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FÓRUM

“DINHEIRO É A FORMA
MAIS SEGURA DE PROVISÃO “
ENTREVISTA: Geraldo Sant’Ana de Camargo Barros
Geraldo Sant’Ana de Camargo Barros é doutor em Economia pela Universidade do Estado da Carolina do Norte
e pós-doutorado pela Universidade de Minnesotta, ambas norte-americanas. É professor titular do Departamento
de Economia, Administração e Sociologia da Esalq/USP e coordenador científico do Centro de Estudos Avançados
em Economia Aplicada (Cepea). Nos últimos quatro anos têm apresentado contribuições teóricas importantes a
respeito da sustentabilidade econômica do agronegócio.

Hortifruti Brasil: Como o senhor interpreta o ris- HF Brasil: Em sua opinião, qual é a melhor forma
co de rentabilidade do tomaticultor de mesa esti- de o tomaticultor se proteger contra os prejuízos
mado pela Hortifruti Brasil (tabela abaixo)? da cultura?
Geraldo Sant’Ana de Camargo Barros: Com base Barros: O produtor de tomate, como regra, está
na série histórica da Hortifruti Brasil de receita sujeito a elevado risco e isso configura em uma si-
líquida mensal nas principais regiões produtoras, tuação perigosa de grandes perdas patrimoniais. A
a probabilidade é de que em dois meses e meio, boa prática administrativa recomenda que o pro-
a cada 12, o tomaticultor tenha rentabilidade ne- dutor somente considere esse empreendimento
gativa. É importante ressaltar que esse cálculo de mediante o provisionamento de parte dos recursos
risco é baseado no perfil de um tomaticultor que a serem comprometidos na atividade. Provisionar
colhe ao longo de 12 meses. Além disso, reitera-
mos que é somente uma referência sobre o grau
de exposição ao risco de rentabilidade presente
na cultura do tomate de mesa. O mais importante
é que o produtor tenha um bom controle do seu
“ Não recomendo o
provisionamento contra
fluxo de caixa e que apure o prejuízo mais co- riscos em terra. A forma
mum (em R$/ha) a que está exposto. Esse montan-
te financeiro é justamente o valor do seguro que mais simples de poupança
o tomaticultor deveria guardar para utilizar em seria separar um percentual
situações negativas de renda, como se fosse uma
proteção contra prejuízo. do capital de giro que seria
RISCO DE RENTABILIDADE DO TOMATICULTOR* investido em tomate e
A cada 12 meses, a chance de se obter... aplicá-lo na caderneta de
Prejuízo de R$ 10 mil a R$ 20 mil/ha 1 mês poupança ou num fundo de


Prejuízo de até R$ 10 mil/ha 1,5 mês
Lucro de até R$ 10 mil/ha 2 meses
renda fixa
Lucro de R$ 10 mil a R$ 20 mil/ha 2 meses
Lucro de R$ 20 mil a R$ 30 mil/ha 2,5 meses é aplicar um montante necessário de capital em
Lucro de R$ 30 mil a R$ 40 mil/ha 1 mês projeto seguro (baixo risco), que pode ser uma
Lucro de R$ 40 mil a R$ 50 mil/ha 10 dias aplicação financeira ou outra atividade que não
Lucro de R$ 50 mil a R$ 75 mil/ha 2 meses apresente o mesmo perfil de risco do tomate.
* Estimativa para um tomaticultor de mesa com colheita nos 12 HF Brasil: Qual atividade o senhor recomendaria
meses do ano, ou seja, que não concentra em uma única época do
ano. A série histórica utilizada no estudo é de fevereiro de 2006 a como alternativa ao tomate para reduzir risco de
abril de 2009. rentabilidade?

18 - HORTIFRUTI BRASIL - Junho de 2009


Barros: O produtor que desejar pode ter outra gado, máquinas e veículos). O problema dessa
atividade agrícola de forma a reduzir o risco con- restrição decorre da sincronização entre renta-
junto, ou seja, trabalharia com tomate mais outra bilidade da agropecuária e o valor desses ativos
atividade. Para isso, é preciso analisar o padrão de quando o ano foi bom (boa produção e bons pre-
risco – de produção e de mercado – de atividades ços). Esses ativos vão estar em alta e, logo, não
que o produtor esteja disposto a desenvolver para- é hora de comprá-los de forma alguma. Quem
lelamente ao tomate. O ideal é buscar atividades quiser comprar mais terra deve fazê-lo quando os
que tenham um padrão de rentabilidade oposto preços estão baixos – o que ocorre quando muitos
ao do tomate; assim, quando este vai mal, a outra produtores rurais estão de bolsos vazios. Então,
atividade compensa e vice-versa. Se essa ativida- o produtor deve poupar seus recursos para uma
de alternativa envolver o uso dos mesmos equipa- eventual aquisição de terra numa época favorável
mentos e/ou alternar com o tomate o uso da terra, para tal negócio, ou seja, num ciclo de baixa ren-
por exemplo, tanto melhor, pois isso vai melhorar tabilidade agrícola. Se fizer provisionamento com
a eficiência econômica do conjunto da produção. terra, caso tenha prejuízo com tomate e precise
dispor de parte de sua terra, vai vendê-la a preços

“ Gerenciar risco fazendo


provisionamento é
baixos, ou seja, vai fazer um mau negócio.

HF Brasil: Há outra alternativa de provisão além


da reserva de dinheiro em banco?
somente para aqueles Barros: As alternativas fora dos bancos, como já
que querem preservar disse, podem ser consideradas quando o produtor
identificar atividade que esteja em condições de
seu patrimônio e, assim, desenvolver, ou seja, uma atividade que conheça
garantir o bem-estar bem – do ponto de vista econômico e técnico –
próprio e o de sua família

HF Brasil: O senhor considera uma boa alternati-
que seja rentável e que não “ande junto” com o
tomate. Pode ser algo no meio rural ou urbano.
Creio, porém, ser difícil identificar tal atividade.
Aplicar no banco, nos ativos já apontados, é mais
va de provisão investimento em terra? seguro e mais cômodo, sem contar a liquidez
Barros: De forma alguma o provisionamento de- imediata.
ve ser uma aplicação em ativos relacionados ao
HF Brasil: Muitas vezes, pode ser difícil convencer
tomate, como a terra da região, por exemplo. A
o produtor a fazer uma provisão anual porque,
forma mais simples seria separar um percentual
– que depende do perfil de risco da atividade – em um determinado ano, ele pode obter lucrati-
do que seria investido em tomate e aplicá-lo na vidade muito maior se tivesse investido 100% na
caderneta de poupança ou num fundo de renda cultura do tomate.
fixa (Certificado de Depósitos Bancários - CDB, Barros: Um produtor que não esteja preocupado
por exemplo), mas nunca em bolsa. O produtor em perder seu patrimônio ou ir à falência pode
não pode perder recursos ao fazer esse provisio- adotar uma estratégia de alto riso como essa. Ge-
namento. Na verdade, em média, essa aplicação renciar risco, fazendo provisionamento é somente
financeira estará reduzindo o risco e aumentan- para aqueles que querem preservar seu patrimônio
do a rentabilidade média da produção de tomate, e, assim, garantir o bem-estar próprio e o de sua
embora diminua um pouco a chance dos ganhos família. O produtor deve examinar se, ao longo
espetaculares que de vez em quando acontecem. dos últimos 15 anos, seu patrimônio aumentou, e
quantas vezes ele “perdeu o sono” por causa de
HF Brasil: Historicamente, no entanto, o produtor grandes quebras de safra ou porque os preços do
considera terra, gado e café como forma de provi- tomate despencaram. Se isso aconteceu, é porque
são. Por quê esse comportamento é tão comum? o grande lucro que ocorreu em determinado mo-
Barros: O produtor rural tende a limitar sua car- mento não cobriu os ganhos pequenos e os preju-
teira de aplicações a ativos agropecuários (terra, ízos de outros momentos.

Junho de 2009 - HORTIFRUTI BRASIL - 19

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