. Foi em 2014 isso.
Agora é só trabalho pelo Face. A gente divulga uns vídeos dentro do estúdio, tipo um
backstage.
Acho que não. Eu uso mais a forma de compartilhar, no Facebook, em grupos no Whatsapp,
mandar link pros outros.
88
Já usei uma vez pra divulgar um trabalho no Facebook, pra divulgar a nossa página.
E foi possível notar a diferença de quando uma publicação é impulsionada para a que
não é?
Deu uma ajuda legal. Ajudou bastante. A gente gastou acho que só uns vinte reais. Ganhamos
bastante likes. A quantidade de pessoas que viu aumentou. Uma música que a gente lançava
tinha quinhentas visualizações, agora tá dando mil. Nosso último clipe que a gente lançou,
Triste Realidade, teve mais de mil visualizações. Sei que não é muito ainda, mas pra gente
daqui de Macaé é bastante. A gente divulga no Facebook entre os chats de amigos. A gente
tem uns amigos no Rio, em Minas, que também fazem música. Aí a gente divulga pra eles e
eles divulgam pra galera de lá.
A gente só fez daquela vez porque a gente ganhou um cachezinho de um show. Aí a gente
separou um dinheiro pra cada um comprar o que tava precisando. Aí a gente falou: “Vamo
impulsionar”. Aí a gente impulsionou pra ver se dava certo. A gente gostou, então
pretendemos fazer de novo.
Por falta de grana e de tempo também. A gente não tá divulgando porque a gente não lançou
nada ainda. Isso tem pouco tempo. Agora a gente vai fazer um clipe e vai impulsionar ele. E
lançando o CD a gente vai impulsionar bastante.
Hoje a internet é o meio mais acessível. Tem a rádio, mas pra gente é bem difícil. O nosso
estilo musical tocar. Porque a rádio não vai querer que um bando de moleques venha falar mal
de seu governo, falar umas verdades. Eles não gostam. Eles gostam daquelas musiquinhas
pop, leve. Rádio, TV. É bem difícil pra gente. A divulgação é mesmo de internet e boca a
boca. Você conversando com a galera.
Ajuda demais a divulgar nosso som. Acho irado quando a galera de fora de Macaé comenta
nos links. Acho irado quando você sabe que o som chegou em tal lugar. Teve uma vez que
uma mina de Recife comentou no Youtube. Eu acho que se não tivesse a internet a gente
nunca teria chegado nessa mina.
Claro! Compartilho muito a música dos meus amigos, de outros grupos, fora de Macaé. Os
caras que eu sou fã eu compartilho bastante. É um meio de ajudar. É irado quando alguém tá
compartilhando seu som. É uma troca. Se todo mundo de Macaé um ajudar o outro, alguém
89
daqui vai estourar. Não precisa que seja eu, o meu grupo. Mas alguém daqui de Macaé tem
que estourar. Pra mostrar pra galera que não é só Rio, São Paulo, as capitais que tem um rap.
E você acha que tem sido boa a procura pelo conteúdo de vocês na internet?
A página da Free Rap tá bombando. A gente tá com mais de mil likes, acho que duzentos
escritos no canal do Youtube. Acho que tá grande, porque a gente não tem muito. A gente vai
fazer um ano de grupo. Depois que a gente começou a trabalhar bastante, que a gente lançar
umas músicas porque a gente não tem nenhum trabalho grande na pista ainda. Não temos um
EP, um CD. Acho que vai crescer depois do CD, que a galera vai ver que a gente tá
trabalhando mesmo.
Acho que o propósito, quando foi criado mesmo, foi conhecer gente nova, interagir com
pessoas de longe, criar novas amizades, divulgar trabalho.
Antigamente, se você quisesse fazer um evento teria que fazer no boca a boca. Telefone, ligar.
O Facebook faz chegar em tantas pessoas tão rápido. De hoje pra amanhã você consegue
chegar em muita gente, compartilhando no Facebook. Isso ajuda bastante nos eventos, nos
meios de divulgação.
90
Brisa (Fiel)
Seja fiel
E que o caminho desse Nigga aqui não seja tão cruel
Brisaaaa...
Só Rastaman
Só a prova de que não se deve rebaixar ninguém
Vivendo na babilônia realmente e difícil de ter paz
Ainda só novo mas já vi um pouco do que o ser humano e capaz
Falo do consumo excessivo
Mano da obsolescência e de meninas grávidas na adolescência