Você está na página 1de 8

' • • / • ' •

^ PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO .

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO


ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA
REGISTRADO(A) SOB N°

ACÓRDÃO IIIIIIIIIIIIHIIIIIIIIM
*02900757*

Vistos, relatados e discutidos estes autos de


Apelação n° 992.08 .'025563-8, da Comarca de São Paulo,,
em que são apelantes SUL AMERICA CAPITALIZAÇÃO S/A e
SUL AMERICA SEGUROS DE VIDA E PREVIDÊNCIA S/A sendo
apelado BRASILINO ERNESTO SCIVOLETTO.

ACORDAM, em 35 a 'Câmara de Direito Privado do


Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte- ,\
decisão: "PROVERAM O RECURSO DA ESTIPULANTE, NEGANDO-
SE AO DO SEGURADOR. V.U.", de conformidade com o voto
dof Relator, que integra este acórdão. ,

O julgamento teve a , participação dos


Desembargadores. MELO BUENO .-(Presidente) e MANOEL
JUSTINO BEZERRA' FILHO.
\

São Paulo, 29 de março de 2 0 W .

CLÓVIS CASTELO
RELATOR ,
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO

Tribunal de Justiça

APELAÇÃO COM REVISÃO N° 992.08.025563-8


'. /- '

COMARCA • SÃO PAULO - FORO REGIONAL DE PINHEIROS - 4a VARA CÍVEL


APELANTES SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A ;
SUL AMÉRICA SEGUROS DE VIDA E PREVIDÊNCIA S/A
APELADO. ' BRASILINO ERNESTO SCIVOLETTO >

Ementa' ^ •
SEGURO DE VIDA EM GRUPO - CANCELAMENTO UNILATERAL -
MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE SEGURO - BOA-FÉ OBJETIVA
- COBERTURA SECURITÁRIA VIGENTE HÁ ANOS -CLÁUSULA
DE NÃO RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA •=- ABUSIV-IDADE -
VIOLAÇÃO AO CÓDIGO, DE DEFESA DO CONSUMIDOR -
v
v- RECURSO NÃO PROVIDO A possibilidade de não renovação nas
mesma.s condições do pacto anteriormente firmado pelo segurador
deve ser apreciada caso a caso, sot> pena de ser caracterizada como
'abusiva, sobretudo quando a cláusula restringe direito fundamental -
ou de regra sobre direito e não ofereça uma opção ao segurado, pois
r o risco é fator inerente ao contrato de seguro de vida, à luz do art 51
da lei consumensta

i
V O T O N° 16179 y

Relatório.

Em face da sentença, acrescida de embargos |d


declaração, que julgou procedente ação ordinária de manutenção de contrato
de seguro de vida, devendo a seguradora abster-se de rompê-lo
unilateralmente rio decurso do prazo previsto, recorrem-as partes: a Sul
América Capitalização^ S/A (fls. 230) pretende o reconhecimento de sua
ilegitimidade passiva, uma vez que figura nocontrato apenas como estipulante
e mandatária'dos segurados em um contrato que'tem caráter facultativo, assim,
PODER JUDICIÁRIO
SÃOPAULO

Tribunal de Justiça

APELAÇÃO COM REVISÃO N° 992.08.025563-8

não atuando como operadora de seguro, não detém competência para a


execução da obrigação; Sul América Seguros de Vida e Previdência (fls. 242)
pleiteia a reforma da decisão monocrática sob o argumento de que o contrato
teve termo final em 30.6.07, por isso ofertou -contratação de nova apólice
coletiva, não aceita pelo segurado; assevera a não aplicação da Lei n°
6956/98, artigo 13, § único, pois se trata de legislação específica para seguro
saúde e não para seguro de vida e acidentes pessoais, tratando-se estes de
contrato com vigência limitada; esclarece que não interrompeu o contrato, mas
sim demonstrou o desinteresse em renová-lo, com fulcro nas cláusulas 25a e
26a, não existindo, por isso, abusividade, à luz da lei consumerista; reforça que
não há determinação contratual ou legal que lhe imponha a renovação,
pugnando pela jmprocedência do pedido. Há contrarrazões às fls. 269.

r v

Fundamentação.

Consta dos autos que as partes celebraram contrato de


seguro de vida em grupo (apólice n°00.988-010-0), com inclusão aos
1.10.1979, tendo por estipulante Sul América Companhia Nacional de Seguros^
renovado anualmente, com pagamento dó prêmio de R$ 223,02 em maio/07:
porém houve, notificação do segurador pela não renovação do contrato, vencido
em 30.06.07, o qual teve vigência durante 28 anos, com oferta de adesão P ^ f t \
nova apólice a partir de 31.7.07 (fls. 28). / /

De proêmio, acolhe-se a preliminar de ilegitimidade


passiva argüida pela Sul América Capitalização S/A. Na dicção do artigo 21,'
v
§2°, do Decreto-Lei n° 73 de 1966, o estipulante, no seguro facultativo, assume
a posição de mandatário, como nos seguros de vida em grupo, com poderes de
representação dos segurados junto à seguradora, na ensinança de Pedro
3

PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
Tribunal de Justiça

APELAÇÃO COM REVISÃO N° 992.08.025563-8 y

Alvin1. Bem por isso a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem


entendendo que : "O estipulante não é parte passiva em ação de cobrança do
seguro contratado, salvo se praticou ato impedindo a cobertura do sinistro pela
seguradora"2.

Em assim sendo, fica o estipulante excluído da relação


processual è extinto o processo sem apreciação de mérito, de conformidade
com p artigo 267, VI, da lei processual.

Extrai-se dos autos que o segurado, contando com 83


anos de idade, mantinha contrato de seguro de vida em grupo e acidentes
pessoais com a COSESP, tendo por estipulante a NOSSA CAIXA, sendo
notificado pela seguradora que a apólice n° 19300000436, com término de
vigência em 31/3/2006, não mais seria renovada nas mesmas condições
(Coberturas: básica R$ 21.849,40 e invalidez R$ 43.698,80, com prêmio
mensal de R$ 25,31), ofertando, no entanto, nova proposta de renovação com
validade de 1.4.2006 a 31.3.2011, com coberturas básica e adicional de R$
10.924,70 e antecipação de indenização por doença terminal DT de R|>\ -
5.462,35, mediante o prêmio mensal de R$ 121,44, com concessão d 3
desconto no valor de R$ 97,12 no primeiro ano.

• '/ /
Observa-se que por ocasião da primeira contratada©
(1/10/1979, fls. 17) o segurado contava com 55 anos e, por ocasião desta
renovação, com os mesmos valores para cobertura securitária, conta com 83
anos.

1
O Contrato de Seguro - Ed Forense - 3P ed Pg 211.
2
(STJ -Resp 426860-RJ - Rei Mm Carlos Alberto Menezes Direito - 3a T ) Também - RESP 121011 - 240945 -
. 140315
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
Tribunal de Justiça

APELAÇÃO COM REVISÃO N° 992.08.025563-8

O cerne da questão cingerse à possibilidade de a


seguradora, mediante notificação prévia, não renovar a apólice de seguro
contratada, frente à norma constitucional (art. 5o, II, §2°, da CF/88), bem como
artigos 421, 422, 423 e 760 do Código Civil, artigos 3o, §2° e 51, incisos XI e
XV, da Lei n° 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e artigo 15, §3° da
Lei n° 10.741, de 2003 (Estatuto do Idoso).

Como,cediço, o contrato de seguro se conclui com o


pagamento do prêmio (artigo 757), devendo a apólice esclarecer, além dos
riscos assumidos, o prazo de validade, o limite de garantia, as condições gerais
e, especialmente, o que se refere à renovação (art. 760). Havendo
agravamento do risco (artigo 769), tais como mudança de profissão, alteração
da idade do segurado, etc, pode a seguradora efetuar o reajuste do prêmio,
que é avaliado por cálculo atuarial, segundo as condições do risco'assumido;
por isso, as regras interpretativas do contrato de seguro são as mesmas
aplicadas aos contratos em geral, obrigando-sé as partes a agirem com boa-fe\
(art-. 765). -

No entanto, a possibilidade de nãc renovação nasL


A]

mesmas condições do pacto anteriormente firmado pelo segurador deve ser j


apreciada caso a caso, sob pena de ser caracterizada como abusivlay
sobretudo quando a cláusula restringe direito fundamental ou de regra sobre •
direito e não ofereça uma opção ao segurado, pois o risco^é fator inerente ao
contrato de seguro de vida, à luz do art. 51 da lei consumerista.

Conquanto o contrato de seguro de vida seja facultativo,


normalmente pactuado para garantia de beneficiários, não podem as partes se
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO

Tribunal de Justiça

APELAÇÃO COM REVISÃO N° 992.08.025563-8

afastarem dos preceitos fundamentais. Por isso, a jurisprudência .do STJ3 tem
reconhecido a vedação à variação pecuniária para consumidores em
decorrência'de faixa etária em contratos de plano de saúde, por força do art.
15, §3°, da Lei n° 10.741, de 2003 (Estatuto do Idoso), cuja abusividade de
reajustes deverá ser aferida caso a caso, estando a majoração sujeita à
autorização prévia da ANS (art. 35).

Tendo-se em conta o artigo 5o da Lei de Introdução ao


Código Civil segundo o qual, na aplicação-da lei, deve o juiz atender aos fins
sociais a que ela se dirige e às exigências do.bem comum, a cláusula que
limita-a renovação da apólice de seguro contratado deve ser apreciada frente à
nova teoria contratual inserida nc Código Civil de 2002, que contempla quatro
princípios: autonomia privada, boa-fé, justiça contratual e função social do
contrato.4

Pelo artigo 765 da atual lei substantiva, "O segurado e p


segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato
mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como ' da
circunstâncias e declarações a ele concernentes", ou seja, o mesmo conceiti
de,boa-fé exigido para todos os contratos em geral, na dicção do artigo 422
mesmo còdex: "Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão
dó contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé".

N
Baseando-se o contrato de seguro essencialmente na
boa-fé das partes (C.C. artigo 1443), ensina o preclaro Pontes de Miranda que
"...o contrato de seguro é "uberrimae fidei"; o segurador fem de admitir a boa-

3
STJ - Resp 809 329-RJ- Rei Mm Nancy Andnghi - j 25/3/08
Código Civil Comentado-r Nelson Rosenvald - E Manole-1 a ed pg 311
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO

Tribunal de Justiça

APELAÇÃO COM REVISÃO N° 992.08.025563-8

fé è contar com a boa-fé com que o interessado se manifesta"5. Assim também


leciona Rizzatto Nunes: "... a boa-fé objetiva, que está presente no CDC, pode
ser definida, grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever
das partes de .agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a
fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo. Não o equilíbrio
econômico, como pretendem alguns, mas o equilíbrio de posições contratuais,

Apesar da seguradora ter comunicado antecipadamente


ao segurado o desinteresse na renovação do bilhete securitário, embasada nos
artigos 38 e 64, §2°, da Circular SUSEP n° 302/05, revela-se injusta a negativa
da seguradora em renovar a apólice até então vigente, obrigando o segurado a
realizar uma nova contratação com valores extremamente superiores aó
prêmio que vinha sendo pago e sensível redução do capital segurado, sem
oferecer üma opção razoável para renovação, lembrando-se que nem mesmo
demonstra o cálculo atuarial elaborado.para tanto. f\

Errí casos semelhantes, ,a jurisprudência desta Corte verra


reconhecendo a abusividade-da cláusula de não renovação automática ddP
contrato de seguro de vida no seu termo, ante a violação ao Código de Defesa/
do Consumidor, conforme arestos 7\ a qua^ fica, assim, aqui reconhecida.^0
contrato em apreço efetivamente não está submisso à Lei 9656, de 3/06/1998,
a qual dispões sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde.

5
Tratrado de Direito Privado - Ed. Borsoi - vol. 45 - § 4923 - pp 324/326
6
"in" Curso de Direito do Consumidor, Saraiva, 2a edição, 2007, p.127
7
Apelação n. 1128168-0/5 Des)-Ruy.Coppola, Ap. n. 1098961-0/6 (com justificativa) - Des.
Rocha de Souza (32a Câm); Ap. 1137738-0/5 - .Des Antônio Nascimento (34a Câm), Ap. n x
.1016075-0/5- Des'Eros Piceli'(necessário ofertar opção-33 a Câm.)
7

PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO

Tribunal de Justiça

APELAÇÃO COM REVISÃO N° 992.08.025563-8

Dispositivo
Ante o exposto, provê-se o recurso da estípulante,
negando-se ao do segurador.

DES./CLÓVI& CASTELO
Relator

Você também pode gostar