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Pontificia Universidade Catolica de Sao PDF
Pontificia Universidade Catolica de Sao PDF
PUC-SP
MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2009
Banca Examinadora
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Dedicatória
Ao maravilhoso Deus, por poder dizer como o Salmista: O Senhor é meu pastor e nada me
faltará.
À professora e orientadora, Flávia Piovesan, pela luta em prol dos direitos humanos, pelos
valorosos ensinamentos, por me orientar com motivação, afeto e a excelência que lhe é inerente, o que fez
pessoalmente e ainda quando distante não deixou de fazer.
À professora Maria Garcia, por tudo que representa no universo jurídico, pela inestimável
intervenção nesse trabalho, e ainda, por tantos ensinamentos, entre os quais, o de indagar: “Por que não?”.
Ao professor Marcelo Lamy, pelo valor que tem na minha vida acadêmica e pelos
questionamentos e apontamentos dirigidos no findar desse trabalho, instigantes e iluminadores.
Ao professor Vidal Serrano, pela preciosa intervenção nesse estudo trazendo novos horizontes
para a abordagem do tema proposto, em especial, no que tange à dignidade humana.
Ao professor Pádua Fernandes, pelo inspirador trabalho acadêmico, em especial na defesa dos
direitos humanos, e ainda, pelas ricas oportunidades de aprendizados.
Às minhas filhas Beatriz Victória e Sophia, existências divinas em minha vida, que tiveram
nosso convívio amenizado em prol desse estudo. Ao meu esposo, Marcio César Figueiredo, exemplo de
pai e de quanto o homem, numa relação conjugal, pode ser fundamental para o exercício dos direitos de
uma mulher. À minha mãe, Maria Ap. Rosa Cobianchi, minha eterna heroína, vencedora de pesados
obstáculos da vida. Ao meu pai, Dorvalino Cobianchi, exemplo de que estamos sempre aprendendo. Aos
meus irmãos, cunhados e cunhada, Hilda, Rogério, Paula, Ananias, Sidney e Alessandra, pelo amor que
me ofertam e, principalmente, pelos maravilhosos sobrinhos. Aos amados que já não estão entre nós,
cujos nomes estão gravados em nossos corações, por terem me deixado motivação para lutar, mediante a
força do Direito, por um mundo melhor.
Ao Sr. Antonio a Sra. Conceição, exemplos de avós, sem os quais, quase sempre verdadeiros
pais de minhas filhas e, por vezes, de mim mesma, não teria condição para findar esse trabalho. Às tias e
aos tios “corujas”, Simone, Silvia, Adilson e Marco Antonio, pelo carinho de sempre.
Aos meus amigos, na pessoa de Zélia Cardoso Montal e de Josilaine Carmargo Silva, pela fé
que me transmitiram, além da intelectualidade compartilhada. Ao Valter Rodrigues, um poeta e meu
“padinho” de formatura, a sua esposa Fátima, por sempre me lembrar: “Viver e não ter a vergonha de ser
feliz ...” Às primas Kátia e Regina, por se fazerem presentes com suas mensagens providenciais. À Maria
Ap. Alvarez e Flávia Regina Ferraz, amigas sempre lembradas em minhas conquistas. Aos amigos que
por meio de meu esposo se tornaram para mim uma grande família, representados nas pessoas de
Dernival, exemplo de vencedor, de sua esposa Márcia, minha amiga “ótima”, e de Lourival Laurindo de
Castro, com quem muito aprendi entre outros queridos amigos do Fórum Regional I de Santana.
Aos tantos colegas de trabalho, pelo prazer da convivência acadêmica, representados nas
pessoas das professoras Cibele Baldassa Muniz e Antonia Teresinha de Oliveira, grandes amigas.
Aos meus alunos, com os quais sempre aprendo.
À equipe da Escola Superior de Direito Constitucional – ESDC, na pessoa da professora
coordenadora Ivone Alice Hyppólito, onde tudo começou com a força necessária para não parar,
principalmente pelos ensinamentos do professor Jorge Radi Junior.
À Fernanda Bottallo, pela revisão desse trabalho.
Enfim, à Comissão de Bolsas da PUC/SP e à Capes, pelo auxílio sem o qual talvez não
prosseguiria, com a esperança de que muito mais alunos, não raros nesse país que não é pobre, tenham a
mesma oportunidade.
Com efeito, o problema que temos diante de nós não é filosófico,
mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de
saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu
fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou
relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los,
para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam
continuamente violados. [...] – NORBERTO BOBBIO
RESUMO
parameters to the control of constitutionality under the perspective of the current stage
of the Constitutional Right, which interacts with the International Human Rights Law.
The primary responsibility as to the protection of human rights belongs to the States,
which, in favor of these rights and of human dignity, should seek for means to improve
the protection in the internal sphere. The international human rights treaties freely
protection, are committed to adequating the internal law with the international
principles. In Brazil, following other States, the rights deriving from these tools when
incorporated to the internal order are received by the Constitution, integrating it beyond
its text. The Constitution itself determines this way of being, and there is no impediment
in its rigidity since, besides the formality of elaboration process of international human
rights treaties, protecting them from being modified by the legislator, the introduction
of these tools in our order does not intend to modify the constitutional text. The rights
resultant from the international treaties cause positive impact in the internal law order
and should be considered in the interpretation of Constitution since they reaffirm and
reinforce its principles. Therefore, they are parameters for the control of
constitutionality. In the case of eventual conflict it should prevail the most favorable
law, whether it is part of the Constitution or part of the international treaties. Finally, it
is correct to say that the international human rights treaties as parameters for the control
constitutionality control.
SUMÁRIO
Introdução.....................................................................................................................................10
1. OS TRATADOS INTERNACIONAIS NO SISTEMA DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS......................................................................................................................... 16
1.1 A proteção dos direitos humanos após a Segunda Grande Guerra: algumas
considerações...........................................................................................................17
1.2 Tratados internacionais do sistema global de proteção dos direitos humanos........ 24
1.2.1 Declaração Universal de 1948, Pacto Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos de 1966 e Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais de 1966: a Carta Internacional dos Direitos Humanos ............ 26
1.2.2 Outros tratados internacionais do sistema global....................................... 30
1.3 Tratados internacionais do sistema interamericano: Convenção Americana de
Direitos Humanos e outros tratados internacionais ................................................ 37
2. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A INSERÇÃO DO BRASIL NO SISTEMA
INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS............................... 45
2.1 Os princípios fundamentais e a declaração de direitos fundamentais como
propiciadores da inserção do Brasil no sistema internacional de proteção dos
direitos humanos..................................................................................................... 46
2.2 Principais consequências da inserção no sistema internacional de proteção dos
direitos humanos .................................................................................................... 64
2.2.1 Soberania estatal em prol da proteção dos direitos humanos..................... 64
2.2.2 Condição de humanidade como único requisito para ser sujeito de direitos
e sua especificação em casos necessários .................................................. 67
2.2.3 A interdependência e a indivisibilidade dos direitos civis, políticos, sociais,
culturais e ambientais................................................................................. 72
3. A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS
HUMANOS: ELABORAÇÃO, INCORPORAÇÃO, HIERARQUIA E DENÚNCIA ...... 78
3.1 Consideração prévia: distinção entre tratados internacionais de direitos humanos e
os demais tratados internacionais. .......................................................................... 78
3.2 Fases do processo de elaboração dos tratados internacionais: da assinatura à
ratificação. .............................................................................................................. 83
3.3 Incorporação dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento
jurídico interno ....................................................................................................... 91
3.4 Hierarquia normativa constitucional dos tratados internacionais de direitos
humanos.................................................................................................................. 96
3.5 Rigidez constitucional e os tratados internacionais de direitos humanos ............. 109
3.6 Tratados internacionais de direitos humanos e o art. 5º, § 3º da CF/88: a questão
formal dos tratados ratificados anteriormente ...................................................... 113
3.7 Considerações sobre a denúncia: necessária participação do Poder Legislativo e
petrificação dos direitos decorrentes dos tratados internacionais de direitos
humanos.................................................................................................................121
4. A POSIÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO
CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS NO BRASIL ...................... 126
4.1 Inconstitucionalidade como ofensa à supremacia constitucional e o controle da
constitucionalidade a garantir a própria Constituição: os tratados internacionais de
direitos humanos sob essa perspectiva.................................................................. 126
4.2 Impacto dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento jurídico
interno com primazia da norma mais favorável para o caso de conflito de
normas.....................................................................................................................137
interno de cada Estado, para aqueles que concedem hierarquia constitucional a esses
aprimorar o sistema de proteção em âmbito interno, o que encontra acolhida nos ditames
humanos norteou a escolha do tema proposto. Isso porque, mesmo que operante um
sistema internacional de proteção é no campo interno de cada Estado que deve ocorrer a
efetivação de tais direitos. Portanto, todos os meios para se alcançar tal fim devem ser
dignidade humana.
inclusão no rol dos direitos constitucionalmente previstos dos direitos decorrentes dos
possuem status de norma constitucional. Vale dizer, não apenas aqueles aprovados nos
ainda, os tratados internacionais de direitos humanos que forem aprovados sem tal
tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil são recebidos pela
pelo Brasil, o que, para tanto, não encontra obstáculo no superveniente ditame do § 3º
parâmetros, uma vez que os atos inferiores devem se coadunar com os comandos
proteção aos direitos humanos, emergido após a Segunda Guerra Mundial, está
12
se, para tanto, os principais tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil e
OEA.
1988 que primou, de forma especial, pelos direitos fundamentais, o que é perceptível em
humanos (art. 5º, § 2º). Assim, está em consonância com a concepção de direitos
Federativa do Brasil (art. 1º, III), e ainda, em consonância com a prevalência dos
direitos humanos a nortear o Brasil nas suas relações internacionais (art. 4º, II). Ao final
direitos humanos e, ainda que efetivada, não tem o condão de afastar os direitos
favorável ao ser humano para os casos de eventuais conflitos; os direitos veiculados por
Com isso, a evidência de que a posição dos tratados internacionais de direitos humanos
controle preventivo para evitar a inconstitucionalidade e, caso isso não ocorra, não há
material), já que os próprios tratados trazem meio para solucionar casos de conflito, o
controle preventivo e para o controle repressivo, agora com a ampliação do rol das
por afronta ao que dispõe o art. 34, VII, “b”, ou seja, a inobservância dos direitos da
sendo certo que tal cenário impulsiona para um novo estudo direcionado às minúcias do
processo constitucional.
da Introdução ao Estudo do Direito e da Teoria Geral do Estado. Além das matérias dos
proteção dos direitos humanos no âmbito interno dentro do que permite o direito do
15
direta por não pretender dizer com outras palavras o que os mestres já disseram com as
direitos, cujas consequencias são suportadas, em última análise, por seus cidadãos. Para
tanto, necessário que todos os operadores do direito atentem para o tema proposto.
DIREITOS HUMANOS
Este primeiro capítulo tem por fim evidenciar a existência do sistema internacional
de proteção dos direitos humanos surgido após a Segunda Grande Guerra, especificamente
de proteção dos direitos humanos, entre eles o Brasil. Portanto, a ênfase será para os
pátrio, com destaque para as disposições pertinentes ao dever dos Estados-partes em adequar
o ordenamento jurídico interno a fim de cumprir o que ratificaram por de livre vontade e de
boa-fé.
1
COMPARATO, Fabio Konder. Afirmação histórica dos direitos humanos. 5ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p.
56-57.
17
1.1 A proteção dos direitos humanos após a Segunda Grande Guerra: algumas
considerações
proteção marcado pela proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.2
A partir de então fica patente a busca pela proteção do indivíduo para além dos Estados,
No capítulo das garantias da comitas gentium, aventadas por Hannah Arendt no seu
artigo de 1949, cabe mencionar preliminarmente a substituição, em matéria de
direitos humanos, do princípio de proteção diplomática, baseado no exercício de
competência tutelar dos Estados, pelo da proteção internacional, que busca tutelar os
direitos dos indivíduos qua indivíduos e não enquanto nacionais de qualquer Estado.
É por essa razão que as Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos,
posteriores à II Guerra Mundial, buscam ir além dos interesses específicos dos
Estados, criando garantias coletivas. Estas procuram estabelecer obrigações
objetivas em matéria de direitos humanos, que são vistas e percebidas como
necessárias para a preservação da ordem pública internacional. Daí o esforço do
Direito Internacional Público de tutelar os direitos dos ‘não-cidadãos’, no contexto
mais amplo do princípio de proteção internacional.3
e fazem parte de uma pauta comum que se desenvolve muito além do âmbito local. Norberto
Bobbio, valendo-se das categorias tradicionais do direito natural e do direito positivo, leciona
descrito:
2
Fruto da Comissão de Direitos Humanos da ONU, a Declaração Universal de Direitos Humanos foi proclamada
em 10 de dezembro de 1948 pela Resolução nº 217.
3
LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos. Um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São
Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 154-155.
18
campos a busca é a mesma, pela efetiva proteção dos direitos humanos. Portanto, entre os
diversos campos em que se projetam tais direitos deve haver harmonia, o que se alcança com
o necessário e possível diálogo. Entre os vários assuntos possíveis desse diálogo, cita-se
entre eles, filósofos e juristas, vêm de longa data preocupando-se com a questão da
Genaro R. Carrió trata dos problemas conceituais. Inicia o autor com referência ao
filósofo político Carlos Santiago Nino5, referindo-se também ao filósofo argentino Eduardo
4
Op. cit., p. 30.
5
Autor de “Ética y Derechos Humanos”, considerada pelo autor “una de las obras filosoficamente más serias y
profundas” que conhece sobre o tema naquele idioma. “Ya hemos visto que, según Nino, los derechos humanos,
previa a su consagración por el derecho positivo, sólo pueden ser vistos como derechos de natureza moral, en
cuanto su fundamento último no se halla en aquél. Una vez consagrados por este valen a su respecto las
seguientes enunciaciones: a) Configuran una familia central dentro del área de prerrogativas y pretensiones que
los juristas agrupan bajo el concepto general de ‘derechos subjetivos’ o, en inglés ‘rights’. [...] b) A diferencia de
lo que ocurre con los derechos subjetivos em general, los derechos humanos exhiben como una de sus calidades
la de ser irrenunciables. La autorización del titular no justifica ni convalida las transgresiones a ellos. C) Por lo
menos en el campo de la tutela nacional o estatal de los derechos humanos – por oposición al de la novísima
protección iternacional de ellos – se admite hoy que no sólo puede violarlos el Estado sino otros grupos humanos
no estatales.” (CARRIÓ, Genaro R., 1990, p. 19-20)
6
segundo o autor, “ha ofrecido una distinta justificación de los derechos humanos, seductoramente más sencilla
que la de Nino”
19
Nino siempre podría responder a Rabossi que la respuesta de este último no oblitera
la cuestión, siempre abierta, de cómo se justifican esos textos de derecho
internacional positivo, pues no es ocioso buscar tras de ellos la justificación última
de prerrogativas humanas que esos textos se han limitado a ‘positivizar’. Y Rabossi
podría contestar a Nino que no es necessario meterse en honduras filosóficas de
discutible acierto cuando hay textos supraestatales que alcanzan la misma finalidad.
¿Para qué bajar al sótano em busca de oscuras raíces metafísicas si todo queda
justificado a la plena luz del día, viendo simplemente qué ha ocurrido en la escena
normativa internacional durante los últimos cincuenta años em materia de
consagración y protección internacional de los derechos humanos?
resumo ao final da obra, que não se pronunciou sobre uma ou outra solução, deixando a
decisão para o leitor. Pois bem, para o fim desse estudo, tendo em vista a internacionalização
Embora, no estágio atual, a busca seja pela proteção de tais direitos e não mais pela
sua justificação, vale salientar que a concepção de direitos humanos9 universais a qual
7
CARRIÓ, Gernaro R. Los derechos humanos y su proteccion. Distintos tipos de problemas. Buenos Aires:
Abeledo-Perrot, 1990,p. 12,21-23,67.
8
Op. cit.,p. 25-6.
9
Quanto à definição de Direitos humanos, Celso D. de Albuquerque Mello nos traz alguns autores: “Ricardo
Lobo Torres afirma que os direitos humanos se caracterizam por serem ‘preexistentes à ordem positiva,
imprescritíveis, inalienáveis, dotada da eficácia ‘erga omnes’, absolutos e auto-aplicáveis’. Na mesma linha de
raciocínio está Lauterpacht. Perez Luño fornece uma definição bastante completa: ‘é um conjunto de faculdades
e instituições da dignidade, a liberdade e igualdade humana, as quais devem ser reconhecidas positivamente
pelos ordenamentos jurídicos a níveis nacional e internacional’. Para Ingo Wolfgang Sarlet direitos fundamentais
20
direciona o presente estudo não se trata de uma concepção estática, mas sim dinâmica, uma
Carvalho Ramos:
pressuposto como “ponto de partida”11. Nesse sentido também Paulo klautau Filho em artigo
são os direitos ‘reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado estado’.
Salienta ainda este autor que eles têm relação com os textos de DI e que eles não se confundem com o direito
natural, porque já foram positivados. Podemos adotar como conceito dos direitos humanos o de Louis Henkin:
‘Direitos Humanos constituem um termo de uso comum mas não categoricamente definido. Esses direitos são
concebidos de forma a incluir aquelas ‘reivindicações morais e políticas, que, no consenso contemporâneo, todo
o ser humano tem o dever de ter perante sua sociedade ou governo’,reivindicações estas reconhecidas como ‘de
direito’ e não apenas por amor, graça ou caridade’. Desejo apenas mencionar que os direitos humanos só têm
uma saída, isto é, se expandirem em todos os sentidos. Chama-se esta tendência de ‘efeito Cliquet’ que é uma
expressão do alpinismo em que o alpinista só pode fazer um movimento, que é ir para cima (Theresa Rachel
Couto Correia)” (Curso de direito internacional público. 15ª ed. 1º vl. Rio de Janeiro. São Paulo. Recife:
Renovar, 2004, p. 813).
10
RAMOS. André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. Análise dos sistemas de apuração
de violações dos direitos humanos e a implementação das decisões no Brasil. São Paulo: Renovar, 2002, p. 11-
13.
11
Flávia Piovesan ao tratar do Universalismo e relativismo cultural evidencia o posicionamento dos seguintes
autores: “Nesse debate, destaca-se a visão de Boaventura de Sousa Santos, em defesa de uma concepção
multicultural de direitos humanos, inspiradas no diálogo entre as culturas, a compor um multiculturalismo
emancipatório. [...] No mesmo sentido, Joaquín Herrera Flores sustenta um universalismo de confluência, ou
seja, um universalismo de ponto de chegada, e não de ponto de partida. [...] (Direitos humanos e o direito
constitucional internacional.São Paulo: Saraiva, 2006, p. 147).
21
Sob tal concepção, o sistema internacional de proteção dos direitos humanos está
Universal de 1948, a qual considera a dignidade humana como inerente a todo ser humano14.
conhecida como a Lei dos Tratados, traz o seguinte, em seu art. 2o:
12
KLAUTAU FILHO, Paulo. Universalismo versus relativismo cultural. Legitimidade da concepção
cosmopolita dos direitos humanos. In: A Contemporaneidade dos Direitos Fundamentais. Revista Brasileira De
Direito Constitucional (RBDC). Julho/Dezembro 2004. p. 89.
13
Para Flávia Piovesan: “Tal sistema é integrado por tratados internacionais de proteção que refletem, sobretudo,
a consciência ética contemporânea compartilhada pelos Estados, na medida em que invocam o consenso
internacional acerca de temas centrais aos direitos humanos, na busca da salvaguarda de parâmetros protetivos
mínimos – do ‘mínimo ético irredutível’” (PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e justiça internacional. São
Paulo: Saraiva, 2006, p. 13).
14
Conforme a primeira consideração da Declaração Universal “Considerando que o reconhecimento da
dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento
da liberdade, da justiça e da paz no mundo;”
22
tratados15, cita-se o conceito de Francisco Rezek para quem: “Tratado é todo acordo formal
efeitos jurídicos”.16
não há dúvidas de que se trata de um acordo formal de vontades entre muitos Estados, o que
se fez para produzir efeitos. Observe-se que a Convenção de Viena trouxe ao final da redação
“qualquer que seja sua denominação específica”, o que se reforça com as lições de Grandino
Variada é a denominação que tem sido dada aos acordos internacionais: tratado,
convenção, capitulação, artigos, protocolo, acordo, ‘modus vivendi’, ato, estatuto,
‘convenant’, carta, pacto, constituição, declaração, troca de notas, entendimento,
concordata, ajuste, compromisso, ata, convênio, memorando e regulamento. Sob o
prisma do Direito Internacional, a denominação escolhida não tem influência sobre o
caráter do instrumento. A prática, por seu turno, demonstra que, via de regra, cada
termo não significa modalidade determinada de compromisso internacional, sendo
sua utilização livre e muitas vezes não muito lógica.17
Vale mencionar que alguns Estados fazem menção à Declaração de 1948 em suas
reformas de 1994 (art. 75, n. 22), inclusive essa última lhe concedendo expressamente status
15
Segundo Celso de Albuquerque Mello: “A matéria que devemos mencionar agora é a de se saber quem pode
concluir tratados: estados, organizações internacionais, Santa Sé, beligerantes, insurgentes, Comitê Internacional
da Cruz Vermelha, movimentos de libertação nacional, etc. Esta enumeração não pretende ser exaustiva, porque
as Constituições, ou até mesmo tratados, podem conceder o ‘treaty-making power’ a outras coletividades. Assim
a própria Constituição do Brasil autoriza os estados-membros da federação, municípios e o Distrito Federal a
realizarem operações externas de natureza financeira e estas são, muitas vezes, realizadas sob a forma de tratados
(acordos internacionais)” (Direito constitucional internacional, 2ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 275).
16
REZEK, Francisco. Direito internacional público. 10ª ed., São Paulo: Saraiva, p. 14.
17
RODAS, João Grandino. Tratados internacionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991, p. 11.
23
como outros direitos, agora sejam veiculados em instrumentos sobre os quais não há dúvidas
Nesse caminho aberto pela Declaração Universal, os tratados internacionais vão além
ao trazerem novos direitos, e ainda, uma nova dimensão aos direitos já declarados,
demonstrando assim a historicidade de tais direitos20. Nesse sentido, podem apontar, a título
relativos ao meio ambiente. Quanto aos primeiros, adianta-se que tem relação com a mais
18
Op. cit., p. 34.
19
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de direito internacional dos direitos humanos. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999, p. 22.
20
Conforme Norberto Bobbio: “[...] Sabemos hoje que também os direitos ditos humanos são o produto não da
natureza, mas da civilização humana; enquanto direitos históricos, eles são mutáveis, ou seja, suscetíveis de
transformação e de ampliação.[...]. Não é preciso muita imaginação para prever que o desenvolvimento da
técnica, a transformação das condições econômicas e sociais, a ampliação dos conhecimentos e a intensificação
dos meios de comunicação poderão produzir tais mudanças na organização da vida humana e das relações
sociais que criem ocasiões favoráveis para o nascimento de novos carecimentos e, portanto, para novas
demandas de liberdade e de poderes (Op. cit., p. 32-33).
24
sobre a qual se mencionará oportunamente. Já quanto ao meio ambiente, basta lembrar que da
direitos do homem nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos
positivos particulares, para finalmente encontrarem sua plena realização como direitos
positivos universais”, vale mencionar que o advento dos direitos positivos universais vem
Unidas seguindo os propósitos expressos em sua Carta de 194521. Para tanto, vários órgãos
21
Nos termos do art. 1º da Carta das Nações Unidas: “Os propósitos das Nações unidas são: 1. Manter a paz e a
segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e
25
quando necessários.
alcançou um de seus intentos com a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 que,
seguida de dois tratados internacionais de 1966, compõem a Carta Internacional dos Direitos
reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade
com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que
possam levar a uma perturbação da paz; 2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito
ao princípio de igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao
fortalecimento da paz universal; 3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas
internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos
direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e 4.
Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns. (Carta
assinada em São Francisco, a 26 de junho de 1945, após o término da Conferência das Nações Unidas sobre
Organização Internacional, entrando em vigor a 24 de Outubro daquele mesmo ano. Ratificada pelo Brasil em
12/09/1945, com depósito em 21/09/1945). (Disponível em: http://www.direitoshumanos.usp.
br/counter/Onu/Carta_Geral/carta_geral.html. Acesso em: 20/07/2007).
22
Cumpre mencionar que, atualmente, se reconhecem algumas críticas dirigidas à ONU diante dos seus
propósitos, que há crise quanto, inclusive, à sua legitimidade e operatividade, a reclamar por uma necessária
revisão para sua adequação e atualização. Contudo, não atine a esse trabalho tratar de tais razões, ao contrário,
evidencia-se que tais críticas, ainda que reais, não prejudicam o intento desse estudo já que embora todos os
problemas, ainda os mais relevantes, não tenham redundado e espera-se que não venham a redundar, na inércia
do sistema emergido de tal organização. Segundo Celso D. de Albuquerque Mello: “A posição de um
internacionalista do terceiro mundo é extremamente difícil. Sabe-se que respeito aos direitos humanos é matéria
de civilização. É um lugar comum. Ainda não chegamos a este nível. Por outro lado, não se pode desprezar a
dignidade do homem. Somos ardorosos defensores dos direitos humanos, mas tememos que eles sirvam de
pretexto para a violação da nossa soberania. A própria ONU é, em 1994, dominada pelos EUA deixando de ser
uma organização imparcial. A OEA com o seu célebre ‘vício de origem’ sempre foi um braço dos EUA. De
qualquer modo, mesmo conhecendo os riscos, optamos pelos direitos do homem como norma de ‘jus cogens’.
Pode-se lembrar que entre tais direitos, está o direito à educação e se este se realizar os direitos do homem se
tornarão também realidade” (MELLO, Celso D. Albuquerque. Responsabilidade internacional do estado. Rio de
Janeiro: Renovar, 1995, p. 159).
26
1.2.1 Declaração Universal de 1948, Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
de 1966 e Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de
1966: a Carta Internacional dos Direitos Humanos.24
declaração solene e formal dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais, a
Universal de 1948 é desprovida de força jurídica vinculante, nas lições de Fábio Konder
Comparado:
23
ACCIOLY, Hildebrando. SILVA, G. E. do Nascimento. CASELLA, Paulo Borba. Manual de direito
internacional público. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 451.
24
“com a adoção dos Pactos das Nações Unidas (e Protocolo Facultativo) sobre Direitos Humanos, em 1966,
compreendendo medidas de implementação, o projeto original de uma Carta Internacional de Direitos Humanos,
iniciado com a Declaração Universal de 1948, completou-se” (TRINDADE, Antônio Augusto cançado. A
proteção internacional dos direitos humanos. Fundamentos jurídicos e instrumentos básicos. São Paulo:
Saraiva, 1991, p. 1). “A partir da elaboração desses pactos se forma a Carta Internacional dos Direitos Humanos,
International Bill of Rights, integrada pela Declaração Universal de 1948 e pelos dois pactos internacionais de
1966 [...]” (PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional, p. 152).
27
Para esse estudo, a Declaração Universal de 1948, ainda que não assuma a forma de
tratado internacional, apresenta força jurídica obrigatória e vinculante, na medida em
que constitui a interpretação autorizada da expressão ‘direitos humanos’ constante
dos arts. 1º (3) e 55 da Carta das Nações Unidas. Ressalte-se que, à luz da Carta, os
Estados assumem o compromisso de assegurar o respeito universal e efetivo aos
direitos humanos. Ademais, a natureza jurídica vinculante da Declaração Universal é
reforçada pelo fato de – na qualidade de um dos mais influentes instrumentos
jurídicos e políticos do século XX – ter-se transformado, ao longo dos mais de
cinquenta anos de sua adoção, em direito costumeiro internacional e princípio geral
do direito internacional.26
conceito de tratado internacional, já que se trata de um acordo formal celebrado entre Estados
para produzir efeitos jurídicos. Portanto, descumprir a Declaração Universal é o mesmo que
sua condição de documento inicial e norteador dos demais tratados internacionais, e ainda,
Quanto aos dois Pactos de 1966, ampliam o rol de direitos da Declaração Universal
de Direitos Humanos de 1948, dessa vez com a indiscutível força jurídica vinculante. Nada
Embora os dois Pactos sejam em certo sentido mais importantes do que a Declaração
de 1948, por serem de cumprimento obrigatório para os países que os ratificaram,
pode-se afirmar que a Declaração Universal tem mais peso, pois a maioria dos
25
COMPARATO, Fabio Konder. Afirmação histórica dos direitos humanos. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.
227.
26
Op. cit., p. 140
28
princípios que consagra são tidos como de direito internacional costumeiro. Passo
adiante será dado ao serem reconhecidos como normas cogentes de direito
internacional geral.27
partir da Declaração Universal de 1948, é composta por duas séries de direitos. A primeira
2 do referido Pacto:
Diante de tal redação é possível afirmar que, primeiramente, espera-se que haja
internamente medidas necessárias para se alcançar o que fora tratado e, caso isso não seja
providências necessárias. Vale dizer, em suma, adequar o ordenamento jurídico interno para
firmaram sob respeito à soberania estatal, redação essa também encontrada em muitos outros
tratados internacionais.
27
ACCIOLY, Hildebrando. SILVA, G. E. do Nascimento. CASELLA, Paulo Borba. Manual de direito
internacional público. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 455-456.
29
B) Direito à adoção, por parte do Estado, de medidas, tanto por esforço próprio
por todos os meios apropriados, o pleno exercício dos direitos previstos no Pacto
com a imediata adoção das medidas para tanto. E mesmo no que tange a tal progressividade,
pertinentes aos direitos humanos, como se abordará oportunamente a fim de evidenciar que
resguardadas, certamente, as reais dificuldades para tanto. Nesse sentido, vale ainda
mencionar que, um estudo comparativo entre os dois Pactos constatará certos direitos
presentes em ambos os instrumentos, ainda que cada qual a seu modo, a exemplo do direito
(art. 28) para o desempenho de funções previamente descritas, entre as quais, a análise dos
Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos28 trouxe a grande
Geral da ONU a quem cabe remeter ao Conselho Econômico e Social, que por sua vez criou o
Comitê sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais30 para análise desses relatórios.
criação de órgãos e mecanismos próprios, o que fugiria ao escopo desse estudo adentrar em
tal assunto31. Aqui importa mencionar que, como esses tratados, muitos outros também
contam com a previsão de órgãos e mecanismos de monitoramento para alcance dos objetivos
convencionados.
28
“Adotado pelas Nações Unidas, em Nova York, em 16.12.1966. Entrada em vigor internacional em
23.03.1976” (MAZZUOLI, Valério de Oliveira – Org – Coletânea de direito internacional. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2005, p.596).
29
Certamente é a sistemática mais bem-vinda, embora, apenas os Estados que o ratificaram poderão ter contra si
eventual denúncia contida em petições individuais. Não é ainda o caso do Brasil já que não é parte em tal
protocolo, bem como ainda não o é no Segundo Protocolo ao Pacto atinente à abolição da pena de morte, o que
pode acontecer a qualquer momento e há notícia de isso ocorrerá ainda no ano corrente (2008).
30
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o direito internacional, cit. p. 171.
31
Cresce a cada dia a lista de autores que voltam atenção para o estudo da operatividade do sistema internacional
de proteção dos direitos humanos. Assim, para um melhor estudo nessa direção cita-se os seguintes: Antônio
Augusto Cançado Trindade, Fábio Konder Comparato, Flávia Piovesan, André de Carvalho Ramos e Valério de
Oliveira Mazzuoli.
32
Como já mencionado, a especificação do sujeito de direitos será abordada no próximo capítulo como uma das
consequências advindas para os Estados inseridos no Sistema internacional de proteção dos direitos humanos.
31
disposição:
pelo Brasil em 20.06.2002. Com 128 artigos distribuídos em oito capítulos, o Estatuto de
Roma cria a justiça penal internacional, inexistente em âmbito regional. O art. 12 do Estatuto
33
“Artigo VI – As pessoas acusadas de genocídio ou de qualquer dos outros atos enumerados no art. III serão
julgadas pelos tribunais competentes do Estado cujo território foi o ato cometido ou pela corte penal
internacional competente com relação às Partes Contratantes que lhe tiverem reconhecido a jurisdição”.
(PIOVESAN, Flávia, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, p. 384).
32
referidos no art. 5º34. Jurisdição essa que, nos termos do art. 26, não alcança os menores de 18
anos.
Com 33 artigos, após definir “tortura”, traz uma série de compromissos35 assumidos
petições individuais.
34
De acordo com o art. 5º são os seguintes crimes: crime de genocídio, crimes contra a humanidade; crimes de
guerra; crimes de agressão.
35
Alguns compromissos: a não invocação de circunstâncias excepcionais para justificar a tortura; a não expulsão,
devolução ou extradição de uma pessoa para outro Estado quando diante de razões que aponte que será ela
torturada; assegurar o ensino e a informação sobre a proibição da tortura no treinamento do pessoal civil ou
militar encarregado da aplicação da lei, do pessoal médico, dos funcionários públicos e de quaisquer outras
pessoas que possam participar da custódia, interrogatório ou tratamento de qualquer pessoa submetida a qualquer
forma de prisão, detenção ou reclusão; direito à reparação e indenização à vítima. Vale ressaltar que o artigo 1º
define “tortura” e vai além ao mencionar quem pode praticar tal ato. Para Flávia Piovesan: “A definição de
tortura envolve, assim, três elementos essenciais: a) a inflição deliberada de dor ou sofrimentos físicos ou
mentais; b) a finalidade do ato (obtenção de informações ou confissões, aplicação de castigo, intimidação ou
coação e qualquer outro motivo baseado em discriminação de qualquer natureza); c) a vinculação do agente ou
responsável, direta ou indiretamente, com o Estado (Op. cit., p. 195-196) .
33
18.12.2002. Composto por 26 artigos, seu objetivo está no art. 1º, seguido da previsão de
1988, a Convenção conta com 30 artigos. Após definir “discriminação contra a mulher” arrola
no art. 2º:
Mulher para receber e considerar comunicações apresentadas de acordo com o seu art. 2º.
Prevê ainda a possibilidade de investigação, inclusive com visita local, quando consentida
Com 25 artigos, a Convenção define discriminação racial, dispõe que não serão
necessária para proporcionar igual gozo ou exercício de direitos humanos e, entre outras
interestaduais e, em cláusula facultativa (aceita pelo Brasil), das petições por parte de
em 24.09.1990.
Com 54 artigos, a Convenção dispõe que se entende por criança todo ser humano
menor de 18 anos cujos direitos ali previstos deverão ser respeitados e assegurados pelos
Estados-partes sem discriminação de qualquer tipo e com primazia dos interesses da criança
à Convenção.
27.01.2004.
das Pessoas com Deficiência, bem como seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova
A Convenção conta com 50 artigos e traz seu propósito no art. 1º, nos seguintes
termos:
art.39.
36
No mesmo dispositivo há concepção de pessoas com deficiência: “Pessoas com deficiência são aquelas que
têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com
diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com
as demais pessoas”.
37
receber comunicações.
que se optou por mencionar considerando-os como referenciais. Certamente o rol não é
exaustivo, poder-se-ia mencionar outros instrumentos como, no que tange ao meio ambiente e
ao trabalhador, mas, para o fim desse estudo seria estender sobremaneira e distanciar-se do
bem por isso com grandes progressos reconhecidos quanto aos seus propósitos. A Carta
Africana de Direitos Humanos, a mais recente, tem o diferencial de não separar os direitos
37
Como os sistemas árabe e asiático.
38
civis e políticos dos direitos sociais, culturais e econômicos, portanto, já em consonância com
a visão integral de tais direitos como oportunamente será mencionado, e ainda, como
Brasil em 25.09.1992.
38
Op. cit, p. 403.
39
Segundo Flávia Piovesan: “O propósito da coexistência de distintos instrumentos jurídicos – garantindo os
mesmos direitos – é, pois, no sentido de ampliar e fortalecer a proteção dos direitos humanos. O que importa é o
grau de eficácia da proteção, e, por isso, deve ser aplicada a norma que no caso concreto melhor proteja a vítima.
Ao adotar o valor da primazia da pessoa humana, esses sistemas se complementam, interagindo com o sistema
nacional de proteção, a fim de proporcionar a maior efetividade possível na tutela e promoção de direitos
fundamentais” (PIOVESAN, Flávia. GOMES, Luiz Flávio. (Coords.) O sistema interamericano de proteção dos
direitos humanos e o Direito Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 25-26).
40
Carta da OEA: “Artigo 1. Os Estados Americanos consagram nesta Carta a organização internacional que vêm
desenvolvendo para conseguir uma ordem de paz e de justiça, para promover sua solidariedade, intensificar sua
colaboração e defender sua soberania, sua integridade territorial e sua independência. Dentro das Nações Unidas,
a Organização dos Estados Americanos constitui um organismo regional. A Organização dos Estados
Americanos não tem mais faculdades que aquelas expressamente conferidas por esta Carta, nenhuma de cujas
disposições a autoriza a intervir em assuntos da jurisdição interna dos Estados membros. Artigo 2. Para realizar
os princípios em que se baseia e para cumprir com suas obrigações regionais, de acordo com a Carta das Nações
Unidas, a Organização dos Estados Americanos estabelece como propósitos essenciais os seguintes: a) Garantir a
paz e a segurança continentais; b) Promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o princípio da
não-intervenção; c) Prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução pacífica das controvérsias
que surjam entre seus membros; d) Organizar a ação solidária destes em caso de agressão; e) Procurar a solução
dos problemas políticos, jurídicos e econômicos que surgirem entre os Estados membros; f) Promover, por meio
da ação cooperativa, seu desenvolvimento econômico, social e cultural; g) Erradicar a pobreza crítica, que
constitui um obstáculo ao pleno desenvolvimento democrático dos povos do Hemisfério; e h) Alcançar uma
efetiva limitação de armamentos convencionais que permita dedicar a maior soma de recursos ao
desenvolvimento econômico-social dos Estados membros” (Disponível em: http://www.direitoshumanos.usp.
br/counter/Sistema_inter/texto/carta.htm. Acesso em: 20/07/2007).
39
e garantir o exercício dos direitos e liberdades nela previstos a toda pessoa sob sua jurisdição
e, no art. 2º, o dever de adotar disposições de direito interno, conforme a seguinte redação:
nessa parte, alguns deveres das pessoas; já a segunda parte contém disposições sobre os meios
Importa também ressaltar, como fez Flávia Piovesan com referência a Hector Fiz-Zamudio,
Salvador), ratificado pelo Brasil em 21.08.1996, o qual direciona maior atenção aos direitos
econômicos, sociais e culturais, conforme parte de seu Preâmbulo que passa a transcrever:
41
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e do direito constitucional internacional. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, p.
230.
40
[...] Considerando a estreita relação que existe entre a vigência dos direitos
econômicos, sociais e culturais e a dos direitos civis e políticos, porquanto as
diferentes categorias de direito constituem um todo indissolúvel que encontra sua
base no reconhecimento da dignidade da pessoa humana, pelo qual exigem uma
tutela e promoção permanente, com o objetivo de conseguir sua vigência plena, sem
que jamais possa justificar-se a violação de uns a pretexto da realização de outros;
[...] Recordando que, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos do Homem
e a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, só pode ser realizado o ideal
do ser humano livre, isento de temor e da miséria, se forem criadas condições que
permitam a cada pessoa gozar de seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem
como de seus direitos civis e políticos;
Se o exercício dos direitos estabelecidos neste Protocolo ainda não estiver garantido
por disposições legislativas ou outra natureza, os Estados-partes comprometem-se a
adotar, de acordo com suas normas constitucionais e com as disposições deste
Protocolo, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias para
tornar efetivos esses direitos.
meios de proteção.
com reserva para aplicar a pena de morte em tempo de guerra nos termos do art. 2º do
Protocolo.42
aos tratados do sistema global, outros inovando quanto aos temas abordados. Todos com
42
“Artigo 2. 1. Não será admitida reserva alguma a este Protocolo. Entretanto, no momento de ratificação ou
adesão, os Estados Partes neste instrumento poderão declarar que se reservam o direito de aplicar a pena de
morte em tempo de guerra, de acordo com o Direito Internacional, por delitos sumamente graves de caráter
militar.”
41
mecanismos de monitoramento quanto aos direitos conferidos aos cidadãos e quanto aos
Com 24 artigos, destaca-se aqui o art. 6º referente aos deveres dos Estados-Partes:
Entre os seus 25 artigos, o art. 7º dispõe entre os deveres dos Estados, o seguinte:
A Convenção conta com 35 artigos. No art. 1º, logo após explicitar seu objeto,
dispõe:
Com a primazia dos interesses dos menores busca sua proteção por meio da
em 15.08.2001.
Com 14 artigos, destaca-se o art. III quanto aos compromissos dos Estados-Partes, a
saber:
43
De acordo com o art. VI, para acompanhar aos compromissos assumidos, será
Quanto ao sistema regional interamericano, foram esses os tratados que se optou por
trazer, principalmente para evidenciar que também nesse sistema há o dever, para os Estados-
proteção dos direitos humanos, haja vista que eles não são dicotômicos, mas harmônicos e
Relevante também observar que, frente ao sistema de proteção dos direitos humanos
em âmbito local, os sistemas internacionais são subsidiários. Como lecionado por Flávia
Piovesan:
Cabe atentar que o Direito Internacional dos Direitos Humanos, com seus inúmeros
instrumentos, não pretende substituir o sistema nacional. Ao revés, situa-se como
43
De acordo com Flávia Piovesan: “Logo, os sistemas global e regional não são dicotômicos, mas, ao revés, são
complementares. Inspirados pelos valores e princípios da Declaração Universal, compõem o universo
instrumental de proteção dos direitos humanos, no plano internacional. Diante desse universo de instrumentos
internacionais, cabe ao indivíduo que sofreu violação de direito escolher o aparato mais favorável, tendo em
vista que, eventualmente, direitos idênticos são tutelados por dois ou mais instrumentos de alcance global ou
regional, ou, ainda, de alcance geral ou especial. Vale dizer, os diversos sistemas de proteção de direitos
humanos interagem em benefício dos indivíduos protegidos. [...] O propósito da coexistêcia de distintos
instrumentos jurídicos – garantindo os mesmos direitos – é, pois, ampliar e fortalecer a proteção dos direitos
humanos. [...] (Direitos humanos e o direito constitucional internacional, cit., p. 225-226)
44
A primazia, portanto, é do sistema local, mas que tem de estar em harmonia com o
internacionais, sejam eles de alcance geral ou específico. Tais tratados não se revelam como
eventual meio para se alcançar um fim, mas, sim, como o único meio encontrado com
potencial o bastante – haja vista a força jurídica obrigatória para os Estados – para estruturar
mesmos objetivos, vale lembrar, a que se propõem os instrumentos internos de proteção dos
sobretudo, em âmbito local. Daí a necessária adequação do ordenamento jurídico interno aos
comandos internacionais. Parte-se, então, a tratar, não diretamente da inserção do Brasil nesse
sistema internacional de proteção dos direitos humanos, mas como isso foi possibilitado com
44
Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, p. 153.
2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A INSERÇÃO DO BRASIL NO
HUMANOS
internacional de proteção dos direitos humanos com menção aos principais tratados
internacionais ratificados pelo Brasil. Objetiva-se com esse capítulo ressaltar como a
sistema internacional de proteção. Isso porque a questão dos direitos humanos no Brasil
com o regime autoritário que primava pela arbitrariedade e pelo desrespeito aos direitos
modelo aberto ao sistema internacional de proteção dos direitos humanos, o que vem ao
expor.
de um Estado jurídico que surge com o advento de uma nova Constituição. Quanto ao
termo “Preâmbulo”, conforme Pinto Ferreira, vem do latim, “onde se formou de dois
natureza constitucional, tal entendimento não retira dele a função de, sinteticamente,
e materialmente49, surgindo uma nova ordem jurídica. Nesse sentido, destaca-se, entre
internacional.
novo Estado brasileiro, com os valores sinteticamente expressos no seu Preâmbulo, vem
a ordem internacional, já que, entre os seus dez primeiros artigos (de 70 originários),
48
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 436-437.
49
“[...] fala-se de descontinuidade constitucional quando uma nova ordem constitucional implica uma
ruptura com a ordem constitucional anterior. Neste sentido, existirá uma relação de descontinuidade
quando uma nova constituição adquiriu efectividade e validade num determinado espaço jurídico sem que
para tal se tenham observado os preceitos reguladores de alteração ou revisão da constituição vigente que,
assim, deixa de ser, por sua vez, válida e efectiva no mesmo espaço jurídico. [...] A descontinuidade
material pode traduzir-se não tanto no diferente título de legitimação do poder constituinte mas na ruptura
consciente com o passado no plano dos princípios constitucionalmente conformadores. [...]” (2000, p.
195-197).
48
internacional de direitos humanos (art. 7º); portanto, algo a ser feito desde logo, ou seja,
conhecimento dos princípios jurídicos para o direito. Como lecionado por Carlos Ari
Sundfeld:
intérprete que se orienta por tais comandos maiores, seja tendo em mira sua própria
50
DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 151-152.
51
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. 4ª ed.,São Paulo: Malheiros, 2000, p. 143-
146.
49
alcance determinados por aqueles. Daí que a violação de princípios é mais grave diante
Constituição e por isso se destacam frente aos demais. Mas, não é só. Entre os
José Afonso da Silva, com base em Canotilho, resume que os princípios constitucionais
52
Continua o autor: “o princípio da legalidade, o princípio da isonomia, o princípio da autonomia
individual, decorrente da declaração dos direitos, o da proteção social dos trabalhadores, fluinte de
declaração dos direitos sociais, o da proteção da família, do ensino e da cultura, o da independência da
magistratura, o da autonomia municipal, os da organização e representação partidária, e os chamados
princípios-garantias (o do nullum crimen sine lege e da nulla poena sine lege, o do devido processo legal,
o do juiz natural, o do contraditório entre outros, que figuram nos incs. XXXVIII a LX do art. 5º)
(SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2000, p.97).
Para Gomes Canotilho, constituem-se dos princípios definidores da forma de Estado, dos princípios
definidores da estrutura do Estado, dos princípios estruturantes do regime político e dos princípios
caracterizadores da forma de governo e da organização política em geral”. (Direito constitucional e teoria
da Constituição.4ª ed, Coimbra: Almedina, 2000, p. 96-97).
50
princípios ficariam num plano superior, exatamente pelo caráter estrutural que
Título I, sem prejuízos de outros. Uma leitura do texto constitucional, portanto, deve
passar por essa principiologia, pois é a porta de entrada da Constituição mediante a qual
funções estatais (art. 2º), os objetivos (art. 3º) e, os princípios regentes das relações
Estado53.
Portanto, cada uma das informações trazidas no caput do art. 1º daria ensejo a estudos
53
Para Canotilho: “As obras mais recentes de direito constitucional dedicam um ou mais capítulos ao
estudo dos princípios constitucionalmente estruturantes. Individualizados e caracterizados de forma muito
variada pela doutrina [...], eles designam os princípios constitutivos do ‘núcleo essencial da constituição’,
garantindo a esta uma determinada identidade e estrutura. Possuem, em geral, duas dimensões: (1) uma
dimensão constitutiva, dado que os princípios, eles mesmos, na sua ‘fundamentalidade principal’,
exprimem, indicam, denotam ou constituem uma compreensão global da ordem constitucional; (2) uma
dimensão declarativa, pois estes princípios assumem, muitas vezes, a natureza de ‘superconceitos’, de
‘vocábulos designantes’, utilizados para exprimir a soma de outros ‘superprincípios’ e de concretizações
normativas constitucionalmente plasmadas. (Direito Constitucional p. 349).
54
Nesse sentido artigo de Dircêo Torrecillas Ramos intitulado “A formação da doutrina dos direitos
fundamentais. A forma do Estado e a proteção dos direitos: opção pelo federalismo. In: A
Contemporaneidade dos Direitos Fundamentais. Revista Brasileira De Direito Constitucional (RBDC).
jul./dez. 2004, p.56-68.
55
Conforme Canotilho: “O Estado Constitucional, para ser um estado com as qualidades identificadas
pelo constitucionalismo moderno, deve ser um Estado de direito democrático. Eis aqui as duas grandes
qualidades do Estado constitucional: Estado de direito e Estado democrático. Estas duas qualidades
surgem muitas vezes separadas. Fala-se em Estado de direito, omitindo-se a dimensão democrática, e
alude-se a Estado democrático silenciando a dimensão de Estado de direito. Esta dissociação corresponde,
por vezes, à realidade das coisas: existem formas de domínio político onde este domínio não está
domesticado em termos de Estado de direito e existem Estados de direito sem qualquer legitimação em
termos democráticos. O Estado constitucional democrático de direito procura estabelecer uma conexão
interna entre democracia e Estado de direito. [...]” (Op. cit., p. 93). “O mesmo autor ainda nos traz que:
“Tal como são um elemento constitutivo do estado de direito, os direitos fundamentais são um elemento
básico para a realização do princípio democrático. [...]” (Op. cit., p. 288).
51
isolados. Aqui importa enfatizar que, em uma República Federativa, que se constitui em
Estado Democrático de Direito, o campo para efetivação dos direitos humanos é muito
mais fértil.
dignidade da pessoa humana (art.1º, III), cuja inclusão no texto constitucional de 1988
perspectivas pode ser estudada. Cita-se Uadi Lammêgo Bulos, a fim de evidenciar sua
abrangência:
56
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007, p. 64.
52
que fez, ao lado de outros fundamentos59, entre eles, o da cidadania. Mas a cidadania,
dignidade humana está também em outras partes da Constituição, a exemplo dos artigos
expressamente alguns deles em seu artigo 3º61, não de forma exaustiva, mas os objetivos
57
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 389.
58
Para Ingo Wolfgang Sarlet: “Consagrando expressamente, no título dos princípios fundamentais, a
dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do nosso Estado democrático (e social) de
Direito (art. 1º, inc. III, da CF), o nosso Constituinte de 1988 – a exemplo do que ocorreu, entre outros
países, na Alemanha –, além de ter tomado uma decisão fundamental a respeito do sentido, da finalidade
e da justificação do exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu categoricamente que é o
Estado que existe em função da pessoa humana, e não o contrário, já que o ser humano constitui a
finalidade precípua, e não meio da atividade estatal (Dignidade da pessoa humana e direitos
fundamentais. 5ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 67-68).
59
São os outros fundamentos previstos no art. 4º: os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e, o
pluralismo político.
60
Nas palavras de Flávia Piovesan e Renato Stanziola Vieira: “Se no atual cenário do Direito
Constitucional ocidental, pode-se depreender que a hermenêutica que mais contribui para a efetividade
das Constituições é aquela que privilegia e potencializa a força normativa de seus princípios fundamentais
(a serem levados em conta desde o primeiro vislumbre da norma abstrata, até o momento da decisão dos
casos concretos), imperioso é ressaltar que, dentre eles, com força deontológica predominante, está o
princípio da dignidade da pessoa humana. Aliás, sua importância chega mesmo a transcrever os limites do
positivismo, conforme já restou assentado nesse texto, a respeito da evolução doutrinária relacionada aos
princípios jurídicos. (A força normativa dos princípios constitucionais fundamentais: a dignidade da
pessoa humana. In: Temas de direitos humanos.São Paulo: Max Limonad, 2003, p. 389)
61
Art. 3º “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I- construir uma
sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
53
todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
a relacionar-se internacionalmente são variadas; interessa, aqui, aquela razão que visa à
da humanidade (inc.IX) 63, os quais, sem prejuízo de outros, vêm deixar assente a opção
62
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes
princípios: I- Independência nacional; II- prevalência dos direitos humanos; II- autodeterminação dos
povos; IV- não-intervenção; V- igualdade entre os Estados; VI- defesa da paz; VII- solução pacífica dos
conflitos; VIII- repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX- cooperação entre os povos para o progresso da
humanidade; X- concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a
integração econômica, política, social e cultural dos povos da América latina, visando à formação de uma
comunidade latino-americana de nações.
63
Já no ano da promulgação da Constituição, Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, ao tecer
comentários à Constituição do Brasil, lecionaram acerca do inciso IX, do artigo 4º: “O atual texto foi
ainda mais longe. Adota como princípio a colaboração do Brasil com os outros povos. De fato, não
poderia ser outra a orientação neste mundo cada mais interdependente. Esta colaboração pode ser atingida
por duas vias fundamentais: a bilateral e a multilateral. Pela primeira, os dois Estados interessados
estabelecem relações recíprocas de colaboração. Na segunda, abre-se o leque a múltiplos interessados,
dando lugar, assim, ao surgimento de organizações de cunho mundial ou então regional. Não é difícil
prever-se que estas organizações deverão ter um papel cada vez mais importante, uma vez que as
fronteiras do Estado estão como que a explodir da magnitude dos problemas. Assim é que o combate a
certas doenças contagiosas, a defesa da ecologia, a exploração de partes do globo terrestre ainda não
submetidos ao domínio de um Estado, o funcionamento das redes de comunicação e transportes
internacionais e, em curto espaço de tempo, o disciplinamento da própria conquista do cosmos, tudo isso,
enfim, não pode concretizar-se sem uma intensa atividade de colaboração entre os Estados.”
(Comentários à Constituição do Brasil. 1º vol. Pré –constitucionalismo. O Estado. Constituição.
Arts. 1º a 4º. São Paulo: Saraiva, 1998, p.460) . Veja que o comando em tela se coaduna com o
seguinte propósito da Carta das Nações Unidas (art. 1º, 3): “Conseguir uma cooperação internacional para
resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para
promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem
distinção de raça, sexo, língua ou religião;”
54
sistema internacional de proteção dos direitos humanos. Nada obstante, segue-se com
64
DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 187.
55
Meirelles Teixeira, em obra organizada por Maria Garcia, ao tratar dos elementos
os direitos fundamentais demonstra ainda mais a prevalência desses direitos, vale dizer,
primeiros freios, o que tem relevância para além do que, à primeira vista, possa
apresentar. Nesse diapasão, Paulo Bonavides leciona sobre tal alteração, ao tratar da
65
A organizadora traz no texto as atualizações pertinentes à Constituição Federal de 1988.
66
TEIXEIRA, J.H. Meirelles Teixeira. In: GARCIA, Maria (org. e atual.). Curso de Direito
Constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, p. 184.
56
individuais e coletivos (cap. I) e os direitos sociais (cap. II), direitos esses, como visto,
Não se vai aqui tratar desses direitos em espécie, mas genericamente quanto
aos aspectos que se entende relevantes a fim de enfatizar ainda mais o quanto a
de tais direitos, trouxe cláusula aberta a receber direitos fundamentais não localizados
67
Curso de direito constitucional. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 584-586.
68
Nacionalidade (Cap. III), Direitos Políticos (Cap. IV), Partidos Políticos (Cap. V).
69
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007, p. 79-80.
70
No que tange às garantias constitucionais, conforme Paulo Bonavides: “A Constituição de 5 de outubro
de 1988 foi de todas as Constituições brasileiras aquela que mais procurou inovar tecnicamente em
matéria de proteção aos direitos fundamentais. Não o fez, porém, sem um propósito definido, que
tacitamente se infere do conteúdo de seus princípios e fundamentos: a busca em termos definitivos de
uma compatibilidade do Estado social com o Estado de Direito mediante a introdução de novas garantias
constitucionais, tanto do direito objetivo como do direito subjetivo. Quanto às do primeiro teor, a saber,
as de direito objetivo, a garantia das garantias, se assim podemos nos expressar, vem a ser a Constituição
mesma, a sua rigidez, o seu grau de legitimidade, o seu formalismo, a eficácia, a juridicidade e o alcance
de suas cláusulas, a par de um efetivo controle de constitucionalidade. Mas não param aí as garantias
formais de que a Constituição será protegida e protegerá o Direito” (Curso de direito constitucional. 13ª
ed., São Paulo: Malheiros, 2002, p. 548).
57
no título II, e ainda, petrificou tais direitos. É sobre os últimos assuntos que se aterá na
que se propõe.
dos direitos e garantias fundamentais, sendo discutível se tal comando se aplica tão-
fundamentais (arts. 6º a 17) e a outros que se encontram por todo o texto e até mesmo
fora dele.
várias as propostas nesse sentido. Segue-se, aqui, a mais recorrente classificação de José
Afonso da Silva74 para elucidar que, tendo em vista o teor do § 1º do art. 5º, não basta
legisle em sentido contrário. Quanto ao legislador, acrescenta-se que não deve deixar de
Portanto, se atualmente a não atuação do Poder Público para tornar aplicável qualquer
71
Não obstante, merece transcrição o teor do art.5º, inc. XLI, a saber; “a lei punirá qualquer
discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”.
72
Os §§ 3º e 4º serão tratados oportunamente.
73
Art. 5º, §1º: “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”
74
SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998.
58
LXXI, do art. 5º, 75 destinado a viabilizar o exercício dos direitos fundamentais que, por
ventura, estejam obstados por ausência de norma infraconstitucional. Há, ainda, a Ação
providente não apenas em declarar os direitos fundamentais, mas também por zelar para
A questão que agora se impõe é trazer que tais direitos não estão apenas no
aberta do art. 5º, § 2º, que vem a receber outros direitos com a mesma natureza, ou seja,
direitos também fundamentais não incluídos naquele rol. Para Luiz Alberto David
75
“Art. 5º [...]. LXXI – conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora
torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania”.
76
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, cit., p. 592
77
Idem, ibidem, p. 597.
59
lhes outorgou”78.
são fontes mediata ou imediata, não há divergência no sentido de que a lei é fonte
imediata. Com isso, e frente ao que será exposto acerca do tratamento privilegiado que
formação de blocos econômicos com suas normas, deve também ser discutida no campo
78
ARAUJO, Luiz Alberto David. NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 11ª
ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 127.
79
Direitos humanos e o direito constitucional internacional , p. 58
60
A partir das lições apontadas, opta-se por enfatizar que o teor do § 2º do art. 5º
expressos no texto, ou seja, que estão sob o Título “Dos Direitos e Garantias
fundamentais” (arts. 5º a 17), desde que sejam: 1º) decorrentes do regime e dos
que já está assente no Supremo Tribunal Federal82. Mas, ainda com base no referido
Importa nesse momento, evidenciar que o reconhecimento dos direitos decorrentes dos
80
O autor menciona em nota (n. 24): “ADI 1.480-MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 18/05/01; HC
76.561/SP, Rel. Min. Nelson Jobim, Plenário, 27/05/98, DJ de 02/02/01)”.
81
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Tratados internacionais na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal. In: Tratados internacionais na ordem jurídica brasileira. AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues
do. (Coord). São Paulo: Aduaneiras, 2005, p. 20.
82
O julgado de referência é o proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 939-7, em que ficou
assente a existência de direitos individuais além do art. 5º.
61
Em busca da origem do art. 5º, § 2º, pertinente aos direitos decorrentes dos
tratados internacionais, como informa Silvia Maria da Silveira Loureiro83, tal redação
fundamentais, por força do comando do art. 60, § 4º, inc. IV85, estão petrificados.
Embora se reconheça que, se por um lado isso é plenamente aceitável quanto aos
direitos e garantias individuais fora do rol do art. 5º, por outro lado, há resistência
quanto aos demais direitos fundamentais, ou seja, direitos que, embora fundamentais e
constantes no texto, não são intitulados como direitos individuais. Celeuma maior aflora
quando se trata de direitos fundamentais fora do texto constitucional, como no caso dos
83
LOUREIRO, Silvia Maria da Silveira. Tratados internacionais sobre direitos humanos na constituição.
Belo Horizonte: Del Rey, 2005.
84
Nesse sentido, destaca-se dentre as alterações examinadas pela autora, a omissão do termo ‘tratados
humanitários’, o que, no seu dizer, “prejudica, ainda hoje, a interpretação e a aplicação deste dispositivo”
e a não inclusão das declarações de direitos humanos, sobre a qual, segundo a autora, “ainda que fosse
como instrumento de interpretação e integração das normas constitucionais [...]. Enfim, o apuro técnico
da redação oferecida pelo conferencista, se adotado desde logo, pouparia os Constituintes de discussões
inférteis, e muitas vezes equivocadas a este respeito.” (p. 60).
85
Art. 60, § 4º: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: [...]IV- os
direitos e garantias individuais”.
62
Federativa do Brasil seja parte. Reconhece-se com isso a relevância não apenas da
Constituição, mas também dos tratados internacionais na proteção dos direitos humanos.
reconhecidos.
Transcreve-se parte do texto introdutório do PNDH que faz menção aos tratados:
86
“Art. 5º [...] § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados,
em cada Casa do Congresso nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, serão equivalente às emendas constitucionais. § 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal
Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.” Art. 109. [...] § 5º Nas hipóteses de grave
violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o
cumprimento de obrigações decorrentes de tratados de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte,
poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo,
incidente de deslocamento de competência para a justiça federal.”
63
“Adotar legislação interna que permita o cumprimento pelo Brasil dos compromissos
humanos”. 88
Resta agora apontar algumas consequências para o Brasil após sua inserção no
87
Brasil. Presidência da República, Governo Fernando Henrique Cardoso. 1995. Direitos Humanos:
Novo Nome da Liberdade e da Democracia. Brasilia: Presidência da República, Secretaria de
Comunicação Social, Ministério da Justiça e Ministério das Relações Exteriores.
88
Disponível em: http://www.dhnet.org.br/dados/pp/pndh/textointegral.html#Ratificação. Acesso em:
12.03.2008.
89
Disponível em: http://www.dhnet.org.br/dados/pp/pndh/pndh_concluido/01_intro.html. Acesso em:
12.03.2008.
90
Disponível em: http://www.dhnet.org.br/dados/pp/pndh/pndh_concluido/15_internacional.html. Acesso
em: 12.03.2008.
64
vários Estados. É, portanto, sobre todos esses Estados que advêm tais consequências.
Estados inseridos em tal sistemática persiste, como não poderia ser diferente, o que é
notório pelo fato de a adesão aos tratados internacionais ocorrer de livre vontade por
dos direitos humanos, aceitam o controle inerente a tal sistemática. Assim, inadmissível
assumidos91. Compromissos esses assumidos não apenas com outros Estados, mas –
91
Para André de Carvalho Ramos: “[...] observo que a proteção de direitos humanos deixa de ser um tema
nacional e passa a ser um tema de interesse do Direito Internacional. Os próprios Estados, ao aceitar as
diversas obrigações internacionais no campo dos direitos humanos, tornaram infundada qualquer tipo de
alegação de ‘domínio reservado’ ou ‘ofensa à soberania’ porventura ventiladas.” (op. Cit. p. 23).
Também Valério de Oliveira Mazzuoli asseverou: “Essa nova concepção, assim, deixa de lado o velho
conceito de soberania estatal absoluta, que considerava, na concepção tradicional, como sendo os Estados
os únicos sujeitos de direito internacional público. [...] É neste cenário que começa a aparecer, então, os
primeiros contornos do Direito Internacional dos Direitos Humanos, afastando-se a ideia de soberania
absoluta dos Estados, em seu domínio reservado, e erigindo os indivíduos à posição, de há muito
merecida, de ‘sujeitos de direito internacional’, dando-lhes mecanismos processuais eficazes para a
salvaguarda de seus direitos internacionalmente protegidos”. (Direitos humanos, Constituição e os
tratados internacionais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002, p. 214-5).
65
domínio doméstico. O Estado soberano, que foi criado para servir aos homens, diante do
internacionais em âmbito interno, servindo assim aos seus reais propósitos. Para Dalmo
de Abreu Dallari:
92
Conforme Mônica de Mello: “[...] ao celebrar um tratado sobre direitos fundamentais, o Estado-parte
não assume a obrigação de respeitar os seus preceitos apenas com os demais Estados, mas principalmente,
com as pessoas que habitam o seu território” (In: O sistema interamericano de proteção dos direitos
humanos e o Direito Brasileiro, p. 311).
93
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A Proteção Internacional dos Direitos Humanos.
Fundamentos Jurídicos e Instrumentos Básicos. SP: Saraiva, 1991, p. 4.
66
Celso Lafer chama atenção para a distinção entre a perspectiva ex parte populi
e a perspectiva ex parte principis, o que faz não sem antes sublinhar a importância da
94
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 19º ed., São Paulo: Saraiva, 1995,
p. 63.
95
LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos. Um diálogo com o pensamento de Hannah
Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 125-126.
67
seguintes termos:
relevância já no início de seus textos (na Constituição brasileira de 1988, por exemplo,
aparece como primeiro princípio fundamental), cabe ao intérprete dar a esse princípio a
Por fim, ventila-se aqui o reflexo dessa nova concepção de soberania estatal no
princípio fora construída sob aquela concepção de soberania ainda não inserida num
2.2.2 Condição de humanidade como único requisito para ser sujeito de direitos e
sua especificação em casos necessários
No que tange à condição de ser humano para ser sujeito de direitos, menciona-
96
MATTOS, Adherbal Meira. Direito internacional público. 2ª ed., Rio de Janeiro. São Paulo: Renovar,
2002, p. 4-5.
68
[...] a afirmação kantiana de que o homem, e apenas ele, não pode ser
empregado como um meio para a realização de um fim, pois é fim de si
mesmo, uma vez que apesar do caráter profano de cada indivíduo, ele é
sagrado, já que na sua pessoa pulsa a humanidade.97
transcrição a seguir:
97
LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos. Um diálogo com o pensamento de Hannah
Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 117-8.
98
COMPARATO, Fabio Konder. Afirmação histórica dos direitos humanos. V ed., São Paulo: Saraiva,
2007, p. 21-2.
99
Citação de SOUZA, Ari Herculano de. Os direitos humanos. Livro do mestre. Projeto: Walter
Szeligowski Ramos. Execução Editora do Brasil S/A, 1989, p.30.
69
Diante de tal citação, sobre a qual se entende não ser o caso de advertir dos
perigos de se ver com olhos de hoje algo tão antigo, resta demonstrado o necessário
sujeito de direitos, o que ocorre, atualmente, não apenas em âmbito interno, mas
Direito, seja ele qual for, se dirige sempre aos homens. O homem é a
finalidade última do Direito. Este somente existe para regulamentar as
relações entre os homens. Ele é um produto do homem. Ora, não poderia o
DI negar ao indivíduo a subjetividade internacional. Negá-la seria
desumanizar o DI e transformá-lo em um conjunto de normas ocas sem
qualquer aspecto social. Seria fugir ao fenômeno da socialização, que se
manifesta em todos os ramos do Direito. Na verdade, podemos concluir que
existem duas principais razões para o homem ser considerado pessoa
internacional: a) a própria dignidade humana, que leva a ordem jurídica
internacional, como veremos, a lhe reconhecer direitos fundamentais e
procurar protegê-los e b) a própria noção de Direito, obra do homem para o
homem. Em consequência, a ordem jurídica internacional vai-se preocupando
cada vez mais com os direitos do homem, que são quase verdadeiros ‘direitos
naturais concretos’.100
genérico e abstrato, como se todos os seres humanos fossem realmente iguais. Foi
demonstrado no capítulo anterior, sob outra ótica pode ser evidenciado, qual seja,
100
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público. 15ª ed. 1º vl. Rio de
Janeiro. São Paulo. Recife: Renovar, 2004, p. 808.
101
Na maioria das vezes, o próprio título do tratado internacional já aponta se trata de alcance geral ou de
alcance específico; a exemplo destes últimos: a Convenção Interamericana para prevenir, punir e
70
erradicar a violência contra a mulher, a Convenção Internacional sobre Eliminação de todas as formas de
Discriminação Racial, a Convenção sobre os direitos da Criança, a Convenção Interamericana para
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência etc.
102
SOUSA SANTOS, Boaventura. Por uma Concepção Multicultural de Direitos Humanos. In:
Reconhecer para Libertar: os caminhos do cosmopolitanismo multicultural. RJ: Civilização Brasileira,
2003, p. 442-443.
103
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992,
p. 69.
71
requer o respeito à etnia, à raça, ao gênero etc. Distinta da primeira concepção, que trata
iguais, e, distinta também da segunda concepção, que reconhece, em prol de uma efetiva
humanidade como único requisito para ser sujeito de direitos com sua especificação
104
A efetividade dos direitos humanos: o desafio contemporâneo. In: A Contemporaneidade dos Direitos
Fundamentais. Revista Brasileira de Direito Constitucional (RBDC), jul./dez. 2004, p. 318.
105
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 61.
72
essa visão antropológica. Nesse sentido, Ingo Walfgang Sarlet discorre acerca do tema
culturais e ambientais são condições para o exercício dos direitos civis e políticos na
evidencia tal visão ao trazer em um único texto os direitos civis e políticos e os direitos
106
Revista de Direito Público – DPU n. 19 – jan/fev/2008 – assunto especial – doutrina. Porto Alegre:
IOB, Brasília: Instituto Brasiliense de Direito Público.
73
único diploma legal. Ainda que os diplomas legais tragam divisões topográficas – como
a vida, não como mera existência, mas a vida digna como pretendida por todos os seres
humanos110. Vida digna aqui vem a ser então a nova dimensão dada para o bem tutelado
107
O legado da Declaração Universal e o futuro da proteção internacional dos direitos humanos. In: O
cinqüentenário da Declaração Universal dos Direitos do Homem. Orgs. Alberto do Amaral Júnior e
Cláudia Perrone-Moisés. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1999, p. 18.
108
Ainda o autor em outra obra: “A expansão contínua e considerável nas quatro últimas décadas do
direito sobre a proteção internacional dos direitos humanos reflete-se na já mencionada multiplicação de
procedimentos internacionais (característica da proteção dos direitos humanos em nossos dias), no âmbito
mais amplo da expansão da própria concepção dos direitos humanos, a abarcar novos valores, dos quais
não se pode dissociar o estudo dos métodos de implementação. As propostas ‘categorias’ de direitos
(individuais e sociais ou coletivos), complementares e não concorrentes, com variações em sua
formulação, podem ser apropriadamente examinadas à luz da unidade fundamental da concepção dos
direitos humanos. Logo tornou-se patente que tal unidade conceitual – e indivisibilidade – dos direitos
humanos, todos inerentes à pessoa humana, na qual encontram seu ponto último de convergência,
transcendia as formulações distintas dos direitos reconhecidos em diferentes instrumentos, assim como
nos respectivos e múltiplos mecanismos ou procedimentos de implementação”. (A Proteção Internacional
dos Direitos Humanos. Fundamentos Jurídicos e Instrumentos Básicos. SP: Saraiva, 1991, 41-2)
109
Nas lições de Flávia Piovesan: “Além da universalidade dos direitos humanos, a Declaração de 1948
ainda introduz a indivisibilidade desses direitos ao ineditamente conjugar o catálogo dos direitos civis e
políticos com o dos direitos econômicos, sociais e culturais. De fato, concebida como a interpretação
autorizada dos arts. 1º (3) e 55 da Carta da ONU, no sentido de aclarar, definir e decifrar a expressão
‘direitos humanos e liberdades fundamentais’, a Declaração de 1948 estabelece duas categorias de
direitos: os direitos civis e políticos e os direitos econômicos, sociais e culturais. Combina, assim, o
discurso liberal e o discurso social da cidadania, conjugando o valor da liberdade com o valor da
igualdade. [...] Ao conjugar o valor da liberdade com o da igualdade, a Declaração demarca a concepção
contemporânea de direitos humanos, pela qual esses direitos passam a ser concebidos como uma unidade
interdependente e indivisível. [...] sem a efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais, os
direitos civis e políticos se reduzem a meras categorias formais, enquanto sem a realização dos direitos
civis e políticos, ou seja, sem a efetividade da liberdade entendida em seu mais amplo sentido, os direitos
econômicos, sociais e culturais carecem de verdadeira significação. [...]” (Direitos humanos e o direitos
constitucional internacional, p. 131, 134 e 136)
110
Não é demais lembrar a preocupação existente atualmente com a vida dos animais irracionais. Daniela
Ikawa a isso faz referência em sua colaboração intitulada: Valor humano intrínseco e redistribuição
Social. (In: Direitos Humanos. Fundamento, Proteção e Implementação. Perspectivas e desafios
contemporâneos. Vol. II. Curitiba: Juruá, 2007, p. 43-58.)
74
“vida”, o que ocorre por força da característica da historicidade dos direitos humanos
em constante mutação.
É nesse contexto que o tema dos direitos ambientais emerge na pauta dos
direitos humanos111 e, portanto, merece o mesmo tratamento, senão maior. Nas lições de
ambientais demandam a mesma atenção por parte do Estado. Para Flávia Piovesan:
Cabe realçar que tanto os direitos sociais como os civis e políticos demandam
do Estado prestações positivas e negativas, sendo equivocada e simplista a
visão de que os direitos sociais só demandariam prestações positivas,
enquanto os civis e políticos demandariam prestações negativas, ou a mera
abstenção estatal. A título de exemplo, cabe indagar qual o custo do aparato
de segurança, mediante o qual se assegura direitos civis clássicos, como o
direito à liberdade e o direito à propriedade, ou ainda qual o custo do aparato
eleitoral, que viabiliza os direitos políticos, ou do aparato da justiça, que
garante o direito ao acesso ao Judiciário. Isto é, os direitos civis e políticos
não se restringem a demandar a mera omissão estatal, já que sua
implementação requer políticas públicas direcionadas, que contemplam
também um custo.113
111
De certa forma, já presente no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966, precisamente
em seu art. 12.(2.b), a saber: 1. Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem o direito de toda a
pessoa de desfrutar o mais elevado nível de saúde física e mental. 2. As medidas que os Estados-partes
no presente Pacto deverão adotar, com o fim de assegurar o pleno exercício desse direito, incluirão as
medidas que se façam necessárias para assegurar: a) [...] b) A melhoria de todos os aspectos de higiene do
trabalho e do meio ambiente. [...]
112
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Direitos humanos – aspectos jurídicos. In: A Contemporaneidade
dos direitos fundamentais. Revista Brasileira de Direito Constitucional - RBDC, jul./dez. 2004, p. 27.
113
Op. cit., p. 169, nota de rodapé 33.
75
Assim, é preciso atentar que para proteção de direitos civis e políticos também
114
RAMOS. André de Carvalho. Op. Cit. p. 257.
115
Nesse sentido, a seguinte notícia: Violência custa ao Brasil R$ 92 bilhões, segundo Ipea. Agência
Brasil. Brasil Agora. Luana Lourenço. Repórter da Agência Brasil. A violência no Brasil gera custos que
chegam a cinco por cento do Produto Interno Bruto (PIB). A conclusão é de um levantamento realizado
pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a pedido do Ministério da Saúde, que mediu os
gastos com violência do governo e do setor privado em 2004. Divulgados na última semana, os dados
revelam que os custos da violência chegaram a mais de R$ 92 bilhões no período, divididos entre os
governos e o setor privado. O setor público gastou cerca de R$ 32 bilhões em despesas com segurança,
sistema prisional e serviços de saúde prestados às vítimas da violência. Para o setor privado, o custo da
violência estimado na pesquisa é resultado da perda de mão-de-obra com as mortes por causas violentas,
como assassinatos e acidentes de trânsito, das despesas com os setores formal e informal de segurança
privada e contratação de seguros, além do valor dos bens roubados e furtados. Somados, os gastos
chegaram a R$ 60,3 bilhões em 2004. A base de dados da pesquisa utilizou informações da contabilidade
dos governos federal, estaduais e municipais, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(Pnad), feita pelo IBGE, e números do Sistema Único de Saúde (SUS). “Utilizamos dados de 1995 a
2005, mas como não havia informações completas sobre todas as variáveis para período completo,
resolvemos usar o ano de 2004 como referência”, explicou o economista Daniel Cerqueira, um dos
coordenadores da pesquisa. De acordo com Cerqueira, as informações do estudo do Ipea vão servir para
direcionar ações e políticas públicas de prevenção e combate à violência mais eficientes do ponto de vista
econômico. “É preciso medir cada uma das ações para ver se elas estão gerando resultados e qual o custo
para a sociedade, para então direcionar os recursos para onde eles são mais necessários”, defendeu. No
Ministério da Saúde, os resultados da pesquisa vão orientar a busca de recursos para o setor, que segundo
a Coordenadora de Informações e Análises Epidemiológicas do Ministério, Maria de Fátima Marinho, “é
o grande depositário da violência, porque recebe as vítimas diretas e as pessoas sofrem o medo da
violência, que têm problemas em decorrência disso”. Segundo Maria de Fátima, o estudo vai ser utilizado
principalmente para sensibilizar os gestores sobre a importância de investimentos em prevenção da
violência. “As pessoas sempre dizem que prevenir é melhor que remediar, vamos mostrar os custos exatos
da escolha pela prevenção”, afirmou. (fonte: Consulex – Ano XXV Edição nº 121 Brasília, terça-feira, 26
de junho de 2007).
76
Pacto sobre Direitos Civis e Políticos e no Pacto de Direitos Sociais e Culturais. Pactos
esses que, juntamente com a Declaração Universal de 1948, a qual trata de todos esses
com capítulo próprio destinado ao meio ambiente (cap. VI, CF/88). Assim, há o
para aqueles que estão sob o título II da CF/88, seja pela abertura do art.5º § 2º para
Enfim, nesse capítulo foi visto que a Constituição Federal de 1988 primou de
rol dos direitos por ela expostos, os direitos oriundos dos tratados internacionais de
HIERARQUIA E DENÚNCIA
de direitos humanos pelo ordenamento jurídico interno. Para tanto, com base na
pertinentes à denúncia.
118
TRINDADE, Antônio Augusto.Tratado de direito internacional dos direitos humanos. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris Editor, 1999, vol. I, p. 401.
79
que, em regra, não ocorre nos demais tratados. Acrescente a isso as lições de Flávia
119
Idem, ibidem, p. 29-31.
120
Nesse sentido, André de Carvalho Ramos: “Novamente salienta-se que os tratados de direitos humanos
não são tratados que regulam interesses materiais dos Estados, regidos pelo princípio da reciprocidade
(quid pro quo). Pelo contrário, os Estados obrigam-se a respeitar os direitos humanos sem que haja
qualquer contraprestação a eles devida. São os imperativos da governabilidade e legitimidade, como
comentado na análise da internacionalização dos direitos humanos, que levam os Estados à ratificação de
tratados e convenções internacionais de direitos humanos. Por isso, caracteriza um tratado de direitos
humanos a natureza objetiva de suas normas, que devem ser interpretadas não em prol dos contratantes
(Estados), mas sim, em prol dos indivíduos.” (Op. Cit., p. 32).
80
121
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional, p. 55.
122
CAFIERO, Juan Pablo. FAUR, Marta Ruth. LLAMOSAS, Esteban Miguel. LEÓN, Juan Méndez
Rodolfo Ponce de. VALLEJOS, Cristina Maria. Jerarquia constitucional de los tratados internacionales.
Fundamentos. Tratados de derechos humanos. Operatividad. Tratados de integración. Acción positivas.
Derecho a la via. Derecho de réplica. VEJA, Juan Carlos. GRAHAM, Marisa Adriana (Directores).
Buenos Aires: Ástrea de Alfredo Y Ricardo Depalma, 1996, p. 32-33.
81
comandos;
instrumentos não pode ser o mesmo dispensado aos outros tratados internacionais.
direitos humanos. Veja que Oscar Vilhena Vieira leciona no sentido de que: “Os
82
caráter constitucional”123
garantias fundamentais com inclusão dos direitos advindos dos tratados ratificados pelo
Brasil. É o que se depreende do teor da parte final do art. 5º, § 2º, e ainda, atualmente,
geral, os seguintes dispositivos: art. 49, I; art. 84, VIII; art. 102, III, “b”; art. 105, III,
“a”.
Resguardados os arts. 102, III, “b” e 105, III, “a”, os quais serão objetos do
último capítulo, quanto ao art. 49, I124, a situação é peculiar, já que possível entender
seja aplicável apenas quando diante da hipótese ali referida, qual seja, quando o tratado
internacionais de direitos humanos, não se identifica tal hipótese nesses casos. Também
Congresso, mas somente é possível afirmar que lhe cabe resolver definitivamente sobre
tais instrumentos no sentido de que a sua reprovação ao tratado obsta a sua confirmação
123
VIEIRA, Oscar Vilhena. A Gramática dos direitos humanos. São Paulo: Revista do Ilanud n. 17, 2001,
p. 42.
124
“Art. 49. É de competência exclusiva do Congresso Nacional: I resolver definitivamente sobre
tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio
nacional;”
83
entendimento de que tal dispositivo não tem aplicação na seara dos direitos humanos.125
sujeitos à aprovação pelo Congresso Nacional (art. 84, VIII). Atualmente, por obra do
poder constituinte reformador, o teor do art. 5º, §3º, o qual será objeto de análise
requer a visita ao Direito Internacional, não sendo esse o intento, mas apenas o de trazer
Direito Internacional.
125
Silvia Maria da Silveira Loureiro, em nota de rodapé, ao fazer referência a tal dispositivo, nos traz:
“apesar do presente estudo não ter se fixado na pesquisa deste dispositivo, sustenta-se que, em que pesem
as críticas a sua má redação, ele não dispõe sobre a regra geral de competência do Poder Legislativo para
aprovar tratados, mas sim a segunda parte do inciso VIII do art. 84. Afigura-se-nos que este dispositivo
traz uma preocupação peculiar do Constituinte de 1988 com os tratados internacionais de endividamento
externo brasileiro. Cf. MEDEIROS. O poder de celebrar tratados, p. 382 est seq.. Cf. também art.26 do
ADCT.” (Tratados internacionais sobre direitos humanos na constituição. Belo Horizonte: Del Rey,
2005, p. 124).
84
atos de negociação;
legislativo;
instrumento.
direitos fundamentais.
126
RODAS, João Grandino. Op. Cit, 1991, p. 14.
85
novos instrumentos, embora esteja o Brasil no exercício de sua soberania para decidir
livremente.
Ênfase deve ser dada ao item “d” da citação no sentido de que, a partir da
considerado do instrumento.
127
Conforme Flávia Piovesan: “A assinatura do tratado, por si só, traduz o aceite precário e provisório,
não irradiando efeitos jurídicos vinculantes. Trata-se da mera aquiescência do Estado em relação à forma
e ao conteúdo final do tratado. A assinatura do tratado, via de regra, indica tão-somente que o tratado é
autêntico e definitivo” (Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, p. 47).
128
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 226-227.
86
que, para tanto, não há um prazo estipulado. Porém, tendo em vista que se trata do
Na Constituição de 1988, como já mencionado, a previsão está no artigo 84, VIII, que
129
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 234.
130
RODAS, João Grandino. Op. Cit., p. 28.
87
a espécie normativa própria para tanto. Tal decreto-legislativo, uma das espécies
normativas previstas no art. 59, da CF/1988, não tem o condão de, por si só, fazer com
que o tratado venha a surtir efeitos de norma jurídica seja na ordem interna, seja na
povo e dos Estados aprovam o que foi anteriormente assinado e, portanto, a partir de sua
lei nacional; é o próprio tratado internacional que, após sua regular formação, se
demonstra que o tratado está em condições de ser observado e cumprido pelo Estado
brasileiro.
decisão de ratificar ou não. A vinculação existe, todavia, caso o Congresso Nacional não
131
FERREIRA FILHO. Manoel Gonçalves. Do processo legislativo. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 198.
88
parte do Poder Legislativo. Todavia, tal apreciação deve ocorrer dentro de um prazo
Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969. Valério de Oliveira Mazzuoli,
De acordo com o autor, mesmo sem a devida apreciação pelo Poder Legislativo
assim, já que suas regras são invocadas entre nós, não só pela doutrina, mas também
pelo Poder Judiciário, a exemplo do HC. 87585/TO. Nas palavras de Antônio Paulo
convenção multilateral, e agem de acordo com ela, há clara presunção de que a regra
tenha se tornado costume internacional, mesmo que a convenção não tenha sido
132
Direito internacional público, p. 45-46.
133
Nas palavras do autor: “Apesar de ainda não ter sido ela ratificada pelo nosso Estado, o governo
brasileiro e o Itamaraty têm se pautado pelos seus preceitos no que tange à celebração, processo de
formação e conclusão de tratados internacionais. Além disso, é a Convenção de Viena de 1969,
unanimemente reconhecida como regra declaratória de direito consuetudinário vigente, deste fato
decorrendo sua obrigatoriedade mesmo para os Estados que ainda não a ratificaram ou dela ainda não são
signatários.” (op.cit, p. 46). Vale lembrar do entendimento de Celso D. de Albuquerque Mello, seguindo
Aréchaga, acerca dos fatores que demonstram a importância da assinatura, entre eles: “f) pode significar
que o Estado reconhece as normas costumeiras tornadas convencionais”, conforme já mencionado (p. 86).
89
seguintes termos:
desse estudo, é preciso atentar para a demora do processo legislativo no Brasil. Para a
duração desses processos (art. 5º, inc. LXXVIII). Agora, talvez, seja o caso de estender
fundamentais, a incluir, portanto, uma apreciação sem delongas pelo Poder Legislativo
134
MEDEIROS, Antônio Paulo Cachapuz de. O poder de celebrar tratados. Competência dos poderes
constituídos para a celebração de tratados, à luz do Direito Internacional, do Direito Comparado e do
Direito Constitucional Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1995, p. 196.
135
Idem, ibidem, p. 242.
136
MELLO, Celso D. Albuquerque. Responsabilidade internacional do estado. Rio de Janeiro: Renovar,
1995, p.228.
90
um Estado vir a ser parte após a conclusão do tratado139. Para Antônio Paulo Cachapuz
de Medeiros:
137
REZEK, Francisco. Direito internacional público. Curso elementar. 10ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005,
p. 50.
138
Segundo Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros: “Predominavam, assim, até a metade do século
passado, os tratados bilaterais, pois mesmo que participassem vários Estados das negociações e que o
conteúdo fosse idêntico, os tratados eram feitos de forma bilateral. Entretanto, a partir da década de 1850,
os Estados começaram a celebrar tratados multilaterais e essa prática foi se intensificando
progressivamente” (O poder de celebrar tratados. Competência dos poderes constituídos para a
celebração de tratados, à luz do Direito Internacional, do Direito Comparado e do Direito
Constitucional Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1995, p. 192).
139
O poder de celebrar tratados. Competência dos poderes constituídos para a celebração de tratados, à
luz do Direito Internacional, do Direito Comparado e do Direito Constitucional Brasileiro. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris, 1995, p. 245.
91
Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho: “Perfeito o ato normativo, qualquer que
seja ele, antes que se torne eficaz há de ser promulgado e publicado. Promulgação e
normativo”.141
nesse sentido, já que após a ratificação o Chefe do Poder Executivo expede um decreto
140
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público. 15ª ed. 1º vl. Rio de
Janeiro. São Paulo. Recife: Renovar, 2004.p. 245.
141
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do processo legislativo. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 249.
92
elaboração e, portanto, sua existência com aptidão para surtir efeitos no ordenamento
Internacional – Direito internacional geral ou comum –, faz referência ao art. 8º, 1142 da
142
O autor informa a redação: ‘normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem
parte integrante do direito português’ (Direito Constitucional e Teoria da Constituição, p. 795). Veja que,
buscando na Constituição brasileira por redação equivalente, encontramos no art. 5º, § 2º.
143
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, p. 795-796.
93
sujeitos de direitos exclusivamente nacionais, já podem considerar que, no rol dos seus
vão além de impor obrigações aos Estados-parte em favor dos seus cidadãos, já que
direitos e garantias fundamentais, o que por interpretação conjunta com o teor do art. 5º,
§ 2º, não são apenas os direitos com assento na Constituição, mas também aqueles
144
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direitos humanos, constituição e os tratados internacionais. Estudo
analítico da situação e aplicação do tratado na ordem jurídica brasileira. São Paulo: Juarez de Oliveira,
2002, p. 253-254.
94
impõem aos seus destinatários em âmbito interno, o que ocorre não apenas por
processo legislativo da lei nacional. Daí que, findo tal processo complexo de elaboração
instrumentos internacionais, é preciso ressaltar que, para os atos normativos que não
promulgado por outrem, como determina o art. 66, § 7º146. Portanto, necessário que se
aplique também esse comando para que o tratado, já regularmente acabado e surtindo
efeitos, não seja obstado de aplicação porque pendente de promulgação. Mesmo porque
o chefe do Executivo, além de já ter concordado com o tratado ao assiná-lo, mais que
isso, confirmou sua concordância ao ratificar tal instrumento, o que fez com referendo
do Poder Legislativo.
internacional a partir da ratificação, a publicação deve ocorrer tão logo seja possível
após esse ato. Mesmo porque como advertido por Valério Mazzuoli, o art. 4º da
145
Para Grandino Rodas: “O Brasil, após a Independência, continuou a seguir a tradição lusitana de
promulgar os tratados já ratificados por meio de um decreto do Executivo. Embora as Constituições
Brasileiras da República incluindo a vigente, não façam qualquer referência, esse costume vem sendo
mantido.” (op. Cit., p. 54).
146
“Art. 66. [...] § 7º Se a lei não for promulgada dentro de quarenta e oito horas pelo Presidente da
República, nos casos dos §§ 3º e 5º, o Presidente do Senado a promulgará, e, se este não o fizer em igual
prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado faze-lo.”
95
contidas”147.
Albuquerque Mello:
147
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direitos humanos, Constituição e os tratados internacionais.
Estudo analítico da situação e aplicação do tratado na ordem jurídica brasileira, p. 181.
148
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público p. 241.
96
isso, a celeuma instaurou-se e, ainda que não mais sob o positivismo exacerbado,
149
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 437.
150
Teoria geral do direito e do Estado. Trad. Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes. 2005, p.
182.
151
Direitos humanos e o direito constitucional internacional, p. 71. Outras considerações existem, como
aquela orientadora da prevalência de normas especiais face a normas gerais, e ainda, e mais recorrente, à
referente ao monismo e dualismo, mas, em suma, essa investigação orienta-se pelo primado da busca
mais favorável ao ser humano, esteja ela na norma especial, geral, internacional ou local.
97
advento.
152
“Art. 5º [..] §3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados,
em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”
153
Relator Min. Xavier de Albuquerque, julgamento em 01.06.1977, tribunal pleno “Ementa. Convenção
de Genebra – Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias – Aval aposto à Nota
Promissória não registrada no prazo legal. Impossibilidade de ser o avalista acionado, mesmo pelas vias
ordinárias. Validade do Decreto-lei nº 427, de 22/1/1969. Embora a Convenção de Genebra que previu
uma lei uniforme sobre letras de câmbio e notas promissórias tenha aplicabilidade no direito interno
brasileiro, não se sobrepõe a ela as leis do País, disso decorrente da constitucionalidade e conseqüente
validade do Decreto-Lei nº 427/1969, que instituiu o registro obrigatório da Nota Promissória em
Repartição Fazendária, sob pena de nulidade do título. Sendo o aval um instituto do direito cambiário
inexistente será ele se reconhecida a nulidade do título cambial a que foi aposto. Recurso extraordinário
conhecido e provido. [...] (Disponível em: www.stf.jus.br/jurisprudencia. Acesso em: 11.11.2008).
154
“No Brasil existem diversos acórdãos consagrando o primado do DI, como é o caso da União Federal
c. Cia. Rádio Internacional do Brasil (1951), em que o Supremo Tribunal Federal decidiu unanimemente
que um tratado revogava as leis anteriores (Apelação Cível nº 9.587). Coelho Rodrigues assinala a
existência de um acórdão do STF (1914), no Pedido de Extradição nº 7, de 1913, em que se declarava
estar em vigor e aplicável um tratado, apesar de haver uma lei posterior contrária a ele. É a tese do
primado do DI. No mesmo sentido deste último, de que um tratado não é revogado por uma lei interna
posterior, está o acórdão do STF na Apelação Cível nº 7.872, de 1943, com base no voto de Filadelfo de
Azevedo. É de se mencionar que a Lei nº 5.172, de 25/10/66, estabeleceu: ‘Os tratados e as convenções
internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna e serão observados pela que lhes
sobrevenha’. [...]” (MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 130).
“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal desde seus primórdios e por longo tempo afirmou a
primazia do Direito Internacional sobre o Direito interno. Valladão alinhavou ampla lista de precedentes.
Philadelpho Azevedo, em 1945, chegou a publicar comentário patenteando a prevalência dos tratados
sobre o Direito interno infraconstitucional, consoante pensamento unânime do Pretório Excelso.”
(RODAS, João Grandino. Op. Cit. p. 52). Não é demais lembrar nesse sentido, o entendimento do
respeitável autor da Teoria Pura do Direito.Veja com Pedro Bhomoletz de Abreu Dallari: “E kelsen, com
muita propriedade, já nos anos 20 deste século, chamava a atenção para a distinção entre o monismo
internacionalista e o monismo nacionalista. Em curso que ministrou em Haia, na Holanda, observou que a
integração entre Direito Internacional Público e Direito interno pode se dar de tal sorte que,
hierarquicamente, as normas de Direito Internacional Público estejam em um patamar superior – seria o
monismo internacionalista – ou, então, se integram ao Direito interno, mas não em condição hierárquica
superior – tratar-se-ia do monismo nacionalista. Para Kelsen, o monismo internacionalista seria a forma
mais adequada de enfoque do tema da integração.” (DALLARI, Pedro Bohomoletz de Abreu. Normas
internacionais de direitos humanos e a jurisdição nacional. In: Revista Especial do Tribunal Regional
98
ainda com a inexplicável consequência de uma lei nacional posterior ter o condão de
não versava sobre direitos humanos e, ainda assim, o julgado teve o condão de surtir
efeitos como precedente para casos posteriores que, ao contrário daquele, versavam
Federal, acompanhado por muitos, não fazia distinção entre tratados de direitos
humanos e outros tratados que não diretamente relacionados com os direitos primordiais
para uma vida digna. Além disso, equiparava-se o tratado internacional à lei nacional.
ordinária está superado. Percebeu-se que o tratado internacional não se confunde com a
lei. Nesse sentido evoluiu o entendimento do Supremo Tribunal Federal, o que ficou
Cezar Peluso, em que se discutiu a questão da prisão do depositário infiel, proibida por
9/SP158.
157
FRAGA, Mirtô. O Conflito entre tratado internacional e norma de direito interno: estudo analítico da
Situação do tratado na ordem jurídica brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 49.
158
Entendimento esse também manifestado nos seguintes julgamentos: HC 87.585/TO, Relator originário
Min. Ilmar Galvão e sucessor Min. Marco Aurélio, RE 349.703/RS, Relator Min. Carlos Britto, entre
outros que advieram posteriormente, a ex. do HC 90.172/SP.
100
entendimento não chegou a ser positivado, embora, como nos informa João Grandino
(art. 55), Itália (art. 10, § 1º), EUA (art. 6º, II), Grécia (art. 28, § 1º), Paraguai (arts. 137
e 141), Equador (art. 163), El Salvador (art. 144, n.2)162, Alemanha (art. 25), Guatemala
(art. 46).163
159
Relator Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 29.03.00, tribunal pleno. Cita-se parte final de seu voto:
“[...] parificar às leis ordinárias os tratados a que alude o art. 5º, § 2º, da Constituição, seria esvaziar de
muito do seu sentido útil a inovação, que, malgrado os termos equívocos do seu enunciado, traduziu uma
abertura significativa ao movimento de internacionalização dos direitos humanos. Ainda sem certeza
suficientemente amadurecidas, tendo assim – aproximando-me, creio, da linha desenvolvida no Brasil por
Cançado Trindade (e. q., Memorial cit., ididem, p. 43) e pela ilustrada Flávia Piovesan (A Constituição
Brasileira de 1988 e os Tratados Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos, em E. Boucault e N.
Araújo (órgão), Os Direitos Humanos e o Direito Interno – a aceitar a outorga de força supralegal às
convenções de direitos humanos, de modo a dar aplicação direta às suas normas – até, se necessário,
contra a lei ordinária – sempre que, sem ferir a Constituição, a complementem, especificando ou
ampliando os direitos e garantias dela constantes.” (fonte: www.stf.jus.br/jurisprudência/inteiro teor,
acesso em 11.11.08)
160
“Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária
interna, e serão observadas pela que lhes sobrevenha.”
161
RODAS, João Grandino. Op. Cit. p. 51.
162
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direitos humanos, Constituição e os tratados internacionais.
Estudo analítico da situação e aplicação do tratado na ordem jurídica brasileira. São Paulo: Juarez de
Oliveira, 2002, p. 131-136.
163
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, 2º vl., p. 509-513.
101
demonstrado no primeiro capítulo, bem por isso não podem estar no mesmo patamar
Francesco Ferrara:
novo leading case.” (destaque do autor)165. No caso, o precedente revogado foi aquele
de direitos humanos, embora supralegais, estão abaixo da Constituição, não condiz com
164
FERRARA, Francesco. Interpretação e aplicação das leis. Trad. Manuel ª Domingues de Andrade. 3ª
ed. Coimbra: Armênio Amado –Editor, sucessor. 1978, p. 130-131.
165
LAMY, Marcelo. Efeitos amplificados das decisões judiciais no controle concreto de
constitucionalidade: uma teoria dos precedentes constitucionais. Tese de Doutorado, PUC/SP, 2008,
p.254.
102
No Brasil, o art. 5º, § 2º, determina expressamente que “os direitos e garantias
expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
Brasil seja parte”. Ao assim dispor, não refere apenas a direitos e garantias que estejam
no mesmo texto.
decorrência do regime e dos princípios adotados pela Constituição. Pois bem, já aqui,
166
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 837.
167
TOMAZ, Carlos Alberto Simões. O décimo segundo camelo de luhmann e o § 3º do art. 5º da
constituição brasileira acrescido pela emenda constitucional n. 45: inconstitucionalidade a partir de uma
visão extradogmática do direito tendo como paradigma a alopoiese jurídica. In: Teoria da constituição. 6ª
Revista Brasileira de Direito Constitucional. Junho/dezembro de 2005, São Paulo: ESDC, p. 185.
103
a dignidade da pessoa humana (art. 1º, II) e a prevalência dos direitos humanos (art. 4º,
II), nem necessitaria da parte final do dispositivo para, diante da realidade do sistema
internacional de direitos humanos no qual o Brasil está inserido, concluir que as normas
dos tratados internacionais de direitos humanos decorrem dos princípios adotados pela
Constituição.
Contudo, o teor do § 2º do art. 5º vai além com sua parte final para,
Tratados esses que, após o seu solene processo de formação, veiculam direitos e
Portanto, os direitos e garantias a que se refere a norma do artigo 5º, § 2º, são
aqueles compreendidos ou contidos implicitamente, no regime, nos princípios
constitucionais ou nos tratados internacionais firmados pelo País. [...] Os
tratados dizem respeito à norma usualmente designada pela fórmula pacta
sunt servanda, e por ela, diz Kelsen, os sujeitos da comunidade jurídica
internacional são autorizados a regular sua conduta recíproca, ou seja, a
conduta dos seus órgãos e súditos, em relação aos órgãos e súditos dos outros
– o que envolve deveres e direitos aos indivíduos, embora isto ocorra ‘por
intermédio da ordem jurídica estadual (da qual apenas o ‘Estado’ é a
expressão personificadora)’. Daí que, insculpidos determinados direitos ou
garantias individuais num tratado internacional, esse texto passa a incorpora-
se ao sistema jurídico estatal, observada a respectiva Constituição – de tal
sorte que, pela dicção do § 2º do art. 5º, tais direitos e garantias vêm integrar
o elenco constante do texto constitucional, podendo ser exigidos ou
exercidos, independentemente de norma expressa. Esses direitos e garantias
têm existência assegurada, portanto, no universo constitucional,
caracterizados pelo regime adotados pela Constituição ou pelos tratados
internacionais firmados. Vêm eles todos consagrados no § 2º do art. 5º,
norma agasalhadora, ampla e projetiva, do sistema constitucional.168
168
GARCIA, Maria.Desobediência Civil, direito fundamental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p.
210/212.
104
como fonte para o direito aplicável internamente com hierarquia constitucional. Nesse
Carlos Mário da Silva Velloso, após trazer sua classificação do art. 5º, § 2º,
169
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado.Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999, v.II, p. 407.
170
MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direito internacional público. Parte Geral, p. 90-91.
105
diz respeito à liberdade, inscrito em Tratado firmado pelo Brasil, como, por
exemplo, o que está expresso na Convenção de São José da Costa Rica, art.
7º, item 7, que limitou a prisão por dívida à hipótese de inadimplemento de
obrigação alimentícia, força é reconhecer que se tem, em tal caso, direito
fundamental com status constitucional. É dizer, o art. 7º, item 7, do citado
Pacto de São José da Costa Rica, é direito fundamental em pé de igualdade
com os direitos fundamentais expressos na Constituição (Constituição, art. 5º,
§ 2º). Nesse caso, de tratar-se de direito e garantia decorrentes de Tratado
firmado pelo Brasil, a incorporação desse direito e garantia, ao direito
interno, dá-se com status constitucional, assim com primazia sobre o direito
comum.171
Ambas as normas limitam o poder estatal com previsão de direitos dos homens e
legislação inferior.
de acordo com os tratados de direitos humanos possibilita mais uma leitura em defesa
da hierarquia constitucional desses instrumentos. Dessa vez, a partir das lições de Hans
171
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Tratados internacionais na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal. In: Tratados Internacionais na ordem jurídica brasileira.AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues
do. (Coord). São Paulo: Aduaneiras, 2005, p. 20-21.
172
Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho: “Regras materialmente constitucionais são, em suma, as que,
por seu conteúdo, se referem diretamente à forma do Estado [...], forma de governo [...], ao modo de
aquisição [...] e exercício do poder (p. ex., atribuições de seus órgãos), estruturação dos órgãos de poder
[...], aos limites de sua ação (p. ex., os traçados pelos direitos fundamentais do homem)” (Curso de direito
constitucional. 31.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 11-12).
173
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes,
2000, p. 247.
106
do Direito de “regular a sua própria criação”, o que pode ocorrer “de forma a que uma
norma apenas determine o processo por que a outra é produzida. Mas também é possível
Kelsen. Nas leituras de Regina Maria Macedo Nery Ferrari: “Destarte, seguindo o
positivo”.175
próprios tratados, ainda que de forma geral. E isso advém da vontade dos Poderes
Se uma norma deve ser elaborada em conformidade com outra norma, essa
outra é superior àquela. No caso dos tratados de direitos humanos, essa superioridade
pela prevalência da norma mais protetiva onde quer que esteja, na Constituição ou nos
174
Op. cit., p. 246.
175
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da Declaração de inconstitucionalidade. 5ª ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 57.
107
comum. No caso dos tratados de direitos humanos, também é assim e com mais
capítulos.
direitos humanos já é realidade em alguns Estados, como nos informa o Min. Celso de
casos abaixo apontados pelo autor, possível defender a hierarquia constitucional desses
Universal dos Direitos do Homem “(por via do art. 16º, nº 2) e algumas leis
constitucionais posteriores a 25 de abril de 1974, por força dos arts. 306º, 308º e 309º”,
176
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado.Tratado de direito internacional dos direitos humanos, p.
511-512.
177
MIRANDA, Jorge. A originalidade e as principais características da Constituição Portuguesa. In:
Estudos de direito constitucional: homenagem à professora Maria Garcia. RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes.
BERARDI, Luciana Andréa Accorsi. (orgs). São Paulo: IOB-Thomson, 2007, p. 165.
109
178
MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direitos Humanos, Constituição e os Tratados Internacionais, p.
282.
179
MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. A teoria das constituições rígidas. 2ª ed. São Paulo: José
Bushatsky, 1980, p. 59.
110
primordiais para uma existência digna e informam a atuação estatal, inclusive no que
não pretendem alterar a Constituição, como se verá. Não obstante, como visto, tais
instrumentos são elaborados por um processo complexo e formal. Com isso, os direitos
por eles veiculados estão protegidos de alterações por parte do legislador. É dizer, além
180
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 215.
111
direitos humanos contam com o reconhecimento por parte de outros estados, o que
tais assuntos e, ainda, de processo específico e dificultoso para sua alteração. Trata-se,
181
DANTAS, Ivo. Teoria do estado. Direito Constitucional I. Belo Horizonte: Liv. Del Rey, 1989, p.
162.
182
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 22ª ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p. 52.
112
processo solene e dificultoso para sua alteração. Com isso, pode-se afirmar, com
autorização do § 2º, do art. 5º, que os tratados internacionais de direitos humanos são
Veja que um direito previsto na Constituição pode ser alterado via emenda
inconstitucional. Tal emenda até ser retirada do ordenamento jurídico, se for, será válida
e eficaz. Já um direito previsto num tratado de direitos humanos está muito mais
protegido porque nem mesmo o Poder Constituinte Reformador pode, por si só, alterá-
lo.
às disposições que, por ventura, sejam conflitantes, os próprios tratados trazem forma de
solucionar tais conflitos que é a prevalência da norma mais protetiva, como será
oportunamente evidenciado.
2004, trouxe o § 3º, no artigo 5º, exigindo uma maior formalidade para os tratados
cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos
referência aos tratados anteriormente ratificados, o que poderia ter ocorrido, a exemplo
183
Direitos humanos e o direito constitucional internacional, 2006, p. 71.
114
comando o efeito negativo no sentido de que os tratados anteriores não possuem status
de norma constitucional, mas apenas aqueles que forem, a partir de então, elaborados de
esclarecer que os tratados de direitos humanos estão no mesmo patamar das normas
Ainda que não seja esse o entendimento prevalente, possível enfatizar que o
jurídico interno antes de tal novação já possuíam status de norma constitucional, já que,
184
LAFER, Celso. A internacionalização dos direitos humanos. Constituição, racismo e relações
internacionais. São Paulo: Manole, 2005. p. 16.
185
FERRARA, Francesco. Interpretação e aplicação das leis. Trad. Manuel A Domingues de Andrade. 3ª
ed. Coimbra: Armênio Amado –Editor, sucessor, 1978, p. 132.
115
formalidade do seu processo de elaboração ser mais solene que o de elaboração de uma
elaborados.
momento da elaboração da lei. Não por outra razão, a inconstitucionalidade formal por
superveniente:
Constituição, leciona:
186
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998,
p. 80.
187
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 463.
116
embora tal espécie normativa nem mais exista no ordenamento jurídico pátrio. Outro
caso é do Código Tributário Nacional que, elaborado nos moldes de lei ordinária, foi
recepcionado como lei complementar. Daí se afirmar não ser possível exigir
naquele momento?
se realidade depois de demasiada delonga por parte do Poder Legislativo. Não que
assunto de tamanha relevância tenha de ser deliberado às pressas. Certamente que não.
poderiam observar o novo regramento, se existente. Mas veja que, como informa Flávia
Piovesan, apenas lhes faltou o segundo turno de discussão, já que aprovados com o
188
O índice do Vade Mecum da Saraiva de 2008 (6ª edição) nos traz um total de 112 Decretos-Leis, entre
eles, vale apontar os seguintes: 2.848/40 (Código Penal), 3.688/41 (Lei das Contravenções Penais),
3.689/41 (Código de Processo Penal), 3.914/41 (Lei de Introdução ao Código Penal e à Lei das
Contravenções Penais), 3.931/41 (Lei de Introdução ao Código de Processo Penal), 4.657/42 (Lei de
Introdução ao Código Civil), 911/69 (Alienação Fiduciária), 1.001/69 (Código Penal Militar), 1.002/69
(Código de Processo Penal Militar). Não é demais lembrar que, na década de 1940, estávamos sob a égide
da Constituição outorgada de 1937, e todos esses decretos foram editados com base no artigo 180 daquela
Carta que transferia a função legiferante para o Presidente da República. Quanto aos demais decretos,
basta apontar que o primeiro citado foi editado por militares com base em atos institucionais.
189
Em essência, o intento da proposta já havia sido objeto de outras propostas. Como noticia Antônio
Paulo Chapuz de Medeiros, há projetos desde 1960 (O Poder de Celebrar Tratados Competência dos
poderes constituídos para a celebração de tratados, à luz do Direito Internacional, do Direito
Comparado e do Direito Constitucional Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1995,
final do cap. 7). Também quando da Revisão Constitucional de 1993 houve proposta que chegou a ser
apreciada no sentido de alargar o comando do art. 4º a fim de dar maior eficácia no plano interno aos
tratados internacionais, como lembrado por Pedro Bohomoletz de Abreu Dallari em artigo publicado na
Revista Especial do TRF-3ª Região a propósito do seminário realizado pela Escola de Magistrados acerca
dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos no Dir. Brasileiro – (1997, p. 37).
117
quorum até superior ao exigido atualmente190, o que demonstra mais uma razão para se
Para melhor evidenciar a situação mal vinda que se pode criar com tratamento
essa que observou as regras existentes no momento de sua elaboração. Ocorre que o
Brasil ratificou, no âmbito da ONU, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
3º do artigo 5º.
diferenciá-los apenas tendo como critério a forma pela qual foram elaborados?
e aquele advindo da OEA não. Este foi elaborado segundo as regras vigentes no
do art. 5º. Portanto, eventual alegação de carência de força constitucional porque não
190
“Observe-se que os tratados de proteção dos direitos humanos ratificados anteriormente à Emenda
Constitucional n. 45/2004 contaram com ampla maioria na Câmara dos Deputados e no Senado Federal,
excedendo, inclusive, o quorum dos três quintos dos membros em cada Casa. Todavia, não foram
aprovados por dois turnos de votação, mas em um único turno de votação em cada Casa, uma vez que o
procedimento de dois turnos não era tampouco previsto.” (Direitos Humanos e o Direito Constitucional
Internacional, p. 72).
118
atendeu aos atuais requisitos exigidos pelo Poder Constituinte Derivado não deve ser
considerada. Não se pode afirmar o que o constituinte não afirmou, ou seja, não dispôs
observaram tais trâmites não gozam de status constitucional. Ora, trata-se de uma
dedução contrária à ordem constitucional e até mesmo à lógica. Isso porque, se fosse o
caso, a lógica seria direcionar aos tratados que não venham a observar tal regramento e
não aos que não observaram. É pretender que a norma surta efeitos para o passado sem
a devida determinação para tanto, o que é inadmissível. Mesmo porque seria obstar a
Também não é o caso de recepção dos tratados anteriores pelo § 3º do art. 5º.
Isso porque, considerando que o fenômeno da recepção ocorre na relação entre norma
uma vez que esta ocorre para normas infraconstitucionais que encontram novo
Todavia, caso seja aceitável uma nova dimensão para o fenômeno da recepção,
moldes do novo regramento. Ainda assim, não se pode desconsiderar que tais
1988, pode surgir questionamento quanto a estes últimos. Nesse sentido, menciona-se o
“1) os tratados celebrados pelo Brasil (ou aos quais ele aderiu), e
regularmente incorporados à ordem interna, em momento anterior ao da
promulgação da CF/88, revestir-se-iam de índole constitucional, haja vista
que formalmente recebidos nessa condição pelo § 2º do art. 5º da CF; 2) os
que vierem a ser celebrados por nosso País (ou aos quais ele venha a aderir)
em data posterior à da promulgação da EC 45/2004, para terem natureza
constitucional, deverão observar o iter procedimental do § 3º do art. 5º da CF;
3) aqueles celebrados pelo Brasil (ou aos quais nosso País aderiu) entre a
promulgação da CF/88 e a superveniência da EC 45/2004, assumiriam caráter
materialmente constitucional, porque essa hierarquia jurídica teria sido
transmitida por efeito de sua inclusão no bloco de constitucionalidade. RE
466343/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 12.3.2008”191.
Constitucional n. 45/2004, mas também seu caráter formal tendo em vista seu processo
objeto desse estudo, pode-se concluir não haver distinção material nem formal entre os
191
Informativo do STF n.498, de 10 a 14 de março de 2008.
120
porque o comando do § 2º do art. 5º não referiu apenas aos tratados que fossem
192
SALDANHA, Nélson. O poder constituinte. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1986, p. 91.
Recentemente tratou sobre a internacionalização do poder constituinte o autor Luís Cláudio Coni (Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2006, p. 80-81).
193
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição.4ª ed, Coimbra:
Almedina, 2000, p. 81.
121
instrumentos, quando versarem sobre direitos humanos, são por ela recebidos.
do Legislativo para aprovar o tratado nos termos daquele regramento, o que será
abordado no próximo capítulo. Não sem antes findar esse capítulo com algumas
concordância do Poder Legislativo, o que não pode ocorrer. Isso porque, se o Poder
194
Direito internacional público. Curso elementar. 10ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p.107.
122
de Maria Garcia:
Trindade:
terça parte dos membros das Câmaras para denúncia aos tratados de direitos humanos
195
GARCIA, Maria. Denúncia. Necessidade da participação do Poder Legislativo. O princípio
constitucional da tripartição dos poderes. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, ano 5 –
n. 21 – outubro-dezembro de 1997 –, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional. São Paulo: Revista
dos Tribunais, p.96-97.
196
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado.Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, 2º vol., p. 509.
123
o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo
Embora não conste expressamente sobre a denúncia, pode-se entender estar ela
de direitos humanos, surge a seguinte questão: Pode tratados de direitos humanos serem
de ser parte. Restando então a questão em aberto do que se entenderia por razões
seguinte entendimento:
197
CAFIERO, Juan Pablo. FAUR, Marta Ruth. LLAMOSAS, Esteban Miguel. LEÓN, Juan Méndez
Rodolfo Ponce de. VALLEJOS, Cristina Maria. Jerarquia constitucional de los tratados internacionales.
124
assim também deve ser para o caso brasileiro. Fora dos moldes citados, haja vista que os
não gera efeito internamente, ou seja, ainda que se considere o Estado desobrigado
Estado se desobrigar do que fora tratado, mas que não tem o condão de retirar do
melhor proteger. Com isso, já se tem o cenário necessário para tratar da posição desses
LEIS NO BRASIL
199
PIOVESAN, Flávia. Conclusões do seminário Incorporação dos tratados internacionais de proteção
dos direitos humanos no direito brasileiro. In: Revista Especial do Tribunal Regional Federal 3ª região.
Escola de Magistrados. Coord: Lucia Figueiredo. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado – Imesp, 1997.
127
Num primeiro momento, não é demais lembrar que a supremacia de certas leis
A Magna Carta de 1215 apresentou-se como lei suprema que, confirmada por
França, no século XIV, restou nítida a distinção entre as leis do reino e outras leis201.
do Cidadão de 1789.
muitos direitos, pela relevância da matéria, devem estar veiculados em diplomas legais
200
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 31.ª São Paulo: Saraiva,
2005, p. 3
201
Conforme Oswaldo Aranha Bandeira de Mello: “Durante a menoridade de Luiz XIV, o parlamento de
Paris afirmou, vivamente, a existência de leis fundamentais, ou leis do reino, e tornou o aresto conhecido
pelo nome de Aresto de União ou Declaração da Câmara de S. Luís, o qual, realmente, é uma
constituição”. (A teoria das constituições rígidas. São Paulo: Bushatsky, 1980, p. 38).
202
Para Canotilho: “Constitucionalismo é a teoria (ou ideologia) que ergue o princípio do governo
limitado indispensável à garantia dos direitos em dimensão estruturante da organização político-social de
uma comunidade. Nesse sentido, o constitucionalismo moderno representará uma técnica específica de
limitação do poder com fins garantísticos. (Direito Constitucional e Teoria da Constituição, p. 51)
128
Bem por isso a Constituição dos Estados Unidos da América logo recebeu suas
primeiras emendas para fazer constar em seu texto uma declaração de direitos
fundamentais. Observe que, em uma dessas emendas (n. IX), houve a declaração de que
conservados pelo povo, ou seja, uma cláusula constitucional aberta a receber outros
direitos.
203
MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado, p. 197.
204
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. Teoria Geral. Comentários aos arts. 1º a 5º
da Constituição da República Federativa do Brasil. Doutrina e Jurisprudência. 8ª ed. São Paulo: Atlas,
2007, p. 1.
129
jurídico, está na Constituição dos Estados Unidos, o que, na prática, ficou demonstrado
no célebre julgado no caso Marbury vs Madison, em 1803. Ressalte-se que, para tal
decisão, o juiz Marshall não se restringiu ao texto propriamente dito. Segundo José
tradução):
205
ARAUJO, José Antonio Estevez. La constitucion como proceso y La desobediência civil. Coleccion
Estructuras y Procesos. Serie Derecho. Madrid: Editorial Trotta, 1994, p. 49.
206
O texto original citado pelo autor: “The interpretation of the laws is the proper and peculiar province
of the judges as a fundamental Law. It therefore belongs to them to ascertain its meaning as well as the
meaning of any particular act proceeding from the legislative body. If there two, that which has the
superior obligation and validity ought of course to be preferred; or in other words, the constitution ought
to be preferred to the statute, the intention of the people to the intention of their agents.” (FIUZA, Ricardo
Arnaldo Malheiros. Direito constitucional comparado. 4ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 286.)
130
embora cada qual com suas peculiaridades. Sobre a supremacia da Constituição, leciona
jurisprudência, algumas vezes até de forma exacerbada a negar a realidade global que,
repelir tal ofensa, ou mesmo, impedir sua formação mediante um controle preventivo.
garantia de direitos supremos, atualmente, requer sua própria garantia. Trata-se das
207
FERREIRA FILHO. Manoel Gonçalves. Do processo legislativo, p. 200.
131
Já num sentido restrito, excluem-se as ações e omissões dos particulares para designar
apenas aqueles atos advindos do poder público. Da acepção restrita é possível estreitar
ainda mais para designar tão-somente a contrariedade de leis. Nesse sentido, cita-se
opção entre elas se faz necessária para prosseguimento, sob pena dessa investigação, já
rumo ao seu findar, tomar proporções inesperadas. Opta-se, então, pela acepção mais
ainda que indiretamente, preocupa-se com a ausência de lei quando reclamada pela
direitos fundamentais. Com isso, ressalta-se uma vez mais que, repelir a
constitucionalidade:
Se a Constituição tem de ser garantida, ela mesma traz em seu bojo os meios
210
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador. Contributo
para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra: Coimbra editora, 1994, p. 363-
364.
211
Sobre omissão inconstitucional Flávia Piovesan em sua obra intitulada Proteção judicial contra
omissões legislativas. Ação Direta de inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção, ao
delimitar o seu objeto de estudo nos traz: “Este tema alcança relevância peculiar em face do perfil do
texto constitucional de 1988, que apresenta um universo extremamente amplo de normas de eficácia
limitada e de aplicabilidade mediata ou indireta que dependem, necessariamente, de providências
normativas ulteriores para a produção dos efeitos colimados pelo legislador constituinte” (São Paulo:
Revistas dos Tribunais, 1995, p. 15).
212
MIRANDA, Jorge. Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade. Coimbra: Coimbra Editora,
1996, p. 77.
133
e adequações necessárias.
la integración y la universalización.”215
Pero además los tiempos actuales exigen, por razones de economia de escala
que, hacia fuera, los países se integren en comunidades econômicas, en
mercados comunes, en unidades de desarrollo sectorial o general, que
comprendan a una diversidad de países que van unificando sus regímenes
jurídicos, creando un derecho comunitário. En consecuencia, es necesario que
las nuevas Constituciones adapten la estructura del poder, posibiliten la
conformación de tratado, con jerarquia constitucional y prevean la delegación
213
TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de direito constitucional, p. 372.
214
Uadi Lammêgo Bulos, ao tratar da evolução do constitucionalismo, leciona: “Quando falamos em
constitucionalismo, deparamo-nos com uma plêiade de fenômenos políticos cujo desenvolvimento pode
ser estudado em seis etapas bem delimitadas: 1ª etapa – constitucionalismo primitivo; constitucionalismo
antigo; constitucionalismo medieval; constitucionalismo moderno; constitucionalismo contemporâneo; e
6ª etapa – constitucionalismo do porvir.” (Curso de direito constitucional, p. 12).
215
DROMI, José Roberto. La reforma constitucional. El constitucionalismo Del ‘por-venir’. La reforma
de La Constitución. In: El derecho publico de finales de siglo.Una perspectiva iberoamericana.
ENTERRIA, Eduardo Garcia. AREVALO, Manuel Clavero (Directores). Madrid: Civitas: Fundacion
BBV, 1997, p. 114.
134
Luiz Flávio Gomes e Rodolfo Luis Vigo trazem-nos obra intitulada “Do Estado
216
Op. cit., p. 115
217
Op. cit., p. 115-116.
218
GOMES, Luiz Flávio. VIGO, Rodolfo Luis (trad. De Yellbin Morote García). Do estado de direito
constitucional e transnacional: riscos e precauções (navengando pelas ondas evolutivas do Estado, do
Direito e da Justiça). Coleção de Direito e Ciências Afins. Vl. III. Direção: Luiz Flávio Gomes e Alice
Bianchini. São Paulo: Premier Máxima, 2008, p. 45-46.
135
constitucional que, atualmente, não está apenas nas disposições do texto constitucional,
englobam os valores mencionados pelo autor e vão além para abarcar os mesmos
Constituição”, traz:
222
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 870.
223
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição, p. 479.
137
ordenamento jurídico interno é buscar maior segurança para esse entendimento, como se
passa a expor.
conflito de normas
224
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007, p. 101.
225
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, p. 91-92.
226
“O disposto no art. 5º, III, da Constituição, que, ao prever que ‘ninguém será submetido a tortura nem
a tratamento cruel, desumano ou degradante’, é reprodução literal do art. V da Declaração Universal de
1948, do art. 7º do Pacto Internacional dos Direitos civis e Políticos e ainda do art. 5º (2) da Convenção
Americana. [...] Por sua vez, o princípio da inocência presumida, ineditamente previsto pela Constituição
de 1988 em seu art. 5º, LVII, também é resultado de inspiração no Direito Internacional dos Direitos
138
OIT que vem complementar o art. 7º, I, da CF/1988. Não que isso signifique equiparar a
interna infraconstitucional. Essa vem disciplinar, já aquela, por força de sua natureza
constitucional, traz ditames tal como traria o poder constituinte para o texto
Humanos, nos termos do art. XI da Declaração Universal, do art. 14 (3) do Pacto Internacional dos
Direitos Civis e Políticos e do art. 8º (2) da Convenção Americana. Cabe ainda menção ao inciso
LXXVIII do art. 5º da Constituição de 1988, introduzido pela Emenda Constitucional n. 45, de dezembro
de 1004, que, ao assegurar a todos, no âmbito judicial e administrativo, o direito à razoável duração do
processo, é reflexo do art. 7 (5) da Convenção Americana de Direitos Humanos” (PIOVESAN, Flávia.
Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, p. 92).
227
“A partir dos instrumentos internacionais ratificados pelo Estado brasileiro, é possível elencar
inúmeros direitos que, embora não previstos no âmbito nacional, se encontram enunciados nesses tratados
e, assim, passam a incorporar-se ao direito brasileiro A título de ilustração, cabe mencionar os seguintes
direitos: a) direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e sua família, inclusive à
alimentação, vestimenta e moradia, nos termos do art. 11 do Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais; [...] c) direito das minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas a ter sua
própria vida cultural, professar e praticar sua própria religião e usar sua própria língua, nos termos do art.
27 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e do art. 30 da Convenção sobre os Direitos da
Criança; d) direito de não ser submetido a experiências médicas ou científicas sem consentimento do
próprio indivíduo, de acordo com o art. 7º, 2ª parte, do Pacto dos Direitos Civis e Políticos; [...] h)
possibilidade de adoção pelos Estados de medidas temporárias e especiais que objetivem acelerar a
igualdade de fato entre homens e mulheres, nos termos do art. 4º da Convenção sobre a Eliminação de
todas as formas de Discriminação contra as Mulheres; [...] j) direito ao duplo grau de jurisdição como
garantia mínima, nos termos dos arts. 8º, h, e 25 (1) da Convenção Americana; [...] m) proibição da
extradição ou expulsão de pessoa a outro Estado quando houver fundadas razões de que poderá ser
submetida a tortura ou a outro tratamento cruel, desumano ou degradante, nos termos do art. 3º da
Convenção contra a Tortura e do art. 22, VIII, da Convenção Americana” (ibidem, p. 93-4.)
139
De qualquer forma não é demais asseverar que, embora não com a mesma
de San Salvador) dispõe ao final do item “d” do seu art. 7º: “[...] Nos casos de demissão
Fora o caso mencionado em que houve denúncia, outros casos podem ser
Convenção Americana sobre Direitos Humanos, de 1969 (Pacto de San José da Costa
Rica) em seu art. 4º228. Redação esta não encontrada na Constituição, embora as
pena de morte, de 1990, foi ratificado pelo Brasil com reserva. Trata-se de reserva para
aplicar a pena de morte de acordo com o que dispõe o art. 2º do Protocolo, no sentido de
possibilitar tal pena, desde que de acordo com o Direito Internacional, por delitos
sumamente graves de caráter militar. Portanto, foi além do que dispõe a Constituição
228
Art.4º - “Direito à vida. 1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser
protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida
arbitrariamente.”
229
Art. 5º [...] XLVII “não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do
art. 84, XIX;”
140
vale mencionar alguns casos: da prisão civil do depositário infiel, permitida pela
Constituição (art. 5º, LXVII230) e proibida pelo Pacto sobre Direitos Civil e Políticos
(art. 11231) e, ainda, pela Convenção Americana sobre Direito Humanos (art. 7º.7232);
prisão perpétua proibida pela Constituição (art. 5º, XLVII, “b”233) e possibilitada pelo
de direitos humanos, é possível valer-se dos meios disponíveis para resolver aparentes
Importa salientar que no campo dos direitos humanos não há duelo entre norma
230
Art. 5º [...] LXVII “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento
voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;”
231
Art. 11 “Ninguém poderá ser preso apenas por não poder cumprir com uma obrigação contratual.”
232
Art. 7º [...] 7. “Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de
autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.”
233
Art. 5º [...] XLVII “não haverá penas: [...] b) de caráter perpétuo;”
234
Art. 77 “Penas aplicáveis. 1. Sem prejuízo do disposto no artigo 110, o Tribunal pode impor à pessoa
condenada por um dos crimes previstos no artigo 5º do presente Estatuto uma das seguintes penas: [..] b)
Pena de prisão perpétua, se o elevado grau de ilicitude do fato e as condições pessoais do condenado o
justificarem,”
235
Para Antônio Cançado Trindade: “No presente domínio de proteção, o direito internacional e o direito
interno, longe de operarem de modo estanque ou compartimentalizado, se mostram em constante
141
Humanos, ao menos não com a ênfase de hoje, mas apenas o Direito Internacional
de direitos humanos, deve prevalecer aquela que for mais favorável ao ser humano. É a
normas com hierarquia constitucional, considerando entre elas as normas dos tratados
interação, de modo a assegurar a proteção eficaz do ser humano. Como decorre de disposições expressas
dos próprios tratados de direitos humanos, e da abertura do direito constitucional contemporâneo aos
direitos internacionalmente consagrados, não mais cabe insistir na primazia das normas do direito
internacional ou do direito interno, como na doutrina clássica, porquanto o primado é sempre da norma –
de origem internacional ou interna – que melhor proteja os direitos humanos; o Direito Internacional dos
Direitos Humanos efetivamente consagra o critério da primazia da norma mais favorável às vítimas”.
(Tratado de direito internacional dos direitos humanos, p. 41-42).
236
CAFIERO, Juan Pablo. FAUR, Marta Ruth. LLAMOSAS, Esteban Miguel. LEÓN, Juan Méndez
Rodolfo Ponce de. VALLEJOS, Cristina Maria. Jerarquia constitucional de los tratados internacionales.
Fundamentos. Tratados de derechos humanos. Operatividad. Tratados de integración. Acción positivas.
Derecho a la via. Derecho de réplica. VEJA, Juan Carlos. GRAHAM, Marisa Adriana. (Directores).
Buenos Aires: Ástrea de Alfredo Y Ricardo Depalma, 1996, p. 40-41.
142
de direitos humanos, tal como deve ser no Brasil. Mesmo porque, possível afirmar que
humanos a reger as relações internacionais (art. 4º, inc.II), acrescido do comando do §2º
do art. 5º, que não exclui outros direitos decorrentes de tratados internacionais de que o
internacionais, leciona:
Há, porém, normas internacionais que têm por objeto a conduta do ser
humano diretamente e que tornam os cidadãos de um Estado verdadeiros
sujeitos de direito internacional, inclusive lhes concedendo o acesso direto
aos tribunais internacionais. Isso, obviamente, repercute na hierarquia das
fontes legais, pois podem essas fontes, eventualmente contrariar ditames
constitucionais de um Estado e, não obstante, sobre eles prevalecer. Essa
presença ampla dos direitos fundamentais, até mesmo acima das soberanias
nacionais, é um dado que implode o princípio da soberania, pois atinge o
próprio direito processual que vê deslocada sua competência interna para
uma situação de subordinação a decisões com base em outros centros
irradiadores de normas, até sem a complacência da autoridade nacional.238
internacional de direitos humanos, deve prevalecer a norma que for mais protetiva. É
primar por uma efetiva proteção. Carlos Fernández Sessarego, ao tratar da proteção à
237
DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 162.
238
FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. Técnica, decisão, dominação, 4ª ed.
São Paulo: Atlas, 2003, p. 240.
143
comando da primazia da norma mais favorável, conforme nos informa Antônio Augusto
Cançado Trindade:
239
SESSAREGO, Carlos Fernández. Protección a la persona humana. In: Daño y protección a la
peersona humana. Autoria coletiva. Buenos Aires: Ediciones La Rocca, 1993, p. 38). O autor faz
referência a vários comandos constitucionais nesse sentido quando vem afirmar que a existência dessas
cláusulas gerais, que protegem a pessoa com a máxima amplitude, supera a polêmica referente à aplicação
das normas constitucionais também nas relações jurídicas no âmbito do direito privado. Cita o autor, entre
outras disposições no Direito Comparado, o art. 2º da constituição italiana de 1947; o art. 10 da
Constituição espanhola; os arts. 1º e 4º da Constituição peruana. (op. Cit, p. 39-41).
144
internacionalmente.
Roma. Opta-se pela sua não imposição, haja vista a norma mais benéfica prevista
240
Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, p. 543,544.
145
resolução desse caso de conflito. É que, defender a primazia da norma mais benéfica
pode encontrar óbice no sentido de que o destinatário da norma mais benéfica é a vítima
e não o agressor, no caso, o condenado pelo Tribunal Penal Internacional, difere, pois de
considerando que o Estatuto de Roma tratar de crimes com maior gravidade que afetam
perpétua prevista no Estatuto de Roma. Mas, como lecionado por Dimitri Dimoulis, é a
o seguinte:
241
DIMOULIS, Dimitri. O art. 5º, § 4º, da CF: dois retrocessos políticos e um fracasso normativo. In:
Reforma do Judiciário analisada e comentada. (Coords TAVARES, André Ramos. LENZA, Pedro.
ALARCÓN, Pietro de Jesús Lora). São Paulo: Método, 2005, p. 111.
242
Op. Cit. p. 117.
243
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. (trad. Torrieri Guimarães). São Paulo: Hemus, ano: sd.
146
reconhecidos. Daí algumas considerações necessárias para enfatizar que tais normas não
aplicação do Direito244. Nesse sentido, concordam muitos outros autores, tais como
Teixeira247; Luís Roberto Barroso248 e Celso de Bastos249. Este último autor leciona que
244
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 19ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003,
p. 248.
245
CAVALCANTI, Themistocles Bandão. Do controle da constitucionalidade, Rio de Janeiro: Forense,
1966, p. 37.
246
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, 13ª ed., SP: Malheiros, 2003, p. 458.
247
TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Curso de direito constitucional. GARCIA, Maria (org.) Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 1991, p. 265.
248
BARROSO, Luís Roberto.Interpretação e aplicação da Constituição. 5ª ed, São Paulo: Saraiva, 2003,
p. 151.
249
BASTOS, Celso. Hermenêutica e interpretação constitucional. 3ª ed., Celso Bastos Editor, p. 105.
147
diante das novas necessidades que, como nos mostra a história, comprovam a
isso se intensifica no campo da interpretação da Lei Maior cuja supremacia requer que
todos os atos inferiores devam com ela se coadunar. Não se trata da não utilização dos
métodos clássicos de interpretação. Como asseverado por Willis Santiago Guerra Filho:
250
CARMARGO, Margarida Maria Lacombe. Hermenêutica e Argumentação. Uma contribuição ao
estudo do direito. 3ª ed. Rio de Janeiro.São Paulo: Renovar, 2003, p. 139-140). Ainda segundo a autora:
“A lógica formal não serve mais ao direito, porque a solução jurídica não se restringe a uma operação
puramente teórico-silogística. A subsunção dos fatos à regra geral (que funciona como axioma) pode
produzir um resultado formalmente lógico, mas não adequado à realidade. O pensamento jurídico não se
conforma com um tipo de raciocínio linear que ignora a dialética e os valores que informam a
hermenêutica. (ibidem, p. 251).
251
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. São Paulo: RCS,
2005, p. 73-74.
148
Por outro viés, é evidenciar, como fez Glauco Barreira Magalhães Filho252, a
métodos de interpretação.
norma constitucional ao caso concreto, outro objetivo deve ser evidenciado por força da
252
MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira. Hermenêutica e Unidade axiológica da Constituição. Belo
Horizonte: Mandamentos. 3ª ed, 2004, p. 57-59. Ainda segundo o autor: “os cânones tradicionais de
hermenêutica foram concebidos para a interpretação de normas com estrutura de regras e, principalmente,
para as normas de Direito Privado. Como, no entanto, o Direito tem recebido uma elevada ênfase social e
a atenção dos juristas tem recaído, de modo especial, sobre a Constituição, cujas normas são estruturadas
sob a forma de princípios, tornou-se necessário uma nova metodologia. As normas jurídicas podem ter
estruturas de regras ou de princípios. Em geral, as normas infraconstitucionais têm estrutura de regras e as
normas constitucionais têm estrutura de princípios” (Op. cit., p. 61).
149
termos:
decisão do juiz Marshall já referenciada. Isso porque ali ficou assente: “Cabendo ao Juiz
aplicar as leis na solução dos conflitos, deve ele, antes do mais, verificar se elas estão
de aplicar suas normas aos casos concretos, seja para o fim de controle da
E vai além, ou seja, não se trata de tarefa exclusiva dos conhecidos intérpretes oficiais
da Constituição, mas sim de todos os seus destinatários. Nas lições de Peter Häberle, há
253
BASTOS, Celso. Hermenêutica e interpretação Constitucional, p. 267.
254
BARROSO, Luís Robert. Curso de direito constitucional contemporâneo. Os conceitos fundamentais
e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009.
255
Como registrado por FIUZA, Ricardo Arnaldo Malheiros. Direito constitucional comparado. 4ª ed.
Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 385.
150
sistema internacional de proteção dos direitos humanos, este último integrado pelos
Como lecionado por Maria Garcia, com referência a Franck Attar: “negar a
sociedade dos Estados para a constatação de uma rede jurídica condicionando sua
não se restringe ao seu texto, mas abarca também os tratados internacionais de direitos
256
HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional. A sociedade aberta dos intérpretes da Constituição:
contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira
Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997, p. 13.
257
GARCIA, Maria. Torres gêmeas: as vítimas silenciadas. O direito internacional entre o caos e a
ordem. A questão cultural no mundo globalizado. Revista de Direito Constitucional e Internacional. Ano
14 – abril-junho de 2006 – n.55, São Paulo: Revista dos Tribunais.
151
Wolfgang Sarlet:
258
ADI-MC 1675/DF. Relator Min. Sepúlveda Pertence. Julgamento: 24/09/1997. Órgão Julgador:
Tribunal Pleno. Publicação: DJ 19-09-2003 PP-00014.
259
HC 93503 MC/SP . Relator: Min. Celso de Mello. –publ.14.02.08- (Informativo do STF n.494 de 1º a
15 de fevereiro de 2008)
260
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais, p. 82.
152
mesmo, haja vista inúmeras alterações por emendas constitucionais. Para além do texto,
uma vez que reforçam ou ampliam o rol dos direitos internamente reconhecidos.
261
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 237.
262
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição, p. 394-395.
153
ao final:
a norma propriamente dita não se identifica fielmente à letra fria da lei nem à época em
que foi elaborada, mas é o produto da interpretação, vale dizer, aquela que foi
construída a partir da letra da lei. Portanto, dentro de certos limites, o intérprete constrói
Mas a nosso ver, não há motivo para essa distinção entre ‘construção’ e
‘interpretação’ constitucional (e muitos juristas norte-americanos são desta
opinião), porque, na verdade, toda autêntica, verdadeira interpretação, é
construção, pois o intérprete não pode ater-se exclusivamente ao texto, à letra
da lei, isolando-a das suas outras partes do ordenamento jurídico, e dos
263
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais, p. 98-99.
154
necessidade para se buscar a norma que melhor proteja o ser humano onde quer que
internacionais de direitos humanos. Nesse sentido, Luiz Flávio Gomes e Rodolfo Luis
Vigo:
para a consonância da lei com as normas que lhes são superiores. Daí o questionamento
que segue para saber se os tratados de direitos humanos são objetos ou parâmetros no
controle da constitucionalidade.
264
TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de direito constitucional, p. 271.
265
GOMES, Luiz Flávio. VIGO, Rodolfo Luis. Op.cit., p. 56.
155
direitos humanos, nos termos já demonstrados, é preciso uma nova leitura acerca do
impedir a sua formação. Todavia, caso isso não ocorra, em especial, no que tange à
de um controle repressivo, já que existe meio especial para resolver tal impasse.
266
MELLO. Celso D. De Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 239.
156
fim de surtir efeitos jurídicos, requer prévia aprovação do Poder Legislativo, sem a qual
Diante disso, possível questionar se o Legislador está livre para decidir acerca
constitucional a tais instrumentos. E ainda, se a não observância das novas regras gera
inconstitucionalidade.
literal do dispositivo -, possível entender que, ou um tratado tem por objeto direitos
humanos e receberá tal equivalência, ou não versa sobre tais direitos, caso em que
267
Art. 84 “Compete privativamente ao Presidente da República: [...] VIII – celebrar tratados, convenções
e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;”
157
ou Degradantes e, mesmo diante da vigência do § 3º do artigo 5º, não foi observado tal
regramento, talvez porque a Convenção - seu texto-base - não foi aprovada naqueles
moldes268, como não poderia mesmo ter sido, já que tais regras não existiam quando da
sua elaboração.
inconstitucionalidade, essa apenas advém da não aprovação pelo Poder Legislativo, nos
termos do art. 84, VIII, o qual não traz exigência quanto ao procedimento de aprovação
instrumentos que sejam aprovados da mesma forma, o que não se espera), por tudo que
já se afirmou no capítulo anterior, sua aprovação nos moldes anteriores não retira a
processo mais formal que aquele previsto para a aprovação de uma emenda, agora, com
268
Veja que, em 2006, Flávia Piovesan assim se manifestou: “Não seria razoável sustentar que os tratados
de direitos humanos já ratificados fossem recepcionados como lei federal, enquanto os demais
adquirissem hierarquia constitucional exclusivamente em virtude de seu quorum de aprovação. A título de
exemplo, destaque-se que o Brasil é parte da Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas
Cruéis, Desumanos ou Degradantes desde 1989, estando em vias de ratificar seu Protocolo Facultativo.
Não haveria qualquer razoabilidade se a este último – um tratado complementar e subsidiário ao principal
– fosse conferida hierarquia constitucional, e ao instrumento principal fosse conferida hierarquia
meramente legal. Tal situação importaria em agudo anacronismo do sistema jurídico, afrontando, ainda, a
teoria geral da recepção acolhida no direito brasileiro.” (PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito
constitucional internacional, p. 72-73).
158
exposto, o tratado de direitos humanos tramita por um processo mais formal que a
emenda constitucional. Veja que o tratado internacional de direitos humanos, ainda que
aprovados nos moldes do § 3º, do art. 5º, não se confunde com a emenda constitucional.
Essa é ato nacional, fruto do Poder Constituinte Reformador; aquele é ato internacional,
direitos humanos é aquele que deve ocorrer antes da ratificação. Uma vez ratificado, o
para tal aferição seja antes da ratificação do tratado. São várias oportunidades nesse
apreciação por parte do Poder Legislativo; quando, ainda, mesmo com a aprovação do
Poder Legislativo, o Chefe do Executivo pode não ratificar o tratado por juízo próprio
de inconstitucionalidade.
269
MALHEIROS, Antonio Carlos. A prisão civil e os tratados internacionais. In: Revista Especial do
Tribunal Regional Federal 3ª região. Escola de Magistrados. Seminário Incorporação dos tratados
internacionais de proteção dos direitos humanos no direito brasileiro. Coord: Lucia Figueiredo. São
Paulo: Imprensa Oficial do Estado – Imesp, 1997, p. 56.
160
perfeitamente aceitável que não ocorra sob a alegação de confronto com os ditames
Também no Legislativo, preferível não aprovar um tratado que conflite com disposições
como forma excepcional para os casos dos tratados. É o que nos informa Gilmar
Mendes, ao tratar da problemática das leis de aprovação dos tratados naquele Estado:
(art. 95)272. Para o Brasil propõe um exame prévio pelo Supremo Tribunal Federal com
em sua proposta não há intenção de não ratificar o tratado porque contraria com a
270
MENDES, Gilmar. Jurisdição Constitucional. O controle abstrato de normas no Brasil e na
Alemanha. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 131.
271
Como informado pelo autor, é a seguinte a redação do referido art. 54: ‘Caso o Conselho
Constitucional, convocado pelo Presidente da República, pelo primeiro-ministro, pelo presidente de uma
ou outra Assembleia ou por sessenta deputados ou sessenta senadores, declare que um compromisso
internacional comporta uma cláusula contrária à Constituição, a autorização de lhe ratificar ou de aprovar
o engajamento internacional em causa somente pode ocorrer após a revisão da Constituição’ (A
Constituição e tratados internacionais, p. 145).
272
É a seguinte a redação transcrita pelo autor: ‘1. A conclusão de um tratado internacional que contenha
disposições contrárias à Constituição exigirá prévia revisão constitucional. O Governo ou uma das
Câmaras pode recorrer ao Tribunal Constitucional para que ele declare se há ou não contradição.’ (A
Constituição e tratados internacionais, p. 145).
273
DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais, p. 144.
162
pelo Poder Judiciário traria resultados positivos para o ordenamento jurídico e para o
Poder Judiciário, em especial aqui, no que tange aos tratados internacionais de direitos
humanos.
antes da ratificação dos tratados internacionais e que, existe entre o ordenamento interno
submissão. Soberania que, no caso, é exercida não apenas pelo Poder Executivo, mas
quando observadas as exigências internas para tanto, não se pode desprezar uma
274
Op. cit., p. 147.
163
eventual inobservância nesse sentido e as consequencias que disso advém. Daí ser bem-
vinda uma aferição pelas autoridades internacionais antes de aceitar uma ratificação.
Direitos dos Tratados275. A pretensão é, tendo em vista o objetivo maior de proteção dos
direitos humanos, que se busquem outros meios de evitar que um tratado internacional
Estado para concluir tratado aquele que apresentar Plenos Poderes (art. 7º.1. a ), tal
interno.
do direito interno como óbice para observância de um tratado internacional. Isso porque,
no caso, não se trata de adequação do ordenamento jurídico interno, mas dos atos
jurídico interno.
275
Segundo o art. 26 da Convenção de Viena: “Todo tratado em vigor obriga as partes e deve ser
cumprido por elas de boa-fé.” Mais precisamente o art. 27,1: “Um Estado-parte de um tratado não pode
invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado.” Já o item 3
dispõe: “As regras dos parágrafos precedentes não prejudicam o artigo 46” (Sobre o qual se fará menção
oportunamente)
164
“Supervisão Internacional da Compatibilidade dos Atos Internos dos Estados com suas
Convenção de Viena, que distingue nulidade absoluta (ex tunc) de nulidade relativa (ex
assevera:
276
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, v.I,
p. 517.
165
reforço no sentido de evitar que tratados internacionais de direitos humanos não sejam
tratados continuam a impor as obrigações deles advindas. É, por exemplo, afirmar que,
requisitos para tanto, os quais não emanam da ordem interna, mas da ordem
humanos.
277
O autor aponta como outras hipóteses de nulidade relativa: o erro (art.48), o dolo (art.49) e a corrupção
(art. 50). Já como hipóteses de nulidade absoluta são: a coação (arts. 51 e 52) e a de conflito do tratado
com uma norma de Jus Cogens (art. 53). MATTOS, Adherbal Meira. Direito internacional público. 2ª
ed., Rio de Janeiro. São Paulo: Renovar, 2002, p. 126-127.
166
autorizada pela Constituição Federal (art. 5º, LXVII), não é permitida pela Convenção
Americana de Direitos Humanos (art. 7º, 7) e também pelo Pacto Internacional dos
anterior. Nesse julgamento, pode-se, em suma, afirmar que prevaleceu a norma mais
prevalente, ainda que apenas por um voto, de que tais tratados possuem status de norma
a prisão civil, não tem por si só o condão de afastar o comando constitucional que
permite a prisão do depositário infiel. Ele é afastado pela prevalência da norma mais
benéfica.278
sua não aplicação em prol da aplicação de norma mais benéfica, seja oriunda de outros
278
Vale mencionar nesse sentido que já há proposição para edição de súmula vinculante sobre o resultado
do julgamento no RE 466343, ou seja, a inconstitucionalidade da prisão do depositário infiel. (“notícias
do STF: “Sexta-feira, 06 de Março de 2009.Sociedade poderá participar de processo de edição de
Súmulas Vinculantes.Possibilidade de bloqueio de verbas públicas para fornecimento de medicamentos e
de tratamento médico a pessoas carentes e inconstitucionalidade da prisão civil de depositário infiel.
Esses são alguns exemplos de pedidos de edição de Súmulas Vinculantes que estão em tramitação no
Supremo Tribunal Federal (STF) desde a criação da classe processual Proposta de Súmula Vinculante
(PSV), em 2008. Disponível em: www.stf.jus.br/noticias, notícias de 06 de março de 2009, 15h30min.
Acesso em: 19.03.3009)
167
tratados, seja proveniente da legislação interna. Assim, caso a norma mais benéfica
menos favorável ao ser humano difere da não aplicação por ser contrária à norma
mesmo raciocínio deve ser aplicado caso se entenda por considerar o tratado de direitos
incompatível com norma mais protetiva da Constituição, o que, como visto, não há
necessidade.
279
FERNANDES, Pádua. A produção legal da ilegalidade:os direitos humanos e a cultura jurídica
brasileira. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2005, p. 110.
168
[...] os pactos sobre direitos humanos assinados pelo Brasil passam a vigorar
como lei interna. Mais que isso, adquirem internamente o ‘status’ de norma
constitucional. Também concordo com o Dr. Malheiros quando diz que o
pacto internacional, entrando em vigor no Brasil, se incoerente com outra
norma constitucional, tem prevalência sobre esta. É que, por vontade
constitucional manifestada no artigo 5º, parágrafo 2º, o pacto passa a ser
norma constitucional, sem dúvida alguma. Entretanto, a verdade é que as
autoridades do Executivo e do próprio Judiciário, até por falta de afinidade
com a aplicação de normas de Direito Internacional, com frequência têm se
equivocado, em detrimento dos princípios que devem reger as boas relações
internacionais.281
direitos humanos deve prevalecer aquela mais favorável ao ser humano, tal norma, se
280
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A Proteção Internacional dos Direitos Humanos.
Fundamentos Jurídicos e Instrumentos Básicos. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 13.
281
O Judiciário e os tratados internacionais sobre direitos humanos. In: Revista Especial do Tribunal
Regional Federal 3ª região. Escola de Magistrados. Seminário Incorporação dos tratados internacionais
de proteção dos direitos humanos no direito brasileiro. Coord: Lucia Figueiredo. São Paulo: Imprensa
Oficial do Estado – Imesp, 1997, p. 59).
282
Vale mencionar que as normas constitucionais oriundas de emendas não são apenas aquelas que vêm
fazer parte do texto constitucional propriamente dito, no sentido daquele recorrentemente consultado, mas
comportam também os dispositivos da própria emenda, as quais, embora constantes do mesmo livro, vêm
em separado. Veja, por exemplo, o artigo 2º da Emenda Constitucional n. 32, de 11 de setembro de 2001,
dispondo acerca da continuidade da vigência de medida provisória editadas anteriormente à data da sua
publicação. Não há dúvida de que se trata de norma constitucional com tudo que disso advém, ainda que
superveniente, e em texto separado, embora constante do mesmo livro.
169
capítulo, mas, desde já: fazendo parte desse bloco, são parâmetros para o controle da
constitucionalidade.
283
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007, p. 152.
170
parâmetro.
direitos humanos deve ocorrer antes da ratificação, pois a partir desse ato o tratado
pontual, já que sob a perspectiva dos ensinamentos acerca do parâmetro para o controle
segue com o tópico sobre a necessária adequação da legislação interna aos comandos
dos tratados de direitos humanos, retomando agora, com novo olhar, o que se
nesse sentido. Diante de tal cenário surge a questão terminológica para justificar
questão ainda pouco explorada. Por fim, será reconhecido que o sistema de controle da
constitucionalidade no Brasil já comporta tal realidade, desde que advenha uma releitura
constitucionalidade.
284
Fundação Casa de Rui Barbosa. Rui Barbosa e a Constituição de 1891. Rio de Janeiro: Forense-
Universitária, 1985, p. 11.
172
constitucionalidade que ora se apresenta surge quando necessário explicitar que, por
285
MIRANDA, Jorge.Teoria do Estado e da Constituição, p. 473.
173
Como apontado pelo autor, o Brasil está entre aqueles que se vinculam à
forma. Ou seja, ainda que destituídas de matéria constitucional, vigem e são eficazes
Diante disso, vale questionar novamente: por que não reconhecer normas
por ele recebidas após um complexo e solene processo de formação que alcança o
desconsiderados.
ausência, ou ainda, outros atos que não normativos) não deve estar restrita à
constitucional (art. 5º, § 2º), também as normas constitucionais oriundas dos tratados
286
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2ª ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 71-72.
174
evidenciar. Para tanto, parte-se das lições de Jorge Miranda para quem a Constituição
como parâmetro é:
como seguem.
287
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, p. 796.
288
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição, p. 474.
289
“Convencidos como estamos de que a inconstitucionalidade é uma relação entre uma norma ou um
acto e uma norma constitucional determinada, temos de entender que são igualmente essenciais em que
qualquer caso, em qualquer contestação, em qualquer sentença, a norma ou o acto inconstitucional e a
norma da Constituição.” (Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade. Coimbra: Coimbra, 1996,
p. 246).
175
Indireta (art. 103-A290 e art. 2º, Lei 1.417/06). Sobre as súmulas vinculantes,
propriamente dito, ainda sem considerar aquelas advindas dos tratados internacionais de
290
Art. 103-A “O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de
dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que,
a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do
Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem
como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.”
291
LAMY, Marcelo. Efeitos amplificados das decisões judiciais no controle concreto de
constitucionalidade: uma teoria dos precedentes constitucionais. Tese de Doutorado, PUC/SP, 2008, p.
257.
292
Art. 28 [...] Parágrafo único. “A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade,
inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem
redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário
e à Administração Pública federal, estadual e municipal.”
293
SÁCHICA, Luis Carlos. Esquema para una teoría del poder constituyente. 2ª ed. Bogotá – Colombia:
Editorial Temis, 1985, p. 47.
176
Política ou poderá também ser reconhecida quando o conflito se verificar com o espírito
294
CAPPELLETTI, Mauro. Juízes legisladores?. Trad. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris Editor, 1993, p. 73-74.
295
BITTENCOURT, C. A Lúcio. O controle jurisdicional da constitucionalidade das leis. Rio de
Janeiro: Revista Forense, 1949, p. 53.
296
“Francisco Campos, parecer, in Revista Forense, vol. 114, página 37: ‘A Constituição de 1946,
conseguintemente, optou, não apenas de maneira tácita, mas de modo expresso, ou manifesta e
declaradamente, pela ordem individualista ou pela ordem das liberdades, a qual tem, como ponto de
caráter dogmático ou pressuposto incondicional, o princípio de que a norma da sua organização não é o
poder, a autoridade, ou qualquer outro elemento exterior ou estranho à sua própria ordem, mas,
precisamente, a liberdade que, assegurada igualmente a todos os indivíduos, constitui a única força
legítima de integração moral, política e econômica nas sociedades verdadeiramente livres. Optando por
essa ordem, a Constituição teria optado, necessariamente, pela ordem econômica liberal. Ora, a ordem da
economia liberal se define, precisamente, pelo postulado de que o equilíbrio econômico resulta do
encontro, da composição ou do entendimento recíproco entre vontades livres em um comício em que,
como nos comícios políticos, a presença do Estado só é admitida para garantir, de modo efetivo, as
liberdades’[...] ‘Ora, a intervenção do Estado na economia, no sentido de conferir ao Estado o poder de se
substituir aos indivíduos na avaliação dos seus próprios interesses e na decisão quanto ao ponto de
equilíbrio em que eles devem se compor, pressupõe uma ordem constitucional autoritária ou o princípio
de que a fôrça de integração social não é a liberdade, mas o poder. Tal intervenção é claramente excluída
pela Constituição de 1946” (nota de roda pé n. 1, BITTENCOOURT, 1949, p. 53-54).
177
impossibilidade:
297
Ibidem, p. 54.
298
TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de direito constitucional, p. 378.
299
Idem, ibidem, p. 378-379.
178
Gonçalves Ferreira Filho traz exemplos de alguns desses direitos.302 Diante disso vale
300
Ibidem, p. 379
301
Nesse sentido, cita-se o entendimento de Fernanda Dias Menezes de Almeida: “Continuando a adotar a
técnica das Constituições republicanas anteriores, a Constituição atual – como se não bastasse o vasto rol
de direitos explícitos – prevê a existência de direitos implícitos, decorrentes do regime e dos princípios
por ela adorados. Ao tempo da Constituição pretérita, como exemplos de direitos implícitos a Doutrina
oferecia o direito à honra, à imagem, à privacidade, entre outros, todos eles hoje expressamente referidos
no texto constitucional, sendo difícil imaginar que direitos mais teriam escapado da generosidade do
constituinte, podendo ser extraídos do sistema” (“Os direitos fundamentais na Constituição de 1988”. 20
anos da Constituição – Revista do Advogado, ano XXVIII, set. 2008, n. 99, p. 46).
302
“Um, o direito ao segredo, ou sigilo. Não só este se depreende do direito à privacidade e à intimidade
(art. 5º, X), mas é ele a base – não referida – de outros, como o do sigilo de fonte de informações (art. 5º,
XIV). Outro, o direito à incolumidade física que aponta por detrás da proibição de tratamento desumano e
da tortura (art. 5º, III)” (Direitos humanos fundamentais. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 100).
303
“Não se tratará aqui da comumente denominada inconstitucionalidade direta (imediata) e indireta
(mediata), por não se tratar essa última, como visto, de inconstitucionalidade propriamente dita, mas sim,
tecnicamente, de mera ilegalidade de normas ou incompatibilidade internormativa de nível
infraconstitucional. A classificação que aqui se exporá, utilizando-se a denominação direta/indireta ao
lado da expressão expressa/tácita, toma outro parâmetro que não a relação direta ou indireta da lei com a
Constituição” (TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 5ª ed. São Paulo: Saraiva,
2007, p. 207).
179
Mais adiante o autor afirma, com menção em nota aos autores Pontes de
O próprio STF tem encampado essa teoria [...]. E chega mesmo o Supremo a
falar em “valores suscetíveis de consideração” e em finalidade última do
sistema constitucional, para fins de identificar incompatibilidades com a
Constituição.305
Clèmerson Merlin Clève também abordou a questão, mas asseverou que o caso
Constituição, como sugere Buzaid. Para Clèmerson Clève a norma violada deve ser
constitucionais expressos”.306
ainda que seja uma norma implícita, não pode contrariar as normas explícitas.307
304
Op. cit., p. 207-208.
305
Op. cit., p. 210-211. O autor cita ainda o voto dos Ministros Xavier de Albuquerque e Rodrigues
Alckmin no RHC 53.801-RJ, de 1975.
306
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro, p.
56-57.
307
“La interpretación se halla vinculada a algo establecido. Por eso los limites de la interpretación se
sitúan allí donde no existe algo establecido de forma vinculante por la Constitución, donde acaban las
posibilidades de una comprensión lógica del texto de la norma o donde una determinada solución se
encontrase en clara contradicción con el texto de la norma. A este respecto puede haber disposiciones
vinculantes contenidas en el Derecho constitucional no escrito. Ahora bien, puesto que el Derecho no
escrito no puede hallarse en contradicción con la constituyo scripta [...], esta última se convierte en limite
infranqueable de la interpretación constitucional. La existencia de este limite es presupuesto de la función
racionalizadora, estabilizadora y limitadora del poder que le corresponde a la Constitución [...].” (Escritos
de Derecho Constitucional. Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales, 1983, p. 51-53. Colección
“Estudios Constitucionales”.).
180
Pois bem, nesse sentido, a própria Constituição determina a não exclusão dos
direitos e garantias decorrentes dos tratados internacionais que o Brasil seja parte (art.
5º, § 2º). Trata-se de norma expressa e não implícita. Trata-se de uma norma explícita e
constitucionalidade.
308
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais, p. 102.
181
brasileira) traz amplo catálogo de direitos. Nada obstante, em sua análise acerca dos
aponta como único problema aquele quanto aos direitos fundamentais não formalmente
podem ser considerados “direitos autônomos não reentrantes nos esquemas normativo-
constitucionais”. Por outro viés, o fato de o Supremo Tribunal Federal ter reconhecido,
ainda que de forma bipartida entre seus Ministros, a hierarquia supralegal de um lado e
de outro a hierarquia constitucional já deixou assente que tais instrumentos não fazem
parte do bloco da legalidade. Assim, diante das hipóteses de Canotilho, resta considerá-
constitucionalidade”.
309
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 888-889.
310
Idem, ibidem, p 892.
182
ordinárias, embora não seja esse o foco desse estudo, oportuno considerar essa
comandos;
veiculam.
311
Ingo Wolfgang Sarlet ao tratar da abertura material do catálogo constitucional dos direitos
fundamentais e o princípio da dignidade da pessoa humana como norma desses direitos e mencionar os
direitos de personalidade constantes no Código civil e também o direito aos alimentos, faz referência ao
artigo 16 da Constituição portuguesa nos seguintes termos: “quanto a este ponto, se é verdade que a nossa
Constituição não agasalhou dispositivo idêntico ao previsto na Constituição da República Portuguesa,
onde, no artigo 16, nº 1, restou igualmente consagrada a noção de abertura material do catálogo
constitucional de direitos fundamentais, abrangendo – como deflui da dicção do dispositivo constitucional
citado – até mesmo direitos positivados no plano legal, isto não significa, necessariamente, a
impossibilidade de se reconhecer a existência de direitos formalmente legais mas materialmente
constitucionais entre nós. Há que consignar, contudo, o nosso próprio ceticismo em relação a esta
possibilidade, que, de resto, foi alvo de críticas, mesmo em Portugal, com base no argumento de que não
faria sentido algum termos direitos fundamentais com hierarquia de lei, visto que com isso se estaria a
subverter a própria noção de fundamentalidade, no sentido de uma indisponibilidade das posições
fundamentais pelos poderes constituídos. [...]” (Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais, p.
109).
183
recentemente pelo Min. Celso de Mello, no RE 466343/SP.312 Embora ainda não seja
entendimento unânime, foi seguido por outros ministros, repetiu-se em outros julgados e
assim se fortaleceu além da doutrina. Com isso, ainda que tal decisão seja desprovida de
Quanto aos tratados de direitos humanos que venham a ser elaborados nos
moldes do § 3º do art. 5º, não restam dúvidas de que fazem parte do bloco de
312
“[...] Alienação Fiduciária e Depositário Infiel – 5. O Min. Celso de Mello, entretanto, também
considerou, na linha do que exposto no voto do Min. Gilmar Mendes, que, desde a ratificação, pelo
Brasil, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7) –, não haveria mais base legal para a
prisão civil do depositário infiel. Contrapondo-se, por outro lado, ao Min. Gilmar Mendes no que respeita
à atribuição de status supralegal aos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil,
afirmou terem estes hierarquia constitucional. No ponto, destacou a existência de três distintas situações
relativas a esses tratados: 1) os tratados celebrados pelo Brasil (ou aos quais ele aderiu) e regularmente
incorporados à ordem interna, em momento anterior ao da promulgação da CF/88, revestir-se-iam de
índole constitucional, haja vista que formalmente recebidos nessa condição pelo § 2º do art. 5º da CF; 2)
os que vierem a ser celebrados por nosso País (ou aos quais ele venha a aderir) em data posterior à da
promulgação da EC 45/2004, para terem natureza constitucional, deverão observar o interprocedimental
do § 3º do art. 5º da CF; 3) aqueles celebrados pelo Brasil (ou aos quais nosso País aderiu) entre a
promulgação da CF/88 e a superveniência da EC 45/2004, assumiriam caráter materialmente
constitucional, porque essa hierarquia jurídica teria sido transmitida por efeito de sua inclusão no bloco de
constitucionalidade. RE 466343/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 12.3.2008” (Informativo do STF n. 498, de 10
a 14 de março de 2008). (sem grifo no original)
313
LAMY, Marcelo. Efeitos amplificados das decisões judiciais no controle concreto de
constitucionalidade: uma teoria dos precedentes constitucionais. Tese de Doutorado, PUC/SP, 2008.
314
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado, p. 207.
184
na prevalência dos direitos humanos. Emerson Garcia trata da dignidade humana como
Brasil:
315
GARCIA, Emerson. Dignidade da pessoa humana: referenciais metodológicos e regime jurídico. A
contemporaneidade dos direitos fundamentais – Revista Brasileira de Direito Constitucional (RBDC).
jul./dez. 2004, p. 393.
185
Por oportuno, vale mencionar que embora na decisão não se referiu ao tratado
interamericano sobre a mesma matéria, pode-se afirmar que controlou também, ainda
conforme tal comando internacional. Veja que José de Oliveira Baracho leciona acerca
comparado:
316
ADI 2649/DF. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Julgamento: 08/05/2008. Órgão Julgador: Tribunal
Pleno DJE 197, de 16/10/2008, publ. 17/10/2008. (Disponível em: www.stf.jus.br/jurisprudencia. Acesso
em: 18/11/2008).
317
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Direito processual constitucional. Aspectos contemporâneos.
Belo Horizonte: Fórum, 2008, p. 131.
186
pelo Brasil, vale dizer, não apenas os tratados internacionais elaborados nos moldes do
humanos foi enfatizada no primeiro capítulo como uma das obrigações decorrentes dos
constitucionalidade.
Trindade:
instrumentos.320
318
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de direito internacional dos direitos humanos. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, v. II, p. 551-552.
319
“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: [...] § 5º Nas hipóteses de grave violação de
direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de
obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte,
poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo,
incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal.”
320
Para Pedro Bohomoletz de Abreu Dallari, ao se referir ao mencionado dispositivo: “[...] a sensível
evolução do sistema internacional de promoção dos direitos humanos, inclusive com o desenvolvimento
de uma estrutura jurisdicional destinada a garantir a sua efetividade, claramente serviu de inspiração ao
novo dispositivo” (Tratados internacionais na Emenda Constitucional 45. In: TAVARES, André Ramos.
LENZA, Pedro. ALACÓN, Pietro de Jesús Lora. (Coords.). Reforma do Judiciário analisada e
comentada. São Paulo: Método, 2005, p. 92).
321
AIDAR, Carlos Miguel C. Perspectiva didática dos tratados internacionais. In: AMARAL, Antonio
Carlos Rodrigues do. (Coord.). Tratados Internacionais na ordem jurídica brasileira. José Francisco
Rezek. São Paulo: Aduaneiras, 2005, p. 82.
188
322
HENRIQUES JUNIOR, Fernando do Couto. Conflito entre norma interna e norma de tratado
internacional. In: Tratados Internacionais na ordem jurídica brasileira. In: AMARAL, Antonio Carlos
Rodrigues do. (Coord.). São Paulo: Aduaneiras, 2005, p. 129.
323
Disponível em: www.camara.gov.br. Acesso em: 11 nov. 2008.
189
todo Estado Democrático de Direito. Atualmente, esse controle não pode desconsiderar
também na jurisdição constitucional cujo aspecto mais importante, como lecionado por
responsabilidade primária dos Estados quanto à proteção dos direitos humanos. Se essa
nesse sentido, o que requer a conformidade da legislação interna – e outros atos – com
324
“O tema do controle jurisdicional da constitucionalidade das leis não pode, certamente, identificar-se
com a jurisdição ou justiça constitucional, a Verfassungsgerichtsbarkeit dos alemães. Ela, ao contrário,
não representa senão um dos vários possíveis aspectos da assim chamada ‘justiça constitucional’, e, não
obstante, um dos aspectos certamente mais importantes” (O controle judicial de constitucionalidade das
leis no direito comparado. 2ª ed, Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 1999, p. 24).
190
Constituição.
ainda não está explorado no universo jurídico. A questão aflorou após o advento do §
3º, do art. 5º, da Constituição Federal, o qual confere a equiparação desses instrumentos
pretensão de indicar qual a terminologia mais adequada, mas apenas reafirmar o próprio
interna com os ditames dos tratados de direitos humanos, o que independe da sua
325
Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, vol.I p. 522.
326
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e justiça internacional, p. 99-100.
192
âmbito interno. Há notícia no sentido de que foi Valério Mazuoli quem primeiramente
327
Para Luiz Flavio Gomes: “no Brasil quem defendeu, pela primeira vez, a teoria do controle de
convencionalidade foi Valério Mazzuoli, em sua tese de doutoramento (sustentada na Universidade
Federal do Rio Grande do Sul-Faculdade de Direito, em Porto Alegre, em 2008). Vale a pena destacar
alguns trechos da sua obra: [pág. 227] ‘Para realizar o controle de convencionalidade das leis os tribunais
locais não requerem qualquer autorização internacional. Tal controle passa, doravante, a [pág. 228] ter
também caráter difuso, a exemplo do controle difuso de constitucionalidade, onde qualquer juiz ou
tribunal pode se manifestar a respeito. À medida que os tratados forem sendo incorporados ao direito
pátrio os tribunais locais – estando tais tratados em vigor no plano internacional – podem, desde já e
independentemente de qualquer condição ulterior, compatibilizar as leis domésticas com o conteúdo dos
tratados (de direitos humanos ou comuns) vigentes no país. Em outras palavras, os tratados internacionais
incorporados ao direito brasileiro passam a ter eficácia paralisante (para além de derrogatória) das demais
espécies normativas domésticas, cabendo ao juiz coordenar essas fontes (internacionais e internas) e
escutar o que elas dizem. Mas, também, pode ainda existir o controle de convencionalidade concentrado
no Supremo Tribunal Federal, como abaixo se dirá, na hipótese dos tratados (neste caso, apenas os de
direitos humanos) internalizados pelo rito do art. 5º, § 3º da Constituição.” (GOMES, Luiz Flávio.
Controle de convencionalidade: STF revolucionou nossa pirâmide jurídica . Jus Navigandi, Teresina, ano
13, n. 2033, 24 jan. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12241>. Acesso
em: 20.05.09)
193
consequência do traço comum entre aqueles que consideram tais tratados acima da
legislação ordinária:
A produção do Direito, por exemplo, agora, para além dos limites formais,
conta também com novos limites materiais, dados pelos direitos humanos
fundamentais contemplados na Constituição e nos Tratados de Direitos
Humanos. Rompendo com as concepções clássicas do positivismo legalista,
impõe-se (de outro lado) concluir que nem toda lei vigente é válida. E quando
ela é válida? Somente quando conta com dupla compatibilidade vertical, ou
seja, compatibilidade com o Direito Internacional dos Direitos Humanos
assim como com a Constituição. Conclusão: não basta haver consonância
com apenas um deles (esse é o caso da prisão civil do depositário infiel: ela
está na lei ordinária bem como na Constituição). Isso não é suficiente. A
produção do texto ordinário deve agora observar dois outros ordenamentos
jurídicos (dois outros filtros) superiores. Quando incompatível com qualquer
328
um deles, não possui validade.
texto constitucional.
dos tratados de direitos humanos, já que possuem o mesmo status, e sua inobservância
gera a inconstitucionalidade que pode e deve ser refutada pelo sistema de controle da
328
GOMES, Luiz Flávio. VIGO, Rodolfo Luis. Op. Cit., p.63.
329
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. O controle de convencionalidade das leis. Artigo publicado no
Tribuna do Direito de fevereiro, de 2009, p. 8.
194
art. 5º, § 3º. Para o autor, os tratados não equivalentes às emendas, porque desprovidos
convencionalidade”.
aos meios para tanto aponta aqueles já existentes para o controle da constitucionalidade.
“bloco de constitucionalidade”, ainda que, para ao final, apontar certa norma violada. À
norma violada, que pode ser decorrente do tratado de direitos humanos, chega-se após o
330
Como indicado pelo autor: “Mazzuoli, Valério de Oliveira. Rumo às novas relações entre o direito
internacional dos direitos humanos e o direito interno: da exclusão à coexistência, da intransigência ao
diálogo das fontes. Tese de Doutorado em Direito. Porto Alegre: UFR-GS, 2008, p. 201-241”
195
pode ser compatível com tratado de direitos humanos, embora incompatível com a
331
PUGLIESI, Márcio. Por uma teoria do Direito. Aspectos Micro-sistêmicos. São Paulo: RCS,
2005, p.269.
196
constitucional recebe nova interpretação, como parte de um todo e não como parte
isolada.
nos traz:
Com relação aos problemas levantados pelo autor, quanto ao primeiro deles, o
várias vertentes, a exemplo da competência e dos instrumentos para tanto, já que o caso
332
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p.892-
893.
333
Op. Cit. P.893-894.
197
envolvido no referido julgado chegou àquela Corte por ter questão constitucional e não
efetuado é o da constitucionalidade.
efetuado em âmbito interno requer que os tratados de direitos humanos sejam superiores
à legislação comum, basta hierarquia supralegal, ficando em aberto os meios para tanto.
Este último tópico tem por objetivo ressaltar que o ordenamento jurídico pátrio
Tal relevância foi registrada por José Alfredo de Oliveira Baracho, como segue
sucintamente:
lugar que lhes cabe, o de parâmetros para tal controle, já que a contrariedade da lei (ou
inconstitucionalidade.
334
BARACHO, José Alfredo de Oliveira, Direito processual constitucional. Aspectos contemporâneos. 1ª
reimpressão. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2008, p. 135, 137.
199
meios para tanto, no Brasil, o controle preventivo de leis e atos normativos pode ser
efetuado pelo Poder legislativo, pelo Poder Judiciário e pelo Poder Executivo.
projeto de lei, em especial pelas Comissões de Constituição e Justiça, mas sem prejuízo
inconstitucionalidade.
Supremo Tribunal Federal não reconhece outro legitimado ativo além do parlamentar.
Reconhecer tal direito também aos cidadãos, os representados, e não apenas aos
controle preventivo.
República, o veto jurídico, por motivo de inconstitucionalidade, nos termos do art. 66, §
1º335. Há, todavia, a possibilidade de derrubada do veto nos termos do art. 66, § 4º336.
Tais atos devem ser motivados e sobre eles deve haver algum controle a fim de evitar
335
“Art. 66[...] § 1º Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte,
inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias
úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do
Senado Federal os motivos do veto.”
336
“Art. 66[...] § 4º O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu
recebimento, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores, em
escrutínio secreto.”
200
acoberta com manto da presunção de constitucionalidade e assim, para não gerar mais
efeitos, deverá ter a inconstitucionalidade reconhecida por órgão competente337. Até que
isso venha a ocorrer, se ocorrer, a lei continuará surtindo efeitos como se lei
humanos.
repressivo, que ocorre de forma difusa ou concentrada, como se apontará a seguir. Mas
jurídico, haja vista seus efeitos surtirem apenas entre as partes do processo. Já, quanto
ao controle concentrado, nem todos detêm legitimidade ativa para as ações pertinentes
e, ainda, os efeitos da decisão poderão não retroagir, o que evidencia ainda mais a
337
Conforme Celso Bastos: “Enquanto as leis constitucionais somente perdem a sua validade pelo
surgimento de nova lei, que as revogue, a lei inconstitucional arca com o ônus de um processo específico
de invalidação, qual seja, o de ver sua invalidade declarada por outro órgão, diferente daquele que a
produziu. Em outras palavras, perderá a lei viciada a sua eficácia, na conformidade de um processo
previsto pela própria Constituição para anular as normas que a desrespeitem.” (Curso de direito
constitucional, p. 401).
201
estudo apresenta-se com mais intensidade, já que aqui se mira direitos humanos
ressaltar que a matéria internacional, por si só, é (ou deve ser), por excelência, de
338
KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional. Introdução e revisão técnica de Sérgio Sérvulo da Cunha.
São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 165-166.
202
Os efeitos da decisão no controle difuso são inter pars, mas podem passar a
em que se comunicará tal decisão ao Senado Federal para o fim do disposto no artigo
Ocorre que, como asseverado por Dyrceu Aguiar Dias Cintra Júnior, em
339
“Compete privativamente ao Senado Federal: [...] X- suspender a execução, no todo ou em parte, de lei
declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;”
340
Art. 103- A “O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de
dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que,
a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do
Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem
como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei”. Artigo devidamente
regulamentado pela Lei 11.417/2006.
341
CINTRA JÚNIOR, Dyrceu Aguiar. O Judiciário e os tratados internacionais sobre direitos humanos.
In: Revista Especial do Tribunal Regional Federal 3ª região. Escola de Magistrados. Seminário
203
dos direitos humanos pelos magistrados do Rio de Janeiro. Segue parte do resultado,
Incorporação dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos no direito brasileiro. Coord:
Lucia Figueiredo. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado – Imesp, 1997, p. 62.
342
ibidem, p. 66.
343
“Para a coleta dos dados, realizada entre janeiro e maio de 2004, foram visitadas 225 das 244 varas
cadastradas;4 e em cerca de 40% das varas o questionário não foi preenchido. Os principais motivos da
perda das unidades informantes foram: (1) recusa não-justificada do juiz; (2) recusa do juiz sob a
alegação de que direitos humanos não fazem parte de seu trabalho; (3) não recebimento do pesquisador
pelo juiz.(CUNHA, José Ricardo. Direitos humanos e justiciabilidade: Pesquisa no Tribunal de Justiça
do Rio de Janeiro. In: SUR – Revista Internacional de Direitos Humanos, Número 3 • Ano 2 • 2005, p.
151-152)
204
de direitos humanos por parte daqueles que provocam a jurisdição e, portanto, têm papel
direitos humanos346, o que pode ser feito mediante os mais variados instrumentos.
344
FERNANDES, Pádua. A produção legal da ilegalidade: os direitos humanos e a cultura jurídica
brasileira. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2005, p. 68.
345
“outro caso recente de fiscalização internacional da situação dos direitos humanos no Brasil, a Relatora
sobre Desaparecimentos e Execuções Sumárias da Comissão de Direitos Humanos da ONU, Asma
Jahangir, esteve em missão no Brasil entre 16 de setembro e 8 de outubro de 2003. Para grande
constrangimento das autoridades federais brasileiras, duas das testemunhas que falaram com a relatora
foram assassinadas em seguida. A Relatora declarou, e isso constou do relatório divulgado em 28 de
janeiro de 2004, que era “fortemente recomendado” que o Relator Especial sobre a independência dos
juízes e advogados fosse encarregado de uma missão no Brasil, eis que havia sido constatado que juízes e
jurados sofriam pressões de proprietários de terras e políticos locais, e que havia uma cultura da
impunidade, fruto da ditadura militar. Houve em seguida um clamor do Presidente do Supremo Tribunal
Federal, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior do Trabalho, respectivamente, à época, os
Ministros Maurício Corrêa, Nilson Chaves e Francisco Fausto, eis que identificaram nessa fala uma
suposta intervenção nos assuntos internos do país, uma alegada violação à soberania brasileira. Hélio
Bicudo (2003), que foi Presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, escreveu à época
que o termo usado na tradução da fala da Relatora – fiscalização, que não representa o “exato conteúdo
das atividades de um relator especial” – talvez tivesse causado as equivocadas reações dos presidentes
desses tribunais superiores. O jurista explicou que “A visita de um observador internacional ao Brasil não
significa interferência em nossa soberania [...] Até mesmo um convênio entre o Superior Tribunal de
Justiça e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi celebrado no ano 2000, para uma troca de
experiências [...]”. [...] Curiosamente, o Relator sugerido por Jahangir, Leandro Despouy, veio ao Brasil
em outubro de 2004 sem causar perplexidades ou sofrer entraves por parte do Judiciário brasileiro, pelo
que o equívoco, ou o eclipse, deve ter sido desfeito nessa ocasião. O Poder Executivo brasileiro, como se
viu, já respondeu às críticas realizadas pelos órgãos internacionais de defesa dos direitos humanos
alegando, entre outros fatores, que haveria uma ignorância do Poder Judiciário no tocante às normas
internacionais que interessam às classes mais pobres. Em certas declarações públicas, esse aparente
desconhecimento parece ser confirmado.
346
Segundo Flávia Piovesan: “[...] a aplicação dos tratados internacionais de direitos humanos oferece
relevantes estratégias de ação, que podem contribuir de forma decisiva para o reforço da promoção dos
direitos humanos no Brasil. Observa-se, no entanto, que o sucesso da aplicação dos instrumentos
internacionais de proteção dos direitos humanos requer a ampla sensibilização dos agentes operadores do
Direito no que se atém à relevância e à utilidade de advogar estes tratados junto a instâncias nacionais e
inclusive internacionais, o que pode viabilizar avanços concretos na defesa do exercício dos direitos da
cidadania.[...] (A Constituição de 1988 e os tratados internacionais de direitos humanos In: Revista
205
Segurança, o Mandado de Injunção e a Ação Popular, ainda que se retome aqui a ideia
sofrendo – ou ameaçada de sofrer – violência, por ilegalidade ou abuso de poder (art. 5º,
humanos.
art. 5º, LXIX. Nos tratados internacionais de direitos humanos, é possível encontrar
constitucional obstado por falta de norma regulamentadora (ou outro ato que seja
Especial do Tribunal Regional Federal 3ª região. Escola de Magistrados. Seminário Incorporação dos
tratados internacionais de proteção dos direitos humanos no direito brasileiro. Coord: Lucia Figueiredo.
São Paulo: Imprensa Oficial do Estado – Imesp, 1997. p.47)
347
Para Flávia Piovesan: “possível sustentar que a ‘falta de norma regulamentadora’ invocada pelo artigo
5º, inciso LXXI, seja, pois, definida como ‘omissão de medida para tornar efetiva a norma constitucional’
Acolhendo-se este raciocínio, norma regulamentadora significa toda e qualquer medida para tornar efetiva
a norma constitucional, o que inclui leis complementares, ordinárias, decretos, regulamentos, resoluções,
portarias, dentre outros atos.” (Proteção judicial contra omissões legislativas. Ação Direta de
inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1995, p.
118-119)
206
Mandado de Injunção.
Por fim, a ação popular, prevista no art. 5º, LXXIII, vem proteger o patrimônio
Aqui, também, se pode vislumbrar a propositura de tal ação com base em tratados de
Federal e assim refutar o entendimento advindo de interpretação do art. 105, III, “a”, da
CF/88 equiparando tratado de direitos humanos à lei federal, como se passa a expor.
5.4.2.2 Os arts. 102, III, “a”, “b” e “c” e 105, III, “a”, da CF/88
O artigo 102, da Constituição Federal, traz a seguinte redação na parte que aqui
federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta
Constituição”.
348
MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso
de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 245.
207
disposto na alínea “c”, quando a decisão julgar válida lei local contestada em face de
ao tratado tem esse condão. Também para eventual incompatibilidade material entre
norma de tratado de direitos humanos e norma da Constituição, o meio para dirimir tal
349
FERREIRA, Pinto. Comentários à Constituição brasileira. 4º vl. Arts. 92 a 126. São Paulo: Saraiva,
1992, p. 167.
208
inconstitucionalidade.
decisão recorrida, que reconhecer tal contrariedade, o que gera efeitos somente entre as
extraordinário.
350
TAVARES, André Ramos. A repercussão geral no recurso extraordinário. In: Reforma do Judiciário
analisada e comentada. São Paulo: Método, 2005, p. 215-216.
209
A lei tem de ser cumprida e, caso isso eventualmente não ocorra, deve haver a
tratado à lei federal. Como já se deixou assente, conforme lições de Konrad Hesse, o
intérprete não pode contrariar a norma constitucional; então, não há que se negar tal
competência ao STJ.
Todavia, também aqui, não se deve ter apego à norma isolada e, considerando a
procurado demonstrar até aqui, inevitável afirmar que tal comando se aplica aos tratados
internacionais que não cuidam de tais direitos, porque, para esses, a competência é do
de direitos humanos está contrariando a própria Constituição. Nesse sentido, aceitar que
210
distinção entre tratados de direitos humanos e os demais tratados; atualmente, porém, tal
distinção já consta no próprio texto como se depreende nos artigos 5º, § 3º e 109, § 5º.
Pode-se mesmo afirmar que defender a aplicabilidade do ditame do artigo 105, III, “a”
pátrio.
quando a decisão recorrida julgar válida lei local contestada em face de lei federal,
conforme art. 102, III, “d”, porque se trata de questão constitucional351. Para André
questão constitucional”.352 Daí ser possível concluir que, quando a decisão contraria
351
Nesse sentido também o deslocamento de competência para a ação de executoriedade de lei federal
para o fim de intervenção, que antes pertencia ao Superior Tribunal de Justiça e a partir da EC 45/04 está
com o Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 36, III, p. f.
352
TAVARES, André. A repercussão geral no recurso extraordinário. In: Reforma do Judiciário
analisada e comentada. São Paulo: Método, 2005, p. 210.
211
Veja que, em Portugal, como informa Canotilho - ainda que com certas
85/1989 alterando a Lei n.28/1982, com destaque, pelo autor, aos “aditamentos da
353
Ao tratar de eventual inconstitucionalidade dos dispositivos referidos, o autor nos traz como
fundamento para tanto o fato de que o legislador da 2ª revisão da Constituição naquele país “[...]se
absteve de introduzir um processo de verificação de normas de direito internacional como faz a
Grundgesetz da Alemanha (art. 100º/ II: ‘Normverifikation’, Normqualififikation’). [...]” (Direito
Constitucional e Teoria da Constituição.4ª ed, Coimbra: Almedina, 2000, p. 1012).
354
Segundo o autor: “A LTC absteve-se de falar aqui em ‘inconstitucionalidade’ ou ‘ilegalidade’ [...] A
relação de contrariedade não diz nem mais nem menos do que isto: um acto legislativo está em
contradição com uma convenção internacional. Essa relação de contrariedade assume um desvalor
jurídico-constitucional e é esse desvalor a causa justificativa da sua recusa de aplicação por parte do juiz a
quo. Todavia, a LTC não qualifica aquilo que era preciso demonstrar: se a relação de contrariedade se
reconduz a uma inconstitucionalidade (o que pressuporia a atribuição de valor constitucional às normas
internacionais), se prefigura uma inconstitucionalidade indirecta (o que assentaria também na hierarquia
superior do direito internacional) ou se é reconduzível a uma ilegalidade (o que radicaria na ideia de as
convenções internacionais beneficiarem de um ‘valor legislativo qualificado’ – valor reforçado – em
relação às normas legislativas internas)”. (ibidem, p. 1013).
355
ibidem, p. 1011.
356
Ibidem, p. 1015.
212
Tribunal Federal afirmar, com efeitos erga omnes, que há ou não inconstitucionalidade
por ofensa aos tratados internacionais de direitos humanos. Nesse sentido, ressalta-se o
inconstitucionalidade com efeitos não retroativos ou até mesmo com efeitos para o
futuro358, não influencia nos efeitos jurídicos do tratado desde a sua ratificação, o que
357
MIRANDA, Jorge. A originalidade e as principais características da Constituição Portuguesa. In:
Estudos de direito constitucional: homenagem à professora Maria Garcia. RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes.
BERARDI, Luciana Andréa Accorsi. (orgs). São Paulo: IOB-Thomson, 2007, p. 176.
358
“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de
segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de
dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia
a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado” Redação essa
reproduzida no art. 11 da L. 9882/1999 que regulamenta a Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental.
213
Todavia, é sabido que nem todos os atos são passíveis de controle via Ação
Federal de 1988. Pode ser que venham a fugir desse controle também as normas em
359
RAMOS. André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos. Análise dos sistemas de
apuração de violações dos direitos humanos e a implementação das decisões no Brasil. SP: Renovar,
2002, p. 353.
360
André de Carvalho Ramos registrou tal preocupação: “Não desconhecemos, entretanto, possíveis
dificuldades na utilização de ações diretas de inconstitucionalidade para a implementação de decisões
internacionais diante da atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, leis anteriores à
Constituição de 1988 não podem ser apreciadas pela sistemática do controle concentrado. No caso da
prisão civil do depositário infiel, o principal diploma normativo em quentão é do decreto-lei 911 de 1969,
o que impede eventual uso do controle concentrado de constitucionalidade, caso tal decreto-lei fosse
considerado incompatível com a Convenção Americana de Direito Humanos. Então, resta a alternativa de
alterações constitucionais e legais, ao bom estilo das enabling legislations, para que o Supremo Tribunal
Federal possa ser invocado para fazer valer as decisões internacionais que determinem, em abstrato, a
inconstitucionalidade de alguma lei com diplomas normativos internacionais.” (Processo Internacional de
Direitos Humanos. Análise dos sistemas de apuração de violações dos direitos humanos e a
implementação das decisões no Brasil. SP: Renovar, 2002, p. 352-353). Mas, veja que o autor mencionou
em nota (n.463) após “controle concentrado”, a possibilidade de ADPF.
214
Não há previsão legal do que seja preceito fundamental, ficando, assim, a cargo
do intérprete tal apontamento. Para Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes
fundamentais. Assim, tendo em vista tudo que se considerou nesse estudo, por preceitos
361
“Art. 102 [...] § 1º A arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta
Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.”
362
Dispõe o art. 1º da L. 9882/99: “A arguição prevista no § 1º do art. 102 da Constituição Federal será
proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar lesão a preceito fundamental,
resultante de ato do Poder Público. Parágrafo único. Caberá também arguição de descumprimento de
preceito fundamental: I – quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou
ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição.”
363
ARAUJO, Luiz Alberto David. NUNES JUNIOR, Vidal Serrano, p. 57.
215
Possível, então, entender ter cabimento tal ação diante do descumprimento das
como entende André Ramos Tavares, para quem a tese da subsidiariedade “não é
sustentável constitucionalmente”.367
364
FIGUEIREDO, Marcelo. O controle de constitucionalidade: algumas notas e preocupações. In:
Aspectos atuais do controle de constitucionalidade no Brasil. TAVARES, André Ramos.
ROTHENBURG. (orgs.) Rio de Janeiro: Forense, p. 185.
365
GARCIA, Maria. Arguição de descumprimento: direito do cidadão. Revista de Direito Constitucional
e Internacional. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, ano 8 – julho-setembro – 2000 –
n.32, p. 103. São Paulo: Revista dos Tribunais.
366
“Art. 4º[...], § 1º Não será admitida arguição de descumprimento de preceito fundamental quando
houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.”
367
TAVARES, André Ramos. Tratado da arguição de preceito fundamental. São Paulo: Saraiva, 2001, p.
236 (“sob o título “Caráter principal e não subsidiário:mudança substancial no panorama do controle
concentrado”).
216
por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade (por ação ou por omissão), seja por
Tavares.
para o fim de intervenção federal. A intervenção nem sempre pode ser decretada
36, III, da CF/1988, o qual determina que a intervenção, tendo por hipótese o artigo 34,
Procurador Geral da República”. No artigo 34, VII368, está um rol de princípios e, entre
368
Art. 34 “A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: [...]VII – assegurar a
observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema representativo e
regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da
administração pública, direta e indireta; e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos
estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e
nas ações e serviços públicos de saúde”
369
Veja a notícia: “O Procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, solicitou na terça-feira
07.10 [2008] que o Supremo Tribunal Federal (STF) determine uma Intervenção Federal (IF nº 5.129) no
Estado de Rondônia por violação a direitos humanos no presídio Urso Branco, em Porto Velho.
[...] Antonio Fernando classifica como uma “calamidade” a situação no presídio. Segundo ele, “nos
últimos oito anos contabilizaram-se mais de cem mortes e dezenas de lesões corporais [contra presos],
fruto de motins, rebeliões entre presos e torturas eventualmente perpetradas por agentes penitenciários”.
[...] ‘É induvidoso que, nas circunstâncias político-administrativas presentes [no presídio], hoje, a
217
advier de ato normativo que possa ser objeto das demais ações do controle concentrado,
De qualquer forma o cidadão não tem, como desejável, legitimidade ativa para
tais ações, mas é possível exercer o direito de petição para provocar aqueles
intervenção se torna indispensável, ao menos para assegurar os direitos da pessoa humana”, conclui
Antonio Fernando, após informar que outras ações judiciais foram iniciadas, sem sucesso, no sentido de
minorar a situação da penitenciária e apurar os abusos contra os detentos. O procurador-geral ressalta que
entidades não-governamentais acionaram a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da
Organização dos Estados Americanos (OAE), que, desde 2002, recomenda medidas com o intuito de
solucionar a situação do presídio, mas que muito pouco foi modificado. Em atenção às exigências da
Corte, a Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, composta por
representantes do Governo Federal, estadual e por representantes de entidades não-governamentais e da
OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), reúne-se a cada dois meses para monitorar as atividades do
presídio e cobrar providências. ‘Não obstante o acompanhamento da situação do presídio Urso Branco, as
recomendações determinadas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos não estão sendo
executadas a contento’, afirma Antônio Fernando. Segundo ele, o Estado de Rondônia descumpre uma
dezena de preceitos constitucionais e dispositivos previstos na Convenção Americana de Direito
Humanos, do qual o Brasil é signatário. (Fonte: Consulex, edição 195, 9 de outubro de 2008).
370
RUTHENBURG, Walter Claudius. Intervenção federal na hipótese de recusa à execução de lei
federal, por requisição do STF: leitura e releitura à luz da EC. N.45. In: Reforma do Judiciário analisada
e comentada. . Coords: TAVARES, André Ramos. LENZA, Pedro. ALACÓN, Pietro de Jesús Lora. São
Paulo: Método, 2005, p. 275.
218
com seus comandos. Com isso, foi possível uma releitura da atual sistemática de
controle da constitucionalidade no Brasil, que está apta a acolher tal posição para os
Humanos de 1948. Sob nova concepção para os direitos humanos, com base na
dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais,
ambos de 1966, juntamente com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, formam
interno aos ditames internacionais que se encontram sob uma sistemática de controle e
monitoramento.
já que o regime ditatorial anterior não possibilitava tal inserção. A Constituição de 1988
primou de forma inédita pelos direitos fundamentais desde o seu Preâmbulo. No texto
condição de humanidade como único requisito para ser sujeito de direito com sua
especificação para alguns casos; a indivisibilidade dos direitos civis, políticos, sociais,
formação das próprias emendas constitucionais. Mas, importa enfatizar que tais
por si só, alterar uma norma de tratado internacional. Daí ser possível afirmar que os
221
alterações nos tratados, quando possíveis, dificilmente ocorrem, mesmo porque se trata
superioridade desses instrumentos advém dos seus comandos que informam a produção
sentido e, ainda que de forma geral, o conteúdo da norma interna para estar conforme
seus ditames. Dispõem também que, para tanto, devem ser observados os trâmites
elaborados segundo o novo regramento. Isso porque, ainda que não prevalente o
não há que exigir observância de norma não existente à época da elaboração de tais
instrumentos. A norma não surte efeito para o passado porque assim não dispôs
antes disso, não gozavam de status constitucional, somente a partir de então. Se o caso
de recepção seria apenas para receber tais tratados como se tivessem sidos elaborados
para a denúncia se impõe. Com a efetivação da denúncia nesses termos, o tratado não
surte mais efeitos para o Estado em âmbito internacional. Ainda assim, os direitos
interage com o Direito Internacional dos Direitos Humanos. Sob essa perspectiva, a
mas também por ofensa às normas oriundas dos tratados internacionais de direitos
direitos humanos vem colocar à disposição dos destinatários desses direitos toda a
humanos, resolve-se com os mesmo meios disponíveis para o caso de aparente conflito
critério segundo o qual norma posterior prevalece sobre a anterior. Primeiro porque, no
caso, são normas oriundas de fontes diversas; segundo porque não se busca a
prevalência de uma norma sobre outra, mas a norma que melhor proteja o ser humano.
agora está mais claro com o advento do § 3º do art. 5º da CF. Por outro lado, esses
art. 84, VIII. Quanto ao novo regramento do art. 5º, § 3º, deve ser observado para todos
aspecto formal. Mas caso isso não ocorra, como de fato não vem ocorrendo, não há
224
Legislativo.
direitos humanos, deve ocorrer de forma preventiva, no caso, antes da ratificação, já que
com esse ato o tratado começa a gerar efeitos internacionalmente com possível
estabelecem que, existindo norma mais benéfica, é essa que deve ser prevalecer e ser
basta a não aplicação da norma menos protetiva, esteja na ordem interna ou na ordem
internacional. Não há que falar em responsabilização do Estado por não observar uma
ordem internacional.
implícitas, as normas oriundas dos tratados não trazem dificuldades para sua
responsabilização do Estado por ofensa aos direitos humanos. Isso porque, quando o
225
direitos humanos. Tal concepção, então, não considera apenas o texto constitucional,
desrespeitar tais normas gera inconstitucionalidade, hipótese para qual existe o controle
da constitucionalidade.
acolher os tratados de direitos humanos na posição de parâmetros. Para tanto, basta uma
releitura de tal sistemática que venha a incluir esses tratados nessa posição, o que, como
tratados de direitos humanos. No entanto, caso fuja a esse controle, resta o controle
meios hábeis. Mas, caso não seja esse o entendimento prevalente, caberá então
objetivando a intervenção em Estado-membro, nos termos dos arts. 34, VII e 36, III, já
internacionais.
de petição, por parte dos cidadãos, para provocação dos legitimados ativos nas ações
humanos.
227
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