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Usos e aplicações de jornalismo guiado por dados: um estudo do jornal O Estado de São
Paulo

Gabriele Ramos Maciel1

Resumo: Este artigo visa elucidar a prática do jornalismo guiado por dados exercido pelo
Jornal O Estado de São Paulo. Após discussão teórica sobre conceito de Big-Data e
jornalismo de dados, é apresentado um estudo de caso realizado a partir do blog Estadão
Dados. Além de descrever as etapas que antecedem a busca pelos dados online, foi possível
verificar os principais temas alvos de uso de jornalismo guiado por dados. O trabalho também
aponta de que maneira o resultado final da busca por dados são apresentados nas reportagens
e apresenta quais são os conhecimentos e técnicas necessárias para ser um jornalista de dados.

Palavras-chave: Jornalismo guiado por dados; Big Data; O Estado de São Paulo; Estadão
Dados.

Introdução

Trabalhar com dados não é uma novidade na realidade do jornalista, cuja rotina
também inclui lidar com planilhas e gráficos, como é possível visualizar na reportagem do
jornal The Gaurdian de 1821. A matéria relacionava escolas da cidade de Manchester, na
Inglaterra, com o custo que cada aluno representava, o que acabou revelando que o número de
estudantes que recebia educação gratuita era maior do que aqueles que os dados oficiais
mostravam.

1
Pós-graduanda em Gestão de Conteúdo em Comunicação pela Universidade Metodista de São Paulo.
E-mail: gabirm@gmail.com.
2

Figura 1: Jornalismo de Dados no Jornalismo de dados no The Guardian em 1821

Fonte: Jornalismo de dados no The Guardian em 1821

A mudança que decorre agora é a disponibilidade de dados digitais que são


provenientes da chegada dos computadores e da Internet. Estamos vivendo a era da Big Data2
(LIMA, 2012), que possibilita o constante armazenamento digital dos dados, permitindo-nos
acessá-los e analisá-los, mesmo sem conhecimento avançado de computação.

Assim, a quantidade de dados que são produzidos e armazenados deu um salto, como é
possível visualizar na Figura 2, a qual prevê que em 2020 haverá 40 mil exabytes3 de dados
no mundo.

2
Big Data é a era em que a base tecnológica oferece possibilidades de novas configurações ao jornalismo.
3
Unidade de medida de informação em que 1 EB equivale 1.000.000.000.000.000.000 Bytes (segundo SI).
3

Figura 2: Quantidade de dados digitais até 2020

Fonte: IDC Digital University Study, 2012

Outro impulso ao jornalismo de dados veio dos governos, que passaram a adotar uma
postura mais aberta, liberando dados de interesse público. No Brasil, a L ei de Acesso4 à
Informação entrou em vigor em maio de 2012, facilitando o acesso dos cidadãos a dados
públicos disponíveis no espaço virtual. A diversificação de ferramentas digitais gratuitas
também contribui para consolidar a prática da descoberta dos dados, já que permitiu que o
entrave das barreiras técnicas fosse superado, como salienta Crucianelli:

As ferramentas digitais abriram um novo caminho para jornalistas do mundo


inteiro, com um profundo impacto na forma de contar as notícias. Para nós
que exercemos o jornalismo, os softwares que usamos todos os dias e a
grande quantidade de recursos online à nossa disposição constituem dois
suportes básicos do método de trabalho. É preciso conhecê-los e dominá-los,
já que desse aproveitamento pode depender em grande medida a qualidade
do nosso trabalho (CRUCIANELLI, S., 2010, p.10).

Mas a necessidade de revelar os dados surgiu muito antes. Conforme revela Trasel
(2014), a importância de disponibilizar esse tipo de informação vem desde a década de 1960,
com a ideia do jornalismo de precisão, passando por Reportagem Assistida por Computador
(RAC), na década de 1990, e evoluindo para o que conhecemos hoje como Jornalismo Guiado

4
Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011.
4

por Dados. Ao assumir outra nomenclatura, de Jornalismo de Precisão para Reportagem


Assistida por Computador (RAC), o que ganha destaque é o uso do computador como suporte
ao trabalho jornalístico:

[...] o Jornalismo de Precisão, embora continue sendo praticado, não


perdurou como conceito de referência, sendo substituído pelo termo
Reportagem Assistida por Computador (RAC). Não apenas a expressão
usada para designar essas técnicas se modificou, mas conceitualmente a
RAC retirou o foco do projeto de atribuir um caráter científico ao
jornalismo, passando a concentrar-se principalmente no desenvolvimento e
disseminação de aplicações da informática ao trabalho de reportagem
(TRÄSEL, M., 2014, p. 109).

A redação de O Estado de São Paulo foi pioneira no Brasil. Em 2012, adotou o


jornalismo guiado por dados como uma prática. A equipe do jornal ainda é enxuta, porém,
com metas bem definidas e resultados positivos.

Diante do cenário, este trabalho busca mostrar de que forma este tipo de jornalismo é
apropriado para o jornal. A intenção é esclarecer quais são os temas alvos de usos de dados
pela equipe, de que maneira eles conseguem dados reveladores sobre esses temas, que tipo de
ferramentas digitais são utilizadas. Para tanto, o trabalho busca estruturar e analisar os dados e
como são apresentados os resultados destas buscas.

O jornalismo a partir de dados


Em decorrência do surgimento e popularização da Internet e das novas tecnologias da
informação, o jornalismo vem sofrendo mudanças estruturais. Houve a mudança do polo
produtor, onde somente as empresas de mídia eram responsáveis pela produção e circulação
de notícias, para um modelo mais democrático e descentralizado. Hoje, qualquer pessoa
consegue produzir conteúdos e isso leva a um profundo movimento no jornalismo, que passa
por adaptações. Segundo Castells (1999), a sociedade pode agora se manifestar sem pedir
licença aos meios de comunicação de massa.
Assim, esse novo modelo de jornalismo é caracterizado por (TOGNOLLI apud
ROSENTAL, 2011, p. 64) ecossistema digital, onde há fartura de informações em muitos
meios, diminuição de custos de produção, maior concorrência, nichos de consumo,
diminuição das barreiras técnicas para produção e divulgação de conteúdo.
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Passado a fase de adaptação inicial, o jornalismo produzido para a web vive sua
terceira fase, onde já há produção específica para o meio, com linguagem e ferramentas
adaptadas a essa nova realidade (MIELNICZUK, 2003).

Neste contexto, os jornais passaram a adotar programas de computação que pudessem


trazer a tona os milhares de dados disponíveis na Internet e, a partir da análise desses dados,
produzir matérias. O uso de dados como matéria-prima de uma matéria jornalística
compreende ao que os teóricos conceituam como jornalismo guiado por dados e cujo cerne
está o uso de dados como principal fonte de informação para a produção de notícias.
Segundo Barboza (2007), o termo base de dados foi cunhado na década de 1960 por
norte-americanos que procuravam maneiras de resolver problemas com arquivo. Com o
surgimento do computador e sua enorme capacidade de guardar dados, o termo ganhou força
e passou a ser utilizado como medida para informações armazenadas.
Segundo Ray afirma no Manual de Jornalismo os dados podem vir a ser fonte ou
ferramentas no jornalismo de dados, ou mesmo ambos. Machado (2005) lembra que hoje o
que se configura como base de dados se ampliou enormemente desde quando o termo foi
cunhado, já que uma base de dados, atualmente, pode guardar não só conjunto de dados
alfanuméricos, como textos, imagens, vídeos, sons etc.
Entretanto, o jornalismo baseado em dados com uso de computadores nasce como uma
reposta ao New Journalism, cuja característica maior é o uso de linguagem literária na
produção de textos jornalísticos. Os que eram então contrários a esse tipo de produção
passaram a usar métodos científicos para produzir conteúdo jornalístico, nascendo o
jornalismo de precisão, como preconiza o Gray (2013), no Manual de Jornalismo de Dados:

No início dos anos 70, o termo jornalismo de precisão foi cunhado para
descrever esse tipo de apuração jornalística: ‘o emprego de métodos de
pesquisa das ciências sociais e comportamentais na prática jornalística’ (em
The New Precision Journalism de Philip Meyer). O jornalismo de precisão
foi proposto para ser praticado nas instituições jornalísticas convencionais
por profissionais formados em jornalismo e em ciências sociais. Nasceu
como resposta ao ‘New Journalism’, que aplicava técnicas de ficção à
reportagem. Meyer defendia que eram necessários métodos científicos para
coleta e análise de dados, em vez de técnicas literárias, para permitir que o
jornalismo alcançasse sua busca pela objetividade e verdade (GRAY, J. et
al, 2013, p.04).

Deste modo, Araújo (2016) propõe que o que diferenciava o jornalismo de precisão do
trabalho realizado atualmente pelo jornalismo de dados é o uso do computador como
ferramenta de apuração jornalística. Segundo o autor (2016, p.154): “intrinsicamente, não
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existentes divergências entre elas porque ambas as práticas baseiam-se na busca por nomes,
números e outros tipos de mensagens que estão presentes na realidade”.
No Brasil, o jornalismo guiado por dados teve início por volta dos anos 2000, quando
jornalistas, de maneira independente, começaram a se utilizar de técnicas computacionais para
balizarem seus trabalhos. De forma institucionalizada, o jornalismo guiado por dados teve
inicio no país com O Estado de São Paulo, em maio de 2012, quando foi criado o Estadão
Dados.
Importante destacar que o surgimento de iniciativas de jornalismo guiado por dados no
Brasil tiveram aporte, em grande medida, com a promulgação da Lei de Acesso a Informação
que trouxe mais transparência aos órgãos públicos brasileiros. Assim, segundo Araújo (2016),
o jornalismo guiado por dados só é possível de ser feito, de forma satisfatória, a partir da
disponibilização de dados na web, possível a partir da Lei de Acesso a Informação.

Metodologia, coleta e análise de dados

Visando esboçar uma metodologia de coleta e análise de dados que permita entender
como é praticado o jornalismo de dados do jornal O Estado de São Paulo, realizou-se uma
coleta de todas as matérias já reproduzidas nas páginas do blog Estadão Dados, desde o
primeiro dia de seu lançamento, em 6 de junho de 2011. Totalizou-se 256 matérias, que foram
analisadas conforme a editoria pertencente, o jornalista que a postou (escreveu), qual
categoria ela foi inserida dentro da lógica de publicação do blog (permanente, gráfico do dia,
séries especiais, explicador, política, eleições 2014), que tipo de ferramenta de visualização
foi usada (através apenas da indicação do blog), e qual fonte de dados foi utilizada (também,
neste caso, quando havia a indicação).

Em segundo momento, foi realizada entrevista com o jornalista coordenador do


Estadão Dados, José Roberto de Toledo, viabilizada por e-mail. Foi enviado a ele um
questionário com 13 perguntas relativas à gestão produtiva da equipe e também questões mais
técnicas. Somente duas das indagações foram respondidas.

O blog Estadão Dados mostra a competência da equipe em promover os dados de toda


natureza de modo a inspirar pautas diversificadas. Porém, nem sempre a tarefa se mostra
simples, como explica Toledo:

Fazer isso todo dia não é fácil, é mais complicado do que parece, mas
felizmente a gente tem conseguido manter a regularidade diária desde que o
blog foi criado e eu acho que está surtindo muitos efeitos positivos, porque a
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ideia de publicar esses infográficos, além de fazer o exercício dos jornalistas


e da equipe, é também criar pautas para o jornal, e isso tem sido feito com
muito sucesso. Muitos infográficos que a gente publicou se transformaram
em matérias de destaque em várias editorias diferentes, a gente conseguiu
diversificar o nosso leque de clientes, por assim dizer, e instigar nos
jornalistas do resto da redação o interesse de trabalhar essas bases e gerar
material jornalístico a partir delas (TOLEDO, J.R. Entrevista concedida a
Marcelo Träsel. São Paulo, 2013).

Mapeando a editoria que mais se destaca no blog, constatou-se que Política está na
dianteira, com 35,5% das matérias publicadas. Não por menos, já que este é o assunto de
maior relevância dentre as demais editorias de um jornal. Segundo, Lima (2006) a
centralidade da política para a mídia ocorre porque é através dos meios de comunicação que a
política nacional acontecesse. O mass média acaba, nesta visão, exercendo várias funções
tradicionais dos partidos políticos, agendando temas e interferindo em eleições.

Verificou-se que em segundo lugar aparece a editoria de economia, com 19,1%


das matérias, como é possível visualizar no gráfico abaixo (Figura 3).

Figura 3 – Gráfico de frequência das editorias por matérias

Fonte: Adaptado de Estadão Dados

A partir da amostra analisada, podem-se levantar algumas tendências com relação ao


uso das ferramentas digitais para visualização dos dados. Segundo Barbosa; Torres (2013,
p.4) a visualização “diz respeito aos modos diferenciados para se representar informações
jornalísticas, a partir da sua estruturação em base de dados”.
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Neste sentido, o blog Estadão Dados apresentou uma variedade de formatos, textos,
fotos, infografia, mapas, etc, perfazendo a disponibilidade de recursos existentes no atual
contexto. A ferramenta mais recorrente utilizada pelo blog Estadão Dados foi a Infogram.
Segundo Seymat afirma no Blog do Inforgram, a ferramenta traz uma grande oportunidade
para fazer gráficos e mapas relevantes de modo a trazer vida a histórias.

Em segundo lugar, aparece à ferramenta Carto DB5, como podemos visualizar na


figura 4. Segundo Fernandez (2013), o Carto DB é uma das mais poderosas ferramentas de
visualização disponíveis e que permite os usuários criar mapas dinâmicos.

Figura 4: Gráfico de frequência das ferramentas de visualização por matéria

Fonte: Adaptado de Estadão Dados

Entretanto, a visualização em gráficos ou mapas não parece ser o foco da equipe já que
ela se debruça nos dados com o objetivo maior de extrair informação relevante, o que pode
desdobrar em matérias e/ou pautas para outras editorias do jornal, sem a necessidade absoluta
de haver a visualização representada no Blog, conforme explica Toledo:

Nós estamos em constante mutação no Estadão Dados. Nos últimos tempos,


nos adaptando a demandas e oportunidades, nos dedicamos mais às
investigações a partir dos dados do que a sua visualização. Quando a
fazemos, é porque ela é absolutamente necessária. Assim, a definição de
uma visualização vem da necessidade de transmitir aquela informação e não
haver outra maneira melhor de fazê-lo do através de um gráfico, um mapa ou
uma ferramenta (TOLEDO, 2016).

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O editor CartoDB é uma ferramenta de mapeamento self-service que mapeia e analisa ferramentas
que combinam uma interface intuitiva com recursos de descoberta poderosos. Mistura e combina seus
conjuntos de dados para obter novos insights sobre suas visualizações.
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De outra maneira, detectou-se que em alguns casos a visualização dos dados não é
clara ou traz erros. Assim, ao invés de organizar a informação, a história contada pela
visualização se tornava complexa ou desorganizada. Na figura 5 não é possível abrir todo o
gráfico de uma vez, sendo preciso rodar a barra de rolagem para acompanhar os dados, o que
acaba por dificultar a compreensão dos mesmos.

Figura 5: Imagem da página 35 do blog Estadão Dados

Fonte: Estadão Dados

De outra maneira, em alguns casos, como na figura 6, a página apresenta erro, ficando
impossível perceber a informação que se pretendia passar.
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Figura 6: Imagem da página 70 do Blog Estadão Dados

Fonte: Estadão Dados

Foram utilizadas 51 fontes diferentes, sendo que a que mais apareceu nas matérias foi
o Ibope. O uso expressivo desta fonte pode justificar-se devido ao fato do órgão trazer
pesquisas sistemáticas e relevantes sobre diversas categorias, desde opinião, mercado,
comportamento, consumo, serviços de telefonia etc.

Entretanto em um número relevante de notícias (20% das matérias) não havia a


indicação do uso da fonte, o que acaba por empobrecer a confiabilidade dos dados
apresentados. Gray traz que:

Citar e compartilhar fontes e referências faz parte da natureza da estrutura de


links da internet, é a forma como estamos acostumados a navegar pela
informação hoje em dia. Voltando um pouco no tempo, o princípio na base
da fundação da estrutura de links da web é o mesmo princípio de citação
usado nos trabalhos acadêmicos. Citar e compartilhar as fontes e dados por
trás da notícia é uma das maneiras mais básicas em que o jornalismo de
dados pode aperfeiçoar o jornalismo, aquilo que o fundador da WikiLeaks,
Julian Assange, chama de jornalismo científico (GRAY,2013, p. 04).

Ainda segundo o Gray, com a fonte de dados disponibilizada, cada usuário pode tomar
para si a tarefa de investigar e se aprofundar no tema, democratizando a informação.

Com relação à fonte dita como Internet, relacionou-se as matérias que foram
originadas a partir de informações do Twitter ou Google, como exemplificado na figura 7.
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Figura 7: Imagem da página 49 do blog Estadão Dados

Fonte: Estadão Dados

Dessa maneira, pelo crescente fluxo de informações presentes no Twitter, o


microblog6 acaba por se tornar um banco de pautas e de fontes aos jornalistas. (MACIEL, G.,
2009, p.37)

Outra fonte que vale mencionar é o Basômetro que é uma “ferramenta interativa que
permite medir o apoio dos parlamentares ao governo e acompanhar como eles se
posicionaram nas votações” (BLOG ESTADÃO DADOS, 2016). Além disso, a ferramenta é
constantemente atualizada, o que permite usá-la permanentemente e de diversas maneiras. E é
a partir desta possibilidade que ela é utilizada em algumas matérias do blog Estadão Dados,
conforme aponta figura 8.

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Segundo Zago (2008) microblog é “parte da idéia de um blog (atualizações em ordem cronológica inversa,
possibilidade de comentários e trackbacks, blogroll), mas apresenta como singularidade o fato de que é adaptado
para postagens de tamanho reduzido”.
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Figura 8: Imagem da página 2 do Blog Estadão Dados

Fonte: Estadão Dados

Dentro da estrutura no blog, foram levantadas as seguintes categorias: permanente,


gráfico do dia, séries especiais, eleições, explicador e política. Assim, segundo levantamento,
destaca-se o gráfico do dia, cuja proporção foi de 63,5% frente ao total das categorias. Em
segundo lugar aparece a categoria especiais, seguido de permanente, eleições 2014 e política
em último, com apenas 0,8% de representatividade. Entretanto, em alguns casos, um mesmo
post foi classificado em duas ou mais categorias.

Figura 9: Gráfico de frequência das categorias por matérias

Fonte: Estadão Dados


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Na seção “gráfico do dia” são publicados gráficos sobre assuntos variados, em


“permanentes” são alocadas matérias que sofrem atualização periódica, já em “séries
especiais”, há uma cobertura mais aprofundada sobre temáticas específicas.

Figura 10: Gráfico Nota das escolas paulistas no Idesp

Fonte: Estadão Dados

Vale destacar que alguns posts do blog somente havia um texto explicativo de como
foi elaborada determinada matéria. Como pode-se visualizar no exemplo da figura 11.

Figura 11: Imagem da página 35 do Blog Estadão Dados

Fonte: Estadão Dados


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Ao abrir este tipo de espaço, o blog Estadão Dados está alfabetizando seu leitor de
modo a fazê-lo compreender como funciona esta nova lógica informativa, segundo a qual, o
usuário tem o poder de narrar à história para si próprio. Em linha, Gray (2013) traz reflexão
de Liliana Bounegru sinalizando que a disponibilização da fonte de dados nas matérias
permite expandir o conhecimento do leitor sobre o assunto já que ele pode mergulhar nestes
dados, fazendo novas descobertas:

Ao permitir que cada um mergulhe com atenção nas fontes de dados e


descubra informação relevante para si mesmo, ao mesmo tempo em que
checa afirmações e desafia suposições comumente aceitas, o jornalismo de
dados efetivamente representa a democratização de recursos, ferramentas,
técnicas e métodos antes restritos aos especialistas; seja repórteres
investigativos, cientistas sociais, estatísticos, analistas ou outros
especialistas. Ao mesmo tempo em que citar e oferecer links para as fontes
de dados é característica do jornalismo de dados, estamos caminhando para
um mundo em que os dados estão perfeitamente integrados ao tecido da
mídia. Jornalistas de dados têm papel importante ao ajudar a diminuir as
barreiras para compreensão e imersão nos dados, e aumentar a alfabetização
de dados dos seus leitores em grande escala (GRAY, 2013, p. 4).

Em outros casos, o texto fazia referência apenas a uma série especial que o Estadão
Dados estava lançando, de modo a propagandear as ações da equipe de Dados (Figura 12).

Figura 12: Imagem da página 9 do Blog Estadão Dados

Fonte: Estadão Dados

Uma das principais limitações do método aqui esboçado é a impossibilidade de se


mapear todas as ferramentas utilizadas nas etapas de produção das matérias, desde o insight
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jornalístico, até a busca dos dados, limpeza, análise e visualização. Além disso, questões
como impossibilidade de visualizar as matérias por erros na página ou mesmo gráficos que
não carregavam configuraram uma barreira na análise (Figura 12).

Figura 13: Imagem página 79 do Blog Estadão Dados

Fonte: Estadão Dados

Conclusão

A pesquisa aqui demonstrada revela, em grande medida, os usos e aplicações que o


Estadão dá ao jornalismo guiado por dados. Esta análise permite supor que o jornal O Estado
de São Paulo faz uso crescente do Jornalismo de Base de Dados em sua estrutura de produção
de notícias.

Neste cenário, vislumbra-se o uso de diversas técnicas para apuração jornalística, com
uso de uma gama de dados. Atrelado a este fator, verificou-se que o Estadão diversifica a
temática das reportagens baseada em dados potencializando assim o eixo temático geralmente
utilizado, o que colabora para uma maior densidade informativa, assegurando a oferta efetiva
de conteúdos originais.

Quanto às fontes, nota-se que não há fontes humanas, somente dados. Pode-se supor, a
partir disso, que há uma crença de que os dados são mais confiáveis e seu uso representa a busca
pela confiabilidade das informações.
Não obstante, percebe-se que, ao explicarem uma matéria, o Blog Estadão Dados
convida os leitores a realizar uma auditoria sobre todo o processo jornalístico. Da mesma
forma, concede o controle da narrativa na medida em que isso permite ao leitor fazer sua
própria interpretação dos dados.
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Outra variável da análise diz respeito à remissão das fontes utilizadas nas matérias.
Elas não aparecem em 100% das matérias, mas quando presentes têm a missão de aprimorar a
credibilidade da informação. Destarte, sua função primordial é ampliar a transparência do
noticiário, para compensar o declínio na credibilidade depositada na imprensa pelo público.
A dinâmica da equipe de dados do Estadão se configura de modo cooperativo, embora,
em sua maioria, apenas um jornalista assina a matéria. Esta afirmação é baseada não só na
análise das matérias, como também por afirmação do responsável pela equipe, o jornalista
José Roberto de Toledo. Ademais, segundo Träsel (2014, p.155) “[...]pode-se dizer que a
maioria das matérias eram produzidas coletivamente pelo ED. Apenas Toledo costumava
apurar e redigir de forma independente, o que pode se dever ao fato de ser o coordenador e
repórter mais experiente do grupo”.

Outro apontamento conclusivo refere-se ao fato de que as análises de pesquisas de


opinião, a partir do Twitter e do Google Trends, revelam-se como promissor meio de se
encontrar notícias.

A análise sinaliza que os jornalistas que trabalham no Estadão Dados possuem os


conhecimentos e técnicas necessárias para atuarem como jornalistas de dados, quais sejam
pensamento computacional, conhecimentos de computação e familiaridade para lidar com
números. O nível de destreza dos profissionais é notado na medida em que todos atuam na
análise e visualização dos dados.
A partir deste cenário, conclui-se que o blog Estadão Dados responde de forma
produtiva a prática do jornalismo guiado por dados.
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Uses and applications journalism guided by data: a newspaper study The State of São
Paulo

Abstract: This article aims to elucidate the practice of database journalism exercised by the
newspaper O Estado de São Paulo. After theoretical discussion on the concept of Big Data
and data journalism, a case study from Estadão Data blog is displayed. In addition to
describing the steps leading up to search for online data, we found the main targets issues of
journalism use guided by data. The work also shows how the final result of the search data is
displayed in reports and displays which are the knowledge and skills needed to be a data
journalist.

KeyWords: database journalism;Big Data; O Estado de São Paulo; Estadão Dados.

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BRASIL. LEI Nº 12.527, (18 de Novembro de 2011). Regula o acesso a informações previsto
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Constituição Federal; altera a Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei no
11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá
outras providências. Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos.
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