Edição Lisboa • Ano XXXI • n.

º
º 11.141 • 1,70€ • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • Director:
Direct Manuel Carvalho Adjuntos: Amílcar Correia, Ana Sá Lopes, David Pontes, Tiago Luz Pedro Directora de Arte: Sónia Matos

Este é o nosso corpo

Como é viver
com o estigma
social da obesidade?

Pandemia retira 10 anos de vida

à almofada do sistema de pensões
Impacto da covid-19 pode ter consequências a médio e longo prazo. Para já, o Governo reduziu em 10 anos
o tempo de vida previsto para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social Destaque, 2/3 e Editorial
ADRIANO MIRANDA

Hospitais
Das filas de
espera às
consultas
adiadas. Histórias
de doentes
não-covid em
nove hospitais
Nunca houve
tantos infectados
internados
Sociedade, 10 a 13

Uma exposição Procurador vê Pode a América Chilenos

C dizem
para descobrir risco de lavagem voltar a ser h
hoje se querem
a identidade de dinheiro a América aos uma
u nova
açoriana na Zona Franca olhos do mundo? C
Constituição
Está patente em São Miguel e Rosário Teixeira deixou Relação com outros países A actual
a vem da ditadura de
evoca a eterna relação entre vários alertas sobre a Zona não regressará ao que era Pin
Pinochet. Após meses de
o homem e a natureza p24/25 Franca da Madeira p16/17 antes de Trump p18/19 tensão, é dia de referendo p21
ten
ISNN-0872-1548
2 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
DESTAQUE
SEGURANÇA SOCIAL
Pandemia retira
10 anos de vida
à almofada das
pensões
Impacto da covid-19 arrisca-se a ter consequências a médio
e longo prazo no equilíbrio do sistema de Segurança Social. Para
já, o Governo reduziu em 10 anos tempo de vida previsto para
o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social
Sérgio Aníbal
e Raquel Martins
B
astaram 10 meses, que incluí-
ram uma contracção recorde
da economia e um aumento
abrupto das necessidades de
apoios sociais por parte dos
portugueses, para que,
segundo as contas do Governo, se
tivesse encurtado em uma década o
prazo previsto até ao esgotamento do
fundo que serve de almofada Ænan-
ceira para o sistema de pensões.
Depois de quatro anos em que se viu
o executivo a melhorar sucessivamen-
te as suas previsões para a sustenta-
bilidade da Segurança Social, a pan-
demia obriga à reversão de uma par-
te signiÆcativa dos ganhos obtidos.
A proposta de Orçamento do Esta-
do (OE) apresentada a 12 de Outubro
revela que crise económica trazida
pela pandemia mudou de forma signi-
Æcativa as expectativas do Governo
em relação à evolução futura das con-
tas da Segurança Social. Entre a pro-
posta de OE para 2020 apresentada
no início deste ano e a proposta de OE
para 2021 agora em discussão no Par-
lamento, registam-se diferenças acen-
tuadas nas previsões que são feitas
para a evolução nas próximas déca-
das dos saldos do sistema previden-
cial da Segurança Social e dos valores
acumulados no Fundo de Estabiliza-
ção Financeira da Segurança Social
(FEFSS), que é a reserva Ænanceira
destinada a fazer face a futuros déÆ#
ces do sistema.
Desde há muito que se sabe que,
por causa da tendência demográÆca
existente em Portugal, o sistema
caminha, caso não se assista a uma
alteração das circunstâncias, para
uma situação de déÆces crónicos a
prazo, que o FEFSS apenas consegui-
rá compensar durante algum tempo.
O que a crise económica agora vivida
veio trazer, mostram os cálculos do
Governo, foi uma aceleração deste
processo, com os déÆces a chegarem
mais cedo e o fundo de estabilização
a esgotar-se mais rapidamente do que
aquilo que estava previsto no início
do ano, antes da pandemia.
No OE inicial para 2020, na análise
da sustentabilidade do sistema de
Segurança Social, o Governo aponta-
va que os primeiros saldos negativos
do sistema previdencial chegassem
“no Ænal da década de 2020”. Agora,
na proposta de OE para 2021, conti-
nua a dizer o mesmo, mas os números
que apresenta mostram que na ver-
dade o primeiro déÆce é agora espe-
rado alguns anos mais cedo.
Nos números publicados, referen-
tes apenas aos últimos anos de cada
década (2030, 2040, 2050 e 2060),
veriÆca-se que se está a antecipar
agora um déÆce bem mais elevado
em 2030. No OE2020, o déÆce pro-
jectado era de 424 milhões de euros
e agora é de mais do dobro: 987
milhões. Um resultado mais negativo
que faz supor que o primeiro déÆce
se possa veriÆcar alguns anos antes
do Ænal da década.
Depois, relativamente ao FEFSS,
Crise económica acelerou estimativa para surgimento de défices e esgot
As projecções do Governo que começa a ser usado a partir do
para a Segurança Social momento em que se registam déÆ#
Saldo do sistema previdencial
ces, as diferenças entre as projecções
feitas no OE2020 e no OE2021 são
Em milhões de euros muito signiÆcativas. Há 10 meses, o
executivo previa “um esgotamento
2000
do fundo na segunda metade da
1000 OE2020
década de 2050”. Agora, estima que
0
“o fundo se esgote na segunda meta-
-1000 -1160
de da década de 40”.
Concretamente, no OE2020 era
previsto que em 2040 o FEFSS pudes-
-2000 se ter ainda 32.228 milhões de euros
-3000 OE2021 a seu cargo, mas agora não se espera
que tenha nessa altura mais do que
-4000 -1662 16.116 milhões, cerca de metade. E
2020/21 2030 2040 2050 2060 para 2050, enquanto antes se projec-
tava que ainda tivesse nos seus cofres
Valor do Fundo de Estabilização
12.617 milhões de euros, agora o valor
Financeira da Segurança Social
previsto é de zero.
Em milhões de euros São vários os motivos para esta pro-
40.000 jecção mais negativa. No OE, o Gover-
OE2020 no fala, em particular, do “agrava-
30.000 mento da situação no ponto de parti-
da”. O ponto de partida é, por causa
20.000 da contracção histórica da economia
OE2021 registada este ano, realmente bastan-
te pior. Há dez meses, o Governo fazia
10.000
as suas contas com base num saldo
do sistema previdencial previsto para
0
2020 de 1567 milhões de euros. E ago-
2020/21 2030 2040 2050 2060
ra, a base das suas projecções passou
Fonte: OE2020 e OE2021 PÚBLICO a ser um excedente de apenas 379
milhões de euros em 2021.

tamento do fundo de estabilização
Depois, relativamente ao FEFSS,
para além de as receitas provenien-
tes do saldo do sistema este ano e
nos próximos serem mais baixas e
de se ter de começar mais cedo a ter
de fazer face aos déÆces, é assumida
ainda uma rentabilidade intrínseca
do Fundo de 3,3% ao ano ao longo
do tempo, quando há dez meses,
essa rentabilidade era calculada em
3,58%.
Ainda melhor que em 2015
Alterações nos cálculos da sustenta-
bilidade do sistema não são uma novi-
dade. Em tempos de crise, com a
deterioração dos indicadores, as pre-
visões para o futuro tendem a tornar-
se mais negativas. E quando a econo-
mia acelera e o desemprego cai, a
tendência é para uma melhoria dos
indicadores de sustentabilidade.
Este segundo caso veriÆcou-se
precisamente entre 2015 e 2020. Os
OE apresentados nos anos anterio-
res à pandemia foram marcados a
este nível por um aumento progres-
sivo do optimismo, com o Governo
a adiar sucessivamente a data de
esgotamento do FEFSS, baseado na
previsão de potenciais de crescimen-
to mais elevados, numa situação
mais positiva no mercado de traba-
lho e na expectativa de cada vez
PAULO PIMENTA
maiores receitas do FEFSS.
É precisamente isto que o Governo
agora destaca quando questionado
sobre a redução do prazo de vida do
FEFSS registada na proposta de OE
para 2021. Fonte oÆcial do Ministério
da Segurança Social assinala que “a
previsão de esgotamento do FEFSS
está projectada para a segunda meta-
de da década de 40, projecção seme-
lhante aos anos de 2018 e 2019 e que
representa uma melhoria de 17 anos
face ao OE de 2015”.
Para Miguel Coelho, economista
especializado em Segurança Social,
este sobe e desce nas expectativas de
sustentabilidade, à medida que a con-
juntura de curto prazo melhora ou
piora são um sinal de que “as projec-
ções feitas não são robustas, são mui-
2040
Há 10 meses, o executivo previa
“um esgotamento do fundo na
segunda metade da década de
2050”. Agora, estima que “o
fundo se esgote na segunda
metade da década de 40”
to cíclicas, com uma lógica que é de
curto prazo”.
Mas alerta que, com a presente cri-
se, “as preocupações com a sustenta-
bilidade agravam-se”, destacando os
impactos que podem decorrer de
“uma alteração no mercado de traba-
lho cuja dimensão não compreende-
mos verdadeiramente”. “O novo
normal vai ser diferente no mercado
de trabalho e o sistema de Segurança
Social não está preparado para obter
receitas neste novo normal das rela-
ções laborais, apenas está preparado
para o que é tradicional”, diz.
Armindo Silva, consultor e asses-
sor da Confederação do Comércio e
Serviços, também conclui que a alte-
ração nos resultados obtidos só se
pode dever à introdução de novos
valores para as variáveis conjuntu-
rais e alerta que alguns dos pressu-
postos do modelo que mantém
podem ser demasiado optimistas.
“As contribuições continuam a cres-
cer ao mesmo ritmo que o PIB, os
salários vão continuar a evoluir ao
mesmo ritmo que a produtividade e
considera-se que a produtividade vai
aumentar em valores muito altos —
hipóteses que são, do meu ponto de
vista, discutíveis.”
O economista Amílcar Moreira
também vê alguns motivos para
temer que as novas projecções pos-
sam ser mesmo assim um pouco opti-
mistas. “É preciso perceber se os
ganhos de emprego que estão previs-
tos se vão mesmo concretizar. Este
cenário optimista da recuperação de
emprego deriva da ideia de que a eco-
nomia vai recuperar muito rapida-
mente desta pandemia e eu não tenho
tanta certeza assim”, aÆrma, alertan-
do: “Se se conÆrmarem as expectati-
vas do Governo em termos da recu-
peração do emprego entre 2021 e
2023, tudo bem, mas se assim não for,
vamos assistir a uma degradação da
sustentabilidade da Segurança Social
no curto a médio prazo.”
Do lado do Governo, aquilo que é
considerado essencial para assegu-
rar o objectivo de sustentabilidade
é, ao mesmo tempo que se assegura
a diversiÆcação das fontes de rendi-
mento, “a estabilização da econo-
mia, através da manutenção do nível
de emprego e do rendimento dos
trabalhadores e, portanto, da receita
contributiva”.
sergio.anibal@publico.pt
raquel.martins@publico.pt
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 3
O sistema de Segurança Social
não está preparado para obter
receitas neste novo normal
das relações laborais
Miguel Coelho
Economista
Qual é o papel do fundo de
estabilização durante as crises?
Raquel Martins
e Sérgio Aníbal
C
om o país confrontado com
uma nova crise económica,
o Governo decidiu recorrer,
embora de forma indirecta,
à almofada da Segurança
Social “para assegurar o equi-
líbrio do sistema” durante este perío-
do. Assim, em 2021, as verbas relati-
vas a 2% da receita do IRC e ao adicio-
nal de IMI — que em condições
normais deviam ser transferidas para
o Fundo de Estabilização Financeira
da Segurança Social — serão encami-
nhadas para o orçamento do sistema
previdencial, para fazer face às neces-
sidades criadas pela pandemia.
A decisão de subtrair verbas ao
FEFSS não é inédita, mas lança a dis-
cussão sobre o papel desta almofada
nos momentos de crise. E há uma
questão que emerge: será preferível
descapitalizar o FEFSS ou, em alter-
nativa, aumentar impostos?
A resposta não é fácil, mas Miguel
Coelho defende que o caminho deve
ser o da primeira hipótese. “Penso
que, nas actuais circunstâncias, pode
ser compreensível recorrer ao fundo
porque é preferível não cobrar mais
impostos quando a economia não
Ana Mendes Godinho, ministra
do Trabalho e Segurança Social
está a crescer. Até se pode questionar
se se deveria ter ido mais longe, evi-
tando custos adicionais para o Orça-
mento do Estado (OE) numa altura de
crise económica”, diz o economista.
Armindo Silva lembra que o pró-
prio Tribunal de Contas tem alertado
para atrasos na transferência das
receitas consignadas ao FEFSS.
Porém, não vê com maus olhos uma
gestão mais Çexível das verbas do
fundo: “É um fundo público. Não me
parece mal que haja Çexibilidade na
sua gestão.” O problema, sublinha, é
que “não são tiradas consequências
das diÆculdades que vai havendo na
gestão do sistema”.
“O FEFSS teve uma performance
notável em 2019 quando, pela primei-
ra vez, conseguiu um aumento das
transferências e uma valorização
signiÆcativa das reservas. Nos outros
anos, ou houve desvalorização dos
activos, por causa dos mercados, ou
não houve transferências. Trata-se de
um fundo com grandes oscilações [na
entrada de receitas] e basearmos a
nossa resposta ao desaÆo da susten-
tabilidade apenas no comportamen-
to do fundo é muito arriscado”, aler-
ta o consultor, que defende a neces-
sidade de fontes alternativas de
Ænanciamento da Segurança Social.
Amílcar Moreira lamenta que não
existam mecanismos “que protejam
o FEFSS de decisões políticas que se
sobreponham à lei”. “As regras, quer
de Ænanciamento do FEFSS, quer da
forma como se poderão vir a utilizar
os fundos, são muito Çexíveis e são
quebradas facilmente. Se estes [IRC e
AIMI] são os mecanismos de Ænancia-
mento, os governos devem cumprir
a lei. Se não cumprem, que mudem a
lei. O que é necessário é um quadro
mais estável de Ænanciamento do fun-
do de estabilização que possa ser
cumprido por toda a gente”, nota.
Questionada pelo PÚBLICO sobre
se há intenção de alterar a lei do
FEFSS, fonte oÆcial do Ministério da
Segurança Social respondeu que a
decisão para 2021 é pontual: “É uma
transferência extraordinária em
2021, face à situação excepcional
que vivemos.”
4 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020

ESPAÇO PÚBLICO
Dificilmente o treinador do Ajax terá, até ao
fim da carreira, uma vitória como a que
ontem obteve no terreno do Venlo, na 6.ª
jornada da Liga holandesa. Erik ten Hag poderá, de
agora em diante, orgulhar-se de ter orientado a
equipa que alcançou a maior goleada da história da
Eredivise. Foram nada mais nada menos do que 13 os
golos marcados pela formação de Amesterdão, que
assumiu a liderança do campeonato com uma média
Erik ten Hag de quatro golos por jogo (Pág. 29). N.S.
Com um arranque de época de altíssimo
rendimento, Pedro Gonçalves tem justificado
a titularidade e o investimento que o Sporting
fez para o contratar ao Famalicão. O médio
português foi absolutamente decisivo no triunfo
alcançado pelos “leões” em casa do Santa Clara. De
ângulo apertado, e em ambos os casos do lado
esquerdo do ataque, apontou os dois golos que dão
continuidade ao bom início de campeonato levado a
Pedro Gonçalves cabo pela equipa de Alvalade (Pág. 28). N.S.

A almofada das pensões está mais curta

incapacidade de atendimento em
tempo útil de doentes com outras
patologias.
Como já se anteviu, o clima de
consenso de Março será política e
Amílcar Correia socialmente irrepetível no
Editorial Inverno: enfermeiros vão entrar
Estado meios excepcionais, para
fazer face a imprevistos especiais.
A contracção brutal da economia e
o aumento das prestações sociais
fez com que, em dez meses, o
prazo previsto de longevidade da
almofada Ænanceira para o fundo
de trabalho, e que lhe garantissem
a estabilidade para assegurar as
despesas com pensões quando a
receita das contribuições é inferior
às despesas. Caso a economia não
recupere e o emprego não cresça a
tempo e horas, melhorando as

O
serviço público tem diante
de si dois desaÆos de
proporções imprevisíveis. O
consistente crescimento de
novos casos de doentes com
covid-19 (que ontem atingiu o pico
desde o início da pandemia)
ameaça a capacidade de resposta
e de organização do Serviço
Nacional de Saúde. O SNS
confronta-se com uma nova
avalancha, de progressão
geométrica garantida nas
próximas semanas, e com a
em greve, a dupla Marta Temido e
Graças Freitas será criticada pelas
suas contradições ao longo do
processo e a gestão da pandemia
tornar-se-á, mais do que nunca,
motivo de confronto político ou
institucional. O que se passa em
Portugal não se distingue do que
se passa no resto de uma Europa
que caminha para a adopção de
medidas mais gravosas com medo
do colapso dos serviços de saúde.
O segundo desaÆo é igualmente
preocupante. A crise económica
decorrente da pandemia exige do
de pensões recuasse uma década.
O Governo optou por deslocar
verbas da receita do IRC e do
adicional de IMI, que deveriam ser
transferidas para o Fundo de
Estabilidade Financeira da
Segurança Social, para as
necessidades actuais de
tesouraria. Compreende-se a
opção. Era impossível aumentar
impostos.
Mas este fundo público deveria
ter fontes alternativas de
Ænanciamento, que não
dependessem apenas do mercado
previsões da sua sustentabilidade,
como se veriÆcou nos últimos
quatro anos, sucessivos déÆces
crónicos podem antecipar o
esgotamento de um fundo que já
sabemos não ser inÆndável.
É uma questão de ciclos. O
colapso do serviço público de
saúde agora e o colapso
antecipado da Segurança Social
signiÆcaria a ruptura da nossa
relação com o Estado e a ruptura
do próprio Estado.
acorreia@publico.pt

As cartas destinadas a esta secção
devem indicar o nome e a morada
do autor, bem como um número
telefónico de contacto. O PÚBLICO
reserva-se o direito de seleccionar e
eventualmente reduzir os textos não
solicitados e não prestará
informação postal sobre eles.
Email: cartasdirector@publico.pt
Telefone: 210 111 000
CARTAS AO DIRECTOR
Oportunista,
chantagista
e criminosa
A generalidade dos portugueses
reconhece a importância crucial
dos enfermeiros e da sua
contribuição fundamental para o
bom funcionamento, quer do
SNS, quer dos hospitais
privados. Conhecem igualmente
a boa imagem que granjearam
nos países para onde um número
signiÆcativo de enfermeiros foi
obrigado a emigrar nos tempos
da troika. Sabe-se igualmente
que, tal como os médicos e
muitos outros proÆssionais de
saúde e não só, têm salários
baixos, se comparados com os
praticados na generalidade dos
países europeus. É igualmente
fácil compreender, como depois
de vários meses de pandemia,
devem andar exaustos e
cansados.
Dito isto, e na altura em que o
maldito vírus se “encarniçou” e é
assustadora a evolução do
número de infectados (esta
semana ultrapassou-se os 3 mil
casos), é completamente
descabida a marcação de uma
greve de 5 dias em Novembro
anunciada pelo Sindicato
Democrático dos Enfermeiros
Portugueses. Descabida, porque
revela uma mistura venenosa de
oportunismo e chantagem que
vem turvar a boa imagem que a
classe tem aos olhos dos
portugueses. É como se no meio
de uma guerra, um batalhão se
recusasse a enfrentar o inimigo
para melhorar o pré. ClassiÆquei
este anúncio de greve como
oportunista e chantagista,
porque ainda acredito que ela
não se venha a realizar-se. Se me
enganar e a greve se efectivar, é
de uma acção absolutamente
criminosa que estamos a falar. Se
caírem na esparrela deste
sindicato, os bons proÆssionais
perderão rapidamente o
prestígio que ao longo de tanto
tempo levaram a construir.
Helder Pancadas, Sobreda
Rio e o Orçamento
do Estado
O chefe do maior partido da
oposição, que foi presidente da
Câmara Municipal do Porto e de
quem muitos gostaram e
acharam ter feito um “trabalho
brilhante” — não é o caso de
quem isto escreve, mas também
em nada conta —, viu agora na
discussão do Orçamento do
Estado, que em tempos de
covid-19 deveria “passar”,
mesmo com deputados a
“morder” a língua, a sua
oportunidade de sobressair,
votando contra.
O maior partido da oposição,
que deviera voltar já ao seu
primitivo nome, dado que de
social-democrata nada tem, está
a querer “olhar para si mesmo” e
só para si mesmo. São jogadas
que para o próprio podem vir a
resultar. Mas são péssimas para o
país em tempo de covid-19.
Augusto Küttner de Magalhães,
Porto
TGV Lisboa-Porto
Olhando para as duas capas do
PÚBLICO (de 22/10/2020 e a de
06/07/1999) não posso deixar de
pensar: mudam-se os tempos
mas não mudaram as vontades.
Trata-se de mais uma notícia
propagandística sem
consequência? Desta vez é que é?
Ou é apenas mais uma promessa
“política”? Gostava bem que
houvesse mais acção política do
que propaganda.
José Sousa Oliveira, Porto
 Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 5

A opinião publicada no jornal respeita a norma ortográfica escolhida pelos autores

O chefe do Governo espanhol, Pedro A controversa alteração constitucional que

Sánchez, convocou para hoje uma reunião
extraordinária do Conselho de Ministros para
declarar o estado de emergência que permita, entre
outras medidas, impor recolheres obrigatórios.
Sánchez preferia esperar para ter a unanimidade das
regiões. Mas cedeu à pressão de dez das 17
comunidades autónomas do país que admite poder
ter quase três milhões de casos de covid-19, doença
Pedro Sánchez que já matou quase 38 mil pessoas. (Pág. 20). A.V.
permitiu a Alpha Condé, de 82 anos,
candidatar-se a um terceiro mandato como
Presidente da Guiné-Conacri, valeu-lhe o cargo, mas
já teve um custo de 90 mortes, em manifestações de
contestação à sua perpetuação no poder. A
comissão eleitoral independente atribui-lhe a vitória,
com 59,4% dos votos, mas o principal adversário,
Cellou Dalein Diallo, também se declarou vencedor,
Alpha Condé antes até da divulgação dos resultados. (Pág. 20) A.V.

ESCRITO NA PEDRA
Está a chegar
Antes de haver segurança social, cerca de metade dos
idosos norte-americanos vivia na pobreza a hora
Bernie Sanders (1941-), político norte-americano

SEM COMENTÁRIOS NASHVILLE, ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

MARIO CRUZ/EPA

EM PUBLICO.PT
O silêncio de uma máquina de
salvar vidas
O fotojornalista Paulo Pimenta mostra
lugares de silêncio no Hospital de S. João,
no Porto, onde se luta contra a pandemia
publico.pt/multimedia
Máscaras obrigatórias
O que muda e quais as excepções à regra?
Perguntas e respostas sobre a nova lei.
publico.pt/coronavirus
E
Miguel Esteves Cardoso
Ainda ontem
ste é aquele domingo do ano em que
acordamos às 7 da manhã, furiosos
por acordar tão cedo, logo no dia
em que podíamos dormir mais um
bocado e vamos ver as horas e aÆnal
ainda são seis da matina.
Está tudo fechado, não há
ninguém com quem se possa falar e
a hora que se “ganhou” só servirá
para ter prematuramente sono às
dez da noite (ex-onze), garantindo que no dia
seguinte o nosso metabolismo macacóide
despertará às cinco.
Faz algum sentido esperar pelas duas da
manhã para voltar para a uma? Então, à uma
e meia da manhã, o que dizemos a nós
próprios? “Espera mais meia hora até ser
uma?”
A lei deve julgar que estamos todos numa
discoteca, naquele festival permanente que
havia antes da covid, a chupar tanto nos
comprimidos e a sacudir tanto as melenas,
que perdemos, juntamente com as
estribeiras, qualquer noção do tempo.
Só assim, aproximando-se as duas da
manhã é que calhará bem às bacantes e aos
bacanos saberem que aÆnal é só uma e que
têm mais uma hora de dança do que
pensavam.
Está mal. Cada um de nós tem o direito de
escolher a hora de mudar o relógio. Que tal
daqui a seis meses, só pelo prazer de dizer:
“Ah, espera aí, não é hoje que a hora anda
para a frente? Então, nesse caso, deixa-me
cá... não fazer absolutamente nada ao
relógio.”
Nus falsos Eu cá tenciono atrasar-me dez minutos por
mês durante três meses e, chegando a Janeiro,
A história de como um serviço obscuro de começarei a adiantar dez minutos por mês até
inteligência artificial transformou milhares Março, altura em que o meu relógio voltará a
de fotos de mulheres em fake nudes. Æcar certo. Se houver extraterrestres a
observar este nosso estranho
publico.pt/p3 comportamento... é bem feito.
6 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
ESPAÇO PÚBLICO
O que fazer com um demagogo?
Teresa de Sousa
Sem fronteiras
Os pais fundadores previram
apenas os checks and balances
1.
entre Presidente, Congresso e
Supremo Tribunal
Do ponto de vista de quem não é
americano, mas “participa” de
alma e coração nas eleições
americanas, um dos debates mais
interessantes nos três dias da 28.ª
edição do Fórum Político do
Estoril, organizado pelo Instituto
de Estudos Políticos da
Universidade Católica, tinha como
tema uma frase que costumamos
utilizar a torto e a direito, mas que, neste
caso particular, faz todo o sentido. “A
América na encruzilhada.” Com dois
oradores principais a intervir de Washington
(a conferência realizou-se via Zoom) de
nomes familiares para quem acompanha o
que se passa no mundo das ideias: William
Galston, da Brookings Institution, e William
Kristol, que publicou uma das revistas de
referência do movimento neoconservador
americano, a The Weekly Standard
(entretanto, fechada). Esperar-se-iam
posições contrastadas sobre os dilemas que a
América atravessa neste momento. A
convergência de opiniões entre ambos é o
primeiro e inequívoco sinal de que a era
Trump não encaixa na normalidade política
de quase 250 anos de vida que leva a
democracia americana.
2. Kristol, que faz parte da “resistência”
republicana a Trump, começou por
responder a uma interrogação que quase
toda a gente já se colocou a si própria: é
possível um sistema constitucional que
impeça alguém como Trump de chegar ao
topo do poder dos EUA? A questão não é
absurda. Já se colocava aos fundadores da
República e está referida nos Federalist
Papers, que reúnem os escritos de Hamilton,
Madison e John Jay, os promotores da
Constituição americana. “Quem pode ser
Presidente?” Ou, mais rigorosamente, como
Kristol explicou, “como impedir que um
demagogo possa ser eleito”. “Nunca tivemos
nenhum demagogo com total desprezo pela
própria Constituição, Donald Trump é o
primeiro caso”, diz. Os pais fundadores não
tinham resposta, a não ser a criação de um
sistema de checks and balances, que perdura
até hoje e que consegue, melhor ou pior,
distribuir o poder por três instituições
essenciais que se equilibram umas às outras:
o Presidente, que é o chefe do executivo, o
TOM BRENNER/REUTERS
vivido aqui, mesmo que tenham entrado
ilegalmente.” Foi o que fez Obama e que
Biden, se for eleito, se prepara para fazer. A
saúde oferece outro exemplo. Em 1965, um
Presidente democrata, Lyndon Johnson, fez
aprovar um novo sistema de saúde
gigantesco para as pessoas mais velhas, o
Medicare. “Mas, por mais liberal que este
sistema fosse, na sua concepção e execução,
recebeu 70 votos republicanos na Câmara e
13 no Senado”, escreve o autor. Pelo
contrário, o Obamacare, que se inspirou em
reformas realizadas por Mitt Romney
(candidato republicano contra Obama, em
2012) no Massachusetts, que levou em conta
muitas ideias republicanas com o objectivo
Congresso e o Supremo Tribunal. Há, no bipartidárias. “A combinação entre uma de obter apoio dos dois partidos, não
entanto, uma coincidência perversa que coligação de centro e Joe Biden poderia ser recebeu um único voto republicano, nem na
contribui para desequilibrar perigosamente fundamental” para retirar a democracia do Câmara, nem no Senado. Em 2014, um
o sistema: segundo Kristol, a total rendição seu bloqueio actual. “Mas são precisos dois inquérito da Pew Research revelava que 37
do Partido Republicano ao “demagogo”, que para dançar o tango e, portanto, é esperar por cento dos republicanos e 31 por cento
distorce o papel fundamental do Congresso. para ver o que acontece depois das eleições”, dos democratas via o outro partido como
“O Partido Republicano transformou-se num que incluem a renovação de lugares nas duas “uma ameaça ao bem-estar nacional”. Em
partido populista, estou bastante pessimista câmaras do Congresso. Para Kristol, talvez 2016, as duas percentagens tinham subido
quanto ao futuro desse partido.” Kristol é mais próximo da realidade do seu partido, “o para 45 e 41 por cento, respectivamente.
republicano. É este grau de “capitulação dos estado de espírito actual dos republicanos é Trump foi eleito. Hoje, republicanos e
republicanos a Trump” que, em seu ser contra”. “É ainda muito difícil imaginar o democratas estão divididos em praticamente
entender, “muda a dinâmica política dos que lhes vai acontecer quando Trump sair de todas as questões relevantes. Ao longo da
Estados Unidos”. “Se tivessem resistido um cena.” O drama, mais uma vez, é que falta história da democracia americana, muita
pouco, nada disto estaria a acontecer.” um precedente histórico. “Nunca houve um coisa dependeu da forma como os dois
Trump.” Quando, nos comícios de Trump, partidos se relacionaram entre si, explica
3. Como se combate este estado de coisas? em 2016 e, de novo, agora, a multidão grita Galston. Quando se afastam demasiado, isso
Francis Fukuyama defendeu recentemente “lock her up” (“prendam-na”), estamos a ver signiÆca uma distorção no sistema. E quando
que era urgente criar um “espaço político de o que não imaginávamos possível. o Congresso não consegue desempenhar o
centro”, entre o populismo da direita e o seu papel, alguns dos seus poderes migram
progressismo radical. Kristol acredita pouco 4. Então, porque aconteceu? Ainda faltam para o Supremo Tribunal e outros para a
nesta possibilidade, mesmo que admita que respostas. Mas, de um modo geral, a extrema Casa Branca.
a defesa da democracia liberal possa vir a polarização política em que o país
unir o centro político. Reconhece que este mergulhou e a crescente polarização da 5. Resta a última angústia, que não chegou
sentimento é hoje bastante mais agudo do própria sociedade podem estar na origem a ser debatida neste painel do Fórum do
que já foi, mas acrescenta que a liderança deste fenómeno nunca até hoje visto na Estoril, mas que vai aumentando à medida
política é o factor decisivo. América. Galston explica-a com o acentuar que o dia das eleições se aproxima: Trump
William Galston responde que não é de três divisões fundamentais na sociedade aceitará os resultados? Sairá da Casa Branca,
impossível, americana: demográÆcas, económicas e se perder? Incitará à violência? Seria, mais
lembrando que, culturais. Que levaram ao afastamento cada uma vez, uma estreia na historia dos EUA. As
mesmo com a vez maior entre os dois partidos e a um opiniões dividem-se. Depois de ouvir o
capitulação dos fenómeno relativamente novo: a debate entre Kristol e Galston, a angústia não
republicanos, foi radicalização dos próprios eleitores, que se diminui.
A rendição do possível criar na identiÆcam cada vez mais de uma forma Quando Trump foi eleito, muita gente
Câmara dos acreditou que o hábito faria o monge. A Casa
Partido Representantes um
exclusiva com um partido e que vêem cada
vez mais no outro tudo aquilo que não Branca e os seus conselheiros fariam dele um
Republicano a caucus com 25 querem ou detestam. Presidente um pouco mais normal do que o
Trump distorce congressistas de cada
partido para levar
Num livro de leitura bastante aconselhável,
Why We’re Polarized, Ezra Klein fornece um
candidato. Não aconteceu. Depois, muita
gente acreditou que a sua presidência teria
o papel do por diante iniciativas vasto conjunto de dados que medem esta um efeito devastador no mundo, mas que a
Congresso, diz bipartidárias. No
futuro, estas
evolução de uma forma surpreendente. O
autor cita discursos de Reagan ou de Clinton
solidez da democracia americana aguentaria
os golpes. Hoje, é a solidez da democracia
Kristol “coligações de que nenhum republicano jamais aceitaria que está à prova.
centro” podiam ser subscrever nos dias que correm e com que Como sair daqui? O vaticínio de Galston:
muito úteis a um poucos democratas se identiÆcariam. “É possível, mas não será nem fácil, nem
Presidente que Reagan assinou uma reforma da imigração rápido”. Kristol insiste: “As lideranças são
passou a vida a que hoje os democratas veneram e sobre a fundamentais”.
trabalhar no qual disse precisamente o seguinte:
Congresso por “Acredito na ideia de amnistia para aqueles Jornalista. Escreve ao domingo
iniciativas que abandonaram as suas raízes e que têm teresa.de.sousa@publico.pt

Ninguém pode salvar-se sozinho
Frei Bento Domingues O.P.
Neste tempo de
desorientação não é nada
enganosa a publicidade que
repete: cuidar de si é cuidar
1.
de todos!
Estes não são tempos de euforia.
As festas que a pretendem imitar
acabam sempre em redobrada
tristeza. Às loucuras das guerras e
novas ameaças de guerras veio
juntar-se a devastação mundial
provocada pela covid-19 que,
além das pessoas que mata e dos
recursos que consome, vai deixar
muita gente abandonada à
miséria. Por isso, não é nada enganosa a
publicidade que repete: cuidar de si é cuidar
de todos!
É verdade que o incómodo da máscara, da
etiqueta respiratória, da limpeza das mãos, da
distância física, etc., é muito irritante.
Recorrer a soÆsmas, para dizer que não está
cientiÆcamente demonstrada a eÆcácia
desses cuidados, não passa de um exercício
de banal e oca retórica.
Ver em todas as medidas governamentais,
que tentam impedir o alastramento da
pandemia, um atentado à liberdade e aos
direitos humanos é uma reacção que roça a
paranóia. O coronavírus não costuma
respeitar as nossas reais ou Æctícias arrelias.
O bom senso, que não precisa de receita
médica, aconselha a boa distância entre o
pânico imobilizador e o desleixo fatal. O
sentido da responsabilidade, pessoal e social,
Æca mais barato do que o conÆnamento ou o
internamento hospitalar.
Resta um desaÆo para a nossa imaginação:
como reinventar e multiplicar as
manifestações de afecto e de bom humor que
anulem o mau distanciamento e a
indiferença, sobretudo em datas de reunião
familiar, como as do Natal religioso ou
agnóstico?
Não está bem atribuir sempre à covid-19 o
mau costume de substituir razões e
argumentos pela agressividade assassina nos
meios de comunicação social e na própria
Assembleia da República, considerada a
pátria da democracia.
O diálogo vigoroso não precisa nem de ser
açucarado nem azedo. A amizade política
favorece a verdade da informação e o rigor da
argumentação, nos debates que visam o bem
comum entre os proponentes de projectos
diferentes de sociedade. O dissenso entre
esses projectos não deveria impedir os
consensos, sobretudo, quando calamidades
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 7
ESPAÇO PÚBLICO
PAULO PIMENTA
que chegam, podem resumir-se em quatro
verbos: acolher, proteger, promover e
integrar. Devemos oferecer aos migrantes a
possibilidade dum novo desenvolvimento
pois, se forem ajudados a integrar-se, eles são
uma bênção, uma riqueza e um novo dom
que convida a sociedade a crescer.
A paz social é muito trabalhosa, artesanal.
Integrar realidades diferentes é muito difícil e
lento, embora seja a garantia de uma paz real
e sólida. O que conta é gerar processos de
encontro, processos que possam construir
um povo capaz de recolher as diferenças.
Armemos os nossos filhos com as armas do
diálogo. Ensinemos-lhes a boa batalha do
encontro! [4]
3. Da Segunda Guerra Mundial, Franz Kafka
deixou-nos o seu testemunho: “A guerra, a
revolução russa e a miséria do mundo inteiro,
aÆguram-se-me uma espécie de dilúvio do
Mal. É uma inundação. A guerra abriu as
comportas do Mal. As escoras, que
sustentavam a existência humana,
partiram-se. O porvir histórico já não repousa
no indivíduo e sim nas massas.
Atropelam-nos, empurram-nos, varrem-nos.
impostas geram graves crises sociais que das pessoas. É a necropolítica no sentido Sofremos a história… Perdemos o
afectam os mais pobres e débeis. puro: o racismo (…). Esta cultura de ódio é conhecimento sem perdermos a vida. O
Como diz M. Correia Fernandes, director da social quando é racial, e é sempre social marquês de Sade é o verdadeiro patrono da
Voz Portucalense, “a nossa imprensa, quer a mesmo quando não é racial. O racismo pode nossa época, pois não pode alcançar a alegria
mais vista lida quer a mais lida (o que não é ser o seu enunciado mais poderoso, porque de viver a não ser através do sofrimento
bem a mesma coisa), tem vindo a assumir um mobiliza o recalcado e fornece uma alheio, do mesmo modo que o luxo dos ricos
vocabulário que pretende ser apelativo ou autodesculpabilização dos cúmplices, mas tem de ser pago pela miséria dos pobres.” [5]
pretensamente expressivo, mas que apenas todo o discurso odioso tem por objectivo criar No Encontro internacional em prol da paz
esconde uma mentalidade eivada de violência medo e instalar o impensável.” [2] no espírito de Assis, realizado na Praça do
escondida ou disfarçada. (…) Com palavras Capitólio (Roma), no dia 20 deste mês, foi lido
construímos e com elas aniquilamos. Com 2. A liturgia deste Domingo começa com um grande Apelo de Paz:
elas apaziguamos e com elas criamos conÇitos um eloquente texto do Antigo Testamento, Nesta Praça do Capitólio, pouco tempo
e guerras. Com o seu mau uso, podemos cheio de lições para o nosso tempo de depois do maior conÇito bélico de que há
destruir tanto xenofobia: “Não usarás de violência contra o memória na história, as nações que se
trabalho feito, tanta estrangeiro residente nem o oprimirás, guerrearam estabeleceram um Pacto,
proximidade porque foste estrangeiro residente na terra do fundado sobre um sonho de unidade que em
aniquilada, tantas Egipto. Não maltratarás nenhuma viúva nem seguida se realizou: uma Europa unida. Hoje,
relações construtivas. nenhum órfão. Se tu o maltratares, e se ele neste tempo de desorientação, açoitados
O sentido da Quanto
relacionamento
clamar por mim, hei-de ouvir o seu clamor
(…). Se emprestares dinheiro a alguém do
pelas consequências da pandemia covid-19,
que ameaça a paz ao aumentar as
responsabilida- humano se perdeu meu povo, ao indigente que está contigo, não desigualdades e os medos, digamos com
de, pessoal e por palavras mal
ditas!” [1].
serás para ele como um usurário: não lhe
imporás juros. Se penhorares o manto do teu
força: Ninguém pode salvar-se sozinho,
nenhum povo, ninguém!
social, fica mais Francisco Louçã próximo, devolver-lho-ás até ao pôr do Sol, Os que pensam que se podem salvar
barato do que o mostra que, nos dias porque a capa é tudo o que ele tem para sozinhos perderam a memória desse Pacto
de hoje, a cobrir a pele. Com que dormiria? E se vier a histórico.
confinamento necropolítica clamar por mim, ouvi-lo-ei, porque Eu sou
ou o condiciona e misericordioso.” [3] [1] Voz Portucalense de 07.10.2020
internamento transforma a razão
democrática de
Através de gerações e gerações,
esquecemos algo elementar: o mundo todo foi
[2] Cf. Francisco Louça, Choque e pavor serão
o futuro da política? Revista Expresso de
hospitalar várias formas: e é feito de migrantes. Não fomos os primeiros 17.10.2020
“Porventura a mais a ocupar o território em que hoje vivemos. O [3] Ex 22, 20-26
poderosa e que tenho desprezo ou o ódio pelo estrangeiro, em [4] Cf. Fratelli Tutti, n.º 129-135 e 217
vindo a sublinhar, é a nome de um nacionalismo cego, tem tanto de [5] Cf. Charles Mœller, Literatura do século XX
que levanta uma antigo como de errado. e cristianismo, Vol. III, Esperança dos Homens,
cultura de ódio para Ao pôr limites às fronteiras que o mundo Flamboyant, São Paulo, 1959, pp. 346-347
se sobrepor à ergueu, o Papa Francisco repete que os
experiência da vida nossos esforços, a favor das pessoas migrantes Escreve ao domingo
8 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020

POLÍTICA
PAN e BE decidem hoje, PCP não
se abstém de exigir mais do OE
Foi Costa o primeiro a anunciar que o PAN revelava a decisão neste Äm-de-semana. Jerónimo avisa que
o PCP viabiliza “apenas e só” a passagem do OE à fase seguinte. Bloco e Governo mantêm o impasse
MÁRIO CRUZ/LUSA

Orçamento 2021
Álvaro Vieira
O PAN anuncia hoje, numa conferên-
cia de imprensa marcada para as 18h,
o sentido de voto quanto à proposta
de Orçamento do Estado (OE) para
2021, que pode Æcar já com a apro-
vação na generalidade viabilizada, se
os três deputados dos eleitos do Pes-
soas-Animais-Natureza optarem pela
abstenção ou pelo voto a favor.
Se for o caso, e no pressuposto de
o PEV não se afastar do PCP e optar
também pela abstenção, por este
anunciada na sexta-feira, seria o
pequeno grupo parlamentar a anun-
ciar implicitamente ao país a passa-
gem do OE2021 à fase da especialida-
de. Com os 10 deputados comunis-
tas, os dois do PEV e os três do PAN
a optarem pela abstenção, o PS, que
tem 108 dos 230 deputados, passa a
ser capaz de, à justa, garantir sozi-
nho a aprovação.
O primeiro-ministro António Cos-
ta, falando ontem à margem da con-
ferência Visão Fest Verde, em Lisboa,
foi o primeiro a revelar — mesmo
antes de o partido convocar a confe-
rência de imprensa — que o PAN
deveria anunciar a decisão neste Æm-
de-semana. E as declarações da líder
parlamentar, Inês Sousa Real neste Jerónimo exigiu que os seis mil milhões de euros previstos para reduzir o défice “sejam aplicados em despesa de que o país precisa”
processo nunca sugeriram diÆculda-
des inultrapássáveis na negociação de à redução do déÆce” em três pon- como no “aumento de todas as pen- criação de vagas na rede pública de que, com a condição de recursos,
do OE com o Governo. tos percentuais, é “uma opção que sões até 650 euros, em 10 euros, a creches e lares em 2021; o alarga- muitos trabalhadores apoiados em
O PCP é que, depois de ter anun- nega aos país seis mil milhões de partir de dia 1 de Janeiro, a conside- mento dos escalões do IRS, assim 2020 serão excluídos. Será o caso de
ciado a abstenção, sente agora neces- euros, demonstrando que há recur- ração do subsídio de insalubridade como medidas para as pequenas e um casal com rendimentos médios
sidade de reiterar o sublinhado de sos para responder ao que o país e risco para os trabalhadores das médias empresas. (de 860 euros cada) em que um dos
que ela serve “apenas e só” para levar precisa”. autarquias ou a criação de uma nova membros perde rendimentos do tra-
a proposta do Governo para a discus- Para o secretário-geral comunista, prestação social extraordinária” —, BE não gosta das contas balho independente. Se o cônjuge
são na especialidade. E para aí são a opção do Governo pela redução do mas considera estas aproximações O Bloco de Esquerda reúne hoje a mantiver o salário de 860 euros em
várias as medidas das quais os comu- déÆce é “errada em quaisquer cir- “muito parcelares” e “limitadas”. mesa nacional e anuncia às 20h30 o 2021, o rendimento considerado para
nistas fazem depender o voto Ænal. cunstâncias”, mas torna-se “particu- E Jerónimo de Sousa elencou as sentido de voto no OE. Mas ontem efeito de condição de recursos será
Foi isso que disse ontem, numa larmente grave e incompreensível na exigências de que depende o voto do trocava dados com o Governo, sem de 506 euros (860:1,7=506), o que
assembleia de quadros do partido na actual situação” de crise decorrente PCP na especialidade. Além do sinal de que o impasse negocial ter Æca acima do limiar da pobreza,
região de Setúbal, o secretário-geral da pandemia. Jerónimo aÆrmou que aumento do salário mínimo para os sido ultrapassado. excluindo o casal da nova prestação.
do PCP. Jerónimo de Sousa avisou o “Governo não está apenas a traba- 850 euros, pede um aumento “geral, O PÚBLICO sabe que o Governo Porém, em 2020, o mesmo casal
que o partido vai lutar “até ao Æm” lhar para o déÆce de 2021”, “está a para todos os trabalhadores”, a valo- respondeu ontem a um pedido de receberia um apoio de 438,81 euros.
para que o Governo aceite desistir da fazê-lo já hoje, com adiamento e rização das carreiras e a revogação esclarecimento do BE sobre o novo O que o BE pretende é que o casal
meta de redução do déÆce das con- incumprimento de várias matérias” das “normas gravosas” da legislação apoio social, confirmando que man- considerado na equação não seja 1,7,
tas públicas, de forma a garantir mais e “não concretizando ou adulteran- laboral. O partido pretende ainda a tém a condição de recursos para o [1 + 0,7 pelo segundo adulto do agre-
seis mil milhões de euros para des- do várias decisões da Assembleia da contratação de médicos, enfermei- acesso dos trabalhadores indepen- gado], mas sim 2 [1 + 1, ou seja, 1 por
pesa com medidas que os comunis- República”. ros, “milhares de proÆssionais” de dentes à prestação, o que não é do cada adulto]). com Francisco Alves
tas consideram essenciais. O PCP reconhece que o executivo outros serviços públicos; o alarga- agrado do partido liderado por Cata- Rito e Sónia Sapage
Segundo Jerónimo de Sousa, a já se “aproximou parcialmente” de mento do subsídio de desemprego, rina Martins.
opção do Governo de “dar priorida- algumas propostas do partido — em valores e prazo de pagamento; a O Bloco fez as contas e concluiu avieira@publico.pt
10 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
SOCIEDADE
E a assistência a doentes não-
-covid? Falhas podem durar anos
Um utente dos Hospitais da Universidade de Coimbra sugere: “Deviam melhorar as condições no exterior” para quem está à espera
Hospitais estão a Hospitais do SNS
Maria João Lopes
dar resposta e a
Na semana em que os casos de covid-
tentar recuperar 19 dispararam e os primeiros efeitos
se começaram a fazer sentir nos hos-
actividade não- pitais, escolhemos nove unidades de
-covid que Äcou saúde e fomos falar com quem preci-
sou de lá ir por razões que nada têm
atrasada. Mas a ver com a pandemia. Nuns casos
encontrámos Ælas na rua, salas de
“vamos sentir espera cheias, queixas de consultas e
durante anos a falta cirurgias adiadas uma, duas, três
vezes. Noutros casos, elogios à orga-
de assistência a nização e ao esforço para se recupe-
rar o que Æcou atrasado. Mas Noel
doentes não-covid”, Carrilho, presidente da Federação
Nacional dos Médicos (FNAM), não
aÄrmam os tem dúvidas. “Vamos sentir durante
médicos muitos meses, possivelmente muitos
anos, a falta de assistência a doentes
não-covid. Estas consequências vão
perseguir-nos.”
O porta-voz do Movimento de Uten-
tes dos Serviços Públicos, Manuel
Vilas Boas, acrescenta: “Aquilo que
está a acontecer, neste momento, é
uma situação perfeitamente inadmis-
sível. Os hospitais estão preocupados,
e bem, com a covid, mas as outras
patologias que já existiam estão a Æcar
em segundo plano. Há muitos utentes
que não estão a ser tratados, muitas
patologias agravam-se e alguns já fale-
ceram por isso.”
Representantes de utentes e de
médicos, todos se queixam do mes-
mo: da falta de proÆssionais de saúde
para dar resposta aos vários desaÆos.
Noel Carrilho diz que, depois da pri-
meira vaga, houve uma tentativa de
se recuperar alguma da actividade
não-covid, mas que o número de
médicos continua insuÆciente: “Nos
cuidados primários e nos hospitais,
sem mais recursos humanos e com a
covid a criar condicionalismos cada
vez mais graves, não conseguimos dar
resposta a tudo.”
Os sindicatos reconhecem que está
a ser feito um esforço para recuperar,
ADRIANO MIRANDA
mas há diÆculdades, além da falta de
proÆssionais, como o receio de alguns
utentes de irem aos hospitais, que está
a ser ultrapassado, e a necessidade de
espaçar consultas para não haver
aglomerações. Noel Carrilho admite
que, mesmo com a pandemia, a “pato-
logia urgente foi-se tentando fazer”,
mas há atrasos noutros casos. “Esta-
mos a tentar correr atrás do prejuízo,
mas é impossível neste momento
todos os doentes serem tratados como
deviam porque não há médicos.”
O secretário-geral do Sindicato
Independente dos Médicos, Jorge
Roque da Cunha, corrobora: “Antes
da pandemia, as consultas já tinham,
em muitas especialidades, cerca de
seis meses, um ano de espera. A situa-
ção já estava extraordinariamente
atrasada, naturalmente com a covid,
com o cancelamento de consultas e o
adiamento de outras não melhorou,
piorou com certeza.”
maria.joao.lopes@publico.pt
Algarve
Na rua, em Äla
de espera
Há quem tenha de voltar para trás —
“Costumo ter uma consulta da dor,
de oito em oito meses, pensei que
hoje ia ser atendida, mas só dia 19 é
que tenho vaga”, diz Maria da Graça
Reis, doente oncológica. Há quem
Æque, mas tenha de esperar: “Hoje
está sol, mas quando chegar a chuva
e o frio, como é que as pessoas vão
aguentar Æcar aqui na rua?”, pergun-
ta Vanda Barra, de Vila Real de Santo
António, amparando a mãe, de 72
anos. Dirige-se à sala onde vai fazer
análises clínicas, onde estão mais pes-
soas para se sentarem do que cadeiras
disponíveis.
No Hospital de Faro as marcações
para consultas externas ou exames
complementares estão programados
para que se processem de forma gra-
dual. Mas, na prática, não é isso que
acontece. A sala de espera para as
análises clínicas tem uma capacidade
para cerca de duas dezenas de uten-
tes. A aÇuência chega a ser de 40 a 50.
A minha mãe [Maria de Fátima] este-
ve cá em Julho, está de volta porque
precisa de fazer uma cirurgia a uma
hérnia”, aÆrma Vanda Barra, critican-
do a organização do serviço: “Nada
tenho a reclamar do atendimento, só
que a maioria das pessoas que aqui
estão são idosas, e quando chegar o
Inverno não podem Æcar ao frio na
rua.” O presidente da Administração
Regional de Saúde do Algarve (ARS),
Paulo Morgado, justiÆca: “As marca-
ções são feitas de forma a que não
haja Ælas, mas há uma certa tendência
para as pessoas se juntarem à mesma
hora [a partir das 8h].”
Ainda assim, o director do Serviço
das Urgências do Hospital de Porti-
mão, João Estevens, nota que alguns
doentes receiam deslocar-se ao hos-
pital, por causa da pandemia. “Só há
cerca de um mês é que Æquei com os
períodos das consultas (medicina
interna) completos. Nos meses de
Maio, Junho e Julho, Æcava constan-
temente com vagas em aberto. Os
utentes faltavam.” Por outro lado,
houve alteração do perÆl do doente:
“Em cada dez utentes que observava
na urgência, em média, só dois é que
Æcavam internados. Agora, em cada
três, interno dois, os casos que apa-
recem são mais graves.”

O velho edifício do Hospital de
Faro, com mais de 40 anos, tem vindo
a sofrer de algumas obras de adapta-
ção, mas a capacidade de resposta
está cada vez mais distante das exi-
gências de um moderno serviço de
medicina. Nesta altura, o serviço de
cardiologia está em obras, por estar
obsoleto, e os doentes foram desloca-
das para uma ala do Serviço de Orto-
pedia. Em relação ao Serviço de Medi-
cina-1, por causa de um surto de covid
que surgiu há cerca de duas semanas,
encontra-se com a capacidade de
internamento reduzida a metade: 20
camas. Idálio Revez
Almada
“Há um esforço
para recuperar”
Daniela Fernandes, 25 anos, está à
porta do Hospital Garcia de Orta,
Almada. Espera a avó que está numa
consulta de cardiologia que aconte-
ceu no dia previsto. Já Daniela, que
tem síndrome antifosfolipídica, está
desde Abril a tentar marcar uma con-
sulta de reumatologia, sem sucesso:
“Deixa-me bastante angustiada, não
tenho razão de queixa do Garcia de
Orta, mas está sobrelotado, bastan-
te.” Na quinta-feira em que o PÚBLI-
CO visita o hospital, tarde de sol, não
há longas Ælas nem aglomerações.
Mas entre os utentes ou acompanhan-
tes, as histórias são diversas. No espa-
ço exterior, Júlia Oliveira, 75 anos, não
só não relata qualquer adiamento nas
duas consultas que tinha, como uma
delas foi antecipada no horário. A do
marido, que ainda está a decorrer,
também foi no dia marcado. Já a con-
sulta de neurocirurgia de SoÆa Cara-
pinheira, 62 anos, foi adiada dois
dias.
Luísa Ramos, porta-voz da comis-
são de Utentes de Saúde do Concelho
de Almada, aÆrma que “a pandemia
agravou as fragilidades que já existiam
nos hospitais públicos” e que é preci-
so “recrutar mais proÆssionais”.
Segundo a informação que lhe chega,
“naquilo que é verdadeiramente
urgente, as esperas não são tão acen-
tuadas”: “O que se considera, em con-
sultas, exames ou cirurgias, que pode
esperar mais algum tempo, serão
essas que estarão mais atrasadas.”
Não tem dúvidas de que, depois de
uma fase de receio, as pessoas estão
a regressar às consultas: “E há um
Menos 12,6%
de consultas realizadas
Desde o início do ano até Agosto,
os hospitais realizaram um total
de 7.120.373 consultas — o que se
traduz numa quebra de 12,6%
comparativamente a igual
período do ano passado, segundo
dados do Ministério da Saúde
divulgados a 30 de Setembro.
No Hospital de São José, em Lisboa, foram instaladas coberturas provisórias, a pensar no Inverno
esforço para recuperar esse tempo
perdido, mas depois, sem a resolução
das questões estruturais, não se con-
segue responder.” O PÚBLICO ques-
tionou a administração do Garcia de
Orta, mas não obteve resposta em
tempo útil. Maria João Lopes
Lisboa
Mais consultas fora
do prazo, quebra de
24% nas cirurgias
Hospital de São José, Lisboa, manhã
de quinta-feira à porta das consultas
externas: Sérgio Clemente, 62 anos,
está à espera do Ælho que foi tirar pon-
tos, depois de “ter cortado o tendão
de um dedo em Fevereiro” — a cirur-
gia era para ter sido em Março, foi há
cerca de duas semanas. Aníbal Fer-
nandes, 59 anos, viu uma consulta
por causa da coluna ser adiada de 19
para 22 de Outubro; já a mulher, Bea-
triz Martins, 64 anos, era para ter sido
operada ao joelho em Março, noutra
unidade hospitalar, e acabou por só
ser em Junho.
Filomena Borges, 52 anos, está à
espera do Ælho que está numa consul-
ta de otorrinolaringologia que era
para ter acontecido há dois meses. E
39%
dos doentes do Centro
Hospitalar Lisboa Central têm
consulta dentro do prazo
aceitável, contra 56% em 2019
Ricardo Silva, 26 anos, está à espera
da namorada que foi tirar pontos
depois de uma cirurgia — a operação,
“nada de grave”, para tirar “um caro-
ço do pescoço”, foi desmarcada uma
vez, antes do início da pandemia, e
duas depois.
O Centro Hospitalar Universitário
de Lisboa Central (CHULC), no qual
o São José se insere, informa que,
entre Março a Setembro de 2019,
foram feitas 22.049 cirurgias. No mes-
mo período de 2020, foram 16.806,
menos 24%. No que toca a consultas
externas, passou-se de 417.164 para
383.807, menos 8%. As especialidades
mais afectadas foram as cirúrgicas.
Entre Março e Setembro deste ano,
realizaram-se 140.584 teleconsultas
(16.708 em 2019). Mas “ainda existem
alguns períodos do dia em que se veri-
Æca concentração de utentes e acom-
panhantes nos respectivos acessos,
situação que urge mitigar atendendo
ao período de Inverno.” Assim,
“foram instaladas estruturas provisó-
rias de cobertura nos vários pólos”.
As diÆculdades sentidas não são mui-
to diferentes das reportadas noutras
unidades. Resultam da “necessidade
de concentrar recursos” para assistên-
cia aos infectados com SARS-CoV-2,
de respeitar o distanciamento, o que
“levou a alguma redução de camas de
internamento ou de presenças de
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 11
RUI GAUDÊNCIO
doentes nas salas de espera”, de higie-
nizar equipamentos, com maior inter-
valo entre atendimentos. Quanto à
percentagem de doentes dentro do
“tempo máximo de resposta garanti-
do” a 31 de Agosto (ou seja, o tempo
de espera clinicamente aceitável para
uma consulta, face à situação especí-
Æca de cada doente) desceu de 56%
para 39% de 2019 para 2020. Ainda
assim, estes números “revelam já o
esforço na retoma da actividade”
após a primeira vaga de covid-19, faz
saber o centro. M.J.L.
Hospital Garcia de Orta, Almada
Cirurgias em recuperação
Até ao final de Agosto foram feitas
355.435 cirurgias no SNS, uma
diminuição de 22,2% (menos
cerca de 100 mil) face aos
primeiros oito meses de 2019. Em
Maio, esta redução face ao
período homólogo era de 28,8%,
o que mostra que houve alguma
recuperação nos últimos meses.
Loures
“Ano e meio para
tirar um quisto”
À porta do Hospital Beatriz Ângelo,
Loures, Maria Emília Ilhéu, de 80
anos, está sentada num banco, com
o Ælho, já depois de ter ido a uma con-
sulta por causa das cataratas. “É a
segunda vez que faz exames, já fez
durante a pandemia e sempre sem
atrasos”, conta o Ælho.
Guilherme Esteves, 79 anos, está à
espera do filho que foi a uma consul-
ta. “Esteve um mês à espera” que a
marcassem. Já o pai diz estar “à espe-
ra há um ano e meio para tirar um
quisto da perna”. “Em Julho do ano
passado, marcaram para Setembro
de 2020, em Setembro [marcaram]
para Dezembro. Vim duas vezes à
urgência e, na segunda vez, o médico
disse que estava tudo atrasado por
causa da pandemia.” O hospital infor-
ma que, entre Janeiro e Setembro
2020, realizaram-se menos 36 mil
consultas externas do que no mesmo
período do ano anterior — uma redu-
ção de 17%. E menos 1870 cirurgias,
uma quebra de 16%. Em ambos os
casos, lê-se na resposta ao PÚBLICO,
a actividade está neste momento
“plenamente retomada”. M.J.L.
Coimbra
“Deviam melhorar
as condições de
espera no exterior”
De duas em duas semanas, Luís Mur-
tinho desloca-se aos HUC (Hospitais
da Universidade de Coimbra) para
fazer um tratamento de alergologia.
Já se habituou à rotina. “Mesmo na
altura do conÆnamento, vim sem-
pre”, relata quando se prepara para
rumar a casa, em Pombal, depois de
cumprir o seu tratamento. Mais um
que decorreu dentro da normalidade
e sem grandes esperas. O único repa-
ro que deixa prende-se com a aglo-
meração de pessoas, às primeiras
horas da manhã, na porta do acesso
às consultas externas.
“Como o acesso é agora mais con-
dicionado, junta-se ali mais gente,
por vezes à chuva e ao vento”, lamen-
ta. Pelo que tem percebido, a situa-
ção Æca a dever-se, em grande c
12 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
SOCIEDADE
medida, ao facto de “algumas pes-
soas irem para a porta muito tempo
antes da consulta”. “O pessoal tem
de fazer uma triagem, veriÆcar quem
tem mesmo de entrar às 9 horas, e
isso leva o seu tempo”, testemunha
Luís Murtinho.
Certo de que esse hábito de chegar
com antecedência ao hospital “é cul-
tural, difícil de alterar”, deixa algu-
mas sugestões à administração do
Centro Hospitalar e Universitário de
Coimbra (CHUC): “Deviam melhorar
as condições para as pessoas pode-
rem permanecer no exterior e colocar
mais funcionários a fazer a triagem,
para que fosse mais rápida.”
Esta concentração de utentes, tes-
temunhada pelo PÚBLICO, ocorre na
entrada para o piso-1. No âmbito das
medidas de controlo de acesso à con-
sulta externa dos HUC, em Julho, foi
determinado que a entrada dos uten-
tes passasse a ser feita, exclusivamen-
te, por este piso. Uma decisão justiÆ#
cada com base na intenção de garan-
tir a “segurança do utente”. O
PÚBLICO tentou obter mais esclare-
cimentos junto da administração
hospitalar, mas a resposta não chegou
em tempo útil.
De resto, aquela unidade hospitalar
parece estar a conseguir manter as
consultas e exames dentro da norma-
lidade. “As análises estavam marca-
das para as 10h00 e às 10h15 o meu
pai já estava a entrar”, aÆrma Edite
Filipe, de Leiria, à saída do hospital.
Maria José Santana
Aveiro
“Até nem tive
de esperar muito”
Se tudo tiver corrido conforme pre-
visto, Adélia Píncaro já terá sido ope-
rada às cataratas. No dia em que o
PÚBLICO a apanhou a sair do Hospital
de Aveiro, na última quinta-feira,
tinha acabado de fazer o teste à covid-
19, com vista a ser submetida, no
sábado de manhã, à cirurgia pela qual
aguardava havia três meses, diz. “Até
que nem tive de esperar muito”, repa-
rava, mostrando-se consciente das
vicissitudes do momento actual. Um
pouco como os utentes (pouco mais
de uma dezena) que aguardavam no
exterior do Bloco 6-8 da unidade de
saúde aveirense, cumprindo o devido
distanciamento e sem retirar a más-
cara da cara. Uma espera normal, a
Cada vez mais internamentos
por covid-19
O número de internamentos
devido à covid-19 registou um
novo máximo: segundo o boletim
da Direcção-Geral da Saúde de
ontem estavam internadas 1455
pessoas, mais 37 do que na
sexta-feira, 221 das quais em
cuidados intensivos (mais 23).
Em Gaia pede-se aos doentes que só cheguem 15 minutos antes
avaliar pelos depoimentos de vários
utentes. A diferença é que agora é
feita cá fora. “Fomos atendidos à hora
marcada”, assegurava Lina Monteiro,
que tinha acompanhado o pai num
exame de imagiologia.
A administração do Centro Hospi-
talar do Baixo Vouga (CHBV), sediado
em Aveiro mas com unidades tam-
bém em Águeda e Estarreja, faz saber
que as consultas e exames têm vindo
a decorrer com normalidade, desde
que retomou a actividade (início de
Maio). Quanto às consultas pelo tele-
fone, “algumas especialidades, sobre-
tudo as que seguem doentes crónicos,
optaram por, sempre que a situação
clínica do doente assim o permite,
manter a teleconsulta”. Por questões
de optimização do trabalho e porque
continua a ser mais seguro para doen-
tes mais susceptíveis não se desloca-
rem ao hospital. M.J.S.
Vila Nova de Gaia
Já houve cirurgias
adiadas na 2.ª vaga
Apesar do número elevado de pes-
soas à espera de consulta no Centro
Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espi-
nho — Unidade I, a entrada é feita de
forma célere e organizada. ConÆrma
a Sandra Brandão que acompanhou
o pai a uma consulta de urologia mar-
cada para as 10h30. “São 10h40 e já
estamos cá fora”, aÆrma. A consulta
já estava marcada “há algum tempo”
e não houve alterações por força dos
ajustes feitos no centro hospitalar
para responder à pandemia. O mes-
mo não aconteceu com Carlota
Novos casos diários registados nas regiões Norte e
de Lisboa e Vale do Tejo
Situação a 24 de Outubro de 2020
1000
0 que estas serão adoptadas dentro
M A M J
NELSON GARRIDO
Gomes que para ter consulta de
Hematologia viu por duas vezes adia-
da a marcação originalmente progra-
mada para o início da pandemia. No
primeiro adiamento aguardou
“alguns meses” por novo agendamen-
to. À segunda vez esperou “apenas
três dias”. Desde o início da pandemia
foram adiadas no centro hospitalar
1518 cirurgias e 52.525 consultas. Em
Maio, “altura em que foi retomada a
actividade programada não prioritá-
ria”, tornou-se possível “recuperar
paulatinamente”. Porém, no regresso
ao estado de calamidade já se senti-
ram “os primeiros impactos”, tendo
sido adiadas seis operações desde
quarta-feira.
O hospital foi obrigado a reajustar-
se às necessidades. Por exemplo, a
Unidade de Cuidados Pós-Anestésicos
foi reconvertida em Unidade de Cui-
dados Intensivos para doentes covid-
19. “Em caso de aumento exponencial
Hospital Beatriz Ângelo, Loures
Norte
2212
LVT
1027
J A S O
de casos”, está prevista a ocupação
dos Cuidados Intermédios Polivalen-
tes e da Unidade de Cuidados Inten-
sivos Cardiotorácicos. Havendo
necessidade de alargar os cuidados
intensivos covid-19 para estas áreas,
“haverá cancelamento de cirurgias”.
André Borges Vieira
Matosinhos
Recurso a privados
com médicos
do público
No Hospital Pedro Hispano (HPH), em
Matosinhos, que agora ainda conse-
gue garantir a actividade assistencial
programada, equacionam-se reajus-
tes, recorrendo à externalização de
algumas especialidades cirúrgicas
para hospitais privados, de forma “a
libertar camas e a não adiar as inter-
venções”. As intervenções serão feitas
na mesma por proÆssionais desta uni-
dade de saúde. Ortopedia avançará já
na próxima semana para esta moda-
lidade, mas poderão ser mais.
Desde o início da pandemia foram
adiadas 2768 cirurgias, 34.740 consul-
tas e 345.602 exames. À espera de
consulta desde Maio, altura em que
foi desmarcada, estava esta semana
Eduardo Ramos, residente em Leça
da Palmeira há mais de 50 anos. Só
agora é que conseguiu ser atendido
na especialidade de ortopedia. Entrou
no consultório à hora marcada, mas
antes esperou numa Æla “grande”,
que “escoou rapidamente” — ao Æm
da manhã, como foi possível conÆr-
mar, já não havia aglomeração de
pessoas.
João Rouxinol, do Movimento dos
Utentes dos Serviços Públicos do Por-
to, actualmente a recolher dados
sobre reclamações de utentes, teme
poder vir a existir um agravamento
desta situação nos próximos tempos
e alerta para o atraso “signiÆcativo”
já existente no tratamento de doenças
crónicas e no acesso a médicos de
especialidade, sublinhando o atraso
das cirurgias programadas. A.B.V.
Guimarães
“Disseram-me que o
hospital está cheio”
Cerca de 15 pacientes espalham-se
"Não podemos excluir nenhum
tipo de medida", diz Costa
Questionado sobre a
possibilidade de decretar
recolher obrigatório, como em
França e Espanha, António Costa
afirmou ontem que o Governo
não exclui nenhuma medida, mas
do “estritamente necessário.”
em redor do edifício das consultas
externas no Hospital Senhora da Oli-
veira, em Guimarães, pelas 9h15,
numa Æla organizada e espaçada. Um
deles é Sérgio Silva, 46 anos. Sofreu
uma arritmia responsável pela ace-
leração do ritmo cardíaco e já viu
“uma cirurgia às válvulas” duas
vezes adiada: o primeiro agenda-
mento era para 16 de Junho e o
segundo para 16 de Outubro. “Expli-
caram-me que não foi possível por
causa da covid-19. Disseram-me que
o hospital está cheio, que há várias
emergências”, desabafa o utente de
Vizela.
A consulta pela qual está à espera
enquanto fala não garante a marca-
ção de uma cirurgia que a sua cardio-
logista já disse ser “urgente”. “Sinto-
me muito cansado, mas a cirurgia
ainda não tem data marcada”, acres-
centa.
Noutra posição da Æla, encontra-se
Ana Maria Pereira, residente em Gui-
marães. Previamente agendada para
Março, está aqui, quinta-feira, para
Ænalmente ter a consulta de ortope-
dia que vai viabilizar uma eventual
cirurgia aos tendões da mão direita.
“Foi adiada por causa da covid-19”,
conta.
O director clínico do Hospital
Senhora da Oliveira, Hélder Trigo,
explica que a covid-19 perturbou o
“funcionamento normal” da unida-
de, antes do início do programa de
recuperação das listas de espera para
consultas, exames e cirurgias, aquan-
do da descida do número de infec-
ções, entre Maio e Agosto. “Temos
conseguido uma boa recuperação.
Vamos conseguir mais de 90% dos
objectivos do Ministério [da Saúde]
quanto aos tempos de espera.”
Sem adiantar mais números, o
médico diz também que o hospital já
recorreu à teleconsulta para alguns
casos. “Esse modelo é adequado para
um doente que fez aqui um tratamen-
to, em que só é preciso controlar se
está bem ou não.”
Ana Maria Pereira e Sérgio Silva
não estão nessa fase. À saída da con-
sulta, a paciente vimaranense diz
que se conÆrmou a tendinite e apa-
renta estar conÆante que a carta para
a cirurgia será “enviada brevemen-
te”. Já o utente de Vizela deixa o hos-
pital com mais incerteza. “Há dois
ou três pacientes mais urgentes do
que eu. Vou ser operado no Ænal do
ano ou no início do próximo.” Tiago
Mendes Dias

Número de internados com covid-19 atinge novo máximo
Sofia Neves
Foi o pior dia de sempre em termos
de novos casos de covid-19. Já tinha
acontecido na quinta-feira, quando o
país ultrapassou, pela primeira vez,
a fasquia dos três mil casos diários.
Ainda assim, os números de ontem
agravaram-se em relação aos dos dias
anteriores, pelo menos no que diz
respeito às novas infecções e ao
número de pessoas internadas.
Em 24 horas, foram confirmadas
loja.publico.pt
CDS questiona Governo
A proibição de deslocações no
fim-de-semana dos Fiéis Defuntos
abrange também quem vai
assistir a espectáculos? E se
abrange, como se justifica então
“a proibição de homenagear os
mortos” ao ar livre? A pergunta é
ds deputados do CDS-PP e foi
endereçada ao Governo.
3669 novas infecções, num total de
116.109 desde o início da pandemia.
Quase todos os valores mais altos de
casos diários foram registados este
mês, que, não estando ainda no Æm,
contabiliza já mais infecções do que,
por exemplo, o mês de Abril.
A 14 de Outubro, Portugal ultra-
passou os 2000 casos diários, mas
Marta Temido já deixava o aviso, em
conferência de imprensa, de que o
número 3000 podia chegar logo na
semana seguinte — o que acabou por
acontecer.
Lar de Idanha com 71 casos
O lar de idosos da Santa Casa da
Misericórdia de Idanha-a-Nova, no
distrito de Castelo Branco, tem 71
casos com resultado positivo de
infecção pelo novo coronavírus,
entre 64 utentes e sete
funcionários. Os utentes não
contaminados serão transferidos
para uma unidade hoteleira.
Também o número de internamen-
tos devido à covid-19 registou um
novo máximo: de acordo com o bole-
tim diário da Direcção-Geral da Saú-
de, ontem estavam internados 1455
doentes com covid-19, mais 37 do que
na sexta-feira; 221 encontravam-se em
unidades de cuidados intensivos
(mais 23 do que no dia anterior).
Foram 21 as mortes registadas, o
que perfaz um total de 2297 desde o
início da pandemia.
O boletim deu ainda conta de uma
subida no número de casos activos,
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 13
Situação em Portugal
Casos
Em 24 de Outubro às 14h30 confirmados
Novos casos diários
3000
2297 67.842 2000
1000
Mortes Recuperados 0
Fonte: DGS M A
indicador que tem estado em cresci-
mento desde meados de Agosto e que
teve a primeira descida na passada
terça-feira, com menos 71. No entan-
to, logo no dia seguinte, voltou a subir
e atingiu ontem o valor mais elevado
de sempre: 45.970.
O número de casos recuperados
também é signiÆcativo: mais 1962 do
que na sexta-feira, num total de
67.842 desde o início da pandemia.
Grande parte dos novos casos con-
tabilizados ontem (2212 ou 60,2%) foi
registada na região Norte e cerca de
SOCIEDADE
116.109
Novos
casos 3669
M J J A S O
27% em Lisboa e Vale do Tejo (1027).
O aumento de infecções na região
Norte nas últimas semanas já levou o
Governo a tomar medidas, aprovan-
do uma resolução que entrou em
vigor na quinta-feira e que impõe o
dever de permanência no domicílio
a três concelhos do país onde a pan-
demia mais cresce: Felgueiras, Lou-
sada e Paços de Ferreira.
Lisboa e Vale do Tejo continua a
registar o maior número acumulado
de casos no país: 52.340. O Norte já
somou 48.603 registos.
PUBLICIDADE
14 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020

LOCAL
Abrigo com 150 animais em
Tavira está a ser desmantelado
Canil foi instalado de forma precária numa quinta junto à ria Formosa e teve agora ordem de despejo.
Cerca de metade dos animais já tiveram acolhimento, os restantes aguardam vaga noutro canil da região
EDUARDO RAPOSO

Direitos dos animais

Idálio Revez
Centena e meia de gatos e cães estão
a ser retirados da quinta do Pinheiri-
nho, em Santa Luzia, Tavira. O terre-
no onde está instalado o canil/gatil,
com 30 hectares, vai dar lugar a um
pomar de citrinos e abacates, junto à
ria Formosa. Os animais, entretanto,
estão a ser recolhidos num outro
canil, situado nas proximidades de
Loulé, mas este está à beira de esgotar
a capacidade de acolhimento. A pre-
sidente da Adota — Associação de
Animais de Santa Luzia, Alice Gil, diz
estar a ser “pressionada e ameaçada”
para abandonar o espaço agrícola,
que esta organização ocupava a título
precário.
A actual dona da quinta, SoÆa
Rodrigues, entende que a instalação
das gaiolas para os cães, no lugar de
umas antigas pocilgas, se tratou de
uma “ocupação abusiva” da proprie-
dade que herdou da avó. Além disso,
garante nunca ter ameaçado Alice Gil.
“Ela só está a fazer-se de vítima”, acu-
sa. Por seu lado, Alice Gil alega que
recebeu o “consentimento da ante-
rior proprietária” para recolher os
animais na propriedade recentemen-
te arrendada. O assunto está a ser
acompanhado, à distância, pelo vice-
presidente da câmara, José Manuel
Guerreiro: “A associação Adota faz Apenas uma parte dos animais alojados em Tavira foi entregue à ARA. Os restantes aguardam uma alternativa
um trabalho que nos agrada”, reco-
nhece, sem se comprometer, no cur- nem quanto à localização da infra-es- animais, após um período de recupe- vai ser muito difícil aprovar o projec- Algarve [que tem um canil/gatil no
to prazo, com uma proposta alterna- trutura — todos os autarcas procla- ração, são entregues para adopção. to”, alerta o vice-presidente do Muni- sítio da Cabanita, Loulé] se disponi-
tiva para o canil. mam apoiar a causa animal, mas não “Na semana passada, um gato cegui- cípio, lembrando as restrições impos- bilizou para oferecer refúgio tempo-
As tentativas de encontrar uma solu- querem ter canis em área urbana, nho foi adoptado por um casal, meu tas pelo PROT e pelo Plano Director rário, aos 60 cães e 90 gatos”.
ção para as centenas de cães e gatos dentro das cidades. Por outro lado, o amigo, de Lisboa. Tiveram pena Municipal (PDM) Por coincidência, esta associação
abandonados por quase todo o Algar- Plano de Ordenamento do Algarve dele”, recorda. À medida que vai mostrando as também está num conÇito com o
ve ainda não tiveram uma resposta à (PROT) “proíbe” a construção em gaiolas, Alice Gil conta histórias des- Município de Loulé que, em Dezem-
escala regional. O assunto foi objecto solo rural. De resto, foi esse o motivo Cada animal, uma história tes animais que protege como se fos- bro de 2019, considerou que o canil
de discussão, sem êxito, por várias (violação das leis do ordenamento do Embora reconheça que montou as sem Ælhos. “Esta canita foi encontra- da ARA se encontrava numa situação
vezes na Comunidade Intermunicipal território) invocado pela Câmara de gaiolas para os cães e as colónias dos da amarrada a um poste”, diz. À de “incontornável ilegalidade”, por
do Algarve — Amal. De acordo com a Loulé, há cerca de um ano, para man- gatos a título precário, não esperava frente, três cachorrinhos, com dois falta de licença, e deu um prazo de
Lei n.º 27/2016, é proibido o abate de dar demolir o canil da Animal Rescue vir a ser desalojada sem que a câmara meses, saltam-lhe à frente, a abanar dois meses para que fosse demolido.
animais errantes e as autarquias estão Algarve (ARA), que está agora a rece- lhe facultasse uma alternativa. “Esta- a cauda. “Nos últimos quatro anos Os recursos administrativos e judi-
obrigadas a criar uma rede de Centros ber os animais do refúgio de Tavira. mos a desenvolver uma campanha de Æzemos uma obra que penso ser de ciais Æzeram suspender a ordem. A
de Recolha OÆcial de Animais (CROA), Ex-gestora Ænanceira de uma angariação de fundos para construir interesse público”, enfatiza. A câma- Câmara de Tavira apresentou, entre-
que inclui a requaliÆcação dos canis empresa de telecomunicações, Alice um canil em Santa Catarina”, revela. ra fornece a água e dá um subsídio tanto, um projecto para criar um
municipais existentes. Gil desenvolveu “um projecto de vida, A propriedade, com um custo de dez mensal de 350 euros. “Agora estou Centro de Bem-Estar Animal, mas a
No ano passado, a Amal apresentou a favor dos animais” na sua terra mil euros, Æca numa zona rural, sem numa agonia, porque querem que obra só está prevista para o próximo
um projecto para criar um canil inter- natal, depois de reformada. “Recebi infra-estruturas. “Se se situar em zona saia daqui e leve os animais”, remata. ano.
municipal, mas não houve entendi- a ajuda de muitos voluntários, portu- de Reserva Agrícola Nacional (RAN) Após lançar vários apelos, prossegue,
mento quanto à partilha de despesas, gueses e estrangeiros”, enfatiza. Os ou Reserva Ecológica Nacional (REN) “apenas a ARA — Animal Rescue irevez@publico.pt
 Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 15

LOCAL

Areia das dragagens do Sado

não vai ser usada para encher
praias da Arrábida
decisão da utilização de sedimentos Setúbal e Sesimbra, com o intuito de mento e não esclarece, sequer, se no aplicável, da respectiva avaliação de
Erosão costeira provenientes das dragagens no porto se desenvolverem estudos da dinâmi- caso do Portinho da Arrábida vai ser impacte ambiental”, conclui a APA.
Francisco Alves Rito de Setúbal para alimentação de ca deste troço de litoral e eventual necessário estudo de impacte A autarquia já conÆrmara os con-
praias”, o ICNF remete para a Agência realização da avaliação do impacte ambiental. “À semelhança do que tactos. “Há conversações e, provavel-
APA e ICNF confirmam que Portuguesa do Ambiente. ambiental associado a um projecto de acontece em toda a orla costeira, a mente, vai haver mais uma reunião
“A APA tem participado em várias realimentação, eventualmente com alimentação artiÆcial de praias com [em breve] não só sobre esse assunto
situação da praia do
iniciativas do Clube da Arrábida, no recurso a areias provenientes das areias provenientes de dragagens de [Portinho da Arrábida], mas também
Portinho da Arrábida é sentido de se encontrar uma solução operações de dragagem do canal de áreas portuárias decorre dos resulta- sobre outras praias”, disse há duas
grave, mas ainda não há para este grave problema, tendo esta- navegação de acesso ao porto de dos dos estudos de caracterização semanas uma fonte da Câmara de
uma solução definida do envolvida nos contactos com a Setúbal.”, refere a agência. necessários (incluindo a caracteriza- Setúbal. De acordo com a mesma fon-
Direcção do Parque Natural da Arrá- A Agência Portuguesa do Ambiente ção do material a dragar e dos locais te, o grupo de contacto está a “avan-
As dragagens no Sado vão recomeçar bida e outros responsáveis do ICNF, sublinha que, além da dinâmica das de depósito), a desenvolver em arti- çar com soluções”.
no início do mês de Novembro, para com a Câmara Municipal de Setúbal correntes, é preciso estudar a quali- culação com as entidades com com-
concluir o aprofundamento do aces- e com a Administração dos Portos de dade dos dragados a usar no enchi- petência nas matérias em causa e, se franciscoalvesrito@publico.pt
so marítimo ao Porto de Setúbal, mas PUBLICIDADE
a areia a retirar do fundo do rio não
pode ser usada para encher as praias
da Arrábida, apurou o PÚBLICO. A
draga regressa ao trabalho, após o
período de proibição imposto pela
Declaração de Impacto Ambiental,
que termina dia 31 Outubro, e as dra-
gagens devem Æcar concluídas ainda
até ao Ænal do ano, pelo que não have-
rá tempo de aproveitar os dragados,
uma vez que os necessários estudos
prévios nem começaram, conÆrmou
o PÚBLICO junto da Agência Portu-
guesa do Ambiente (APA).
A APA e o Instituto da Conservação
da Natureza e das Florestas (ICNF)
estão atentos ao desassoreamento do
Portinho da Arrábida, e conÆrmam a
gravidade da situação, mas as solu-
ções, como o enchimento da praia
com areia das dragagens, continuam
longe de poderem ser concretizadas.
Contactadas pelo PÚBLICO, após a
carta aberta em que o Clube da Arrá-
bida apelou, recentemente, à salva-
ção do Portinho da Arrábida, as auto-
ridades mostram que ainda não há
um plano.

Problema grave nas praias

A Agência Portuguesa do Ambiente
conÆrma que “a situação descrita na
carta aberta do Clube da Arrábida
sobre a praia do Portinho da Arrábida
de redução acentuada de área da
praia de ano para ano é um facto
real”, e o Instituto da Conservação da
Natureza e das Florestas (ICNF) diz
que “está atento à situação e revê-se
genericamente nas preocupações do
Clube da Arrábida”.
O ICNF acrescenta estar a “traba-
lhar activamente, desde há algum
tempo a esta parte, em conjunto com
a autarquia, para se encontrarem as
soluções para as intervenções neces-
sárias a curto prazo”, embora não
especiÆque quais são as hipóteses de
intervenção possíveis. Já “quanto à

ENTREVISTA A EDUARDO SOUTO MOURA,
PORTUGUÊS PREMIADO COM O PRITZKER,
O MAIS ALTO GALARDÃO DA ARQUITETURA.
SEGUNDA - FEIRA
DIA 26 OUTUBRO - 21h
16 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
ECONOMIA
Rosário Teixeira vê ris
branqueamento de ca
Procurador do DCIAP associa a Zona Franca da Madeira a três
factores de risco: estruturas empresariais complexas, fundos
Äduciários e contas de passagem. Governo regional não reagiu
Transparência
Pedro Crisóstomo
O Governo Regional da Madeira Æcou
em silêncio depois de o procurador
da República Jorge Rosário Teixeira,
com uma longa carreira no combate
à criminalidade económica e Ænan-
ceira complexa, ter apontado a Zona
Franca da Madeira (ZFM) como um
território de risco de lavagem de
dinheiro em Portugal.
O procurador do Departamento
Central de Investigação e Acção Penal
(DCIAP) esteve no Funchal a 16 de
Outubro para falar numas jornadas
do Conselho Regional da Madeira da
Ordem dos Advogados sobre a pre-
venção do branqueamento de capi-
tais e aproveitou o tema para deixar
avisos à navegação e revelar à plateia
que, enquanto investigador, identiÆ#
ca a zona franca com três tipos de
actuação “censuráveis”: desenho de
estruturas societárias complexas,
recurso a fundos Æduciários para
ocultar a identidade e utilização de
contas bancárias de passagem.
O procurador contou que a ZFM
tem surgido, “em termos das investi-
gações”, nessas três perspectivas. Não
falou de qualquer processo concreto,
nem disse se estão em curso inquéri-
tos do Ministério Público. Mas há
casos recentes. O inquérito do BES
mostrou como a antiga Sucursal
Financeira Exterior do BES (ali regis-
tada) funcionou como uma placa
giratória das relações comerciais do
banco com a Venezuela e Angola. Em
Espanha, o futebolista brasileiro
Adriano, ex-jogador do FC Barcelona,
foi acusado por fraude Æscal num
caso que envolveu uma empresa da
ZFM. Quanto ao mais, pouco se
sabe.
Há factos públicos: no centro de
negócios, estão sediadas empresas de
Pessoas Politicamente Expostas
(PPE), como é o caso da empresária
Isabel dos Santos (Ælha do anterior
Presidente angolano) e de Francisca
Nguema Jiménez (Ælha do ditador
Teodoro Obiang, Presidente da Gui-
né Equatorial). Dois casos denuncia-
dos a Bruxelas pela antiga eurodepu-
tada do PS Ana Gomes.
No Funchal, Rosário Teixeira falou
sobre os deveres preventivos anti-
branqueamento de capitais, lembran-
do que os advogados, contabilistas e
outros intermediários estão obriga-
dos por lei a fazer uma avaliação de
risco relativamente a um cliente ou a
uma operação especíÆca. E se tiverem
razões suÆcientes para suspeitar de
que certos fundos provêm de activi-
dades criminosas — se tiverem dúvi-
das e não se sentirem confortáveis
com os indícios em presença —, têm
de remeter uma comunicação ao
DCIAP e à Unidade de Informação
Financeira (UIF). Não é uma denúncia
de um ilícito, apenas um documento
que tem como suporte “uma análise
de risco”, salientou.
A triangulação
Há determinados indicadores de sus-
peição a que é preciso estar atento. E
foi aí que Rosário Teixeira incluiu os
três elementos de risco que associou
O procurador do
DCIAP associou à
ZFM a criação de
estruturas
societárias de
“excessiva”
complexidade
à zona franca. Da mesma forma que
é preciso fazer essa avaliação quando
estão em causa operações em nume-
rário, movimentos relacionados com
a Venezuela ou Angola (“países de
risco com elevados níveis de corrup-
ção”), operações de cidadãos com
vistos gold ou de Pessoas Politicamen-
te Expostas, também é preciso fazê-lo
em relação a empresas da ZFM.
O procurador do DCIAP associou à
zona franca a criação de estruturas
societárias de “excessiva” complexi-
dade — uma triangulação das partici-
pações por vários territórios, incluin-
do paraísos Æscais. “Estamos a falar
de apresentarmos umas sociedades
das British Virgin Islands como sócias
[das empresas da ZFM], que, abaixo,
têm sociedades de Malta e, abaixo,
sociedades de um outro país ainda”,
descreveu. Além de “serem simpáti-
cas para quem as cria, porque geram
a possibilidade de pedirem algumas
comissões, têm uma aparência ime-
diata de ocultação de quem é o bene-
Æciário Ænal” (quem, em última linha,
directa ou indirectamente, controla
uma entidade).
Como segundo elemento, o procu-
rador referiu-se aos casos em que o
proÆssional de uma empresa de ges-
tão é o Æduciário de participações
sociais. Sobre isso deixou um alerta
sério: “Se o senhor da management
da Madeira detém Æduciariamente
participações sociais numa sociedade
e não as declara como tal — [se] não
declara que está a agir como Æduciá-
rio e indica quem é o mandatário —,
pura e simplesmente está a participar
no cometimento de um crime se aqui-
lo corre para o torto e se o dinheiro
tem origem ilícita”. E continuou:
“Não tenho a menor dúvida de que o
detentor Æduciário de participações
sociais, que não se revela a si mesmo
nessa qualidade, está a participar no
cometimento de um crime”.
A terceira tipologia que suscita
atenção ao investigador é o uso de
contas bancárias de passagem: “Para
que é que isso serve? Serve para criar
mais uma fronteira entre o facto ilíci-
to e o proveito do crime. Portanto,
uma conta de passagem que é aberta
em Portugal com o suporte de uma
entidade criada na Zona Franca da
Madeira é um instrumento de bran-
queamento de capitais.”
Foram estes “alertas” que o procu-
rador das operações Furacão, Monte
Branco e Marquês quis deixar no Fun-
chal. Fê-lo, disse, numa “perspectiva
construtiva”.
As declarações tiveram eco no Diá-
rio de Notícias Madeira. Não houve
reacções oÆciais directas. Na última
terça-feira, o PÚBLICO pediu um
comentário ao vice-presidente do
executivo, Pedro Calado, que tem na
sua alçada a pasta dos assuntos Æs-
cais, mas o número dois de Miguel
Albuquerque não respondeu. Fica
em aberto saber que tipo de Æscaliza-
ção tem sido feita aos instrumentos
 Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 17

scos de
apitais na zona franca COM CARLOS DANIEL

A OPINIÃO DE QUEM SABE.

RICARDO CAMPOS
Æduciários (designadamente pela
autoridade tributária regional em
articulação com o Æsco nacional) e O DEBATE ENTRE QUEM PENSA DIFERENTE.
esclarecer que medidas têm sido
tomadas pelo Governo Regional para
reforçar os mecanismos de preven-
ção do branqueamento de capitais na
zona franca.
O presidente do executivo regional
também falou nas jornadas de 16 de
Outubro. Albuquerque destacou a
importância de os Estados estarem
atentos ao fenómeno do branquea-
mento de capitais, através da coope-
ração internacional entre as autorida-
des judiciárias (uma óptica distinta da
preventiva). E fechou o evento com
“duas boas notícias”: uma delas,
sobre o controlo da pandemia no
arquipélago; outra, essa sim sobre a
ZFM, para se congratular com a entra-
da de “um conjunto de novos navios
no registo internacional da Madeira,
que vai criar mais empregos no qua-
dro da hotelaria”.

Empresas de fachada
As jornadas serviram para tocar nou-
tros temas transversais que tanto
dizem respeito à ZFM como ao resto
do território nacional. Rosário Teixei-
ra deixou alertas da parte da manhã;
de tarde, na plateia, a mesma onde
estava o juiz Carlos Alexandre, outro
dos oradores, o procurador aprovei-
tou para pedir à bastonária da Ordem
dos Contabilistas CertiÆcados e ao
Conselho Regional da Madeira da
Ordem dos Advogados uma posição
sobre os casos em que os contabilistas
e os advogados aceitam ter, nos seus
escritórios, as sedes de empresas —
por vezes “dezenas!”.
A palavra foi dada ao bastonário da
Ordem. Luís Menezes Leitão reconhe-
ceu que “essa questão não foi objecto
de análise especíÆca” da Ordem; dis-
se que haveria alguns escritórios que
“davam” o nome para a constituição
da sede “provisoriamente”; e prome-
teu examinar essa temática porque ESTREIA
DIA 27 OUTUBRO - 22h
considera não ser uma prática “sau-
dável”.
Para a bastonária da Ordem dos
Contabilistas, Paula Franco, essa não
é, por si só, o indício de “uma prática
ilícita” — referiu que pode acontecer
quando um empresário está a consti-
tuir uma empresa ou quando uma
sociedade industrial precisa de ter
uma sede para localizar os seus docu-
mentos.

No Funchal, procurador alertou gestão, advogados e contabilistas pedro.crisostomo@publico.pt

18 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
MUNDO
Pode a América voltar a ser
a América aos olhos do mundo?
Análise
Teresa de Sousa
1. Uma das raras coisas normais
nas eleições presidenciais
americanas é o facto de quase
ninguém mencionar a política
externa. E, no entanto, para o
resto do mundo, o seu resultado
será “o mais pesado de
consequências da história
recente”. A aÆrmação de Julian
Borger, analista do Guardian
britânico, talvez não seja tão
exagerada quanto parece. As
eleições presidenciais americanas
têm sempre um forte impacte
global porque os Estados Unidos
continuam a ser o país mais
poderoso do mundo. Desta vez,
soma-se uma outra razão. Talvez
nunca tenham sido tão distintas as
visões dos dois candidatos sobre a
relação da América com o mundo.
O primeiro mandato de Donald
Trump conseguiu pôr Æm ao
habitual consenso bipartidário no
domínio da política externa com
que o resto do mundo podia
contar.
O ano de 2020 será,
deÆnitivamente, o ano em que uma
pandemia tomou conta da
humanidade, mas será também o
ano em que a sorte do mundo
esteve, em grande medida,
dependente da escolha que os
eleitores americanos —
provavelmente, menos de 200
milhões — Æzerem nas urnas, a 3 de
Novembro.
2. Há duas perguntas simples
que toda a gente coloca. A primeira
é se o mundo, tal como ainda o
conhecemos, resistirá a mais
quatro anos de Donald Trump. A
segunda, até que ponto Joe Biden
consegue restaurar a imagem e a
liderança americana no mundo?
Pode dizer-se sem risco de errar
que a primeira pergunta obtém
respostas mais convergentes. O
mundo continuaria a sua
caminhada cada vez mais rápida
em direcção ao caos. A China teria
o seu caminho em direcção à
hegemonia mundial facilitado. A
Europa, órfã do seu grande aliado,
ver-se-ia obrigada a fazer das
fraquezas forças para enfrentar
uma realidade internacional para a
qual não está preparada.
Tem fundamento um cenário tão
negro? O título de um ensaio de
Richard Haass, publicado na
edição de Setembro/Outubro da
Foreign Affairs, consegue ser a mais
simples das deÆnições do que
foram os anos de Trump na Casa
Branca: Present at the Disruption. O
director do Council on Foreign
Relations de Washington vai buscar
inspiração às memórias de Dean
Acheson, conselheiro de Roosevelt
e secretário de Estado de Truman,
Present at the Construction.
Acheson descreve ao pormenor
como os Estados Unidos
reconstruíram a ordem
internacional do pós-guerra a
partir da criação de instituições
multilaterais assentes na regra e
Æéis à defesa da liberdade e dos
direitos humanos — do sistema das
Nações Unidas ao Sistema de
Bretton Woods, da fundação da
Aliança Atlântica ao impulso
decisivo para a uniÆcação da
Europa Ocidental. A ordem liberal
que os Estados Unidos criaram
sobreviveu à Guerra Fria, viveu um
breve e feliz interregno em que a
democracia e os mercados
pareciam contagiar o mundo
inteiro, resistiu à “guerra ao terror”
de George W. Bush, teve em Obama
um convicto defensor.
Donald Trump operou uma
ruptura. “Quase destruiu ou, no
mínimo, ignorou, as alianças
permanentes dos Estados Unidos,
um dos seus principais pontos
fortes em comparação com outras
grandes potências como a China ou
a Rússia”, diz William Burns, do
Carnegie Endowement de
Washington. Ignorou as
instituições multilaterais,
considerando-as apenas um
sorvedouro de dinheiro e de
recursos dos EUA. Abandonou o
apoio à integração europeia e
chegou a pôr em causa a própria
NATO. Finalmente, a única política
que chegou a ter alguma aceitação
acabou por traduzir-se em quase
nada. Elegeu a China como o
grande rival da América, o que
poderia não alterar
substancialmente a política de
“contenção” posta em prática por
Barack Obama, quando deÆniu a
China como o maior adversário
estratégico dos EUA no século XXI.
Faltou-lhe, no entanto, tudo o
resto. Desfez as alianças e os
acordos comerciais que Obama
negociou na Ásia-PacíÆco,
abandonando a Parceria
TranspacíÆca com 11 países da
região, incluindo o Japão e
excluindo a China. Substituiu a
“contenção” pela hostilidade. “A
Administração Trump cedeu o
terreno à China, ao abdicar da sua
liderança global e ao negligenciar
os seus amigos em todo o mundo”,
diz ainda Burns. Trocou uma
política por slogans, omnipresentes
na sua campanha: o vírus é
“chinês”; “se Biden ganhar, a China
ganha”.
Robert Zoellick, que foi o
representante de George W. Bush
para as negociações de comércio,
acrescenta um veredicto ainda
mais negro: “A política de Trump
em relação à China, que valoriza
mais a postura do que os
resultados, foi um total falhanço.
Feitas as contas, a retórica belicista
e radical não fez vergar a ambição
chinesa, nem lhe retirou os
instrumentos de que precisa para
aÆrmá-la”.
Retirou-se a superpotência
liberal e democrática. Entraram
em cena grande potências
revisionistas, que se opõem ao
liberalismo e à democracia.
“Quatro anos de política externa
norte-americana radicalmente
revisionista deram força aos
autocratas em todo o mundo,
promoveram o aventureirismo,
alimentando os conÇitos nas
fronteiras da Europa e as divisões
entre parceiros”, diz Rosa Balfour,
“Não há bilhete de
regresso ao mundo
antes de Trump”,
escreve Philip
Stephens no
Financial Times.
A realidade
internacional
mudou. Os
principais actores
mundiais também
directora do Carnegie-Europe. sucessor de Trump na Casa Branca,
Regressando a Richard Haass, mais desde que não seja o próprio
quatro anos de Trump Trump.
transformariam a “disrupção” que A simples eleição de Joe Biden
introduziu na ordem internacional terá um efeito imediato: restituir
na sua “destruição”. algum brilho à imagem
3. Edward Luce, colunista do internacional da América. “Apesar
Financial Times em Washington, de Trump, os Estados Unidos ainda
argumenta que foi no domínio da mantêm um considerável soft
política externa que o actual power, porque grande parte do
Presidente conseguiu cumprir mundo olha para a sua presidência
algumas das promessas que fez aos como uma aberração, que não
americanos em 2016. “Não iniciou reÇecte o verdadeiro carácter da
nenhuma guerra. Retirou as tropas América”,
do Afeganistão e do Médio Oriente.
O Estados Islâmico [Daesh] perdeu
o seu território. Os aliados da
América foram forçados a
pensar num mundo em
que os EUA deixam
de garantir a sua
segurança.”
O argumento
de Luce não
signiÆca uma
apreciação positiva da sua
política externa. Pretende
apenas sublinhar que o que
fez vai, em muitos
aspectos, ao encontro
do que pensa uma
maioria de
americanos, pouco
interessados no que se
passa no mundo. O
colunista do Financial
Times também quer dizer
que não vale a pena apagar
o seu mandato, porque isso
não é possível. Joe Biden
apoiou publicamente os
acordos que Trump negociou
entre Israel e os Emiratos
Árabes Unidos e é muito provável
que mantenha a embaixada
americana em Jerusalém.
O mesmo não pode ser dito das
suas cimeiras com o líder da Coreia
do Norte, exibidas como um
enorme êxito na contenção do seu
programa nuclear. Se era precisa
uma prova, ela foi apresentada na
parada militar com que Kim
Jong-un celebrou o último
aniversário da fundação da Coreia
do Norte — um “míssil monstro”
com capacidade para transportar
ogivas nucleares e atingir território
americano.
4. “Biden pode salvar o mundo?”
A pergunta é retórica, mas contém,
ao mesmo tempo, as grandes
expectativas e o reconhecimento
das diÆculdades que esperam o JIM BOURG/REUTERS

escreve Kemal Dervis, da
Brookings Institution, que já
cheÆou o Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento e
foi ministro da Economia de
Ancara.
Outros autores são menos
optimistas. Reconstruir a conÆança
nos EUA vai levar tempo — o tempo
necessário para conÆrmar que
Trump foi uma excepção e não
uma viragem. “Os políticos
americanos vão ter de trabalhar
arduamente para ultrapassar
algum cepticismo, incluindo dos
nossos mais próximos
aliados, e o receio de que a
a mudanças na relação com Pequim.
p
polarização política
americana tenha
infectado a sua
diplomacia”, diz
William Burns. Será
uma questão de
tempo, mas não
apenas isso. Não
vale a pena
O Presidente
Donald Trump e o
senador Joe Biden
enfrentam-se nas
urnas a 3 de
Novembro
JIM BOURG/EPA
alimentar a ilusão de que a relação
da América com o mundo vai
regressar ao ponto em que estava
antes de Tump. “Não há bilhete de
regresso ao mundo antes de
Donald Trump”, escreve Philip
Stephens no Financial Times. A
realidade internacional mudou. Os
principais actores mundiais
também. A política externa de
Biden terá de levar em conta esta
mudança.
A China continuará a ser o maior
desaÆo estratégico dos Estados
Unidos nas próximas décadas. Não
haverá imediatamente grandes
Manter-se-ão as actuais tensões
económicas e tecnológicas. Haverá
uma dimensão nova, dos direitos
humanos, que uma futura
Administração Biden não
poderá ignorar. E a extrema
tensão em redor de
Taiwan —
provavelmente, o maiss
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 19
É esta, sério risco de uma confrontação
militar — exigirá de uma nova
precisamente, Administração democrata toda a
uma das grandes sua capacidade dissuasora. Como
traçar um limite ao crescente
questões em expansionismo da China será um
debate — se é dos maiores quebra-cabeças do
novo Presidente.
possível travar Será mais fácil restabelecer uma
a transformação boa relação com os velhos aliados e
restaurar parte da conÆança dos
da ordem liberal europeus na NATO. Biden não será
numa ordem “o amigo de Putin” e o “inimigo de
Merkel”. Mas Trump, se perder,
internacional que deixa atrás de si uma Europa mais
regressa à “balança
balança dividida na sua relação com a
América, tentada pelo sonho de
de poder” “autonomia estratégica”, incluindo
no domínio da segurança e defesa,
mais desconÆada da solidariedade
a
am ericana. O Irão pode ser um
americana.
teste importante. Biden já disse
te
q
qu e, se for eleito, retomará
que,
o compromisso americano
ccom
co m o tratado nuclear
n
neegociado por Obama
negociado
e
emm 2015 e que Trump
abandonou. Com uma
ccondição:
co ndição: “Teerão terá
d
dee cumprir o que Æcou
estabelecido”. Um
grande “se”. O
candidato democrata
também já anunciou
que os EUA
regressam ao Acordo
de Paris sobre as
alterações climáticas
e manter-se-ão na
OMS.
5. Estas são as
mudanças
imediatas. Uma
estratégia
internacional a
mais longo prazo,
adaptada ao mundo
pós-pandemia, ainda é
matéria para intenso
debate nos círculos de
política externa próximos de
Joe Biden. O candidato
democrata tem uma longa
experiência nos assuntos
internacionais desde os seus
tempos de senador e de
vice-presidente de Obama, com
quem teve algumas divergências.
Uma ala mais “progressista” dos
seus conselheiros diz que lhe falta
ambição e audácia. Os mais
realistas, escreve Christine
è
Kauèmann no Monde,
“preocupam-se mais em olhar,
não tanto para Biden, mas para
uma sociedade americana muito
dividida, e para o estado actual do
mundo”.
Anne-Marie Slaughter,
braço-direito de Hillary Clinton no
departamento de Estado no
primeiro mandato de Obama,
escreveu no Financial Times sobre
as mudanças que espera de Biden:
“Em estilo, [mudará]
dramaticamente. Na acção,
substancialmente, mas não
completamente.” Continua a
actual directora do think-tank New
Ameri
America: “Os EUA voltarão a
abraça
abraçar o multilateralismo e a
estend
estender a mão aos aliados e aos
parcei
parceiros com renovado vigor”,
mas “c“continuarão a exercer a
comp
competição entre grandes
potên
potências e a concentrar-se na
China enquanto o seu maior rival”.
É es
esta, precisamente, uma das
grand
grandes questões em debate — se é
possív
possível travar a transformação da
ordem liberal numa ordem
intern
internacional que regressa à
“balan
“balança de poder”. A antiga
conse
conselheira de Hillary Clinton
conclu
concluiu que a política externa de
Biden se pode resumir a três “D”:
“Dom
“Domestic, deterrence and
demo
democracy”. A frente interna será
funda
fundamental, porque boa parte da
capac
capacidade de conter a China
passar
passará pela renovação económica
e tecn
tecnológica dos Estados Unidos.
É nest
nestas duas dimensões que a
China é mais forte, e não na
dimen
dimensão militar. Biden, o
defen
defensor dos acordos de comércio
livre d
do tempo de Obama e de Bill
Clinto
Clinton, será provavelmente mais
sensív
sensível à protecção da capacidade
indust
industrial americana.
O “D
“D” de Democracia pode
traduz
traduzir-se numa velha ideia: não
aposta
apostar tanto nas organizações
multil
multilaterais, antes fundar uma
“alian
“aliança das democracias”, capaz
de con
contrariar a vaga autoritária que
varre o mundo e reforçar o modelo
ociden
ocidental contra o modelo chinês.
O outr
outro “D”, de dissuasão, não
agrad
agradará tanto aos “progressistas”
da sua entourage, que gostariam de
ver uma
um redução signiÆcativa do
gigant
gigantesco orçamento da defesa.
Os tem
tempos não caminham nessa
direcç
direcção. E Biden é, em primeiro
lugar, um pragmático.
teresa.de.sousa@publico.pt
teresa
20 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
MUNDO
Sánchez marca conselho
de ministros pressionado por regiões
para declarar estado de emergência
Espanha
Maria João Guimarães
Governo soma apoios para
conseguir aprovar a
medida, que as regiões
querem para restringir
actividade à noite
O chefe do Governo espanhol, Pedro
Sánchez, marcou para hoje uma reu-
nião extraordinária do Conselho de
Ministros, pressionado pelas regiões
para declarar um estado de emergên-
cia que permita aplicar recolheres
obrigatórios devido à progressão do
coronavírus.
Dez das 17 regiões vinham a pres-
sionar o Governo para que se decidis-
se por esta medida. Sánchez, diz o
diário El Mundo, preferia esperar para
ter unanimidade das regiões, mas a
pressão de algumas começou a ser
grande, e o Governo já somou apoios
suÆcientes para conseguir aprovar o
estado de emergência.
O diário Publico destaca que quase
todo o país está com risco alto ou mui-
to alto, e seis comunidades estão mes-
mo em alerta máximo. Espanha tor-
nou-se na semana que passou o pri-
meiro país da Europa a passar um
milhão de casos de infecção e Pedro
Sánchez disse que este número estará
muito provavelmente subestimado e
que o número real de infecções pode
ser mais próximo de três milhões.
Morreram quase 38 mil pessoas.
Outros países da Europa com cená-
rios menos preocupantes impuseram
já medidas como o recolher obrigató-
rio: França em várias zonas, incluindo
grandes cidades como Paris e Marse-
lha, Itália, nas as regiões do Lácio
(Roma), Campânia (Nápoles) e Lom-
bardia (Milão), por exemplo, e Grécia
em Atenas e outras zonas.
A Catalunha anunciou que irá
impor um recolher obrigatório mal o
Governo aprove um decreto que lhe
dê cobertura legal. “A evolução é mui-
to preocupante. Ou aumentamos os
nossos esforços, ou a covid-19 aumen-
ta”, disse o número dois do governo
catalão, Pere Aragonès.
“O vírus não percebe divisões
administrativas ou cores políticas
diferentes”, disse o líder da região de
Castela e Leão, Alfonso Fernández
Mañueco, em defesa de um entendi-
mento.
Algumas regiões dizem mesmo que
Pedro Sánchez: há que reduzir movimentos, “não há outra solução”
Covid-19 na Europa
Presidente da Polónia
infectado com coronavírus
O Presidente da Polónia, Andrzej
Duda, está infectado com o
coronavírus, anunciou o
porta-voz do chefe de Estado,
mas está a sentir-se bem. Duda,
48 anos, participou na
segunda-feira num fórum em
Talin, na Estónia, onde se
encontrou com o Presidente da
Bulgária, Rumen Radev — que
está agora em quarentena por
ter sido exposto ao vírus. A
Polónia tem visto um enorme
aumento de casos, com um
novo recorde de infecções,
ultrapassado na sexta-feira (mais
de 13.600 infecções). O país
entrou num confinamento
nacional e encerrou
parcialmente escolas primárias
e restaurantes.
Macron: viver com o vírus pelo
menos até ao Verão
O Presidente francês,
Emmanuel Macron, disse que o
país vai ter de viver com o vírus
“no melhor dos casos, até ao
PABLO BLAZQUEZ DOMINGUEZ/REUTERS
Verão”, citando previsões dos
cientistas. Macron impôs um
recolher obrigatório numa série
de regiões para evitar um novo
confinamento, mas disse ser
ainda cedo para decidir se será
necessário voltar a fechar o
país. França registou, na
sexta-feira, mais de 40 mil
novos casos e 298 mortes. O
recolher obrigatório pode ser
relaxado, disse, quando os
casos voltarem aos 3000-5000
por dia, uma grandeza que se
registou pela última vez no final
de Agosto.
Angela Merkel volta a fazer
apelo aos alemães
A chanceler alemã, Angela
Merkel, voltou a pedir aos
alemães que limitem os
contactos sociais e não viajem a
não ser que seja estritamente
necessário. Apesar de o país
estar na parte mais abaixo da
tabela de países europeus a
nível de taxa de incidência
(infecções por cem mil
habitantes nos últimos 14 dias),
e de ter recebido doentes de
outros países, como a Holanda,
a situação está a
descontrolar-se, têm avisado as
autoridades de saúde. O país
ultrapassou as dez mil infecções
diárias esta semana e registou,
desde o início da pandemia, dez
mil mortes. M.J.G.
se o Governo central não agir, procu-
rarão outros meios para impor restri-
ções: “Não podemos esperar mais,
temos de dar passos em frente”, disse
o líder do governo da região de Múr-
cia, Fernando López Miras, à TVE.
“Se o Governo central não Æzer nada,
vamos aprovar um recolher obriga-
tório”, declarou, sendo os tribunais
regionais vistos como outro meio de
conseguir impor restrições.
No entanto, o Governo deverá con-
seguir apoio suÆciente para aprovar
o estado de emergência, com o apoio
de partidos regionais como o Partido
Nacionalista Basco, no poder na
região e cujo líder, Iñigo Urkullu, tam-
bém quer o recolher obrigatório.
Até agora, Sánchez tem dito que
cabe às regiões decidir os próximos
passos e pediu aos espanhóis que
“reduzam o movimento e o contacto
social”, já que “não há outra solu-
ção”.
A região de Madrid que, diz o jornal
espanhol Publico, é acusada por mui-
tos de não estar a tomar as medidas
correspondentes à gravidade da situa-
ção, anunciou entretanto novas res-
trições para vigorar depois do conÆ#
namento de duas semanas que até
ontem limitou a mobilidade dos resi-
dentes para fora da região.
A principal novidade, segundo o
diário El País, é que Æca a ser proibido
o socializar em público de pessoas
que não vivam juntas entre a meia-
noite e as 6h. Muitos dos outros res-
ponsáveis regionais dizem que isso
não chega. O Executivo de Sánchez
(centro-esquerda, do PSOE-Unidas
Podemos) e o governo autonómico de
Madrid, do partido Popular e Cida-
dãos apoiado pela extrema-direita do
Vox, têm-se desentendido em relação
à gestão da pandemia.
A líder do Cidadãos, Inés Arrima-
das, disse, entretanto, que apoiaria
Sánchez numa declaração de estado
de emergência, pondo o seu partido
em rota de colisão com o seu parceiro
de coligação no governo autonómico
de Madrid, o PP, onde a líder do exe-
cutivo Isabel Ayuso se tem oposto
com veemência a esta medida.
Se for aprovado, este será o terceiro
estado de emergência decretado pelo
Governo de Sánchez depois do pri-
meiro de Março, que acabou renova-
do seis vezes, mantendo-se em vigor
até Junho, e do que foi recentemente
imposto na região de Madrid.
mguimaraes@publico.pt
Alpha Condé
declarado
vencedor das
presidenciais
Guiné-Conacri
Cellou Dalein Diallo fala
em fraude e diz ter sido
ele o vencedor. A violência
pós-eleitoral já fez dez
mortos no país
O Presidente cessante da Guiné-Co-
nacri, Alpha Condé, venceu as elei-
ções do passado domingo com 59,4%
dos votos, conseguindo um contro-
verso terceiro mandato, anunciou a
comissão eleitoral.
O seu principal adversário, Cellou
Dalein Diallo, que se declarou vence-
dor das presidenciais antes da divul-
gação dos resultados, obteve 33,5 por
cento dos votos, segundo a comissão.
Condé, 82 anos, foi o primeiro chefe
de Estado eleito democraticamente
em 2010, após décadas de regimes
autoritários. Com um referendo mui-
to contestado, em Março, fez aprovar
uma nova Constituição e considerou
que o novo texto lhe permitia concor-
rer ao terceiro mandato. Os adversá-
rios denunciaram um “golpe de Esta-
do constitucional”.
Alpha Condé, de
82 anos, mudou
a Constituição
para poder
candidatar-se
a um terceiro
mandato
Segundo a oposição, pelo menos,
90 pessoas morreram este ano em
confrontos em manifestações contra
uma nova candidatura de Condé. A
violência pós-eleitoral causou pelo
menos uma dezena de mortes.
A Comissão Eleitoral Nacional
Independente anunciou na quinta-
-feira que, contados os votos de 37
dos 38 círculos eleitorais, Condé
tinha mais de 2,4 milhões de votos
entre os 3,9 milhões de votos regis-
tados, o dobro dos conquistados por
Diallo (1,2 milhões).
Os opositores acusam o Governo
de estar envolvido numa fraude,
enquanto o executivo e os apoiantes
de Condé asseguram que o processo
eleitoral foi realizado de forma segu-
ra e responsabilizam Diallo pela ins-
tabilidade social na Guiné-Conacri
por se ter autoproclamado na segun-
da-feira vencedor das eleições.
Lusa

O referendo no Chile é um exorcismo
do fantasma de Pinochet
Durante meses, as ruas do Chile exigiram a refundação do Estado e um novo contrato social.
Ao votarem para que seja redigida uma nova Constituição, abrem um novo capítulo na História do país
América Latina
João Ruela Ribeiro
Os chilenos esperam que o plebiscito
de hoje marque o início de uma nova
fase no rumo de um país que viveu
um ano de enorme tensão social. É
provável que seja dada luz verde
para o arranque do processo de ela-
boração de uma nova Constituição,
mas será a partir daí que a sociedade
terá de começar a fazer escolhas difí-
ceis.
Os eleitores vão dizer se aprovam
ou rejeitam a hipótese de ser elabo-
rada uma nova Constituição para
substituir a actual que vigora desde
1980, quando o Chile era uma dita-
dura governada por Augusto Pino-
chet. Caso sejam favoráveis, os chi-
lenos terão também de se pronun-
ciar sobre o tipo de órgão que terá
essa função: uma assembleia com-
posta por 155 elementos eleitos ape-
nas para esse Æm ou uma convenção
mista com 172 membros, dividida
entre deputados e cidadãos eleitos.
A convocatória de um referendo
constitucional foi a solução encon-
trada pelo Presidente Sebastián Piñe-
ra para tentar pôr Æm à onda de pro-
testos que, no Ænal do ano passado,
deixou o Chile numa situação caóti-
ca. A oposição aos planos do Gover-
no de aumentar a tarifa do metro em
Santiago transformou-se numa con-
testação generalizada ao modelo de
sociedade que se desenvolveu nas
últimas décadas. A repressão violen-
ta das manifestações deixou marcas
e, acima de tudo, uma enorme des-
conÆança face aos poderes instituí-
dos.
Os protestos diminuíram de inten-
sidade nos últimos meses, mas esse
parece ser um efeito das medidas
para conter a pandemia de covid-19,
e não um sinal de que haja algum
tipo de tréguas. A Praça Itália, o epi-
centro das manifestações do ano
passado, voltou a concentrar deze-
nas de milhares de pessoas no
domingo passado, para assinalar o
aniversário do início dos protestos.
O dia voltou a terminar numa nota
violenta, com um morto e mais de
500 detidos em todo o país.
As sondagens mostram que a
A pandemia pode provocar um nível de abstenção elevado
maioria do eleitorado está a favor do
“Aprovo” à nova Constituição. A con-
vicção dominante é a de que o actual
texto constitucional não tem legiti-
midade, apesar das mais de 50 alte-
“O que está em rações realizadas desde a instaura-
ção da democracia, em 1990. Foi à
jogo é pôr um Äm luz dessa Constituição que o Chile se
ao neoliberalismo tornou o grande exemplo da aplica-
ção de medidas neoliberais que con-
e avançar rumo viveram com o autoritarismo político
a um modelo de Pinochet. Os serviços públicos
foram privatizados, gerando uma
social-democrata”, forte iniquidade e são um entrave à
diz a professora ascensão social.
“Num país altamente classista e
Claudia Heiss racista como o Chile, a exigência por
um tratamento humano e justo
explodiu com muita força”, explica-
va há um ano, em plena onda de
protestos, o professor do Instituto de
Comunicação e Imagem da Univer-
sidade do Chile, Cristian Cabalin, ao
site Infobae.
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 21
ELVIS GONZALEZ/EPA
A grande dúvida sobre a votação
de hoje é o nível de participação.
Desde que o voto deixou de ser obri-
gatório em 2013, a abstenção subiu
nas eleições chilenas, o que faz do
país um dos que apresenta taxas de
participação mais baixas na América
Latina. As restrições associadas à
pandemia podem deixar em casa os
mais idosos, geralmente mais parti-
cipativos.
Não foi Æxado nenhum patamar
mínimo para que o resultado do ple-
biscito seja vinculativo, mas há uma
grande discussão sobre a legitimida-
de de um desfecho caso menos de
metade dos 14,7 milhões de eleitores
for votar. “Simbolicamente, se temos
um plebiscito em que participa
menos gente do que nas últimas pre-
sidenciais, isso mostraria que os
cidadãos não apreciam muito este
processo constitucional e não consi-
deram que será a solução dos pro-
MUNDO
blemas”, disse ao El País o analista
político Kenneth Bunker.
Depois do voto
Se parece certo que após a votação
os chilenos entram numa nova fase,
isso signiÆca simultaneamente o iní-
cio de um período de muita incerte-
za. Desde que Piñera anunciou o
plebiscito, no Ænal de 2019, que cen-
tenas e centenas de mesas redondas,
conferências e debates, geralmente
virtuais, sobre o que signiÆca uma
nova Constituição animam o espaço
público chileno.
Ninguém sabe que país irá sair no
Ænal deste processo — que terá em
2021 uma maratona de votos, com
eleições presidenciais, parlamenta-
res, regionais e para a assembleia
constituinte, se o referendo der uma
vitória ao “Aprovo” —, mas há a espe-
rança de que se torne mais justo e
menos elitista.
“O que está em jogo é pôr um Æm
ao neoliberalismo e avançar rumo
a um modelo social-democrata”,
resume a professora da Ciência Polí-
tica da Universidade do Chile, Clau-
dia Heiss, citada pelo Financial
Times. “A maioria dos chilenos quer
apenas um Estado mais presente”,
acrescenta.
Como chegar a esse objectivo será
determinada na próxima etapa, que,
se antes já seria desaÆante, com o
impacto económico causado pela
covid-19 será monumental. Não pare-
ce haver grande alternativa que não
passe pela ampliação do acesso a
serviços públicos e medidas de maior
redistribuição dos rendimentos.
Porém, as instituições Ænanceiras
internacionais também já deram
entrada no debate. Na semana pas-
sada, a agência de notação Ænancei-
ra Fitch desceu a avaliação da dívida
chilena, alertando para a subida da
despesa pública reivindicada pelos
manifestantes. O Fundo Monetário
Internacional disse haver riscos
para a economia na eventualidade
de “o processo constituinte, no Ænal
de tudo, acabar por se resumir à
aplicação de uma multiplicidade de
políticas sociais sem sustento
macroeconómico”.
joao.ruela@publico.pt
22 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
CIÊNCIA
Nuno Vasco Rodrigues
Uma lente
no oceano para
alertar para
os problemas
ambientais
Biólogo e investigador, Nuno Vasco Rodrigues decidiu
abandonar o Oceanário de Lisboa para se dedicar à fotograÄa
submarina. Através da fotograÄa, procura alertar para os
problemas ambientais dos oceanos
Rui Pedro Paiva
N
uno Vasco Rodrigues
nasceu em Abrantes,
longe do mar. Depois
mudou-se para Coim-
bra e o mar continuava
longe. Nada que o
impedisse de escolher
o oceano como o seu
escritório. É investiga-
dor no pólo do Centro
de Ciências do Mar e do Ambiente
(Mare) no Instituto Politécnico de Lei-
ria e um dos poucos fotógrafos sub-
marinos portugueses, mas, assume
preferência pela designação de fotó-
grafo de conservação.
As diferenças no nome servem para
salientar a preocupação ambiental da
sua actividade. “É um fotografo que
vê mais além do que a questão estéti-
ca e tenta através da imagem alertar
para um problema”, explica ao
PÚBLICO, dando exemplo da sobre-
pesca, do aquecimento global, da
destruição dos habitats e do manan-
cial de plásticos que poluem os mares.
“Através de uma imagem com grande
impacto captamos atenção da pessoa.
A partir do momento que isso acon-
tece, abre-se uma porta para transmi-
tir uma mensagem e é isso que eu
tento fazer”, diz.
A ligação com o mar veio em
pequenino. A “pesca foi a porta de
entrada”, sobretudo devido à inÇuên-
cia do avô materno, médico de pro-
Æssão, mas pescador nos tempos
livres. Na infância, Nuno Vasco Rodri-
gues, agora com 38 anos, aguardava
ansiosamente pelo Æm-de-semana.
Era quando ia pescar com o avô, que
lhe ia “sempre transmitindo conhe-
cimento”. “Quando começava a pen-
sar que ia para a pesca, já nem conse-
guia dormir.” Na altura, devido à
distância geográÆca, ia pescar sobre-
tudo para a barragem na zona de
Abrantes ou para o rio Mondego. A
não ser no Verão: altura em que iam
um mês para o Algarve. “Passávamos
o dia inteiro nas poças de maré a pro-
curar caranguejos e peixes e foi assim
que começou a grande paixão.”
A paixão pelo mar estendeu-se a
outras áreas. Começou por ser nave-
gador federado e começou a experi-
mentar — de forma mais amadora — o
mergulho. Em suma, “passava o dia
todo dentro de água à procura de pei-
xes”. A certa altura, tinha a casa cheia
de tanques e de peixes que trazia do
mar. Foi aí que a família foi se aperce-
bendo de que ele iria “enveredar por
uma proÆssão qualquer ligada aos
animais” — marinhos, sobretudo. Contudo, com a necessidade de por ser chave na minha vida, tive um
Não se enganaram. Quando chegou passar mais tempo nas secretárias da contacto muito próximo com o meio
a altura de enveredar por um curso faculdade, Nuno Vasco Rodrigues cientíÆco e isso fascinou-me.”
superior, a opção por biologia mari- começou a sentir falta do mar, “sentia Além de o ter fascinado, motivou-o.
nha no Instituto Politécnico de Leiria a falta de explorar os bichos”. No Voltou a Portugal, determinado a aca-
foi “uma escolha muito natural”. segundo ano, colocou um interregno bar o curso, para ir “rapidamente
“Nem havia outra hipótese, não havia no curso, aproveitou um contacto fazer ciência no terreno”. Após o cur-
segunda opção.” Estava no primeiro que tinha no Brasil e foi para lá traba- so, começou a trabalhar na área dos
ano do curso quando tirou o curso de lhar com cientistas. “Fui trabalhar aquários públicos, com o papel de
mergulho e começou a mergulhar nas num laboratório que fazia estudos no conservação. “Sempre fui um nerd
Berlengas. Corria o ano 2000. Foi aí campo, na zona dos recifes de corais.” dos peixes, os peixes sempre foram a
que a “parte de mergulho e da explo- Olhando agora com a respectiva dis- minha grande paixão.”
ração marinha” começaram a ganhar tância temporal, o fotógrafo não tem Seguiu-se um curso na área dos
“relevância” na sua vida. dúvidas: “Essa experiência acabou aquários em Boston, nos EUA. O ano

era de 2006 e marca o início da sua
carreira na fotograÆa. “Havia lá na
universidade uma pequena câmara
compacta que ninguém estava a uti-
lizar, lembro-me de pedir a um dos
professores para a utilizar”, diz,
puxando da memória para evocar o
momento. O pedido foi acedido e é aí
que surge a fotograÆa submarina na
sua carreira. “Comecei por fazer algu-
mas fotograÆas e a partir daí foi sem-
pre a subir.” A fotograÆa surgiu por
“necessidade”, por falta de um “guia
de campo fotográÆco da vida mari-
FOTOS: NUNO VASCO RODRIGUES
ANA PINTO
nha”, algo que “não era habitual em
Portugal”. No seu caso, interessava-
lhe sobretudo a zona das Berlengas e
daí nasceu o seu primeiro de três
livros: Guia de Espécies Submarinas.
Portugal — Berlengas, de 2008 (segui-
ram-se Peixes Marinhos de Portugal,
de 2015; e Peixes Marinhos Costeiros
de São Tomé e Príncipe, de 2018).
“Tudo pode acontecer”
Nuno Vasco Rodrigues fez parte da
Estrutura de Missão para a Extensão
da Plataforma Continental, na condi-
ção de especialista em biodiversidade
marinha. Fez aí várias expedições às
ilhas Selvagens e ao Porto Santo, ao
mesmo tempo que trabalhava na
empresa Flying Sharks, dedicada ao
transporte de animais marinhos.
Com o seu nome associado a vários
projectos, em 2015 recebeu um “desa-
Æo quase impossível de recusar”: ir
para o Oceanário de Lisboa como
responsável do departamento de con-
servação cientíÆca e da colecção. “Foi
um salto na carreira.” Estávamos em
Setembro de 2016.
“Liderar uma equipa grande”, era
um “desaÆo interessante”, diferente
de tudo o que tinha feito até ali. A
“experiência foi muito boa”, mas,
com o passar do tempo, começou a
fazer “muitas outras coisas que não
estavam bem ligadas” à vida mari-
nha. Inerências de um trabalho que
também tinha muito de gestão buro-
crática. Ou seja, tal como quando
decidiu suspender o curso para ir
para o Brasil, o trabalho no oceanário
fazia-o “sentir a falta do terreno”. Do
terreno e da fotograÆa, uma vez que
só fotografava aos Æns-de-semana ou
nas férias. Tudo isso pesou na deci-
são. “Chegou a altura que estava na
hora de mudar. Não foi nada fácil,
mas estava em ponto de saturação.
Queria voltar ao mar.”
E voltou. Quase de seguida. Deixou
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 23
o Oceanário de Lisboa em Janeiro
deste ano, em Fevereiro foi para o Sul
de Moçambique. Foi fotografar “ani-
mais de grande dimensão, que estão
quase todos ameaçados”, como o
caso do tubarão-baleia ou das jaman-
tas. Além disso, foi também acompa-
nhar um projecto de conservação
com as comunidades costeiras
moçambicanas para que sejam “elas
próprias a deÆnir as suas áreas mari-
nhas protegidas”.
Entretanto, dá-se a pandemia da
covid-19 e teve de abandonar Moçam-
bique antes da conclusão dos projec-
tos. Mal a evolução da pandemia
permitiu o desconÆnamento possí-
vel, o fotografo submarino foi para
os Açores. Passou lá o Verão, de
Junho a Setembro, na ilha do Faial, a
acompanhar o trabalho desenvolvido
pelo Departamento de OceanograÆa
e Pescas da Universidade dos Açores.
“Está a fazer-se ciência de grande
nível e é muito relevante fazer ima-
gens desses projectos porque há uma
certa diÆculdade em transmitir ao
público em geral o trabalho dos cien-
tistas. Daí a importância da comuni-
cação de ciência.”
A estadia nos Açores era já uma
das suas intenções para este ano por-
que trata-se de um “ano absoluta-
mente excepcional” para explorar o
Atlântico. E Nuno Vasco Rodrigues
No sentido dos ponteiros do
relógio: tubarões-azuis no banco
submarino Condor no Faial;
lesma-do-mar nas Berlengas;
tubarão-baleia na ilha de Santa
Maria; Nuno Vasco Rodrigues;
e jamantas em Santa Maria
fala de experiência própria. Dá o
exemplo do tubarão-azul, que tem
sido avistado frequentemente ao
redor das ilhas açorianas. Aquele
animal, a espécie de tubarão mais
pescada a nível mundial devido à
venda de barbatanas para o mercado
asiático, é uma das predilectas do
fotógrafo. “Queria muito fotografá-lo
porque é um animal lindíssimo, é
dos animais estruturantes, predado-
res de topo, responsáveis do equilí-
brio do ecossistema.”
Também conseguiu fotografar as
jamantas que aparecem nos bancos
submarinos dos Açores e o tubarão-
anequim que passava perto da ilha
do Faial. Também encontrou uma
tartaruga-de-couro na ilha vizinha, a
do Pico. De todos, não faltou o tuba-
rão-baleia, o “maior peixe do mun-
do”, que esse ano “apareceu em
força em Santa Maria” e também no
Sul do Pico, onde foram avistados
três animais a cerca de 150 metros da
costa. “As pessoas das casas conse-
guiam ver, é algo anormal.” Uma
anormalidade que resulta da centra-
lidade das ilhas açorianas no Atlân-
tico. “Estás no meio do oceano e
tudo pode acontecer, tudo pode apa-
recer aqui mesmo ao lado.”
Mas os Açores não são um local
privilegiado para a fotograÆa subma-
rina apenas pela localização. Há
quem defenda que a fotograÆa é
essencialmente luz. E as águas aço-
rianas, sendo “pobres em nutrien-
tes”, têm uma penetração de luz
interessante, que permite uma “ópti-
ma luminosidade” para as fotos.
Além da luz, para uma boa fotograÆa
submarina tem de se estar o “mais
próximo possível do animal”, por-
que a localização é fundamental. “É
como dizem os imobiliários: locali-
zação, localização, localização. É
estar no sítio certo e à hora certa e
isso só se consegue passando horas
e horas no mar.” E para ele, não há
nada melhor.
Com o apoio da
que incentiva a investigação
científica em torno do Atlântico
24 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020
CULTURA
Viagem nos Açores pelo eterno
diálogo entre homem e natureza
Como se manifesta a identidade
açoriana? A exposição Epicentro: Milagre,
até 10 de Janeiro no Arquipélago —
Centro de Artes Contemporâneas, é uma
tentativa de resposta
Artes
Rui Pedro Paiva
Um conjunto de homens, cobertos
por umas longas túnicas brancas,
percorrem o interior da ilha de São
Miguel. Vão em Æla, como em pro-
cissão, a entoar cânticos de penitên-
cia. Estão à procura do local esco-
lhido para a cerimónia. Assim que
o encontram, a um dos homens são-
-lhe retiradas as vísceras. O sacrifí-
cado grita, o sangue expele e os
Açores Æcam a salvo das intempé-
ries divinas.
A história, Æccional, está no Ælme
Misericórdia, de Francisco Lacerda,
um dos momentos da exposição Epi-
centro: Milagre, patente no Arquipé-
lago — Centro de Artes Contemporâ-
neas dos Açores, na Ribeira Grande,
até 10 de Janeiro. Uma exposição
com a curadoria do Tremor, que era
para ter sido inaugurada aquando
do festival, marcado para 31 de Mar-
ço a 4 de Abril, mas que foi cancela-
do devido à pandemia da covid-19.
Sete meses depois, eis a exposi-
ção. “Epicentro” evoca a “natureza”
e “milagre” a “cultura”: “Dois ele-
mentos muito fortes ligados a esta
geograÆa, a esta geograÆa histórica,
social e afectiva”, diz ao PÚBLICO
António Pedro Lopes, um dos cura-
dores, referindo-se à geograÆa que
deÆne a identidade de quem vive
naquelas ilhas. As intervenções pro-
curam explorar a noção de que a
“cultura se cria muito em relação a
uma natureza inesperada”, que tan-
to pode ser “criadora ou destruido-
ra”. “Por isso, as pessoas arranjam
maneira de suportar e lidar com a
natureza, sejam rituais e formas de
ajuntamento, como forma de acal-
mar eventuais tormentas”, diz.
Foi isso que Francisco Lacerda
fez. Ele, de origens açorianas, achou
que as tradições regionais tinham
“matéria-prima” para o cinema fan-
tástico. “Nesse caso, com o conceito
de homem, Açores, natureza, divino
e as romarias que são feitas para
apaziguar a ilha de tremores e erup-
ções, peguei nisso porque tinha uma
faceta um bocado fantástica, daque-
la ideia de culto e ritual”, diz o
cineasta ao PÚBLICO, confessando
que se sentiu “vulnerável” ao longo
do processo. O resultado é um Ælme
“fascinante”; que se equilibra “entre
o meio documental e o Æccional”.
“Era território novo para mim, mas
acho que o resultado saiu uma coisa
fascinante. Decidi pegar no que sei
e adaptar ao formato.”
O trabalho de Lacerda dialoga de
perto com o ritual dos romeiros nos
Açores. Todos os anos, por altura da
quaresma, um grupo de homens,
com terços enrolados nas mãos e de
xaile colorido caído pelas costas,
organiza-se em ranchos e sai da sua
freguesia para percorrer a ilha a pé.
Vão rezando em voz alta e param
em todas as igrejas da ilha, dormin-
do em casas de pessoas que lhes dão
guarida em nome da fé. Uma expres-
são genuína da tal identidade aço-
riana que está retratada numa exi-
bição fotográÆca de João Ferreira,
noutro dos momentos da exposição.
“O próprio fotógrafo decidiu ser
romeiro. Ele integrou o grupo, mas
também utilizou a prática da roma-
ria para a prática da introspecção e temos os pés é um organismo vivo”:
da prece”, explica António Pedro
O percurso “A terra continua a expelir, a trans-
Lopes. sugerido por formar-se, ela é mutável, tal como
A terra treme Epicentro: Milagre nós ao longo da vida”, elucida o
curador.
A tradição dos romeiros começou atravessa o âmago Este símbolo da instabilidade do
no século XVI, após um terramoto solo é antecedido por uma “viagem
ter destruído Vila Franca do Campo
do território e ao interior da terra”, protagonizada
— então capital de São Miguel. É termina num por Tito Mouraz. Uma instalação que
uma das características das ilhas ergue um conjunto de representa-
açorianas: a terra treme. Um movi-
corredor que ções sequenciais de positivos de
mento transformado em instalação ostenta um tapete fotograÆas instantâneas, que vão em
pelo colectivo Berru. Duas chapas crescendo ou em decrescendo — con-
de metal, suspensas, estão total-
de verduras forme o ponto de vista. “Uma forma
mente preenchidas por pequenas evocativo das pictórica de representar o que está
pedras. Uma totalidade que preten- ali por baixo da terra, a borbulhar.”
de ser posta à prova ao longo dos
procissões É um jogo visual, de cores e formas,
próximos meses. A pedaços, um católicas que sobre a ilha.
pequeno dispositivo bate na chapa O percurso sugerido pelo Epicen-
e as pedras vão caindo lentamente.
abundam no tro: Milagre atravessa o âmago do
Não são varridas, Æcam no chão, arquipélago território e termina num corredor
para “demonstrar que a terra onde que ostenta um tapete de verduras
 Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 25

A cultura acaba por ser uma coisa

bolorenta se não é constantemente
actualizada por nós, as pessoas que
estamos a vivê-la neste momento
Márcio Laranjeira
Um dos curadores

ARQUIPÉLAGO – CENTRO DE ARTES CONTEMPORÂNEAS ARQUIPÉLAGO – CENTRO DE ARTES CONTEMPORÂNEAS

como a História”, escreveu Nemésio
em 1932 na revista Insula.
“É importante trazer essas refe-
rências e actualizá-las”, vinca Márcio
Laranjeira, outro dos curadores. Até
porque os Açores, que já estão “dife-
rentes pelo tempo”, continuam a ser
um “lugar muito imersivo, não só
pela natureza como pela dimensão
cultural”. O “próprio mundo está em
mutação”, diz Laranjeira, e a cultura
deve acompanhá-lo. “A cultura acaba
por ser uma coisa bolorenta se não
é constantemente actualizada por
nós, as pessoas que estamos a vivê-la
neste momento.” Francisco Lacerda,
o realizador, apesar de assumir que
o seu Ælme viveu do “experimenta-
lismo” — “fui para os locais rodar e
não tinha nada comigo” —, reconhe-
ce a intenção de “desconstruir for-
malismos e dogmas”.
Porque, aÆnal, é para isso que ser-
ve a cultura. “É para não permitir
que a nossa visão do lugar em que
estamos se cristalize”, aÆrma Antó-
nio Pedro Lopes, acrescentando que
“questionar” o que é “sacral, o dog-
ma e o subterrâneo” é também o
“lugar da arte”. Seja nos Açores, ou
noutro sítio qualquer. Porque, tendo
a vivência daquelas nove parcelas de
terra no meio do mar como pano de
fundo, Epicentro: Milagre interpela,
no Ænal de contas, a condição huma-
na. “Há uma certa universalidade
porque nós enquanto humanidade
temos sempre essa diÆculdade em
lidar com a natureza e com o que ela
pode trazer.”

PUBLICIDADE

ARQUIPÉLAGO – CENTRO DE ARTES CONTEMPORÂNEAS

Instalação de Tito Mouraz (esq.),
instalação do colectivo Berru e o
filme Misericórdia, de Francisco
Lacerda: divino e terrestre, real
e ficcional no Arquipélago
evocativo das procissões católicas
que abundam no arquipélago. Uma
instalação arte in situ, que reúne
objectos recolhidos pela ilha e mis-
tura-os com vídeo e som. Por base,
uma história sobre um conjunto de
mulheres que se reúnem uma vez
por mês para evocar o espírito da
natureza. Para o fazerem, as mulhe-
res baseiam-se no livro do Santo
Cristo, a obra que relata a história
daquele que é o santo maior da reli-
giosidade açoriana e que, de forma
escondida e clandestina, é utilizada
para adivinhar o futuro. Uma insta-
lação entre o real e o Æccional: “Não
procure a razão, procure a resso-
nância”, lê-se numa das paredes da
intervenção.
Questionar: “Lugar da arte”
É sob o ritmo do real e do Æccional,
e do divino e do terrestre, do pagão
e do católico que se desenvolve Epi-
centro: Milagre. São os horizontes
para explorar a identidade açoriana.
“A forma como a especiÆcidade da
ilha molda uma identidade cultural,
a açorianidade à imagem de Vitorino
Nemésio”, como se lê no texto à
entrada da exposição.
A referência não surpreende.
Nemésio é o nome incontornável
quando se aborda a noção de uma
identidade açoriana — o poeta
cunhou o termo açorianidade para
deÆnir a condição do ilhéu: “A geo-
graÆa, para nós, vale outro tanto
26 • Público ClassiÄcados • Domingo, 25 de Outubro de 2020

Agrupamento de Escolas de Cister - Alcobaça OFEREÇA

Sede: Escola Secundária D. Inês de Castro

AVISO
FILMES & SÉRIES
10 Assistentes Operacionais a tempo parcial
Procedimento concursal comum de recrutamento para ocupação de dois
postos de trabalho em regime de contrato de trabalho em funções públicas
a termo resolutivo certo, a tempo parcial, para a carreira e categoria de
assistente operacional, publicado no DR N.º 206, de 22 de Outubro - II Série.
Local de trabalho: escolas pertencentes ao Agrupamento de Escolas de Cister
- Alcobaça.
Funções a desempenhar: prestação de serviços/ tarefas - serviço de limpeza e
vigilância/acompanhamento de crianças.
Duração do contrato de trabalho: Ano letivo 2020/2021 - até ao dia 18 de
Dezembro de 2020.
Horário semanal: 20 horas semanais, a 4horas /dia (10 postos de trabalho).
Remuneração ilíquida/hora: 3,67€/hora, a que se acresce o valor do subsídio
de alimentação (4,77€/dia).
Observações: Este concurso é válido para eventuais contratações que ocorram
durante o ano escolar 2020/21.
Os interessados podem apresentar as candidaturas, pessoalmente ou por
correio, até 04/11/2020 nos Serviços Administrativos da Escola, sede, Rua
Costa Veiga, 2460-028 Alcobaça, tendo em conta as orientações do ponto 5.2 e
6 do referido aviso de abertura publicado no DR n.º 206, II Série de 22/10/2020 e
publicado na página eletrónica do Agrupamento (www.aecister.pt).
O Diretor,
Gaspar da Silva Fernandes Vaz MAIS INFORMAÇÕES: loja.publico.pt | 210 111 010

Fundada em 1988 pelo Professor Doutor Carlos Garcia,

a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de
Doentes de Alzheimer - Alzheimer Portugal é uma
Instituição Particular de Solidariedade Social. É a
única organização em Portugal, de âmbito nacional,
Condicionamento de Trânsito especificamente constituída para promover a qualidade
de vida das pessoas com demência e dos seus familiares
A4 – Amarante / Vila real (Túnel do Marão) e cuidadores. Tem cerca de dez mil associados em todo
o país.
Trabalhos de manutenção Oferece Informação sobre a doença, Formação para
cuidadores formais e informais, Apoio domiciliário,
Sublanço: Nó de Ligação ao IP4 (Padronelo) – Nó da Campeã, entre o km 63 Apoio Social e Psicológico e Consultas Médicas da
e km 82 Especialidade.
Como membro da Alzheimer Europe, a Alzheimer
Portugal participa ativamente no movimento mundial
A Infraestruturas de Portugal informa que o tráfego estará cortado no sentido e e europeu sobre as demências, procurando reunir e
períodos abaixo indicado: divulgar os conhecimentos mais recentes sobre a Doença
de Alzheimer, promovendo o seu estudo, a investigação
- Sentido Porto / Vila Real (desvio pelo Nó de Ligação ao IP4 - km 63) das suas causas, efeitos, profilaxia e tratamentos.
26 para 27 de outubro, das 21H00 às 06H00 Contactos
27 para 28 de outubro, das 21H00 às 06H00 Sede: Av. de Ceuta Norte, Lote 15, Piso 3, Quinta do Loureiro, 1300-125 Lisboa
- Tel.: 21 361 04 60/8 - E-mail: geral@alzheimerportugal.org
Centro de Dia Prof. Dr. Carlos Garcia: Av. de Ceuta Norte, Lote 1, Loja 1 e 2
- Sentido Vila Real / Porto (desvio pelo Nó da Campeã - km 82) - Quinta do Loureiro, 1350-410 Lisboa - Tel.: 21 360 93 00
Lar, Centro de Dia e Apoio Domiciliário «Casa do Alecrim»: Rua Joaquim Miguel Serra Moura,
28 para 29 de outubro, das 21H00 às 06H00 n.º 256 - Alapraia, 2765-029 Estoril
29 para 30 de outubro, das 21H00 às 06H00 Tel. 214 525 145 - E-mail: casadoalecrim@alzheimerportugal.org
Delegação Norte: Centro de Dia “Memória de Mim” - Rua do Farol Nascente
n.º 47A R/C, 4455-301 Lavra
Os desvios de tráfego serão efetuados pelo IP4 e estarão devidamente sinalizado Tel. 229 260 912 | 226 066 863 - E-mail: geral.norte@alzheimerportugal.org
Delegação Centro: Urb. Casal Galego - Rua Raul Testa Fortunato n.º 17,
no local. 3100-523 Pombal Tel. 236 219 469 - E-mail: geral.centro@alzheimerportugal.org
Delegação da Madeira: Avenida do Colégio Militar, Complexo Habitacional da
Agradecemos a compreensão dos utentes por eventuais transtornos causados no Nazaré, Cave do Bloco 21 - Sala E, 9000-135 FUNCHAL
Tel. 291 772 021 - E-mail: geral.madeira@alzheimerportugal.org
decorrer dos trabalhos. Núcleo do Ribatejo: R. Dom Gonçalo da Silveira n.º 31-A, 2080-114 Almeirim
Tel. 24 300 00 87 - E-mail: geral.ribatejo@alzheimerportugal.org
Núcleo de Aveiro: Santa Casa da Misericórdia de Aveiro - Complexo Social da
Número de Apoio ao utente: 707 500 501 Quinta da Moita - Oliveirinha, 3810 Aveiro
Tel. 23 494 04 80 - E-mail: geral.aveiro@alzheimeportugal.org

CONHEÇA A NOSSA SELECÇÃO DE MODA,

ACESSÓRIOS E PRODUTOS LIFE&STYLE
EDIFÍCIO
EDIFÍCIO
DIOGO CÃO
DIOGO
DOCA CÃO
DE ALCÂNTARA
NORTE,
DOCA DELISBOA
ALCÂNTARA
(JUNTO AO
NORTE, LISBOA
MUSEU
(JUNTODO AOORIENTE)
HORÁRIO:
MUSEU DO ORIENTE)
2.ª – 6.ª FEIRA: 9H – 19H
HORÁRIO:
SÁBADO: 11H – 17H

MAIS INFORMAÇÕES: loja.publico.pt | 210 111 010

 Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 27

DESPORTO
FC Porto lançou uma labareda
num mar de contrariedades
Golo do estreante Evanilson decidiu o jogo no Estádio do Dragão, que acabou com os portistas sobre
brasas depois de um penálti falhado por Uribe e da expulsão de Zaidu, a fazer renascer o Gil Vicente
MANUEL FERNANDO ARAUJO/EPA

FC Porto 1 Crónica de jogo

Evanilson 41’
Gil Vicente 0
Estádio do Dragão, no Porto
FC Porto Marchesín, Manafá, Pepe
a74’, Mbemba, Zaidu a26’aa73’,
Corona (Marega, 90+2’), Uribe a30’,
Fábio Vieira (Sérgio Oliveira, 83’),
Nakajima a73’ (Sarr, 78’), Toni Martínez
(Romário Baró, 46’), Evanilson (Taremi,
78’). Treinador Sérgio Conceição
Gil Vicente Denis, Joel (Fujimoto, 85’),
Ygor Nogueira a58’, Rodrigo, Rúben
Fernandes, Talocha, Lourency (Baraye,
62’), João Afonso a85’, Claude
Gonçalves (Renan Oliveira, 69’),
Leautey (Lucas Mineiro, 69’), Samuel
Lino. Treinador Rui Almeida
Árbitro Hélder Malheiro (AF Lisboa)
Positivo/Negativo
Evanilson
Em modo felino,
mostrou-se apenas quando
se justificava a intervenção
na área. Tirou as medidas à
baliza com um remate à
barra antes de se estrear
a marcar com a camisola
azul e branca.
Augusto Bernardino
Foi sofrida e à justa a vitória do FC
Porto sobre um Gil Vicente (1-0) que
até acabou por cima, aproveitando a
expulsão de Zaidu e a “bondade” de
Uribe, ao falhar um penálti que teria
sentenciado o jogo a 30 minutos do
Æm. Os “dragões” quebraram o ciclo
de três jogos sem vencer, não deixa-
ram escapar o Sporting na 5.ª jornada
da Liga, mas percebeu que há muito
trabalho pela frente.
Sérgio Conceição sentiu a necessi-
dade de gerir o desgaste provocado
pela jornada europeia e precaver-se
— num terreno pesado — de situações
como as de Luis Díaz e Otávio, isto
quando tem já nesta terça-feira novo
compromisso da Liga dos Campeões,
com o Olympiacos.
Nesse sentido, aproveitou o plano
de Manchester (com três defesas) e
ainda o facto incontornável de defron-
tar mais um adversário de tracção
traseira, o que o Gil Vicente conÆr-
mou em absoluto com dois blocos de
aço, escorados numa linha de cinco
defesas protegida por uma segunda
trincheira de quatro unidades, Corona voltou a ser o criativo de serviço no FC Porto, desta vez coadjuvado por Nakajima
sobrando Sandro Lino na frente para
tentar a sorte numa brecha. meira meia hora de jogo. O prenúncio de golo era mesmo
Prevendo este cenário, o FC Porto Um exercício perigoso, já que na REACÇÕES para levar a sério e a resistência gilis-
repetiu o sistema de três centrais. tentativa de encontrar os espaços ta desvaneceu-se quando Corona

Denis
Adiou a sentença com uma
defesa a cabeceamento de
Toni Martínez e, sobretudo,
quando defendeu o penálti
de Uribe.
Uribe
Infeliz em duas boas
ocasiões de golo, falhou
um penálti que daria à
equipa a possibilidade de
gerir o jogo tranquilamente.
Zaidu
Fez de central, lateral e
extremo, tudo à velocidade
da luz, criando
desequilíbrios até ser
expulso, deixando a equipa
em brasa a 20’ do fim.
Zaidu juntou-se a Pepe e Mbemba,
projectando Corona na direita e
Manafá na esquerda, e reservando
três surpresas: o regresso de Nakaji-
ma à titularidade — o que não aconte-
cia desde Março — para explorar o
jogo interior e espicaçar os instintos
dos avançados Toni Martínez e Eva-
nilson, pela primeira vez chamados
à titularidade. De fora, em relação ao
jogo de Manchester, Æcavam o lesio-
nado Luis Díaz, Sérgio Oliveira, Sarr
e Marega.
O dispositivo portista, quando Con-
ceição refere as diÆculdades de adap-
tação das caras novas do “dragão”,
revelava falta de rotinas, essenciais
para o jogo de pressão portista, que
os gilistas esvaziavam a cada indeci-
são ou precipitação do adversário,
obrigando o FC Porto a consultar
constantemente uma cábula que só
começou a assimilar a partir da pri-
negados pelo adversário cometeu
inúmeros erros que o Gil Vicente não
teve calma nem classe para aprovei-
tar, limitando-se a provocar o descon-
forto de que falava o treinador Rui
Almeida, sem contudo ferir verdadei-
ramente uma equipa notoriamente
afectada pelas duas derrotas e pelo
empate de Alvalade nos últimos três
jogos.
Assim, depois de alguns avisos —
Samuel Lino perdeu ocasião soberana
aos 26’ e Marchesín defendeu a recar-
ga de Leautey —, os “dragões” encon-
traram a temperatura ideal para
começarem a soltar as labaredas que
lhes permitiam encurralar o Gil,
expondo as fragilidades de um rival
que ainda resisitu às investidas de
Toni Martínez (defesa de Denis) e Eva-
nilson (cabeceamento à barra), fruto,
essencialmente, da deslocação de
Corona para o Çanco esquerdo.
“Não entrámos bem, mas
rectifiquei e criámos várias
ocasiões. Num dia de maior
eficácia, o resultado teria
sido mais volumoso”
Sérgio Conceição
FC Porto
“Quisemos jogar, tentar
impor o nosso jogo. Nunca
mudámos a nossa ideia.
Obrigámos o FC Porto a
fazer coisas que não queria”
Rui Almeida
Gil Vicente
lançou Zaidu no corredor, surgindo
Nakajima na área a oferecer o golo a
Evanilson, que só precisou de encos-
tar a quatro minutos do intervalo.
Na segunda parte, Conceição reto-
cou o esquema, apostando em Romá-
rio Baró no lugar de Martínez e repo-
sicionando a equipa num 4x2x3x1 de
menor exposição ao risco. O Gil
Vicente esperou um pouco, acabando
por ser salvo por Denis, que defendeu
um penálti de Uribe (59’), a punir mão
de Ygor que não escapou ao VAR. E
quando o jogo parecia bem encami-
nhado para o FC Porto, com o Gil
Vicente a escapar entre os pingos de
chuva, Zaidu foi expulso, provocando
uma inversão de papéis, com a equi-
pa de Barcelos mais afoita em busca
do empate e o anÆtrião à espera que
o tempo voasse.
augusto.bernardino@publico.pt
28 • Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020

DESPORTO

Coates complicou, CLASSIFICAÇÕES

Pedro Gonçalves desempatou
I LIGA
Jornada 5
Tondela-Portimonense 1-0

e o Sporting ganhou
Nacional-Paços de Ferreira 1-1
Santa Clara-Sporting 1-2
FC Porto-Gil Vicente 1-0
Farense-Rio Ave 15h, SPTV
Moreirense-Marítimo 15h, SPTV
Famalicão-Boavista 17h30, SPTV
V. Guimarães-Sp. Braga 20h, SPTV
Benfica-Belenenses SAD amanhã, 20h15, BTV
e os “leões” criaram perigo logo des- fazer e o Santa Clara mais tranquilo
Santa Clara
Thiago Santana 42’
1 Crónica de jogo de o início. Essa boa entrada deu no jogo. Amorim reforçou o ataque J V E D M-S P

Marco Vaza frutos aos 20’. Tudo começou numa

recuperação de João Palhinha (uma
com Tomás e Sporar, a equipa melho-
rou e criou oportunidades, algumas
1. Benfica
2. FC Porto
4 4 0 0
5 3 1 1
13-3
13-6
12
10
3. Sporting 4 3 1 0 8-3 10
Dois golos do ex-jogador do clara mais-valia no meio-campo), delas falhadas de forma incrível pelo
Sporting 2 4. Santa Clara 5 2 1 2 5-4 7
com a bola a passar por Nuno Santos avançado esloveno, que continua em 5. V. Guimarães 4 2 1 1 2-1 7
Pedro Gonçalves 20’ e 81’ Famalicão deram o triunfo 6. Sp. Braga 4 2 0 2 7-5 6
e Nuno Mendes antes de chegar a branco esta época — aos 73’, cabe-
aos “leões” por 1-2, nos Jovane, que arrancou um passe cali- ceou ao lado após cruzamento de
7. Nacional 5 1 3 1 6-6 6
8. Marítimo 4 2 0 2 6-7 6
Estádio de São Miguel, nos Açores Açores, ante o Santa Clara brado na perfeição para apanhar a Porro; aos 77’, nem conseguiu rema- 9. Famalicão 4 1 2 1 7-10 5
corrida de Pedro Gonçalves. O ex-Fa- tar após criação de João Mário. 10. Gil Vicente 4 1 2 1 2-2 5
Santa Clara Marco, Cristián González 11. Moreirense 4 1 2 1 3-3 5
a18’ (Shahriar, 87’) , João Afonso,
Há uma clara diferença geracional no malicão aguentou bem a pressão de Para compensar o falhanço de Coa-
12. Belenenses SAD 4 1 2 1 2-2 5
Fábio Cardoso, Sagna a45’ (Rafael Sporting. A defesa é para os expe- Fábio Cardoso, ganhou a linha e, de tes e a falta de pontaria de Sporar,
13. Tondela 5 1 2 2 4-8 5
Ramos, 74’), Anderson a63’ (Nené, rientes (guarda-redes e centrais estão pé esquerdo, conseguiu meter a bola voltou a surgir em cena Pedro Gon- 14. Paços de Ferreira 5 1 2 2 4-6 5
70’), Costinha (Rashid, 70’), Mansur, acima dos 30), o ataque é para os na baliza entre o poste e o guardião, çalves. Aos 81’, captou bem um passe 15. Portimonense 5 1 1 3 3-6 4
Lincoln, Carlos Jr (Patrick, 87’), Thiago 16. Rio Ave 4 0 3 1 2-5 3
Santana. Treinador Daniel Ramos
jovens (médios e avançados são sub- Marco. longo de Feddal e aproveitou uma
17. Boavista 4 0 2 2 4-10 2
25), mas já se sabe que os erros e os O Sporting estava num bom dia, o saída desastrada de Marco (que cho-
18. Farense 4 0 1 3 5-9 1
Sporting Adán, Neto (Tiago Tomás, golos não têm idade. Ontem, nos Santa Clara nem tanto, mas um dis- cou com um dos seus centrais) para
Próxima jornada Paços de Ferreira-FC Porto,
56’), Coates a90’, Feddal, Porro, Açores, um dos mais experientes parate de Sebastian Coates fez esque- ganhar espaço na área. O ângulo não Belenenses SAD-Farense, Rio Ave-Moreirense,
Palhinha, Matheus Nunes (João Mário, Marítimo-Nacional, Portimonense-Santa Clara,
(Coates) errou e um dos mais novos cer isso tudo. O central uruguaio fez era o melhor e a bola não estava no
66’), Nuno Mendes, Pedro Gonçalves, Gil Vicente-V. Guimarães, Sporting-Tondela,
Nuno Santos (Gonçalo Inácio, 88’), (Pedro Gonçalves) brilhou. Num jogo um autêntico passe para Lincoln, que seu melhor pé, mas Pedro Gonçalves, Sp. Braga-Famalicão, Boavista-Benfica
Jovane Cabral (Sporar, 56’). em que foi melhor durante mais tem- rapidamente direccionou a bola para que também responde pela alcunha
Treinador Rúben Amorim po, o Sporting venceu com justiça, Thiago Santana. Adán saiu da baliza, de “Pote”, salvou o Sporting de per- II LIGA
nos Açores, o Santa Clara, por 1-2, e o goleador brasileiro passou por ele der pontos frente a um Santa Clara Jornada 7
Árbitro Manuel Mota (AF Braga) Penafiel-Arouca 2-2
mantém-se invicto na I Liga, mas esta com toda a calma e atirou a contar que já leva três jogos sem ganhar.
Vizela-Académica 1-3
não deixou de ser uma vitória com para o empate, aos 42’, entrando, Com um jogo a menos (que será Vilafranquense-Casa Pia 2-2
Positivo/Negativo sofrimento e que esteve perto de não pelo caminho, para a história do San- cumprido a uma hora tardia na pró- FC Porto B-Desp. Chaves 1-2
Cova da Piedade-Leixões 2-0
acontecer. ta Clara — para além de voltar a ser o xima quarta-feira), os “leões” con- Benfica B-Ac. Viseu 0-1
Pedro Gonçalves Como tem sucedido quase sempre líder dos goleadores da Liga (cinco quistaram dez pontos em 12 possí- Varzim-Estoril 11h15, SPTV
Dois golos, ambos de nos jogos do campeonato, o Sporting golos), tornou-se no melhor marca- veis, mantêm-se invencíveis e com Oliveirense-Sp.Covilhã 15h
Feirense-Mafra amanhã, 18h30, SPTV+
execução difícil, para o entrou com dinâmica e com vontade dor de sempre da equipa açoriana na amostras de bom futebol, que vão
J V E D M-S P
médio que foi a de resolver cedo. Rúben Amorim I divisão (13 golos). compensando os erros.
contratação mais cara do apostou no mesmo “onze” que empa- Este empate contracorrente dei- 1. Mafra 6 5 0 1 12-4 15
Sporting (6,5 milhões). Está tara há uma semana com o FC Porto xou o Sporting sem saber bem o que mvaza@publico.pt 2. Desp. Chaves 7 4 2 1 12-7 14
3. Académica 7 4 2 1 7-3 14
a consolidar o seu estatuto EDUARDO COSTA/EPA 4. Estoril 6 4 1 1 8-4 13
na equipa como assistente 5. Feirense 6 3 2 1 10-8 11
e como goleador, e não 6. Arouca 7 2 4 1 6-4 10
será, de certeza, ele a sair 7. Penafiel 7 3 1 3 11-10 10
8. Cova da Piedade 7 3 1 3 7-8 10
quando João Mário se fixar 9. Casa Pia 7 2 3 2 9-14 9
no “onze”. 10. Vizela 7 2 2 3 8-13 8
11. Oliveirense 6 2 2 2 7-6 8
Thiago Santana 12. FC Porto B 7 2 1 4 11-11 7
13. Benfica B 7 2 0 5 13-11 6
Não teve muitas
14. Vilafranquense 7 1 3 3 9-14 6
oportunidades de brilhar, 15. Leixões 7 1 3 3 6-9 6
mas aproveitou muito bem 16. Ac. Viseu 7 1 3 3 3-7 6
o disparate de Coates para 17. Sp. Covilhã 6 1 2 3 6-9 5
18. Varzim 6 1 2 3 3-6 5
marcar e manter a
liderança dos goleadores. MELHORES MARCADORES

Coates
O central uruguaio é o
capitão e um dos mais
experientes da equipa, mas
foi por causa dele que os
“leões” passaram um mau
bocado nos Açores.
I Liga
Marco 5 golos Thiago Santana (Santa Clara),
Rodrigo Pinho (Marítimo)
Podia ter feito mais no II Liga
primeiro golo do Sporting, 7 golos Gonçalo Ramos (Benfica B)
a cobrir o primeiro poste, e,
no segundo, calculou mal o
seu tempo de saída e
deixou a baliza aberta.
Pedro Porro arrancou alguns dos cruzamentos que geraram as melhores ocasiões para o Sporting

Real Madrid saiu
por cima no “clássico”
das crises
Futebol internacional
Marco Vaza e Nuno Sousa
Nos Países Baixos,
o Ajax alcançou a maior
goleada da história da
Eredivisie, ao impor-se em
casa do Venlo por 0-13
O Real Madrid em crise de resultados,
o Barcelona em crise de identidade,
assim se olhava para mais um capítu-
lo do “clássico dos clássicos” que já
seria diferente de todos os outros.
Quem saiu melhor deste “clássico da
crise” foi o Real, que triunfou em
Camp Nou (1-3) e interrompeu uma
série de duas derrotas (com o Cadiz,
na Liga espanhola, e com o Shakthar
Donetsk), deixando o Barcelona ain-
da mais mergulhado nos seus múlti-
plos problemas.
O “clássico” começou da forma
mais espectacular possível. Aos 5’,
Valverde já estava a dar a vantagem
ao Real, concretizando da melhor
forma um passe de Benzema, e o Bar-
ça respondia aos 8’, com Ansu Fati a
conseguir o empate após cruzamento
de Jordi Alba.
Só na segunda parte é que o mar-
cador voltou a funcionar. Numa altu-
ra em que a equipa de Ronald Koe-
man dominava, Sergio Ramos caiu na
área catalã, com a camisola puxada
por Langlet. O árbitro deixou passar,
o VAR aconselhou-o a ir ao monitor
e, após rever o lance, apontou para a
marca dos 11 metros. Foi o próprio
Ramos que se encarregou de conver-
ter o castigo em golo, devolvendo ao
Real a vantagem.
Já com Francisco Trincão em cam-
po pelo Barcelona (entrou aos 82’), o
Real aumentou a vantagem em cima
dos 90’. Luka Modric, com toda a
classe e calma de um craque vetera-
no, segurou a bola nos pés e Æntou o
guarda-redes Neto até encontrar o
espaço para fazer o 1-3.
Este triunfo elevou o Real Madrid
até ao topo do campeonato, agora
com 13 pontos em seis jogos, enquan-
to o Barcelona ocupa um incaracte-
rístico 10.º lugar, com sete pontos, os
mesmos que o Sevilha, que foi sur-
preendido em casa pelo Eibar (0-1).
Já o Atlético Madrid teve de esperar
pela segunda parte para bater o Betis
(2-0), com golos de Llorente e Luis
Suárez, e subir à segunda posição da
tabela, com menos um jogo.
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 29
DESPORTO
Breves
ALBERT GEA/REUTERS
Ciclismo
Fuga e Tim Wellens
dominam atenções
na 5.ª etapa da Vuelta
Uma fuga com “intrusos” bem
colocados na geral e a vitória
do belga Tim Wellens (Lotto
Soudal) marcaram a 5.ª etapa
da Volta a Espanha, antes de
uma queda lançar o “caos” na
chegada à meta. Wellens
cumpriu os 184,4km entre
Huesca e Sabiñanigo em
4h19m24s, fazendo vingar a
fuga e chegando quatro
segundos à frente do francês
Guillaume Martin (Cofidis),
segundo. O líder da geral,
Primoz Roglic (Jumbo-Visma),
foi quarto classificado, numa
chegada marcada por uma
queda que afectou o irlandês
Dan Martin (Israel Start-Up),
segundo, a cinco segundos do
esloveno e com oito de
Valverde e Vinícius festejam o primeiro golo do Real Madrid em Camp Nou vantagem sobre o terceiro,
Richard Carapaz (INEOS).
Na Alemanha, há uma Ægura que À noite, em AnÆeld Road, o Liver-
CLASSIFICAÇÃO continua em destaque. Dez golos em pool também entrou para a primeira
Judo
cinco jogos na Bundesliga 2020-21, é e para a segunda partes empatado
ESPANHA este o cartão-de-visita de Robert
Lewandowski, que apontou um hat-
(0-0, naturalmente, e 1-1), mas Diogo
Jota, de cabeça e após cruzamento de
Bárbara Timo
Jornada 7
Elche-Valência 2-1 trick diante do Eintracht Frankfurt, Mané, resolveu um problema chama- arrecada bronze
Barcelona-Real Madrid
Osasuna-Athletic Bilbau
1-3
1-0
lançando o Bayern Munique para
uma goleada (5-0) na 5.ª jornada.
do Sheêeld United (2-1) e catapultou
os “reds” para o segundo lugar, à con-
em Budapeste
Sevilha-Eibar 0-1
Atlético Madrid-Betis 2-0 Antes da meia-hora de jogo, o avan- dição, com os mesmos 13 pontos do A judoca portuguesa Bárbara
Valladolid-Alavés 13h, Eleven çado polaco já tinha bisado, inaugu- vizinho Everton. Timo, vice-campeã mundial,
Cadiz-Villarreal 15h, Eleven
Getafe-Granada 17h30, Eleven rando o marcador aos 10’ e marcan- O jogo mais surpreendente do mapa conquistou ontem a medalha
Real Sociedad-Huesca 20h, Eleven do, depois, de cabeça na sequência do futebol continental, esse, aconte- de bronze na categoria -70kg
Levante-Celta Vigo amanhã, 20h, Eleven de um pontapé de canto. O terceiro ceu nos Países Baixos. É um daqueles do Grand Slam de Budapeste,
J V E D M-S P
golo chegou aos 61’, graças a uma resultados que já não se usam no fute- repetindo o feito conseguido
assistência de Douglas Costa, sendo bol de alta competição: 0-13 foi o des- na sexta-feira por Rodrigo
1. Real Madrid 6 4 1 1 9-4 13
2. Atlético Madrid 5 3 2 0 10-1 11 que a goleada do Bayern sobre o Ein- fecho do jogo da 6.ª jornada da Liga Lopes, em -60 kg. Com 20
3. Real Sociedad 6 3 2 1 10-2 11 tracht (que teve André Silva e Bas Dost holandesa entre o Venlo e o Ajax. atletas em prova, Bárbara
4. Villarreal 6 3 2 1 8-8 11 de início) Æcou completa com golos Uma goleada que não foi só humilhan- Timo, quarta cabeça de série,
5. Osasuna 6 3 1 2 6-4 10 de Sané (72’) e Musiala (90’). te para os anÆtriões, foi a maior de começou a sua prestação nos
6. Getafe 5 3 1 1 5-3 10
Este triunfo coloca o campeão ale- sempre na história da Eredivisie. quartos-de-final, vencendo a
7. Elche 5 3 1 1 5-4 10
8. Cadiz 6 3 1 2 6-6 10
mão no segundo lugar, com 12 pon- O VVV Venlo, que entrou para esta brasileira Maria Portela, por
9. Granada 5 3 1 1 7-8 10 tos, um atrás do RB Leipzig, que der- partida a meio da tabela, viu o pesa- acumulação de shidos. Na
10. Betis 7 3 0 4 7-11 9 rotou o Hertha Berlim, por 2-1. delo começar aos 12’, com um golo meia-final, Timo foi afastada
11. Eibar 7 2 2 3 5-6 8 de Jurgen Ekkelenkamp. O médio do combate para atribuição
12. Barcelona 5 2 1 2 9-5 7 Diogo Jota decisivo voltaria a marcar aos 57’, elevando dos dois primeiros lugares
13. Sevilha 5 2 1 2 5-4 7
Em Inglaterra, o dia começou com o resultado para... 0-7. É que, entre- pela croata Barbara Matic, ao
14. Valência 7 2 1 4 9-11 7
15. Athletic Bilbau 6 2 0 4 4-6 6
dois empates, na 6.ª jornada. Primei- tanto, Lassina Traoré Æzera um hat- cometer o terceiro shido já em
16. Huesca 6 0 5 1 4-6 5 ro foi o Manchester City a registar um trick e ainda chegaria ao póquer, período de “ponto de ouro”, e
17. Celta Vigo 6 1 2 3 3-9 5 1-1 em casa do West Ham, passando a enquanto Dusan Tadic, Antony, no combate pelo bronze
18. Alavés 6 1 1 4 3-8 4 ocupar um paupérrimo 12.º lugar na Daley Blind, Huntelaar (dois golos) e impôs-se por ippon à
19. Valladolid 6 0 3 3 5-9 3
Premier League; depois o nulo de Old Lisandro Martínez também contri- porto-riquenha Maria Pérez,
20. Levante 5 1 0 4 5-10 3
Traèord entre Manchester United e buíram para a “enxurrada”, que dei- vice-campeã mundial em 2017.
Chelsea, que deixa os “red devils” no xa o Ajax provisoriamente na lide- A competição termina hoje.
último terço da classiÆcação. rança da prova.
Quem não perde
as grandes notícias,
não vai perder
esta grande série.

Assinar o Público dá-lhe 2 meses grátis

de HBO PORTUGAL, com direito à estreia da série PÁTRIA. 2 meses
HBO Portugal
Todos os novos assinantes do Público, até ao final de Outubro, recebem acesso grátis durante
2 meses à HBO Portugal, onde estão os melhores filmes e séries, e a estreia da série PÁTRIA. Grátis*
Uma série baseada no bestseller de Fernando Aramburu, que retrata a história de duas famílias
divididas pela luta política em Espanha. Não perca esta oportunidade de ter acesso à melhor
informação e ao melhor entretenimento.

*Apenas válido para novos utilizadores residentes em Portugal. Para usufruir desta oferta, o utilizador terá que criar uma conta HBO Portugal, em hboportugal.com, introduzir o código e completar todos
os passos do registo até dia 31 de Outubro de 2020. Se não cancelar antes de terminar o período de 2 meses, o valor da subscrição será de 4,99€/mês. Requer 1 ano de assinatura Público.

João Almeida
aproxima-se
do quarto
lugar no Giro
Ciclismo
No dia em que Jai Hindley
assumiu a liderança, o
português ficou mais perto
do pódio, até porque hoje
há contra-relógio individual
O britânico Tao Geoghegan Hart
(INEOS) venceu ontem a 20.ª etapa
da Volta a Itália em bicicleta, que
passa a ser liderada, com o mesmo
tempo, pelo australiano Jai Hindley
(Sunweb). João Almeida (Deceu-
ninck-QuickStep) voltou a exibir-se
a alto nível e aproximou-se do quar-
to lugar da geral, antes de um derra-
deiro contra-relógio em que tem
especiais pergaminhos.
Hart, que já tinha vencido nesta
edição do Giro, completou os 190
quilómetros entre Alba e Sestriere
em 4h52m45s, à frente do rival na
luta pela vitória Ænal, com o austra-
liano Rohan Dennis (INEOS) em ter-
ceiro, a 25 segundos.
Almeida cortou a meta em quarto,
a 1m01s, e conseguiu ganhar tempo,
não só ao antigo camisola rosa, o
h o l a n d ê s Wi l c o Ke l d e r m a n
(Sunweb), mas também ao espanhol
Pello Bilbao (Bahrain-McLaren).
Rúben Guerreiro (EF), que mantém
a camisola azul, foi 13.º, a 2m09s.
Hindley veste agora a camisola
rosa, com o mesmo tempo de Hart,
seguindo-se Kelderman no terceiro
posto, a 1m32s, Bilbao em quarto e
Almeida a fechar o “top 5”, a 1m18s
do holandês e a 23s do espanhol.
Hoje, a 21.ª e última etapa prevê
um contra-relógio de 15,7 quilóme-
tros que começa em Cernusco sul
Naviglio e termina em Milão, para
consagrar o vencedor da 103.ª edição
do Giro.
CLASSIFICAÇÕES
20.ª ETAPA
1.º Tao Geoghegan Hart (Ineos) 4h52m45s
2.º Jai Hindley (Sunweb) m.t.
3.º Rohan Dennis (Ineos) a 25s
4.º João Almeida (Quick-Step) a 1m01s
13.º Rúben Guerreiro (EF) a 2m09s
GERAL
1.º Jai Hindley (Sunweb) 85h22m07s
2.º Tao Geoghegan Hart (Ineos) m.t.
3.º Wilco Kelderman (Sunweb) 1m32s
4.º Pello Bilbao (Bahrain-McLaren) 2m51s
5.º João Almeida (Quick-Step) 3m14s
Lewis Hamilton foi forçado a “trabalho extra” para conseguir a volta mais rápida no Algarve
Hamilton garante pole position
no Grande Prémio de Portugal
Fórmula 1
Augusto Bernardino
Inglês bate o companheiro
Valtteri Bottas, no último
fôlego de uma qualificação
que coloca o Ferrari de
Leclerc na segunda linha
Lewis Hamilton conquistou, em
Portimão, a pole position do Grande
Prémio de Portugal (13h, Eleven),
conseguindo o registo de 1m16,652s
no último ensaio. Esta é a nona pole
do piloto britânico em 2020, a 97.ª
da carreira e 70.ª na Mercedes, con-
quistada na hora da verdade, para
superar o companheiro de equipa
Valtteri Bottas (1m16,754s, a 0,102s)
e grande dominador dos treinos
livres. Para a Mercedes, é o pleno de
12 poles em 12 Grandes Prémios.
O piloto britânico ganhou, desta
forma, importante vantagem,
partindo do lado limpo da pista
do Autódromo Internacional do
Algarve, 26.º circuito no qual garan-
tiu o primeiro lugar da grelha, e
onde é possível que Hamilton possa
superar as 91 vitórias de Michael
Schumacher no Campeonato do
Mundo.
No regresso da Fórmula 1 a Portu-
gal, 24 anos depois da última passa-
gem do “Grande Circo” por territó-
rio nacional, os pilotos enfrentaram
inúmeros desaÆos na “montanha
GRELHA DE PARTIDA
GP de Portugal
1ª linha
Lewis Hamilton 1m16.652s
Valtteri Bottas (Mercedes)
2ª linha
Max Verstappen (Red Bull)
Charles Leclerc (Ferrari)
3ª linha
Sergio Perez (Racing Point)
Alexander Albon (Red Bull)
4ª linha
Carlos Sainz Jr. (McLaren)
Lando Norris (McLaren)
5ª linha
Pierre Gasly (AlphaTauri)
Daniel Ricciardo (Renault)
6ª linha
Esteban Ocon (Renault)
Lance Stroll (Racing Point)
7ª linha
Daniil Kvyat (AlphaTauri)
George Russell (Williams)
8ª linha
Sebastian Vettel (Ferrari)
Kimi Raikkonen (Alfa Romeo)
9ª linha
A. Giovinazzi (Alfa Romeo)
Romain Grosjean (Haas)
10ª linha
Kevin Magnussen (Haas)
Nicholas Latifi (Williams)
russa” algarvia, que testou a capa-
cidade de adaptação a um circuito
desconhecido para praticamente
todos, um pouco à imagem do que
havia sucedido em Mugello, Itália.
O início da qualiÆcação sofreu um
Público • Domingo, 25 de Outubro de 2020 • 31
JOSÉ SENA GOULÃO/REUTERS
atraso de 30 minutos, provocado
pelo levantamento de uma “tampa”
de escoamento, que interrompeu a
terceira sessão de treinos por ques-
tões óbvias de segurança.
No regresso à pista, com o vento
a diÆcultar a tarefa dos pilotos, os
Mercedes, os únicos a optarem por
0.102s
pneus médios, Æzeram uma peque-
0.252s na demonstração de força, batendo
0.438s os macios da concorrência, insuÆ#
cientes para destronar os “Çechas
0.571s prateadas”, que voltaram a fechar a
0.785s
primeira linha da grelha de partida,
logo seguidos pelo insuspeito Max
0.868s
0.873s Verstappen (Red Bull), a 0,252s de
Hamilton, e pelo surpreendente
1.151s
Charles Leclerc (Ferrari), a 0,438s.
0.829s
A diferença entre Bottas e Hamil-
0.962s ton residiu na estratégia do inglês,
0.974s que no Ænal voltou a sublinhar o
desempenho do Ænlandês.
1.076s “Nem consigo expressar o quão
1.136s
difícil foi este dia. Vi o Valtteri lide-
1.267s rar cada sessão e tive de ir mais fun-
1.549s do para encontrar o tempo, o que
me levou a optar por fazer três vol-
1.671s
tas para ter hipóteses de o bater”,
1.712s
explicou um aliviado Hamilton, em
1.856s contraste com o desalento do Ænlan-
2.125s dês. Bottas reconheceu, de resto,
ter hesitado no número de voltas
cronometradas: “Devia ter feito
mais uma. Teria sido ‘simpático’
largar do lado limpo da pista. Vere-
mos o que é possível fazer com esta
segunda posição”, lamentou-se.
augusto.bernardino@publico.pt
DESPORTO
Pole para
Nakagami,
oitavo lugar
para Oliveira
MotoGP
Nuno Sousa
Japonês fez história na
qualificação para o
Grande Prémio de Teruel.
Português manteve-se
sólido nas duas sessões
Takaaki Nakagami (Honda) tornou-
-se ontem o primeiro piloto japonês,
em 16 anos, a arrecadar a pole posi-
tion em MotoGP, depois de ter sido
o mais rápido a rodar na qualiÆcação
para o Grande Prémio de Teruel, em
Espanha (hoje, 12h).
Dois dias depois de ter assinado
um novo contrato com a Honda,
Nakagami (que fez a melhor volta em
1m46,882s) sucede ao compatriota
Makoto Tamada, que tinha sido o
último nipónico a chegar à pole, em
Outubro de 2004, curiosamente
também em Espanha, mas na quali-
Æcação para o GP da Comunidade
Valenciana.
Franco Morbidelli (Yamaha) parte
da segunda posição para a 11.ª corri-
da da temporada, enquanto Alex
Rins (Suzuki) completa a primeira
linha da grelha, a 0,273s de Nakaga-
mi — pelo contrário, o companheiro
de equipa do espanhol, Joan Mir, sai-
rá da 12.ª posição.
Miguel Oliveira
tentará retomar
os bons
resultados no
Mundial, depois
do 16.º lugar
em Aragão
Miguel Oliveira (Tech3 KTM) con-
seguiu o oitavo melhor tempo, ao
rodar a 0,627s de Nakagami, enquan-
to o colega de equipa do português,
o espanhol Iker Lekuona, não foi
além da 11.ª posição.
O piloto de Almada garantiu logo
a presença na segunda fase da qua-
liÆcação, ao realizar o oitavo melhor
tempo ainda na terceira sessão de
treinos livres, de manhã, repetindo
o resultado à tarde. Com este oitavo
posto, Miguel Oliveira iguala o segun-
do melhor resultado da temporada,
em qualiÆcações, saindo da mesma
posição de que partiu para o GP da
Estíria, que acabou por vencer.
nsousa@publico.pt
Domingo, 25 de Outubro de 2020

BARTOON LUÍS AFONSO

Presidente prepara homenagem

minimal a vítimas da pandemia em Belém
Covid-19
Margarida Gomes
Cerimónia será restrita e
terá um formato idêntico
ao das comemorações do
1O de Junho no Mosteiro
dos Jerónimos
O Presidente da República, Marcelo
Rebelo de Sousa, está a organizar
uma cerimónia simbólica para home-
nagear as vítimas da pandemia de
covid-19, num formato minimalista,
muito idêntico ao das comemorações
do 10 de Junho, no Mosteiro dos Jeró-
nimos. A cerimónia decorrerá no
Palácio de Belém e está marcada para
2 de Novembro, uma segunda-feira,
que foi declarado há dias pelo Conse-
lho de Ministros Dia de Luto nacional
pelas vítimas da covid-19.
Embora o formato ainda não esteja
fechado, o que está previsto é uma
sessão singela, com o hastear da ban-
deira a meia-haste, e um minuto de
silêncio pelas vidas perdidas.
A decisão de declarar 2 de Novem-
bro Dia de Luto nacional foi anunciada
pela ministra de Estado e da Presidên-
cia do Conselho de Ministros, Mariana
Vieira da Silva, na quinta-feira, quan-
do explicou que o Governo reconhece
que “há necessidade de assinalar o
Marcelo Rebelo de Sousa ainda não decidiu quem será convidado para a sessão
luto” e que esse dia servirá para “pres-
tar homenagem a todos os falecidos,
e em particular às vitimas da pande-
mia de covid-19”.
O Presidente da República também
promoveu uma homenagem, no pas-
sado dia 10 , aos proÆssionais de saú-
de que lidaram com a doença. Antes
ainda das comemorações do 10 de
Junho, uma nota da Presidência da
República informava que o chefe de
Estado pretendia homenagear os pro-
Æssionais de saúde após o surto pan-
démico de covid-19, em data ainda a
anunciar. A sugestão de se fazer essa
homenagem nacional a proÆssionais
de saúde, por ocasião das cerimónias
do 10 de Junho, foi feita pelo bastoná-
RUI GAUDÊNCIO
rio da Ordem dos Médicos, a quem o
chefe de Estado, segundo a nota de
Belém, respondeu então que “já ten-
cionava fazer” essa distinção “naque-
la data nacional”, tal como tinha feito
na cerimónia do 25 de Abril.
“[O Presidente da República] ten-
ciona personalizar essa homenagem
em momento posterior, já que é ain-
da manifestamente desaconselhável
a concentração de um número ele-
vado de pessoas na actual fase do
surto pandémico, ultrapassando, no
entendimento do Presidente da
República, o carácter simbólico da
cerimónia”, adiantava a nota, que,
contudo, não revelava os moldes da
homenagem pretendida pelo chefe
de Estado.
A cerimónia idealizada por Marcelo
realizou-se quatro meses depois, na
tarde do passado dia 10. O Presidente
da República condecorou os proÆs-
sionais de saúde. Na impossibilidade
de condecorar todos, Marcelo Rebelo
de Sousa decidiu homenagear simbo-
licamente os quatro proÆssionais de
saúde que lidaram com o primeiro
caso de covid-19, em Portugal. Foi
uma forma de homenagear médicos,
enfermeiros e auxiliares portugueses,
em particular do Serviço Nacional de
Saúde, que, segundo o chefe de Esta-
do têm sido um exemplo de dedica-
ção neste tempo de pandemia.
Um dia depois da homenagem, a
Ordem dos Médicos acusou o Gover-
no de não investir nos proÆssionais de
saúde. E o bastonário, Miguel Guima-
rães, reiterou que o Presidente havia
distinguido apenas aqueles proÆssio-
nais que condecorou, e não toda a
classe como dissera pretender.
mgomes@publico.pt

Esta informação não dispensa a

consulta da lista oficial de prémios Totoloto 6 11 23 27 30 8 1.º Prémio
1.500.000€
Contribuinte n.º 502265094 | Depósito legal n.º 45458/91 | Registo ERC n.º 114410 | Conselho de Administração - Presidente: Ângelo Paupério Vogais: Cláudia Azevedo, Ana Cristina Soares e João Günther Amaral
9988B239-5524-4EAD-8F38-C11E4ABBFC05
E-mail publico@publico.pt Estatuto Editorial publico.pt/nos/estatuto-editorial Lisboa Edifício Diogo Cão, Doca de Alcântara Norte, 1350-352 Lisboa; Telef.:210111000 (PPCA); Fax: Dir. Empresa 210111015; Dir. Editorial
210111006; Redacção 210111008; Publicidade 210111013/210111014 Porto Rua Júlio Dinis, n.º270, Bloco A, 3.º, 4050-318 Porto; Telef: 226151000 (PPCA) / 226103214; Fax: Redacção 226151099 / 226102213; Publicidade,
Distribuição 226151011 Madeira Telef.: 963388260 e/ou 291639102 Proprietário PÚBLICO, Comunicação Social, SA. Sede: Lugar do Espido, Via Norte, Maia. Capital Social €4.050.000,00.
Detentor de 100% de capital: Sonaecom, SGPS, S.A. Impressão Unipress, Travessa de Anselmo Braancamp, 220, 4410-350 Arcozelo, Valadares; Telef.: 227537030; Empresa Gráfica Funchalense,
SA, Rua da Capela de Nossa senhora da Conceição, nº. 50- Morelena – 2715-029 Pêro Pinheiro Telf.: 219677450 Distribuição VASP – Distribuidora de Publicações, SA, Quinta do Grajal - Venda
Seca, 2739-511 Agualva Cacém, Telef.: 214 337 000 Fax : 214 337 009 e-mail: geral@vasp.pt Assinaturas 808200095 Tiragem média total de Setembro 25.267 exemplares Membro da APCT

PUBLICIDADE

O mundo precisa
PENSE BEM, PENSE PÚBLICO
Aponte para aqui a câmara ou aplicação
do seu telefone e carregue no link que aparece
OU CONTACTE-NOS
publico.pt/assinaturas/novonormal
de respostas
Confie em quem faz
assinaturas@publico.pt
808 200 095 (DIAS ÚTEIS DAS 9H ÀS 18H)
as perguntas certas