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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

Reitor Diretora da Faculdade de Arquitetura


Carlos Antonio Levi da Conceição e Urbanismo
Denise Barcellos Pinheiro Machado
Pró-Reitor de Planejamento,
Desenvolvimento e Finanças Coordenadora do Programa de Pós-
Carlos Rangel Rodrigues -Graduação em Urbanismo
Rachel Coutinho Marques da Silva
Decana do Centro de Letras e Artes
Flora de Paoli Faria

REALIZAÇÃO
Laboratório de Patrimônio Cultural e Cidades Contemporâneas – LAPA/PROURB

Projeto Gráfico: Maristela Carneiro – Algo+ Soluções Editoriais


Ficha Catalográfica: Eneida Oliveira
Os conceitos emitodos neste livro são de inteira responsabilidade dos autores

V393 Vazios urbanos: percursos contemporâneos / Organização


de Andréa de Lacerda Pessôa Borde. – Rio de Janeiro :
Rio Books, 2012.
1 cd.
ISBN: 978 – 85 – 61556 – 29 – 7
1. Urbanismo 2. Planejamento urbano 3. Patrimônio Cultural. 4.
Renovação Urbana. I. (Borde, Andréa de Lacerda Pessôa). Org.
CDD: 307.416 6
EXPRESSÕES CONTEMPORÂNEAS DOS VAZIOS URBANOS 4
Andréa de Lacerda Pessôa Borde

PROJETOS URBANÍSTICOS E VAZIOS URBANOS: REVISITANDO O TEMA 9


Carmen Beatriz Silveira e Lilian Fessler Vaz

REQUALIFICAÇÃO URBANÍSTICA DAS ÁREAS PERICENTRAIS NO RIO DE JANEIRO


Cristovão Fernandes Duarte

INSTRUMENTOS PARA A REINSERÇÃO IMOBILIÁRIA NAS ÁREAS CENTRAIS E PERIFERIAS


IMEDIATAS DAS GRANDES CIDADES
Fernanda Furtado

TANTOS TETOS E TANTOS SEM-TETO1: Relato analítico de uma experiência de readequação de


edifícios públicos ocupados. 73
Luciana Andrade

VACÂNCIA E INTERVENÇÕES NO CENTRO ANTIGO DE SALVADOR - Tensões entre privatização urbana e


direito à cidade 86
Angela Gordilho Souza

A REGENERAÇÃO URBANA CONTEMPORÂNEA. Entre o espetáculo e as necessidades


socioantropológicas das cidades 122
Evelyn Furquim Werneck Lima

VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL: Interfaces com o ordenamento urbanístico


e o patrimônio cultural. 142
Andréa da Rosa Sampaio

VAZIOS NA PERIFERIA METROPOLITANA: Sobre a singularidade dos espaços-entre 166


José Almir Farias Filho

VAZIOS URBANOS CONTEMPORÂNEOS: Conceitos, permanências e alteridades 191


Andréa de Lacerda Pessôa Borde
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL:

Interfaces com o ordenamento urbanístico e o patrimônio cultural.

Andréa da Rosa Sampaio

Ruínas do Antigo Frigorífico da


CIBRAZEM, na Área do projeto Porto
Maravilha. O imóvel foi cedido à
iniciativa privada, em 2008, para a
construção do Aqua-Rio, mas seu
destino continua incerto.
Fonte: Andréa Sampaio, 2011.

Introdução
A situação de sucateamento do patrimônio edificado, particularmente de notáveis bens protegi-
dos – exemplares de patrimônio industrial arruinados – instiga a investigação sobre os processos
que levam da obsolescência da edificação à condição de vazio urbano e sobre as perspectivas e
entraves para sua reabilitação. Tal situação é comum nos grandes centros urbanos brasileiros e será

andréa SAMPAIO
observada no caso da área urbana central do Rio de Janeiro, através de uma leitura sob a perspecti-
va de suas interfaces com o ordenamento urbanístico e com a preservação do patrimônio industrial.
Por outro lado, a perspectiva de sediar a Copa do Mundo 2014 e Olimpíadas 2016 inaugura
um novo ciclo de valorização, e consequentemente, de pressões especulativas sobre a área urba-
na central, que confrontam as oportunidades de reabilitação do patrimônio através da aplicação
de recursos públicos e privados com a vulnerabilidade do patrimônio edificado e a precariedade
das condições habitacionais da população residente no antigo casario. Tamanho contraste re-
mete aos paradoxos presentes na cidade e evidenciados na área urbana central, em função da
oscilação entre ciclos de valorização e desvalorização simbólica e econômica da área que, como
núcleo original da cidade, concentra a Área Central de Negócios e o Centro Histórico, e possui um
acervo patrimonial correspondente ao seu status de capital durante mais de dois séculos.
Assumindo-se como premissa metodológica que “o estudo do conjunto da estrutura urbana
só se concebe em sua dimensão histórica” (Panerai, 2006), a presente reflexão percorrerá o proces-
so histórico da área central, buscando delinear as interfaces entre vazios urbanos, ordenamento
urbanístico e patrimônio industrial, de modo articulado aos processos de obsolescência das edifi-
cações e do tecido urbano central. Para tanto, busca-se evidenciar os nexos entre esses processos
e os impactos de projetos de reurbanização da área central, aos reflexos de legislações urbanís-
ticas e à formação de vazios urbanos, de modo articulado à tomada de consciência do valor da
área urbana central da cidade como patrimônio ambiental urbano e ao tardio reconhecimento do
legado arquitetônico que viria a ser considerado como patrimônio industrial.
A problematização da questão fundamenta-se em referenciais que discutem a noção de
patrimônio cultural na contemporaneidade (Choay, 2001 e 2011; Meneses, 2006), definem o pa-
trimônio industrial como bem cultural e objeto de pesquisa (Kuhl, 2010; Meneguello, 2011), ana-
lisam o percurso histórico da proteção ao patrimônio cultural de modo articulado às legislações
e às intervenções urbanísticas projetadas para a cidade (Sampaio, 2006 e 2011), em referenciais
que problematizam o fenômeno dos vazios urbanos centrais (Borde, 2006) e as interfaces entre
vazios centrais e patrimônio cultural (Borde, 2012).
Ancora-se a discussão na compreensão da cidade como bem cultural, tal como defendida
por Meneses (2006) que a concebe como um artefato socialmente apropriado em três dimen- 143
sões, intimamente imbricadas que atuam solidariamente: a dimensão do artefato, já que a urba-
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

nização é um produto próprio da sociedade; a dimensão do campo de forças, em cujo espaço se


desenvolvem tensões e conflitos na economia, na política, na vida social, nos processos culturais,
etc. e, finalmente, a dimensão das significações, que dotam de sentido e inteligibilidade o espaço.
Esse discernimento contribui para a problematização da temática, que deve ser compreendida
como parte do processo urbano.
A reflexão tem como base pesquisas sobre as normas urbanísticas e patrimoniais vigentes
na área urbana central1, nas quais se evidencia a influência que as normas de preservação têm
sobre o tecido urbano e a dinâmica local. No entanto, a recorrente condição de arruinamento de
bens tombados expõe a incapacidade da legislação em garantir à conservação dos bens frente
à dinâmica do processo urbano. Tal situação sugere que a preservação urbana é uma questão
complexa, para a qual instrumentos legais isolados de ações são insuficientes para dar conta da
dinâmica urbana e não impedem o sucateamento do patrimônio, gerando vazios urbanos.
Além dos reflexos da legislação urbanística, também serão observados casos em que pro-
jetos de renovação urbana baseados no arrasamento do tecido urbano tradicional, inspirados no
paradigma moderno de cidade, impactaram na decadência física e econômica da área, ainda que
não tenham sido implantados. Merecem destaque, projetos para a Área Portuária e para o bairro
da Cidade Nova, bairros que recentemente passaram a receber investimentos após décadas de
descaso. Nessas áreas há notáveis exemplares de patrimônio cultural sucateados e subutilizados,
prestes a ruir, bem como casos isolados de bens restaurados.
A compreensão dessa conjuntura sob a ótica do patrimônio cultural implica na revisão da
trajetória da política de proteção dos bens culturais vigente, que reflete a evolução da noção de
patrimônio cultural. Merecem particular atenção os aspectos relativos à atribuição de valor ao
patrimônio industrial como bem cultural, reconhecido não só pelo valor arquitetônico, mas como
herança do processo de industrialização. Verificam-se lacunas no que tange a abordagem dessa
temática sob o ponto de vista adotado no presente trabalho, que reconhece a dimensão urbana
do patrimônio industrial, que mais frequentemente é tratado em projetos, pesquisas e inventá-
rios como objeto arquitetônico, a partir de trabalhos monográficos sobre indústrias, experiências
de intervenções em bens, frequentemente se valorizando o potencial de reconversão em novos
144
programas, sobretudo equipamentos culturais. Tal situação não se restringe ao recorte espacial

andréa SAMPAIO
do Rio de Janeiro, mas já foi apontada por Meneguello (2011) ao circunscrever o patrimônio in-
dustrial em suas nuances como tema de pesquisa.
A perspectiva adotada considera a conservação integrada como uma premissa, a qual
pressupõe a articulação da conservação com o planejamento urbano para uma abordagem do
patrimônio industrial da área urbana central a partir do conceito contemporâneo de patrimônio
ambiental urbano, que supera o foco no monumento isolado e contempla a qualidade ambiental
da paisagem cultural socialmente construída (Castriota, 2009).

O patrimônio Industrial como bem cultural


Primeiramente convém delinear o que se entende por patrimônio industrial e o contexto em que
o mesmo emerge como tema de estudo específico no campo disciplinar da preservação do pa-
trimônio. Kuhl (2008) ampara a conceituação de patrimônio industrial a partir da definição de
arquitetura industrial, a qual compreende a “arquitetura do processo de industrialização”, ou seja,
a produção arquitetônica resultante do processo de industrialização, englobando tanto edifícios
destinados às atividades industriais, como aqueles construídos com materiais pré-fabricados, e
os destinados ao funcionamento de meios de transportes. Os exemplares de arquitetura indus-
trial empregam materiais de construção cuja produção passou a ser industrializada no decor-
rer do século XIX, a exemplo do vidro, do tijolo e do ferro fundido. A partir de então, surgem os
elementos pré-fabricados, geralmente metálicos, empregados em vários tipos de construções,
principalmente em pontes, viadutos e passarelas, estações e abrigos de plataforma, além de pro-
gramas variados de galpões – armazéns, oficinas, matadouros, mercados – e ainda gasômetros,
moinhos, entre outros.
O reconhecimento do valor cultural de exemplares da arquitetura industrial como Patrimô-
nio Industrial é uma construção conceitual recente, surgida no bojo da ampliação da noção de pa-
trimônio cultural na década de 1960, a partir da preocupação com a perda do legado do processo
da industrialização, com demolições de exemplares notáveis de arquitetura industrial, sobretudo
na Inglaterra e na França, no âmbito do processo de desfuncionalização dos parques industriais 145
urbanos das grandes cidades (Kuhl, 2010)2. Este movimento alcançou difusão internacional nas
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

décadas seguintes juntamente com o processo de desfuncionalização dos parques industriais ur-
banos das grandes cidades que atingiria seu ápice nos anos 1970.
O campo de pesquisa vem se consolidando, impulsionado pela vulnerabilidade desse pa-
trimônio em face das transformações urbanas, já tendo se consagrado e instituído a partir de
fóruns de discussão internacionais e nacionais. Os estudos realizados sobre o tema no âmbito do
International Committee for the Conservation of the Industrial Heritage –TICCIH foram sintetizados
na Carta de Nizhny Tagil (Rússia, julho de 2003) 3. Primeiro documento de referência internacional
com a finalidade de guiar a proteção e conservação do Patrimônio Industrial, a Carta traz a se-
guinte definição:

“O patrimônio industrial compreende os vestígios da cultura industrial que possuem


valor histórico, tecnológico, social, arquitetônico ou científico. Estes vestígios englobam
edifícios e maquinaria, oficinas, fábricas, minas e locais de processamento e de refinação,
entrepostos e armazéns, centros de produção, transmissão e utilização de energia, meios
de transporte e todas as suas estruturas e infra-estruturas, assim como os locais onde se
desenvolveram atividades sociais relacionadas com a indústria, tais como habitações, lo-
cais de culto ou de educação”.
(Carta de Nizhny Tagil, 2003)

A Carta de Nizhny Tagil consolida a definição de patrimônio industrial e estabelece parâme-


tros para as intervenções realizadas nos sítios industriais, as quais devem ser reversíveis, devendo
ser registradas todas as alterações inevitáveis, e os elementos significativos, eventualmente eli-
minados, devem ser inventariados e, se possível, armazenados num local seguro.
Em 2011 a atualização do debate é formalizada no documento conjunto ICOMOS/TICCIH
Princípios para a Conservação de Sítios, Estruturas, Áreas e Paisagens do Patrimônio Industrial ,
conhecido como “Princípios de Dublin”, no qual são enumeradas propostas para aprofundar o
conhecimento, a proteção e a conservação do patrimônio industrial, justificadas por sua gran-
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de vulnerabilidade. O documento aponta como causas da perda desse patrimônio, a falta de
conscientização, documentação, reconhecimento ou proteção, assim como devido a mudanças

andréa SAMPAIO
de tendências econômicas, as percepções negativas, questões ambientais ou de seu tamanho
e complexidade. O mesmo documento preconiza que a conservação do patrimônio industrial
construído pode contribuir para alcançar os objetivos do desenvolvimento sustentável nos níveis
local, nacional e internacional, tanto nos aspectos sociais, como físicos e ambientais. (ICOMOS/
TICCIH, 2011).
Embora seja notória a significação cultural de certos exemplares do patrimônio industrial
na memória urbana e evidente o potencial de reconversão da arquitetura industrial subutilizada,
ainda é grande o desafio pela sua preservação, tendo em vista a complexidade na defesa de sua
caracterização como bem cultural, inclusive por sua diversidade tipológica, e, sobretudo devido
às pressões especulativas pelos terrenos hoje localizados em zonas centrais, que são frequente-
mente considerados ociosos e passíveis de renovação urbana, conforme discutido por Rufinoni
(2009), Kuhl (2010), entre outros. Meneguello (2011) alerta para a necessidade de se tratar o patri-
mônio industrial em sua dimensão urbana, uma vez que o seu desmantelamento é um problema
urbano em larga escala.
Não obstante os preceitos já consagrados no campo da preservação, tem se observado
cada vez mais nas metrópoles brasileiras, mega-projetos que descaracterizam, ou mesmo arra-
sam, o patrimônio industrial, balizados pelo lucro imobiliário, e justificados por supostos bene-
fícios à sustentabilidade ambiental. A preocupação com a perda do patrimônio industrial nesse
tipo equivocado de projeto tem sido recorrentemente objeto de estudos em casos paulistanos4,
mas o risco se estende a casos no Rio de Janeiro, onde se observa a vulnerabilidade dos anti-
gos galpões da área Portuária, em função dos novos parâmetros urbanísticos, que incidem sobre
imóveis não protegidos, ainda que muitos sem valor patrimonial, enquanto outros ostentam um
significativo valor cultural.
Essa conjuntura pode ser explicada tanto pelo incipiente reconhecimento do valor patrimo-
nial do patrimônio industrial nas políticas de proteção, conforme será discutido adiante no âmbito
da abordagem sobre a evolução da noção de patrimônio cultural, mas principalmente pela dinâmi-
ca à qual a área urbana central está sujeita. Nesse sentido, adotando-se as dimensões propostas por
Meneses (2006), tratou-se do patrimônio industrial enquanto objeto de estudo em suas dimensões 147
de “artefato” e de “significações”, partindo-se então para a abordagem de sua dimensão “campo de
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

forças”, contextualizada pela dinâmica urbana, em que se discutirá a conjuntura atual da área em
sua espessura histórica e a influência exercida pelo ordenamento urbanístico.

A área urbana central do Rio de Janeiro na contemporaneidade


O percurso sobre o processo urbano da área urbana central do Rio de Janeiro reconhece sua es-
pessura histórica sob um olhar contemporâneo. Verificam-se processos análogos a outros gran-
des centros, em que o núcleo central, mesmo servido de equipamentos urbanos e infraestrutura,
vem perdendo população e atividades econômicas, tal qual o diagnóstico do Programa de Reabi-
litação de Áreas Urbanas Centrais5 (Brasil, 2005).
O recorte espacial aqui examinado contempla a Área de Planejamento 1 (AP-1), conforme
divisão administrativa do Planejamento Urbano municipal, excetuando o bairro de Santa Teresa,
de uso predominantemente residencial. Trata-se, portanto, da área do núcleo urbano original (a
Cidade Velha), atual centro financeiro da cidade, sua área de expansão imediata (a Cidade Nova),
correspondente aos bairros Centro, Cidade Nova, Catumbi, além dos bairros portuários Saúde,
Gamboa e Santo Cristo e ainda São Cristovão.
Sendo simultaneamente Área Central de Negócios e Centro Histórico, convivem na área
central prédios e terrenos muito valorizados, com singelos sobrados comerciais, além de vazios
urbanos, nesses incluídos prédios em acelerado estado de degradação. Enquanto determinados
trechos dessa área são revitalizados conforme um modelo contemporâneo de patrimonializa-
ção, com centros culturais e bens preservados, produzindo verdadeiros nichos de globalização,
outros, localizados principalmente nas franjas do centro de negócios, sofrem um processo de
esvaziamento – degradação e abandono – de seus bens culturais. Tal conjuntura engendra para-
doxos, tratados por Guimaraens (2002), em que a verticalização e o adensamento dos espaços
centrais foram, sobretudo, causa e consequência da criação de uma imagem contemporânea e
histórica do centro do Rio, no âmbito da política Federal de proteção ao patrimônio. Nesse sen-
tido, observam-se setores verticalizados aonde a legislação de preservação não atuou, ou o fez
148 recentemente.
Corrobora-se com o entendimento de Borde (2012) quanto ao papel estruturador dos va-

andréa SAMPAIO
zios urbanos e do patrimônio edificado nos processos de formação do tecido urbano da área cen-
tral. Traçando a história urbana da área central a partir da formação dos vazios urbanos, Borde
(2006) estuda a conjuntura de suas diferentes causas e propõe critérios de análise e reabilitação.
Já os entraves gerados pelos vazios são sublinhados em estudos realizados pelo Poder Público
com a finalidade de justificar planos e projetos urbanos6, apoiados em diagnósticos que expõem
o processo de deterioração físico-urbanística e de esvaziamento sócio-econômico dos bairros
centrais, os entraves fundiários, a existência de áreas potencialmente renováveis e sub-utilizadas
pela Indústria da Construção Civil, imóveis e áreas em processo de degradação urbanística, vazios
existentes ou potenciais decorrentes da desocupação de edificações ou áreas, apontando a ne-
cessidade de desenvolvimento sócio-econômico e físico-territorial.
A conjuntura de degradação é comum às franjas da área central, conforme já alertado por
Santos (1986) ao discutir o modelo de urbanização em vigor, a vulnerabilidade do casario e da
população residente e defender o seu potencial como patrimônio urbano. Conforme tratado em
Sampaio (2006), na década de 1960, São Cristóvão e demais bairros periféricos ao centro – Ca-
tumbi, Cidade Nova, Estácio e bairros portuários, enquadravam-se numa zona típica de degrada-
ção da cidade, mas de função predominantemente industrial, levando a sua inclusão na faixa de
transição que cerca a city7 (Área Central de Negócios). Estas áreas caracterizam-se pelo estado de
degradação dos prédios e grande valorização dos terrenos, instalação de pequenas indústrias, ar-
tesanato, escritórios e depósitos, ou seja, usos de apoio ao centro, sendo significativa a demanda
por uso de estacionamentos nessas áreas.
O processo histórico que conformou essa paisagem urbana hoje considerada histórica
constituiu-se por intervenções urbanizadoras, remodeladoras e renovadoras que desempe-
nharam um papel estrutural ao dotarem a cidade de infraestruturas, particularmente, as viá-
rias. Estas obras conformaram a morfologia urbana da cidade do Rio de Janeiro, até mesmo
nos rastros deixados no tecido urbano por alguns projetos drásticos não implantados (Sam-
paio, 2011)8.
A conjuntura política e administrativa de capital durante dois séculos desempenhou papel
fundamental na conformação do acervo edificado e também no esvaziamento da área, intensi-
149
ficado quando a Capital Federal foi transferida do Rio para Brasília em 1960. Naquela ocasião,
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

várias instituições públicas se mudaram da cidade, deixando muitos edificações vazias, muitas
das quais assim permanecem até os dias de hoje.
As mudanças paradigmáticas na cidade ocorrem no período que vai do final do século XIX
às duas primeiras décadas do século XX, sendo significativas para o entendimento do atual espa-
ço urbano da cidade. A cidade deixou de ser essencialmente comercial para se transformar em
centro industrial e porto agro-exportador. O centro ganha características da modernidade e os
subúrbios começam a se delinear como a principal área industrial durante todo o século XX. Tam-
bém é, nessa fase, que surge a zona sul como território das elites, enunciando uma configuração
espacial que contrastava com o restante da cidade (Abreu, 1988).
Nessa curta trajetória histórica para o entendimento das condições atuais do patrimônio
industrial, cabe pontuar a lógica de localização urbana, sobretudo das indústrias e a moradia das
elites, que segundo Villaça (1999), são agentes estruturadores da ocupação do espaço urbano. Os
usos incômodos – habitações coletivas proletárias e os chamados usos “sujos9” – como matadouro,
cocheiras, curtumes e atividades portuárias – foram sendo paulatinamente expulsos do centro em
direção à periferia da cidade.
Com a intensificação da industrialização também as indústrias passaram a ser considera-
das uma vizinhança nociva, em especial na área central e nas localizações valorizadas pelo capi-
tal imobiliário. Enquanto que, nas áreas valorizáveis, a presença da indústria poderia acarretar
a desvalorização do valor dos terrenos, nas áreas populares, sua presença facilitava o acesso ao
local de trabalho. Assim, atraídas pela proximidade das indústrias, sem maiores preocupações
ambientais, proliferaram-se vilas operárias e habitações coletivas em São Cristovão. A abertura
da Avenida Brasil (1940-1946) trouxe consigo uma nova dinâmica urbana para a região e para os
subúrbios, ocasionando a transferência de grandes indústrias instaladas na área central, sobretu-
do em São Cristovão, para áreas mais distantes da cidade (Sampaio, 2006).
O patrimônio industrial da área central da cidade é hoje conformado, sobretudo, por gal-
pões de antigas fábricas, sendo as mais antigas instaladas em São Cristovão, entre meados e o
final do século XIX, armazéns portuários das antigas Docas, e notadamente armazéns portuários
150 implantados com a extensão do Porto, na área aterrada durante a Reforma Pereira Passos10. Cabe
destacar que o próprio processo de reestruturação do Porto no início do século XX, atendendo às

andréa SAMPAIO
novas demandas comerciais de então, ocasionou a obsolescência de alguns dos armazéns mais
antigos, que ficaram afastados do cais11. Instalações ferroviárias e inúmeras instalações indus-
triais implantadas na área portuária são remanescentes da cadeia produtiva que vigorou na re-
gião e foi sendo desfuncionalizada a partir da década de 1960.
Essa paisagem urbana histórica, aparentemente agonizante, e de grande significação his-
tórica está sendo resignificada através da reocupação de antigos galpões pela indústria criativa
– escolas de samba, ateliês, escritórios de arquitetura e design, ao mesmo tempo em que é con-
frontada pelo projeto Porto Maravilha, através de obras viárias e uma proposta de tabula rasa em
parte da área. Observa-se um risco iminente da perda desse patrimônio, diante da desproteção
legal e da tendência crescente de mudanças de usos, que implicam em adaptações, demolições
e construções de novas tipologias. Por outro lado, é através desse mesmo projeto estão sendo
realizadas ações de valorização do patrimônio e recuperação de bens, através da aplicação de re-
cursos advindos da operação com os CEPACs (Certificados de Potencial Adicional de Construção),
conforme determinação da Lei que rege a OUC Porto Maravilha12.

O Processo Urbano e o Ordenamento Urbanístico


Revisitando a evolução urbana da cidade, verifica-se um crescente papel das normas urbanís-
ticas ao longo de sua história. Os seus primeiros mentores foram os higienistas, preocupados
em controlar o modo de crescimento da cidade, com particular preocupação em relação à sa-
lubridade das habitações, ao saneamento de pântanos e à ventilação da cidade, prejudicada
pelas ruas estreitas, bem como à localização dos chamados usos “sujos”, em função de suas
incomodidades e estigmas. Embora as normas de meados do século XIX já tratem de usos,
em termos de salubridade e incomodidades, vários destes usos somente deixaram o centro,
quando expulsos pelas reformas: Pereira Passos (1903-1906) e abertura da Avenida Presidente
Vargas (1ª fase na década de 1940 e alargamento da área da Cidade Nova na década de 1960).
A periferia da área central e, em particular são Cristovão, recebe então a população, juntamente
com seus ofícios, banidos da área central. 151
A leitura da conjuntura atual à luz do processo histórico do ordenamento urbanístico revela
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

uma sucessão de legislações urbanísticas que redefiniu o zoneamento e as áreas de conservação


urbana, explicitando conflitos de interesses, expressos tanto em projetos urbanos como nas nor-
mas urbanísticas. Essa sobreposição de instrumentos normativos não impediu a decadência física
nem a vacância dos edifícios protegidos como patrimônio cultural. Em muitos casos, as restrições
normativas conduzem ao esvaziamento, que somadas aos entraves fundiários praticamente cris-
talizaram alguns vazios urbanos dessa área e dificultam sua reabilitação (Sampaio, 2006 e 2011).
Em Sampaio (2006), revisitando o percurso histórico da cidade, verifica-se um papel cres-
cente da regulação urbanística a partir do início do século XX. Identificou-se a coexistência de
diferentes modelos normativos vigentes na cidade desde as normas urbanísticas precursoras, e
a passagem do planejamento urbano geral – o zoneamento – para um planejamento descentra-
lizado, pautado em normas locais. Verificou-se um leque de normas que equacionam o modelo
de ocupação, balizadas em parâmetros urbanísticos ora indutores, ora restritivos, em relação ao
adensamento e transformação de usos.
A partir dos anos 20, com o processo de industrialização do país, o Rio de Janeiro, então
capital da república, passa a sofrer grandes transformações em seu espaço urbano devido não só
ao crescimento populacional, como para acomodar a atividade industrial, sendo já observada a
formação do mercado imobiliário. Como a área mais regulada da cidade, o centro foi sucessiva-
mente objeto de normas urbanísticas, desde o primeiro zoneamento da cidade (1924), até a sua
consolidação no Código de Obras do Distrito Federal (1937)13, que vigorou por três décadas, e foi
substituído pelo zoneamento de molde funcionalista da década de 1970, acrescido de normas
patrimoniais a partir da década de 1980, posteriormente ampliadas na década de 90. Na maior
parte das vezes, a legislação, pulverizada em decretos, limitou-se a referendar os caminhos es-
pontâneos do crescimento da cidade e as tendências já existentes, além de concretizar as expec-
tativas de grupos ligados ao setor da construção civil.
Os princípios Modernistas orientaram projetos urbanos a partir da década de 1940 até a dé-
cada de 1970 no Rio de Janeiro. Além disso, os regulamentos de zoneamento de 1970 e 1976 eram
pautados na segregação funcional, preconizando um centro monofuncional, através da restrição
do uso residencial na área central, apesar da presença significativa de moradias em sobrados tra-
152
dicionais e de exemplares de habitação multifamiliar localizados na periferia do núcleo central,

andréa SAMPAIO
nos bairros do Catumbi, Rio Comprido e Cidade Nova.
Essa sobreposição normativa havia configurado o núcleo do espaço urbano central como a
parte mais verticalizada da cidade. A condenação desse modelo de urbanização predatório veio
na década de 1980 com a implementação das Áreas de Preservação Urbana14, quando se verificou
a transição da proteção da escala arquitetônica para urbana. Até então, somente os bens cultu-
rais mais notáveis eram protegidos através de atos de tombamento.
A partir da década de 1980, com a instituição do órgão de tutela municipal e legislação com-
petende, a preservação passa a ser política urbana com a designação de Áreas de Preservação,
que estancaram o processo de renovação urbana que vinha destruindo parcelas significativas do
tecido urbano mais antigo da cidade, ali situados exemplares arquitetônicos que atualmente se-
riam considerados incontestes bens culturais15. Essa tendência se intensifica a partir da década de
1990, quando se ampliou a área preservada e a quantidade de imóveis tombados e preservados,
conforme apresentado em Sampaio (2011).
Atualmente, o regime normativo vigente conjuga a legislação local com uma grande parte
preservada pelas APACs e trechos onde ainda vigora o regulamento de Zoneamento do Decreto
322/ 1976. Com a finalidade de promover a revitalização da área, a Lei nº 2.236/ 1994, conhecida
como Lei do Centro, foi formulada como AEIU – Área de Especial Interesse Urbanístico, em cará-
ter transitório, aguardando a edição de um PEU. Essa lei permite usos mistos, em particular ha-
bitacionais, uso que havia sido limitado na área central desde 1970, em detrimento das cristaliza-
ções residenciais existentes, particularmente na região portuária. A repercussão da intenção da
Lei do Centro em restabelecer a mistura de usos com a volta da função residencial ainda é lenta,
ocorrendo alguns empreendimentos isolados recentes. A mais recente legislação local incidente
no recorte espacial resulta da Operação Urbana Consorciada Porto Maravilha, aprovada pela Lei
Complementar no101/2009. Apesar da delimitação estabelecida como AEIU para a área portuária,
sua influência extrapola seus limites, dada a magnitude de suas propostas viárias e dos novos pa-
râmetros urbanísticos, que propõem o adensamento a partir de gabaritos elevados.
Infere-se que a configuração espacial atual é um legado de um processo urbano que con-
jugou projetos e normas urbanísticas, pautados na urbanização e reurbanização de áreas, num
processo análogo aquele apontado por Harvey (1992) como “destruição criativa”, que explicaria 153
os impasses do projeto de modernidade – como poderia ser criado um novo mundo sem destruir
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

boa parte do existente? Esta expressão englobaria a preocupação significativa com a remodela-
ção das cidades, de caráter, sobretudo, higienista, evidenciada ao longo do século XIX. Nela se
enquadram, por exemplo, a reforma de Paris, que se tornou paradigma para outras em vários
lugares, inclusive a reforma de Pereira Passos (1906), no Rio de Janeiro.
A noção de progresso vinculada ao modelo de cidade teve seu ápice no movimento mo-
dernista. A cidade modernista imbrica projeto e norma, preconiza a monumentalização da cons-
trução – em especial a habitação social – a segregação das atividades, o isolamento das formas
arquitetônicas e a condenação das formas passadas (PANERAI, 1996). Assim sendo, o completo
arrasamento de extensas áreas da cidade, em operações de tábula rasa, foram defendidas pelos
urbanistas filiados ao Movimento Moderno e colocados em prática nas cidades ocidentais16.
Verifica-se uma série de projetos para a área central do Rio nesses moldes, sendo alguns
tão drásticos que deixaram rastros mesmo quando não implementados. Decadência, desvalo-
rização e degradação das propriedades e do espaço público, além de espaços subutilizados são
algumas das consequências recorrentes que ameaçam a população residente nessas áreas con-
denadas a ser varridas do mapa. Destacam-se os casos do projeto da Avenida Norte-sul17, discu-
tido por Sampaio (2011), que gerou repercussão, mesmo sem ser implantado, na área portuária e
no sopé do Morro da Conceição e uma série de projetos na área da Cidade Nova, que redesenha-
ram o antigo tecido urbano, destruindo a Praça XI e arrasando extensas áreas, deixando parte do
casario, que ainda é um reduto habitacional de uso misto. Tais projetos foram concebidos sob a
prevalente lógica do funcionamento do sistema viário, resolvendo ligações metropolitanas, sem
preocupação com a escala local.
Menor vitalidade econômica e menor coesão social em função do destino incerto dessas
áreas, têm acelerado a deterioração causada pela condenação daqueles quarteirões, cujas edi-
ficações acabam abandonadas por seus proprietários, levando a deterioração física, a subutili-
zação dos espaços e sua ocupação informal dos imóveis. Tais reflexos discutidos por Sampaio
(2011) para a área sob impacto da Avenida Norte-sul, podem ser generalizados para outros casos,
como da área da Cidade Nova. Embora estas áreas tenham sido reconhecidas como patrimônio
cultural no final da década de 1980 e início de 1990, atualmente a maioria dos sobrados antigos
154
encontra-se em péssimo estado de conservação e abriga atividades impróprias, particularmente

andréa SAMPAIO
estacionamento e armazenamento.

A trajetória da proteção ao patrimônio cultural


A conjuntura atual da área urbana central foi brevemente discutida anteriormente a partir de seu
ordenamento urbanístico. Busca-se, na sequência, estabelecer nexos entre seu processo urbano
e a tomada de consciência do valor cultural do patrimônio urbano, o que permitirá elucidar ques-
tões como a perda de bens culturais e o estado degradado de certos conjuntos urbanos, como
parte das escolhas normativas do urbanismo e do planejamento urbano. Nesse sentido, busca-se
pontuar os conceitos que convergiram para o amadurecimento da proteção ao patrimônio cultu-
ral, aí incluindo a tomada de consciência quanto o valor cultural do patrimônio industrial.
Cabe primeiramente lembrar que os instrumentos de proteção ao patrimônio cultural tem
como finalidade impedir sua destruição, pautados em moldes que podem ser denominados como
uma “retórica da perda”18, sendo frequentemente aplicados emergencialmente para impedir a
destruição dos bens. Tal condição faz parte da gênese do campo disciplinar, que conforme ar-
gumento de Choay (2001) surge na contramão do urbanismo, no século XIX, então propulsor de
reformas urbanas que arrasaram o tecido urbano histórico de Paris e Viena.
O deslocamento conceitual do patrimônio cultural corresponde à passagem da noção de
Monumento histórico,segundo a qual foram selecionados ícones artísticos e históricos a preser-
var sob a ótica de cidade-monumento, para uma noção ampliada de bens culturais inscritos na
ótica de cidade-documento, em que se enfatiza a construção da história urbana. O panorama
brasileiro da política federal é discutido por Fonseca (1997), Santanna (2000) Castriota (2009) e
Bonduki (2010). Já a evolução da política de proteção na área central do Rio de Janeiro foi tratada
anteriormente por Sampaio (2006 e 2011).
Emerge contemporaneamente uma abordagem do patrimônio cultural cada vez mais in-
terdisciplinar, na qual a preservação do patrimônio cultural passa a ser problematizada como fato
social, sob uma perspectiva de cidade como artefato cultural, conforme argumentos de Meneses
155
(2006). Essa ampliação conceitual é reflexo das interfaces estabelecidas, sobretudo a partir da
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

década de 1970, com campos que tratam da cidade e da sociedade, além da Arquitetura e Urba-
nismo: Economia, Direito, Sociologia, Antropologia, História, Meio Ambiente. Choay (2001) dis-
cute a ampliação do objeto patrimonial num panorama internacional, tecendo críticas ao excesso
de patrimonialização, fenômeno ainda distante no caso brasileiro, onde as políticas de preserva-
ção não conseguem abarcar o universo de bens a proteger.
Tendo sido capital por dois séculos, o centro histórico do Rio de janeiro guarda marcos
construídos, referenciais não só da história local, mas da cidade e da Nação. O reconhecimento
de alguns desses marcos como patrimônio cultural ocorreu em diferentes momentos, de acordo
com noção de patrimônio então prevalente. Neste sentido, revisitar a história conceitual da pro-
teção ao patrimônio nesta cidade, corresponde por rebatimento, a história em nível Nacional.
Resumidamente, pode-se dizer que o patrimônio foi primeiramente valorizado por seus
aspectos artísticos e históricos, como Monumento Nacional, assumindo posteriormente a no-
ção mais abrangente de patrimônio cultural, que contempla bens arquitetônicos e sítios dotados
de significação cultural. Embora a proteção ao patrimônio estivesse regulada em nível Nacional,
desde 1937, somente em 1965 houve os primeiros tombamentos no nível local, então Estado da
Guanabara, passando a ser praticada como política urbana na década de 80, com a instituição do
órgão de tutela municipal e a legislação competente. A partir de então, além das áreas de preser-
vação, houve uma série de tombamentos em nível municipal e estadual, de acordo com critérios
menos elitistas, preconizados a partir da Carta de Veneza (1964).
Apesar da gênese da noção de patrimônio urbano já ter emergido na década de 1930 na Itá-
lia, com os estudos de Giovannoni19, a noção brasileira de patrimônio era então referenciada em
valores nacionais, prevalecendo a herança colonial representada pela arquitetura monumental, es-
pecialmente edifícios religiosos de estilo colonial barroco, além da arquitetura neoclássica. A noção
de Patrimônio então vigente era aquela preconizada pelo CIAM na Carta de Atenas (1933): o tecido
urbano denso e insalubre deveria ser erradicado e somente os monumentos excepcionais poderiam
permanecer como testemunhos do passado, desde que não fossem obstáculos para o progresso.
Como paradoxo, no caso brasileiro, a arquitetura moderna também se enquadraria no valor
156 excepcional previsto na norma federal de 1937 que rege o Patrimônio Histórico e Artístico Nacio-
nal20. Isso se explica no fato da proteção do patrimônio cultural brasileiro ter sido, desde o seu

andréa SAMPAIO
início em meados da década de 1930, formulada e administrada pelos expoentes do Modernismo.
A partir da década de 1970 emerge internacionalmente uma visão crítica ao desenvolvi-
mentismo e ao negativo impacto das demandas contemporâneas sobre o meio ambiente e áreas
históricas. Essa temática foi incorporada nas Cartas Patrimoniais, sobretudo na Recomendação
de Nairobi (UNESCO, 1976), relativa à proteção dos conjuntos históricos tradicionais e ao seu
papel na vida contemporânea21. A integração com o planejamento urbano é defendida na Decla-
ração de Amsterdam (1975), através do conceito de Conservação Integrada.
No Brasil, e particularmente no Rio de Janeiro, somente no final da década de 70 foi deli-
neada uma política de preservação de áreas históricas com o projeto Corredor Cultural, já incor-
porando a mudança de paradigma de patrimônio cultural. Só então grande parte dos conjuntos
urbanos da área central do Rio de Janeiro construídos entre o final do século XIX e início do XX,
filiados ao estilo eclético, teve seu valor patrimonial reconhecido. Sendo a valorização do patri-
mônio operada primeiramente através de uma visão do urbanista Modernista, a arquitetura ec-
lética, aí incluída a arquitetura industrial, era desvalorizada como linguagem arquitetônica pelos
arquitetos modernistas e tampouco era considerado de interesse para o Patrimônio Nacional,
exceto nos casos de valor histórico.
A ênfase na revalorização do passado e na patrimonialização dos sítios históricos nasce a
partir da década de 80, quando emerge um culto à memória, com o consumo de formas culturais
históricas, fenômeno que pode ser inscrito no paradigma do Pós-modernismo (HARVEY, 1992; JEU-
DY, 2005). Na década de 1990, seguindo o modelo da Globalização, o enfoque cultural incorpora
a revitalização urbana, orientada pela lógica da dinamização econômica, valorização imobiliária e
controle social, que transforma a cidade histórica em cidade-atração, conforme observa Sant’anna
(2004). Nesses moldes, houve diversas experiências de intervenções e salvaguarda em áreas de in-
teresse histórico/ cultural tanto no Brasil22, como no cenário internacional. Esse tipo de intervenção
vem priorizando a visibilidade das centralidades, como acontece também no Rio de Janeiro.
Recentemente os critérios de preservação urbana vêm sendo questionados, tanto pela óti-
ca neoliberal desregulacionista, como pela ótica preservacionista. O embate do desenvolvimento
versus preservação acirra-se, particularmente, nas áreas valorizadas pelo mercado imobiliário,
como tem ocorrido recentemente na área central por conta do projeto Porto Maravilha. 157
Embora não haja consenso entre o discurso e a prática dos diferentes agentes, atualmen-
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

te se defende uma visão de potencial de intervenção sobre o patrimônio, que aponta para uma
noção mais dinâmica, transpondo a ideia da preservação para a da conservação daquelas carac-
terísticas ”que apresentem uma significação cultural”. Desta forma, trabalha-se tanto com a pre-
servação – a restrição das alterações – como com a ideia de conservação, quando se refere à
inevitabilidade da mudança e à sua gestão (CASTRIOTA, 2009).

A tomada de consciência do valor do patrimônio industrial


Muitos dos estudos sobre o Patrimônio industrial no país se concentram na região sudeste, so-
bretudo em São Paulo, naturalmente por ser o berço da industrialização e abrigar um rico acervo.
Muitos desses enfatizam aspectos arquitetônicos da arquitetura industrial, notadamente arqui-
tetura de ferro e ferroviária, bem como sua preservação (Kuhl, 2008). Meneguello (2011) discute
as dificuldades e avanços na conformação do campo de pesquisa na área e relaciona os Bens
tombados em nível nacional e estadual paulista, citando ainda, no nível internacional, os bens
protegidos na listagem de Patrimônio Mundial, que podem ser caracterizados como patrimônio
industrial. Cabe destacar a partir das considerações da autora, o restrito número de bens tomba-
dos em nível federal no país, enquadrados como patrimônio industrial, nos quais estão incluídos
os engenhos.
No Brasil e particularmente, no Rio de Janeiro, observa-se a tomada de consciência do va-
lor cultural – notadamente histórico – de exemplares de patrimônio industrial através de atos de
tombamento, a partir de meados da década de 1960, em nível estadual23, e da década de 1980,
em nível municipal24, consoantes com a ampliação tipológica e cronológica do objeto patrimo-
nial, segundo critérios preconizados a partir da Carta de Veneza (1964). Já em termos de tomba-
mentos federais que podem ser caracterizados como patrimônio industrial, na cidade do Rio de
janeiro, verificam-se somente três bens até o momento, sendo o primeiro fora do recorte espacial
da pesquisa – o Hangar de Zepelins em Santa Cruz (1998). Os demais tombamentos são mais re-
centes: Estação Ferroviária D. Pedro II (Federal, 2008 – Municipal1996) e Armazém das Docas D.
Pedro (Federal provisório, 2012).
158
Cabe destaque o avanço em relação à formação de uma memória ferroviária, conforme

andréa SAMPAIO
pode ser observados na atenção especial ao tema em inventários (INEPAC) e tombamentos que,
no entanto, só evitam as demolições e descaracterizações, mas não asseguram o bom estado de
conservação. Um passo importante na formalização dessa memória foi tomado na regulamen-
tação da extinção da Rede Ferroviária Federal, através da Lei 11.483/ 2007, delegando ao IPHAN
a tutela, o inventário e a preservação dos bens relacionados ao Transporte Ferroviário da extinta
RRFSA. Ao menos se terá o conhecimento sistematizado desses bens, para que se possa buscar
recursos para a sua preservação.
Grande parte do patrimônio industrial carioca constitui o patrimônio ambiental urbano da
Região Portuária, que foi objeto do projeto de conservação urbana conhecido como SAGAS25,
que contou com participação popular, e resultou na criação de uma Área de Preservação Am-
biental – APA – em 1987, que regulamenta a preservação do casario mais antigo e alguns arma-
zéns. Exemplares de arquitetura industrial notáveis como o Moinho Fluminense e o Antigo Tra-
piche Modesto Leal foram tombados individualmente em nível municipal em 1986. No entanto,
os armazéns portuários só vieram a ser protegidos no ano 2000, quando parte do conjunto foi
tombado pelo Decreto Municipal nº 19.002 de 05/10/00. Esse tombamento não protegeu todo
o conjunto que seria objeto de área de preservação, e que se encontra atualmente vulnerável
às pressões de renovação do Porto Maravilha. Inclui-se nesse caso o antigo armazém da CIBRA-
ZEM, anteriormente um frigorífico, que foi objeto de projeto de intervenção para a instalação do
AquaRio, ainda de destino incerto, mas cuja proposta resultaria em grande descaracterização da
tipologia do armazém, com prejuízos para o conjunto urbano.
O tardio reconhecimento do patrimônio industrial e sua incipiente proteção acarretaram
a perda de muitos exemplares significativos, enquanto outros foram mutilados e parcialmente
preservados. Entre os lamentáveis exemplos, merece destaque a demolição do antigo Mercado
Municipal, na década de 1960, para a passagem do viaduto da perimetral. Da imponente arquite-
tura de ferro de influência Art-Nouveau, restou somente um torreão, onde funciona o Restauran-
te Albamar, tombado em nível estadual em 1983.
Cabe mencionar ainda o caso da Garage Pagani – galpão projetado por Antonio Virzi na Ci-
dade Nova, em 1921, tombado em nível estadual e municipal. Resta somente a fachada e ínfima
159
parte da estrutura do telhado desse que é um dos poucos exemplares remanescentes dos proje-
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

tados pelo arquiteto italiano, que contava com a parceria do artífice Pagani, autor das magníficas
serralherias peculiares às suas obras, o que pode explicar a singularidade dos ornatos encontra-
dos na fachada da Garage. A dupla proteção não assegurou a conservação dessa singular edifica-
ção, em meio a conjuntura urbana de decadência física da Cidade Nova, dadas as incertezas de
arrasamentos propostos em vários projetos urbanos, conforme mencionado anteriormente.
Experiências de recuperação e reconversão do patrimônio industrial em novos usos tem sido
cada vez mais frequentes no Brasil e no exterior, chamando atenção para o seu potencial na reabi-
litação de vazios urbanos, com a implantação de novos equipamentos urbanos. Nos anos 80 sur-
gem as primeiras reconversões de edifícios industriais para novos usos, entre as quais se destacam
o Museu D’Orsay, em Paris e a reconversão do antigo mercado de Convent Garden, em Londres.
No Brasil, destaca-se o projeto pioneiro de Lina Bo Bardi para a reconversão da antiga fábrica de
tambores dos Irmãos Mauser em SESC Pompéia, em São Paulo. Na mesma época Vittorio Gregotti
propunha a paradigmática reconversão da extensa área da fábrica da Pirelli em La Bicocca, Milão.
Projetos contemporâneos cada vez mais espetaculares, pautados no contraste do antigo
com o novo, convertem antigas e ociosas edificações em equipamentos culturais, trazendo à
tona o debate em torno da cidade-atração a partir de equipamentos culturais. Podem ser cita-
dos os projetos da Tate Modern em Londres (antiga Bankside Power Station, do escritório suíço
“Herzog & deMeuron”, vencedor do concurso internacional realizado em 1995); para o antigo
Matadouro Legazpi de Madrid (projeto dos arquitetos Artur Franco e Fabrice Van Tesslaar, 2009);
para a reconversão de antiga fábrica em extensão do MACRO – Museu de Arte Contemporânea
da Cidade de Roma (projeto de Odile Decq e Benoit Cornette, 2001-2011).
Na área central do Rio despontam alguns projetos de recuperação de patrimônio industrial
com a recuperação de antigos galpões e reconversão em equipamentos culturais, entre os quais
se destacam o pioneiro projeto do Galpão da Cidadania, no Armazém das Docas de D. Pedro e os
recentes projetos da “Fábrica de espetáculos” do Teatro Municipal no galpão tombado Armazéns
Paranapanema26, e de recuperação dos Galpões da Gamboa, ainda sem programa definido, ambos
no contexto do Projeto Porto Maravilha. Merece destaque a instalação de artistas na antiga Fábrica
de chocolates Bhering, em Santo Cristo, que exerceu pressão para a sua preservação, em 2012.
160
E afinal, quais as perspectivas?

andréa SAMPAIO
Apesar das iniciativas de preservação emergentes, as dificuldades e entraves ainda tornam um
desafio a compatibilização da demanda de modernização da área central com a conservação de
seu patrimônio ambiental urbano, sem o comprometimento de sua identidade – sua paisagem
e seus habitantes. No caso da Área Portuária e do bairro de São Cristovão, entende-se que suas
identidades sejam constituídas pela ambiência de espaço da industrialização, com galpões e re-
sidências proletárias, muitos dos quais ameaçados pelos parâmetros urbanísticos propostos pelo
Projeto Porto Maravilha.
Em panorama sobre a atuação do Programa Monumenta em nível nacional, Bonduki (2010)
traça uma análise que pode ser transposta à conjuntura atual dos sítios históricos brasileiros, se-
gundo a qual os núcleos históricos “...não são ruínas arqueológicas, mas lugares vivos, onde habita
uma população com necessidades contemporâneas, que podem e devem ser atendidas no território
urbano como um todo, inclusive nas áreas protegidas”.
Encontra-se ressonância das preocupações com o futuro do patrimônio urbano da área
central, em particular de seu significativo patrimônio industrial, no argumento de Choay (2011),
que enfatiza, em tom de manifesto, a necessidade de uma tomada de consciência das ameaças
que pesam sobre a identidade humana. A autora convida seus leitores a travar um combate em
prol do patrimônio, a partir de três frentes de luta: a) educação e formação; b) utilização ética de
nossas heranças edificadas; c) participação coletiva na produção de um patrimônio vivo.
Através da discussão aqui levantada, e sobretudo pelos paradoxos vivenciados pelo
patrimônio urbano da área central, percebe-se que há um longo caminho a ser trilhado, e
que as frentes apontadas por Choay (2011) podem ser norteadoras no sentido de reforçar o
papel ancorador do patrimônio nas dimensões sociais e morfológicas do espaço urbano. No
entanto, voltando ao argumento de Meneses (2006), a conservação urabana não se limita às
dimensões de artefato e simbólicas, mas são definidas, sobretudo, no campo de forças, pela
gestão urbana.
Nesse sentido, a reflexão sobre a complexa dinâmica da área urbana central da cidade aqui
desenvolvida, a partir da síntese de seu processo urbano, tendo como fio condutor marcos nor- 161
mativos e transformações espaciais, bem como as mudanças de paradigmas da preservação do
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

patrimônio, pode ser esclarecedora a respeito das conjunturas políticas e sociais engendradas no
ordenamento urbanístico e nos projetos urbanos passados. Não adianta a preservação por legis-
lação específica – só no papel, são necessárias ações de reabilitação urbana no sentido abrangen-
te e não somente de valorização imobiliária. Acredita-se no potencial de resignificação urbana do
patrimônio industrial como força indutora para alcançar a conservação integrada. Para tanto, é
necessário sistematizar o reconhecimento dos bens a partir de inventários e incluir o patrimônio
industrial nas políticas de proteção, evitando que seja apagada da memória urbana essa impor-
tante etapa da história das cidades.

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Notas de fim
1
Pesquisas “Normas Urbanísticas e Patrimônio Cultural: Cartografias da Área Urbana Central do Rio de Janeiro”, com apoio da FA-
PERJ e PIBIC/CNPq UFF, coordenada pela autora, e Pesquisa “Vazios Urbanos da Área Urbana Central do Rio De Janeiro: Alteridades,
Permanências e Descontinuidades” com apoio da FAPERJ, coordenada pela Profa. Dra. Andréa L. P. Borde (PROURB/ FAU/ UFRJ).
2
Kuhl (2008 e 2010) cita os casos da demolição da Coal Exchange e da Estação Euston em Londres, em 1962, e do Mercado Central
de Paris – Les Halles, no início da década de 1970.
163
3
A tradução para o português está disponível no site do Comitê Brasileiro pela Preservação do Patrimônio Industrial – <http://
VAZIOS URBANOS E PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

www.patrimonioindustrial.org.br/>.
4
Exposto por autores como Rufinoni (2009), Kuhl (2010), entre outros.
5
O Programa Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais objetiva promover a reabilitação urbana e o adensamento de áreas centrais
desocupadas, de forma a otimizar a infraestrutura instalada, recuperar o estoque habitacional e a dinâmica econômica, conser-
vando o patrimônio cultural e imobiliário. Define área urbana central como “um bairro ou um conjunto de bairros consolidados,
articulados ou não em torno do núcleo original da cidade, com forte poder de concentração de atividades e pessoas dotadas de infra-
estrutura urbana, acervo edificado, serviços e equipamentos públicos, serviços de vizinhança e oportunidades de trabalho. Essas áreas
apresentam, porém, processos de evasão de população e de atividades e/ou degradação física relativa à infraestrutura e ao ambiente
construído” (Brasil, 2005).Vide <www.cidades.gov.br>.
6
Ver Diagnóstico para a VII R.A São Cristovão no Estudo do PEU (1999) que foi aprovado pela Lei C 73 de 19/07/2004. Os diagnósti-
cos do projeto Porto Maravilha também apontam a degradação da área..
7
Soares cita Tricar que conceitua como a inclusão na “franja pioneira do núcleo comercial das grandes cidades, onde a especulação
mantém os velhos prédios degradados, que por sua vez são utilizados para fins muito próximos a esse centro comercial (artesanato,
oficinas, depósitos e escritórios”. Tricart, Jean. “L’Habitat Urbain”. Cours de Geographie Humaine, fascicule II, 1958. p. 154.
8
O impacto dos projetos de renovação sobre as áreas centrais mereceu estudos antológicos como o Jacobs (2000) para Nova
Iorque e o de Carlos Nelson Ferreira dos Santos, para o bairro do Catumbi, no Rio de Janeiro em Quando a rua vira casa (São Paulo:
Projeto, 1985).
9
Conforme termo cunhado por RABHA, Nina M. C. E. Cristalização e Resistência no Centro do Rio de Janeiro. In: Revista Rio
de Janeiro. 1(1), 1985, p.35-44. O matadouro é um caso exemplar de deslocamento para fora da cidade: inicialmente situado
na Santa Luzia (1774) – área urbana, hoje centro – depois transferido para São Cristovão (1853) e finalmente, para Santa Cruz
(1881), à medida que a cidade foi expandindo-se (Sampaio, 2006).
10
Para informações sobre as transformações na área portuária, vide Lamarão, Sergio T. N. Dos Trapiches ao Porto. Rio de janeiro:
SMC/ DGPC, 2006.
11
Um dos exemplos desse caso é o Armazém das Docas de Dom Pedro I, atualmente ocupado como Galpão da Cidadania.
12
A Lei Complementar no. 101/2009 determina que no mínimo 3% dos recursos arrecadados com os CEPACs tenha essa finalidade.
13
A dupla de decretos nos 5595 de 1935 e 6000 de 1937 estabelece o primeiro zoneamento funcional da cidade. Embora frequen-
temente seja atribuído ao de 1937 o papel fundador, este aperfeiçoa os instrumentos do decreto anterior e revê minimamente a
delimitação das zonas.
14
Vigoram na área urbana central as seguintes legislações de preservação: decreto no. 4141/1983 Corredor Cultural; Lei no
1139/1987 Corredor Cultural; Lei no 506/1984 Corredor Cultural; Lei no 971/1987 SAGAS; decreto no 7351/1988 SAGAS; decreto no.
10040/1991 Cidade Nova – Catumbi; decreto no 11883/1992 Cruz Vermelha; decreto no 16419/1997 Teófilo Otoni; dec. 19000/2000
Estácio; APAC de São Cristovão.
15
Vide Pinheiro (2002).
16
Sobre projetos de renovação urbana nos EUA e Europa, ver Kostof (1992).
17
Projeto de autoria de Affonso Eduardo Reidy e Hermínio de Andrade e Silva (1949).
Conforme argumento desenvolvido por Gonçalves (1996) sobre o Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. GONÇALVES, José
18

R. S. A Retórica da Perda. Rio de Janeiro: UFRJ/IPHAN, 1996.


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19
Ver Choay (2001) a respeito.

andréa SAMPAIO
Vários autores discutem essa questão, que se explica pelo fato dos agentes do patrimônio serem os expoentes da Arquitetura
20

Moderna, como Lucio Costa. Ver Fonseca (1997), entre outros.


21
Para Choay (2001), essa continua sendo a “exposição de motivos e a argumentação mais complexa em favor de um tratamento
não museal das malhas urbanas contemporâneas”.
22
Destacam-se Salvador, Recife e São Paulo, entre outras cidades.
Tombamentos estaduais: Antiga estação e cocheira da Vila Guarani, em Santo Cristo (1966); Fundição Progresso (1987); antiga
23

Fábrica de Gás (1990); Estação Ferroviária Leopoldina (1991). Cabe destacar que até a fusão, em 1974, a instância apesar de esta-
dual, correspondia a cidade, então Estado da Guanabara.
24
Dos tombamentos municipais, destaca-se a Perfumaria Kanitz no bairro da Cruz Vermelha, (1987).
O Projeto SAGAS abrange os bairros portuários da Saúde, Gamboa e Santo Cristo. Lei no 971/1987 SAGAS, regulamentada pelo
25

decreto no 7351/1988.
26
Vide <http://www.theatromunicipal.rj.gov.br/releasesfabrica.html>.

Andrea da Rosa Sampaio


andrea.rsampaio@gmail.com

Professora Associado da Escola de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em


Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense. Arquiteta e Urbanista (UFF), Mestre
em Urban Design (University of Nottingham) e Doutora em Urbanismo (PROURB/UFRJ). Trabalhou
como arquiteta das Prefeituras Municipais de Petrópolis e Niterói. Atuação profissional e publica-
ções com ênfase em Reabilitação e proteção do Patrimônio Cultural, Urbanismo, Legislação Urba-
nística e Expressão Gráfica. Vem desenvolvendo pesquisas com apoio da FAPERJ e CNPq, e projeto
de extensão PROEXT/MEC. É membro suplente do Conselho Municipal de Proteção ao Patrimônio
Cultural do Rio de Janeiro. Foi premiada pelo IAB-RJ por projetos, orientações e pela tese.
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