Você está na página 1de 35

AULA FEB

Capítulos 1, 2, 3, 4
Formação Econômica do Brasil – Celso Furtado
Sumário
• Da expansão comercial à empresa agrícola
• Fatores do êxito da empresa agrícola
• Razões do monopólio
• Desarticulação do sistema
Da expansão comercial à empresa agrícola
A ocupação das terras americanas
• Um episódio da expansão comercial da Europa
- Não se trata de deslocamentos de população provocados por
pressão demográfica, rupturas sistêmicas, ou ocasiões de força

- Elevado grau de desenvolvimento europeu no século XV e


dificuldades de abastecimento de produtos (inclusive manufaturas)
nas linhas orientais – mediterrâneo - (invasões turcas)

- Restabelecimento dessas linhas na segunda metade do século XV


- Para Portugal
➢ Um episódio secundário durante meio século
➢ Limitação de recursos

- Para a Espanha
➢ Se atem ao ouro acumulado pelas velhas civilizações da meseta
mexicana e do altiplano andino
➢ A razão de ser da América, como objetivo dos europeus, em sua primeira
etapa de existência histórica
➢ Maior condições de recursos mas cessão à pressão invasora
➢ Redução do perímetro territorial conforme estabelecido no Tratado de
Tordesilhas
➢ Criação de colônias de povoamento de reduzida importância econômica
e com fins de abastecimento e defesa (Cuba por exemplo)
A ocupação das terras americanas

- Para as demais nações europeias: contraposição de interesses em


relação à Portugal e Espanha (descobertas compensatórias ou
plataformas de ataque)

Não fossem os tesouros, muito provavelmente a exploração e


ocupação teriam progredido mais lentamente
A ocupação das terras americanas
Foi uma consequência [...]
➢ Da pressão política exercida sobre Portugal e Espanha pelas
demais nações europeias
➢ Princípio de que espanhóis e portugueses não tinham o direito
às terras, senão aquelas que tivessem efetivamente ocupado

Exemplos de
➢ Iniciativa francesa de, por motivos religiosos, organizar
expedições de colônia de povoamento na costa setentrional
brasileira
➢ Crescente percepção de perda das terras americanas a menos
que fosse realizado um esforço para ocupa-las permanentemente
A ocupação das terras americanas
- Ocupação das terras americanas significava
➢ Desviar recursos de empresas muito mais produtivas no Oriente
➢ Miragem da possibilidade de existência de ouro no interior do território
brasileiro (junto à estranha pressão francesa) atuou na decisão do relativo
esforço de assegurar o território
➢ Fora das regiões ligadas à grande empresa militar-mineira espanhola
(México – Peru/Flórida – embocadura do rio da prata), o continente
apresentava escasso interesse econômico, e defende-lo de forma efetiva e
permanente constituía sorvedouro enorme de recursos
➢ Os traços de maior relevo do primeiro século da história americana estão
ligados a essas lutas em torno de terras de escassa ou nenhuma utilização
econômica
➢ Impossibilidade de evitar a invasão ocupação das Antilhas (inicialmente
considerada de uso unicamente militar, mas que ganha importância
econômica no período seguinte)
A ocupação das terras americanas
• Desenvolvimento econômico de Portugal no século XV
- Exploração da costa africana
➢ Expansão agrícola nas ilhas do Atlântico (Açúcar na Ilha da Madeira e
em São Tomé)

- Abertura da rota marítima das Índias Orientais


➢ Comércio de especiarias
➢ Eliminação dos intermediários (árabes), e quebra do monopólio
(venezianos)
➢ Brusca queda dos preços das especiarias, e fundamental para o
desenvolvimento comercial europeu
- Acontecimentos independentes das vicissitudes criadas no
mediterrâneo pela penetração turca (otomana)
A ocupação das terras americanas
A iniciativa de Portugal
➢ Encontrar uma forma de utilização econômica das terras americanas
além da extração de metais preciosos
➢ E dessa forma viabilizar os gastos de defesa dessas terras
➢ E se inicia a exploração agrícola das terras brasileiras

De simples empresa espoliativa e extrativa (idêntica ao


empreendimento na costa da África e nas Índias Orientais) para se
constituir enquanto parte integrante da economia reprodutiva
europeia
➢ Técnicas e capitais aplicados para criar de forma permanente um fluxo
de bens destinados ao mercado europeu
A ocupação das terras americanas
- Aparente inviabilidade da exploração econômica das terras
americanas no século XVI
➢ Nenhum produto agrícola era objeto de comércio em grande escala
na Europa
➢ O principal produto da terra, o trigo, dispunha de fontes de
abastecimento abundante dentro do território europeu
➢ Fretes elevados devido a insegurança e a distância: somente produtos
manufaturados e especiarias orientais eram viáveis

- Dificuldades do empreendimento agrícola devido aos custos


➢ Coube aos portugueses, no Brasil, a primazia nesse empreendimento
➢ A Espanha já havia tentado nas Antilhas e no México, mas não passou
do estágio experimental
A ocupação das terras americanas

- São esses esforços, que tiveram êxito subsequente, que permitiu a


defesa das terras no Brasil

- De outra maneira, essa defesa teria sido um ônus e dificilmente


Portugal teria perdurado como grande potência colonial na América
• Fatores de êxito da empresa agrícola
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
• Antecedentes
- Início nas ilhas do Atlântico
➢ Produção, em escala relativamente grande, de uma das especiarias mais
apreciadas no mercado europeu: o açúcar

- Técnica de Produção disponível


➢ Dificuldades de conhecimento
➢ Proibições de exportação de equipamentos
➢ A experiência permitiu solucionar problemas técnicos na produção de
açúcar
➢ Fomento ao desenvolvimento, em Portugal, da indústria de
equipamentos para os engenhos açucareiros.
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
• Experiência comercial
- Entrada do açúcar português nos canais tradicionais
➢ Controlados por comerciantes das cidades italianas
➢ Quebra desse monopólio em relação ao acesso às fontes de
produção

- Destinação da produção portuguesa para Flandres e associação com


os flamengos (Antuérpia e Amsterdam)
- Recolhimento e refinamento do produto português, e distribuição por
toda a Europa (principalmente Países Bálticos, França, e Inglaterra)
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
• Contribuição Holandesa

➢ Fundamental para a grande expansão do mercado do açúcar na segunda


metade do século XVI, e
➢ Para o êxito da colonização no Brasil
➢ Especialização, e financiador, no comércio intra-europeu
➢ Um dos poucos que possuíam organização comercial para criar um
mercado de grandes dimensões para um produto praticamente novo
➢ Além do refino e do comércio, financiamento de instalações produtivas
no Brasil e importação de m.d.o. escrava
➢ Um empreendimento quase holandês
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
• A questão da mão de obra

- Necessidade de investimento elevado para o transporte desde a


Europa (tornaria o empreendimento antieconômico)
- Condições de trabalho implicavam o pagamento de salários
superiores aos da Europa para atrair mão-de-obra dessa região
- Possibilidade de reduzir custos retribuindo com terras o trabalho
que não era atrativo ou viável devido a escassa concentração de
capital que resultava em terras praticamente sem valia econômica
- Escassez de mão de obra em Portugal, considerando o
florescimento da empresa das Índias Orientais
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
• A questão da mão de obra

- Conhecimento prévio e senhorio de um mercado africano de escravos


➢ Operações de guerra para captura de pagãos na África (um século antes)
➢ Evolução para um bem organizado, e lucrativo, escambo que abastecia
de mão de obra escrava certas regiões da Europa

- Com recursos suficientes, possibilidade de ampliação e organização


para a transferência de “mão de obra barata” para a nova colônia
agrícola, sem a qual ela seria economicamente inviável
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
• A questão da mão de obra

- A m.d.o indígena foi cogitada nos primeiros projetos de colonização,


e utilizada em determinados núcleos coloniais
- A partir da demonstração de alta rentabilidade do empreendimento
colonial é que foram mobilizados os capitais que propiciaram a
importação da mão de obra escrava a partir do continente africano
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
- Cada um dos referidos problemas (técnica de produção, criação de
mercado, financiamento, mão de obra) pôde ser resolvido no tempo
oportuno, independentemente da existência de um plano geral
preestabelecido
- Houve um conjunto de circunstancias favoráveis sem o qual a
empresa colonial não teria conhecido o enorme êxito que alcançou
- Por trás estavam o desejo e o empenho do governo português de
conservar a parte territorial que lhe cabia, das quais se esperava
que um dia sairia o ouro em grande escala
O êxito da primeira grande empresa colonial agrícola
europeia
- O êxito da grande empresa colonial agrícola no século XVI,
única na época, constituiu a razão de ser da continuidade da
presença dos portugueses em grande extensão no território

- No século seguinte, com alterações na relação de forças na Europa,


com o predomínio das nações não participes do Tratado de
Tordesilhas, Portugal já havia avançado na ocupação efetiva da
parte que lhe coube
• Razões do monopólio
A colônia espanhola
- Concentração espanhola na extração de metais preciosos (mesmo
com o sucesso agrícola português)
- Reforço do cordão de isolamento do território (invasões)
- Singularidade do território espanhol na américa:
➢ Denso povoamento, que era utilizado como mão-de-obra no âmbito
da empresa colonial espanhola

- Escassez de meios de transporte, sendo a causa do elevado preço


dos fretes (nota 10)
A colônia espanhola
Política espanhola
➢ Transformar as colônias em sistemas econômicos (1) auto-suficientes
e (2) produtores de um excedente líquido – na forma de metais preciosos
➢ Afluxo de metais preciosos provocou profundas transformações
estruturais na economia espanhola
➢ Crescimento do poder econômico do Estado
➢ Aumento no fluxo de renda gerado por gastos públicos ou privados
(subsidiados pelo governo) provocou uma crônica inflação e persistente
déficit na balança comercial (aumento da importação e redução das
exportações)
➢ Os metais preciosos que a Espanha recebia da américa provocaram
um afluxo de importação de efeitos negativos sobre a produção interna e
altamente estimulante para as demais economias europeias (demanda por
exportações)
A colônia espanhola
Política espanhola
➢ Possibilidade de viver diretamente, ou indiretamente, de subsídios do
Estado fez crescer o número de pessoas economicamente inativas
➢ Redução da importância relativa na sociedade espanhola e na
orientação política estatal dos grupos dirigentes ligados às atividades
produtivas
➢ A decadência econômica da Espanha prejudicou suas colônias
americanas (nota 12)
➢ Nenhuma empresa de envergadura além da exploração mineira,
➢ Exportações agrícolas em nenhum momento alcançou
importância significativa em três séculos de império colonial
➢ Abastecimento de manufatura baseado no artesanato local
(retardo a transformação das economias de subsistência preexistentes na
região
A colônia espanhola
Política espanhola
➢ Retrocesso econômico (acentuado no século XVII), impediu a
evolução da exportação de manufaturas da metrópole para as
colônias
➢ Consolidação da simples transferência periódica de um excedente
na forma de metais preciosos
➢ O consumo de manufaturas europeias pela população colonial da
teria criado a necessidade de uma contrapartida de exportações de
produtos locais, seja para consumo na Espanha ou para reexportação
➢ Um intercambio desse tipo provocaria transformações nas estruturas
arcaicas das economias indígenas e possibilitaria maior penetração de
capitais e técnicas europeus
Consequências da colonização espanhola na empresa
agrícola portuguesa
• Se a colonização espanhola tivesse evoluído no sentido
contrário, as dificuldades enfrentadas pela empresa
portuguesa teriam sido maiores devido à
➢ Melhor abundância e qualidade de terras para produção do açúcar
➢ Maior proximidade da Europa
➢ Mão de obra indígena ´´barata´´ e mais evoluída do ponto de vista
agrícola (para as terras altas – México e Andes)
➢ Direcionamento da densa população das Antilhas para o trabalho nas
minas, em condições climáticas distintas, repercutindo em sua
devastação em grande escala
➢ Poder financeiro concentrado
Consequências da colonização espanhola na empresa
agrícola portuguesa
- Decadência econômica espanhola impediu
➢ Domínio do mercado de produtos tropicais (especialmente o açúcar)
➢ Também a proibição da exportação do açúcar pelas colônias para
preservar a pequena produção que se obtinha na Andaluzia
➢ Necessidade de grupos econômicos poderosos para o
desenvolvimento da exportação de produtos agrícolas
➢ Impedimento da liderança dos produtores de manufaturas pela
decadência do setor na etapa das (1) grandes importações de metais
preciosos e (2) da concentração de renda nas mãos do Estado espanhol
➢ Um dos fatores de êxito da empresa colonizadora agrícola portuguesa
foi a decadência da economia espanhola, principalmente devido à
descoberta precoce de metais preciosos
• Desarticulação do sistema
Os Países Baixos na América

Impactos na colônia portuguesa na América resultantes da absorção


de Portugal à Espanha (União Ibérica, 1580 – 1640) e da Guerra dos
Oitenta Anos entre a Espanha e a Holanda
➢ Ocupação de Portugal, com quem haviam desenvolvido um intenso
comércio
➢ Espanha: País a qual estavam submetidos anteriormente à
independência
Os Países Baixos na América
• Quadro político-econômico do nascimento e progresso da
empresa agrícola no Brasil colonial
- Controle Holandês de praticamente todo o comércio realizado por
mar pelos países europeus no início do século XVII
➢ Posição geográfica;
➢ Organização comercial e técnica;
➢ Atraso econômico dos demais países

- Impossibilidade de distribuir o açúcar pela Europa sem a


cooperação comercial holandesa
Os Países Baixos na América

Responsabilidade holandesa no sucesso do empreendimento do


açúcar
➢ Ausência de pretensão de renunciar a parte que possuíam no negócio
➢ A luta pelo controle do açúcar torna-se uma das razões do conflito
entre holandeses e espanhóis
➢ Antes da trégua estabelecida em 1609, os holandeses abriram
brechas tanto no império português das Índias Orientais, quanto
buscando açúcar em Lisboa com a própria conivência dos portugueses

Um dos episódios deste conflito é justamente a ocupação holandesa de


regiões produtoras de açúcar no Brasil
Os Países Baixos na América
Ocupação Holandesa
➢ É a ruptura do sistema cooperativo oficial entre holandeses e
portugueses, com consequências mais duradouras do que a ocupação
militar

Durante a ocupação
➢ Absorção do conhecimento relacionado à aspectos técnicos e
organizacionais da indústria do açúcar
➢ Conhecimentos que vão servir de base para a constituição de uma
indústria concorrente e de grande escala no Caribe
➢ Rompimento do monopólio instituído até então a partir da identidade
de interesses entre (1) produtores portugueses e (2) grupos financeiros
holandeses, que controlavam o comércio europeu
➢ Queda nos preços do açúcar até o século XVIII
Os Países Baixos na América

Ruptura Holanda e Portugal


➢ Finda a etapa de máxima rentabilidade da empresa agrícola-colonial
portuguesa
➢ Queda no volume das exportações médias anuais em mais da metade,
assim como os preços
➢ Queda da renda real gerada pela produção açucareira a 25% em
comparação a sua melhor época
➢ Depreciação da moeda portuguesa em relação ao ouro nas mesmas
proporções, indicando a importância assumida pelo açúcar no balanço de
pagamentos português
Os Países Baixos na América
Embora os manufaturados que chegassem ao Brasil fossem
produzidos em outros países europeus e remetidos via Portugal
➢ A desvalorização da moeda portuguesa significa uma importante
transferência de renda real em benefício do núcleo colonial,
➢ A depreciação minorava os prejuízos dos comerciantes que tinham
capitais empatados nos negócios do açúcar, permitindo que estes
continuassem operando
➢ Sendo os artigos de produção interna exportados de Portugal para o
Brasil com preços fixados em ouro, as transferências resultantes da
desvalorização, se revertiam em benefício para os exportadores
metropolitanos portugueses

Você também pode gostar