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2009

REVISTA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO IFAM

O CONCEITO DE CURRÍCULO: UM BREVE HISTÓRICO DAS


MUDANÇAS NO ENFOQUE DAS LINHAS CURRICULARES

Débora Lima Campos1 e Sebastião Constantino Brito da Silva2


1
Secretaria Municipal de Educação (SEMED)
(a-dcampos@bol.com.br)
2
Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Amazonas
(scbscefetam@uol.com.br)
anos

RESUMO
Este trabalho, para poder enveredar no que seja, deva ou possa ser entendido como currículo, vale-se,
de início, de um breve histórico das mudanças ocorridas no enfoque curricular a partir de uma concisa
análise da sociedade americana e brasileira. Por esse caminho procuramos esclarecer o porquê das
inquietações do desenvolvimento dos estudos de currículo. Em seguida, passamos a enfocar o significado
de currículo e, para melhor entendimento, nas diferentes linhas de abordagem, analisaremos algumas
definições de currículo para somente depois, traçarmos as consequências dessas ideias e, numa síntese,
definir as implicações de todo o estudo para o currículo.

Palavras-Chave: Currículo, conhecimento escolar, política educacional.

ABSTRACT
This work, in order to be able to embark on what is, should or can be understood as a curriculum, is
worth, at the beginning, a brief history of the changes occurred in the curricular approach from a concise
analysis of American and Brazilian society. In this way we try to clarify the reason for the uneasiness in
the development of curriculum studies. Next, we focus on the meaning of curriculum and, to a better
understanding, on the different lines of approach, we will analyze some definitions of curriculum for
later only, draw the consequences of these ideas and, in a synthesis, define the implications of the whole
study for the curriculum.

Keywords: Curriculum, school knowledge, educational policy.

ISSN: 1982-5498 ISSN-E: 2238-4286 Edição Especial – Novembro 2017 29


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INTRODUÇÃO problematização e questionamentos, tenso


a sociologia do currículo como importante e
As mudanças ocorridas na sociedade do fundamental elemento.
século XIX e XX, provocadas principalmente pelo
advento da era industrial, trouxeram críticas Da concepção do currículo
severas para o sistema educacional e para escola
como instituição social, criada para a transmissão As primeiras referências à expressão currículo:
dos conhecimentos. alguns estudos apontam que o contexto do
As críticas eram voltadas principalmente surgimento da expressão currículo é identificado
ao formalismo dessa instituição, sua disciplina com a Reforma Protestante do final do século
rígida, a limitação educativa situada nas matérias XVI, mais especificamente com o Calvinismo.
estanques e no conservadorismo que fazia as Possivelmente, o termo teria sido utilizado em
pessoas pensarem em repassar aos filhos aquilo 1582, nas escriturações da Universidade de
que haviam recebidos, sem se preocupar com Leiden (Holanda), mas o primeiro registro que
as mudanças da sociedade e com as novas dele se constata é o de um atestado de graduação
necessidades surgidas. outorgado a um mestre da Universidade de
Em razão desses fatos, foram criadas, nos Glasglow (Escócia), em 1663 (SAVIANI, 1994, p. 39)
Estados Unidos, de 1890 a 1920, várias comissões Os estudos mais específicos sobre o currículo
que influenciaram sobremaneira as decisões a tiveram início nos Estados Unidos, na década
serem tomadas no desenvolvimento do currículo. de 1920. Os movimentos migratórios e o
Assim, até ao final da década de 1930, grande amplo processo de industrialização geraram
impulso havia sido dado à educação e ao currículo a necessidade de mais escolarização, o que
obrigando as escolas a uma completa revisão, repercutiu diretamente nos currículos (BOBBITT,
atuação e atualização do pessoal atuante. 2004). O modelo institucional dessa concepção
A partir da daí a elaboração do currículo passa de currículo é a fábrica. A inspiração “teórica”
a ser responsabilidade da escola e dos professores, é a “administração científica” de Taylor (alunos
no sentido de encontrar os melhores recursos vistos como produtos de fábrica) procedimentos
materiais para sugerir atividades e experiências de e métodos com vistas a alcançar resultados que
aprendizagem, preocupação esta que chegou até pudessem ser medidos.
os dias de hoje. Considerando o sentido etimológico da palavra
Em meio a todas essas mudanças, nada tem currículo (em latim, curriculum), em sua origem
sido mais significativo, nem tão fundamental e abrangência significa o curso, o percurso, o
quanto as principais modificações que se têm feito caminho da vida ou das atividades de uma pessoa
no currículo de todos os níveis, desde a educação ou grupo de pessoas. Pode-se dizer que não houve
infantil até a universidade. alterações profundas até hoje, mas não podemos
Sua natureza decorre do fato de ser o currículo deixar de assinalar importantes variações de
o próprio fundamento de qualquer sistema de vocábulo, no uso e na apropriação do mesmo pelo
ensino. Ele é o elemento nuclear do projeto vocabulário pedagógico.
pedagógico da escola, viabilizando o processo Na aplicação do termo à educação, poderemos
de ensino e aprendizagem. Sendo assim toda encontrar uma variação considerando-se, na linha
e qualquer mudança não terá efeito, se não de evolução dos tempos, as diferentes concepções
acompanhar uma reconcepção de currículo. de educação e escola. Assim, vamos notar que o
Por isso, a finalidade dessa investigação é currículo se moldou respondendo à organização e
esboçar alguns dos ingredientes essenciais ao às necessidades de determinada sociedade, num
estudo da teoria do currículo: um breve histórico dado momento histórico.
das linhas conceituais curriculares a partir da
análise da sociedade americana e brasileira, como
um movimento de contínua análise, reformulação,

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Conceituação de currículo 84), sendo, no entanto, o papel do mestre preparar


o ambiente para que esta sucessão se faça de
Foram muitas as interpretações dadas ao tal forma que promova o desenvolvimento dos
conceito de currículo através dos tempos em alunos e os faça atingir os fins da auto direção, no
razão das transformações sociais, culturais e desenvolvimento de suas atividades. Entendemos
tecnológicas subjacentes às concepções de que a visão do autor é a de que o professor
mundo, de homem e de educação, formulado no tradicional não atuará na qualidade de transmissor
transcurso da história. Conceitualmente o currículo de conhecimentos. Através dessas colocações
tem sido interpretado como “lista de matérias a no que diz res- peito à definição de currículo,
estudar sob orientação do professor, experiências abordadas por Dewey e, complementadas por
de aprendizagem para desenvolver habilidades Kilpatrick, vemos já em seu tempo, e ainda hoje,
que preparem para a vida; seriação de estudos um avanço perante as ideias de currículo como
realizados na escola” (SOARES, 1993, p. 68). matérias ou disciplinas “feitas e acabadas”.
Todavia, mergulhando na definição de Muitos autores seguiram nessa linha traçada
currículo a partir do ponto de vista de alguns por Dewey, como é o caso de Bobbit (2004), que
autores especialistas no assunto como John em 1922, defendeu currículo como um conjunto
Dewey, William Kilpatrick, Franklin Bobbit, Ralph de série ou de coisas que crianças e jovens devem
Tyler, Hilda Taba, Michael Apple, Lina Traldi e experimentar para desenvolver habilidades que
outros, respeitado o tempo histórico em que os capacitem a decidir assuntos da vida adulta.
foram formuladas, buscamos apresentar algumas Nessa afirmação de Bobbit, já encontramos uma
dessas definições. preocupação em definir qual deveria ser a relação
Inicialmente, na década de 1930, sob a entre a estrutura do currículo e o controle e o
influência de John Dewey, o currículo passou a poder da comunidade – uma função social do
ser associado à vivência do aluno, às experiências currículo.
que possibilitaram aos indivíduos desenvolverem- Seguindo essa lógica, em 1935, surgem dois
se de forma satisfatória considerando as diversas teóricos afirmando que o currículo abrange todas
dimensões do seu ser. Nessa linha de discussão, as experiências do educando sob a orientação
afirma o autor: do professor (CASWELL; CAMPBELL, 1935).
Posteriormente, este conceito seria mais bem
O valor do currículo está na explicitado por Caswell (1938) quando ele diz que
possibilidade de mostrar ao currículo é tudo que acontece na vida da criança,
mestre os caminhos abertos
na de seus pais e de seus professores, explicando
à criança para o verdadeiro, o
belo e o bom, permitindo a esse ainda que “tudo que cerca o aluno, em todas as
mestre, determinar o ambiente, horas do dia, constitui matéria para currículo”
o meio necessário para o (CASWELL; CAMPBELL apud TRALDI, 1984, p. 34).
desenvolvimento do educando Portanto, para esses autores, tudo que rodeia o
e, assim, dirigir indiretamente a educando será parte do currículo: pais, materiais,
sua atividade mental, porquanto,
livros, edifícios, conteúdos, etc.
segundo ele, tudo se resume
na atividade em que entra a Está claro que nesta tarefa de planejar currículo
inteligência reagindo ao que lhe para que as atividades possam desenvolver-
é externamente apresentado se a contento, surgem autores que procuram
(DEWEY, 1959, p. 80). definir melhor os elementos constitutivos e as
responsabilidades de quem planeja. Estes autores
Reiterando as palavras de Dewey, um de serão mencionados a seguir.
seus colaboradores acrescenta: “currículo é uma Os estudos sobre currículo na perspectiva de
sucessão de experiências escolares adequadas organização e desenvolvimento começam a se
a produzir, de forma satisfatória, a contínua consolidar por volta de 1936, através de Harold
reconstrução da experiência” (KILPATRICK,1956, p. Rugg que atribuiu ao currículo uma questão

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técnica. Nessa perspectiva, o autor apresenta a fim de prover, aos estudantes, oportunidades
currículo como um programa integral da escola desejáveis de aprendizagem” (TRALDI, 1984, p. 35),
que deve envolver o que o professor e o aluno restringindo, no entanto, o currículo ao ambiente
faz e, como o fazem, direcionando para as tarefas escolar. No que diz respeito ao planejamento
essenciais envolvendo o planejamento e o das atividades pedagógicas o autor defende que
desenvolvimento do currículo, detalhado pelas “conteúdo e método não podem ser encarados
seguintes ações: determinação dos objetivos, como entidades separadas” (ibidem).
seleção das atividades e materiais de ensino e, Na mesma linha que restringe o currículo à
organização dessas atividades e materiais, para situação escolar, agregamos a definição de Vernon
o bom ensino (RUGG, 1936, p. 26 apud TRALDI, Anderson (1956, p.10) que também diz que
1984, p. 34). “conteúdo e método não podem ser encaradas
Todas essas tarefas citadas anteriormente como entidades separadas”, e ainda acrescenta: “o
serão recolocadas por Tyler (1983), considerado currículo inclui não apenas as experiências da sala
um clássico na discussão sobre o tema abordado. de aula, mas também as atividades extraclasses”
Na conhecida obra Princípios Básicos Currículo (IBIDEM, 1956, p. 11).
e Ensino o referido autor levanta questões Nessa concepção de currículo, não apenas a
comumente apontadas pelos educadores: Que experiência da sala de aula deve ser valorizada,
objetivos educacionais a escola deve procurar mas também as atividades extraescolares. Nesse
atingir? Como selecionar as experiências de aspecto, ressaltamos o desenvolvimento de
aprendizagem que possam ser úteis à realização atividades em bibliotecas, visitas a comunidade
desses objetivos? etc.
Dessa forma, observamos que Tyler também O foco principal na definição de currículo, mais
destaca a experiência do aluno como uma uma vez é o aluno, o ambiente sócio- cultural ao
problemática a ser pensada no planejamento qual estão inseridos e o ambiente organizado para
curricular, a qual deve ser articulada em cada etapa o desenvolvimento das experiências desejadas.
do planejamento como: elaboração de objetivos, Nessa nossa trajetória cronológica,
seleção e organização de experiências, bem como encontramos, em 1960, uma definição científica
na sua avaliação. que envolve e considera as estratégias e, portanto,
Nessa concepção, o currículo é visto como uma
a parte dinâmica do currículo, definindo-o da
prática neutra, instrumento de racionalização da
seguinte forma: “o currículo é a estratégia pela qual
atividade educativa e controle do planejamento.
as escolas tentam satisfazer os fins da educação”
O pensamento de Tyler influenciou nos estudos
(LEE; LEE, 1960, p. 145), complementando o seu
sobre currículo no Brasil, adotado como
pensamento, afirmam que o “currículo são todas
fundamento teórico na organização curricular do
as experiências da criança das quais a escola se
ensino na década de 1970.
utiliza ou tenta influenciar” (LEE; LEE, 1960, p.148).
Em 1953, William Ragan, em sua obra Currículo
Portanto, podemos inferir, tudo que acontece na
elementar moderno, concebe currículo como:
escola, de acordo com esses autores, envolve o
um recurso instrumental, que educando, as experiências e a situação ensino-
consiste em experiências por meio aprendizagem.
das quais as crianças atingem a Nesse sentido, teoria e prática, engrossa
auto-realização, ao mesmo tempo as fileiras, chamando atenção para o fato de o
em que aprendem a contribuir
currículo ser “um plano para a aprendizagem”, em
para a construção de melhores
comunidades [...] (RAGAN, 1973, que “tudo o que se conheça sobre o processo da
p. 23). aprendizagem e o desenvolvimento do indivíduo
terá aplicação para a sua elaboração” (TABA, 1974,
Além dos autores já citados, lembramos ainda p. 256).
de Edward Krug, em 1956, que define currículo Assim, é Taba quem chama a atenção para
como “todos os meios empregados pela escola a necessidade de elaboração e planejamento

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científico e racional na construção de currículos, remetem-nos a uma nova definição sobre


em que, a partir do diagnóstico das necessidades currículo: “são todas as atividades, materiais,
socioculturais dos educandos, se deter- minarão métodos de ensino e outros meios empregados
os objetivos a alcançar, a fim de que os estudantes pelo professor, ou considerados por ele, para
possam enfrentar as demandas da sociedade alcançar os fins da educação” (UNESCO, 1968,
no presente e no futuro, “participando como p. 30). Nesse sentido, percebemos que a ideia
membros úteis dessa cultura” (1974, p. 25). predominante desse documento sobre currículo
Ainda sobre currículo, a autora, também chama se reproduz nos espaços institucionais regida por
atenção para que, em função do que for levantado uma visão orgânica – consensual que media as
ou considerado como básico, se faça a seleção dos relações pedagógicas nas escolas.
conteúdos e se proceda à sua organização para, Influenciada fortemente por Tyler e Taba, em
então, determinar a seleção das experiências ou 1972, Lady Lina Traldi, propõe uma definição de
atividades de aprendizagem e sua organização. currículo como metodologia para a reconstrução
Finalmente, proceder-se-á à determinação do que curricular e o define da seguinte forma:
avaliar e dos meios e modos de fazê-lo.
Sendo o currículo compreendido
As preocupações de Taba em nível teórico
como todas as experiências
podem sem dúvida ser fundamentalmente organizadas e supervisiona- das
associadas à tendência tecnicista, embora um pela escola e pelas quais, portanto,
interesse em compreensão também se encontre esta assume responsabilidade,
em sua discussão sobre fontes de objetivos e cabe determinar na seleção
experiências de aprendizagem. A pesquisadora destas experiências aquelas
propõe um modelo de organização curricular que que sejam mais significativas
para o desenvolvimento e
envolve a determinação de: a) objetivos a serem formação máximos, completos e
alcançados; b) experiências curriculares; c) centros harmoniosos da personalidade
de organização do currículo; e d) um esquema de integral do educando (permitindo-
abrangência e sequência (TABA, 1974, p. 27 apud lhe alcançar a autor realização), ao
MOREIRA, 1997, p. 68). mesmo tempo em que estejam
O modelo proposto por Taba, no qual se em harmonia com as necessidades
da sociedade e com os fins mais
integrariam tanto o conteúdo como as experiências
elevados da humanidade em geral
de aprendizagem, pretende superar os problemas (TRALDI, 1984, p. 41).
dos modelos de organização curricular existentes,
inclusive o currículo centrado na disciplina. Vê- Essa é uma visão ampla e de ordem sistêmica,
se que a proposta de organização curricular da em que há um todo integrado para oferecer
pesquisadora corresponde predominantemente conjuntos integrados de oportunidades que
a um interesse em controle técnico, evidente em permitam aos educandos atingirem amplos e
sua ênfase nos elementos e passos incluídos no objetivos específicos. Estes serão continuamente
modelo. planejados, implementados, avaliados e revisados
Sendo assim, o “currículo da escola moderna para permitir contínuo replanejamento. Para Traldi
pode ser definido como a totalidade de (1984, p. 41) “todas as experiências selecionadas e
experiências da criança, pelas quais a escola organizadas sistemicamente pela escola somente
é responsável” (FLEMING, 1970, p.10), o que poderão ser encaradas na sua dinâmica processual,
foi corroborado por Doll (1964, p. 11), quando para levar o educando ao seu desenvolvimento
afirmou que “currículo consiste nas experiências pleno”. Nesse caso concordamos plenamente
que as crianças vivem sob a direção e orientação com a autora, para os quais através de processos,
da escola”, desta forma, esses autores acreditam podemos empregar conhecimentos não
que ao melhorar o currículo significa melhorar a meramente como um conjunto de informações,
qualidade dessas experiências. mas como um sistema para aprender.
O reforço e as definições dos diversos Seguindo em nossa ordem, “os currículos
especialistas abordados nos parágrafos anteriores escolares têm dado ênfase mais ao que já

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aconteceu do que está por vir, e que as pessoas por natureza inseparável ao da educação, como
e os programas escolares precisam ser orientados uma construção política, parte do pressuposto de
para o futuro, devido ao ritmo demasiadamente que a escola é o veículo dessa atividade política,
acelerado do mundo atual” (BERMAN, 1975, p. 34). ou seja, um modo particular de organizar o poder
Diz ainda que para chegar ao “núcleo essencial da e as influências que se encontram nas suas práticas
vivência e da compreensão humanas” (IBIDEM, cotidianas.
1975, p. 38), o currículo deverá buscar e estabelecer Por outro lado, o currículo não pode se reduzir
os “seus pontos de ênfase ou prioridades”, que são a uma atividade política, porque se poderia
os ingredientes dos processos fundamentais do considerá-lo um texto institucionalizado e, propõe
constructo curricular. a seguinte definição de currículo:
Mais uma vez, dentro da linha de evolução
que estamos seguindo, Alvin Toffler, em 1974, Defino currículo como uma
com sua obra Aprender para o amanhã: o papel solução necessária ao problema
de representação e o problema
do futuro na educação expõe sua preocupação
da representação como o objeto
com um mundo de amanhã turbulento e do discurso pedagógico. O objeto
de mudanças muito rápidas, que somente a do discurso coloca-se como um
educação poderá responder efetivamente à situ- domínio do pensamento e da
ação de aprendizagem se a ela incorporarmos o construção de realidades sociais
desenvolvimento de uma psicologia do futuro. quando a produção social e a
O autor acredita que somente a combinação reprodução se separam entre si
(LUNDGREN, 1997, p. 22).
de ação-aprendizagem com trabalho acadêmico
e de ambos com uma orientação para o futuro
Nesse caso, o currículo passa a ser um
criará uma motivação de aprendizagens intensas
documento escrito de solução de problema da
e fortes para o educando (TOFFLER, 1974).
Nessa concepção, há necessidade de se ter uma representação social1, que interliga os processos
educação para a mudança voltada para o futuro de produção e de reprodução, englobando a
em que se podem destacar vários modelos de seleção e conteúdos, a organização de conheci-
futuros possíveis, dos prováveis e dos preferíveis. mentos e destrezas e a orientação de método de
É claro que isto exigirá maior cooperação da transmissão de conhecimentos.
parte de todos (inclusive os alunos trabalhando Fundamentando-nos em José Pacheco
nesse sentido), bem como maior criatividade nas (2003), acreditamos que por ser a política uma
conjecturas acerca do futuro dentro do espectro necessidade para a vida humana, tanto individual
de mudanças. como coletiva, a política curricular representa a
Considerando o lado político e em oposição as racionalização do processo de desenvolvimento
teoria sobre currículo que Ralph Tyler formulara, do currículo nomeadamente com a regulação
em 1995, James MacDonald estabelece a seguinte do conhecimento, que é face visível da realidade
conceituação: escolar e com o papel desempenhado por cada
O parâmetro principal do currículo não é o ator educativo dentro de uma dada estrutura
aluno, nem a sociedade, nem a herança cultural,
1 Representação social é entendida aqui sob o ponto
mas o processo político de escolaridade. Assim, de vista de Denise Jodelet (2001, p. 27): é uma forma
pretendo dizer que o processo político é a rede de de conhecimento prático, de senso comum, que circula
estruturas, papéis, normas e relações interpessoais na sociedade. Esse conhecimento é construído de
que operam no processo de escolaridade conceitos e imagens sobre pessoas, papéis, fenômenos
do cotidiano. As pessoas constroem suas representações
(MACDONALD, 1995). nos seus grupos sociais, através das conversas, das
Para o autor, o currículo é um autêntico espaço visões, das crenças que veiculam. Assim, os conceitos e
público, ou seja, um espaço onde múltiplas imagens vão sendo aceitos, naturalizados, considerados
perspectivas podem ser articuladas em relação verdadeiros, embora sejam apenas representações.
Muitos dos preconceitos, dos estigmas, das exclusões
ao processo de ensino-aprendizagem. Assim, a de pessoas, decorrem desse processo e dos equívocos
importância dada por ele ao currículo, e que está que podem gerar.

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de decisões relativas à construção do projeto inter-relacionados. Esses contextos situam-se


formativo. em um ciclo contínuo de políticas e podem ser
Em termos formais, a política curricular genericamente definido como:
corresponde ao conjunto de leis e regulamentos
que dizem respeito ao que deve ser ensinado nas a) o contexto de influência consiste no
escolas. Pensando dessa maneira José Gimeno espaço-tempo onde os conceitos chaves são
Sacristán, define a política curricular como: estabelecidos para gerar o discurso político
inicial;
Toda a decisão ou o
condicionamento dos conteúdos e b) o contexto de produção do texto político
da prática de desenvolvimento do engloba a produção de diversos textos legais,
currículo, desde os contextos de oficiais, documentos e textos interpretativos
decisão política e administrativa,
que podem ser contraditórios tanto
que estabelece as regras de jogo
do sistema curricular. Planeja internamente, quanto na intertextualidade,
parâmetros de atuação com um onde diferentes grupos competem para
grau de flexibilidade para os controlar a representação e o propósito da
diferentes agentes que moldam política;
o currículo. Na medida em que
o regula, a política é o primeiro c) o contexto da prática consiste nas
condicionante direto do currículo
possibilidades e limites materiais e simbólicos,
e, indiretamente, é através da
sua ação que outros agentes são bem como na leitura daqueles que
moldados (SACRISTÁN, 1988, p. implementam a política;
129-130).
d) o contexto dos resultados diz respeito aos
Sob essa perspectiva, a política curricular é efeitos das políticas tanto nas estruturas e
uma ação simbólica, representando uma ideologia práticas quanto no impacto dessas mudanças
para a organização da autoridade e que abrange nos padrões de qualidade, liberdade e justiça
tanto as decisões das instâncias da ad- ministração social;
central como as decisões dos contextos escolares,
sendo implementada por intermédio de três tipos e) o contexto da estratégia política engloba
de instrumentos: normativos explícitos – leis, as atividades sociais e políticas de modo a
decretos-leis, portarias, despachos normativos; contribuir para a resolução/atenuação das
normativos interpretativos e subjetivos – circulares desigualdades, no fundo, a base da investigação
e ofícios circulares; documentos de orientação e social crítica.
apoio – textos de apoio, documentos internos da
Temos, pois, a partir desses autores, um avanço
escola.
significativo na compreensão do que seja política
Segundo Pacheco (2003), como a política não se
curricular porque, primeiro, não só definem a
reduz a um simples texto e o Estado é apenas um
política curricular como explicitam seu processo
dos teorizadores, os textos curriculares, oriundos
de construção e, o que é mais importante, sem
da administração central, são documentos de
dicotomizá-lo. Segundo, porque dão voz a todos
trabalho que simbolizam o discurso oficial do
os agentes políticos sem criar hierarquias entre
Estado que agrega interesses diversos e alianças
eles. Terceiro, e em conseqüência dos anteriores,
elaboradas a diversos níveis de ação.
reconhecem no processo político, uma relação
O autor afirma que as análises em política
dialética entre global/local, destacando não só o
curricular, para terem validade política e teórica,
movimento do global para o local, mas o inverso
devem considerar cinco contextos: contexto de
também. Quarto, destacam os conflitos políticos
influência, contexto de produção do texto político,
existentes nos diferentes contextos de produção
contexto da prática, contexto dos resultados e o
da política curricular, liberam não só a visualização
contexto da estratégia política, todos vistos como
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de conflitos culturais no processo de construção da características, ele assim sintetizava o sentido


política curricular como também de movimentos que dava à expressão que depois ia se tornar
hegemônicos e contra-hegemônicos no processo usual nos círculos educacionais:
político.
Refletindo acerca das concepções de currículo [...] os grandes grupos, a
da forma que estão tratadas ao longo do texto, utilização do elogio e do poder
que se combinam para dar um
onde se concebe currículo numa dimensão mais
sabor distinto à vida de sala de
ampla, observa-se: aula coletiva- mente formam
um currículo oculto, que cada
Sua forma de ser visto não como estudante (e cada professor) deve
produto, mas sim deve ser vista dominar se quiser se dar bem na
como uma seleção e organização escola. As exigências criadas por
de todo o conhecimento social estas características da vida de sala
disponível em uma determinada de aula podem ser contrastadas
época. Uma vez que essa seleção com as exigências acadêmicas
e organização acarretam opções ─ o currículo oficial, por assim
sociais e ideológicas conscientes dizer ao qual os educadores
e in- conscientes, então uma tarefa tradicionalmente têm concedido
primordial do es- tudo do currículo mais (JACKSON, 1968, p. 36 apud
será relacionar esses princípios SILVA, 1992, p. 94).
de seleção e organização do
conhecimento à sua estrutura
Outro teórico que chamou atenção para a
institucional e interacional nas
escolas e, em seguida, ao campo existência de um currículo oculto, embora sem
da ação mais amplo das estruturas usar esta expressão, foi Althusser em seu ensaio
institucionais que cercam a sala de Aparelhos ideológicos de Esta- dos, ao enfatizar
aula (APPLE, 1982, p. 30). a ideologia como tendo uma existência material:
“Uma ideologia sempre existe em um aparelho e
O autor citado dá muita importância à em sua prática ou práticas” (ALTHUSER, 1985, p.
hegemonia definindo-a como “um conjunto 89), em outro momento de sua produção, o autor
organizado de significados e práticas ligados considera o sujeito, como agente do seguinte
ao sistema central, efetivo e dominante de sistema: a ideologia existente em um aparelho
significados, valores e ações que são vividos” ideológico material, que prescreve práticas
(APPLE, 1982, p. 32). materiais reguladas por um ritual material,
Dessa forma, compreendendo o papel práticas estas que existem nos atos materiais de
ideológico da educação e, particularmente de um sujeito, que age conscientemente segundo
currículo, é que se torna possível fazer crítica à sua crença (IBIDEM, 1985, p. 92).
neutralidade, tratando de forma mais explícita É oportuno chamarmos atenção para o
os conflitos existentes na sociedade, conteúdo denominado currículo oculto, isto quer dizer o
que em grande parte está contido no currículo seguinte, que a escola, além de desenvolver o
oculto e, que sem revelar contribui para a currículo explícito, referente à transmissão do
manutenção da ideologia dominante. saber ao aluno, ela desenvolve também o currículo
A noção de currículo oculto tem exercido oculto no sentido referente à transmissão de
uma particular atração sobre aqueles que valores, normas e comportamentos. Assim,
analisam o funcionamento da educação e enquanto o currículo explícito hierarquiza os
sobre os educadores, de modo geral. Apesar graus escolares, o oculto desenvolve nos alunos a
de sua conotação crítica, foi um educador aceitação da hierarquia e do privilégio.
americano da ala conservadora, Philip Jackson, Para Apple (1982), a idéia de currículo oculto
quem primeiro usou o termo na forma em que é entendida como normas e valores que são
ficou conhecido. Num livro publicado em 1968, implícitas, porém efetivamente transmitidos pelas
Life in classrooms, em que analisava certas escolas e que habitualmente não são mencionados

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na apresentação feita pelos professores dos fins ou como desinteressadamente envolvida com a
objetivos. Ele ressalta que o conceito de currículo transmissão de conhecimento e, lança as bases
oculto aponta para o fato de que o “aprendizado para toda a teorização crítica em educação,
incidental” durante um curso pode contribuir mais argumentando fundamentalmente que:
para a socialização do estudante que o conteúdo
ensinado nesse curso. A educação constituiria um dos
principais dispositivos através
O autor salienta ainda que o papel reprodutor
do qual a classe dominante
da escola e do currículo, e a idéia de currículo transmitiria suas idéias sobre o
oculto, possam vir a ampliar-se e passar a significar mundo social, garantindo assim
não só o terreno por excelência de controle a reprodução da estrutura social
social, mas também o espaço no qual se travam existente. Essas idéias seriam
lutas ideológicas e políticas, passível, portanto, diferencialmente transmitidas,
de abrigar intervenções que visem as mudanças na escola, às diferentes classes:
uma visão de mundo apropriada
sociais.
aos que estavam destinados
Contudo, considerando a razão social da a dominar, outra aos que se
educação, é preciso reconhecer a importância destinavam às posições sociais
do currículo a partir de seu conteúdo filosófico subordinadas (ALTHUSSER, 1985,
e político, no qual está contemplada a idéia de p. 21-22).
homem livre e transformador, sujeito de sua
história, consciente de sua produção e, que Althusser (1985) explicita a respeito dos
permite se conhecer apreendendo a dinâmica mecanismos pelos quais essas diferenciadas visões
per- manente do movimento social. de mundo eram transmitidas. De forma geral, essa
Nessa direção, é compreendendo como as transmissão da ideologia estaria centrada em
formas culturais são (re)produzidas e reguladas matérias escolares mais propícias ao “ensino” de
na sociedade, os parâmetros que as orientam idéias sociais e políticas, como é o caso da História,
na escola, a valorização ou não das situações Educação Moral, Estudos Sociais, mas estariam
vivenciadas de forma objetiva e, subjetivamente, presentes, também, embora de forma mais sutil,
que estaremos repensando o currículo e em matérias aparentemente menos sujeitas à
redimensionando sua projeção. Pois, considerar a contaminação ideológica, como Matemática e
experiência do aluno implica fundamentalmente Ciências.
tomá-la como ponto de partida no processo de Se ideologia e currículo não podem ser vistos
reflexão que deve sustentar a prática pedagógica separados da teorização educacional crítica,
do professor e, ao problematizá-la, extrair o cultura e currículo constituem um par inseparável
significado das relações educativas, como também na teoria educacional tradicional. Nessa visão,
oportunizar que o aluno se aproprie criticamente que é a educação? e, em particular, o currículo?,
de outras experiências e saberes. senão uma forma institucionalizada de transmitir
Dessa forma, é preciso concordar com Moreira a cultura de uma sociedade.
e Silva (1995, p. 7), o currículo é um artefato social Em se tratando de teorização crítica, de
e cultural, pois o currículo não é um elemento certa forma, o currículo continua trazendo um
inocente e neutro de transmissão desinteressada calhamaço de tradição. A educação e o currículo
do conhecimento social, ao contrário, o currículo estão profundamente envolvidos com o processo
está implicado em relações de poder, o currículo cultural, entretanto, há diferenças importantes a
transmite visões sociais particulares e interessadas, serem enfatizadas. De forma geral, a educação e o
o currículo produz identidades, estabelece currículo estão, sim, envolvidos com esse processo,
culturas individuais e coletivas. mas ele é visto, ao contrário do pensamento
Sob esta perspectiva, Althusser (1985) em seu convencional, como um fundamento político.
ensaio “Aparelhos ideológicos de Estado”, ao tratar Para Moreira e Silva (1995), o currículo e a
da educação em seu caráter ideológico, rompe educação estão profundamente envolvidos em
com a noção liberal e tradicional da educação uma política cultural, o que significa que são

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tantos campos de produção ativa de cultura movimento para tornar a seleção e determinação
quanto os campos contestados. Em contraste do currículo numa área de especialização
com o pensamento convencional sobre a relação profissional, como Gordon Rugg, Ralph Tyler e
entre currículo e cultura, a tradição crítica vê o Hilda Taba abraçaram convictamente tanto a
currículo como terreno de produção e criação cruzada moral quanto a ética da adaptação ao
simbólica cultural. Para eles, a educação e o sistema econômico como funções patentes da
currículo não atuam, nessa visão, apenas como escolarização.
correias transmissoras de uma cultura produzi- da Ao examinarmos trabalhos de alguns dos
em outro local, por outros agentes, mas são partes mais influentes intelectuais e especialistas em
integrantes e ativas de um processo de produção currículo como John Dewey, Ralph Tyler, John F.
e criação de sentidos, de significações, de sujeitos. Bobbit é possível percebermos os compromissos
Nessa perspectiva, o currículo educacional, por ideológicos que orientaram grande parte da
sua vez, é o terreno privilegiado de manifestações, estruturação de currículo no passado e, como
desse conflito, reafirmam os mesmos autores, exatamente a visão da escolarização como uma
o currículo, então, não é visto, tal como na visão instituição de aculturação lentamente se uniu à
tradicional, como um local de transmissão de uma visão da escolarização para a adaptação ao sistema
cultura incontestada e unitária, mas como um econômico na mente do público.
campo em que se tentará impor tanto a definição Portanto o entendimento inicia-se a partir
particular de cultura de classe ou grupo dominante desse ponto com um modelo curricular econômico
quanto o conteúdo dessa cultura. e culturalmente conservador adquirindo forma
Os autores dizem ainda que: aquilo que na própria, tornando-se um paradigma dominante.
visão tradicional é visto como o processo de Ficando claro que, historicamente, a teoria e o
continuidade cultural da sociedade como um desenvolvimento do currículo que deveriam estar
todo, é visto aqui como processo de reprodução ligados às mudanças sociais, as estruturas que
cultural e social das divisões dessa sociedade. legislam a escolarização em seus mais diversos
Nesse entendimento, o currículo não é o veículo níveis de ensino e na promoção sócio-econômica
de algo a ser transmitido e passivamente absorvido, da coletividade não desenvolvem o seu papel
mas o terreno em que ativamente se criará e político-educacional e, o que se vê é um currículo
produzirá cultura. O currículo é, sim, segundo eles, engessado em teorias, vazio de falas e de práticas
“um terreno de produção e de política cultural, cotidianas.
no qual os materiais existentes funcionam como
matéria-prima de criação, recriação e, sobretudo, CONSIDERAÇÕES FINAIS
de contestação e transgressão” (MOREIRA e SILVA,
1995, p. 28). O percurso conceitual e histórico das linhas
Enfim, para discutir currículo de uma forma curriculares que realizamos nos permite verificar
crítica, acreditamos ser necessário discuti-lo num a variedade de posições/perspectivas sobre a
sentido amplo e abrangente, não se limitando conceituação de currículo. Também podemos
a problemas técnicos como ocorreu em muitos perceber que estas teorias admitem possibilidades
momentos da história, entendendo que o campo variadas de interpretação, de- pendendo do
curricular está fortemente influenciado por um contexto e dos grupos sociais envolvidos.
conjunto de valores educacionais, pertencente Sendo assim, não existe a mais ou a melhor
a um quadro de referência teórica, histórica e definição de currículo, porque uma vez que
política. implica uma posição de valor, tal definição vai ser
Pautado nessa discussão, o papel da es- cola melhor para um grupo que opta por determinados
tanto na parte ética quanto na adaptação à valores; o que pode ser a melhor definição para se
estratificação econômica foi algo que vá- rios trabalhar em um determinado grupo, porque ele
dos autores citados abordaram com muita fez opções, pode não ser válido para outro grupo,
tranqüilidade. Muitos dos primeiros líderes do porque ele fez outras opções. Tomar decisões

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curriculares é essencial- mente tomar decisões CASWELL, Hollis; CAMPBELL, Doak. Curriculum
de valor, e decidir-se por uma definição de development. New York, American Book
currículo está em se definir por uma determinada Company, 1935.
concepção, que inclui compromissos sociais e
DEWEY, John. Vida e Educação. São Paulo:
políticos; uma vez tomadas essas decisões, a Nacional, 1959.
definição assume significado.
A concepção de currículo evoluiu FLEMING, Robert S. (org.). Currículo moderno:
acompanhando o desenvolvimento das ciências um planejamento dinâmico das mais avançadas
da educação aplicada a diferentes áreas do técnicas de ensino. Rio de Janeiro: Lida- dor,
1970.
conhecimento. A questão fundamental no
âmbito dos estudos sobre currículo resume-se na KILPATRICK, William H. Educação para uma
explicação do que deve ser aprendido (conteúdo) civilização em mudança. São Paulo: Melhora-
e do como deve ser aprendido (ação). mentos, 1956.
Acreditamos que o currículo deva ser visto
como uma maneira de preparar a juventude KUHN, Thomas. A Estrutura das Revoluções
Científicas. São Paulo: Perspectiva, 1989.
para participar ativamente de sua cultura. Nem
todas as culturas se nutrem das mesmas classes JODELET, Denise (Org.). As representações
de conhecimentos, nem uma mesma cultura sociais. Rio de Janeiro: Eduerg, 2001.
necessita dos mesmos tipos de capacidades e
habilidades intelectuais em todas as épocas. LEE, John Murray; LEE, Dorris May. The child and his
Assim, uma análise da cultura e da sociedade é curriculum. Science Education, vol.34, issue 5,
New York: Appleton-Century-Crofts, 1960. p. 345-
um dos critérios que fundamentam a proposta de
361.
currículo.
Portanto, tudo o que foi visto até aqui LUNDGREN, Ulf. Teoria del curriculum y
é necessário para permitir exame e análise escolarización. 2. ed. Madrid: Morata, 1997.
completos (do que existia, do que existe) sobre
conceituação de currículo e; levar à tomada de MACDONALD, James B. Curriculum as political
process. New York: Peter Lang, 1995.
decisões que promovam o melhoramento de
desenvolvimento do currículo, seu planejamento MOREIRA, Antonio Flávio Barbosa; SILVA, Tomaz
e replanejamento no sentido de melhorar o Tadeu da. Sociologia e teoria crítica do currículo:
processo ensino-aprendizagem, em benefício do uma introdução. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1995.
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