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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas

Faculdade de Filosofia

João Gabriel Farias Lima

Ruínas: Filologia e Classicismo na recepção de Nietzsche

Rio de Janeiro

2018
Ruínas: Filologia e Classicismo na recepção de Nietzsche

Monografia apresentada como requisito parcial para


obtenção do título bacharel, ao Programa de
Graduação em Filosofia, da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro.

Orientador: Prof. Dr. Fabiano Lemos

Rio de Janeiro

2018
"Não fui filólogo em vão, talvez o seja ainda, isto é, um professor da lenta leitura: —
afinal, também escrevemos lentamente. Agora não faz parte apenas de meus hábitos, é
também de meu gosto — um gosto maldoso, talvez? — nada mais escrever que não leve ao
desespero todo tipo de gente que “tem pressa”. Pois filologia é a arte venerável que exige de
seus cultores uma coisa acima de tudo: pôr-se de lado, dar-se tempo, ficar silencioso, ficar
lento — como uma ourivesaria e saber da palavra, que tem trabalho sutil e cuidadoso a
realizar, e nada consegue se não for lento. Justamente por isso ela é hoje mais necessária do
que nunca, justamente por isso ela nos atrai e encanta mais, em meio a uma época de
“trabalho”, isto é, de pressa, de indecorosa e suada sofreguidão, que tudo quer logo
“terminar”, também todo livro antigo ou novo: — ela própria não termina facilmente com
algo, ela ensina a ler bem, ou seja, lenta e profundamente, olhando para trás e para diante,
com segundas intenções, com as portas abertas, com dedos e olhos delicados... Meus
pacientes amigos, este livro deseja apenas leitores e filólogos perfeitos: aprendam a ler-me
bem!".

Friedrich Nietzsche – Aurora, Prefácio (1886)


SUMÁRIO

0 PROPILEU: problema da leitura [em Nietzsche]............................................. 1

1 FILOLOGIA CLÁSSICA.................................................................................... 4

1.1 O Classicismo Alemão............................................................................... 6

1.2 A Filologia de F.A 20


Wolf.............................................................................

2 NIETZSCHE, FILOLOGIA E 24
CLÁSSICISMO...............................................

2.1 Homero e a Filologia 25


Clássica...................................................................

2.2 Ruínas......................................................................................................... 30

3 CONCLUSÃO...................................................................................................... 35

4 BIBLIOGRAFIA.................................................................................................. 37
1

0.PROPILEU:
o problema da leitura [em Nietzsche]

Atualmente, Nietzsche tem suscitado interesse tanto pelos críticos acadêmicos quanto
de um público não especializado. Desde do início do séc. XX autores importantes da filosofia
como Heidegger, Benjamin, Jaspers e Deleuze tem se ocupado de interpretar ou recriar os
problemas das suas formulações. Por sua vez, no público não especializado, Nietzsche
também goza de um prestígio incomum entre os autores de filosofia, máximas como "Deus
está morto", encontrada em sua Gaia Ciência, são amplamente reconhecidas e utilizadas fora
do círculo acadêmico.

Seu estilo intempestivo, orientado aos fragmentos e a polêmica, sem dúvida contribuiu
para a evidência do seu pensamento desde então, entretanto, a violência e popularidade destas
formulações por vezes soterram o significado estratégico que estes movimentos retóricos têm
para a filosofia de Nietzsche. Neste sentido o texto de Nietzsche sofre de uma dupla
desvalorização: primeiro, no universo acadêmico, que tem dificuldades em sintetizar como
doutrina os seus fragmentos e não acabamentos, legando a estes elementos um caráter
meramente poético. Segundo, nos leitores mais casuais, que, ao inverso, passam ao largo das
correlações conceituais presentes nestas formulações em favor de suas passagens mais
polêmicas e sedutoras.

Estas dificuldades com o texto de Nietzsche parecem estar compreendidas na relação


entre três eixos fundamentais da hermenêutica: o autor, a obra e o leitor. No caso da autoria,
Nietzsche ao longo de sua obra testa constantemente os limites desta determinação, chegando
ao ponto de assinar seu Ecce Homo1 como “Dioniso contra o crucificado”. No que cerne a
noção de obra em Nietzsche também está constantemente em jogo, quando consideramos o
fato de que poucos textos foram elaborados no modelo clássico de um livro2 a ser publicado.
E por fim, na dimensão de seus leitores, existe uma constante preocupação de Nietzsche sobre
quem seria seu leitor ideal e qual seria a práxis de leitura que interessa a seus textos. Cada um
destes elementos oferece um desafio a parte, cujo o estudo, pela complexidade e relevância,
não temos condições de empregar aqui. Entretanto, não é por acaso que Nietzsche testa
constantemente os limites destes eixos hermenêuticos que citamos. Existe um tema, apesar do

1
NIETZSCHE, Ecce Homo
2
Somente a genealogia foi para ser publicado
2

caráter fragmentário de sua obra, que parece reunir e ser constantemente requisitado, mesmo
que de maneira indireta, para redimensionar estes problemas – a filologia clássica.

O tema da filologia clássica até pouco tempo recebia pouco protagonismo dentro do
quadro de leituras de Nietzsche3. No entanto, o fato de que Nietzsche assinava
orgulhosamente seus papéis como professor de filologia não parece ser um elemento menor
da sua biografia. Esta miopia parcial parece se instaurar desde o início da recepção póstuma
de seus textos. Uma chave de leitura que colocava em evidência o Nietzsche filósofo enterrou
no obscurantismo a necessidade de se abordar positivamente a sua atividade como professor
de filologia clássica da universidade da Basiléia. Esta narrativa, que valoriza o filósofo sobre
o filólogo, deve-se em grande medida ao trabalho editorial póstumo praticado pela irmã e pelo
amigo pessoal de Nietzsche, Elizabeth Föster-Nietzsche e Peter Gast. Estes dois nomes foram
responsáveis por lançar na história a primeira impressão sobre o que seria a obra de
Nietzsche, e o lançaram como o primado do gênio filosófico, que superou as limitações
institucionais da filologia em direção a filosofia da vontade de poder. Hoje é sabido que a
falta de critério desta edição vinha seguido de perto pela agenda política pessoal de Elizabeth,
a quem interessava em transformar o irmão em porta-voz filosófico do antissemitismo do qual
ela era entusiasta, a esta agenda não convinha revelar o fracasso de Nietzsche como filólogo
em Basiléia. Por mais que hoje esteja provado a manipulação pouco científica de Föster-
Nietzsche e Gast, a cristalização de Nietzsche como filosofo ainda faz sombra sobre as
determinações e exclusões que formam a obra de Nietzsche. Fato este que se reflete na
dificuldade de encontrar traduções do material pregresso aos anos de 1872, ou seja anterior ao
Nascimento da Tragédia e relativo a filologia.

Aqui nos encontramos com um quadro curioso; é uma cristalização de leitura da obra
de Nietzsche, baseada na exclusão do tema da filologia e suas implicações, que termina por
reforçar estas exclusões que estabelecem este modelo de leitura cristalizado – uma espécie de
círculo hermenêutico vicioso que projeta constantemente uma sombra sobre si mesmo.
Nietzsche parecia estar ciente desta possibilidade de uma hermenêutica viciada, em sua
palestra de 1869, intitulada Homero e a filologia clássica, ele expõe de maneira crítica aos
seus colegas filólogos uma semelhante tendência circular. Operando uma intrincada rede de
referências, Nietzsche provocará seu público expondo o caráter ideológico e projetivo que

3
James Porter, Rafael Girardot são alguns dos poucos nomes que trabalharam a questão da filologia ou
diretamente as suas aulas como foi o caso de James Whitmann que traduziu o curso dos pré platônicos.
3

existe no esforço de leitura dos clássicos. E então, usando a figura de Homero, ele pergunta –
"Fez-se então um conceito a partir de uma pessoa ou uma pessoa a partir de um conceito?"4.

Os elementos em jogo nessa palestra mostram uma economia crítica já bastante


refinada, dois deles nos parecem fundamentais por sua capacidade estruturante: primeiro, o
fato de que esta fala foi proferida na ocasião de sua posse à cátedra de filólogo, ou seja, este é
seu movimento inaugural como professor de filologia clássica. Em segundo lugar, que
Nietzsche tenha articulado sua crítica através da questão homérica, que tinha importância não
só no debate científico como também no classicismo cultural alemão. Esta palestra procura
conjugar ciência e cultura, ao mesmo tempo que formula uma crítica de bases filosóficas
sobre os fundamentos da filologia, ou seja, da linguagem.

Homero e a filologia clássica opera de maneira crítica aqueles três eixos


hermenêuticos – autoria, obra e leitor – e o faz conjugado de maneira indistinta com uma
crítica aos fundamentos da filologia clássica. O tema da filologia está na base de uma crítica
acerca destes elementos que se desenvolve de maneiras nem sempre explicitas na sua obra.
Em última análise, o argumento presente na palestra de 1869, ao expor o caráter
extemporâneo da leitura dos clássicos, ensaia a base do projeto crítico do modelo de verdade
que determina a experiência de leitura em geral na modernidade. O que justifica a importância
do tema da filologia para a capacidade de contribuir enormente para a leitura de Nietzsche.5

Portanto este trabalho procurará concretizar a importância do tema da filologia. Para


tal, nos parece decisivo recriar alguns elementos principais do quadro cultural e institucional
do classicismo e da virada científica promovida por F.A Wolf nas ciências da antiguidade. De
posse deste quadro, poderemos compreender que as críticas de Nietzsche estão imersas em
um horizonte cultural e institucional mais complexo e que seu trabalho crítico não depende
necessariamente do fim do seu ciclo como professor de filologia – pelo contrário, a influência
deste quadro talvez possa ser reconhecida inclusive nos seus escritos mais tardios.

Por fim, um último esclarecimento. O título deste trabalho remete a um símbolo


central para o classicismo alemão do séc. XVIII ao qual Nietzsche se filia – o signo da ruína.
Este signo está no centro de uma complexa relação entre cultura, ideologia e estética que será
articulada por Winckelmann e Goethe através do sentimento de nostalgia. Nietzsche irá
explorar as consequências metafísicas deste sentimento pelas ruínas, levando à frente cada vez

4
NIETZSCHE, F. Homero e a Filologia Clássica, p.187
5
Concordam com isto Girardot, Porter, Lemos, Cavalcanti
4

mais as aporias presentes neste signo, ao mesmo tempo que vai esgaçando os seus limites
epistemológicos. Além da presença objetiva no tópico que escolhemos, o signo da ruína nos
parece também adequado na medida que resgatar a narrativa da filologia de Nietzsche
significa testemunhar os vestígios da sua incompletude latente.

1. FILOLOGIA E CLASSICISMO

No que interessa o classicismo Alemão, suas raízes dependem do próprio surgimento


do classicismo como força cultural na Europa. Após o período medieval se inicia um ciclo
especial para a filologia – o Renascimento. A partir do séc. XIV, primeiramente na península
itálica, começa um movimento de intensa valorização de um humanismo clássico, através
principalmente da retomada do espólio cultural pagão de Roma, que havia sido interditado ao
público por séculos pela igreja. Diversos nomes da cena cultural italiana passaram a se
dedicar ao estudo do passado, não só através de textos, mas também de investigações de
cunho arqueológico e da coleção de itens da antiguidade. Um caso paradigmático é o de
Francesco Petrarca (1304-1374), considerado por muitos o primeiro renascentista.

“Petrarca personificava o abrangente estudo da antiguidade clássica


latina, fundamentada na filologia e no antiquarianismo. Ele trouxe de
volta à vida o amplo estudo da ‘gramática’ antiga. Ele se tornou um
modelo para os futuros eruditos humanistas. No lastro de Petrarca a
erudição humanista se prestava a três trabalhos: (1) supervisionar a
pureza dos escritos contemporâneos (ou seja, o quão próximo ela
imitava um uso ideal da antiguidade), (2) achar, editar e avaliar textos
antigos; e (3) buscar a pesquisa histórica e antiquária.”6

Através deste crescente entusiasmo, que seguiu da Itália para o resto do continente, as
ideias clássicas de poética, arquitetura, proporção e filosofia em geral, penetram de maneira
incontornável nos círculos intelectuais europeus. De tal modo que ser intelectual significava
conhecer Cícero, Píndaro e Homero. A esta altura qualquer produção cultural só era legitima
se imitasse7 os princípios clássicos. Portanto, a filologia, ainda como um conjunto geral de
ferramentas intelectuais, volta a ser intensamente requisitada, de modo que intelectualidade e
filologia passam a ser indissociáveis. Esta onda cultural que impele o uso cada vez mais

6
TURNER, James. Philology, p.34.
7
LE GOFF, Jacques. Antigo e moderno, p.8.
5

intenso do ferramentário filológico é chamado de classicismo. Embora a diferença entre


classicismo e filologia nem sempre seja clara, podemos dizer que a diferença se determina
pelo horizonte técnico e prático da filologia, enquanto o classicismo tem a ver com uma força
cultural mais geral de tendência ao ideário greco-romano na Europa.

Um conflito cultural, que se inicia praticamente junto com o renascimento, serve como
um bom ponto de observação da diferença entre classicismo e filologia. Este conflito que
parece se desenvolver desde a poesia do séc. XII, irá encontrar no teatro francês do séc. XVII
o palco de uma disputa entre o teatro clássico e artistas que se recusavam a aceitar as
convenções desse modelo baseado na imitação dos clássicos.

“A mais célebre polémica entre Antigos e Modernos tem início entre o


fim do século XVII e o princípio do século XVIII. Desenrola-se ao
longo do século das Luzes e desemboca no Romantismo. Vê triunfar
os modernos com Racine et Shakespeare de Stendhal e o Préface du
«Cromwell», de Victor Hugo (1827), onde a oposição românticos-
clássicos mais não é que a nova roupagem do conflito modernos
antigos, estando as cartas baralhadas do ponto de vista cronológico,
pois que o herói dos modernos, Shakespeare, é anterior aos modelos
clássicos do século XVII.”8

Diversas rivalidades profissionais como a dos dramaturgos Hugo e Stendhal, movidas por
uma espécie de contra classicismo, apareceram na Europa ao longo dos sécs. XVII e XVIII.
Este debate, que foi chamado de querelle des anciens et des modernes, surge no horizonte
estético e vai ganhando contornos cada vez mais gerais e consequências cada vez mais graves.

O revelo da querelle afirma duas coisas importantes que nos servirão para aprofundar
a diferença entre classicismo e filologia. Primeiro, a querelle como conflito cultural traz para
o primeiro plano o forte caráter moral e ideológico do classicismo, deixando de lado os
aspectos técnicos da filologia. Este ponto será importante para Nietzsche e para a filologia na
Alemanha, quando as próprias inovações e descobertas técnicas da filologia irão se voltar
contra a antiguidade idealizada. O segundo ponto está intimamente ligado ao primeiro, o
conflito da querelle transforma o que era antes moderno em algo antiquado. Ou seja, os
pensadores que discordam do classicismo estressam o caráter conservador do classicismo,
este ponto também será importante para Nietzsche.

1.1 O Classicismo Alemão

8
Op.cit, p.10
6

Será ao longo do renascimento que o classicismo será assimilado pelas nações


desenvolvidas na Europa. Todavia, o caso Alemão será substancialmente diferente. Esta
diferença reside justamente no fato de que durante tal período a Alemanha não era uma nação
desenvolvida, ou nem mesmo uma nação propriamente dita. Contar a história do classicismo
na Alemanha é contar a complexa história de sua penetração tardia, que por sua vez depende
diretamente do contexto material de seu atraso em relação a seus vizinhos consolidados,
principalmente a França.

Segundo Norbert Elias, o fato da unificação e desenvolvimento tardios da Alemanha


no quadro Europeu é uma marca definidora da história e do habitus9 de seu povo. Dois
aspectos saltam de sua análise e nos interessam aqui. Primeiro, o caráter de continua tensão,
quase sempre violenta, na relação entre os povos do bloco intermediário europeu. "O processo
de formação do Estado entre os alemães foi profundamente influenciado pela sua posição
como bloco intermediário na configuração desses três blocos de povos.”10

O segundo aspecto nos interessa particularmente. Elias analisará que a fase medieval
do processo de formação do estado Alemão, por uma série de fatores, coloca o território
Alemão em profunda desvantagem aos seus vizinhos próximos:

"A fase medieval do processo de formação do Estado alemão, em


particular, que contribuiu significativamente para o fato de que na
Alemanha esse processo não acompanhou o ritmo dos processos de
formação do Estado em outras sociedades europeias.
No caso de países como a França, Inglaterra, Suécia e até a Rússia, a
sociedade medieval de Estados do tipo mais compactamente integrado
de monarquia absoluta, que era usualmente, mas forte nas lutas de
poder. Na Alemanha, o equilíbrio de forças afastou-se gradualmente
do nível de integração representado pelo imperador e inclinou-se a
favor do de príncipes regionais."11

O império germânico sofreu gradativamente o enfraquecimento do poder central. O


quadro que outrora tivera garantido a hegemonia de poder durante o período medieval, que
fazia do império germânico uma constante ameaça na geopolítica europeia, se tornou sua
9
ELIAS, Norbert, os alemães, p9: por “habitus” Elias significa basicamente “segunda natureza” ou “saber
social incorporado. (...) Assim, Elias afirma que “os destinos de uma nação ao longo dos séculos vêm a ficar
sedimentados no habitus de seus membros individuais”. ELIAS, Norbert, os alemães, p9
10
ibidem, p17
11
Ibidem, p18
7

fraqueza. Esta vaga integração do império produziu, através dos conflitos religiosos do séc.
XVI, as condições econômicas determinantes no atraso do processo de formação de seu
estado.

"No contexto do desenvolvimento alemão, esses trinta anos de guerra


representam uma catástrofe. deixaram marcas permanentes no habitus
alemão. Na memória de franceses, ingleses, e holandeses, o século
XVII é descrito como um dos mais brilhantes em relação ao
desenvolvimento destes povos, um período de grande criatividade
cultural e de crescente pacificação e civilização. Para a Alemanha,
entretanto, esse século foi um período de empobrecimento, inclusive
de empobrecimento cultural"12

Ou seja, no séc. XVII enquanto os demais países europeus gozavam da consolidação das suas
identidades nacionais e estruturas de estado, avançando decisivamente no debate cultural, a
Alemanha não tinha sequer suas fronteiras ou sua língua estabilizada.

Somado a estes dois fatores analisados por Elias, no mesmo corte temporal a
Alemanha atravessava também os desdobramentos decisivos da reforma protestante. As
supremacias do sobrenatural, do reino da fé, em termos de uma contraposição com a razão,
impossibilitam mais ainda a permeabilidade da Alemanha em relação as premissas do
Renascentismo Europeu13. Premissas estas que representavam de certa forma o seu progresso.
Ou seja, o pietismo de fundo Luterano implica em um certo anti-humanismo que ajuda a adiar
a penetração do retorno dos valores clássicos. A tradição pietista aprofunda a Alemanha em
um quadro de atraso cultural em relação a Europa, colocando no séc. XVIII uma tarefa
particularmente intensa de exercício das premissas do Renascentismo para uma reintegração à
cultura europeia.

Tal intensidade projetada por estas questões históricas ira instaurar o debate do
Classicismo intrinsicamente ligado ao problema da identidade e formação cultural Alemã, o
debate da Bildung. Da Aufklärung, passando pelo Classicismo de Weimar e chegando ao
Romantismo Alemão, o problema do Clássico será a trincheira preferencial de uma guerra
que os alemães, por conta do seu atraso material, já não podiam travar fisicamente. É na base
desta retomada às discussões europeias marcada por uma necessidade cultural de
renascentismo tardio que encontramos a figura de Johann Joachim Winckelmann (1717 -
1768).

12
Ibidem, p19
13
Cf. BORNHEIM, G, “introdução à leitura de Winckelmann” in Artes & Ensaios, p. 145
8

Anteriormente a Winckelmann o discurso acerca da antiguidade [Altertümer] se


situava principalmente no círculo cultural conhecido como antiquários, uma prática
estabelecida desde o séc. XVI. Thomas Kaufmann analisa que o Antiquarianismo seria o
esforço de colecionar ou reproduzir documentos e objetos antigos dentro de um interesse
muito mais geral e empírico do que crítico 14. Tal prática era importante para o
estabelecimento de pesquisas historiográficas sendo muitas vezes a única maneira de se
relacionar com objetos antigos. Ali a descrição dos objetos antigos viria acompanhada no
máximo de comentários eruditos que visavam um reconhecimento geral de características de
autoria dos objetos ou documentos - Kaufmann chamará isso de "Connoisseurship"15. É no
lapso deste discurso, de preocupações estritamente empíricas e imediatas com o objeto, que
Winckelmann, mediante um contexto de ideias estéticas e complexos históricos, irá se
estabelecer.

O surgimento de Winckelmann no quadro do Classicismo Alemão se inicia dentro


desta diferenciação com a tradição do Antiquarianismo. Winckelmann vai substituir a
erudição pragmática dos entusiastas por uma crítica, científica16 nas suas pretensões, do objeto
e da história da arte. Sua educação estética remete aos dois anos em Halle (1738-40) onde
teve contato com as ideias gerais da estética corrente representadas principalmente pelas
ideias de Leibniz, Christian Wolff e Alexander Baumgarten17.

Gerd Bornheim explica no seu artigo de 1961, Introdução à leitura de Winckelmann,


outro aspecto importante do discurso de Winckelmann acerca da arte. Bornheim pensará a
forma como a estética de Winckelmann estaria articulada também à uma recusa dos valores
barrocos, principalmente da arte barroca de Bernini18. É neste primeiro momento de crítica
14
Cf KAUFMANN, “Antiquarianism, the History of Objects, and the History of Art before Winckelmann” In:
Journal of the History of Ideas, p.536
15
Idem, p.529
16
É importante frisar a diferença entre a noção de ciência da época [Wissenchaft] para a noção contemporânea.
Não se trata em Winckelmann de uma Ciência comedida pelo método empírico e sim de uma noção geral de
sistema ou crítica. Kaufmann relembra a crítica de Waetzoldt sobre a diferença entre a prática antiquaria de
Sandrart, baseada em uma erudição mais geral [Gelehrsamkeit] de uma verdadeira Wissenchaft da história da
arte presente em Winckelmann com pretensões críticas (Cf idem, p527). Sobre as mudanças da noção de
ciência no pensamento Alemão entre os sécs. XVIII e XIX, ver Schnädelbach, Filosofia em Alemania.
Principalmente sessão 3.
17
Cf Aesthetics. Disponível em http://plato.stanford.edu/entries/aesthetics-18th-german/. Acesso em 10/08/2015
18
Cf BORNHEIM, Gerd, Introdução à leitura de Winckelmann, p.149
9

específica aos ensinamentos de Bernini que Winckelmann no seu texto de 1755, Reflexões
sobre a arte grega na pintura e na escultura, vai atualizar as ideias gerais da estética de Wolff
e Baumgarten com a intuição herdada das tradições antiquarias. Ou seja, Winckelmann vai
introduzir ao lugar comum da imitação da natureza a dimensão da antiguidade como valor.
Nas reflexões ele diz: “Mesmo se a imitação da natureza pudesse tudo dar ao artista,
certamente não lhe daria a exatidão do contorno, que só os gregos sabem ensinar” 19. É dentro
desta mistura de estética com um espírito de antiquário que Winckelmann irá se afastar, tanto
de uma estética que pensa exclusivamente uma perfectibilidade da imitação da natureza –
ideal coincidente em Wolff, Baumgarten e no Barroco - quanto um Classicismo Romanizado
que parecia dominar a Europa. Ainda segundo Bornheim: "De fato, antes de Winckelmann,
por maior que tenha sido nos países latinos a preocupação com os gregos, pode-se afirmar que
toda a cultura aquém dos Pirineus permaneceu sob o signo de Roma, e isso desde a
Renascença até o Barroco". Nos parece então que é a Winckelmann que devemos o primeiro
pensamento consistente da Grécia como ideal, é ele que vai colocar a Grécia no mapa do
pensamento do Classicismo Alemão subsequente. A centralização da Grécia como ideal
estético se provará vital para história ultrapassando as fronteiras da estética e do séc. XVIII
em muitos anos.

Ainda sobre esta eleição do Grego como ideal em recusa ao Romano, é possível
conectar uma influência Luterana; A aversão da tradição Luterana aos valores Romanos tem
papel central ao refrear o Renascentismo que ainda não tomara totalmente a Alemanha apesar
da grande força cultural. Ao identificar os valores católico-romanos com uma ofensa pagã ao
evangelho, Lutero influencia a Alemanha com uma certa atitude hermenêutica de
negatividade para com os antigos em geral e especialmente aos valores Romanos. Aqui, a
vitória hermenêutica de Lutero, se faz importante para o movimento de superação encontrado
em Winckelmann, quando no meio do século XVIII procura-se novos horizontes para além da
recusa Luterana do Romano. Estando Winckelmann posicionado no início deste golpe tardio
de um Barroco-renascentismo. Sobre isto Bornheim comenta um episódio elucidativo:

Em Dresden, para onde se mudara em 1748 e assumira o posto de


bibliotecário do conde Buenau, no castelo de Noethnitz, Winckelmann
sofre o impacto violento da arte barroca, sobretudo no Grosser Garten,
que oferecia na época mais de 150 estátuas de imitadores franceses,
italianos e alemães de Bernini. Em um local mais escondido e de

19
WINCKELMANN, Reflexões sobre a arte grega na pintura e na escultura, apud BORNHEIM, op.cit, p.149
10

difícil acesso do mesmo jardim, tinha a oportunidade de flertar com


algumas peças abandonadas de arte antiga [...]20

É aqui que a contribuição de Winckelmann se conecta com o pano de fundo de uma


reintegração da cultura alemã com a tradição renascentista refreada pelo pietismo anti-
humanista que mencionamos anteriormente. Quando em Winckelmann “a Alemanha começa
a desprender-se do exclusivismo de Lutero, buscando uma nova dimensão para a sua alma na
antiga Grécia"21 ela estará superando o quadro hermenêutico imposto por Lutero e se
reintroduzindo – mesmo que de maneira reacionária – na cultura Europeia.

Winckelmann na sua já referida obra de 1755 irá, dentro de um ataque mais geral a
arte Barroca, aprofundar sua recusa ao Romano, e consequentemente, fundamentar seu ideal
de Grécia. Ao se afastar do ideal Barroco e aconselhar aos jovens artistas a imitação do
clássico, Winckelmann consolida a Grécia no solo da formação estética da Alemanha. Como
atesta por exemplo a passagem: "As fontes mais puras de arte estão abertas: feliz quem as
encontra e as sorve. Procurar essas fontes significa partir para Atenas" 22 Onde mais uma vez
está contraposto a imitação da natureza, uma atitude Barroca, com uma proposta de retorno à
Grécia na sua “nobre simplicidade e calma grandeza”23.

Neste movimento de fundamentação de uma Grécia ideal já podemos perceber uma


primeira formulação da Grécia atrelada a um modelo pedagógico. Obviamente, se trata aqui
de uma pedagogia voltada principalmente para o artístico, entretanto não podemos deixar de
seguir a formulação até o lugar onde o modelo estético remete também ao gesto ético, em
última análise, esta formulação já apontaria para este povo Grego como modelo cultural para
formação [Bildung] alemã. Vemos aqui o início de um movimento do Classicismo que o
elevou a parte central da formação cultural Alemã.

Winckelmann parece visar um valor especifico da vida Grega que deveria ser imitado,
ele argumenta: "entre todos os povos antigos, os gregos foram os únicos que atingiram o

20
BORNHEIM, Gerd, op.cit, p.149
21
Idem, p.147
22
Apud BORNHEIM, Gerd, op.cit, p.150
23
WINCKELMANN. Réflexions sur l’imitation des œuvres grecques en peinture et sculpture, p. 122 apud
SÜSSEKIND, Pedro. A Grécia de Winckelmann, p.73
11

pleno desenvolvimento de sua forma e, por isso, o esplendor maior da natureza" 24. Nesta frase
podemos entender um aceno ético de Winckelmann, a proposta de imitação dos Gregos é uma
proposta de retorno a um tempo onde relação com a natureza se estabelecia de forma plena,
quando ele crítica a imitação da natureza de maneira direta, no seu tempo, talvez ele esteja
acenado para um tempo marcado pela falta. Sobre este ponto Bornheim esclarece:

A diferença entre o grego e o moderno reside em que, naquele, a


natureza já se presentava ao artista em seu estado de perfeição, ao
passo que para o moderno - e aqui vai implícita uma crítica ao
cristianismo - a perfeição da natureza perdeu-se25.

Não há outro caminho senão buscar a bela alma na Grécia antiga26.

É importante também comentar uma espécie de continuidade da prática do Antiquário


em Winckelmann. A medida que vai se estabelecendo seu discurso estético,
concomitantemente suas teses são aplicadas no exercício de descrição das obras de arte
Grega, aos quais ele se dedica especialmente. Tal exercício contribui dentro de uma esfera
prática para a crescente presença da arte Grega na Alemanha. Entretanto, o que era apenas
uma descrição empírica para a tradição do Antiquário, torna-se em Winckelmann uma
descrição vivaz, preenchida de um conteúdo crítico, ou seja, a prática do antiquário é também
atualizada em Winckelmann. Esta vivacidade com que Winckelmann descreve por exemplo o
grupo de estátuas de Laocoonte será importante no pensamento de Goethe acerca do Clássico
e da estética27.

24
Idem, p.153
25
Idem p.153
26
Sobre imitação em Winckelmann também coloca Pedro Süssekind “O único caminho para nos tornarmos
grandes e, se possível, inimitáveis, é a imitação dos antigos...” só pode ser interpretada corretamente a partir
dessa diferença entre imitação e cópia. Há um caráter contraditório evidente nessa formulação, uma vez que os
antigos são considerados pelo autor, mais do que grandes, inigualáveis, inimitáveis, mas são indicados como
modelo a ser imitado. Em outras palavras, o que Winckelmann propõe, a partir de sua constatação da grandeza
da arte antiga e da decadência da arte moderna (o Barroco, a pintura holandesa) é um caminho para alcançar a
grandeza, “se possível” uma grandeza tão “inimitável” quanto a dos gregos.” (SÜSSEKIND, Pedro. “A Grécia
de Winckelmann”, in. Kriterion, p.73)
27
Para mais sobre a Goethe e Winckelmann, suas relações estéticas e Classicismo, ver artigo de SELIGMANN,
Marcio, “Como um raio fixo Goethe e Winckelmann: Classicismo e suas aporias”, in. PHAOS
12

A partir destes elementos, nos parece seguro sentenciar: é Winckelmann que coloca a
Grécia no mapa cultural da Alemanha do séc. XVIII. Situando-a sobretudo como modelo
estético a ser seguido de forma ostensiva pelos jovens artistas. Os desdobramentos da sua tese
vão reverberar para muito além deste tempo. Problematizações posteriores como as de
Nietzsche, são impensáveis sem essa primeira ideia de Grécia. Até hoje, muitos discursos
filosóficos se estabelecem na performance da Grécia ideal como pensada por Winckelmann.

O gesto de Winckelmann se consolida, entretanto, circunscrito ao campo da arte. As


consequências ético-culturais estariam nos guetos das suas teses estéticas. Bornheim dirá que
não, ele analisa a existência de um programa mais amplo do que a agenda da arte na leitura da
seguinte passagem do texto História da arte na Antiguidade de Winckelmann: “A história da
arte deve mostrar sua origem, seu crescimento, suas modificações e sua queda, bem como
ensinar os diversos estilos dos povos, épocas e artistas” na sequência de "povo, épocas e
artistas"28 Bornheim vai suspeitar que já em Winckelmann se articula uma hierarquia que será
extremamente cara para uma Filosofia da história que surgirá na Alemanha. Talvez a
especulação de Bornheim seja corajosa demais, entretanto é impossível não concordar que a
estética pensada por Winckelmann vaza para fora do seu meio e influencia o círculo
intelectual da sua época e para além do fim estético 29. Herder que recolherá a lança para joga-
la mais longe. O conteúdo programático que Bornheim suspeita em Winckelmann, vai ser
explicitamente levado a cabo por Herder, principalmente no campo da teoria político-
histórica, da Kultur e da Bildung30.

Johann Gottfried Herder (1744 –1803), aluno de Hamann e Kant, vai ser o responsável
por uma Filosofia da história universal, onde o desenvolvimento orgânico dos povos e nações
será central. Em Herder, a pergunta sobre o destino da arte, passa a ser a pergunta sobre o
destino do povo e da Kultur Alemã. E, aceitando o ideal estético Winckelmanniano 31, ira
28
Cf BORNHEIM, Gerd, Op.cit, p.156
29
Algo parecido assere Süssekind ao estabelecer a influência do caráter histórico presente em Winckelmann até
Herder e Hegel (SÜSSEKIND, Pedro, Op.cit, p.71)
30
Para uma breve contextualização sobre a atuação de Herder no problema da Bildung Alemã ver NICOLAU,
Marcos, “Herder: uma proposta de reforma radical na educação” In Cadernos de Filosofia alemã n.2
31
Também sobre Herder e Winckelmann escreve Süssekind “Herder valorizava o direcionamento de
Winckelmann para uma interpretação direta e arrebatada das obras de arte particulares. Assim, a proximidade
por meio do sentimento se contrapõe à frieza da razão normativa, e a busca das condições de surgimento da
escultura, identificadas na observação da natureza bela dos corpos de atletas, indica um caminho teórico novo,
baseado na especificidade da cultura, da geografia e do clima.” SÜSSEKIND, P, Op.cit, p.70
13

perguntar sobre a relação profunda entre Gregos e Germânicos 32. As particularidades da


Filosofia de Herder nos interessam em diversos pontos, devemos nos dedicar um pouco sobre
eles.

Isaiah Berlin, importante filósofo do séc. XX, dedica todo um capítulo sobre Herder
no seu livro The Proper Study of Mankind. Lá ele aponta que "a fama de Herder se baseia no
fato de que ele é o pai das noções de nacionalismo, historicismo e de Volkgeist, era um dos
líderes da revolta romântica contra o classicismo, racionalismo e fé na omnipotência do
método científico"33. Ele denunciava que a premência das regras universais ao interpretar a
história, destruía aquilo que cada nação, povo ou período histórico tinha de especifico e
importante. É dado a ele o crédito de revigorar as noções de padrões sociais, crescimento
social, e a vital importância de considerar sempre os fatores, quantitativamente e
qualitativamente34.

Berlin vai dividir o pensamento de Herder em três tópicos principais: Populismo, a


crença no valor intrínseco de um grupo cultural - não necessariamente político, afastado de
um nacionalismo. Expressionismo, a doutrina de que a atividade humana, a arte em particular,
expressa toda personalidade de um indivíduo ou de um grupo, e vai sendo inteligível na
medida que vai se concretizando. E Pluralismo, que é a crença não apenas na multiplicidade,
mas também na incomensurabilidade dos valores entre as culturas e sociedades. Importante
salientar o fato de que as três teses acima, que para Berlin resumem o que há de original na
Filosofia de Herder, são incompatíveis com as doutrinas morais, históricas e estéticas centrais
para o Iluminismo, ou seja, assim como Winckelmann, as posições centrais de Herder são
confrontos diretos com as bases do Iluminismo e do Racionalismo, resumindo, de um certo
ethos moderno que estava se formando.

A ideia geral de Populismo presente em Herder, fala do passado e da obsessão


constante pela pergunta sobre a identidade Alemã. A esta pergunta, Herder responde com a
noção de Volk [povo], ou grupo cultural35. A tese do populismo pode parecer extremamente
kantiana, no sentido de que a ideia de povo possa soar como uma ideia universal que
prescinde da experiência do povo em questão - ou ainda uma ideia, que contrastada com

32
Cf BORNHEIM, Gerd, op.cit, p.156
33
BERLIN, Isaiah The Proper Study of Mankind, p.359
34
Cf idem, p.360
35
Cf BERLIN, Isaiah, Op.cit, p.367
14

realidade política de um reino dividido entre diversos príncipes, soaria como um apelo ao
unitarismo cosmopolita. Entretanto, no quadro maior do pluralismo, Herder consolida a
ruptura com os ideais iluministas. Aqui Berlin detecta também o emparelhamento do
populismo Herderiano com o sotaque do Iluminismo, entretanto, segue uma intuição:

“Todos parecem concordar que Herder surge como um típico, quase


corriqueiro, defensor das grandes ideias do Iluminismo do séc. XVIII,
ideias estas como, Humanismo, Cosmopolitismo e Pacifismo. (...).
Não é este, afinal, a evolução de outros pensadores da sua e da
geração subsequente da Alemanha? Quase sem exceção, eles recebem
a revolução Francesa de forma arrebatadora, plantando árvores de
liberdade, denunciando a obsolência e a brutal opressividade do
reinado dos trezentos príncipes Germânicos, até que, horrorizados
pelo Terror e feridos pela humilhação militar imposta pelos exércitos
revolucionários Franceses, aos exércitos Germânicos inda mais, os
Napoleônicos, eles se transformam em patriotas, reacionários e
irracionalistas românticos. ”36

Ao contrário do que achamos nas teses Iluministas, a noção de Povo em Herder é


altamente refratária a contornos idealistas. A ideia de populismo é marcada por um anti-
estadismo, sendo em sua raiz, anti-política. A noção de Povo em Herder é a ideia de que uma
nação nasce das necessidades geográficas, históricas e culturais, a este conjunto de fatores
empíricos deu ele o nome de "clima" 37. Somente por estas necessidades se justifica a união
dos indivíduos, e neste caso, uma união completamente natural, em oposição a união sintética
promovida pelo estado ou por conceitos abstratos como a ideia iluminista de humanidade 38. A
noção de Populismo é sobretudo anti-imperialista - é talvez aí que a intuição de Berlin mostra
seu valor, ao associar a narrativa desta ideia em Herder a um gesto histórico de horror perante
as agressões Francesas à Alemanha e consequentemente o repúdio ao imperialismo.

“Diga o nome de uma terra [ele pergunta no seu Cartas sobre o


progresso da Humanidade (1793-7) aonde os europeus pisaram sem se
corromper para sempre diante de uma humanidade indefesa e
confiante, pela palavra injusta, pelo engano ganancioso, pela opressão

36
Idem, pp.370-371
37
Cf, idem, p.378
38
O povo como conjunção circunstancias naturais parece ser central na filosofia de Herder, sobre isso atesta
Berlin in, op.cit, p.373 ou mais concisamente em p.374
15

esmagadora, pelas doenças, presentes fatais que levaram? 39

Esta passagem sintetiza o espírito anti-imperialista de Herder. Este gesto de repudia se


concretiza na esfera do pensamento em várias teses que irão combater uma resolução
universal para os povos. Aqui, Herder está diametralmente contra Kant e Hegel, e mesmo que
ele vá articular um conceito de Humanidade, em última análise o individual nunca deve ser
sacrificado no altar da abstração, por nenhum preço, nem mesmo pela paz perpétua ou pelo
espírito absoluto.

Sua contribuição para a estética e para a crítica literária se enquadraria na ideia geral
de expressionismo trabalhada por Berlin. Junto com a ideia da rejeição de valores absolutos,
surge a ideia de que a atividade humana intrinsecamente ligada a seu horizonte histórico do
qual ela é expressividade. Esta conclusão levada para o campo da arte, suspende a prescrição
de valores universais para o Belo40. Conclusão que vai dialogar diretamente com as aspirações
de Winckelmann, sua estética pretendia, mesmo diante de tensões, ultrapassar o objeto
artístico em vista do que, em última análise, é a ideia universal do Belo. Seligmann parece
correto a fazer apontamentos semelhantes:

“Os próprios termos da concepção do ideal grego já mostram que a


aporia se aloja na leitura que Winckelmann fez desse ideal (da estátua
grega) enquanto corpo esfacelado entre as polaridades
grandeza/nobreza e simplicidade/quietude. Esta polaridade, esta
tensão, é típica do universo intelectual de Winckelmann. Na sua visão
da Grécia não se pode separar o sublime do belo, assim como na
Modernidade qualquer tentativa de revitalizar a Antiguidade estará
condenada ao fracasso. Mas Winckelmann ainda quer acreditar nessa
possibilidade. Diferentemente de Herder (ou de Goethe), ele não é um
historicista.”

Em Herder a arte expressaria, não de forma menos importante, o clima, a


particularidade empírica da experiência de um povo 41. O ideal de artista está atrelado ao seu
projeto de valor de um povo, aqui, populismo e expressionismo se conjugam na importância
do Folklore. A mais alta meta do artista se confunde com a do poeta “O poeta é o criador do

39
BERLIN, Isaiah, op.cit, p.375
40
Cf, BERLIN, Isaiah, Op.cit, pp. 367-368
41
Berlin analisa “Herder says over and over again that the true artist (in the widest sense) creates only out of the
fullness of the experience of his whole society, especially out of its memories and antiquities, which shape its
collective individuality”, Op.cit, p.421
16

povo; ele dá um mundo a contemplar, ele segura esta alma em suas mãos. ” 42 “Ele é,
obviamente, em mesma medida criado por ele” 43. Esta formulação de Herder se provará
extremamente importante, se desdobrará de forma excêntrica nos projetos românticos de
Fichte, Schelling e Hegel, influenciará fortemente Goethe e mais tarde Nietzsche.

Seria impossível esgotar a contribuição de Herder para sua época de tão vasta sua
atuação. Herder contribuiu ativamente do campo da política à crítica literária, passando
inclusive por uma atuação direta no campo da pedagogia e da Bildung em 1776 quando aceita
o convite de Goethe, então conselheiro do Duque de Weimar, para o cargo de conselheiro do
Ducado44. O nosso interesse geral foi de desenhar os principais conceitos que possibilitem ver
Herder como um dos principais críticos do Iluminismo do seu tempo. Seus apelos às emoções,
às particularidades da ideia de povo, à historicidade na busca pela Volkgeist Alemão,
contribuirão de forma central para o surgimento do movimento conhecido como Sturm und
Drang45, o movimento proto-romântico da Alemanha no final dos anos de 1760. Este conjunto
de noções conceituais em si e o próprio advento do Sturm und Drang serão vitais para a
história do classicismo Alemão, para a Filologia e para Nietzsche respectivamente.

O Classicismo Alemão tinha agora um sentimento estético produzido por


Winckelmann e um programa cultural produzido por Herder. Entretanto, "Na literatura alemã
falta ainda, lamenta-se Herder, a grande obra, falta o Homero nórdico" 46. É Johann Wolfgang
von Goethe (1749 - 1832) que praticará o legado estético e teórico de Winckelmann e Herder
na literatura Alemã. Goethe sintetizará o sentimento estético de Winckelmann e o programa
Cultural Herderiano, sendo ele mesmo o experimento último do Classicismo.

Goethe nos anos de 1770 foi influenciado diretamente pelas ideias de Herder e
Hamann, o que resultou em sua adesão ao movimento cultural do Sturm und Drang. Sob o
prisma de Berlin é possível analisar um jovem Goethe dentro das mesmas chaves de
populismo, expressionismo e pluralismo com que lemos Herder. A atividade intelectual de
Goethe funciona dentro das mesmas bases da valorização do Gênio, da língua alemã e do

42
viii 344 apud BERLIN, Isaiah, idem, p.422
43
ii 160-1 apud BERLIN, Isaiah, idem.
44
Para mais sobre Herder e o problema da pedagogia e Bildung, ver o artigo de NICOLAU, Marcos, “Herder:
uma proposta de reforma radical na educação”, in: Cadernos de Filosofia Alemã
45
Cf, idem, p.419
46
BORHEIM, Gerd, op.cit, p.157
17

povo47. O que parece apenas similaridade para Seligmann é uma filiação, ele comenta o texto
"arquitetura alemã" de 1772: "[Goethe] defende uma arte que seja própria, ou seja,
genuinamente condizente com a deutsche Seele (a "alma alemã", XII, 14), e critica com verve
a doutrina do "bom gosto".”48 Logo, nos parece razoável dizer que Goethe contrai diretamente
de Herder a recusa a um espirito iluminista, normativo, classificador e universalista, o que
leva os dois a terem formações e até estruturas de pensamento bastante similares em diversas
ocasiões. Berlin detecta até uma repulsa de ideias francesas, no mesmo espírito de Herder:

Goethe diz praticamente o mesmo sobre Moses Mendelssohn. [um


iluminista judeu que viveu de 1729 a 1786 - comentário nosso] Ele diz
que Mendelssohn trata o Belo como um entomologista trata a
borboletas. Ele captura o pobre animal, prega-o, e conforme suas raras
cores se esvaem, lá está, um corpo frio sob o prego. Isso é estética!
Esta é uma reação muito típica da parte do jovem, Romântico Goethe
dos anos de 1770, sob a influência de Hamann, contra uma tendência
da parte dos Franceses pela generalização, classificação, medição,
organização em álbuns, pela produção de algum tipo de ordenamento
racional da experiência humana, deixando de fora o "élan vital", (...)49

Aqui o que Berlin detecta como uma influência de Hamann pode ser facilmente
estendida e até cooptada para uma influência de Herder. Apesar da esfera política estar
decidida por usa filiação a Herder, na esfera estética Goethe parece se aproximar mais de
Winckelmann, e isso compromete toda estrutura do projeto cultural em questão. Seu olhar se
volta ao clássico, à Grécia de Winckelmann, com a mesma admiração pela "calma grandeza e
nobre simplicidade". Em última análise, isto significa dizer que a expressão filosófica geral de
Goethe se situa de uma forma bem especifica entre a autenticidade do seu clima histórico,
como em Herder, e um impulso nostálgico para o clássico, como em Winckelmann.
Seligmann parece correto ao salientar o mesmo ponto: "A querelle des anciens et des
modernes expressa-se, portanto, no Goethe desse período, sob a forma de uma tensão entre os
polos da admiração pelos clássicos e o culto da "germanidade", ou seja, do próprio".50

Esta ligação com o classicismo de Winckelmann também se evidencia na aproximação


de Goethe com o Laocoonte, após sua visita à Itália entre 1786 e 1788, e respectivamente o
encontro com o Laocoonte, Goethe vai aprofundar seu classicismo estudando Winckelmann

47
Cf, SELIGMANN, Márcio, op.cit, p.170
48
Idem
49
BERLIN, Isaiah, Roots of Romanticism, p.51
50
SELIGMANN, Márcio, op.cit, p.171
18

diretamente. Em 1798, no primeiro volume da revista Propyläen ele publica o texto "Sobre o
Laocoonte" evidenciando a importância, tanto da experiência clássica no encontro com a
estátua, como a importância do classicismo de Winckelmann 51. No mesmo texto, além deste
ponto, Goethe irá enfatiza a esfera da presença na interpretação da arte, é preciso olhar a arte
clássica para poder então, falar sobre ela. É no campo da afetação apolínea da arte grega que o
artista alcança o que é mais próprio dele. Esta afirmação parece funcionar tanto em Goethe
quanto em Winckelmann.

Entretanto o que é apenas uma aporia lateral da teoria estética de Winckelmann (a


aporia aqui seria o paradoxo que existe em perseguir a imitação do que há de inimitável nos
antigos) é elevado em Goethe como dinâmica principal da formação do artista. Esta pequena
diferença distancia de maneira importante os dois classicismos 52. É neste gesto de imitação
tensionada com criação que Goethe vai comentar elogiosamente Rafael, Mestre da pintura
Italiana de 1483-1520, como “grego à sua moda”: “Ele não greiciza em parte alguma, mas
pensa e age totalmente como um grego"53. Ou seja, aqui interessa muito menos um resgate
objetivo de uma atitude grega, e sim um certo agir Grego. O Grego aqui merece ser
mencionado de modo respeitoso, pois é um povo que atingiu de forma admirável esse agir,
entretanto, o Grego é apenas um indicativo para este modo de ser. Lemos dá a mesma ênfase a
esta esfera do agir "Aquilo que a especulação sobre a cultura helênica poderia fornecer à
Kultur não era tanto a Ciência, mas a Ideia da Arte grega, que não pode ser conhecida, mas
diante da qual devemos agir."54

51
Cf. idem, p.178
52
Cf, também sobre o distanciamento entre os classicismos de Goethe e Winckelmann uma nota de rodapé no
artigo de Seligmann. Ele comenta uma carta entre Humboldt e Goethe: “Essa exigência da distância de que
Humboldt fala corresponde a uma postura refletida de filosofia da história diversa da de Winckelmann que via
na distância para com a Antigüidade não algo necessário, mas sim uma triste imposição de sua época. A utopia
da arqueologia consistia na reconstrução do passado através da pesquisa, análise, descrição e arquivamento dos
seus restos. Já Humboldt e Goethe estariam mais próximos das visões oníricas de Piranesi com suas misturas
de imaginação e imitação/ acúmulo de ruínas. Essa concepção difere também daquela iluminista que esteve na
base do projeto da Enciclopédia e acreditava em um armazenamento e em uma tipologia total do
conhecimento. In SELIGMANN, Márcio, op.cit, p.180
53
“Antik und Moderne”, Sämtliche Schriften, Artemis Verlag/DTV, vol. XIII, p.846 Apud SELIGMANN,
Marcio, op.cit, p.178
54
LEMOS, Fabiano, op.cit, p.126
19

Goethe responde de maneira assertiva a esta tensão temporal entre antiguidade clássica
e modernidade em formação. Esta tensão se plenifica e se resolve em termos de um agir
criativo. Este mesmo espírito está presente no artigo que Goethe escreveu sobre Winckelmann
em 1805:

"A Antigüidade deve aparecer para nós apenas à distância, apenas


separada de tudo que há de ordinário, apenas como passado. Ocorre
aqui, ao menos para mim e para alguns dos meus amigos, como o que
ocorre com as ruínas. Sempre nos irritamos quando desenterram um
meio enterrada. Isso pode no máximo significar um ganho para a
erudição às custas da fantasia"55

O classicismo que está em movimento em Goethe acumula o espólio contraditório do


idealismo estético de Winckelmann e o programa da individualidade histórica de Herder em
uma tensão muito delicada. Considerando o elemento do ressentimento do habitus Alemão
que exploramos anteriormente, a atividade Goetheana representa, sob este ponto de vista, uma
linha de escape, uma síntese entre o significado conservador e aristocrático do primeiro
classicismo e algo do significado progressista burguês presente no Sturm und Drang. Ou seja,
Goethe parece ser um primeiro triunfo do espírito Alemão em direção a uma bildung
unificada. É exatamente este poder genial de unificação do disperso, de preenchimento do
arruinado, que será elogiado sem comedimento por Nietzsche.

É importante notar que esta vitória de Goethe ainda não traduz a recuperação total da
Alemanha em relação a seus vizinhos. Certamente ali estão as condições propedêuticas que
possibilitam a Alemanha a readquirir seu lugar à mesa debates filosófico/culturais da Europa,
entretanto, é muito sintomático que o acontecimento de Weimar como grande centro cultural
tenha ocorrido ainda através do despotismo esclarecido do ducado de Weimar. Ou seja, o
classicismo de Weimar representa apenas a inauguração do espírito artístico alemão, faltando
ainda sua contrapartida física que só ocorrerá anos mais tarde com Bismarck. Esta vitória
parcial explica também a necessidade que Nietzsche e sua geração tem de retornar a este
classicismo e ao problema da bildung.

1.2 A Filologia de F.A Wolf

55
carta entre Goethe e Humboldt, apud SELIGMANN, Márcio, op.cit. pp.179-180
20

É diante deste espírito de contorno muito mais literário, que na passagem do séc.
XVIII para o XIX, Friedrich August Wolf dá um passo decisivo na história do classicismo
Alemão. Sua contribuição dará traços finais quanto a metodologia do estudo dos clássicos e
será um marco de reinauguração do significado da filologia clássica como instituição
científica - sendo considerado até hoje o pai desta disciplina como tal.

O feito de Wolf não parecia fácil; codificar uma disciplina cuja a amplitude engloba
diversas práticas eruditas, ao mesmo tempo que é tão cara ao horizonte simbólico da cultura
europeia e alemã. A realização de sua visão na filologia pode ser descrita como uma pequena
revolução copernicana - e nisto Wolf parece repetir na filologia o que Kant fez na filosofia. A
formula de seu sucesso reside no novo fôlego que sua atividade daria ao estudo dos clássicos
na Alemanha56, fôlego que depende mais do seu êxito como pedagogo que de suas inovações
técnicas propriamente.

Nascido em Hainrode, em 1759 (portanto contemporâneo dos debates do classicismo


de Weimar), Wolf ingressa aos dezoito anos na famosa universidade de Göttinger, onde
Gottlob Heyne era responsável por diversos avanços no campo do classicismo, principalmente
em leitura comparada e uma leitura crítica de Homero 57. Em 1782, Wolf publica uma edição
do Banquete de Platão que serve como passaporte para uma cadeira na universidade de Halle,
no departamento de filosofia e pedagogia.58

Em Halle, Wolf se dedica ao seu seminário de filologia, onde em pouco tempo se


torna o classicista dominante do norte da Europa 59. Apesar da grande importância técnica dos
seus textos, a sua personalidade como intelectual parecia ser particularmente magnética, de
modo que até Goethe se interessou em assistir seus seminários em Halle 60. De maneira que é
possível entender melhor sua contribuição analisando dois aspectos de sua práxis como
filólogo: Sua atividade pedagógica e sua revolução crítica, de bases metodológicas.

Em 1795 Wolf publica sua obra magna, Prolegomena ad Homerum. Um livro que será
absolutamente canônico para a atividade do classicismo Europeu desde então. Nada mais
natural que pensar que este livro seja o portador de inovações decisivas, e isto é verdade em

56
GRAFTON, Anthony, Prolegomena to Friedrich August Wolf, p.101
57
GRAFTON, AAnthony, Introdução. In: WOLF, F, Prolegomena to Homer. p.3
58
idem
59
Idem, p.4
60
Idem, p.3
21

alguma medida, entretanto, uma breve análise nos mostra que o ponto mais forte do
Prolegomena talvez seja mais o modo como se coloca as inovações, já que muitos pontos do
seu trabalho já eram populares nos círculos do classicismo Alemão. Turner demonstra no seu
livro chamado Philology, que Wolf em seu Prolegomena irá articular muito da filologia de
Heyne e da tradição da filologia bíblica:

“Heyne obteve sua teoria sobre os gregos antigos em parte pelo livro
de Wood ‘Original Genius and Writings of Homer’, e Heyne
provavelmente o introduziu ao jovem Wolf. (...) através filologia
bíblica de Eichhorn Wolf herdou os métodos de reconstrução de textos
antigos. De dentro da estrutura conceitual de Heyne e Wood, Wolf
aplica o método bíblico de Eichhorn a Homero. (A permeabilidade na
fronteira entre as várias regiões da filologia novamente fora
decisiva)”61

ele comenta ainda sobre o Prolegomena:

"[No Prolegomena ad Homerum] ele irá traçar meticulosamente, pela


primeira vez, a história do texto homérico na antiguidade. Ele mostra
o quão infrutífero é a esperança de saber qualquer coisa para além dos
textos que estão nas mãos dos críticos helênicos de Alexandria."62

Portanto a obra sobre Homero trata de uma elaboração exitosa e bastante incisiva
sobre diversas conclusões intelectuais que já pairavam na filologia de seu tempo. Não só
Turner que concorda com este ponto, Grafton também concorda e inclusive reputa a ele a
permeabilidade fácil do discurso de Wolf aos estudantes Alemães: "Não é de se estranhar que
os estudantes Alemães receberam o programa pedagógico de Wolf com tanta simpatia. De
maneira eloquente e incisiva, ele estava apenas dizendo o mesmo que intelectuais bem
informados já sabiam."

Grafton irá adicionar que ao contrário de Heyne, a "originalidade de Wolf" reside no


fato de que "ele desejava reformar a cultura contemporânea como um todo, bem como os
estudos clássicos"63. E é aqui que sua relação com Wilhelm von Humboldt traz ao programa
de Wolf sua esfera pedagógica urgente - aquela que reconfigura classicismo e formação sob o
esquema do problema da Bildung Alemã. Foi uma intensa troca de cartas entre os dois que
culminou na obra de Wolf de 1807, Darstellung der Altertumswissenschaft. Nesta obra está

61
TURNER, James, Philology, p.118
62
Idem
63
GRAFTON, Anthony, op.cit, p.108
22

presente o caráter central que o estudo dos clássicos tem para a formação do homem. A
importância do classicismo em Darstellung se afasta do campo de uma imitação artística,
agora, trata-se de um exercício disciplinado de visionar todo um povo como meio para formar
o próprio espírito.

"Apenas esta abordagem é capaz de levar a um verdadeiro


conhecimento filosófico do homem. Já que isto nos força a exercitar o
caráter e a situação completa de uma nação, e compreender todos os
aspectos dela em correlação. O esforço para obter tal conhecimento -
posto que ninguém pode completar este propósito - pode ser dito
necessário para qualquer homem."64

Grafton e Turner parecem concordar que as inovações de Wolf, pelo menos em


Prolegomena e em Darstellung, estão imersos em heranças conceituais e ideológicas de
companheiros classicistas e intelectuais da Alemanha. A sua grande habilidade, ao qual
parece ter sido decisiva para seu sucesso como intelectual dominante na Alemanha, seria a
habilidade em "juntar materiais de áreas divergentes da filosofia e da erudição"65 mediante
um programa mais amplo e arrebatador. A atividade de Wolf como pedagogo aprofunda o
programa educacional de Heyne ao mesmo tempo que empresta seu modelo para os objetivos
da pedagogia humanista de Humboldt. Talvez esta habilidade reformadora seja a
característica que mais chama atenção ao jovem Nietzsche, que por vezes expressou seu
desejo próprio de reformar a filologia e a bildung Alemã.

O segundo ponto que nos permitirá recriar a contribuição Wolfiana reside na sua
revolução crítico-metodológica - a Altertumswissenschaft ou ciências da antiguidade. Esta
ciência se caracterizaria principalmente como um ultrapassamento do estudo dos textos em
direção as "condições da emergência dessa estética, tanto histórica quanto filosoficamente"66.
Lemos caracteriza esta virada metodológica como uma guinada Kantiana, já que a reflexão
passa do nível da imediaticidade dos textos para o movimento reflexivo com qual a própria
noção de texto se estabelece. Podemos ver essa atitude claramente na questão Homérica
presente no Prolegomena, Turner observa bem ao dizer que "Ele [Wolf] traça

64
Apud GRAFTON, Anthony, op.cit, p.109
65
idem
66
LEMOS, Fabiano, op.cit, p.128
23

meticulosamente, pela primeira vez, a história do texto homérico na antiguidade"67. Grafton


vai sublinhar o mesmo comportamento:

"Um jeito mais preciso de expressar tal diferença seria o de dizer que
Wolf escreve a história da erudição ao invés da história dos escólios.
Ele sabia que os escólios precisavam de análise, que os Alexandrinos
precisavam de bibliografia e datas confiáveis. Mas o que ele
reconstruiu foram os métodos técnicos que cada um dos críticos
antigos usou - e, através deles, reconstruiu a história do destino de
Homero."68

É esta mudança de paradigma que possibilita um arejamento dos limites da filologia,


agora ela está livre, pelo menos em parte, das determinações do classicismo como moral. A
filologia poderia então explorar o potencial infinito de um caráter científico, que
crescentemente se tornaria uma exigência histórica daquele tempo em diante. Tudo isto, ao
mesmo tempo que cria condições para que o estudo destas minúcias do mundo antigo esteja
em direção de um projeto muito mais amplo, não só de descoberta científica de um mundo
historicamente díspar, mas de um exercício disciplinado de erudição que leva decididamente a
uma bildung segura e desejável. Wolf parece ouvir com precisão duas necessidades históricas
urgentes, ciência e bildung, através do horizonte da forte herança cultural do classicismo.

Wolf conjuga, portanto, as características centrais do Classicismo Alemão que vimos


até aqui: o fim estético de Winckelmann está contemplado na medida que estudar os antigos
fornece um modelo de comportamento, portanto, também um modelo estético, necessário e
desejável na formação do povo Alemão. O historicismo de Herder reside na conclusão de que
o mundo Grego está decisivamente apartado do Alemão, tanto no tempo quanto na cultura. Já
Goethe e Wolf compartilham uma característica muito mais sutil, já que a iconoclastia
Wolfiana sugere um desacordo com a Grécia ideal do velho Goethe, mas, é possível aparentá-
los no poder que estas duas personalidades tiveram de agregação, cada um no seu campo da
intelectualidade. Esta força agregadora será incessantemente lembrada por Nietzsche na sua
primeira filosofia da cultura, e justificará a razoavelmente inusitada conjugação de Wolf e
Goethe, mas à frente.

2. FILOLOGIA E CLASSICISMO

67
TURNER, James, op.cit, p.118
68
GRAFTON, Anthony, op.cit, p.119. Também cf PORTER, James, op.cit, p.69 em diante
24

A primeira sessão deste trabalho procurou caracterizar uma visão de mundo clássica
presente na Alemanha do tempo de Nietzsche. Visão de mundo que surge inseparável das
contradições materiais do cenário político da Europa em relação a Alemanha, que acabam por
produzir particularidades conceituais de um classicismo que se caracteriza constantemente
como uma reação ao humanismo iluminado. O posicionamento da filologia de Nietzsche
depende fortemente deste quadro, não é à toa as diversas menções de Nietzsche nos seus
cadernos a estes nomes centrais do Classicismo que mencionamos anteriormente. Entretanto,
estas menções diretas, mesmo estas de seus cadernos privados, não revelam todas as nuances
do jogo de espelhos que é o posicionamento de Nietzsche em relação a cultura clássica e a
tradição magisterial de sua disciplina. Portanto, será nosso objetivo nas próximas páginas
revelar estas nuances da relação entre o projeto crítico da filologia de Nietzsche e o horizonte
cultural que estabelecemos.

Inesgotáveis seriam os ângulos através dos quais poderíamos adentrar esta questão,
dado a natureza ampla da atuação desta primeira filosofia da cultura de Nietzsche. Por sorte, o
próprio nome da sua formação guarda os elementos centrais que podemos analisar afim de
definir um angulo de entrada, portanto, seguindo esta pista, o primeiro esforço será o de
caracterizar o modo crítico com que Nietzsche opera a filologia/clássica: ou seja, a filologia
como ciência, o classicismo como estética e a tensão presente entre estes dois polos. Tensão
esta que havia se aprofundado desde Wolf em uma espécie de reedição filológica da Querelle,
ou, pelo menos, do embate ideológico entre o modelo de ciência moderno versus ciência mais
alinhada com o humanismo clássico, encenado pela disputa entre Sach-Philologie e a Sprach-
Philologie69

Talvez o texto mais expressivo das pretensões de Nietzsche neste contexto seja a
conferência dada em ocasião da posse da cátedra de filólogo na universidade de Basiléia, em
1869. Neste texto, Nietzsche irá fazer um apanhado crítico da sua disciplina manipulando um
problema fundamental da filologia clássica, a personalidade de Homero. É também neste
texto que podemos evidenciar os limites da sua subscrição em qualquer uma das pontas da
tensão entre ciência e classicismo, na medida que ele irá articular teses culturais, ou melhor,
sobre o significado cultural da filologia, em relação a formação Alemã [Bildung]. Ao mesmo
tempo que articula correntes culturais, segundo Porter, Nietzsche irá manipular ao mesmo
tempo um conjunto de conceitos que terão grande importância no quadro da filologia de
69
JENSEN, Anthony, An Interpretation of Nietzsche’s On the Uses and Disadvantage of History for Life, p.11
25

Nietzsche, conceitos estes que serão a base da implosão hermenêutica que ocorreria através de
toda a sua filosofia.

2.1 Homero e a Filologia Clássica

Lemos, analisando o aspecto cultural da conferência, irá detectar quatro pontos


principais presentes em Homero e a Filologia: (1) Conexão entre Filologia e Bildung 70. (2)
Ampliação da relação entre filologia e cultura pelo estudo da língua nacional 71. (3) Uma
recusa do princípio objetivo da Sach-Philologie em razão da Personalidade do filólogo72. (4)O
primado do artista sobre o filólogo 73. Lemos afirma ao longo dos pontos (1) e (2) que estas
teses estariam em sintonia com o senso comum da tradição magisterial que ouvia a Nietzsche.
Contudo, os pontos (3) e (4) se relacionam criticamente com o paradigma filológico de sua
audiência ao manipular aspectos do horizonte estético clássico em perspectiva do projeto
Wagneriano de reforma cultural. Comecemos pela questão da personalidade.

Logo de início, já no segundo parágrafo, Nietzsche atenta para a importância da


personalidade do filólogo para a cultura.

"As chamadas diversas orientações básicas da filologia irromperam


então em determinadas épocas, ora com uma ênfase maior, ora com
uma menor, de acordo com o grau de cultura e a evolução do gosto do
respectivo período; e por isso os indivíduos representativos daquela
ciência sempre costumam compreender as orientações que mais
correspondem a seu poder e querer como as orientações centrais da
filologia, de tal modo que a avaliação na filologia, na opinião do
público, depende muito do ímpeto da personalidade dos filólogos!"74

70
LEMOS, Fabiano, op.cit, p.136
71
LEMOS, Fabiano, op.cit, p.140
72
LEMOS, Fabiano, idem, p.142
73
LEMOS, Fabiano, idem, p.146
74
NIETZSCHE, Homero e a filologia clássica, p.180
26

Aqui Nietzsche apresenta uma tese mais branda sobre a personalidade 75, a saber, que a
formação depende menos do conhecimento e mais do caráter psicológico, ou melhor, em
termos Schopenhaurianos, a formação é do domínio da vontade. Esta tese ensaia a entrada em
uma questão mais delicada, que, podemos dizer, é o centro nevrálgico da conferência - a
questão da personalidade de Homero.

"Portanto, examinemos deste ponto de vista a chamada questão


homérica, de cujo problema capital Schiller falou como de uma
barbárie instruída. O problema capital ao qual me refiro é a questão da
personalidade de Homero."76

Lemos reputa a esta questão um posicionamento estratégico de Nietzsche, que teria


mais significado como negação dos princípios da Sach-Philologie do que realmente uma
concordância teórica com a Sprach-Philologie de seu mestre Ritschl77. Lemos parece correto
também em dizer que o ataque a Sach-Philologie significa um combate ao "advento de uma
objetividade pragmatista em ciência"78, associando este posicionamento estratégico de
Nietzsche mais a uma crítica institucional do que de fato uma associação com postiva com a
Sprach-Philologie. Neste sentido os cadernos do início da década de 70 apresentam menções
negativas diretas à Sach-Philologie através de um de seus maiores representantes, Otto Jahn:

"Basta que um alemão tenha descoberto um campo [científico] novo,


que exija uma enorme dedicação, mas que possa ser administrado com
pouco espírito, para que este se torne famoso, pois encontra inúmeros
seguidores. Daí a fama de Otto Jahn, tão bom homem, insensível e
sem brilho."79

Entretanto, é curioso não haver nenhuma menção diretamente positiva sobre a


filologia subjetivista, pelo menos que não esteja em função de sua crítica à bildung e as

75
Esta tese também está presente no fragmento 5[107] in. NIETZSCHE, Fragmentos póstumos (1869-1874),
p.143: A formação: segundo o caráter de representações ilusórias. Como pode se transmitir uma formação?
Não por meio do conhecimento, e sim por meio do poder da personalidade. O poder da personalidade reside
em seu valor para a vontade(...)” que acentua a relação com a filosofia de Schopenhauer por meio do conceito
de vontade.
76
Idem, p.184
77
LEMOS, Fabiano, op.cit, p.143
78
idem
79
NIETZSCHE, Fragmentos póstumos (1869-1874), 1[20], p.68. Outros fragmentos seguem o mesmo sentido
como 9[65] e 27[10].
27

instituições. Portanto, de fato, o argumento de Lemos salienta uma esfera importante da


questão da personalidade que é o seu inequívoco alinhamento estratégico com o projeto
reformador de cunho Wagneriano80. Em outras palavras, o posicionamento anticientificista de
Nietzsche está ligado à recusa ideológica de um panorama científico iluminista, nos mesmos
81
moldes em que Goethe havia criticado Mendelssohn e o impulso classificatório que ignora
outros aspectos da vida. Sendo este o motivo principal para uma reforma geral da bildung.

Portanto, a questão da personalidade nesta conferência determina do ponto de vista


ideológico o alinhamento anti-iluminista, no sentido preciso de uma objetividade pragmática
que visa tornar a ciência útil à civilização. Ao mesmo tempo, indica a subscrição de Nietzsche
ao classicismo pré-moderno, já que este classicismo guardaria a chave para uma renovação
cultural capaz de contornar o paradigma moderno de ciência mencionado. O que chamamos
aqui de paradigma pré-moderno é justamente aquele panorama do Classicismo de
Winckelmann, Herder e Goethe que trabalhamos na primeira sessão. Cada um destes nomes
tem papel importante neste retorno. Voltaremos a estas correlações mais à frente.

James Porter, ao analisar a mesma conferência, irá salientar a questão da personalidade


através de outro prisma, trazendo uma dimensão mais aprofundada dos entremeios da
hermenêutica filológica que Nietzsche já estaria enfrentando por ocasião de sua pesquisa
sobre Demócrito82. Ele diz:

"Originalmente imaginada como um ensaio "Sobre a personalidade de


Homero", este trabalho é uma brilhante apresentação do pensamento
sutilmente congestionado e autoimune de Nietzsche (...). Além de
levar adiante uma problematização e uma ampliação implícita do
ponto de vista de Lange sobre a Persönlichkeit, que dá ao ensaio seu
conteúdo "filosófico e estético", o ensaio também representa a
radicalização, e consequentemente a crítica, das suposições filológicas
existentes" 83

O que Porter chama de sutilmente congestionado seria o excesso de significância


projetado no problema da personalidade de Homero, que, ainda por cima, podemos adicionar
a dimensão da Bildung e da primeira filosofia da Cultura prevista por Lemos. Da parte de
Porter este congestionamento advém dos problemas hermenêuticos que Nietzsche passa a

80
Presente sobretudo nas conferências sobre os estabelecimentos de ensino e no nascimento da tragédia.
81
CF. nota 45
82
PORTER, James, op.cit, p.3
83
Idem, pp.62-63
28

enfrentar crescentemente ao exacerbar as próprias suposições da filologia durante a pesquisa


sobre Demócrito84. Embora não possamos reproduzir aqui a pesquisa de Porter, a hipótese
central que nos interessa seria que: durante a pesquisa sobre Demócrito Nietzsche sofre a
influência do materialismo crítico de Albert Lange 85, juntamente a “um tipo especial de
Kantismo"86, chegando ao que Porter chamará de filologia cética 87. Esta filologia cética, por
sua vez, cria um ambiente em que os próprios princípios conceituais da filologia se voltam
criticamente contra ela mesma - uma espécie de virada reflexiva promovida por Nietzsche que
carrega a marca inequívoca do pensamento Alemã de sua época.

Portanto quando Nietzsche traz um questionamento sobre a personalidade de Homero,


para Porter, ele estaria "complexificando o significado do nome de Homero através da
forçada separação das questões do texto, autoria e atribuição no nível teorético de suas
construções."88 . O texto da conferência parece ter entrada para este tipo de deslocamento em
algumas passagens, como por exemplo:

"Não quero dizer que justamente com Homero o mundo moderno


aprendeu, mas que pela primeira vez experimentou um grandioso
ponto de vista histórico (...)Aqui se aprendeu a conhecer densas
representações nas figuras aparentemente fixas da vida dos povos
mais antigos; aqui se aprendeu pela primeira vez a reconhecer a
capacidade miraculosa da alma nacional [Volksseele] para verter a
situação de seus costumes e crenças na forma da personalidade" 89
(184-185)

ou quando Nietzsche salienta a diferença entre o poeta antigo e o moderno:

"A única diferença entre ambos diz respeito a algo totalmente


diferente do modo como surgiram seus poemas, a saber, à propagação
e à divulgação, numa palavra: à tradição."90

84
Idem, p.3
85
Idem e p.43 em diante
86
Idem, p.23
87
CF. idem, capítulo homônimo.
88
Idem, p.63
89
NIETZSCHE, Homero e a filologia clássica, p.193
90
Idem, p.191-192
29

Ou ainda quando arremata a questão: "[considerar] Homero como o poeta da Ilíada e


da Odisséia não é uma tradição histórica, mas um juízo estético."91

Se Porter estiver correto, o deslocamento hermenêutico da persönalischfrage da


objetividade individual de Homero para o domínio da ficção criada pela recepção, abre uma
dimensão importante para a filosofia de Nietzsche. Entretanto, o surgimento da hipótese de
Porter depende da escavação através da densa camada filosófica que Nietzsche coloca na
questão para que ela concorde com o projeto estético do Wagnerianismo. Este soterramento
estético não invalide a hipótese de Porter, apenas a torna complicada em termos do que está
em evidência no discurso de 1869. Aqui a aparente tensão entre o foco na dimensão cultural e
institucional promovida por Lemos e o foco na dimensão hermenêutica e filosófica proposta
por Porter nos ajuda a compreender o angulo de entrada que propomos no início desta
segunda parte do trabalho - que é a tensão entre os polos da filologia como ciência e do
classicismo como cultura.

Entretanto, o trabalho que tivemos em caracterizar o horizonte histórico-conceitual do


classicismo Alemão nos credencia a dar um passo além. É no contraste com a tradição
clássica que alguns aspectos desta tensão se aprofundam e que outros poderão ser testados.
Lembremos novamente da imagem do jogo de espelhos, será na manipulação da tradição
clássica e dos seus problemas correlatos, ora ampliando, reduzindo ou cortando estas imagens,
que Nietzsche produzirá uma nova aproximação filológica, que apesar de estranha aos seus
pares contemporâneos depende unicamente das radicalizações promovida com os aspectos da
tradição que procuraremos demonstrar a seguir.

2.2 Ruínas

A conferência sobre Homero não termina de maneira negativa. O jovem filólogo, após
apresentar um apanhado geral do estado da arte de sua disciplina e suas tensões próprias faz a
indicação mais perigosa de sua fala. Neste último movimento, que Lemos caracteriza como a
quarta tese apresentada na palestra, está o conteúdo mais polêmico em relação a tradição
magisterial alemã.

"Para a frustração daqueles que viam nele o futuro do


desenvolvimento da filologia clássica como ciência, a tarefa com que
investirá seu ensino não apenas vai de encontro aos critérios de

91
Idem, p.193
30

cientificidade - objetiva ou subjetiva - de sua profissão, mas destrói


completamente a autonomia do filólogo"92

O que está sendo apresentado é a subscrição da atividade filológica ao horizonte


criativo da filosofia, que, em termos da primeira filosofia da cultura está indissolúvel com a
figura do artista.

"Com isso deve pronunciar-se [o fato de] que toda e qualquer


atividade filológica deve ser abarcada e cercada por uma visão
filosófica universal [Philosophische Weltanschauung], na qual tudo
que é particular e isolado seja dissipado, enquanto rejeitável, e apenas
subsistam o todo e a uniformidade."93

Como Lemos bem caracteriza, é certo que este último movimento de Nietzsche é um
aceno ao golpe que será dado no Nascimento da tragédia submetendo o trabalho científico ao
artista94. Por este angulo parece seguro encerrar a correlação de Homero e a Filologia
Clássica, e, portanto, da tensão entre filologia e classicismo, como o retorno simples do
projeto estético de Winckelmann e Goethe. Mas há uma grande diferença entre o intento de
Nietzsche e estes intelectuais que iniciaram aristocracia estética grega na Alemanha, e esta
diferença não se resume apenas no óbvio elemento dionisíaco95.

O primeiro movimento de Nietzsche é contra Winckelmann. Em seus cadernos da


década de 70 estão registradas uma atitude de desconfiança do idealismo tradicionalmente
Winckelmanniano com que se trata a Grécia: "A antiguidade clássica (contra Wolf,
Winckelmann e Goethe)"96, ou "O helênico desde Winckelmann: a mais forte trivialidade...".97
A mais visível medida de Nietsche contra Winckelmann é a de introduz a distorção da Grécia
pré-clássica, do horizonte do dionisíaco, contra os a qual a "Nobre simplicidade e calma

92
LEMOS, Fabiano, op.cit, p.146
93
NIETZSCHE, Homero e a Filologia Clássica, p.198
94
LEMOS, Fabiano, op.cit, p.146
95
O que queremos dizer aqui é o que explica Roberto Machado na introdução de MACHADO, Roberto,
Nietzsche e a polêmica sobre o nascimento da tragédia, “Mas há uma grande diferença entre ele e os
pensadores que iniciaram a política cultural alemã de valorização da arte grega como modelo do que deve ser a
arte moderna (...) Nietzsche relacionará a serenidade apolínea com um aspecto mais profundo da Grécia, o
dionisiaco, que não tinha sido pensado por eles.”, p.11
96
NIETZSCHE, Fragmentos póstumos (1869-1874), 8[39] p.221-222
97
Idem, 3[75] p.113
31

grandeza" não são mais do que aspectos criados para conviver com as forças disruptivas do
dionisíaco. Entretanto o caminho conceitual que possibilita Nietzsche chegar a esta conclusão
merecem ser retraçados, já que ele revela um segundo distanciamento com Winckelmann que
guarda consequências para interpretação do classicismo como um todo.

Como vimos, Herder, contra a universalização do iluminismo francês decreta a radical


historicidade dos povos. Ou seja, nenhum povo tem o direito de medir o outro, dado que suas
condições materiais, e seu clima [Stimmung]98, são irreproduzíveis e incomunicáveis. A
fronteira da história impõe ao idealismo de Winckelmann e a imitação dos gregos, um
impasse incontornável. E Nietzsche, por sua vez, não pode abrir mão nem da atitude 99 estética
de Winckelmann, já que ela funciona como arma contra o paradigma objetivo estéril da
filologia, nem do historicismo fundado por Herder, que desde Wolf passa a ser parte integral
da filologia. Confrontado pela encruzilhada cultural, Nietzsche esbarra num paradoxo latente
do classicismo, de modo que será Goethe que irá fornecer algum horizonte de solução desta
aporia. Sobre esta relação de Goethe com a aporia classica Seligmann analisa o seguinte:

"Goethe oscila entre, por um lado, a afirmação da (originalidade da)


modernidade e do limite da relação - i-mediata - com a Antigüidade e,
por outro, o desejo de realizar esse mergulho no passado. Essa
ambiguidade em termos da filosofia da história espelha-se nas demais
polaridades: o desejo de contato direto com o modelo clássico
manifesta-se na técnica da descrição das obras da Antigüidade -a
ekphrasis da tradição retórica. Mas a descrição se constrói sobre a
corrosiva certeza dos seus limites: limites e fronteiras entre as palavras
e as imagens, mas também entre o logos e a Antigüidade(...)" 100

No sentido deste paradoxo Goethe é a manifestação mais clara da Querelle des


anciens et modernes no classicismo Alemão (e, talvez, na cultura Alemã em geral), pois nele
reside ao mesmo tempo a admiração pelos gregos (o antigo) e o culto à germanidade (o
presente). E ao contrário de Winckelmann, Goethe dá vazão a esta aporia ao passo que, como
vimos, Winckelmann parece lamenta-la. Portanto está aqui também um motivo muito sutil
que justifica a reclamação de Willamowitz-Möllendorf contra Nietzsche quando alerta para

98
Cf. nota 33
99
Aqui existe uma diferença sutil que, se não explicada, pode gerar uma contradição. A escolha da palavra
atitude em detrimento da escolha mais óbvia ideal, salienta que Nietzsche necessita mimetizar a atitude de
Winckelmann, aquela que impôs ao antiquarianismo uma visão de mundo estética sobre os objetos da
antiguidade e suas descrições. Já o idealismo de Winckelmann parece ser dispensável.
100
SELLIGMAN, Márcio, op.cit, p.169
32

seu afastamento de Winckelmann. De certa forma a prática de Winckelmann da descrição dos


objetos antigos só era necessária para suplantar uma falta que uma arqueologia ideal poderia
corrigir, já que os objetos da antiguidade eram expressões do ideal artísticos em si. Portanto
os adeptos da filologia de matizes mais objetivas como a Sach-Philologie podiam se sentir
possuidoras do legado do antiquarianismo a lá Winckelmann, e, portanto, poderiam se colocar
como defensores de sua Grécia ideal. Portanto a crítica de Willamowitz, neste sentido, mostra
como Nietzsche escolheu o conceito de classicismo de Goethe, que parece complexificar a
possibilidade de alcançar a antiguidade.

Goethe acentua a diferença entre imitação e inimitável, trazendo ao centro do seu


classicismo a aporia que Winckelmann lamenta. Por exemplo, quando sentencia "Que cada
um seja à sua maneira um grego! Mas que ele o seja" Goethe está descartando a imitação
pura e simples do que quer que seja o "Grego", já que "nem todos possuem a ocasião de
desenvolver perfeita e dignamente seu talento", ao mesmo tempo que “nenhuma época está
impedida de produzir o mais belo talento"101 na medida que é possível chegar ao mesmo nível
dos gregos através de uma atitude, desde que circunscrita a seus limites nacionais e
históricos102.

Portanto o classicismo de Goethe se distancia de um passado objetivo que nos fora


vilipendiado pela ruina, trata-se, porém, de uma atitude que depende da ruína enquanto tal. O
espírito, para Goethe, se desenvolve quando se supera a ruína através dela mesma.

"A antiguidade deve aparecer para nós apenas à distância, apenas


separada de tudo que há de ordinário, apenas como passado. Ocorre
aqui, ao menos para mim e para alguns dos meus amigos, como o que
ocorre com as ruínas. Sempre nos irritamos quando desenterram uma
meio enterrada. Isso pode no máximo significar um ganho para a
erudição às custas da fantasia."103

Aqui parece residir um elemento hermeneutico central do classicismo romantico de


Goethe, e embora ele tenha se retraido do horizonte romântico à certa altura de sua vida, fica a
dúvida de até que ponto este modelo foi abandonado. E se Nietzsche retorna a este modelo de
classicismo, até que ponto a ideia de grécia como ideal tem tangibilidade para além de um

101
GOETHE, antigos e modernos, in. Escritos sobre arte, p.233
102
Sendo possível enxergar neste ponto uma influência definitiva do historicismo de Herder
103
carta entre Goethe e Humboldt, apud SELIGMANN, Márcio op.cit. pp179-180
33

fantasma estratégico, que serviria como ponto de inflexão para a reforma cultural pretendida
pela sua primeira filosofia da cultura?

O classicismo tomado por este prisma parece guardar em si os mecanismos que são
capazes de demolir suas próprias suposições idealistas. Se isto é verdade, a exacerbação cética
da filologia de Nietzsche proposta por Porter acaba por ganhar mais um ponto de apoio. Logo,
ele estaria correto em afirmar que a relação de Nietzsche com o classicismo não é de uma
mera recusa do idealismo de Winckelmann ou um retorno meramente estratégio contra um
paradigma objetivo de filologia, o que estaria em jogo é um aprofundamento cego e radical
das premissas mais complexas do classicismo alemão, como observa Porter:

"E aqui Nietzsche age como um fanático que, no seu próprio


fanatismo, imerso na completa proximidade com a verdade da crença
que ele encarna, acaba por repelir até o mais entrincheirado de seus
colegas crentes com um mero golpe de vista. Nietzsche consegue
expor algo da íntima perversidade reprimida do classicismo"104

Este aprofundamento radical das suas raízes, sejam estas as raízes clássicas, filosóficas
ou filológicas, define o compromisso de Nietzsche com o seu solo histórico, fazendo com que
o exame pormenorizado deste solo enriqueça de maneira decisiva o entendimento de suas
teses no campo da filologia.

A filologia de Nietzsche portanto parte da ruína do classicismo, tanto da ruína como


conceito articulado por Goethe quanto pelo estado de depredação causada pela constante
agressão científica da filologia pós-Wolfiana105. A este propósito é importante lembrar as
repetidas caracterizações da ciência como destruidora, como por exemplo neste fragmento da
primavera de 1870: “O fim da ciência é a aniquilação do mundo. Acontece, no entanto, que
seu efeito imediato é semelhante ao de pequenas doses de ópio: fortalece a afirmação do
mundo”106.

A ruína do classicismo, portanto, poderia ser escoada pela filologia, o que faria de
Nietzsche um quadro perfeitamente adequado da filologia do seu tempo. Este certamente não
é o caso, porque Nietzsche também parte da ruína da filologia. Ora, uma parte desta ruína já
104
PORTER, James, op.cit, p.184
105
O próprio “Homero e a filologia trágica” ressalta como os artistas, mencionando até Schiller, teria tomado
com agressão o manejo Wolfiano sobre a questão Homérica.
106
NIETZSCHE, Fragmentos póstumos (1869-1874), 3[10] p.100
34

foi mencionada e explicitada pela conferencia sobre Homero, a saber, o caráter fraturado da
filologia pós-Wolfiana. A outra e bastante significativa parte desta ruína é aquela exarcebação
cética que Porter menciona. A filologia cética de Nietzsche abre espaço para um concepção
muito parecida com a visão romântica de Goethe, esta coincidência é revelada no tratamento
que Nietzsche da a personalichfrage. Ou seja, se o sentido da personalidade de Homero reside
nos preconceitos estéticos de uma recepção posterior, não haverá nunca a possibilidade de
reabilitar o Homero factual. O trabalho da filologia é necessariamente lidar com os escombros
de uma imagem cuja sua manifestação será sempre necessariamente os escombros. É
necessariamente neste ponto que os polos tencionados da filologia e do classicismo se unem,
o aprofundamento de ambas as dimesções necessitam de uma resposta intelectual prática:

“A ilustração despreza o instinto: cree somente em razões. Os


românticos carecem de instinto: As imagens ilusórias da arte não os
estimula à ação, permanecem em seus estados de excitação. Tais
estados não se superam teoricamente até que sejam superados
praticamente”107

Nietzsche ao confrontar de um lado o ceticismo ilustrado da filologia, que se imobiliza


pela razão, e do outro o romantismo ingênuo, que se imobiliza pelo excesso de ilusões
artísticas, sintetiza uma resposta que reverbera a consequência do classicismo de Goethe, na
medida que a constatação da ruína deve levar à ação. Portanto, Nietzsche parte para fazer na
filologia o que Goethe fez na cultura alemã, uma reforma vertical dos seus princípios, e
exatamente aqui que a subscrição pretendida por Nietzsche do filológico ao artístico-
filosófico, adquire seu contorno mais complexo.

O modelo tático que Nietzsche imprime para a reforma da filologia será a reforma
promovida por Wolf. Nietzsche irá revisar os mesmos pontos que Wolf enfrenou para
imprimir suas mudanças na Filologia, a saber, uma recodificação 108 global da disciplina, a
importância na questão da Bildung e uma polêmica com o idealismo moral do classicismo.
Sendo que este ultimo ponto irá funcionar duplamente em Nietzsche, primeiro na sua
habilitação do dionisismo pré-classico e segundo no ataque ao idealismo que mascara os
problemas hermenêuticos de recepção dos textos antigos.

107
NIETZSCHE, Fragmentos póstumos (1869-1874), 5[45] p.131
108
O termo “recodificação” é usado de maneira consciente, porque se aceitarmos que Nietzsche articula em
grande medida lugares comuns da filologia do seu tempo, também nisto ele parece imitar a tática de Wolf, que,
como vimos, não parece ser original na substância de suas teses (como comentam Grafton e Turner) e sim no
modo como as fez ganhar capilaridade no meio acadêmico.
35

3. CONCLUSÃO

O estudo do horizonte da filologia em contraste com o classicismo europeu é uma


tarefa muito maior que a que tivemos condições de levar à cabo aqui. Sem dúvida este tópico
precisaria de uma análise pormenorizada de outros autores da Hermeneutica do séc XVIII e
XIX como também de Schiller, Kant, Schopenhauer e os Romanticos de Jena. Como também
se faria necessário uma análise direta do material utilizado por Porter para concluir à favor de
uma filologia cética em Nietzsche. Entretanto, repetimos o enunciado da nossa introdução que
é o de salientar a importância de um exame da narrativa da filologia para o quadro geral de
interpretações de Nietzsche.

Contudo, foi possível verificar, com alguma consistência, certas aproximações e


distânciamentos que de outro modo poderiam ser feitas de maneira muito superficial, como
por exemplo entre Goethe e Nietzsche, que, por vezes, tem sua proximidade resumida na
metafísica do artista de Wagner. Esta aproximação é absolutamente justa, entretanto, como
vimos, parece importante matizar algumas linhas de fuga do idealismo do classicismo de
Goethe, que, de outro modo, ficariam soterrados pelas diversas declarações em favor do ideal
grego de velho Goethe. Outra aproximação que ganha complexidade é o modo como a
questão da Bildung é levantada. É possível olhar a relevância da conexão epistemológica entre
Bildung e filologia para além de uma metafísica ingênua do nascimento da tragédia, onde um
leitor apressado poderia simplesmente justificar a bildung reformada pelo puro e simples
impulso artístico.

Mas, mais que estas verificações, a narrativa da filologia se valoriza pelo agregado de
questões que ela é capaz de trazer para uma leitura global de Nietzsche, por mais frágil que
possa ser a noção de leitura global de um autor tão fragmentário como Nietzsche. E talvez
seja justamente esse problema que se beneficie. Porque se olharmos atravéz dos impasses tão
jovens na linha de pensamento de Nietzsche, talvez ai esteja uma chave hermenêutica para
redimensionar os seus comprometimentos retóricos, ou seja, talvez, na questão da filologia,
esteja a chave para o entendimento das estratégias retóricas de Nietzsche, seu caráter
fragmentário, agonístico, autocontraditório, performático, em outras palavras – arruinado.

O curioso é que este trabalho de pesquisa (longe do ideal, é verdade) se concretizou


mimetizando um pouco da rigorosidade filológica que Nietzsche propõe. No sentido de que
tentamos nos ater a uma análise histórica e conceitual, e de retraçar não somente as filiações
36

históricas de Nietzsche, mas também de revelar algumas hipóteses sobre suas consequências.
Não sabemos se estas hipóteses são corretas, tampouco sabemos se elas são minimamente
aceitáveis, o que parece estar mais do que provado é que definitivamente o rigor filológico
que por acidente reproduzimos, enriqueceu decididamente minha formação, provando que
Nietzsche e a tradição da filologia alemã está correta em associar a disciplina da leitura ao
crescimento humano.

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