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ALIMENTOS TÓXICOS PARA CÃES E GATOS

Amália Turner Giannico1, Clara Alita corona Ponczek1, Aline Spina de Jesus2, Alessandra Melchert3,
Priscylla Tatiana Chalfun Guimarães-Okamoto3
1
Universidade Federal do Paraná – UFPR, Curitiba – PR. E-mail: amaliaturner@uol.com.br, claponczek@uol.com.br.
2 3
Médica veterinária autônoma. Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia – UNESP-Botucatu-SP. E-mail:
alessandra@fmvz.unesp.br, tatiana@fmvz.unesp.br

RESUMO
Os animais de companhia estão cada vez mais próximos de seus donos e por este motivo acabam
compartilhando de forma errônea a mesma alimentação. Várias substâncias são capazes de causar
intoxicações ou envenenamentos nos cães e gatos, sendo que muitas delas estão presentes nos
alimentos para consumo humano. Alguns alimentos que são comestíveis para os seres humanos e
até mesmo para outras espécies animais podem representar riscos para cães e gatos devido às
diferentes vias metabólicas, além das quantidades e concentrações consumidas. As intoxicações
nos animais ocorrem de forma intencional ou acidental no domicílio do proprietário do animal,
ocorrendo manifestação aguda dos sinais clínicos. O objetivo desta revisão foi apresentar os
produtos alimentícios, para seres humanos, que não devem ser fornecidos para cães e gatos assim
como sinais clínicos característicos de uma toxicose por estes alimentos, demonstrando também
sua terapia geral. Esta revisão explora em detalhes os mecanismos de ação e os sinais clínicos
decorrentes de toxicose causada por chocolate, xilitol, macadâmia, cebola, alho, uvas e passas,
abacate, bebidas alcoólicas e leite.
Palavras-chave: intoxicação; pequenos animais; produtos alimentícios

TOXIC FOOD FOR DOGS AND CATS

ABSTRACT
Pet animals are closer to their owners and for this reason erroneously share the same
alimentation. Several substances can cause intoxication or poisoning in dogs and cats, being many
of those also found in human food. Some foods that are edible for humans or even to other animal
species can be risky for dogs and cats due to different metabolic pathways, and further damage
can be caused depending on the amount or concentration consumed. Poisoning in animals occur
intentionally or accidentally in the household of its owner, occurring acute onset of clinical signs.
Thus, the objective of this review was to present the food products for humans that cannot be
given to dogs and cats as well as clinical signs characteristic of a toxicosis, also demonstrating the
therapy for the damage created by consumption of those substances. This review explores the
mechanisms of action and clinical signs of toxicosis caused by chocolate, xylitol, macadamia nuts,
onions, garlic, grapes and raisins, avocado, alcoholic beverages and milk.
Keywords: intoxication; small animals; food products.

Colloquium Agrariae, v. 10, n.1, Jan-Jun. 2014, p.69-86. DOI: 10.5747/ca.2014.v10.n1.a101


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INTRODUÇÃO bebidas alcoólicas e leite (KOVALKOVIČOVÁ


Existem vários agentes que podem et al., 2009).
causar intoxicações nos cães e gatos. A Esta revisão teve como objetivo
gravidade das intoxicações nestes animais apresentar os produtos alimentícios que não
depende da disponibilidade desses agentes devem ser fornecidos para cães e gatos e os
no meio ambiente, quantidade de agente ao sinais clínicos característicos de uma toxicose
qual o animal está exposto e sensibilidade por estes agentes e a terapia geral.
individual para os seus efeitos
(KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). REVISÃO DE LITERATURA
Cerca de 90% das intoxicações nos Chocolate, café e chá (teobromina)
animais são acidentais e agudas, ocorrendo O chocolate é apreciado por muitas
perto ou no domicílio do proprietário pessoas, inclusive pelos cães. Na constituição
(GODBOLD et al., 1979; OGA, 2003; TODD; do chocolate existe grande quantidade de
POWELL, 2007; KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009; carboidratos, lipídios, aminas biogênicas,
XIA et al., 2009). Existem alguns alimentos neuropeptídeos e metilxantinas (teobromina
consumidos pelos seres humanos e até e cafeína, sendo a concentração de
mesmo por outras espécies de animais que teobromina muito mais significativa do que a
podem representar riscos para cães e gatos de cafeína). A manteiga de cacau é o
devido a diferente metabolização ingrediente presente em maior quantidade
(KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Os hábitos e no chocolate, e é ela que possui a
apetite exigente dos gatos fazem com que a teobromina (STIDWORTHY et al., 1997). A
intoxicação alimentar nestes animais seja teobromina é uma substância com ação
três vezes menos frequente do que nos cães diurética, estimulante cardíaca e
(OGA, 2003; KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). vasoconstritora, sendo extremamente nociva
Os alimentos tóxicos mais comuns para os em excesso, podendo resultar em morte
gatos são cebola, alho, chocolate, uva, passas (BEASLEY, 1999; KOVALKOVIČOVÁ et al.,
e alguns vegetais como tomate verde, batata 2009).
verde ou cru. No caso dos cães, os produtos A teobromina é o componente tóxico
mais comuns que causam toxicoses são mais importante do chocolate e provoca
chocolate, café, doce que contém xilitol, grande estimulação cerebral e intenso
nozes, macadâmia, cebola, alho, uva, passas, aumento no trabalho muscular cardíaco,
ocasionando arritmias cardíacas importantes

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nos cães (STIDWORTHY et al., 1997, BEASLEY, grandes quantidades, mas os cães
1999). A concentração dessa substância no metabolizam a teobromina mais lentamente,
chocolate pode ser de 3 a 10 vezes maior do podendo facilmente se intoxicar (GORNIAK;
que no café (BEASLEY, 1999). Ela também é SPINOSA, 2003).
encontrada no chá e bebidas à base de cola As metilxantinas são bases altamente
(KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Quanto mais lipossolúveis (STIDWORTHY et al., 1997;
matéria lipídica possuir o chocolate, menor GORNIAK; SPINOSA, 2003). Possuem a
vai ser o teor de teobromina, como é o caso habilidade de atravessar as barreiras
dos chocolates brancos, que não oferecem placentária e hematoencefálica e são
tanto risco para estes animais. Quanto mais absorvidas tanto no estomago quanto no
escuro for o chocolate há mais teobromina, intestino. No cérebro, competem com a
havendo uma maior possibilidade de ocorrer adenosina, inibidor pré-sináptico, diminuindo
intoxicação (Tabela 1). Assim, os chocolates sua ação inibitória e desta forma, causando
amargo e meio-amargo são os que oferecem excitação. A meia vida da teobromina no cão
maior risco, pois possuem um teor mais é de 17,5 horas, permanecendo no
elevado desta substância (STIDWORTHY et organismo por até seis dias (GORNIAK;
al., 1997). SPINOSA, 2003). Este tempo de meia-vida é
A quantidade de teobromina prolongado, pois sua excreção ocorre pela
encontrada no chocolate é pequena o bile e não pela urina (STIDWORTHY et al.,
suficiente para que o chocolate possa ser 1997; GORNIAK; SPINOSA, 2003).
consumido com segurança por pessoas em

Tabela 1. Quantidade de teobromina e cafeína em um grama de produto.

Teobromina Cafeína
Chocolate branco 0,009mg 0,030mg
Chocolate ao leite 2,046mg 0,212mg
Chocolate meio-amargo 4,586mg 0,705mg
Chocolate amargo 13,863mg 1,658mg
Cacau em pó 25,997mg 2,469mg

Um cão de 10 kg pode ser seriamente (STIDWORTHY et al., 1997; KOVALKOVIČOVÁ


intoxicado ao ingerir um quarto de um et al., 2009). Quanto menor o cão, menor a
pacote de 250g de cacau em pó quantidade necessária para intoxicar-se

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(GORNIAK; SPINOSA, 2003). Os efeitos 2009). Metilxantinas também podem


dependem do peso do cão, da dosagem e do aumentar os níveis de cálcio intracelular,
tipo de chocolate (STIDWORTHY et al., 1997; inibindo a fixação de cálcio pelo retículo
GORNIAK; SPINOSA, 2003). sarcoplasmático dos músculos estriados
As doses tóxicas de teobromina estão (GORNIAK; SPINOSA, 2003). O efeito é o
próximas a 100mg/kg sendo fatais perto de aumento da força e da contratilidade do
200 mg/kg (STIDWORTHY et al., 1997; músculo esquelético e cardíaco (GORNIAK;
KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Porém, há SPINOSA, 2003; KOVALKOVIČOVÁ et al.,
relatos de sinais de intoxicação, como 2009). Essas substâncias também podem
vômitos e diarréia, com ingestão de apenas competir pelos receptores benzodiazepínicos
20mg/kg (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009) e no SNC e inibirem a fosfodiesterase,
também de sinais de efeitos cardiotóxicos resultando no aumento dos níveis de
com ingestão de 50mg/kg de teobromina adenosina monofosfato cíclico (AMP)
(BEASLEY, 1999). (GORNIAK; SPINOSA, 2003). Também podem
Há ainda, relatos de efeitos drásticos aumentar os níveis circulantes de epinefrina
com a ingestão não só de chocolate em pela estimulação da zona medular das
barra, mas também de chocolate em pó glândulas adrenais (STIDWORTHY et al.,
dissolvido em leite e oferecido aos cães. Os 1997; KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009).
cães são os mais afetados por gostarem
muito desta guloseima (KOVALKOVIČOVÁ et Sinais clínicos
al., 2009), no entanto gatos também podem Os sinais clínicos desta intoxicação
ser intoxicados ao ingerirem o chocolate geralmente ocorrem dentro de seis a 12
(GORNIAK; SPINOSA, 2003). horas após a ingestão (STIDWORTHY et al.,
1997). A teobromina, uma vez absorvida,
Mecanismo de ação pode permanecer ativa no corpo por 24
Metilxantinas provocam um horas antes de ser eliminada
antagonismo competitivo dos receptores de (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). A morte
adenosina (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009; seguida da ingestão de doses fatais ocorre
GORNIAK; SPINOSA, 2003). A inibição destes aproximadamente 24 horas mais tarde
receptores provoca estimulação do sistema (STIDWORTHY et al., 1997; BEASLEY, 1999).
nervoso central (SNC), a constrição de alguns Podem ser observados náusea, êmese,
vasos sanguíneos, diurese e taquicardia diarréia, dispnéia, polidipsia, poliúria e
(BEASLEY, 1999; KOVALKOVIČOVÁ et al., polaquiúria (STIDWORTHY et al., 1997).

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Outros sinais clínicos e alterações avançadas gástrica com uso de carvão ativado, caso a
que podem ser encontradas são intoxicação tenha ocorrido há menos de 2
desidratação, hiperatividade, arritmias horas. Medidas como instituição de
cardíacas, hemorragias internas, hipertensão fluidoterapia, monitoração cardíaca e
arterial sistêmica, taquipnéia, cianose, controle de convulsões são fundamentais.
hipertermia, fraqueza, tremores, ataxia, Uma vez que as metilxantinas podem ser
convulsões, coma e morte (BEASLEY, 1999; reabsorvidas a partir da vesícula urinária,
GORNIAK; SPINOSA, 2003). O alto teor de deve-se manter o animal sondado e a bexiga
gordura dos produtos de chocolate ainda vazia. Devido à longa meia vida da
pode provocar pancreatite em animais teobromina, os sinais clínicos podem
sensíveis (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). perdurar por 24 a 72 horas, devendo-se
As intoxicações por café e chá estão manter o animal internado até a recuperação
relacionadas à cafeína, o que é bastante total (ANDRADE, 2011).
semelhante à teobromina encontrada no
chocolate (STIDWORTHY et al., 1997; Xilitol
KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Suas fontes O xilitol é um açúcar pentanol
incluem bebidas que contenham café, chás e comumente utilizado como adoçante
até mesmo pílulas de cafeína substituto do açúcar (sacarose) em muitos
(KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Os sinais produtos, inclusive em produtos para
clínicos estão relacionados ao coração, diabéticos (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009).
pulmão, rim e SNC, como hiperatividade, Também é utilizado como ingrediente em
êmese e dor abdominal no início, seguidos balas e gomas de mascar para a prevenção
por estado ofegante, fraqueza, ataxia, de cáries, especialmente nas crianças
aumento da frequência cardíaca, tremores (HONKALA et al., 2006) e vem apresentando
musculares, convulsões, coma e morte um aumento do seu uso na sua forma em pó
(GORNIAK; SPINOSA, 2003; HOWLETT et al., para fabricação de pães. Além disso, o xilitol
2005). é encontrado em vários vegetais e frutas,
como ameixas, morangos e framboesas
Tratamento (KITCHENS, 2005).
O tratamento da intoxicação por Os cães são sensíveis ao xilitol, e a
chocolate, café ou chá é de suporte. Deve-se ingestão de produtos que contenham essa
eliminar as toxinas ainda não absorvidas, por substância pode levar à intoxicação
meio da indução do vômito ou lavagem

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(DUNAYER, 2004; TODD; POWELL, 2007; XIA O xilitol é também metabolizado no


et al., 2009). fígado, entrando na via pentose-fosfato e
O Centro de Controle de produzindo um metabólito intermediário
Envenenamento Animal da Sociedade (ribose-5-fosfato), antes de ser transformado
Americana à Prevenção da Crueldade aos em glicose (GORNIAK; SPINOSA, 2003;
Animais (ASPCA) relatou o aumento da DUNAYER; GWALTNEY-BRANT, 2006). Todo
incidência da intoxicação por xilitol nos cães, esse processo de metabolização requer
mostrando que existiram, nos Estados adenosina trifosfato (ATP), e quando uma
Unidos, três casos em 2002, 20 em 2003, 82 grande quantidade de xilitol é absorvida na
em 2004, 193 em 2005 e 198 até julho de circulação sanguínea, o ATP dos hepatócitos
2006 (DUNAYER; GWALTNEY-BRANT, 2006). se esgota, conduzindo à necrose destes e ao
consequente aumento sérico das enzimas
Mecanismo de ação alanina aminotransferase (ALT) e aspartato
O xilitol é um metabólito intermediário aminotransferase (AST) (DUNAYER;
do ciclo do ácido glucurônico que estimula a GWALTNEY-BRANT, 2006). Estudo mais
síntese e secreção da insulina, o que resulta recente mostrou aumento da bilirrubina
nos cães em hiperinsulinemia (KUZUYA; indireta (XIA et al., 2009), o que se deve à
KANAZAWA, 1969; DUNAYER, 2004). O hemólise, pois sabe-se que o suprimento
mecanismo exato de como isso ocorre é contínuo de glicose sanguínea é necessário
desconhecido, mas demostrou-se em um para a integridade da membrana de
estudo que o xilitol, por si só, estimula leucócitos e eritrócitos (NAGY et al., 1998).
diretamente a secreção de insulina nas Como o suprimento de glicose é reduzido em
células β da ilhota pancreática (KUZUYA; consequência da hipoglicemia, há ruptura da
KANAZAWA, 1969). membrana dos eritrócitos, levando à
A insulina estimula a atividade da liberação de hemoglobina, a qual é
enzima de membrana ATPase, que por sua degradada em bilirrubina (NAGY et al., 1998).
vez, catalisa a transferência de íons potássio Além disso, há relato de estudo in vitro de
para o meio intracelular (AL-KHALILI et al., que o xilitol pode promover aumento na
2003), o que induz a hipocalemia. Além disso, concentração sérica de cálcio, pois afeta o
a hiperinsulinemia levará a uma hipoglicemia, tecido epitelial e aumenta a absorção de
que tem pico entre 10 a 20 minutos após o cálcio no intestino (MINEO et al., 2002).
pico de insulina sérica (KUZUYA; KANAZAWA,
1969; DUNAYER, 2004).

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Sinais clínicos sofreram alteração. Sendo assim, esse estudo


A intoxicação por xilitol nos cães é mostrou que a intoxicação por xilitol é
caracterizada por depressão, vômito, ataxia e caracterizada por hiperinsulinemia,
fraqueza, sendo a maioria desses sinais hipoglicemia, hipocalemia, hipofosfatemia,
clínicos secundários à hipoglicemia, que hiperbilirrubinemia, e aumento da
normalmente é observada 30 a 60 minutos concentração sérica de AST e ALT (XIA et al.,
após a ingestão desta substância (DUNAYER, 2009).
2004). Há relato de que 0,15g/kg de xilitol foi Todd e Powell (2007) relataram leve
o suficiente para causar hipoglicemia e levar, leucocitose neutrofílica e desidratação
consequentemente, ao aparecimento dos (comprovado pelo hematócrito elevado com
sinais clínicos (DUNAYER; GWALTNEY-BRANT, hiperproteinemia) em um animal que ingerira
2006). 95 gramas (3,7g/kg) de xilitol. O
Segundo Xia et al. (2009), os animais coagulograma revelou significante aumento
que foram submetidos à administração de no tempo de protrombina e da
xilitol na dosagem de 1g/kg e 4g/kg, tromboplastina parcial ativada, e ainda
apresentaram aumento na concentração diminuição no nível de fibrinogênio
sérica de insulina e diminuição da glicemia. plasmático. A avaliação citológica do fígado
ALT e AST também apresentaram aumento mostrou marcantes mudanças degenerativas
acentuado, proporcional à dose nas células hepáticas, alterações vacuolares
administrada. Não foram observadas não lipídicas e colestase. Todas essas
alterações na gama-glutamil transpeptidase alterações, juntamente ao quadro clínico do
(GGT) e na bilirrubina conjugada, porém a animal, levaram ao diagnóstico de
bilirrubina total aumentou após uma a duas intoxicação por xilitol causando insuficiência
horas da administração. Isso sugere que o hepática aguda.
acometimento hepático não está relacionado
à estase biliar, já o aumento da bilirrubina Tratamento
total deve-se ao fato da hemólise, como já O tratamento da intoxicação por xilitol
visto anteriormente (NAGY et al., 1998). deve ser de suporte, ou seja, tratam-se as
Também foi observada diminuição do alterações ocasionadas pela hipoglicemia,
potássio e fósforo inorgânico. O cálcio ficou como fluidoterapia e reposição de eletrólitos
mais elevado nos animais do grupo controle (DUNAYER; GWALTNEY-BRANT, 2006; XIA et
por três horas, porém não foi maior que os al., 2009). Também é possível o uso de
valores de referência, e o cloro e o sódio não tratamento preventivo aos danos hepáticos,

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pelo uso de hepatoprotetores, como nenhuma outra sintomatologia semelhante a


silimarina e ácido ursodesoxicólico e que ocorre nos cães, sendo que os sinais
transfusão de plasma fresco congelado, clínicos nos cães que ingeriram as nozes
principalmente quando há alterações na sugerem não se tratar de um processo
coagulação (TODD; POWELL, 2007). alérgico (HANSEN et al., 2000).
Na maioria das vezes em que há Na maioria dos relatos de intoxicação, o
suspeita de insuficiência hepática secundária consumo de cinco a 40 sementes de
à ingestão de xilitol o animal já não apresenta macadâmia foi suficiente para o
mais hipoglicemia no momento em que é aparecimento de sinais clínicos (BOTHAA;
examinado. Além disso, um tratamento PENRITHB, 2009). A média de consumo para
precoce e agressivo aos danos hepáticos, intoxicação nos cães foi de 11,7g/kg
mesmo quando o animal está assintomático, (variando de 2,2 a 62,4g/kg), sendo que o
pode prevenir a mortalidade devido à tempo entre a ingestão e o aparecimento dos
insuficiência hepática aguda (TODD; POWELL, sinais clínicos foi menor que 12 horas em
2007). 79% dos casos (HANSEN et al., 2000).

Macadâmia Sinais clínicos


A macadâmia é a semente de um fruto Os sinais clínicos da intoxicação por
obtido da árvore das espécies Macadamia macadâmia cursam inicialmente com
integrifolia e Macadamia Tetraphylla fraqueza, depressão, vômito e hipertermia,
(KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Seu princípio evoluindo para ataxia e paresia, dor e edema
tóxico ainda é desconhecido, mas sabe-se dos membros pélvicos (HANSEN et al., 2000;
que muitas variedades de macadâmia HANSEN, 2002). Além disso, são observados
contêm níveis tóxicos de glicosídeos tremores, dor abdominal, claudicação, rigidez
cianogênicos, porém eles possuem sabor das articulações e palidez das mucosas
amargo e não são utilizados na alimentação (HANSEN et al., 2000).
(BOTHAA; PENRITHB, 2009). No estudo onde a intoxicação por
macadâmia foi reproduzida em laboratório
Mecanismo de ação por meio da administração de 20g/kg desta
O mecanismo de ação da intoxicação semente, os cães apresentaram fraqueza
por macadâmia não é conhecido (HANSEN, intensa com a incapacidade de manter-se em
2002). Em seres humanos já foram relatadas estação por 12 horas após a administração.
reações anafiláticas (KNOTT et al., 2008), mas Exames laboratoriais realizados nestes

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animais mostraram apenas elevação sérica atribuídas desde os tempos antigos, o que fez
da lipase ativa (HANSEN et al., 2000). Na com que fosse realizada análise química
pesquisa realizada por Bothaa e Penrithb exata dos seus ingredientes ativos nos
(2009) os animais apresentaram aumento últimos anos (SLIMESTAD et al., 2007;
transitório dos triglicerídeos. KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Estes
O diagnóstico desta intoxicação deve benefícios para a saúde fornecidos por alguns
ser baseado no histórico de ingestão, ou compostos da cebola incluem propriedades
presença da semente no vômito ou fezes, anti-carcinogênica, antiplaquetária, atividade
além do aparecimento abrupto de fraqueza antitrombótica, antiasmático, antidiabético,
dos membros pélvicos, quando excluída efeitos fibrinolíticos e várias outras ações
possibilidade de trauma, neuropatia biológicas e antibióticas (SLIMESTAD et al.,
periférica, envolvimento do SNC ou dor 2007). Por outro lado, a cebola contém os
muscular (HANSEN et al., 2000). componentes tóxicos que podem danificar as
células vermelhas do sangue e provocar
Tratamento anemia hemolítica acompanhada pela
Não existe antídoto e deve ser formação de corpúsculos de Heinz nos
instituído o tratamento suporte com eritrócitos de mamíferos (DESNOYERS, 2000;
fluidoterapia e outras medidas necessárias. O TANG et al., 2008).
enema é indicado e a lavagem gástrica deve O alho (Allium sativum) é considerado
ser realizada até duas horas após a ingestão menos tóxico e seguro para cães do que a
(ANDRADE, 2011). cebola, quando usado com moderação. Os
O prognóstico é bom, já que na maioria agentes farmacologicamente ativos do alho
dos casos o animal apresenta remissão dos são a alicina e o ajoene, potentes relaxantes
sinais clínicos após 24 horas (HANSEN et al., de músculos cardíacos e de músculo liso,
2000; HANSEN, 2002). agentes vasodilatadores e hipotensores
(COPE, 2005).
Cebola e Alho O consumo de apenas 5g/kg de cebola
A cebola (Allium cepa) é rica em pelos gatos, ou 15 a 30g/kg pelos cães,
componentes químicos que trazem resultou em alterações hematológicas
benefícios para a saúde humana, como os clinicamente importantes (COPE, 2005).
flavonóides (SLIMESTAD et al., 2007). Além
de seus usos culinários, a cebola tem Mecanismo de ação
propriedades medicinais que têm sido

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O mecanismo de toxicidade da cebola (COPE, 2005). A alimentação diária de cebola


tem sido estudado há várias décadas, mas poderia ter um efeito acumulativo devido à
estudos recentes tem mostrado que mais de formação contínua de corpúsculos de Heinz
uma toxina está envolvida (COPE, 2005; em comparação a uma única exposição. Um
TANG et al., 2008). Os componentes tóxicos grande espaço de tempo até a próxima
em todo o tipo de cebola, alho, alho-poró, ingestão permite que a medula óssea
cebolinha e outros vegetais da família Allium, regenere as células vermelhas destruídas
são sulfóxidos e sulfetos alifáticos (COPE, prematuramente (DESNOYERS, 2000; COPE,
2005). É amplamente aceito que sulfureto de 2005).
n-propil é a principal toxina que reduz a
atividade da glucose-6-fosfato desidrogenase Sinais clínicos
em células vermelhas do sangue, interferindo Os primeiros sinais são normalmente
com a regeneração da glutationa necessária de gastroenterite, como vômito, diarréia, dor
para evitar a desnaturação oxidativa da abdominal e perda de apetite, sendo que
hemoglobina (THRALL, 2003). Hemoglobinas depressão e desidratação também são
desnaturadas precipitam na superfície das observadas (TANG et al., 2008). Os sinais
células vermelhas do sangue (corpúsculos de clínicos associados à hemólise, como
Heinz) e desencadeiam a hemólise intra e mucosas pálidas ou ictéricas, frequência
extravascular (TANG et al., 2008). respiratória aumentada, letargia, fraqueza e
Todas as formas de cebola podem ser hemoglobinúria demoram alguns dias para
tóxicas, incluindo: desidratada, cebola crua ocorrer (THRALL, 2003; COPE, 2005). O
ou cozida, em pizzas, pratos chineses, ou exame hematológico pode revelar neutrofilia,
seja, qualquer alimento que contenha cebola linfopenia, anemia com corpúsculos de Heinz
(COPE, 2005). e metahemoglobinemia (DESNOYERS, 2000;
Dentre as espécies estudadas, o THRALL, 2003; TANG et al., 2008).
homem é a mais resistente (KOVALKOVIČOVÁ Os efeitos letais são raros nos cães
et al., 2009). Embora o cão pareça ser uma (COPE, 2005), mas deve-se evitar a exposição
das espécies mais sensíveis, existem poucos a qualquer tipo de A. cepa nestes animais e
relatos na literatura científica sobre o nas outras espécies de animais domésticos
envenenamento acidental, associados à (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009).
ingestão de cebola por estes animais (TANG Nos cães que receberam extrato de
et al., 2008; KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). alho por via gástrica uma vez por dia durante
Os gatos são mais suscetíveis do que os cães sete dias, a contagem de eritrócitos,

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hematócrito e concentração de hemoglobina pode causar lesão renal nos cães (GWALTNEY
diminuíram. A formação de corpúsculos de et al., 2001).
Heinz também foi detectada, no entanto, De uma forma geral, qualquer
nenhum cão desenvolveu anemia hemolítica quantidade ingerida de uva ou passas deve
(LEE et al., 2000). ser considerada um problema. Valores
estimados de uvas associados a lesões renais
Tratamento nos cães são próximos de 32g/kg, já a
Não existe antídoto específico, quantidade de uvas passas associada à
entretanto, deve ser realizado o tratamento manifestação de sinais clínicos variam de 11
suporte com o objetivo de diminuir os efeitos a 30g/kg (GWALTNEY et al., 2001). Apesar
oxidativos do ingrediente ativo e evitar a disso, há relatos de casos de óbito em cães
lesão renal resultante da hemoglobinúria. quando a dose ingerida destes frutos foi de 5
Caso a ingestão tenha sido até duas horas, a 10g/kg (CAMPBELL, 2007).
deve-se induzir a êmese. O carvão ativado
pode ser utilizado com o objetivo de adsorver Mecanismo de ação
os compostos dissulfetos. Pode ser O princípio tóxico é ainda desconhecido
administrado precursores da glutationa, N- (BOTHA, PENRITH, 2009) e seu mecanismo de
acetilcisteína ou SAMe, sendo que para ação ainda não foi elucidado. A aparente
hipoxemia grave ou anemia hemolítica pode falta de uma relação entre dose e resposta
ser realizada uma transfusão sanguínea ou clínica levou alguns autores a sugerir que isso
uso de hemoglobina bovina polimerizada possa refletir tanto a presença de um
(Oxyglobin) (GFELLER, MESSONNIER, 2006). componente dos frutos presente em
quantidades variáveis, quanto a existência de
Uva e Passas um composto que seja extrínseco aos frutos.
A intoxicação de cães por uvas in Variações na resposta individual também
natura ou passas emergiu como uma podem ocorrer (KOVALKOVIČOVÁ et al.,
potencial preocupação nos últimos anos. 2009). A investigação de casos individuais da
Estudos apontam como causadora dessa intoxicação parece excluir a contaminação
toxicose uma toxina ainda desconhecida ou das uvas com pesticidas, metais pesados ou
ainda um fator extrínseco associado micotoxinas. Fatores como o teor
(CAMPBELL, 2007). Atualmente há relatos excessivamente elevado de açúcar das uvas e
que confirmam que a ingestão destas frutas passas, ocorrência de hipercalcemia, o
possível envolvimento de substâncias

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vasoativas, assim como a suspeita de a realização de diálise (GFELLER,


anafilaxia, foram postulados (BOTHA, MESSONNIER, 2006).
PENRITH, 2009).
Abacate
Sinais clínicos Todas as partes da planta do abacate
Os sinais clínicos geralmente se (Persea americana) como folhas, frutos e
manifestam dentro de 6 horas após ingestão, caroço são potencialmente tóxicos para os
e no máximo dentro de 24 horas. Estes cães, gatos, camundongos, ratos, aves,
incluem diarréia, anorexia, dor abdominal, coelhos, cavalos, bovinos e caprinos, entre
fraqueza, desidratação, tremores e letargia outras espécies (BUORO et al.,1994).
(GWALTNEY-BRANT et al., 2001; CAMPBELL, Persin é uma toxina fungicida
2007). Polidipsia discreta associada à oligúria encontrada em todas as partes do abacateiro
normalmente se desenvolve 72 horas após a (BUORO et al.,1994; KOVALKOVIČOVÁ et al.,
ingestão do fruto, evoluindo para anúria 2009). Acredita-se que seja esta toxina a
(GWALTNEY-BRANT et al., 2001). causadora das intoxicações por abacate nos
Na urinálise podem ser observados animais quando ingerida em grande
proteinúria, glicosúria e hematúria, mas quantidade (BUORO et al.,1994). A dose letal
raramente cristalúria. Pode-se observar não é conhecida e seu efeito é variável nas
também elevação de glicose, cálcio, fósforo e diferentes espécies (KOVALKOVIČOVÁ et al.,
enzimas do fígado e pâncreas em alguns cães 2009).
(GWALTNEY-BRANT et al., 2001). O
prognóstico é reservado nos casos de lesão Mecanismo de ação
renal (GWALTNEY-BRANT et al., 2001; A persin pode causar necrose do
CAMPBELL, 2007). epitélio da glândula mamária e do miocárdio.
Entretanto, o mecanismo tóxico permanece
Tratamento desconhecido (HANDL, IBEN, 2010).
Deve ser realizada a êmese se a
intoxicação for recente, caso isso não seja Sinais Clínicos
possível pode ser instituída a lavagem De um modo geral observa-se edema
gástrica. Tratamento suporte com pulmonar e efusão pleural, causando
fluidoterapia e avaliação do débido urinário, dificuldade respiratória e morte por anóxia
caso não tenha produção pode ser necessário dentro de 24 horas após a ingestão . Também
pode-se encontrar efusão pericárdica

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(BUORO et al.,1994). Além desta toxina, o ingestão de frutas podres (VAN


alto teor de gordura presente no abacate WUIJCKHUISE; CREMERS, 2003).
também pode ser prejudicial, causando
pancreatite (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Mecanismo de ação
Animais intoxicados por abacate O mecanismo de ação sobre o SNC está
também podem apresentar irritação relacionado, em parte, a alterações na
gastrointestinal, vômito e diarréia (BUORO et permeabilidade da membrana celular dos
al.,1994). axônios e sua provável ação facilitadora de
sinapses pelo neurotransmissor ácido gama-
Tratamento aminobutírico (GABA) (VALENTINE, 1990;
Não há tratamento específico, deve ser RICHARDSON, 2006).
instituído o tratamento sintomático e de O álcool aumenta a inibição sináptica
suporte (Andrade, 2011). mediada pelo GABA e pelo fluxo intracelular
de íons cloreto (VALENTINE, 1990;
Álcool RICHARDSON, 2006). Esse efeito do álcool e
As bebidas alcoólicas contêm etanol, outras ações sedativas e motoras são inibidas
composto químico que causa depressão de pela bicuculina, um antagonista específico
SNC e sistema respiratório (RICHARDSON, dos receptores GABAérgicos (VALENTINE,
2006). O etanol é rapidamente absorvido 1990). O álcool atua também sobre outros
sistemicamente, sendo importante procurar neurotransmissores além do GABA no
atendimento médico veterinário imediato. sistema adrenérgico, fazendo com que
Intoxicações graves têm sido relatadas aumentem a síntese e a liberação de
quando bebidas alcoólicas são fornecidas noradrenalina; e no sistema opióide,
como uma brincadeira aos cães, que não diminuindo a ligação das encefalinas aos
toleram o álcool, mesmo em pequenas receptores enquanto aumenta os níveis de
quantidades (VAN WUIJCKHUISE; CREMERS, beta-endorfinas (VALENTINE, 1990).
2003).
O etanol ou álcool etílico é o tipo de Sinais clínicos
álcool mais comum. Está contido nas bebidas O álcool afeta rapidamente o SNC,
alcoólicas, é usado para limpeza doméstica e causando nos seres humanos sedação,
também como combustível para automóveis diminuição da ansiedade, ataxia, prejuízo da
(VALENTINE, 1990). A intoxicação nos cães capacidade de julgamento e desinibição do
por etanol também foi relatada após a comportamento (OGA, 2003). Os sinais de

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intoxicação incluem maior grau de sedação, Portanto, de uma forma geral, o quadro
depressão, letargia, fraqueza, andar clínico apresentado é o de diarréia,
cambaleante e hipotermia (VALENTINE, 1990; semelhante ao que ocorre com seres
OGA, 2003). Nos animais, altas doses humanos que possuem intolerância a lactose
promovem ataxia, redução dos reflexos, (GUILFORD, 1994; GASCHEN; MERCHANT,
alterações comportamentais, acidose 2011). Deste modo, a retirada da
metabólica, excitação ou depressão, administração do leite ou ingestão de
diminuição da frequência respiratória e derivados é essencial para que não ocorra o
parada cardíaca podendo chegar à morte, quadro de diarréia e desidratação
assim como nas pessoas (OGA, 2003, VAN secundariamente. Nos casos mais graves de
WUIJCKHUISE; CREMERS, 2003). No entanto, intoxicação por leite a realização de
os cães possuem uma taxa metabólica fluidoterapia como suporte deverá ser
elevada, sendo mais suscetíveis à intoxicação cogitada (GUILFORD, 1994).
(RICHARDSON, 2006).
Tratamento
Tratamento O tratamento é a terapia suporte e
Devido a depressão do sistema nervoso retirada da fonte de lactose (Andrade, 2011).
central a êmese não é indicada pois aumenta
o risco de aspiração. O uso de carvão ativado Terapêutica
não tem sucesso pois o cão não adsorve bem O tratamento para as intoxicações por
o álcool e a lavagem gástrica, apesar de alimentos inclui suporte agressivo com
pouco eficaz, é indicada em caso de ingestão fluidoterapia, devendo-se realizar medidas
de grandes quantidades (GFELLER, de descontaminação, como indução do
MESSONNIER, 2006). vômito ou realização de lavagem gástrica até
Leite duas horas após a ingestão da substância e a
Estudos realizados mostram que tanto administração de carvão ativado, para
os cães como os gatos adultos não produzem reduzir a absorção do agente (VIANA, 2007;
lactase, enzima degradadora da lactose, KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). Ao mesmo
sendo esta presente apenas nos filhotes tempo, deve-se visar à estabilização dos
(GASCHEN; MERCHANT, 2011). parâmetros do paciente. A terapia de suporte
objetiva manter a homeostase e facilitar a
Sinais clínicos eliminação do agente tóxico, com
fluidoterapia e diurese forçada com

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furosemida; tratamento taquiarritmias se havendo a necessidade de fornecer aos


necessário, tratamento de desequilíbrios animais quaisquer elementos destinados à
eletrolíticos, principalmente a hipocalemia alimentação humana.
que pode ocorrer a partir de vômitos
prolongados (RICHARDSON, 2006; VIANA, CONCLUSÃO
2007). Neste caso também é recomendada a O aumento considerável de
administração de antieméticos, como intoxicações alimentares nos animais de
metoclopramida ou Cerenia®(maropitnat) companhia se deve ao fato destes estarem
(VIANA, 2007). Evitar administração mais próximos a seus donos, e desta
concomitante de corticosteróides perante maneira, compartilharem a mesma
intoxicações por café ou chocolate, pois estes alimentação. O mercado oferece ao seu
fármacos podem interferir na excreção de público uma gama de produtos específicos,
metilxantinas (KOVALKOVIČOVÁ et al., 2009). que muitas vezes imitam os alimentos de
É recomendado o uso de antioxidantes consumo humano e são rigorosamente
(vitamina E e ácido ascórbico) como balanceados, justamente para que não
prevenção da formação de corpúsculos de ocorra nenhum mal à saúde animal.
Heinz e dano oxidativo nos gatos, quanto
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