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Trabalho Enfase Luciane
Trabalho Enfase Luciane
MÓDULO DA ALTERIDADE
PORTO ALEGRE – RS
2016
INTRODUÇÃO
2 ROLNIK, S. Subjetividade, ética e cultura nas prática clínicas. Reelaboração de uma palestra... ,p.1.
3 FOUCAULT, M. Em defesa da Sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 304.
Essa inquietação é devida aos impactos subjetivos e sociais derivados das
experiências das vivências como vítimas de um sistema de privilégios de brancos e
prejuízos de negros, pautado em práticas racistas que estigmatizam e inferiorizam a
população negra.
Para estudar as representações sociais do racismo é preciso que lancemos mão de
alguns conceitos, como alteridade, intersubjetividade e identidade, conforme sugerido por
Jodelet (2001) e Guareschi (2001). Os estudos de representações sociais que perpassam
questões referentes ao racismo têm situado a ocorrência deste fenômeno como
decorrência da instauração de uma alteridade-radical, fruto da fenda social existente entre
brancos e negros (JODELET, 2001).
Entende-se como alteridade4 a relação de sociabilidade e diferença entre o
indivíduo em conjunto e a unidade, onde os dois sentidos inter-dependem na lógica de
que para constituir uma individualidade é necessário um coletivo. Dessa forma eu apenas
existo a partir do outro, da visão do outro, o que me permite também compreender o
mundo a partir de um olhar diferenciado, partindo tanto do diferente quanto de mim
mesmo, sensibilizado que estou pela experiência do contato.
Pensando sobre o racismo, entende-se que se trata de um processo que se dá no
nível da intersubjetividade, campo onde as representações sociais surgem. Neste sentido,
é na dinâmica eu X outro, das relações sociais, que emergem representações situando
identidade e alteridade. Dentro de qualquer cultura há pontos de tensão e de fratura, e é
ao redor desses pontos de clivagem no sistema representacional duma cultura que as
novas representações emergem. Nestes pontos de clivagem há uma falta de sentido, um
ponto onde o não-familiar aparece. Assim, da mesma forma como a natureza não aprecia
o vácuo, assim também a cultura não suporta a ausência de sentido, engendrando
elaborações representacionais para familiarizar o não-familiar, e assim, restabelecer um
sentido de estabilidade (JODELET, 2001).
Para o considerado grupo dominante “branco”, o negro constitui-se como um
sujeito de características físicas e culturais que fogem daquilo que “deveriam” ser, uma
vez que diferem enormemente da “norma” branca. Assim, com o intuito de “familiarizar” a
não-familiaridade negra, o grupo hegemônico tece representações sociais que, de um
lado, desqualificam o negro, e de outro buscam assimilá-lo, levando-o a aderir a
representações sociais e identidades brancas.
4 https://pt.wikipedia.org/wiki/Alteridade
De acordo com Jodelet (2002) a alteridade é um duplo processo de construção e
de exclusão social que, indissoluvelmente ligados como os dois lados duma mesma
moeda, mantêm sua unidade por meio dum sistema de representações. Assim, a
perspectiva aberta pela abordagem das representações sociais fornece os meios para se
levar em consideração as dimensões simbólicas subjacentes a toda relação com a
alteridade. Colocar em perspectiva as relações com o outro, a pertença social e a sua
tradução nas manifestações concretas da vida e da produção social abre caminho para a
aproximação à alteridade radical. Esta última terá sua expressão ideal-típica e extrema no
racismo, considerado um “fenômeno total”, na medida em que se constrói ao mesmo
tempo nas práticas e discursos, supondo representações, teorização e organização dos
afetos. No quadro das práticas perfazem-se as diferentes formas de violência, desprezo,
intolerância, humilhação, exclusão; os discursos veiculam representações e teorias.
Essas representações se caracterizam por serem elaborações intelectuais de um
fantasma de inspeção, sondagem e vigília. Articuladas em torno das marcas da diferença,
elas estariam constantemente retomando a necessidade de purificar o corpo social,
proteger a identidade de si e do nós de toda promiscuidade, de toda mestiçagem tidas
como risco de invasão. As teorias, por sua vez, seriam “racionalizadas” por intelectuais.
Essas representações e teorias organizam os afetos cuja forma obsessiva e irracional
conduz à elaboração de estereótipos que definem tanto os alvos quanto os portadores do
racismo. Tal combinação de práticas, discursos, representações, estereótipos afetivos vai
explicar ao mesmo tempo a formação de uma “comunidade de racistas” entre os quais
existem laços de imitação, e da pressão que leva as vítimas do racismo a se aperceberem
como comunidade (JODELET, 2001).
Neste sentido, que a invisibilidade do sujeito negro na sociedade brasileira ganha
novas formas quando é implementado um sistema de reserva de vagas para indivíduos
negros na educação superior pública. É, então, que se passa a enxergar o indivíduo
negro. A alteridade negra é posta, de forma escancarada, sobre os privilégios do grupo
dominante. É neste contexto que todo o passado histórico se revela ainda atual.
Referências Bibliográficas
JODELET, D. A alteridade como produto e processo psicossocial. In: Arruda Angela (org),
Representando a alteridade. 2ª edição. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.