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GESTÃO DO CONHECIMENTO E GOVERNANÇA CORPORATIVA:

UM ESTUDO DE CASO

Pedro Luiz de Oliveira Costa Neto – UNIP – politeleia@uol.com.br


Geraldo Cardoso de Oliveira Neto – UNIP – geraldo.prod@ig.com.br
Oduvaldo Vendrametto – UNIP – oduvaldov@uol.com.br
Sylvio Ferreira Junior – UNIP – sylvio.jr@ig.com.br

Resumo: Entre as muitas alterações que o setor produtivo vêm promovendo está a organização do
conhecimento interno e da cultura das empresas. Disseminado internamente, o conhecimento técnico
tradicionalmente concentrava-se em indivíduos, de maneira fluida e precária. As manifestações em
favor da responsabilidade social e ambiental, difundidas pela mídia, as exigências compulsórias
impostas por legislação de proteção e defesa da saúde do trabalhador e da preservação do meio
ambiente, ficam cada vez mais aderentes à imagem das empresas. Essa combinação de fatores tem
levado empresas a movimentar-se no sentido de atender a legislação e empreender ações que
estimulam e valorizam o trabalhador, tornando-o mais participativo, interessado e pró-ativo em
aprender e empreender. Para isso, elas criam mecanismos para apreender, classificar e organizar o
conhecimento interno, de modo a atender tanto a legislação como aproveitar a oportunidade que essa
atividade pode oferecer sobre os mais diferentes aspectos. A formalização dessa atividade de Gestão
do Conhecimento, com freqüência inserida na Governança Corporativa, tem mostrado resultados
positivos na melhoria da imagem, no desempenho, na redução de acidentes e desperdícios, e nas
relações entre empregados, gerências, diretorias e sócios das empresas. Este artigo trata da inserção
da Gestão do Conhecimento numa grande empresa distribuidora de gás.
Palavras-chave: Gestão do Conhecimento. Governança Corporativa. Responsabilidade Social e
Ambiental.

1 - Referências Teóricas

1.1 - Gestão do Conhecimento


Gestão do conhecimento pode ser considerada um termo rico em conceitos. Torna-se ainda
mais intenso ao ser correlacionado ao ambiente das organizações empresariais.
Gestão é uma palavra originária do latim, que, largamente tem sido utilizada como adjunto de
outros objetos de pesquisa, tais como a estratégia, a qualidade, as finanças, a saúde, ao ambiente,
etc., com o intuito de referenciar modelos de aplicação e melhores práticas acerca destes objetos de
pesquisa. A gestão em si é derivada do ato de administrar, conceituado pelas funções enumeradas por
Taylor – planejar, organizar, dirigir e controlar – da Administração Científica, complementado pela
função “coordenar”, atribuída a Fayol, da Escola Clássica, convergindo em um ponto comum aos
objetivos da Engenharia de Produção que compreendem buscar, eficiente e eficazmente, o inter-
relacionamento de pessoas, máquinas, processos, materiais, capital e informação em prol dos
interesses da organização.
O conhecimento permeia espectro ainda mais abrangente. Esse termo também é originário do
latim, é comumente confundido e utilizado como sinônimo de sabedoria e informação. É
amplamente estudado por diversas linhas de pensamento, abrangendo a Filosofia, a Psicologia, que
objetiva compreender seus processos de criação, conservação, transmissão e transformação, até os
teóricos organizacionais, que desejam aprender a lidar com ele para melhor utilizá-lo no ambiente
competitivo dos negócios. Platão considera que “os conhecimentos são as crenças verdadeiramente
justificadas”, que é análogo ao pensamento de Nonaka (2000), tal que para quem “o conhecimento é
um processo humano dinâmico de justificar a crença pessoal com relação à verdade”.
Contudo, acredita-se que o elemento mais importante que distingue o ser humano dos demais
animais é a classificação que a Biologia nos proporcionou, nos auto-intitulando homo sapiens. Por
sermos homens que sabem, a cognição, a capacidade de aprender, apreender, interpretar, analisar,
refletir e decidir em relação aos dados, fatos e pensamentos, condizente com o ciclo vivencial de
Kolb apud Guaragna (2007), e de sua necessidade de relacionamento que fez com que criássemos
gestos, figuras, representações, símbolos gráficos e fonéticos comuns, para estabelecermos a
comunicação para a transmissão disso que se denomina conhecimento.
Fruto dos relacionamentos, e de fontes racionais e subconscientes, instintivas das necessidades
humanas de proteção e continuidade “(...) chegou um momento em que os homens sentiram o desejo,
vago e indeterminado, de um bem que ultrapassa o seu bem particular e imediato e que ao mesmo
tempo fosse capaz de garanti-lo e promovê-lo” (AZAMBUJA, 1979), que o conduziu a organizar-se
em sociedades e formar organizações que hoje conhecemos por empresas.
Segundo Godinho Filho (2004), desde a Revolução Industrial, as empresas têm evoluído sob a
influência de Paradigmas Estratégicos de Gestão da Manufatura (PEGEM). Estes paradigmas
compreendem aos anseios mercadológicos vigentes, os princípios, crenças e cultura da organização,
suas capacidades de execução e, por fim, seus objetivos de atendimento à demanda em face de suas
capacidades, o que se costuma denotar por “vantagem competitiva” (PORTER, 1985).
No início do século XX, a demanda era maior que a oferta, por isso era mais tolerante e
propenso a aceitar os produtos oferecidos pela Manufatura em Massa, em que a padronização era
característica fundamental. Porém, após a Segunda Guerra Mundial, iniciou-se um processo inverso.
Houve o incremento do conceito de qualidade diante da postura produtiva, culminando no
denominado “Sistema Toyota de Produção”, ou manufatura enxuta, em que se prioriza a otimização
de recursos. Além disso, o cliente passou a se tornar mais exigente e seu interesse pela diversificação
e pela exclusividade tem forçado a adoção de novas estruturas produtivas, tais como a Manufatura
Responsiva, Customização em Massa e a Manufatura Ágil. Tal desejo de exclusividade tem causado
impactos profundos e antagônicos com os fatos ocorridos no final do século XX. A globalização que
prognostica interface e inter-relação mundial tem se confrontado com o individualismo e o
enclausuramento das pessoas em seus microambientes. (POPCORN, 1999).
O combustível para esta mudança de atitudes e aumento de exigências evolutivas do ser
humano é o conteúdo informacional contido nos produtos. Exemplificando-se com o automóvel –
produto símbolo do século XX – percebe-se claramente este ganho e desenvolvimento, pois este se
converteu de uma máquina mecânica semelhante a uma carruagem com motor, para uma estação
coberta de recursos informacionais que vão do computador de bordo que, automaticamente regula
ajustes de banco, retrovisores, volante, adapta o regime de trocas de marchas de acordo com a
dirigibilidade do condutor, a sistemas de posicionamento global que auxiliam na determinação do
caminho a seguir e até ao entretenimento embarcado com a aparelhagem de áudio e vídeo.
As sociedades e as organizações estão migrando de um paradigma mecanicista para um
holístico, de uma cultura que valorizava os bens tangíveis para uma que valoriza um bem intangível,
único e mais valioso: o capital intelectual contido em todos os seus colaboradores. Sob este prisma,
Stewart (2002) determina que “a economia do século XXI caracteriza-se pela intensidade de
informação cada vez maior (...) o valor está na informação em si [...] o conhecimento valioso
independe de sua base física”. Nesse sentido, as coisas são apenas o que parecem ser. O telefone
celular não é meramente um telefone móvel e sim uma agenda, um relógio, despertador, câmera
filmadora e fotográfica, gravador de voz entre outras funções. Nesta nova dinâmica de mercado,
Stewart (2002) estabelece três pilares fundamentais, a saber:
- o conhecimento impregna tudo que compramos, vendemos e produzimos. Tornou-se o mais
importante fator de produção;
- os ativos do conhecimento – isto é, o capital intelectual – passou a ser mais importante para
as empresas do que os ativos financeiros e físicos;
- para prosperar nessa economia e explorar esses novos ativos cruciais, precisamos de um novo
léxico, novas técnicas de gestão, novas tecnologias e novas estratégias.
Nas palavras de Crawford, Zabot (2002) salienta outras quatro características, além da
intangibilidade, a este conhecimento que se impregna em nossas vidas:
- é difundível e se auto-reproduz: aprimora-se e se expande com o uso;
- é substituível: otimiza outros recursos com a aplicação de novas técnicas;
- é transportável: onde a TI é responsável pela agilização da movimentação da informação;
- é compartilhável: refere-se à transmissão do conhecimento entre as pessoas.
De fato, a revolução tecnológica, a globalização gerada pela interconectividade, facilitou
principalmente no que tange à transportabilidade e à difusão de informações. Informações que, em
outros tempos, serviam para distinguir, discriminar e sobrepujar povos em detrimento de outrem.
Hoje, porém, o conhecimento é a base para a vantagem competitiva.
Zacarelli (2000) apresenta uma vantagem competitiva pela existência de talentos especiais na
empresa, seja em função gerencial ou operacional, que propicia vantagem sobre os concorrentes em
razão da maior habilidade que eles têm para perceber oportunidades de bons negócios e implementá-
los antes dos concorrentes ou para sair do negócio cuja rentabilidade tende a cair. As pessoas
talentosas, quando saem da empresa, levam consigo a vantagem competitiva, assim é preciso haver
esquemas sofisticados para retê-las.
Assim, Stewart (2002) coloca que: “O conhecimento é a própria razão de ser da empresa. Não
se consegue alcançar a vantagem competitiva com trabalho não qualificado. (...) A vantagem
competitiva duradoura deriva de algo exclusivo, ou pelo menos de difícil imitação: um tipo especial
de conhecimento (...) ou uma combinação singular de ativos do conhecimento e ativos físicos”. “A
essência da empresa na nova economia é sua capacidade de criar, transferir, montar, integrar,
proteger e explorar novos ativos de conhecimento”. David Teece apud Stewart (2002), que corrobora
com Bukowitz e Williams (2002), que consideram que a “Gestão do conhecimento é o processo pelo
qual a organização gera riqueza, a partir do seu conhecimento ou ‘capital intelectual’ que é: (...)
qualquer coisa valorizada pela organização que esteja contida nas pessoas, ou seja, derivada de
processos, de sistemas e da cultura organizacional – conhecimento e habilidades individuais, normas
e valores, bases de dados, metodologias, programas, conhecimentos, licenças, marcas e segredos
comerciais”.
“A gestão do conhecimento representa um esforço para reparar prejuízos anteriores e uma
política de segurança contra a perda de memória organizacional futura” sintetiza Freitas (2004), “É
uma atitude que visa preservar o conhecimento explícito e tácito de seus colaboradores”.
Logo, Terra e Gordon (2002) identificam que “O recurso conhecimento e as práticas para
gerenciá-lo demandam profundo entendimento das práticas de trabalho, fontes de informação e
aprendizado, avaliação de tecnologia pertinente e fatores motivacionais de diferentes grupos de
indivíduos da organização (...) exige que as organizações reconheçam que precisam realizar esforços
mais focados em compreender como a variável conhecimento afeta seus processos, modelos de
negócios e o desempenho de diferentes grupos de pessoas na empresa”.
1.2 - Governança Corporativa Implementando a Gestão do Conhecimento nas Diretrizes
Neste tópico será apresentado um modelo desenvolvido e motivado pelas discussões
propiciadas pelo envolvimento acadêmico, reforçando que a Gestão do Conhecimento necessita estar
no cerne da Governança Corporativa para se conseguir a vantagem competitiva organizacional.
Assim, os empresários, empreendedores, gerentes e líderes precisam valorizar e promover formas de
aquisição e geração de idéias nas empresas, aprendendo a hierarquizá-las e disseminá-las de maneira
estratégica.
Em uma breve síntese das concepções da governança corporativa na atualidade, é possível
verificar que o poder não pode mais ser centralizador, pois pode gerar conflitos entre os elos da
estrutura organizacional.
Hoje as empresas são mais flexíveis, as estruturas mais horizontais, o que facilita a
comunicação entre todos os grupos de interesse que podem ser internos, externos e ao entorno.
A esses grupos de interesse que participam da estratégia de negócios das organizações de
maneira integrada, que quebram os paradigmas rígidos e centralizadores, observando alguns
atributos. Conforme Andrade (2006), “as crenças e os valores, a cultura e as práticas de gestão, a
missão, a visão e os focos estratégicos, os fatores críticos de sucesso, atendimento às demandas de
partes interessadas e os indicadores de desempenho definidos e monitorados pelos órgãos de
governança”.
Claramente não há uma maneira única de definir as estratégias dos negócios, por motivo das
contingências e aspectos multivariados na concepção das pessoas. No Quadro 1, apresenta-se a
concepção de alguns autores sobre os fatores diferenciadores da governança corporativa e “observar
que, independente de todas essas condições diferenciadoras, o objetivo comum, subjacente a todos os
modelos e concepções de governança, é o máximo retorno total dos investimentos dos grupos de
interesse harmonizado ou não com outros interesses” (ANDRADE, 2006).
Quadro 1 - A concepção de alguns autores sobre os fatores diferenciadores da Governança
Corporativa. Fonte: Andrade (2006) adaptado pelo autor.

Gillan e Starks Mostram as implicações para a governança nas companhias em que os stakeholders
são grupos de controle associados.

Mitchell e Enfatizam a complexidade decorrente de fusões e aquisições.


Mulherim

Gubitta e Mostram as diferenças da governança nas empresas familiares em relação a outras


Gianecchini estruturas de controle, chamando a atenção para os alinhamentos da estratégia de
negócios e das expectativas dos stakeholders, que, neste caso, tendem a envolver
mais dificuldades.

Yip Destaca a maior complexidade da governança nas corporações de atuação global,


tendo em vista as pressões dos stakeholders, que diferem em função de fatores
culturais e da diversidade da ordem institucional dos países.

Lodi (2000), por meio do relatório Candbury Report, define-a como “o sistema pelo qual as
companhias são dirigidas e controladas. Ela coloca os conselheiros de administração no centro de
qualquer discussão sobre a Governança Corporativa”.
Lodi (2000) continua, dizendo que, no passado recente, nas empresas privadas e familiares, os
acionistas eram gestores, confundindo em sua pessoa propriedade e gestão. Com o profissionalismo,
a privatização, a globalização e o afastamento das famílias, a Governança Corporativa colocou o
Conselho entre a Propriedade e a Gestão.
Dessa forma, o conselho atua como interface entre os acionistas, os administradores, os demais
interessados stakeholders, os conselheiros, os credores, os auditores e a sociedade de forma mais
ampla. A esse relacionamento que permite a condução da corporação ao encontro dos seus objetivos
dá-se o nome de Governança Corporativa (LAMEIRA, 2001).
IBGC (2006) a define como “um sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas,
envolvendo os relacionamentos entre acionistas/cotistas, conselho de administração, diretoria,
auditoria independente e conselho fiscal. As boas práticas de governança corporativa têm a
finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para sua
perenidade”.
De acordo com Andrade (2006), no Quadro 2 são demonstradas a abrangência e as
diversidades das categorias conceituais.
Quadro 2 - Conceitos de Governança Corporativa: uma tentativa de síntese.
Fonte: Andrade (2006) adaptado pelo autor.

A geração de valor é uma das principais fontes da governança corporativa de integridade ética,
pois permite maior sustentação, amarrando concepções, práticas e processos de alta gestão com
senso de justiça e eqüidade no tratamento dos acionistas com respeito aos direitos dos minoritários e,
ainda, na presença ativa em discussões com transparência das informações entre todos os membros,
principalmente as que envolvem resultados, oportunidades e riscos, com prestação responsável de
contas e conformidade no cumprimento de normas regulamentadoras.
Segundo Andrade (2006), conceituam-se os cincos Ps da Governança Corporativa:
• Princípios - a base ética presente na geração de valor;
• Propósitos - o de contribuir para o máximo retorno total de longo prazo dos stakeholders de
maneira clara e legítima é harmonizável com interesses legítimos.
• Poder - a estrutura de poder legitimamente definida pelos proprietários é que leva a maior
clareza na separação de funções e responsabilidades dos conselhos corporativos e da direção
executiva.
• Processos - começam pela constituição e pelo empowerment dos conselhos de administração,
da direção executiva e do sistema de auditoria – considerados como órgãos-chave da governança
corporativa na introdução de indicadores de desempenho.
• Práticas - as boas práticas de governança estabelecem-se no interior de cada um dos
processos definidos e seu foco; é a gestão de conflitos de agência, tanto os decorrentes de
oportunismo quanto os de majoritários.
Um dos aspectos que merece atenção prioritária é a transparência de informações de
desempenho, que Lodi (2000) transcreve do The Conference Bord, Special Report 97/1, em que as
vantagens podem conduzir a uma melhor avaliação da empresa e possibilita discutir estratégias com
administradores e conselhos de administração. Os indicadores que medem o desempenho estratégico
relatados são:
1) Qualidade da gestão;
2) Qualidade dos produtos e serviços;
3) Capacidade de atrair, desenvolver e manter pessoas talentosas;
4) Valor como investimento de longo prazo;
5) Uso dos ativos da empresa;
6) Solidez financeira;
7) Inovação;
8) Responsabilidade pela comunidade e pelo ambiente.
Na Figura 1 é apresentado um novo modelo conceitual de Governança Corporativa estratégica
focada na Gestão do Conhecimento.
A organização precisa de uma governança que tenha seus princípios, seus propósitos, seus
processos, suas práticas e, principalmente, poder para promover, valorizar e disseminar o
conhecimento. É preciso também valorizar crenças e valores, costumes e práticas, e implementar na
missão, na visão e nos focos estratégicos a necessidade de valorizar o conhecimento nas empresas, e
introduzir indicadores de desempenho para mensurar a valoração ao capital intelectual da empresa.
Figura 1 - Modelo conceitual de Governança Corporativa estratégica focada na Gestão do
Conhecimento

Este modelo é original, elaborado pelos autores e está aberto a discussões e aprimoramento
pelos interessados.
Assim a empresa consegue gerar novas idéias e patenteá-la, por meio de pesquisas, criatividade
das pessoas, benchmarking, com um sistema de apoio de tecnologia da informação para hierarquizar
e descartar as idéias geradas pelos stakeholders.
E, por fim, disseminar seletivamente o conhecimento que promove a valorização do capital
intelectual e retorno total do investimento dos stakeholders de maneira harmonizada.

2 - Exemplo de Aplicação

2.1 - Metodologia
Baseado em Svelby apud Stollenwerk (1999) de que a gestão do conhecimento pode ser
classificada com base em seu enfoque na gestão da informação ou em detrimento da aprendizagem
organizacional, analisam-se propostas adotadas pela empresa explorada.
2.2 - Descrição do Caso

2.2.1 - GED Web


O sistema de Gerenciamento Eletrônico de Documentos (GED), com plataforma de acesso via
internet (Web) teve seu início de implantação em 2005, sob a administração do departamento de
saúde, segurança, meio ambiente e qualidade (SSMQ), com as seguintes responsabilidades:
1) Aprovar documentos quanto à sua adequação antes de seu uso;
2) Analisar e atualizar, conforme necessário, e reaprovar documentos;
3) Assegurar que as alterações e a situação atual da revisão de documentos sejam identificadas;
4) Assegurar que as versões relevantes de documentos aplicáveis estejam disponíveis em seu
ponto de uso;
5) Assegurar que os documentos permaneçam legíveis e prontamente identificáveis;
6) Assegurar que os documentos de origem externa determinados pela organização como sendo
necessários ao planejamento e à operação do sistema da gestão ambiental sejam identificados e que
sua distribuição seja controlada;
7) Prevenir a utilização não intencional de documentos obsoletos e utilizar a identificação
adequada nestes, se forem retidos para quaisquer fins.
Os objetivos centrais desta “biblioteca eletrônica” são a padronização, a catalogação e o
controle para distribuição do acervo documental da organização. Neste sentido, os diversos tipos de
documentos são classificados em cinco níveis, de acordo com sua abrangência.
No primeiro nível encontram-se as Políticas (POL), que estabelecem os princípios, os valores,
as regras globais, as diretrizes e o comprometimento da Alta Direção referente à qualidade, à saúde,
à segurança e ao meio ambiente; e o Manual do Sistema de Gestão Integrado, que aborda a garantia
da aplicação correta dos requisitos da ISO 9000, OHSAS 18001 e ISO 14000, e serve como base
para os documentos dos demais níveis.
No segundo nível catalogam-se as Diretivas Técnicas, que determinam os objetivos, princípios,
critérios e propósitos, nos quais ações e decisões são baseadas e servem como base para os demais
documentos.
No terceiro nível, as Normas Técnicas que abrangem os requisitos técnicos, legais, políticas e
diretrizes, de modo a estabelecer conceitos, requisitos, parâmetros e abordagens para os projetos,
construção, operação e manutenção. O Procedimento de Emergência refere-se às ações a serem
adotadas em casos de emergência relacionadas à rede de distribuição de gás. O Procedimento
Operacional que registra a forma adequada para realizar uma atividade operacional. O Padrão
Comgás detalha as diretrizes estabelecidas pela companhia aplicáveis a todas as áreas e como serão
atendidos os requisitos da ISO 9000, OHSAS 18001 e ISO 14001. O Procedimento de Gestão
delimita as rotinas aplicáveis ao sistema de gestão integrado – controle de documentos, treinamentos,
etc.
No quarto nível abordam-se as Instruções de Engenharia que expõem, em caráter temporário,
os requisitos e as ações que precisam ser imediatamente implementadas, sendo que, assim que
possível, devem ser incorporados aos documentos definitivos – tal como o padrão Comgás. O
Caderno de Materiais e Equipamentos que listam características que um material ou equipamento
deve atender para ser utilizado. A Especificação de Equipamento descreve as características que um
conjunto de materiais ou equipamentos deve atender para ser utilizado pela Comgás e para preservar
projetos de equipamentos específicos. A Instrução de Trabalho mapeia e detalha atividades rotineiras
operacionais de uma determinada área ou processo, e complementa as informações de documentos
dos demais níveis.
E no último nível encontram-se os Formulários, manuais ou eletrônicos, que demonstram o
adequado funcionamento do sistema de gestão integrado da Comgás. Finalizando-se com a base de
dados, os Registros que são as evidências físicas ou eletrônicas de verificações, acompanhamentos e
situações específicas daquilo que efetivamente foi realizado no Sistema de Gestão Integrado da
companhia.
Em meados de 2005 foram entregues guias para os gestores apresentarem e explicarem, em
reuniões semanais para as suas equipes, a estrutura, importância do sistema e providenciar a
adequação ao modo vigente de controle de documentos e descrição de processos. Além disso, coube
ao gestor avaliar, atualizar e aprovar os procedimentos concernentes as suas equipes e enviar tais
revisões ao setor de qualidade para oficialização destas propostas e alterações.
Porém, percebeu-se que, embora seja de acesso a todos os funcionários da companhia, em
razão da falta de reiteração constante desta prática, o hábito da coleta do documento em fonte oficial
ainda não se consolidou. Com a autonomia dada aos gestores, cada departamento desenvolve práticas
e documentos próprios, que poderiam ser compartilhados entre as áreas que possuem processos
semelhantes e convergidos em documento padrão e uniforme. A integração desejada por este sistema
ainda não alcançou os outros sistemas corporativos – sua ERP e seu CRM: principais fontes de
registros.
Atualmente, esta ferramenta se encontra em revisão, capitaneada pela engenheira que
implantou tal sistema que admite ter sentido certa dificuldade em reaver o conteúdo histórico da
ferramenta. Esta revisão visa, essencialmente, avaliar o conteúdo existente na plataforma e reiniciar a
convocação dos gestores e demais funcionários ao devido uso desta valiosa peça de armazenamento
e distribuição de informações.
Adicionalmente, este projeto ainda não conseguiu incorporar nem todos os registros
provocados pela própria área gestora (SSMQ), visto que os dados referentes a um programa de
prevenção de acidentes baseado em comportamento, que é gerador periódico de relatórios
individuais dos funcionários, são incluídos em outro programa de gestão de dados.
Verificou-se, também, a dificuldade de os gestores determinarem a abrangência e a
classificação que suas percepções e propostas, por meio da documentação, alcançam dentro da
organização, inviabilizando sua integração, catalogação e disseminação.

2.2.2 - Dicas ZapGás


Fruto do trabalho de conclusão de curso de um superintendente da diretoria operacional da
companhia, que consiste em um sistema de registro de experiências e de boas práticas constatadas
pelos empregados no processo de construção da rede de distribuição, sua manutenção e de
características especiais constatadas.
Esta ferramenta apóia-se em quatro elementos-chave:
1) Conhecimento implícito dos funcionários;
2) Política de incentivo ao registro de experiências;
3) Validação e estruturação de dados;
4) Programa de armazenamento.
O objetivo principal desta ferramenta é coletar e converter a expertise, principalmente dos
funcionários mais antigos da companhia, em dados estruturados inteligíveis e dissemináveis para o
aumento da qualidade das atividades.
Este projeto foi aprovado e incentivado pela diretoria de operações e foi inaugurado no
segundo semestre de 2006, patrocinado por uma política de brindes e reconhecimentos em dinheiro.
O processo tem os seguintes passos:
1) O funcionário detentor do conhecimento deve converter em símbolos gráficos, fotos ou
texto suas percepções;
2) Encaminha-se ao grupo de validação, composto pelo líder de manutenção de rede e dois
engenheiros. Este grupo pré-avalia o conteúdo e o encaminha ao gestor das atividades a qual a
sugestão se refere;
3) Aprovada a sugestão, ela é classificada e registrada pelo grupo de validação;
4) O funcionário recebe comunicação da inclusão de sua sugestão no banco de dados.
Atualmente, este programa se encontra suspenso e em reconstrução, pois com a promoção do líder e
de um dos engenheiros em fins de 2007, o know how do processo ainda está retido nestes
profissionais que não têm disponibilidade, em face de suas novas obrigações, de transferi-lo ao novo
responsável.

2.3 - Discussão
Evidencia-se pelas propostas adotadas pela empresa o enfoque essencial na gestão da
informação preexistente da companhia. A intenção e a preocupação em amealhar, de modo
organizado, dados, fatos e conhecimentos que fazem parte do cotidiano e da natureza específica e
singular do ramo de negócio em que está inserida, pode ser fonte de notável aprimoramento.
Contudo, nota-se que as ferramentas encontram-se dispersas e subutilizadas em vista de uma
abordagem integrada de gestão do conhecimento e governança corporativa.
O GED Web tem sido aplicado como biblioteca eletrônica dos documentos corporativos.
Todavia, este pode alcançar o caráter de portal corporativo, conforme Freitas (2004), pois “o portal
corporativo surgiu como evolução das intranets, como solução para agregar em um único ambiente
ferramentas de colaboração, software de Business Intelligence, CRM e ERP, permitindo interação e
integração de informações e conhecimento”. Porém, como também salienta este autor “em apoio à
Gestão do Conhecimento”. Ou seja, ferramenta que suporte dados e os concilie em ambiente comum
para coleta, registro e análise de informações.
Esse sistema, apesar de sua elevada graduação de níveis de conteúdo, percebe-se enfoque
prioritário aos assuntos pertinentes ao departamento gestor deste programa (SSMQ). Embora
implantado em 2005, deve ser considerado em estágio inicial de consolidação, pois ainda não
conseguiu abranger totalmente nem os dados de sua área.
O dicas ZapGás, em teoria, enfatiza o caráter de aprendizado ao tentar coletar e compartilhar
conhecimentos. Enquadra-se nos critérios de Nonaka (2000) de classificação do conhecimento, é
melhor aproveitar o conhecimento tácito e convertê-lo em explícito. Entretanto, este foi vítima de seu
próprio objetivo: com a saída dos detentores do conhecimento implícito inerente ao fluxo do
processo, o projeto quase se perdeu totalmente, tornando-se necessária sua reconstituição. Este artigo
ilustra o nível de preocupação que deve existir nas empresas realmente conscientes da importância da
gestão do conhecimento, em seus diversos aspectos, conforme ilustrado na Figura 1, para evitar
contratempos conforme discutido.
Além disso, reforça-se que as ferramentas precisariam ser interconectadas, pois o fruto da
conversão do conhecimento tácito em conhecimento explícito deveria fazer parte, justamente, do
sistema de gestão eletrônica de documentos e não estar contido em plataforma alheia à organização.
Outro aspecto, que reflete certa ausência da capacidade integrativa da gestão do conhecimento
e da governança corporativa na adoção das ferramentas citadas, é o fato de que estas ferramentas são
independentes e focalizadas de modo ainda restrito, visto que o programa dicas ZapGás apenas tem
como objetivo fundamental capturar o conhecimento tácito do empregado operacional, ignorando as
possibilidades existentes em todos os outros profissionais que compõem a empresa. Dentro desta
ferramenta, salienta-se a abordagem de coleta baseada em uma troca pecuniária e a falta de
acompanhamento e auxílio ao detentor do conhecimento no processo de conversão, que poderia ser
feito por meio de entrevistas pessoais, acompanhamento do profissional em ação e debates com
outros profissionais para o aprimoramento e refino do conhecimento implícito para sua estruturação
e padronização explícita.

3 - Considerações Finais
O amadurecimento dos mercados e a evolução dos meios de comunicação têm promovido
alterações nas organizações e em seus produtos, pois, relembrando Stewart (2002), “o conteúdo
informacional contido nos produtos e serviços é cada vez maior”. Para enfrentar tais demandas,
novas abordagens têm sido adotadas.
A organização precisa de um sistema que tenha seus princípios, seus propósitos, seus
processos, suas práticas e, principalmente, poder para promover, valorizar e disseminar o
conhecimento. É preciso também valorizar crenças e valores, costumes e práticas, e implementá-los
na missão, na visão e nos focos estratégicos.
A Gestão do Conhecimento constitui metaferramenta – formada de outras ferramentas, tanto
psicológicas quanto informáticas e administrativas – que visa capturar, organizar, controlar e renovar
continuamente os conhecimentos em um atualizado ciclo PDCA focado nas competências humanas
de prover o conteúdo informacional e a qualidade em adequação aos requisitos esperados pelos
clientes.
Adicionalmente, a Governança Corporativa agrega ótica holística, profissional, ética e
ecologicamente preocupada em prol do gerenciamento da organização, em consonância com todos
os grupos de interesse envolvidos com o ambiente de negócios.
Associadas, a metaferramenta do conhecimento e a abordagem de governança constituem
ambiente e preocupação integradora e agregadora de valor por meio de dados, fatos, experiências e
competências adquiridas pelas pessoas.
O estudo de caso apresentou a conscientização da necessidade de aproveitamento e do devido
armazenamento do conhecimento por meio de ferramentas que abordaram os primeiros objetivos da
gestão do conhecimento: capturar conhecimento – via dicas ZapGás – concernente ao pensamento
de Nonaka (2000) de conversão do conhecimento tácito em explícito e quanto a sua organização de
dados, como objetiva o GED Web, seguindo o caráter de administração de sistemas de informação.
Contudo, observou-se seu caráter ainda incipiente devido à ausência do caráter integrador e
abrangente na aplicação das ferramentas utilizadas, em comparação ao ambiente proveniente da
Governança Corporativa com enfoque na Gestão do Conhecimento.

Referências Bibliográficas
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AZAMBUJA, D. Teoria Geral do Estado. Rio de Janeiro: Globo, 1979.
BUKOWITZ, W. R.; WILLIAMS, R. L. Manual de gestão do conhecimento: ferramentas e
técnicas que criam valor para as empresas. Porto Alegre: Bookman, 2002.
FREITAS, R. A. de. Portais corporativos: uma ferramenta estratégica para a gestão do
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GODINHO FILHO, M. Paradigmas Estratégicos de Gestão da Manufatura: configurações,
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Tese em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos: São Carlos, 2004.
GUARAGNA, E. Desmistificando o Aprendizado Organizacional. São Paulo: Qualitymark, 2007.
IBGC - INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA. Uma década de
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Tipo de Produção: Anais em CD

Título do Texto: Gestão do Conhecimento e Governança Corporativa: um Estudo de Caso


Autor: Pedro Luiz de Oliveira Costa Neto
Coautores: Geraldo Cardoso de Oliveira Neto; Sylvio Ferreira Jr.

Orientador: Prof. Dr. Oduvaldo Vendrametto


Instituição: UNIP
Bolsista: Não

Título do Meio de Publicação: Anais do SIMPEP 2008

Local da Publicação: Bauru-SP – Brasil


Data: Outubro/2008

Área: Gestão de Sistemas de Operações


Linha de Pesquisa: Redes de Empresas e Planejamento da Produção
Projeto de Pesquisa: Conhecimento e Informação para o Setor Público

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