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arte

crítica
política


organização
NUNO CRESPO

Ana Godinho
António Guerreiro
Bruno C. Duarte
Delfim Sardo
Eduarda Neves
Joana Cunhal Leal
Mariana Pinto dos Santos
João Pedro Cachopo
Jorge Figueira
José Gil
Margarida Medeiros
Maria Filomena Molder
Miguel Wandschneider
Pedro Lapa
Ricardo Carvalho
Rosa Maria Martelo

L I S B O A
T IN TA‑DA‑CHIN A
M M X V I
Este trabalho é financiado por Fundos Nacionais
através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia
no âmbito do projecto UID/PAM/00417/2013. ÍNDICE

9 APRESENTAÇÃO
Nuno Crespo

23 A CRÍTICA SEGUNDO PESSOA: INTUIÇÃO E DESPERSONALIZAÇÃO


Nesta edição, respeitou‑se Ana Godinho
a opção ortográfica de cada autor. 33 O ENSINO DA ARTE E O TRABALHO DE LUTO
António Guerreiro
43 CITAÇÃO DA CRÍTICA.WALTER BENJAMIN POR FRIEDRICH SCHLEGEL
© 2016, Autores e Edições tinta‑da‑china, Lda. Bruno C. Duarte
Rua Francisco Ferrer, 6A
1500 ‑461 Lisboa 77 DIVIDIR E COSER: UMA OPINIÃO SOBRE A RELAÇÃO
Tels.: 21 726 90 28/9 ENTRE CRÍTICA E CURADORIA
E ‑mail: info@tintadachina.pt Delfim Sardo
www.tintadachina.pt
85 UM CRÍTICO NA ÉPOCA DO CINISMO AVANÇADO
Eduarda Neves
Título: Arte. Crítica. Política
Organização: Nuno Crespo 93 AS «SETE CABEÇAS» DO MODERNISMO
Autores: Ana Godinho, António Guerreiro, Bruno C. Duarte, Delfim Sardo, Joana Cunha Leal | Mariana Pinto dos Santos
Eduarda Neves, Joana Cunhal Leal, Mariana Pinto dos Santos, João Pedro 113 PARA ALÉM DO JUÍZO: A CRÍTICA DE ARTE COMO TRADUÇÃO
Cachopo, Jorge Figueira, José Gil, Margarida Medeiros, Maria Filomena João Pedro Cachopo
Molder, Miguel Wandschneider, Pedro Lapa, Ricardo Carvalho, Rosa Maria
Martelo
133 HOUSTON, WE HAVE A PROBLEM. O FIM DA CRÍTICA DE ARQUITECTURA
Jorge Figueira
Revisão: Tinta‑da‑china
Composição : Tinta‑da‑china 147 O NEXO DA CRÍTICA
Capa: Tinta‑da‑china (V. Tavares) José Gil
157 FOTOGRAFIA, ARTE, CRÍTICA. A CADEIRA DO JUIZ QUE FICOU VAZIA
1.ª edição: Dezembro de 2016 Margarida Medeiros

isbn: 978 ‑989 ‑671‑329 ‑4 173 COM A VOZ TORVA E SEM ARREPENDIMENTO
depósito legal n.º 418096/16 Maria Filomena Molder
211 A CRÍTICA DE ARTE EM PORTUGAL HOJE. ANÚNCIO DE UMA MORTE,
AUTÓPSIA (PRELIMINAR) DE UM CADÁVER
Miguel Wandschneider
215 POÉTICA E POLÍTICA NO FIM DO SÉCULO XX EM PORTUGAL
Pedro Lapa
231 INCERTEZA, CRÍTICA E ARQUITECTURA
Ricardo Carvalho
APRESENTAÇ ÃO
245 ARROGÂNCIA E MORTE… OU NEM TANTO?
Rosa Maria Martelo

259 AGRADECIMENTOS
261 NOTAS BIOGRÁFICAS
Esta obra conjunta nasceu do trabalho do grupo de investigação
Arte. Crítica. Política. do Instituto de História da Arte, Faculda‑
de de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa.
Trata‑se da primeira iniciativa editorial e resulta da necessidade
de prolongar a discussão ocorrida em Junho de 2014, durante um
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colóquio organizado por André Silveira, Bruno Marques, Gabrie‑
la Raposo e eu próprio.

apresentação
O conjunto de textos aqui reunidos apresenta uma topogra‑
fia incerta, enquadrando‑se em áreas do saber distintas: arte,
estética, filosofia, literatura, história, política e teoria da arte. É
uma indefinição necessária, porque o campo científico e disci‑
plinar daquilo a que podemos chamar crítica não só não se dei‑
xa circunscrever, como convoca um conjunto de problemas que
importa resgatar do esquecimento e da inactualidade que a con‑
temporaneidade lhe conferiu. Cítica, aqui, expressa um modo
de pensar para o qual as formas artísticas materiais produzidas
por artistas e poetas são momentos privilegiados de reflexão,
e encontram na crítica uma possibilidade de sistematização e
conhecimento.
Este livro, de alguma forma, insurge‑se contra o putativo fim
da crítica e a sua substituição por sistemas institucionais, culturais
e artísticos imunes a qualquer juízo e disputa, mostrando como o não permitir fixar e estabilizar um método crítico ou encontrar
enfraquecimento da palavra crítica implica um fechamento polí‑ uma definição do que é a crítica. Esta indefinição expressa a
tico do campo artístico ao debate, ao pensamento e à sociedade. fertilidade e potência da palavra da crítica, porque exige daque‑
A ideia de crítica que neste livro trazemos à discussão combate este le que se envolve nas coisas da crítica sujeitar‑se a uma dupla
estado de coisas e propõe retomar o entendimento da produção tensão: a primeira é cognitiva e diz respeito à procura do modo
artística, nas suas modalidades mais diversificadas, como campo correcto de ver, perceber, experimentar uma obra; a segunda é
de conhecimento e investigação que convoca um vasto conjunto uma tensão linguística, porque o crítico se vê obrigado a pro‑
de ferramentas; não procede por exclusões, mas pela afirmação da curar as palavras certas para dizer o objecto da sua experiência.
pluralidade de meios, conceitos e abordagens; posiciona o valor ar‑ Estas tensões, longe de ficarem resolvidas, vivem em estado de
tístico não como decorrente da visibilidade, da comunicabilidade, permanente nascença, porque, de cada vez, o crítico, face a uma
da circulação e das lógicas culturais dominantes, mas a partir da nova obra – que é um problema –, tem de encontrar o melhor lu‑
sua pertinência enquanto experiência reflexiva que importa deba‑ gar para a conhecer e, depois, as melhores palavras para a poder
ter. Trata‑se não só de sublinhar a relevância da crítica enquanto dizer.
momento reflexivo necessário à construção do objecto artístico, O entendimento de crítica – enquanto crítica de arte – aqui em
mas igualmente rever o seu âmbito de actividade, contribuindo causa não pretende torná‑la lugar da fixação do valor dos diferen‑
para a revalidação da sua autonomia e pertinência disciplinar. Ao tes objectos com que lida, mas pretende mostrar que o gesto críti‑
mesmo tempo, procuramos mostrar como o pensamento crítico, co é, sobretudo, a tomada de posição num debate que as obras de
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nas suas diferentes expressões, é um elemento decisivo para o de‑ arte iniciam (seguindo a sugestão de Walter Benjamin). Ter con‑
senvolvimento inteligente das comunidades humanas. dições para dizer algo neste debate é a melhor descrição da tarefa

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arte. crítica. política

Para não fechar a discussão no âmbito dos especialistas em da crítica. Não se trata de conquistar um ponto de vista neutro,
crítica da arte e na tão acesa polémica que opõe crítica, curado‑ até porque, ainda segundo Benjamin, no que toca às questões da
ria, história da arte, museologia e teoria, os diferentes contribu‑ crítica, imparcialidade e neutralidade são expressões de incom‑
tos para esta obra conjunta não apresentam qualquer predomínio petência, mas de pôr a descoberto a natureza das obras de arte
disciplinar. Nascem, contudo, de uma inquietação: saber sob que enquanto objectos de conhecimento. Que as obras de arte impli‑
condições se pode pensar criticamente as diferentes criações hu‑ cam participação, no sentido em que o seu valor se cria e se recria
manas, mostrando que o modo como se pensa e faz arte tem im‑ através das experiências que elas provocam, e que são lugares de
portantes consequências na organização das comunidades huma‑ pensamento livre é uma herança kantiana que parece perdida nos
nas. Assim, este conjunto de textos ambiciona não só contribuir tempos actuais. Um dos sintomas desta perda é, por exemplo, a
para o debate específico da crítica de arte, mas também para o substituição da crítica por sistemas de promoção e divulgação, ou
desenho do seu possível mapa de questões e para a exploração dos seja, a substituição da crítica pela publicidade e do crítico pelo
problemas cuja reflexão e discussão importa ainda aprofundar. publicista. Assumir uma posição neste debate é justamente o que
A maneira como arquitectura, arte, filosofia, história da arte, esta obra conjunta ambiciona.
literatura e poesia surgem lado a lado constitui um problema por
Dada a natureza tão polimórfica dos conceitos, práticas e lingua‑ desfazem‑se alguns equívocos, nomeadamente aquele que faz do
gens utilizadas pelos autores dos textos deste livro, optou‑se por texto crítico um poema e do crítico um poeta. A relação com‑
organizar os diferentes contributos por ordem alfabética, sem plexa que Bruno Duarte se propõe esclarecer é a existente entre
qualquer hierarquia entre autores e os diferentes temas discutidos o ideal da crítica em Schlegel e o ideal da citação em Benjamin,
nos seus textos. traçando o quadro complexo das tensões, proximidades e dife‑
Assim, no texto de Ana Godinho encontramos Fernando Pes‑ renças existentes entre esses dois ideais. E é a partir desta dis‑
soa e as condições necessárias para o exercício da crítica. O críti‑ cussão que o próprio conceito de crítica e de crítico ganham a
co, tal como surge nestas linhas, não é porta‑voz de qualquer tipo sua espessura e especificidade.
de sentimentalismo ou pensamento comum, mas antes lugar de Mas se a crítica de arte ocupava um lugar privilegiado no cam‑
cruzamento entre cultura e sensibilidade. E só a reunião destas po das artes visuais, nos tempos mais recentes ela tem conhecido
«competências» permite ao crítico, diz Pessoa, chegar ao novo e alterações de formato, de contexto e, sobretudo, de força. Con‑
à original novidade. A pergunta que orienta a leitura de Pessoa à tudo, de acordo com Delfim Sardo, estas alterações não consti‑
luz da prática da crítica de poesia é que preparação deve ter o crítico? tuem razão suficiente para falar de um tempo pós‑crítico, dada a
E na tentativa de resposta Ana Godinho apresenta o crítico como aparente e corrente desvalorização da crítica face à curadoria. E é
sujeito de dois devires fundamentais: um devir‑imparcial, que im‑ na relação entre estas duas disciplinas que se desenvolve o argu‑
plica o poder de despersonalização, e um devir‑artista, absoluta‑ mento de Sardo: a conversão da crítica em curadoria, defendida
mente necessário para o seu trabalho crítico, que implica um trabalho por muitos autores, é impossível não só porque se tratam de dis‑
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sobre a intuição. ciplinas distintas, mas também porque as suas ambições e pro‑
A crítica enquanto momento reflexivo da arte, ou seja, en‑ cessos são totalmente diferenciados. A crise da crítica é uma crise

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arte. crítica. política

quanto gesto de a arte se pensar e conhecer a si própria, é o que enquanto instância judicativa: já não se espera da crítica a fixação
António Guerreiro traz para a discussão. O seu contributo foca‑ do valor das obras de arte, mas o gesto crítico deve assumir fisio‑
‑se na relação entre o ensino da arte e o necessário trabalho de nomias diferentes e, por exemplo, metamorfosear‑se em ensaio.
luto que esse ensino implica. O autor, partindo de Walter Benja‑ O cinismo como característica dominante do nosso tempo é o
min, explora a semelhança entre o destino das Escolas de Belas‑ mote do ensaio de Eduarda Neves, e é nesse contexto que a autora
‑Artes e o destino da crítica: pertencem a um tempo que parece já tenta enquadrar o crítico actual. Por um lado, é feito um diagnós‑
ter passado e foram substituídas por consensos culturais e por figuras tico da crise da crítica, convocando as importantes ferramentas
de promoção. conceptuais de Sloterdijk para descrever o trabalho administrativo
Bruno Duarte mostra que a crítica está sempre relacionada em que a crítica se transformou; por outro lado, este diagnósti‑
com o conceito de kunstkritik herdado de Walter Benjamin, e co propõe uma reflexão sobre as condições do exercício crítico,
que este herdara dos primeiros românticos alemães e, mais es‑ mostrando que está em causa um modo de pensar, de agir e de
pecificamente, de Friedrich Schlegel. No seu texto assiste‑se à transformar.
recuperação dos momentos essenciais do quadro onde se vê sur‑ As «7 cabeças» do Modernismo, de Joana Cunha Leal e Mariana
gir aquilo a que corresponde o bom crítico e, simultaneamente, Pinto dos Santos, é um importante contributo para a discussão
acerca do modernismo, retomando a discussão sobre as concep‑ tectura deteve poderes reguladores e normativos, até ao tempo
ções de arte, de história e, naturalmente, de crítica protagoniza‑ em que desembocou numa crise que é simultaneamente crise da
das por figuras‑chave da construção das narrativas da história da crítica, da arquitectura e do mundo.
arte portuguesa. Almada Negreiros, José Augusto França, Ernes‑ No texto de Ricardo Carvalho, a arquitectura é pensada não
to de Sousa e António Ferro protagonizam um debate que ex‑ a partir dos habituais constrangimentos impostos pelo terreno,
pressa a complexidade e o contexto histórico e político de produção de orçamento, programa, tempo, etc., mas a partir do modo como
modernismos. articula criticamente todas essas realidades. Trata‑se de pensar a
João Pedro Cachopo, à semelhança de Delfim Sardo, retoma prática da arquitectura a partir das dúvidas, questões e reacções
a ideia de o destino judicativo da crítica dever ser ultrapassado. que levam o arquitecto à escolha. E é este processo teórico, refle‑
Mas, se no caso de Sardo é a crítica enquanto ensaio que surge xivo e prático, ou seja, esta concepção metodológica do projecto
como alternativa, aqui explora‑se o modelo da crítica enquanto em arquitectura que surge neste texto como actividade crítica.
tradução. Não se trata só de contrastar uma putativa negativida‑ Trata‑se da possibilidade de entender o gesto criativo enquanto
de do gesto crítico versus a positividade da tradução, que restitui, gesto crítico.
aproxima e torna acessível. O argumento de Cachopo é que esta Porque é que os pintores desejam tanto que se escreva sobre
aproximação permite exercer crítica enquanto arte da emancipa‑ a sua obra? Por que razão as obras de arte revelam tão grande ne‑
ção e não do embrutecimento. Um ideal de emancipação que subjaz cessidade do que está fora delas? E por que razão à autonomia da
ao esforço do crítico, cuja máxima é o incitamento ousa julgar. Ao arte se contrapõe a necessidade do espectador, do crítico, do fi‑
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tema kantiano da ousadia do julgar junta‑se neste ensaio a ideia lósofo? Estas são algumas das questões que José Gil desenvolve
benjaminiana da tradução enquanto mediação. A originalidade do no seu ensaio. O fio condutor do texto prende‑se com a maneira

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arte. crítica. política

argumento é que a crítica enquanto tradução não é uma simples como a crítica, entendida enquanto trabalho na linguagem, é um
mediação entre a arte e o público, mas uma actividade reflexiva de movimento de aproximação, forte e necessário, ao nexo das obras
aproximação ao original: uma ideia de crítica que implica trans‑ de arte.
formar as ideias de crítico, de público, de espectador e de obra. A fotografia e o seu lugar no contexto das representações ar‑
Se a arte e, mais especificamente, as artes visuais são cen‑ tísticas é o elemento central do texto de Margarida Medeiros. De
tros a partir dos quais irradiam muitas das questões abordadas que forma uma tecnologia industrial pode conter conceitos como
pelos vários textos, a arquitectura também possui um papel re‑ o de criação e de criador e, assim, ser lugar de configuração de
levante no pensamento que aqui tentamos construir. Pela mão uma nova realidade estética que exige do seu crítico novas moda‑
de Jorge Figueira, dá‑se conta do paradoxo contemporâneo lidades reflexivas e conceptuais? Qual é o lugar seguro que o juiz
de nunca terem existido tantas possibilidades de agir critica‑ das artes deve ocupar no debate entre a realidade que a fotografia
mente na realidade e, simultaneamente, de a crítica se revelar apresenta, assumindo‑se como seu documento, e o território da
tão impotente na sua tarefa de regular. Como escreve Figueira: imaginação que a fotografia reclama como seu? E, face a este de‑
o relativismo cultural enlouqueceu o exercício da crítica. Este texto é bate, quais são as condições necessárias para que o crítico possa
uma viagem que parte dos momentos em que a crítica de arqui‑ criticar? Independentemente da sua especificidade no campo da
fotografia, estas perguntas são centrais para o entendimento da Concentrando‑se num grupo de práticas artísticas activas
crítica enquanto campo de questionamento das obras de arte e principalmente no final do século xx, Pedro Lapa mostra a sua
das suas relações com o mundo. inscrição naquilo que podemos considerar uma arte crítica. Isto é,
Segundo o poeta Joaquim Manuel Magalhães, a crítica designa dinâmicas criativas desenvolvidas a partir de uma relação crítica
uma posição de incompreensibilidade face à obra, por isso só o não só com a arte, mas com a própria realidade. O lugar de criação
próprio poeta pode ser o seu crítico. Errando falarão de ti é a evi‑ foi, para estes artistas, uma reflexão sobre o lugar produtor do sistema
dência que alimenta o trabalho de reconstrução da totalidade da da cultura, e a sua estética entendida enquanto processo crítico re‑
sua obra poética, que Maria Filomena Molder convoca e descreve, lativo às lógicas dominantes do consumo, da espectacularização e
numa tentativa de compreender, a partir de dentro, o modo de o das discursividades dominantes no mundo da arte.
poeta ver a sua própria obra e, assim, tentar acompanhar as suas
exigências de leitura, compreensão e experiência. Este texto é Nuno Crespo
uma forma de enfrentar aquela obra poética a partir do gesto poé‑
tico da destruição; por isso, a pergunta recorrente é: quem pode
ler estes poemas? Esta questão implica pensar sobre o que é um
leitor e como é possível ler sem trair uma obra.
As relações entre a poesia e a sua crítica são também o moti‑
vo de reflexão de Rosa Maria Martelo. A partir de experiências
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poéticas concretas, a autora tenta analisar o aparente movimento
contrário que podemos encontrar na poesia entre a sua pretensão

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arte. crítica. política

à distinção, que constitui a sua singularidade, e ao mesmo tempo


a possibilidade da integração e transformação dessa singularidade
em cultura, ou seja, em coisa comum, social, comunicável. A crítica,
neste contexto, assume não uma função reguladora, apresentando‑
‑se antes como um combate pela abertura de espaço para que a poesia
possa irromper, interromper e abrir fissuras na massificação.
A situação portuguesa em termos do exercício crítico surge
nos textos de Miguel Wandschneider e de Pedro Lapa. No primei‑
ro, é declarada a morte da crítica em Portugal, e propõe‑se a sua
autópsia preliminar. Um texto com valor de diagnóstico, que cha‑
ma a atenção para a secura e infertilidade do exercício da crítica
no nosso país, mostrando como se trata de uma crítica domesti‑
cada, que evita a experiência de desfamiliarização produzida pela
arte e que, para Wandschneider, é essencial na actividade crítica.

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