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DA ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL A RE-ORIENTAÇÃO

PROFISSIONAL: REFLEXÕES ACERCA DA ATUAÇÃO DO


PSICÓLOGO FRENTE AO ATUAL CENÁRIO DE MUDANÇAS
PROFISSIONAIS
FROM VOCATIONAL GUIDANCE TO VOCATIONAL REORIENTATION: REFLECTIONS ON THE
ROLE OF PSYCHOLOGISTS IN FACE OF CURRENT PROFESSIONAL CHANGES

Aline dos Santos Fabris1


Bruna Cardoso Zinhani1
Bruna Morgana Giraldi Barão1
Gabriella Marcondes do Amaral1
Raquel Carvalho Lisboa1
Maria Adelaide Pessini2

FABRIS, A. dos S.; ZINHANI, B. C.; BARÃO, B. M. G.; AMARAL,


G. M. do; LISBOA, R. C.; PESSINI, M. A. Da orientação profis-
sional a re-orientação profissional: reflexões acerca da atuação
do psicólogo frente ao atual cenário de mudanças profissionais.
Akrópolis Umuarama, v. 25, n. 1, p. 13-24, jan./jun. 2017.

DOI: 10.25110/akropolis.v25i1.6670

Resumo: O presente artigo pretende ressaltar aspectos acerca da


atuação do psicólogo enquanto orientador e reorientador profissional,
e o quão amplo é este processo, tendo em vista seus ricos subsídios
teóricos e práticos para o cenário contemporâneo, que tem apresen-
tado uma vasta demanda desta prática em diversas circunstâncias
perpassadas pelos sujeitos. Na busca de um trabalho preventivo e
simultaneamente que promova qualidade de vida, apresentamos as
possibilidades em que se pode servir da reorientação; um breve histó-
Acadêmicas do curso de Psicologia da
1

UNIPAR rico desta prática no Brasil e as principais teorias psicológicas que dão
suporte à orientação profissional. Para atingir os objetivos desta pes-
2
Docente do curso de Psicologia da UNIPAR quisa foi realizado um cauteloso garimpo das revisões bibliográficas.
Com o estudo, pode-se concluir que a práxis do psicólogo na orienta-
ção profissional ou na re-orientação profissional requer conhecimentos
teórico, metodológico e das singularidades de cada sujeito (orientando
ou re-orientando) e do contexto onde os mesmos estão inseridos.
Palavras-chave: Orientação; Possibilidades; Qualidade de vida; Re-
orientação.

Abstract: This paper aims to emphasize aspects related to the role


of psychologists as a guiding and reorienting professional, and the am-
plitude of this process, given its rich theoretical and practical subsidies
for the contemporary scenario, which has presented a broad demand of
this practice in different circumstances experienced by the subjects. In
the search for a preventive work and simultaneously to promote quality
of life, this study presents the possibilities that can be used by reorien-
tation; a brief history of this practice in Brazil and the major psycho-
logical theories that support vocational guidance. In order to achieve
the purposes of this study, a thorough literature review was performed.
Therefore, it can be conclude that the psychologist practice in profes-
Recebido em maio de 2017 sional guidance or professional reorientation requires both theoretical
Aceito em julho de 2017 and methodological knowledge, as well as knowledge on the singula-
rities of each subject (being guided or redirected) and of the context

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where they are inserted in. espaço lisonjeado, pois atua com as escolhas do
Keywords: Orientation; Possibilities; Quality of life; sujeito, isto é, em seu alicerce. Assim, essa atu-
Reorientation. ação torna-se um trabalho de prevenção, aderi-
do a psicoprofilaxia, almejando o bem-estar ge-
INTRODUÇÃO ral do sujeito, pois, esta psicoprofilaxia pode ser
compreendida como toda atividade que, através
O tempo de mudanças vivido pela socie- de um esboço de análise psicológica e por meio
dade mundial, tem sido de grande valor técnico do manejo de recursos e técnicas psicológicas,
científico e econômico, porém tem implicado em procure promover o desenvolvimento das poten-
problemas de desenvolvimento para o ser hu- cialidades do ser humano, seu amadurecimento
mano, que embora seja protagonista neste pro- como pessoa e, finalmente, sua felicidade.
cesso, não tem a capacidade de acompanhar Logo, destacaremos no decorrer do ar-
psicologicamente o ritmo das transformações, tigo algumas teorias que subsidiam as práticas
principalmente no que diz respeito à escolha e/ da orientação profissional, bem como os autores
ou mudança no campo do trabalho. Independen- que as compõem, denotando suas percepções
te da relação de causa e consequência entre de- acerca do sujeito e do ambiente que o permeia,
semprego e tecnologia, as alterações tem sido constituindo fatores que influenciam no processo
consideráveis. de escolha e decisão. Sendo assim, cada abor-
Neste cenário, refletir sobre a atuação do dagem visualiza e decodifica os variados con-
psicólogo na reorientação profissional e buscar textos de maneiras diferentes, mas cada uma
conhecimentos que subsidiem essa prática ad- contribuindo significativamente para obtenção
quire importância sem precedentes, a partir do de resultados positivos. Portanto, ressaltamos
momento em que proporciona um conhecimento respectivamente a Psicanálise; Análise do Com-
sobre o desenvolvimento histórico da orientação portamento; Sócio-cognitiva e a Fenomenológi-
profissional, sobre os princípios teóricos que co-Existencial.
norteiam essa prática e sobre os contextos em
que a reorientação profissional é possível. UMA BREVE HISTÓRIA DA ORIENTAÇÃO
A orientação profissional acompanhou as PROFISSIONAL NO BRASIL
transformações do mundo do trabalho concomi-
tantemente às mudanças de sua própria prática Os primeiros indícios da Orientação Pro-
exigidas por cada contexto histórico. Além dis- fissional no Brasil aparecem no início do século
so, a orientação profissional utiliza demasiadas XX, conforme é exposto por Abade (2005), tendo
abordagens teóricas como uma das ferramentas como acontecimento relevante a seleção de alu-
primordiais no trabalho com o indivíduo/orien- nos para o curso de Mecânica Prática no Liceu
tando. Através das perspectivas psicológicas de Artes e Ofícios de São Paulo em 1924, neste
é possível auxiliar o orientando, suprindo suas momento a Orientação Profissional era estrita-
necessidades conforme as práticas científicas mente psicométrica.Concordando com Brown &
que permeiam determinadas teorias. Com isso, Brooks (1996); Carvalho (1995); Super&Bohn
faz-se necessário o conhecimento de tais abor- Junior (1970/1976) apud Sparta (2003), durante
dagens, as quais são imprescindíveis na realiza- as décadas de 1920 e 1930 a prática da Orien-
ção de um trabalho eficiente. tação Profissional passa a ser influenciada pela
Diante disso, a orientação profissional Psicologia Diferencial e pela Psicometria, abor-
vai além, com os estudos antropológicos, his- dando e desenvolvendo testes de inteligência,
tóricos e filosóficos unidos a psicologia, sendo aptidões, habilidades, interesses e personalida-
possível trabalhar com conteúdos bem mais de.
profundos da subjetividade humana, pois não se
restringe só a informação profissional do sujei- A Orientação Profissional passou a ser um
to, como também pode ser comparada à clínica. processo fortemente diretivo, em que o
Porém, em hipótese alguma como intervenção orientador tinha como objetivos fazer diag-
psicoterápica, ou seja, a psicologia tem como nósticos e prognósticos do orientando e, com
objetivo promover equilíbrio do indivíduo, atra- base nesses procedimentos, indicar ao mes-
vés da prevenção e promoção da saúde. Por- mo profissões ou ocupações apropriadas.
(SPARTA, 2003, p. 2).
tanto, a orientação profissional estabelece um

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Da orientação profissional a...

É possível compreender que este méto- (ABOP) como uma comunidade civil sem inten-
do adotado pela Orientação Profissional, preo- ção lucrativa que reúne Orientadores Profissio-
cupava-se especificamente com ajustamento, nais do Brasil. Tendo em vista construir de forma
em adequar as habilidades, aptidões, caracte- compartilhada atividades que envolvem o de-
rísticas pessoais à determinadas atividades e senvolvimento da Orientação Profissional (OP)
profissões, isto é, o homem certo no lugar certo, em todo país, ampliando e desenvolvendo ativi-
pode ser assinalado como Teoria do Traço e Fa- dades técnicas e científicas envolvendo psicólo-
tor (SPARTA, 2003). gos e profissionais afins.
Em 1947 foi criado o Instituto de Seleção
e Orientação Profissional (ISOP) da Fundação Além de congregar pesquisadores e pro-
Getúlio Vargas, objetivando promover o ajusta- fissionais, cabe às Associações Nacionais
mento entre as aptidões dos trabalhadores e os e Internacionais, neste domínio, atuarem
requisitos exigidos em cada profissão. Segundo firmemente com o propósito de estabele-
cer normas éticas, critérios de competência
Antunes (1991) apud Abade (2005) neste perí-
requeridos dos orientadores profissionais,
odo a Orientação Profissional estava direciona- qualidade dos serviços e das pesquisas, de-
da a racionalização e organização do trabalho finição de políticas públicas de acesso demo-
visando obter aumento da produtividade. Visto crático à Orientação Profissional e à Educa-
que, os testes vocacionais visavam a direcionar ção de qualidade. (MELO-SILVA, 2007, p. 1)
os jovens para uma escolha relacionada às suas
capacidades, no entanto, sem considerar carac- Conforme Melo-Silva (2007), desde seu
terísticas subjetivas dos sujeitos (ABADE, 2005). início em 1993, a ABOP, atuou no desenvolvi-
Os trabalhos brasileiros ligados à temá- mento e na viabilização de diversos eventos que
tica da Orientação Profissional, a partir de 1971 contribuíram para o fortalecimento e a ampliação
sofreram grande influência de Bohoslavsky e do conhecimento científico e prático a respeito
suas publicações sobre a estratégia clínica em da Orientação Profissional no Brasil. Em 1997
orientação vocacional, segundo exposto por a ABOP lançou a Revista Brasileira de Orienta-
Abade (2005). No entanto, durante a década ção Profissional, esta revista tem teor científico,
de 70 tendo em vista a instauração da ditadura sendo a única no domínio da Orientação Profis-
militar no Brasil, houve uma considerável dimi- sional no Brasil, abordando publicações a nível
nuição das publicações referentes à Orientação nacional, mas alcançando também o campo in-
Profissional. ternacional, com a finalidade de conceber e pro-
Assim como a Psicologia na década de pagar a ciência, produzindo reflexões sobre as
80 aprimora e redefine suas práticas, a Orien- demasiadas possibilidades da O.P. na contem-
tação Profissional também apresenta considerá- poraneidade. Proporcionando um ambiente que
vel desenvolvimento. Neste momento o Instituto aceita produções originais conexas a O. P. “que
de Seleção e Orientação Profissional (ISOP) se se enquadrem nas seguintes categorias: relatos
transforma no Instituto Superior de Estudos e de pesquisas, estudos teóricos, revisões críticas
Pesquisas Psicossociais. A partir dos anos 80 da literatura, comunicações breves sobre pes-
a escolha profissional passa a ser considerada quisas, relatos de experiência profissional, en-
uma perspectiva multidisciplinar, a profissão e o saios, notas, técnicas, resenhas” (MELO-SILVA,
indivíduo tendem a um caráter dinâmico (ABA- 2007, p. 6).
DE, 2005).
No início dos anos 90 houve um relevan- TEORIAS PSICOLÓGICAS QUE SUBSIDIAM
te aumento das publicações sobre Orientação A PRÁTICA DA ORIENTAÇÃO PROFISSIO-
Profissional. Em 1993 é criada a Associação NAL E DA RE-ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL
Brasileira de Orientação Profissional (ABOP),
sendo este evento um marco histórico de gran- A partir das concepções históricas da
de importância para a Orientação Profissional O. P., torna-se possível definir a relevância das
no Brasil. A ABOP surge oferecendo suporte ao abordagens teóricas enquanto instrumentos in-
orientador profissional, e aos vários aspectos re- dispensáveis ao orientador. Pois é por meio des-
lacionados a esse ramo de atividade. sa base, denominada abordagem psicológica,
Melo-Silva (2007), considera a Asso- que o profissional terá capacidade de analisar o
ciação Brasileira de Orientação Profissional sujeito, suas experiências passadas, suas cau-

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salidades, suas possibilidades e seu contexto, ses para que o orientando possa, por meio de
ou seja, todo seu conjunto bio-psico-social. seu comportamento, encontrar um meio de fazer
No entanto, cada profissional utiliza de suas próprias escolhas, sem demais interferên-
uma teoria específica para auxiliá-lo no proces- cias, pois é nesse momento de escolher que as
so de orientação ou de re-orientçaão. Com isso, autoras supracitadas mencionam o behaviorista
faz-se necessário o conhecimento das diversas Skinner, que entende o comportamento de deci-
abordagens existentes e consequentemente a dir como algo que pode ser moldado por diver-
aquisição de tal suporte, o qual é imprescindí- sos estímulos, os quais são muitas vezes oca-
vel para as práticas interventivas. Sendo assim, sionados pelo próprio sujeito.
destacamos algumas teorias para o conheci- Um dos entraves da Análise do Compor-
mento prévio do leitor. tamento é que essa perspectiva não objetiva a
Na perspectiva psicanalítica foram mui- prática em O. P. como único meio de ação, o
tos os representantes que muito contribuíram, que permite que alguns analistas rejeitem o tra-
no entanto, segundo Erlich, Castro e Soares balho de atender o adolescente em sua proble-
(2000), Bohoslavsky, considerado um pesqui- mática. Tal circunstância pode ser efeito de um
sador expoente no campo da orientação voca- modelo tradicionalista, a Orientação Vocacional,
cional, apresenta características relacionadas à que pode ter um impacto espontâneo nos profis-
adolescência e escolha profissional. Baseia-se sionais devido sua conotação. É por essa razão
no “sentido” humano, ou seja, na maneira como que o conceito de Análise entende que o indi-
o homem atribui um significado ao trabalho, tor- víduo tem sua vocação construída através de
nando-o algo transcendente a uma necessidade seu meio social, cultural e pessoal, pois esses
biológica; assim como nas palavras do próprio elementos perpassam sua história influenciando
autor “supõe-se que as pessoas fazem alguma sob suas habilidades e interesses, que devem
coisa ‘por’ alguma coisa e que fazem ‘para’ algu- ser adaptadas de acordo com o ambiente em
ma coisa, entretanto, esta ‘coisa’ não está bem que vive (MOURA e SILVEIRA, 2002).
definida” (BOHOSLAVSKY, 1998, p. 41 apud O comportamento verbal também tem
EHRLICH, CASTRO e SOARES, 2000, p. 68). um papel significativo no momento da O. P., pois,
Bohoslavsky também traz críticas sobre é por meio dele que o orientador será capaz de:
o homem ser enquadrado nos padrões que lhe
são cabíveis e ao conceito liberal de liberdade 1) identificar pensamentos e sentimentos re-
de escolha, pois isto o torna sem razão de ser lativos a escolha profissional; 2) interpretar
e ignora as historicidades e contextos individu- como os contextos passado e presente do
ais. Além disso, elucida que as pessoas têm a adolescente interferem na tomada de deci-
são; 3) identificar (para, posteriormente alte-
capacidade de escolher o seu futuro e definirem
rar) regras mantenham relações impróprias
“quem ser”, “quem não ser” e o “quê fazer”. Por- ou distorcidas com contingências reais que
tanto, há uma “personalidade” escolhendo, onde se refiram à escolha profissional (MOURA e
é apresentado o “princípio Freudiano que define SILVEIRA, 2002, p. 8).
as escolhas ocupacionais como resultado de um
processo de sublimação de instintos” (EHRLI- Dessa forma, o analista do comporta-
CH, CASTRO e SOARES, 2000, p. 71). mento obtém subsídios para uma ação poste-
Porém, esse processo exige perdas, rior, podendo adequar e discutir algumas regras
pois o jovem estará deixando seu papel infantil de acordo com o desenvolvimento do processo,
para adquirir maturidade, perdendo a oportuni- garantindo resultados essenciais no processo
dade de ser outro profissional, de viver outras individual de escolha, surtindo efeitos positivos
possibilidades, perpassando incessantemente sobre o indivíduo.
por sentimentos de angústia, medo, dúvidas e De acordo com Teixeira (2008), a pers-
inquietações, convivendo com um conflito den- pectiva sócio-cognitiva prioriza o mundo e a res-
tro de si mesmo, à procura de quem almeja ser ponsabilidade do indivíduo, como meios que o
(EHRLICH, CASTRO e SOARES, 2000). impulsionem a atuar e mudar. Isso ocorre por
Conforme as autoras Moura e Silveira meio de um processo denominado “autorregula-
(2002), na perspectiva da Análise do Compor- tório”, em que a pessoa constituirá suas próprias
tamento, esse caminho pelo qual direciona os regras de funcionamento por meio da aprendi-
profissionais no momento de atuação, traz ba- zagem, consoante aos três fatores imprescindí-

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veis: indivíduo, ocasião e comportamento. e outras não. Por essa causa, “escolher uma
Portanto, o sujeito é compreendido como profissão, por exemplo, não é escolher somen-
ser proativo em que suas ações são subsidiadas te um fazer, mas sim um ser, e é exatamente
por seus objetivos particulares, além de executar por isso que o sujeito experimenta a angústia”
uma avaliação de si mesmo, refletir e perceber (EHRLICH, CASTRO e SOARES, 2000, p. 75).
o mundo através de suas crenças, as quais são Até mesmo um homem que vive em condições
constituídas a partir “[...] das experiências, das desumanas, como exemplo um morador de rua,
emoções, da aprendizagem por modelagem, e está cercado por possibilidades objetivas para
da persuasão verbal” (TEIXEIRA, 2008, p.12). seu ser, segundo o seu contexto. Assim, o ser
Por conseguinte, a perspectiva sócio- humano sendo seu próprio plano, vai formando
-cognitiva alinhada ao domínio vocacional, sua personalidade através de suas relações e
concebida por Lent e Cols. (1994) apud Teixei- escolhendo suas possibilidades, cujo futuro o
ra (2008), distingue-se em três modelos, sen- espera para ser definido (EHRLICH, CASTRO e
do eles: o desenvolvimento dos interesses, as SOARES, 2000).
escolhas e o desempenho. Ambos os modelos
contém “variáveis de natureza pessoal (e.g., AS POSSIBILIDADES DA ORIENTAÇÃO PRO-
sexo, raça, saúde) e situacional (e. g., família, FISSIONAL E DA RE-ORIENTAÇÃO PROFIS-
escola, cultura)” (TEIXEIRA, 2008, p.12), as SIONAL
quais são significadas a partir da relação do su-
jeito com seu contexto. Além disso, abarca ex- A Orientação Profissional, criada e cons-
pectativas resultantes das experiências sociais tantemente aprimorada desde a crise econômi-
e emocionais, que influenciam nos interesses e ca de 1930 se faz extremamente necessária ao
nas escolhas do indivíduo, propiciando novas apoio à adaptação das pessoas aos perfis pro-
experiências que culmina o autoconhecimento e fissionais necessários. Para tanto, novos pres-
a competência, ou seja, supostos de orientação precisaram ser elabora-
dos, onde o papel do orientador pudesse ser:
De acordo com o modelo que explica o de-
sempenho, a realização de uma tarefa resul- Auxiliar o processo de re-adaptação a no-
ta da interacção entre a capacidade, a crença vas carreiras; buscar a compreensão das
de eficácia, as expectativas de resultados e relações existentes entre as diferentes ocu-
os objectivos, e associa sempre procedimen- pações vivenciadas pela pessoa e seus as-
tos de avaliação. (TEIXEIRA, 2008, p. 13). pectos psicológicos [...]; desenvolver novas
capacidades pessoais exigidas pelas novas
Segundo Erlich, Castro e Soares (2000), ocupações como: espírito empreendedor,
na perspectiva fenomenológico existencial Sar- criatividade, flexibilidade, espírito de equipe,
tre refere-se à personalidade e o projeto de ser. entre outras (LUCCHIARI, 1997, p. 81).
Para este autor “a existência precede a essên-
cia”, isso significa que o homem existe, encon- Lucchiari (1997), define a reorientação
tra-se inserido no mundo e cercado por tudo o como facilitadora do processo de adaptação pro-
que nele há, mas que nenhum desses fatores fissional frente às mudanças exigidas pela mo-
determinará se ele será rico ou pobre, tímido ou dernização e pela globalização. O objetivo maior
extrovertido, professor ou empresário, ou seja, da re-orientação profissional é trabalhar a rela-
este indivíduo é livre para fazer suas próprias ção homem-trabalho, a vivência no desemprego
escolhas, independente dos fatores que o cer- da profissão, os sentimentos experimentados e
cam. Livre porque está em suas mãos escolher as mudanças exigidas. E permitir ao indivíduo
ser este ou aquele, e fazer isto ou aquilo, sendo de progredir em suas sucessivas “escolhas”
assim, ele próprio vai se definir através das con- auxiliando-o a ver a relação existente entre as
dições de possibilidades. diversas decisões que vai tomando ao longo de
O sujeito é seu próprio projeto, por isso sua vida profissional.
“não há nada de inato ou pré-determinado”, as Sabe-se que o ser humano, em geral,
escolhas se dão por meio de uma “estrutura de tem repúdio à mudança e por isso se encontra
escolha”, onde a situação em que se encon- em tamanho conflito para aceitá-la e acompa-
tra deliberará certas possibilidades materiais nhá-la, ainda que tenha extrema necessidade
disso. De acordo com Lucchiari (1997), é nesse

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plano que o trabalho de re-orientação profissio- procurar outra (quando os honorários de apo-
nal se destaca. Sendo possível em diferentes sentados não lhe permitem sustentar-se). Ou
momentos da vida, desde o período universitário fazer projetos de futuro, geralmente ligados à
até a aposentadoria ou redirecionamento da car- prosperidade, ou seja, aproveitam como um mo-
reira, é através desse processo que o indivíduo mento especial em suas vidas propício para bus-
encontra um novo rumo ao qual se adapte. car realizar o que sempre sonharam, mas que
Esse período, encarado como época de por inúmeros motivos não puderam fazer ante-
crise para cada sujeito que o enfrenta, pode ser riormente. Neste momento da vida, existe a pos-
amenizado por meio do trabalho do psicólogo, sibilidade de reorientarem-se, pois estão abertos
que o re-orienta propondo “uma integração da ao futuro. França e Soares (2009) apresentam a
identidade vocacional-profissional com a histó- aposentadoria como um período de incertezas,
ria pessoal e familiar da pessoa” (LUCCHIARI, apesar das sofisticadas projeções econômicas
1997, p. 87), além de garantir prevenção da saú- tão presentes no mundo atual. E que há, sem
de mental do mesmo, a partir do momento em dúvida, uma carência de estudos e pesquisas
que o seu novo trabalho é planejado para ser diante dessa realidade, pois são desconhecidos
acima de tudo, uma fonte de prazer. e imprevisíveis os comportamentos dos traba-
A demanda por orientação profissional lhadores e das empresas frente ao aumento da
no processo de re-escolha ou re-opção tem sido expectativa de vida, visto que os aspectos psico-
cada vez maior no cenário atual, o que se escla- lógicos, sociais, econômicos e políticos-culturais
rece, entre muitos outros fatores, o alto índice de envolvidos nesta fase de transição são fortemen-
insatisfação, troca e/ou desistência dos cursos te influentes e não podem ser desconsiderados.
superiores, ou ainda quando o estudante quer
seguir estudos em uma pós-graduação e apro- Por ser uma temática ainda nova, a aposen-
veita a oportunidade para redefinir sua esco- tadoria é acompanhada de contradições,
lha anterior. Nas palavras de Hotza & Lucchiari observadas tanto naqueles que estão na
(1998, apud MOURA e MENEZES, 2004, p. 30), transição quanto nos vários segmentos da
sociedade, e essa falta de preparo pode pro-
“A insatisfação com a opção realizada ou com
vocar uma série de conflitos. De um lado, es-
a formação profissional conquistada, é corrobo- tão aqueles que podem planejar se aposentar
rada pela crescente demanda de universitários com maior tranqüilidade, podendo transfor-
ou ex-universitários por trabalhos de orientação mar essa fase em uma oportunidade de ba-
profissional.” lanço, do despertar de novas possibilidades,
Moura e Menezes (2004), salientam que seguidas por um recomeço ou otimização da
escolher ou re-escolher não é um processo sim- vida; por outro lado, a aposentadoria hoje, e
ples, pois traz consigo a tomada de decisão para especialmente no Brasil não representa ne-
qual a maioria das pessoas não recebeu um pre- cessariamente a saída dos trabalhadores do
paro adequado, quer seja pela formação fami- mercado de trabalho, uma vez que muitos
desejam continuar a ter uma atividade remu-
liar, escolar ou de outras instituições educativas.
nerada (CAMARANO, 2001, apud FRANÇA
Após o período universitário, geralmen- e SOARES, 2009, p. 740).
te, cada indivíduo ocupa determinado segmento
profissional, onde pode encontrar-se estabiliza- Diante dessa realidade, faz-se extrema-
do ou não, neste e em diversos outros casos, o mente necessário, segundo França (2008, apud
mesmo também pode servir-se da orientação ou FRANÇA e SOARES, 2009), que as organiza-
re-orientação. ções ofereçam um sistema que garanta o bem-
Já no período final do percurso labo- -estar dos trabalhadores mais velhos e dos que
ral, em geral caracterizado pela aposentadoria, estão se aposentando, sem perder de vista o in-
pode ser encarado de duas maneiras pelo pro- centivo à motivação e à produtividade das equi-
fissional. Enquanto crise, quando há certa re- pes intergeracionais e a responsabilidade social
cusa em aceitar a situação ou necessidade de com todos os seus trabalhadores, mesmo com
voltar ao trabalho por sobrevivência; e enquanto aqueles que estejam deixando as organizações.
liberdade, quando é incentivado pela assistên- Identificando aqueles que desejam, precisam e
cia familiar ou pela busca de prazer através do têm condições de continuar no mesmo tipo de
lazer. Nessas situações, os indivíduos podem trabalho, os que desejam um trabalho diferente
continuar trabalhando na mesma ocupação ou ou mesmo que queiram se aposentar definitiva-

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mente, garantindo o apoio essencial a essa fase. Soares (2000, apud FRANÇA e SOA-
França e Soares (2009), falam sobre a RES, 2009), afirma ainda que eles muitas vezes
educação ao longo da vida e os programas de procuram uma nova colocação, tanto pela ne-
preparação a serem empregados nas organiza- cessidade de complementar os ganhos, quanto
ções, a fim de efetivar a transição trabalho-apo- a fim de obter nova ocupação para preencher o
sentadoria enquanto planejamento para o futuro, tempo vago ou até para concretizar um antigo
os quais devem conter projetos de atualização e sonho. Sob esta ótica, o trabalho do psicólogo
desenvolvimento, aplicação de novas metodolo- como re-orientador de projetos para o futuro na
gias, inserção digital para os trabalhadores mais aposentadoria pode caracterizar-se por auxiliar
velhos, quebra dos preconceitos contra o enve- na desvinculação com a profissão anterior, a fim
lhecimento e integração entre os trabalhadores de buscar uma atividade que atenda às neces-
mais velhos e mais jovens. sidades e facilite ao reorientando a compreen-
O motivo de tamanha preocupação com são de seu avanço e suas escolhas sucessivas,
essa temática e, principalmente, com os traba- auxiliando-o a ver a relação entre as inúmeras
lhadores envolvidos nesse processo é o fato de decisões que toma ao longo da vida profissio-
que, nas palavras de França e Soares (2009), nal, visando projetar um futuro com qualidade de
a adaptação à aposentadoria depende de diver- vida e realizações (SOARES, 2002 apud FRAN-
sos fatores. Sob o ponto de vista psicossocial, é ÇA e SOARES, 2009).
fundamental que sejam analisadas as atitudes
dos trabalhadores diante das perdas e os ga- O papel do orientador deve ser o de contribuir
nhos que acompanham essa transição, de for- com a reflexão sobre o projeto de vida pesso-
ma que os ganhos possam ser reforçados e o al e profissional, e, a partir de tal reflexão, au-
impacto das perdas seja contornado por meio do xiliar as pessoas a se darem conta de como
lidam consigo mesmas e com as relações de
planejamento, este último elaborado a partir do
trabalho e sociais, para então, se necessá-
acompanhamento e orientação psicológica. rio, reestruturar tais relações, de um modo
adequado para si mesmo e para a socieda-
O PPA facilita o bem-estar dos futuros apo- de. É fundamental que, nesse processo, os
sentados, pois enfatiza os aspectos positivos indivíduos construam pontes” entre o mundo
e oportuniza a reflexão sobre os aspectos interno e externo e aprendam a lidar com as
negativos da transição bem como a discus- possibilidades e as limitações presentes em
são de alternativas para lidar com eles. É ambos (SOARES et al., 2000 apud FRANÇA
a oportunidade para receber informações e e SOARES, 2009, p. 747).
para a adoção de práticas e estilos de vida
que promovam a saúde. É também o mo-
França e Soares (2009) concluem que a
mento para (re)construir o projeto de vida a
curto, médio e longo prazos, priorizando os aposentadoria também tem chegado para pes-
seus interesses e as atitudes que precisa soas ainda jovens, que estão em condições de
tomar para realizar seus projetos pessoais continuar empregadas nas mesmas ou em ou-
e familiares (FRANÇA e SOARES, 2009, p. tras atividades profissionais e neste sentido, “a
743-744). reorientação pode ajudar a buscar os sonhos
adormecidos, a realização de projetos deixados
O valor da reorientação profissional e da para trás por motivos familiares e profissionais.”
carreira neste período do aposentar-se é ines- (SOARES, 2002, apud FRANÇA e SOARES,
timável, e tem por público-alvo um dos princi- 2009, p. 747).
pais protagonistas na prática da reorientação, o Reis (2008), aborda a prática da re-
que Soares et al. (2007, apud FRANÇA e SOA- -orientação profissional com pessoas portado-
RES, 2009), deixa claro ao relatar experiências ras de deficiências motoras em consequência de
de aposentados que confirmam que a aposen- acidentes, e aponta que o índice de acidentes
tadoria transforma completamente a vida dos procedentes de sequelas físicas tem tido um au-
sujeitos. Geralmente altera rotinas, hábitos, ex- mento considerável a cada ano, com destaque
pectativas e relacionamentos, o que indica ser para Portugal, país onde fora realizada a pes-
fundamental a preparação para o enfrentamento quisa, apresentando idade predominante de ví-
dessas mudanças e a reflexão sobre o planeja- timas entre 25 e 35 anos, envolvendo acidentes
mento pessoal para o futuro. de trabalho e automobilísticos.

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FABRIS et al.

Visando a adaptação do sujeito a um víduos tendem a criar uma imagem negativa de


novo modo de vida, outrora desconhecido por si mesmo, carecendo de uma análise de suas
ele mesmo, forças e fraquezas, para que modifique sua per-
cepção.
É indispensável para o processo de orien- No entanto, o orientador deve observar
tação vocacional, reforçar as competências as vivências antecedentes ao acidente, sejam
dos indivíduos tendo em conta o contexto elas pessoais ou profissionais, cujos laços e
familiar, as habilitações, as possibilidades significados foram formados pelo indivíduo, e
profissionais já consideradas, experiências
através dessa análise deve buscar habilidades
profissionais, crenças, valores, o tipo de per-
sonalidade, assim como as pessoas signifi- de enfrentamento, para que esse sujeito possa
cativas e de suporte associadas ao indivíduo amadurecer e se desenvolver de acordo com as
(REIS, 2008, p. 2). exigências do ambiente. Por isso, o re-desenvol-
vimento é destacado da seguinte forma: neces-
Nota-se a importância do orientador pro- sidades fisiológicas, em que o deficiente preci-
fissional nesse processo, devendo atentar-se às sa adaptar-se a cadeira de rodas (se esse for o
necessidades desse indivíduo, pelo qual perpas- caso), aprender outras maneiras de produção e
sa uma sinestesia, pela forma como era, a ma- aprender a cuidar de sua higiene pessoal; neces-
neira que está agora e como habituar-se às no- sidades de segurança, a busca por um emprego
vas condições. É relevante que a re-orientação similar ao anterior, porém que lhe garanta sub-
preze pelas habilidades motoras que a vítima sídios ao seu novo modo de vida; necessidades
perdeu e pelos cuidados de uma nova aprendi- de afeto e de pertença; necessidades de estima;
zagem. necessidades de autoatualização, desenvolven-
A autora supracitada alude que, segundo do o interior e o exterior, aceitando sua situação.
Ettinger (1997), a deficiência é percebida como Conforme explicação anterior, para uma
uma diferença pelo olhar médico e não como nova realidade ser construída, o deficiente
algo negativo. Porém, o público comporta-se perpassa por habilidades que também devem
perante o deficiente não apenas como um ser constituir-se, sendo elas: skills de percepção e
diferente, mas delimitando-o por meio de um resposta a transições, o deficiente compreende
estigma. Ressalta ainda, que tempos atrás, a que sua dificuldade é agora sua normalidade, e
admissão laboral de deficientes físicos era mais a partir disso, há um aumento considerável em
comum que os deficientes mentais, e que as ati- sua auto-estima; skills para avaliar, construir e
tudes sociais deparadas com tais sujeitos é uma utilizar sistemas de suporte externos, o suporte
variabilidade, considerando a época e o contex- esperado pelo sujeito ocorre de poucas pesso-
to em que ocorrem. as; skills para lidar com o estresse emocional e
Portanto, o meio é bastante influente fisiológico; skills para planejar e implementar a
no modo como as pessoas deficientes sentem- mudança.
-se menos adequadas do que as outras ditas Vale ressaltar que o processo de transi-
normais. Daí a importância de ressaltar alguns ção é constante na vida do sujeito com defici-
fatores primordiais no processo de análise de ência motora, essencialmente na construção de
tais sujeitos, os quais, Reis (2008) distingue sua profissão, principalmente se antes do aci-
em: ajustamento, o indivíduo sente dificuldade dente o mesmo já possuía certa estabilização
de ajustar-se aos padrões sociais, inferindo-lhe no setor laboral. Por isso, a readaptação é fun-
uma negação própria e tendo como consequên- damental nesse ambiente, fazendo-se necessá-
cia disto, frustração, vergonha e a sensação de rio que o orientador promova um envolvimento
inferioridade; barreiras atitudinais, onde o defi- desse sujeito com o seu ambiente de trabalho,
ciente defronta-se com obstáculos na inserção evidenciando uma reestruturação e um reco-
laboral; generalizações decorrentes da ‘etique- nhecimento por parte do indivíduo. As amizades
tização’ de deficiente, visto que o sujeito deve também são muito importantes para esse sujeito
ser identificado pelo seu mérito e não pela sua que se adapta a uma nova realidade, pois for-
inépcia física; altura no ciclo de vida no qual o necem suporte emocional, proporcionando-lhe
acidente ocorre, quanto mais tardia a alteração, motivação para trabalhar.
maiores são os empecilhos de instalação e es- Reis (2008) destaca o papel do profis-
tabilização e, autoconceito, sendo que tais indi- sional de Orientação Vocacional frente a esse

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Da orientação profissional a...

público-alvo que requer tantos cuidados. Pri- mas principalmente devido às mudanças ex-
meiramente, é importante que o orientador ternas, no meio ambiente (LUCCHIARI, 1997).
deixe de lado qualquer estigma ou percepção Há ainda aqueles que pertencem ao grupo de
negativa sobre o indivíduo, deixando de lado o pessoas com transtornos globais do desenvolvi-
medo, para que não interfira em sua prática. É mento, dentre eles, os portadores do transtorno
de extrema importância observar se há indícios do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
depressivos por parte do sujeito, uma vez que Essas pessoas demandam uma atenção espe-
esse sentimento é comum por ter perdido suas cial em relação a sua vida laboral por portarem
habilidades motoras. Assinala também, que o determinado tipo de transtorno.
profissional não deve prender-se apenas em O TDAH é um dos transtornos neuropsi-
aplicações de teorias, mas obter um olhar sensí- quiátricos mais comuns que atingem a infância.
vel e empático para com o deficiente, visto que a É extremamente comprometedor, visto que in-
intervenção positiva começa pelo psicólogo. terfere desde o desempenho escolar até o futuro
profissional do indivíduo, além de gerar prejuí-
O mundo é, notadamente, não uma realidade zos no âmbito familiar e social oriundos da difi-
fixa e menos ainda um ambiente físico par- culdade de interação e adaptação aos padrões
ticular, mas sim definitivamente um mundo sociais, que por sua vez, desencadeiam baixa
de construções individuais em permanente autoestima e quadros de ansiedade. As pessoas
mudança, ou melhor, um mundo de co-cons-
acometidas pelo TDAH geralmente não apresen-
truções sociais. (FURTH, 1998, apud REIS,
2008, p. 15) tam déficit intelectual, porém o desenvolvimento
educacional caracteriza-se como instável devido
Desse modo, é notória a necessidade de à ineficiência e desorganização com os estudos
adaptar esse indivíduo, vítima de um acidente e tarefas, gerando dificuldade para o aprendiza-
que lhe privou de habilidades motoras, num novo do e memorização.
campo de vida, o qual engloba família, trabalho A escolha profissional é típica do período
e comunidade. Considerando seus nuances, é da adolescência, fase em que as pessoas diag-
preciso e possível reestruturar a carreira do su- nosticadas com o TDAH enfrentam inúmeros
jeito a partir do momento em que ele mesmo problemas, além dos considerados normais para
considere-se efetivo, autosuficiente e capaz de essa faixa etária. Costa e Barros (2012), apre-
realizar suas atividades, tecendo laços que for- sentam a possibilidade de re-orientação profis-
taleçam a si mesmo e a todos que o envolvem. sional com portadores deste transtorno, que ge-
Vimos que a reorientação pode benefi- ralmente apresentam um atraso maturacional de
ciar tanto uma pessoa bem-sucedida que deseja 4 a 6 anos em relação aos demais adolescentes.
trocar ou experimentar uma atividade diferen- Por isso, esses pacientes se diferenciam ainda
te, mudar de especialidade dentro da mesma mais do grupo, pois tendem à dificuldade de
profissão, quanto uma pessoa mal sucedida aceitar normas disciplinares, de aprender com
profissionalmente, que muitas vezes culpa as as consequências das suas ações, a ter pouco
dificuldades encontradas na profissão por seu desenvolvidas as competências de aprendiza-
insucesso, ou ainda aqueles em situação de gem social e conceitual, as quais são imprescin-
desemprego que buscam resolver uma ques- díveis para o desenvolvimento e a exploração da
tão emergencial nem sempre ligada à procura carreira na vida adulta. Neste período, o trans-
de uma nova escolha laboral. A modernização torno manifesta-se mais visivelmente no âmbito
também tem trazido a necessidade cada vez profissional, onde os adultos têm consequências
mais urgente de adaptação à tecnologia, e por como o insucesso e a insatisfação no trabalho,
isso atualmente fala-se muito em reorientação além da dificuldade em selecionar uma carreira,
nas empresas. O mundo do trabalho, mediatiza- se inserir no ensino superior e/ou se manter em
do de mudanças tecnológicas: a automação, a um emprego.
globalização, o avanço das comunicações e dos Alguns elementos importantes em todo
transportes, redes de computadores e Internet processo de orientação profissional, represen-
tem exigido que os trabalhadores das mais di- tam um dos maiores desafios no trabalho com
ferentes profissões se modernizem. Esta é mais os jovens com TDAH, porém, uma vez alcança-
uma possibilidade de reorientação não como dos permitem à orientação e re-orientação pro-
falta de orientação ou má escolha profissional, fissional um caráter terapêutico e profilático mais

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FABRIS et al.

significativo do que o seria para orientandos em de sua história de vida, que os direcione a um
outras circunstâncias, adquirindo um significado caminho profissional específico.
crucial no caso dos portadores de TDAH: As autoras afirmam que “é comum as
pessoas com TDAH terem grandes chances de
(a) o respeito ao ritmo próprio do orientando; fazer uma escolha profissional de forma impulsi-
(b) estar atento para que o adolescente reflita va e irrefletida; por conseguinte, é bem provável
e baseie sua decisão em seus próprios va- que eles apareçam no consultório como um caso
lores e não naqueles impostos pelo sistema posterior de re-orientação” (COSTA E BARROS,
econômico, moral, educacional, social, ou
2012, p. 249).
qualquer outro que se sobreponha ao do in-
divíduo; (c) ter sempre claro que a utilização A baixa motivação caracteriza outro com-
de técnicas ou testes devem funcionar como plicador do processo de orientação profissional
recurso e não como fim em si; (d) considerar com esses sujeitos, visto que apresentam uma
e refletir junto com o orientando que a esco- busca incessante pela novidade, o que dificulta
lha, quando feita, é circunstancial ao momen- a eleição de um único caminho a seguir, aban-
to vivido, e não como uma escolha definitiva donando as demais possibilidades existentes,
e imutável, (e) ajudar o orientando a construir o que resulta em uma carga de angústia maior
uma forma própria de tomar decisões, que do que nos adolescentes sem o transtorno. “O
possa ser estendida a outras áreas e a ou- orientador, sabendo dessa característica, pode
tros momentos de sua vida (BARROS, 2004
apontá-la para o orientando e gerar uma dis-
apud COSTA e BARROS, 2012, p. 247-248).
cussão de como ela pode afetar (ou não) a sua
escolha profissional e seu desempenho como
Por isso, a orientação profissional com
trabalhador” (COSTA e BARROS, 2012, p. 250).
esses pacientes visa propiciar um apoio adicio-
De acordo com as autoras supracitadas,
nal, uma consciência própria mais acurada e a
outro sintoma do TDAH que precisa ser aborda-
melhora no desempenho do papel profissional.
do para o trabalho em orientação profissional é
Ao orientador, cabe conhecer as dificuldades ad-
a hiperatividade, que ocorre tanto fisicamente
vindas de determinados quadros e traçar estra-
quanto mentalmente.
tégias adequadas para a resolução da questão
profissional de cada indivíduo.
Conhecer e entender o próprio comportamen-
Quanto às características mais comuns to é fundamental para uma mudança de pers-
dos orientandos com TDAH em relação à essa pectiva que possibilite um redirecionamento
prática profissional,o comprometimento do sis- em sua vida. É importante ao TDA aceitar o
tema atencional pode evidenciar-sede diversas seu modo de ser e acreditar sinceramente
formas e intensidades, como descrito por Costa em seus talentos, transformando assim, po-
e Barros (2012, p. 248): tencialidades criativas em atos criativos. Ele
tem que adquirir confiança para buscar seu
Atrasar ou esquecer o dia da sessão; es- espaço nesse novo sistema de trabalho, cria-
quecer as técnicas que ele precisa realizar tividade, coragem de errar e perseverança
em casa; dificuldade em sustentar a atenção de continuar tentando. É necessário que te-
nas técnicas aplicadas na sessão; perder o nha um ideal firme e que creia no seu próprio
“fio da meada” no meio da conversa, mudar sonho para torná-lo real (SILVA, 2009, apud
de assunto tendo dificuldade de manter um COSTA e BARROS, 2012, p. 251).
foco, passar de um assunto para outro, sem
finalizar as discussões. Para a execução de um trabalho efetivo,
é imprescindível que o profissional orientador ou
A impulsividade representa um dos as- re-orientador profissional conheça o transtorno e
pectos do déficit das funções executivas (essen- trabalhe para adaptar o processo às caracterís-
ciais para uma decisão consciente) e pode ser ticas desses pacientes, buscando recursos que
outra característica dos portadores deste trans- auxiliem a reflexão e a escolha consciente de
torno, causando um impacto maior nas atitudes um futuro profissional.
exigidas para a tomada de uma decisão profis-
sional. Neste sentido, se encontra a grande difi- CONSIDERAÇÕES FINAIS
culdade das pessoas que não contam com uma
motivação particular ou uma habilidade ao longo Portanto, diante de tudo o que foi expos-

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Da orientação profissional a...

to no decorrer do artigo, consideramos de suma LASSANCE, M. C.; SPARTA, M. A orientação


importância que seja realizada uma reflexão so- profissional e as transformações no mundo
bre a atuação do psicólogo enquanto re-orienta- do trabalho. Rev. Bras. Orientac. Prof., São
dor profissional que tem embasamento histórico/ Paulo, v. 4, n. 1-2, p. 13-19, dez. 2003.
teórico acerca de conhecimentos que proporcio-
nem uma prática que alcance possíveis eventos LUCCHIARI, D. H. S. A re-orientação
singulares a cada sujeito. Essa prática é pos- profissional apoio em época de crise. Rev.
sível por meio de estratégias que promovam a ABOP, Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 81-88, jun.
qualidade de vida, a partir do conhecimento de si 1997.
mesmo agregado ao conhecimento técnico das
possibilidades profissionais. MELO-SILVA, L. L. Histórico da Associação
Diferente do que é concebido pelo senso Brasileira de Orientação Profissional. Revista
comum, a re-orientação profissional transcende Brasileira de Orientação Profissional, São
o processo de orientação profissional, não no Paulo, v. 8, n. 2, p. 1-9, dez. 2007.
sentido de sobrepor uma à outra, mas na abran-
MOURA, C. B.; MENEZES, M. V. Mudando de
gência das situações em que o orientando pode
opinião: análise de um grupo de pessoas em
recorrer a esta prática, permitindo que o sujeito
condição de re-escolha profissional. Revista
se posicione diante das dúvidas relacionadas à
Brasileira de Orientação Profissional, São
escolha profissional.
Paulo, v. 5, n. 1, p. 29-45, jun. 2004.
Ao profissional, cabe ter uma postura
imparcial, sem julgamento, proporcionando au-
MOURA, C. B.; SILVEIRA, J. M. Orientação
xílio e compreendendo o sujeito, de modo que
Profissional sob o Enfoque da Análise do
esse reconheça e reflita sobre suas possibilida-
Comportamento: Avaliação de uma Experiência.
des de escolhas, ampliando suas percepções
Revista Estudos de Psicologia, Campinas, v.
a respeito do leque de profissões acessíveis.
19, n. 1, p. 5-14, jan./abr. 2002.
A prática daquilo que nos apetece, é extrema-
mente saudável em qualquer momento da vida, REIS, M. A. P. A (re)orientação vocacional
Soares (1997, apud FRANÇA e SOARES, 2009) de pessoas com deficiências motoras em
mencionava que a situação mais feliz é aquela consequência de acidentes. O Portal dos
em que o trabalho e o hobby coincidem, ou seja, Psicólogos. Porto, jun. 2008.
aquilo que é trabalho representa uma fonte de
prazer. SOARES, D. H. P.; FRANÇA, L. H. F. P.
Preparação para a aposentadoria como parte
REFERÊNCIAS da educação ao longo da vida. Psicologia:
Ciência e Profissão, Brasília, v. 29, n. 4, p.
ABADE, F. L. Orientação Profissional no 738-751, 2009.
Brasil: Uma Revisão Histórica da Produção
Científica. Revista Brasileira de Orientação SPARTA, M. O Desenvolvimento da Orientação
Profissional, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 15-24, Profissional no Brasil. Revista Brasileira de
jun. 2005. Orientação Profissional, São Paulo, v. 4, n.
1-2, p. 1-11, dez. 2003.
COSTA, N. S.; BARROS, D. T. R. Orientação
Profissional com Portadores de TDAH: TEIXEIRA, M. O. A abordagem sócio-cognitiva
informações e adaptações necessárias. no aconselhamento vocacional: Uma reflexão
Revista Brasileira de Orientação sobre a evolução dos conceitos e da prática
Profissional, Minas Gerais, v. 13, n. 2, p. 245- da orientação. Rev. Brasileira de Orientação
252, jul./dez. 2012. Profissional, São Paulo, v. 9, n. 2, p. 9-16, dez.
2008.
EHRLICH, I. F.; CASTRO, F.; SOARES,
D. H. P. Orientação Profissional: liberdade
e determinantes da escolha profissional.
Revista de Ciências Humanas, Florianópolis:
EDUFSC, n. 28, p. 61-79, out. 2000.

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FABRIS et al.

LA ORIENTACIÓN A ORIENTACIÓN
PROFESIONAL: REFLEXIONES SOBRE EL
PAPEL DEL PSICÓLOGO ANTE EL ACTUAL
ESCENARIO DE CAMBIOS PROFESIONALES

Resumen: El presente artículo objetiva resaltar aspec-


tos acerca de la actuación del psicólogo como orien-
tador e reorientador profesional, y la amplitud de este
proceso, apuntando hacia sus ricos subsidios teóri-
cos y prácticos para el escenario contemporáneo, el
cual presenta una vasta demanda de esta práctica en
diversas circunstancias atravesadas pelos sujetos.
En la búsqueda de un trabajo preventivo e simultáne-
amente que promueva calidad de vida, presentamos
las posibilidades en que se puede servir da reorien-
tación; un breve histórico de esta práctica en Brasil y
las principales teorías psicológicas que dan suporte
a la orientación profesional. Para atingir los objetivos
de esta pesquisa, fue realizada una cautelosa revisi-
ón bibliográfica. Con el estudio se pudo concluir que
la praxis del psicólogo en la orientación profesional o
en la re-orientación profesional requiere conocimien-
tos teórico, metodológico y de las singularidades de
cada sujeto (orientando o re-orientando) y del contex-
to en que los mismos está inseridos.
Palabras-clave: Calidad de vida; Orientación; Po-
sibilidades; Reorientación.

24 Akrópolis, Umuarama, v. 25, n. 1, p. 13-24, jan./jun. 2017 ISSN: 1982-1093

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