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José Manuel Moran Marcos T. Masetto Marilda Aparecida Behrens ae te PAPIRUS pc i a a= seca rs ei ns cf Ra A St sa . 4 Capa: Fernando Comacchia Foto de capa: Rennato Testa Copidesque: Lucia Helena Lahoz Morel Revisdo. Maria Licia A. Maier Dados Internacionais de Catalogagéo fa Publicagao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, ‘SP, Brasil) ‘Moran, José Manuel Novas tecnologias e mediagdo pedagdgica/ José Manuel Moran. Marces T. Masetto, Marida Apareckla Behrens. ~ Campinas, SP: Papirus, 2000. - (Colegdo Papirus Educacdo) Bibliogratia. ISBN 85-308-0594-1 4. tnovagées educacionais 2. Tecnologia educacional |. Maselto, Mateos Tarciso, 1997- Il. Behrens, Marida Aparecida. Titulo WV. Série. 00-1585 epp-371.33 indices para catélogo sistematico: 41. Educagiio ¢ tecnologia 371.33 2. Tecnologia e educagao $71.33 Edigao 2009 ae Probida @ reprodugao total ou parcial da obra de acordo com a lel 9.610/98. Editora afiiada a Associagao Brasileira dos Direitos Reprograficos (ABDA). DIREITOS RESERVADOS PARA ALINGUA\ PORTUGUESA: MR. Cornacchia Livraria e Editora Ltda. ~ Papirus Editora R. Dr. Gabriel Penteado, 253 —CEP 13041-305 - Vila Jodo Jorge Foneltax: (19) 3272-4500 - Campinas ~ Sao Paulo ~ Brasil E-mail: editora@ papirus.com.br - www.papirus.com.br 2 PROJETOS DE APRENDIZAGEM COLABORATIVA | NUM PARADIGMA EMERGENTE Marilda Aparecida Behrens As perspectivas para 0 século XX] indicam a educagao como pilar para alicergar os ideais de justiga, paz, solidariedade e liberdade. As transformagées econdmicas, politicas e sociais pelas quais o mundo vem passando sao reais e irreversiveis. A humanidade tem sido desafiada a testemunhar duas transigdes importantes que afetam profundamente a sociedade: 0 advento da sociedade do conhecimento e a globalizagao. A acelerada mudanga em todos os nfveis leva a ponderar sobre uma educagao planetaria, mundial e globalizante. Educar nesse tempo de mundializagao instiga a refletir sobre o processo de globalizagio que tem passado a integrar os sistemas financeiros, econdmicos, politicos e sociais das nagées. Esse contexto torna as nagGes cada vez mais interde- pendentes e inter-relacionadas e, ao mesmo tempo, mais dependentes de uma estrutura econdmica com uma versio neoliberal. Paralelamente, ocorre a transi¢io da sociedade industrial, voltada para a produgao de 67 bens materiais, para a sociedade do conhecimento, voltada para a produ- cio intelectual com uso intensivo de tecnologias. Oprocesso de mudanga eem — a © © eso nos des ne el e J O novo paradigma de ciéncia sustentado pelo advento da fisica quantica tornou-se fato marcante no século XX, em especial nas tltimas décadas, com 0 desmoronamento da proposi¢ao newtoniana-cartesiana. Neste momento hist6rico, a tradicional visao cartesiana, que acompanhou todas as 4reas do conhecimento no século XIX e grande parte do século XX, nao dé mais conta das exigéncias da comunidade cientifica e da, formagao académica dos estudantes exigida na sociedade moderna. A proposigéo mecanicista e reducionista que levou a fragmentagao — divisaio — é um procedimento advindo do pensamento newtoniano- cartesiano, que vem sendo superado pelo paradigma da sociedade do conhecimento que propée a totalidade. A Era das Relagdes (Moraes 1997) exige conexio, inter-relacio- namento, interconexio, visdo de rede, de sistemas integrados. Em suma, trata-se de reconectar 0 conhecimento que foi fragmentado em partes e reassumir 0 todo. A visio de superar nao é fazer desaparecer, mas progredir na reaproximagiio do todo. “Pois 0 todo esta em cada uma das partes, e, ao mesmo tempo, 0 todo é qualitativamente diferente do que a soma das partes” (Cardoso 1995, p. 49). Trata-se da crise e da superagao da matriz epistemolégica cartesiana. O paradigma positivista acentuado pela visio newtoniana-cartesiana, que enseja a racionalidade, a objetividade, a separatividade, a decomposigao do todo em partes fragmentadas, impulsionou para uma formagao aca- démica reducionista. Outro agravante desse paradigma conservador da ciéncia, acentuado pelo advento do mundo globalizado e do pensamento 68 neoliberal, redundou na formagio sectaria, competitiva e individualista, que, em nome da técnica e do capital, parece perder muito da fungiio de buscar formar homens responsaveis, sensfveis e que venham buscar o sentido da vida, do destino humano e de uma sociedade justa e igualitaria. Neste contexto, Régnier (1995, p. 3) alerta: Em meio a uma crise global, de tao graves proporgdes, muito se fala ultimamente em diferentes instdncias das sociedades modernas, em mudanga de paradigma como reconhecimento da necessidade premente de construgao de um novo modelo que, para além dos limites da racio- jade cientifica, crie as condigdes propicias a uma alianga entre ciéncia e conscién . 14240 € intuigo, progresso e evolugio, sujeito e objeto, de tal forma que seja possivel o estabelecimento de uma nova ordem planetéria, As exigéncias de uma economia globalizada afetam diretamente a formagio dos profissionais em todas as reas do conhecimento. Torna-se relevante alertar que o profissional esperado para atuar na sociedade contemporanea exige hoje uma formagao qualitativa diferenciada do que se tem ofertado em um grande ntimero de universidades. O Forum dos Pr6-Reitores de Graduagao das Universidades Brasileiras, em 1999, com base em um trabalho coletivo construiu a proposta de um Plano Nacional de Graduagao, no qual alerta: 69 Por um lado, o papel da universidade relacionado a formagao profissional necessita de uma redefinigao que possibilite acompanhar a evolugio tecnoldgica que define os contornos do exercicio profissional contem- pordneo, considerando a formagao académica como tarefa que se realiza, necessariamente, em tempo diferente daquele em que acontecem as inovagdes. A este dado se acrescenta um outro, 0 fato de que nao se concebe mais um exercicio profissional homogéneo durante perfodo de vida util. (Plano Nacional de Graduagao 1999, p. 7) ‘As mudangas desencadeadas pela sociedade do conhecimento tém desafiado as universidades no sentido de oferecer uma formagao com- pativel com as necessidades deste momento histérico. A visio de terminalidade oferecida na graduagao precisa ser ultrapassada, pois vem. gerando uma crise significativa nos meios académicos. Crise alimentada pela falsa idéia de que ao terminar 0 curso 0 aluno esta preparado para atuar plenamente na profissao. O novo desafio das universidades é instru- mentalizar os alunos para um processo de educagao continuada que devera acompanhé-lo em toda sua vida. Nesta perspectiva, 0 professor precisa repensar sua pratica pedagdgica, conscientizando-se de que niao pode absorver todo o universo de informagdes e passar essas informagoes para seus alunos. Um dos maiores impasses sofridos pelos docentes € justamente adificuldade de ultrapassar a visdo de que podia ensinar tudo aos estudantes. Ouniverso de informagao ampliou-se de maneira assustadoranestas iltimas décadas, portanto 0 eixo da agiio docente precisa passar do ensinar para enfocar o aprender e, principalmente, 0 aprender a aprender. Neste contexto, cabe a recomendacao: - Do ponto de vista da Graduagao em particular, a formagdo para 0 exercicio de uma profissfioem uma era de rdpidas, constantes e profundas mudangas requer, necessariamente, atenta consideragéo por parte das universidades. A decorréncia normal deste processo parece ser a adogiio de nova abordagem, de modo a ensejar aos egressos a capacidade de investigagao e a de “aprender a aprender”. Este objetivo exige o dominio dos modos de produgao do saber na respectiva drea, de modo a criar as condigdes necessérias para 0 permanente processo de educacio conti- nuada, (Plano Nacional de Graduagdo 1999, p. 7) 70 A produgio do saber nas areas do conhecimento demanda agdes que levem o professor e 0 aluno a buscar processos de investigagao e pesquisa. O fabuloso actimulo da informagiio em todos os dominios, com um real potencial de armazenamento, gera a necessidade de aprender a acessar as informagées. O acesso ao conhecimento e, em especial, a rede informatizada desafia o docente a buscar nova metodologia para atender as exigéncias da sociedade. Em face da nova realidade, o professor deverd ultrapassar_seu_papel autoritario, de. dono da verdade, para se tornar um investigador, um pesquisador do conhecimento) critico ¢ palmente, parceiro de seus alunos no processo de aprendizagem. Nesta nova vis&o, 0 professor deve mudar o foco do ensinar para reproduzir conhecimento e passar a preocupar-se com 0 aprender e, em especial, 0 “aprender a aprender”, abrindo caminhos coletivos de busca e investiga- cao para a produgio do seu conhecimento e do seu aluno. Por sua vez, 0 aluno precisa ultrapassar 0 papel de passivo, de escutar, ler, decorar e de repetidor fiel dos ensinamentos do professor e tornar-se criativo, critico, pesquisador e atuante, para produzir conheci- mento. Em parceria, professores e alunos precisam buscar um processo de auto-organizagio para acessar a informagao, analisar, refletir e elabo- rar com autonomia o conhecimento. O volume de informagées nao permite abranger todos os contetidos que caracterizam uma drea do conhecimento. Portanto, professores e alunos precisam aprender a apren- der como acessar a informagao, onde buscé-la e o que fazer com ela Nio se trata de formar os alunos tendo em vista um pensamento oportunista e neoliberal que venha atender somente as exigéncias do mercado de trabalho, mas de buscar uma formagio sintonizada que venha preparé-los para conquistar uma melhor qualidade de vida. Neste con- texto, além de se tornar um profissional competente, precisa tornar-se cidadao critico, auténomo e criativo, que saiba solucionar problemas, e que com iniciativa propria saiba questionar e transformar a sociedade. Em busca dessa transformagio, o aluno deve ser sujeito histérico do seu pr6prio ambiente, buscando desenvolver a consciéncia critica que leve a trilhar caminhos para a construg’io de um mundo melhor. 71 O professor precisa refletir e realinhar sua pratica pedagégica no sentido de criar possibilidades para instigar a aprendizagem do aluno. O foco passa da énfase do ensinar para a énfase do aprender. O processo educativo em todos os nfveis — e em especial no nivel da graduagao nas universidades — deve propor o desenvolvimento de competéncias para atuar em relagfo as circunstancias com que possam se defrontar. Na yerdade, espera-se que os docentes universitarios possam contemplar dois pélos em suas prdticas pedagégicas: formar para a cidadania, como sujeito histérico e transformador da sociedade, e contribuir para a produgio do conhecimento compatfvel com 0 desenvolvimento tecnolégico contemporaneo. Neste contexto, “enquanto participante do desenvolvimento tecnolégico ela [a universidade] ser4é, ao mesmo tempo, critica do modelo econémico globalizado e parceira do setor produtivo. Enquanto promotora da cidadania universal, orientara parte significativa de sua produgiio de saber pelos interesses sociais mais amplos da sociedade” (Plano Nacional de Graduagio 1999, p. 7). Portanto, cabe & universidade oferecer situagGes de aprendizagem com uma formagio humanistica compativel com as exigéncias do mundo contemporaneo. Trata-se de aliar a formagao ético-humanistica aos desafios tecnoldégicos-cientificos, sob pena de construir uma sociedade produtiva e, aO mesmo tempo, agressiva, racional e desumana, acentuando os problemas e as injustigas sociais. O homem precisa se apropriar da técnica e colocd-laa seu servigo, buscando uma melhor qualidade de vida para si e para seus semelhantes. O inegavel desenvolvimento cientifico e tecnolégico leva a refletir sobre a dicotomia homem-mdaquina. Essa ques- tiondvel relagdo precisa adquirir sentido e significado, observando- Sey criteriosamente, os impactos das tecnologias sobre a sociedade e sobre” a cultura. A tecnologia precisa ser contemplada na pratica pedagdgica do professor, de modo a instrumentaliz4-lo a agir e interagir no mundo com critério, com ética e com visao transformadora. 72 A era digital e a aprendizagem colaborativa Os alunos, habituados a freqiientar as aulas sentados, enfileira- dos e em siléncio, teréo que enfrentar uma nova postura nestas proximas décadas. O paradigma antigo era baseado na transmissao do _professor, na memorizagiio dos alunos ¢ numa aprendizagem compe-— titiva e individualista. No paradigma tradicional, a linguagem oral e a escrita sio-con- templadas num processo de repeticao que leva a decorar datas, ntimeros, formulas, enfim, dados que muitas vezes nao tém significado para_os alunos no processo de aprendizagem. Os estudantes traduzem o que conseguiram reter ou decorar e, a0 longo do tempo, essas informagGes sao esquecidas. O professor, muitas vezes ingenuamente, julga que o ensino se consolida pela quantidade de informagGes que sao explicadas para serem decoradas. Por sua vez, os alunos reclamam que mesmo dominando as informag6es nao conseguem aplica-las a uma situagao concreta. Aqui caberia indagar: Por que gastar tanta energia ensinando, se os alunos nao est&o aprendendo? O desafio imposto aos docentes é mudar o eixo do ensinar para optar pelos caminhos que levem ao aprender. Na realidade, torna-se essencial que professores e alunos estejam num permanente processo de aprender a aprender. O desejo de mudanga da pratica pedagégica se amplia na socieda- de da informagio quando 0 docente depara com uma nova categoria do conhecimento, denominada digital. Segundo Pierre Lévy (1993), o conhe- cimento poderia ser apresentado de trés formas diferentes: a oral, a escrita e a digital. Embora as trés formas coexistam, torna-se essencial reconhecer que a era digital vem se apresentando com uma significativa velocidade de comunicagao. Neste processo de enfrentamento oriundo do avango da tecnologia, a escola nao passa impune. Como alerta Kenski (1998, p. 61): 73 O estilo digital engendra, obrigatoriamente, nao apenas 0 uso de novos equipamentos para a produgio ¢ apreensao de conhecimento, mas tam- bém novos comportamentos de aprendizagem, novas racionalidades, novos estimulos perceptivos, Seu répido alastramento e multiplicagao, em novos produtos e em novas 4reas, obriga-nos a nao mais ignorar sua presenga e importancia. O reconhecimento da era digital como uma nova forma de cate- gorizar 0 conhecimento nao implica descartar todo o caminho trilhado pela linguagem oral e escrita, nem mistificar 0 uso indiscriminado de computadores no ensino, mas enfrentar com critério os recursos eletré- nicos como ferramentas para construir processos metodolégicos mais significativos para aprender. A linguagem digital, segundo Pierre Lévy (1999a), apresenta-se nas novas tecnologias eletrénicas de comunicagao e na rede de informagao. O paradigma na era digital, na sociedade da informacio, enseja uma pratica docente assentada na construgao individual e coletiva do conhecimento. Em tal situagao, o professor precisa saber que pode romper bar- reiras mesmo dentro da sala de aula, criando possibilidades de encontros presenciais e virtuais que levem 0 aluno a acessar as informacdes disponibilizadas no universo da sociedade do comhecimento. A rede informatizada contempla 0 registro e a manipulagao dinamica das informa- gGes escritas, sonoras e visuais combinadas. O docente precisa servir-se da informatica como instrumento de sua pratica pedagégica, consciente de que a ldgica do consumo nao pode ultrapassar a l6gica da produgdo do conhecimento. Nessa 6tica, o computador e a rede devem estar a servigo da escola e da aprendizagem. A abertura de novos horizontes mais aproximados da realidade contemporanea e das exigéncias da sociedade do conhecimento depende de uma reflexao critica do papel da informatica na aprendizagem e dos beneficios que a era digital pode trazer para o aluno como cidadio. 74 Para romper com o conservadorismo, o professor deve levar em considera¢ao que, além da linguagem oral e da linguagem escrita que acompanham historicamente 0 processo pedagégico de ensinar e apren- der, € necessdrio considerar também a linguagem digital. Neste processo de incorporagio, ele precisa propor novas formas de aprender e de saber se apropriar criticamente de novas tecnologias, buscando recursos e meios para facilitar a aprendizagem. Portanto, 0 professor, ao propor uma metodologia inovadora, precisa levar em consideragdo que a tecnologia digital possibilita o acesso ao mundo globalizado e a rede de informagao disponivel em todo 0 universo. A sala de aula passa a ser um locus privilegiado como ponto de encontro para acessar 0 conhecimento, discuti-lo, depuré-lo e transformé-lo. As proposigées pedagégicas se ampliam, pois como Kenski (1998, p. 64) alerta: A tecnologia digital rompe com a narrativa continua ¢ seqiiencial das imagens e textos escritos e se apresenta como um fendmeno descontinuo. Sua temporalidade e espacialidade, expressas em imagens e textos nas telas, esto diretamente relacionadas ao momento de sua apresentaco. Verticais, descontinuos, méveis e imediatos, as imagens ¢ os textos digitalizados a partir da conversio das informagoes em bytes tém o seu proprio tempo, seu proprio espago fenoménico da exposigao. Eles repre- sentam portanto um outro tempo, um outro momento revolucionario, na maneira de pensar e de compreender. Os alunos passam a ser descobridores, transformadores € produtores do conhecimento. A qualidade e a relevancia da produgio dependem também dos talentos individuais dos alunos que passam a ser considerados como portadores de inteligéncias miltiplas. Inteligéncias que vao além das lingiiisticas e do raciocinio matematico que a escola ver oferecendo. Como parceiros, professores e alunos desencadeiam um processo de aprendizagem cooperativa para buscar a produgio do conhecin ent O desafio do professor ao propor sud acio docente séré levar em 75 ner (1994) como: espacial, interpessoal, intrapessoal, cinestésico-corporal, lingiiistica ou verbal, l6gico-mateméatica, musical e naturalista. Além do desenvolvimento das inteligéncias nuiltiplas, € fundamental pensar nas oportunidades de desenvolver a inteligéncia emocional (Goleman 1996), necessaria para desencadear a formagao do cidadao. Segundo Magada e Tijiboy (1998, p. 2), “acredita-se que hoje em dia, além da expressao verbal e escrita e do raciocinio matematico (habilidades tradicionalmente consideradas essenciais), faz-se necessdrio o desenvolvimento de novas habilidades ou talentos que incluem a fluéncia tecnolégica, a capacidade de resolver problemas e os ‘3 c’s’ — comunicagdo, colaboragdo e criatividade’’. A inteligéncia emocional alicerga os processos interativos de comunicagao, colaboragao e criatividade indispensdveis ao novo profissional esperado para atuar na sociedade do conhecimento. A for- magao inovadora exigida para atuagdéo em todas as areas do conhecimento demanda trabalho coletivo, discusséo em grupo, espirito de entreajuda, cooperagio, contribuigéo e parcerias. Para desenvolver esses processos, ha necessidade de as universidades oferecerem uma pratica pedagégica que propicie a conquista dessa nova proposigao a partir da sala de aula. A abordagem pedagégica que valorize a aprendizagem colaborativa depende dos professores e dos gestores da educacao, que deverao tornar-se sensiveis aos projetos criativos e desafiadores. Redimensionar a metodolo- gia oferecida dentro da sala de aula demanda contemplar atividades que ultrapassem as paredes das salas, dos laboratérios e dos muros das univer- sidades. As atividades desafiadoras para responder as problematicas existentes necessitam da criagdo de espacos virtuais e presenciais dentro e fora da universidade. A abertura para contatos pela rede informatizada, que, poder ocorrer do professor para 0 professor, do professor para 0 aluno, dos alunos entre si, e dos alunos e professores com os usuarios da rede, propicia a insergao no universo mundial da informagio. Na Era das Relagdes (Moraes 1997), cabe aos gestores e profes- sores derrubar barreiras que segregam 0 espago e a criatividade do 76 professor e dos alunos restritos 4 sala de aula, ao quadro-de-giz e ao livro-texto. Com a visio do desafio para a transformagio da realidade, a autora alerta: Estamos querendo abandonar uma escola burocratica, hierarquica, orga- nizada por especialidades, subespecialidades, sistemas rigidos de controle em fungdes dos comportamentos que se pretende incentivar & manter, dissociada do contexto, da realidade, para construir uma escola aberta, com mecanismos de participacao e descentralizacio flexiveis, com regras de controle discutidas pela comunidade e decisdes tomadas por grupos interdisciplinares proximos dos alunos. (Idem, p. 68) Como usuario da rede de informagGes, o aluno devera ser iniciado como pesquisador e investigador para resolver problemas concretos que LO |pesqui vesugay a Tess gst ocorrem no cotidiano de suas vidas. A aprendizagem precisa ser significa- tiva, desafiadora, problematizadora e instigante, a ponto de mobilizar 0 aluno e o grupo a buscar solugGes possfveis para_serem discutidas e concretizadas a luz de referenciais te6ricos/praticos. O processo de apren- dizagem colaborativa precisa ter presente que a interag&o reconhece: Que sujeito e objeto sao organismos vivos, ativos, abertos, em constante intercdmbio com o meio ambiente, mediante processos interativos indis- socidveis e modificadores das relagdes sujeito-objeto ¢ sujeito-sujeito, a partir dos quais um modifica 0 outro, ¢ os sujeitos se modificam entree si. E uma proposta sociocultural, ao compreender que 0 “ser” se constréi na relago, que 0 conhecimento € produzido na interago com o mundo fi os outros, incluindo aqui sua dimensdo social, dialdgica, inerente 4 0 social, a partir do contato do individuo com a sua realidade, com propria construgdio do pensamento. (Moraes 1997, p. 66) Num mundo globalizado, que derruba barreiras de tempo e espago, © acesso A tecnologia exige atitude critica e inovadora, possibilitando o relacionamento coma sociedade como um todo. O desafio passa por criar e permitir uma nova agao docente na qual professor e alunos participam ag de um processo-conjunto para aprender de encorajadora e que tenha como esséncia 0 didlogo e a descoberta. a inter-relagao e a interdependéncia dos seres humanos, que deverao ser "solidarios acybuscar caminhos felizes para uma vi forma criativa, dinamica, ida sadia deles proprios € __do planetay Neste "proceso, empreender projetos que privilegiem um: relagao dialégica (Freire 1997) e que permitam ao professor e ao aluno aprenderem a aprender, num processo coletivo para a produgao do conhe- ciment¢ A relagio é de parceiros s prob! da cooperagiio e da criativi olidérios que enfrentam desafios de :matizacdes do mundo contemporaneo ese apropriam dacolabora¢ao, significativa, critica e transformadora (Behrens 1996a). Quatro pilares da aprendizagem colaborativa Comissao Internacional sobre Educagao para 0. Arelacao professor-aluno na aprendizagem colaborativa contempla ‘i | dade, para tornar a aprendizagem colaborativa, Jacques Delors (1998) coordenou 0 “Relatério para a Unesco da Século XX1”, no qual aponta como principal conseqiiéncia da sociedade do conhecimento a necessidade de uma educacdo continuada. A aprendizagem ao longo da vida enseja superar a visdo de terminalidade que era atribuida aos cursos, em especial aos de graduagao nas faculda por Delors apresenta para a educagi vida assentada em quatro pilares: aprens aprender a viver juntos © aprender a ser. 78 Como primeiro pilar, o autor aponta © aprender a conhecer: Est tipo de aprendizagem que visa nfo tanto aquisi¢ao de um repertsrio de saberes codificados, mas antes ao dominio dos pr6prios instrumentos do conhecimento pode ser considerado, simultaneamente, como meio ¢ como finalidade da vida humana, Meio, porque se pretende que cada um aprenda a compreender 0 mundo que 0 rodeia, pelo menos na medida em que isso Ihe é necessério para viver dignamente, para desenvolver as * les e universidades. A proposigao manifestada jo uma aprendizagem ao longo de toda der a conhecer; aprender a fazer, suas capacidades profissionais, para comunicar. Finalidade, porque seu fundamento € 0 prazer de compreender, de conhecer, de descobrir. (Delors 1998, p. 91) 3 Com coe visao enfatiza-se ter prazer em descobrir, em investigar, em ter curiosidade, em construir e reconstruir 0 conhecimento. Aprende aconhecer implica aprender a aprender, compreendendo a aprendizagem como um processo que nunca esta acabado. A pesquisa como principio educativo (Demo 1996) torna-se relevante, pois o aprender a aprender supera a “decoreba”, a cdpia e a imitagao. Segundo Gadotti (2000, p. 251), aprender a conhecer implica ter seb prazer de compreender, descobrir, construir ¢ reconstruir o conhecimen- to, —— autonomia, atencao. Indtil tentar conhecer tudo. Isso supde uma cultura geral, 0 que nao prejudica 0 dominio de certos assuntos especializados. Aprender a conhecer € mais que aprender a aprender. Aprender a decorar um volume infindavel de informagées tornou- se tarefa de questiondvel valor, uma vez que pela produgao veloz com que os conhecimentos vém sendo apresentados e renovados eles tendem a envelhecer rapidamente. A visdo ingénua do professor que julga ensinar tudo aos alunos sobre sua disciplina passou a ser impraticavel pois 0 universo das informagGes se estendeu e se ampliou. Portanto, ay que apiesene e decorar contetidos os alunos precisam aprender a acessd-los, a pensar e refletir sobre eles. O aluno precisa ser instigado a buscar 0 conhecimento, a ter prazer em conhecer, a aprender a pensar, a elaborar as informagdes para que possam ser aplicadas a realidade que est4 vivendo. No processo de produzir conhecimento torna-se necessdrio ousar, criar e refletir sobre os conheci- mentos acessados para converté-los em produgiio relevante e significativa. Como segundo pilar, Delors (idem, p. 93) apresenta 0 aprender a fazer, aprendizagem indissociavel do aprender a conhecer, recomenda: 79 continuar a ter o significado simples de Aprender a fazer nao pode, poi preparar alguém para tarefa material bem determinada, para fazé-lo participar no fabrico de alguma coisa, Como conseqiiéncia, as aprendi- zagens devem evoluir e no podem mais ser consideradas como simples transmissio de praticas mais ou menos rotineiras, embora estas conti- nuem a ter um valor formativo que nao é de desprezar. Trata-se, portanto, de ir além da tarefa repetitiva, do ato de repetir © que estd feito, mas sim de buscar o fazer na criagao com criticidade e autonomia. Como conseqiiéncia, o aprender a fazer vem coligado com 0 desenvolvimento de aptiddes que levam a pessoa a atuar na sua profissao com mais competéncia e habilidade. Segundo Gadotti (op. cit., p. 251), a substituiciio de certas atividades humanas por méquinas acentuou 0 cardter cognitivo do fazer. O fazer deixou de ser puramente instrumental. Nesse sentido vale mais hoje a competéncia pessoal que torna a pessoa apta a enfrentar novas situagdes de emprego e a trabalhar em equipe do que a pura qualificagao profissional. Aliando aprender a conhecer e aprender a fazer, 0 professor precisa superar em sua pratica pedagégica a dicotomia teoria e pratica. A teoria e a pratica podem caminhar juntas. O docente deve ter a preocupagio de criar problematizag6es que levem o aluno a acessar os conhecimentos e aplicd-los como se estivesse atuando como profissio- nal. A teoria por si s6 n&o da conta de preparar o aprendiz para aplicd-la. As aptidoes, as habilidades e as competéncias para decodificar as infor- magées e conyerté-las numa agao efetiva tornam-se tarefa importante, pois preparam o aluno para se readaptar As situagdes-problema e estar apto para atuar como profissional. = ‘A obsolescéncia do conhecimento e da tecnologia implica 0 realinhamento e a readaptagio do profissional num curto espago de tempo, pois os empregos definitivos darao lugar a atuacao coletiva, que exigiré flexibilidade e competéncia para saber resolver problemas varia- dos de acordo com a realidade que se apresentar. 80 ; O terceiro pilar apresentado por Delors refere-se ao aprender a viver Juntos, “evar os alunos a tomarem consciéncia das semelhangas e da interdependéncia entre todos os seres humanos no planeta” (idem, p. 97). Acrescenta-se a aprendizagem de conviver harmoniosamente com todos os seres vivos, homens e animais, mar, terra e ar. Gadotti (op. cit., p. 251) interpreta a aprendizagem de viver juntos como “compreender o outro e desenvolver a percepgao da interdependéncia, da nao-violéncia, administrar conflitos. Descobrir o outro, participar em projetos comuns. Ter prazer no esforgo comum. Participar de projetos de cooperagiio”. Observa-se que nestas tiltimas décadas a sociedade e as organizagGes em geral tém enfati- zado a necessidade de os profissionais aprenderem a trabalhar em parceria Portanto, precisam reaprender a viver juntos, a respeitar as indi vidualidades num processo coletivo para aprender e se emancipar. Os pressupostos do paradigma inovador na ciéncia propdem movi- mentos de evolugiio, de interconexio, de entropia, de inter-relacionamento edefendem um pensamento em rede, tal qual uma teia, onde todos os seres vivos interagem e sao interdependentes uns dos outros. Esse movimento qngingu uma crise de dimensGes planetarias, advinda historicamente de um Paradigma que permitiu a separagao, a divisao, a fragmentagiio, levando a uma visio mecanicista do mundo. A evolugao da ciéncia para superar 0 pensamento newtoniano-cartesiano, que prope a fragmentagao, a unicida- de, a parte, vem dando lugar a um pensamento holistico, que busca a reunificagao das partes no todo. A visao de inter-relacionamento, de interconexio e de totalidade, proposta pelo novo paradigma da ciéncia, busca a superagao das verda- des absolutas e inquestiondveis, do positivismo, da racionalidade e do pensamento convergente. Os avan¢os tecnolégicos, cientificos e eletrénicos nao estio tra- zendo a vida em plenitude para o homem. Ao contrario, vieram desafid-lo € angustia-lo, levando-o ao estresse, 4 competitividade exacerbada, a um pensamento isolado e fragmentado, impedindo-o de ver 0 todo e retiran- do a responsabilidade de atos isolados perante a sociedade. Neste 81 passoua destruira Terra (Cardoso 1995). ‘os isolados um todo mbevecido pela tecnologia, ohomem seus semelhantes al, a si mesmo € OS igma alerta que “a natureza nao sao bloc de relagdes entre as varias partes de yundo é um complicado ). Nessa visao, om ctam, Se jnter-relacionam e SC combi- processo, ©! e,em especi O novo paradi mas uma complexa teia unificado” (Capra 1995, p. 41 tecido de eventos que se intercone: nam, determinando a textura do todo. As instituigdes sociais €, em especial, pedagdgicos que ainda neste moment vidual, competitivo & mecanicista. ica pensar coletivamente, uns depende das parcerias, do trabalho coletivo. Portanto, 2 escola ndo refletir sobre @ sucesso dos outros, ecer situagdes de problematizagoes, faze nflitos, pensamen- as escolas precisam rever seus processos to histérico instigam 0 trabalho indi ‘A visao holistica 1mP ndo do precisa ofert realidade, para que 0S alunos aprendam a administrar CO! tos divergentes, yespeitar a opiniao dos outros, saber contra-argumentar sem mpetitividade. Juta, agressdo € CO) iver juntos, propos pedagégicas dos pr se processo seja de A validade do aprender av implica redimensionar as praticas 0. Os professores os niveis de ensin um projeto comum. Os processos cooperacao precisam ser instigado’ preparado para enfrentar as exigencias do nos diversos segmentos. yefere-se a0 aprender a ser. Delors to por Delors (1998), ‘ofessores em todos eos alunos passam a ser parceiros de de entreajuda, de colaboragao, de 3 sob pena de 0 aluno nao estar que a sociedade vem apresentan- que es: recomenda: « vara O desenvolvimento total da pessoa, sensibilidade, sentido estético, responsabi- o deve ser preparado, de, para elaborar [A educagdo deve contribuir e corpo, inteligéncia, tualidad ccagiio que recebe naj espirito lidade pessoal, espiti ecialmente, gragas a edu‘ esp pensamentos autonomose criticos & P porsimesmo, ite valor, de modo a poder decidir circunstincias da vida. (Idem, P- 99) 1c, Todo o ser human avent ara formular os seus proprios jurZos como agir nas diferentes Com essa visa 7 visio 3 rindo ao homem beeetenin superar a desumanizagao do mundo atos, na buscarde a lade de pensamento e responsabilidade oe lesenvolviment« 7 sobre sei contemplar o “de : nto dos processos de < senvol : le aprender a dais mentida sees aire integral da pessoa: ers Py se pensamento auténomo See pessoal. Ce (Gadotti e col. 2000, p a imaginacao, criatividade. anaes 3 2 7 , Pp. % ‘iva’ inteligéncias milti . Trata-se de levar ulti — em con: 0% possibilidade ne as potencialidades dos alunos oe a para criticar, para participar e para cri em plenitude, « ‘a criar. Nestas tiltim: i as décadas, os h racionalidade e BeGasee) OR DOD foram em| : da spear inners panies Destruiram a a —_ Pel umial'visdo oni : lotaram atitude compativel com os aaah. ae ositivista do universo. Cardoso (199: pressupostos de ia pertinente, quando explicita: 5, p. 31) apresente Emresui mo, 0 paradigma cartesi a paradigma cartesiano-newtoniano ori = no orienta o saber e a agiio mente ci pela razdo e : ela experir ai penguins zdo © pela experimentagdo, reve rail ecto ¢ 0 exilio do coragio. O universo. as ee . , Na Sptica mecani oe oa a partir da linearidade ec ina de eo ; + me ae jologia reducionista fragmentou tanto a ie nossa realida- de externa (i mpessoal) quanto ai Bee a na aética individu intema (psfquica). No plano existencial, ’ s val oe sta e os valores materiais cimentam a circulagao do Ter. 1 ser O maravilhoso progresso cientifico-tecnolégico € fruto deste paradigma; odavia, nele residem também as causas da crise multidimensi a _ anisasielastirl Itidi " q vivemos, como a agudizagao da violéncia, da depredagio do ambi gudizac iolénci ag: io do ambiente fisico, social e interior. As divers: nifest ‘sas mal 6 iai Zo sai ete ifes tages sociais de agressao e violéncia nao sac gratu’ as advém de uma formaga vers: igo. ae igo universal i te : que exilou o coragao. A falt: de fe Vv! cee de orban eta e de amor embruteceu a: _ soas : ‘Ss pes: que parecem insensiveis aos problemas de conflito e injustiga social. O capitalismo selvagem do te: do do ee ; ip atte vag ter superou a formagao do ser, sti processo tem subsidiado conflitos relevante: irei : s sobre o direito dos injusti fl justi ¢ados, que niio sao atendidos com dignidade para morar, alimentar-se e educar-se. Por isso, torna-se essencial saber pensar, refletir, para nao ser engolido pela obtengao material em detrimento da formagao pessoal e grupal. Agrega-se a aprendizagem de viver juntos com a de aprender a ser, quando se buscam processos que aflorem a sensibilidade, a afetivi- dade, a paz e 0 espirito soliddrio, que precisam ser resgatados sob pena de os homens se destruirem uns aos outros. Nao se trata de uma visio roméntica, mas de um desafio imposto as escolas, de maneira geral, e as familias, de maneira particular. Cabe a escola tornar possivel o desenvolvimento destes quatro pilares: Aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos, aprender a ser. Os profissionais preparados para 0 século XXI deverao ser criativos, criticos, auténomos, questionadores, participativos e, prin- cipalmente, transformadores da realidade social. Com esse desafio presente, Gadotti (2000, p. 251) atribui a escola a missao de: Amar 0 conhecimento como espago de realizaco humana, de alegriae, de contentamento cultural; cabe-Ihes selecionar e rever criticamente a informagao; formular hipéteses; ser criativa e inventiva (inovar); ser provocadora da mensagem e nao pura receptora; produzir, construire reconstruir conhecimentos elaborados. E mais: numa perspectiva eman- cipadora da educagiio a escola tem que fazer tudo isso em favor dos excluidos. Nao discriminar o pobre. Ela nao pode distribuir poder, mas ber, que é poder. Numa pode construir e reconstruir conhecimentos, perspectiva emancipadora da educacdo, a tecnologia nao é nada sem a cidadania. Neste contexto, a pratica pedagégica do professor precisa desafiar os alunos a buscarem uma formacaio humana, critica e competente, alicergada numa visdo holistica, com uma abordagem progressista, e num ensino com pesquisa que levara 0 aluno a aprender a aprender. O aprendizado deve ser impulsionado pela curiosidade, pelo interesse, pela crise, pela problematizagao e pela busca de solugdes possiveis para 84 aquele momento histérico com a visdo de que nao sao respostas tinicas, absolutas e inquestiondveis. Os docentes desafiados pelo novo paradigma terao que conviver com um processo de mudanga continua, harmoniosa e produtiva. Para construir uma pratica pedagdégica emancipadora sera necessario buscar a qualidade nos relacionamentos, superando a visio de opressores e Oprimidos (Freire 1975) e organizando sua ac¢ao docente numa complexa teia de relagGes e interdependéncia, na qual os trabalhos coletivos e de parcerias exigirao a colaboracao e a participagio de todos. Com essa visdo compartilhada os grupos irdo se renovando a cada ano ¢ os alunos estarao preparados para o enfrentamento das novas agdes € dos novos desafios. O mundo do trabalho indica que as organizag6es buscarao individuos talentosos, criativos, que saibam projetar, analisar e produzir conhecimento. Os profissionais sero contratados para tarefas especiais € temporrias, recebendo mais do que receberiam se continuassem empregados no sistema anterior. As empresas poderao contratar pessoas que se encontram a quilémetros de distancia, atravessando fronteiras por meio de redes eletr6nicas e informatizadas, e Para este desafio os alunos precisam estar preparados, em todos os niveis da formagao e, em espe- cial, na educagdo superior. Paradigma emergente na pratica pedagégica Um paradigma inovador que venha atender aos pressupostos necessarios as exigéncias da sociedade do conhecimento tem sido deno- minado de paradigma emergente por alguns educadores — Boaventura Santos (1989), Moraes (1997), Pimentel (1993), Gutiérrez (1999) e Behrens (1999). Caracterizar um paradigma emergente nao parece tarefa de facil resposta neste momento hist6rico, mas o que se pode garantir, além da multiplicidade de denominagées, é que o paradigma inovador engloba diferentes pressupostos de novas teorias. Por exemplo, Moraes 85 (1997) denomina paradigma emergente a alianga entre as abordagens construtivista, interacionista, sociocultural e transcendente. O ponto de encontro entre os autores que contribuem com seus estudos sobre o paradigma emergente é a busca da visao de totalidade, o enfoque da aprendizagem e 0 desafio de superacao da reprodugao para a producao do conhecimento. O desafio dos cientistas e intelectuais, no sentido da retomada do todo, contamina a educagio e instiga os professores a buscar uma pratica pedagégica que supere a fragmentacao e a reprodugao do conhecimento. O ensino como produgao de conhecimento propée enfaticamente 0 envolvimento do aluno no processo educativo. A exigéncia de tornar © sujeito “cognoscente” valoriza a reflexdo, a agdo, a curiosidade, o espirito critico, 0 questionamento, e exige reconstruir a pratica edu- cativa proposta em sala de aula. a Uma agao pedagégica que leve a produgao do conhecimento e que busque formar um sujeito critico e inovador precisa enfocar 0 conheci- mento como provis6rio e relativo, preocupando-se com a localizagao historica de sua produgdo. Precisa estimular a andlise, a capacidade de compor e recompor dados, informagdes e argumentos. Acrescida da valorizagio da acao reflexiva ¢ da disciplina tornada como capacidade de estudar e de sistematizar 0 conhecimento, instiga o aluno a reconhecer arealidade e a refletir sobre ela (Cunha 1997). A produgao de conhecimento com autonomia, com criatividade, com criticidade e espirito investigativo provoca a interpretagao do conhe- cimento e ndo apenas a sua aceitagao. Portanto, na pratica pedagdgica 0 professor deve propor projetos que provoquem um estudo sistematico, uma investigacao orientada, para ultrapassar a viséo de que o aluno é produto e objeto, e tornd-lo sujeito e produtor do proprio conhecimento. “ A aprendizagem colaborativa precisa ter como referéncia uma pratica pedagégica num paradigma emergente. Para alicergar uma pra- tica pedag6gica compativel com as mudangas paradigmaticas da ciéncia, num paradigma emergente, Behrens (1999) acredita na necessidade de 86 desencadear uma alianga de abordagens pedagégicas, formando uma verdadeira teia, da visao holistica, com a abordagem progressista e com 0 ensino com pesquisa. Essa alianga (Behrens 1998) justifica-se e torna- se necessaria de acordo com as caracterfsticas de cada abordagem: a) O ensino com pesquisa pode provocar a superagéo de reprodu- ¢o para a producao do conhecimento, com autonomia, espfrito critico e investigativo. Considera a pesquisa como principio educativo, portanto o aluno e o professor tornam-se pesquisadores e produtores dos seus préprios conhecimentos. b) A abordagem progressista tem como pressuposto central a transformagao social. Instiga 0 didlogo e a discuss%o coletiva como forgas propulsoras de uma aprendizagem significativa e contempla os trabalhos coletivos, as parcerias e a participagao critica e reflexiva dos alunos e dos professores. c) A visdo holistica ou sistémica busca a superagao da fragmen- tagao do conhecimento, o resgate do ser humano em sua totalidade, considerando o homem com suas inteligéncias multiplas, levando a formagaio de um profissional humano, ético e sensivel. A alianga ou a teia proposta a partir das trés abordagens permite uma aproximagio de pressupostos significativos, cada uma em sua dimensio. Uma pratica pedagégica competente e que dé conta dos desafios da sociedade moderna exige uma inter-relagao dessas aborda- gens e uma instrumentalizagéo com a tecnologia inovadora. Servindo como instrumentos, 0 computador e a rede de informag6es aparecem como suportes relevantes na proposigao de uma agdo docente inovadora. Paradigma emergente numa alianga de abordagens pedagogicas Realizando pesquisas sobre a pratica pedagdgica entre professores universitérios, Behrens (1999) defende, para o paradigma emergente, como ja foi exposto, uma alianga entre os pressupostos da visdo holistica, 87 da abordagem progressista e do ensino com pesquisa, instrumentalizada pela tecnologia inovadora. A conjungio, a interconex4o, 0 inter-relacionamento da teia for- mada por essas abordagens possibilitam a aproximagio de referenciais significativos para a pratica pedagdgica. A dimensio dessa alianga depende da opgao e do aprofundamento teérico-pratico que cada docente tiver 0 entusiasmo e 0 arrojo de construir. A concepgao de uma proposta pedagégica embasada por essas tendéncias demanda exploragéo dos referenciais de cada uma delas, tendo presente que a aproximagio desses pressupostos pode e deve formar um todo. 1. O ensino com pesquisa, proposto por Paoli (1988), por Demo (1991) e por Cunha (1996), defende uma aprendizagem baseada na pesquisa para a produgao do conhecimento, superando a reprodugao, a c6pia ea imitagao referendadas pelo pensamento newtoniano-cartesiano. Busca-se um ensino aliado a pesquisa como principio educativo, e nao apenas como principio cientifico. Essa abordagem contempla a visio de educador que propde uma metodologia que possibilite ao aluno se apropriar, construir, reconstruir e produzir conhecimento. Nao se trata apenas de uma mudanga de método, mas de uma postura pedagdégica. O aluno passa a ser participante e sujeito do seu préprio processo de aprender. A elaboragio e a reelaboragao do conhecimento s4o componentes substanciais da aprendizagem. O alerta de Cunha (1999, p. 3) torna-se pertinente: “O desafio que se coloca para 0 ensino universitario €, pois, fazer com que suas praticas se renovem, a fim de poder dar conta de uma nova perspectiva epistemoldgica, onde as habilidades de intervengiio no conhe- cimento sejam mais valorizadas do que a capacidade de armazeni-lo.” Nesse sentido, passa a ser importante retomar a idéia de indissociabilidade do ensino e da pesquisa como eixo da pratica pedagégica. 88 A concepgao do ensino com pesquisa tem como pressuposto basico 0 processo de produgao do conhecimento. A contribuigao de Paoli (1988) tornou-se relevante ao propor um ensino com pesquisa que instigasse a diivida e a critica, permitindo ao aluno perceber que os contetidos nao estao prontos e acabados, sao produtos de um trabalho de investigagao proviséria que podem modificar, rever, ampliar e transfor- mar as informagGes de acordo com 0 momento histérico. Portanto, s40 provis6rios e adquirem valor para determinada época. Aliado a dtivida e Acritica, o ensino com pesquisa implica trabalhar com 0 aluno e nao para oaluno. Para tanto, o professor deve propor situagdes que levem a acessar o conhecimento para refletir sobre ele e discuti-lo, quebrando as formas lineares que vém sendo apresentadas. Oaprendiz é movido pela diivida, encontra o prazer da descoberta, da investigagio e da pesquisa. Neste processo de aprender a aprender, Cunha (1996, p. 32) propde um ensino baseado em procedimento que: ¢ Enfoca o conhecimento a partir da localizagao histérica de sua produgio e o percebe como provisorio e relativo. e Estimula a andlise, a capacidade de compor e recompor dados, informagGes, argumentos e idéias © Valoriza a curiosidade, 0 questionamento exigente e a incerteza. e Percebe 0 conhecimento de forma interdisciplinar, propondo pontes de relagées entre eles e atribuindo significados préprios aos contetidos, em fungao dos objetivos académicos. e Entende a pesquisa como instrumento do ensino e a extensao como ponto de partida e de chegada da apreensio da realidade. Os procedimentos propostos levam a uma pratica pedagégica que alia agdes que levem a problematizar, observar, comparar, acessar, criticar, sistematizar, produzir conhecimento e se posicionar diante da realidade. 89 Num paradigma de ensino com pesquisa, “o professor torna-se dindmico, articulador, mediador, critico e criativo, provocando uma pratica pedagégica que instiga o posicionamento, a autonomia, a tomada de deciso e a construgdo do conhecimento, atuando como parceiro experiente no processo educativo” (Behrens 1999, p. 91). O ensino com pesquisa como processo educativo necessita de um professor que perceba o aluno como um parceiro, sujeitos do mesmo processo, um questionador, um investigador, que precisa alicergar procedi- mento para desenvolver raciocinio légico, criatividade, posicionamento, capacidade produtiva e cidadania. Neste processo educativo, Demo (1996, pp. 28-29) considera: fundamental que os alunos escrevam, redijam, coloquem no papel 0 que querem dizer e fazer, sobretudo alcancem a capacidade de formular. Formular, elaborar sao termos essenciais da formagao do sujeito, porque significam propriamente a competéncia, medida que se supera a recepedo passiva do conhecimento, passando do conhecimento, passan- do a participar como sujeito capaz de propor e contrapor... Aprende a + duvidar, a perguntar, a querer saber, sempre mais e melhor. A partir dat, surge desafio da elaboragio propria, pela qual o sujeito que desperta comega a ganhar forma, expressao, contorno, perfil. Deixa-se para tras a condigao de objeto. j O processo de produgao de conhecimento considera momentos gradativos de conquista. Segundo Demo (1994), o processo de ensinar pela pesquisa apresenta fases progressivas desde a interpretacdo repro- dutiva, a interpretag4o propria, a reconstrugao, a “construgao”, a criagao e a descoberta. Como unidade indissoltivel, a teoria e a pratica so favorecidas pelo espirito empreendedor do ensino com pesquisa que leva a acessar, analisar e produzir 0 conhecimento. 90 2. A abordagem progressista tem como pressuposto basico a busca da transformagao social. Engloba uma proposta de parceria entre professor e alunos num processo dialégico amoroso (Freire 1993). Os professores progressistas, como intelectuais transformadores, promovem processos de mudanga, manifestando-se contra as injustigas sociais, as atitudes antiéticas, as injustigas politicas e econdmicas. Num processo dialégico, instigam seus alunos a buscar solugGes que permitam aos homens uma melhor qualidade de vida. Responsabilizar os indivi- duos pelos seus atos contra os homens, contra a natureza ¢ contra eles mesmos € possibilitar um processo de reconstrugao da sociedade pela atuacao de profissionais éticos e politicos que sero construtores de suas proprias histérias e do seu pais. Dentro desta perspectiva A reflexao ¢ aco critica tornam-se parte do projeto social fundamental de ajudar os estudantes a desenvolverem uma fé profunda e duradoura na Tuta para superar as injusticas econémicas, politicas € sociais, e humanizarem-se ainda como parte desta luta... Também significa desenvol- ver uma linguagem critica que esteja atenta aos problemas experimentados cm nivel da experiéncia cotidiana, particularmente, enguanto relaciona- dos com as experiéncias ligadas 4 pratica em sala de aula. (Giroux 1997, p. 163) Essa visdo politica do professor leva ao compromisso de tornar possfvel uma aprendizagem significativa, reflexiva, critica e transforma- dora na construgao da cidadania. Neste sentido, a pratica pedagdgica precisa ser problematizadora, levando em consideragao 0 contexto dos ambientes culturais, raciais, hist6ricos, de classe e de género. A propo- sigdo de uma agiio pedagégica progressista vai além da produgao do conhecimento para buscar a formagio de cidadiios, homens e mulheres, &ticos, humanos e solidarios. Os professores e os alunos no sao neutros politica e ideologicamente. Com esta visdo, devem considerar as relagdes sociais em sala de aula, os valores e as atitudes que virio desencadear como construtores e sujeitos de sua prdpria histéria. 91

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